Mal Nascida - A Defesa de Clitemnestra e a Defesa de Electra

August 10, 2017 | Autor: J. Pique Castanheira | Categoria: História Da Antiguidade Clássica
Share Embed


Descrição do Produto

História das Culturas da Antiguidade Clássica Professor Doutor Nuno Simões Rodrigues Mal Nascida - A Defesa de Clitemnestra e a Defesa de Electra Electra A personagem de Electra encontra-se presente em três peças clássicas de Três autores distintos, Sófocles, Eurípedes e Ésquilo. No caso das peças dos dois primeiros autores verifica-se uma certa dúvida sobre qual terá sido a primeira a ser escrita. Na situação de Ésquilo, a peça Coéfora (onde está presente a tragédia de Electra), é criada como uma paródia tal como o resto das peças da trilogia Oresteia. Em todas as peças esta personagem é motivada pela necessidade de vingar a morte de seu pai, Agamémnon, levada a cabo por Clitemnestra após o regresso da guerra de Troia. No caso das tragédias gregas, a razão para este assassinato deve-se ao facto de Agamémnon antes de partir para guerra de Tróia ter decidido sacrificar uma das suas filhas, Ifigénia, de modo a que o seu exército tivesse uma travessia pacífica no mar. No caso da modernização cinematográfica de João Canijo, a motivação de Lúcia (personagem equivalente a Electra) também provém do assassinato do seu pai por parte da mãe e do padrasto, embora se verifique uma diferença no motivo pelo qual este é morto. Ao longo do filme, como ao longo das peças, verifica-se sempre que a personagem de Electra/Lúcia nunca esquece, ou perdoa a morte do pai, embora este tenha cometido um acto horrível ao sacrificar a sua filha Ifigénia, ou no caso da adaptação cinematográfica a violação e assassinato da filha. Na sua defesa, esta personagem apresenta vários argumentos com o objectivo de justificar a necessidade de vingar o assassinato de seu pai, mesmo após ter conhecimento de que ele tinha violado e matado a sua irmã Fátima (personagem equivalente a Ifigénia). Levando essa necessidade de vingança mais tarde ao assassinato da mãe e do padrasto, auxiliada pelo seu irmão Augusto (Egisto nas peças Clássicas). Em sua defesa verifica-se que Lúcia afirma que a morte do pai é algo horrível e imperdoável e que a mãe nunca deveria, no caso da peça, ter morto o marido, e no caso do filme consentido o assassinato que Evaristo realizou. Quando confrontada com a mãe e exposta à situação e às razões que esta apresenta para assassinar o marido, Lúcia recusa-se a aceitar a morte do pai como um acto de justiça, mesmo após tomar conhecimento que a sua irmã era violada e que no fim foi morta pelo próprio pai. Conclui-se assim que a personagem de Lúcia/Electra não possui alterações muito drásticas quando transportada para um cenário contemporâneo, para além de certos episódios, que são ligeiramente modificados, para melhor se inserirem num contexto moderno, como por exemplo se verificou no cenário da morte da sua irmã.

Clitemnestra

No caso da personagem de Clitemnestra, mãe de Electra e esposa de Agamémnon, verificam-se alterações mais acentuadas na adaptação de João Canijo. As grandes diferenças, verificam-se na alteração sobre quem é que realmente mata o seu marido. Observa-se nas peças clássicas1 que a morte de Agamémnon é proveniente das acções de Clitemnestra, apenas auxiliada pelo futuro padrasto de Electra (Orestes). Já na adaptação de João Canijo, Adelaide, personagem correspondente a Clitemnestra, não apresenta uma acção directa na morte do marido, apenas se limitando a deixar Evaristo assassiná-lo. Verifica-se assim que esta personagem apresenta a maior modificação em relação ao texto original, ao contrário da situação de Electra/Lúcia, em que Clitemnestra/Adelaide possui um papel mais de espectadora do assassinato do marido em contraste com o seu papel mais activo nas obras clássicas. No caso da morte do marido, no filme de Canijo, Adelaide não é motivada pelo facto do seu marido entregar a sua filha em sacrifício aos deuses, algo que do ponto de vista de uma modernização do texto clássico teria sido visto como algo fora de contexto. Assim verifica-se que o realizador decide alterar este episódio ao apresentar ao espectador que o assassínio do marido deve-se ao facto de este ter violado inúmeras vezes a filha e a ter morto quando esta engravidou dele. Também é possível identificar neste episódio outra diferença significativa em relação às personagens, pois em vez de ser a mulher a matar o marido, no assassinato de Agamémnon por Clitemnestra, verifica-se que no filme esta acção é atribuída a Evaristo com o consentimento de Adelaide. Ao expor a sua defesa para as acções que levaram á morte do marido, a personagem de Adelaide apresenta alterações acentuadas em relação à personagem onde se inspirou, Clitemnestra. Embora ambas apresentem a mesma motivação, vingar a morte da filha, o modo como elas efectuam a sua vingança difere, como se verificou anteriormente em que é Evaristo, quem age activamente na morte do marido de Adelaide. Como modo de justificar as suas acções, e as de Evaristo, Adelaide quando confrontada com Lúcia defende que a morte do marido não poderia ser considerada como um acto criminoso, ao contrário considera que ele sim, teria cometido um crime maior violando e assassinando a própria filha, afirmando que a existência de um consenso entre ela e Evaristo reforçava a ideia de que o acto que cometera nunca seria considerado um crime. João Castanheira, nº49118

1

SACCONI, Karen Amaral, Electra de Eurípedes: Estudo e Tradução, São Paulo, [s.n.], 2012. Tese de Mestrado. Sófocles, Tragédias do ciclo troiano, Lisboa, Edições Sá da Costa, 1973. Ésquilo, Oresteia, Tradução PULQUÉRIO, Manuel de Iliveira, 1ª edição, Lisboa, Edições 70, 2012.

Bibliografia:

- SACCONI, Karen Amaral, Electra de Eurípedes: Estudo e Tradução, São Paulo, [s.n.], 2012. Tese de Mestrado. - Sófocles, Tragédias do ciclo troiano, Lisboa, Edições Sá da Costa, 1973. - Ésquilo, Oresteia, Tradução PULQUÉRIO, Manuel de Iliveira, 1ª edição, Lisboa, Edições 70, 2012. - BONNARD, André, A Civilização Grega, Tradução José Saramago, 1º edição, Lisboa, Edições 70, 2007. - PEREIRA, Maria Helena da Rocha, Estudos de História da Cultura Clássica, vol. I, 11ª edição, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 2012. - CANIJO, João - Mal Nascida. Costa do Castelo Filmes, 2008. 1 disco óptico (DVD) (118 min.).

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.