Mandado de Segurança em face do Presidente da ALRS

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Protocolo nº 151.739. Cópia anexa.
Art. 76.A denúncia assinada pelo denunciante e com a firma reconhecida, deve ser acompanhada dos documentos que a comprovem, ou da declaração de impossibilidade de apresentá-los com a indicação do local em que possam ser encontrados. Nos crimes de que houver prova testemunhal, conterão rol das testemunhas, em número de cinco pelo menos.
Cópia anexa. Documento juntado ao protocolo anterior.
Cópia anexa. Documento recebido pessoalmente pelo Dr. Fernando Ferreira.
Cópia anexa.
Mandado de Segurança e Ações Constitucionais. 35ª ed, 2013, Malheiros Editores. p. 35.
CAMPOS E SILVA, Ronaldo. Processo de Mandado de Segurança. Niterói, RJ: Impetus, 2013. p. 33.
Constituição Federal de 1988, art. 1º, parágrafo único.
Vide Mandado de Segurança nº 21623/DF, de relatoria do Ministro Carlos Velloso. Remédio impetrado por Fernando Affonso Collor de Mello, julgado pelo Pleno do Supremo Tribunal Federal em 17/12/1992.
Mandado de Segurança e Ações Constitucionais. 35ª ed, 2013, Malheiros Editores. p. 33.
Mandado de Segurança e Ações Constitucionais. 35ª ed, 2013, Malheiros Editores. p. 35.
SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI, Luis Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Curso de direito constitucional. 2ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013. Pp. 398-399.
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR DESEMBARGADOR RELATOR DO ÓRGÃO ESPECIAL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL










LETÍCIA DE SOUZA FURTADO, brasileira, solteira, advogada e cidadã, domiciliada e com endereço profissional na ___________________________________________________________, vem respeitosamente perante Vossa Excelência, em causa própria, impetrar

MANDADO DE SEGURANÇA COM PEDIDO DE LIMINAR

contra (falta de) ato do PRESIDENTE DA ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO RIO GRANDE DO SUL, O SENHOR EDSON BRUM, , com fulcro nos arts. 5º, inciso LXIX, da Constituição Federal; 1º e 7º, inciso III, da Lei 12.016/09; 461, §3º, do Código de Processo Civil; e 8º, inciso V, alínea "b", do Regimento Interno deste Egrégio Tribunal, pelos argumentos de fato e de direito a seguir expostos.




I – DA ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA
De início, informa-se que a impetrante é profissional liberal, não tem renda fixa, a média de seu ganho é baixa, e, conforme declaração anexa, não possui condições de arcar com custas processuais e honorários advocatícios sem prejuízo do sustento próprio ou de sua família, razão pela qual faz jus a assistência judiciária gratuita, nos termos do artigo 4º da Lei 1.060/50, com redação introduzida pela Lei 7.510/86.

II – DOS FATOS
No dia 1º de setembro de 2015, esta peticionária protocolou, na Mesa da Presidência da Assembleia Legislativa do Estado, Denúncia de Crime de Responsabilidade em face do Governador do Rio Grande do Sul, o Senhor José Ivo Sartori, em síntese fundamentada no ato que parcelou os salários dos servidores públicos do Poder Executivo, e em questões circundantes.
Na mesma data, a referida denúncia foi encaminhada à Procuradoria-Geral da Assembleia e passou, então, aos cuidados do Procurador-Geral, o Doutor Fernando Guimarães Ferreira, para que fosse confeccionada manifestação jurídica acerca do pedido.
Em que pese os documentos exibidos por advogados sejam presumidamente verdadeiros, a impetrante foi aconselhada a reconhecer firma em cartório e juntar certidão de quitação eleitoral, para o exato cumprimento do que dispõe o art. 76 da Lei 1.079/50. Por essa razão, em 08 de setembro apresentou novamente o pedido, com o preenchimento de tal requisito.
No dia 11 de setembro, a impetrante pediu formalmente que a denúncia fosse impulsionada e devolvida à Presidência da Assembleia, para a devida autuação e regular tramitação.
Em 22 de setembro, requereu, nos termos do art; 5º, inciso XXXIV, alínea "b", da Constituição Federal – que dispõe sobre o direito de certidão –, fosse expedido documento com informações acerca do andamento da denúncia realizada. Esta certidão nunca lhe foi entregue, embora a impetrante tenha ido à Assembleia mais de uma vez com a finalidade de buscá-la.
Em 07 de outubro de 2015, a denúncia foi enfim autuada. "Tramita", assim, sob o nº 004081-01.00/15-0.
Dia 16 de outubro a impetrante foi à Assembleia Legislativa, oportunidade em que lhe informaram que o processo teria sido devolvido à Presidência da Casa. Telefonou em 20 de outubro, certa de que finalmente o feito começara a ser impulsionado, quando recebeu a notícia de que o Presidente pedira esclarecimentos adicionais ao Procurador-Geral, para o Gabinete de quem o expediente retornou.
É o breve relato de uma advogada cidadã e perseverante.

III – DO DIREITO SUBJETIVO LÍQUIDO E CERTO À ANÁLISE FUNDAMENTADA DE ADMISSIBILIDADE DA DENÚNCIA POR CRIME DE RESPONSABILIDADE
Na esfera federal, as regras aplicáveis ao processo de impeachment vêm sendo examinadas em razão de sucessivos pedidos protocolados contra a Presidente da República Dilma Rousseff. Alguns pontos advindos das discussões naquele âmbito são proveitosos a este Mandado de Segurança.
Ao responder em Plenário, no dia 24 de setembro de 2015, à questão de ordem nº 105, o Presidente da Câmara dos Deputados, Sr. Eduardo Cunha, assinalou que:
[...] o juízo inicial de admissibilidade da denúncia por crime de responsabilidade envolve não apenas a análise dos aspectos meramente formais enumerados acima, mas também de questões substanciais, notadamente a das condutas imputadas e a existência de indícios mínimos de autoria e materialidade, nos termos da jurisprudência firmada pelo Supremo Tribunal Federal. [grifei]
A resposta de Eduardo Cunha foi amparada pelo Agravo Regimental no Mandado de Segurança nº 30.672 (Relator Ministro Ricardo Lewandowski, Plenário, Diário da Justiça, 18 de outubro de 2011), do qual se extrai:
O Plenário desta Corte, por ocasião do julgamento do Mandados de Segurança 23.885/DF, Rel. Min. Carlos Velloso, e afirmou o entendimento no sentido de que a competência do Presidente da Câmara dos Deputados para recebimento, ou não, de denúncia no processo de impeachment, não se restringe a uma admissão meramente burocrática, cabendo-lhe, inclusive, a faculdade de rejeitá-la imediatamente acaso entenda ser patentemente inepta ou despida de justa causa. [grifei]
Os Ministros Teori Zavascki e Rosa Weber, recentemente, ao conceder liminares nos Mandados de Segurança 33837 MC / DF e 33838 MC / DF, respectivamente, ressaltam os aspectos constitucionais do procedimento de impeachment.
A Ministra ressaltou a relevância e envergadura constitucional pertinentes à definição das regras sobre o processo e julgamento de Presidente da República por crimes de responsabilidade. E não poderia ser de outra forma, pois, sobre o tema, há previsão no art. 85, parágrafo único da Carta Magna. Por conseguinte, a conclusão extensiva é de que a magnitude e a necessidade de zelo imponível a tudo que se refira ao trâmite de legítimas denúncias por crime de responsabilidade estão bem afirmadas, afinal, busca-se garantir a idoneidade de um processo democrático de valor constitucional.
O Ministro Teori Zavascki, por sua vez, teceu as seguintes considerações:
Embora, à primeira vista, a controvérsia pareça revestir-se de características de simples questão interna corporis, o que na realidade subjaz em seu objeto é, pelo menos indiretamente, a tutela de importantes valores de natureza constitucional, notadamente o que diz respeito à higidez das normas editadas pela autoridade impetrada sobre procedimentos "relacionados e à análise de denúncias em desfavor da Presidente da República pela suposta prática de crimes de responsabilidade". [grifei]
É nesse sentido que lecionam MEIRELLES, WALD e MENDES:
No entanto, não se sujeitam a correção judicial a lei regularmente votada e promulgada, bem como os atos interna corporis do Legislativo, que são aquelas deliberações do Plenário, Comissões ou da Mesa que entendem direta e exclusivamente com as atribuições e prerrogativas da corporação. Da não se conclua, entretanto, que todo e qualquer ato desses órgãos constitua interna corporis vedado à apreciação judicial. Não é assim, pois atos e deliberações do Legislativo existem regrados pela Constituição, pela lei e pelo Regimento, e nestes casos pode – e deve – o Judiciário decidir sobre sua legitimidade. [grifei]
Assim, sustenta-se que a discussão palpitante na esfera federal lembra e reafirma, de todas as formas possíveis, a dimensão constitucional, e, portanto, a natureza preciosa de tudo que circunda a possibilidade do exercício político em que consiste uma denúncia legítima por crime de responsabilidade. Conclui-se, ainda, que o direito líquido e certo da impetrante, no momento, consubstancia-se em que seja decidida a admissibilidade da denúncia protocolada em 1º de setembro, por óbvio, de forma satisfatoriamente fundamentada. Lembrando que a falta de motivação idônea é causa de nulidade.
Na verdade, liquidez e certeza são atributos que se agregam aos fatos. São os fatos constitutivos do direito do impetrante que precisam ser líquidos e certos no sentido de que possam ser demonstrados de plano, independentemente de dilação probatória.
CONTROVÉRSIA SOBRE MATÉRIA DE DIREITO NÃO IMPEDE CONCESSÃO DE MANDADO DE SEGURANÇA (STF, Súmula 625).
Todo cidadão tem o direito de ver ecoar seu exercício legítimo de cidadania no Estado Democrático de Direito vigente, construído sob o lume de Lei Maior que declara emanar do povo todo o poder, sendo este exercido, também, diretamente, nos termos da Constituição.
Em complemento, a legislação brasileira anuncia a liquidez e certeza desse direito. A Lei 1.079/50 define os crimes de responsabilidade e regula o respectivo processo de julgamento. A Constituição Federal de 1988, em seu art. 85, arrolou condutas as quais, cometidas pelo Presidente da República, configurarão crime de responsabilidade. O parágrafo único acrescenta: Esses crimes serão definidos em lei especial, que estabelecerá as normas de processo e julgamento. A Carta Magna vigente recepcionou a Lei 1.079/50 nos moldes deste dispositivo. No mesmo sentido, reza o art. 83 da Constituição Estadual do Rio Grande do Sul: São crimes de responsabilidade do Governador do Estado os previstos na Constituição Federal e definidos em lei. Como se pode perceber, esta expressão dos direitos políticos está bem respaldada pelas normais constitucionais.
Segundo o art. 14 da Carta Magna Federal, a soberania popular será exercida, dentre outras formas, pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto.
Ao definir, em seu art. 76, que "é permitido a todo cidadão denunciar o Governador perante a Assembleia Legislativa, por crime de responsabilidade", a Lei 1.079/50 concede ao cidadão ferramenta reflexa ao voto direto. Se, com esta ferramenta, o indivíduo que goza de direitos políticos dá um voto de confiança ao candidato eleitoral, gesto imbuído de esperança, voltado ao futuro; com aquela – a denúncia –, o indivíduo pretende realizar um controle de atos ilegais já praticados pelo representante eleito, é uma medida voltada ao que já está feito, mas que decorre da mesma essência democrática, que permite ao indivíduo participar dos rumos da Nação e zelar pela manutenção ordem jurídica.
A Lei 1.079/50 delimita a forma do exercício de cidadania sobre a qual se requer a segurança não apenas no que tange ao cidadão denunciante, mas também ao que respeita o órgão competente para analisar o pedido. É desse conjunto de poderes e deveres legalmente dispostos que nasce o direito subjetivo líquido e certo que um cidadão tem de ver seu ato de cidadania considerado.
Consoante a Lei 1.079/50, uma vez recebida a denúncia por crime de responsabilidade, o procedimento deve ser o seguinte:
- Realização da leitura da denúncia no expediente da sessão seguinte, sendo esta despachada a comissão especial (art. 19);
- A comissão deve se reunir para eleger seu Presidente e relator (art. 20);
- A comissão deve emitir parecer sobre a denúncia, opinando sobre se a denúncia deve ou não ser julgada objeto de deliberação (art. 20);
- O parecer é lido no expediente da sessão da Casa Legislativa, sendo incluído em primeiro lugar na ordem do dia, para uma discussão única (art. 20, §§1º e 2º);
- Encerrada a discussão do parecer, submete-se este a votação nominal, para decidir se a denúncia será considerada objeto de deliberação ou arquivada (art. 22);
- Não sendo arquivada, a comissão especial promoverá diligências, ao fim das quais profere outro parecer sobre a procedência ou improcedência da denúncia (art. 22, §2º);
- Novas discussões e votação nominal, desta vez a respeito da procedência da denúncia (art. 22, §3º);
- Decidindo-se pela procedência, considera-se decretada a acusação pela Casa Legislativa (art. 23, §1º);
- No processo e julgamento do Governador serão subsidiários da Lei 1.079/50, naquilo em que lhe forem aplicáveis, o Regimento Interno da Assembleia Legislativa, e do Tribunal de Justiça, bem como o Código de Processo Penal (art. 79).

Conforme já mencionado nos itens 10 e 11 deste tópico, o recebimento ou rejeição da denúncia ocorre após o juízo de admissibilidade da mesma, quando são analisados se: houve reconhecimento de firma do signatário; está comprovada a quitação eleitoral; não é inepta a inicial; há justa causa para a propositura.
Caso se verifiquem presentes todos os requisitos, deve a denúncia ser recebida; em caso contrário, deve ser rejeitada sob satisfatória fundamentação.
O crime de responsabilidade envolve questões administrativas e políticas, abarca meandros da ética e da moral, e a procedência da denúncia deve, por isso, ser analisada pelos representantes do povo em sessão aberta na qual se garanta o máximo de representatividade.
Como se pode ver, muito tempo já se passou desde que a denúncia foi protocolada; mas seu juízo de admissibilidade até hoje não foi realizado. A ilegalidade e a violação do direito líquido e certo apontado estão consolidadas e devem ser desconstituídas, sob pena de restringir gravemente direitos políticos básicos.
Uma vez que a violação está ocorrendo em razão de inércia, cabível mencionar decisão registrada no Informativo nº 143 do Supremo Tribunal Federal:
Tratando-se de mandado de segurança contra ato omissivo que a autoridade apontada como coatora deva praticar de ofício, é indevida a exigência de prova a respeito da prática da omissão, bastando apenas para o impetrante a demonstração de que a autoridade impetrada tem o poder-dever de agir. RMS 22.032-DF, rel. Min. Moreira Alves, 26.3.99. [grifei]
A impetrante, durante esse tempo – desde o dia 1º de setembro –, tem ido pessoalmente à Assembleia ou para lá telefonado. Ouve promessas de que o processo será impulsionado, mas nada relevante acontece. Nas lições de MEIRELLES, WALD e MENDES:
Sendo ação cível, o mandado de segurança enquadra-se no conceito de "causa", enunciado pela Constituição Federal [...] Distingue-se das demais ações apenas pela especificidade de seu objeto e pela sumariedade de seu procedimento [...] Visa, precipuamente, à invalidação de atos de autoridade ou à supressão de efeitos de omissões administrativas capazes de lesar direito individual ou coletivo, líquido e certo. (grifei)
Se, para ganhar uma capa, um número e uma manifestação do Procurador-Geral – atos que nem são mencionados na Lei 1.079/50 –, passou-se mais de um mês e meio, em quanto tempo será analisado o pedido? Ele será analisado?
É de se invocar a razoável duração do processo (art. 5º, inciso LXXVIII, da Constituição Federal). Se por um prisma o mais comum seja mencionar este princípio para defender direitos de quem está submetido a processo, por outro, é de se notar que também para aquele que pede a instauração existe interesse legítimo de duração razoável. Eis um ditame que se relaciona com o previsto no inciso XXXV do mesmo artigo, segundo o qual "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito".
A norma do inciso XXXV é aplicável ao caso, pois, no procedimento de impeachment, o Poder Legislativo "faz as vezes" de Judiciário. E não se está a ignorar que, tecnicamente, o pedido ainda não se transmutou em processo; mas se a inércia não está lesando o primeiro inciso referido, causa ineficácia relativa à lei que visa garantir o segundo.
O art. 82 da Lei 1.079/50 determina que "Não poderá exceder de cento e vinte dias, contados da declaração da procedência da acusação, o prazo para o processo e julgamento dos crimes definidos nesta lei". Se o legislador fixou 120 dias (cento e vinte) como prazo razoável para a análise do mérito, em prazo muito aquém disso deve ser realizado o juízo de admissibilidade, tão mais simples.

IV – DO DIREITO SUBJETIVO LÍQUIDO E CERTO DE OBTER CERTIDÃO EM REPARTIÇÕES PÚBLICAS
A violação descrita no tópico anterior não foi a única. A impetrante, percebendo que seu pedido não era impulsionado, peticionou à autoridade coatora com o fim de obter certidão que informasse quais medidas já haviam sido tomadas em relação à denúncia apresentada.
Novamente, o pedido foi encaminhado à Procuradoria-Geral da Assembleia, e restou inerte. A impetrante compareceu àquela Casa Legislativa diversas vezes, mas o documento não lhe foi entregue.
O direito de petição é assegurado pelo art. 5º, inciso XXXIV, da Constituição Federal. A liquidez e certeza do direito estão materializados no próprio pedido, realizado nos seguintes termos: "Requer seja concedida certidão que informe o andamento do feito até a presente data, com esclarecimento dos motivos de eventual paralisação".
Trata-se de um pedido curto, bem delimitado, que visa esclarecer situação de interesse pessoal, mas também, reflexamente, defender direitos – individuais e coletivos. Pretendia-se, pois, instruir o Mandado de Segurança ora impetrado.
Em realidade, a violação exposta neste tópico é apenas a continuação da tratada no item anterior. Ambas estão impregnadas da mesma inércia comissiva.

V – DA NECESSIDADE DE LIMINAR
O art. 7º, inciso III, da Lei 12.016/09 – que disciplina o Mandado de Segurança –, dispõe que o Julgador, ao despachar a inicial, determinará "que se suspenda o ato que deu motivo ao pedido, quando houver fundamento relevante e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida".
Os atos aqui impugnados, em realidade, tratam-se de omissões. Questiona-se a falta de ato, omissão que materializa lesão. Tanto o direito violado pela falta de impulso da denúncia por crime de responsabilidade, quanto aquele negado pela falta de fornecimento da certidão requerida estão expressamente previstos na Constituição Federal. Daí porque estes atos não ameaçam apenas o direito subjetivo e concreto da impetrante, mas causam nódoa à Lei Maior, a qual está no topo de nosso sistema para iluminar todo o restante.
Respaldamo-nos, novamente, na brilhante e completa doutrina de MEIRELLES, WALD e MENDES:
A medida liminar pode ter natureza cautelar ou satisfativa, e visa garantir a eficácia do possível direito do impetrante, justificando-se pela iminência de dano irreversível de ordem patrimonial, funcional ou moral se mantido o ato coator até a apreciação definitiva da causa. [grifei]
E por que não falar em iminência de dano moral? Ou a impetrante experimentaria mero dissabor se constatasse a ineficácia do ordenamento jurídico-constitucional ao qual está submetida? A lei é para todos, ou não é para ninguém.
O pedido protocolado perante o Presidente da Assembleia Legislativa é reflexo direto da personalidade da impetrante, é a construção dessa personalidade, impulsionada pela sua consciência de pertencimento à comunidade política – e politizada. Põe em prática seu direito subjetivo de participação política. Tanto retrata características que lhe são personalíssimas, que foi a primeira a denunciar o Governador do Estado por crime de responsabilidade em razão do parcelamento da remuneração dos servidores públicos do Poder Executivo. Após, apenas mais um cidadão efetuou denúncia com base no mesmo fato. Seria, sim, pessoalmente muito frustrante concluir que o esforço diferenciado foi em vão.
Para corroborar os argumentos recém expostos, invocam-se os ensinamentos de SARLET:
A existência de uma série de direitos especiais de personalidade consagrados textualmente e de forma autônoma no texto constitucional (v.g., no caso da Constituição Federal, os direitos à privacidade, intimidade, honra e imagem) não faz com que a cláusula geral de proteção da personalidade tenha um caráter meramente complementar ou até mesmo simbólico, pois, muito antes pelo contrário, assume a condição de direito fundamental autônomo, destinado a assegurar a livre formação e desenvolvimento da personalidade, a proteção da liberdade de ação individual e a proteção da integridade pessoal em sentido integral e não reduzida às refrações particulares que representam o âmbito de proteção dos direitos especiais de personalidade. Por outro lado, tendo em conta que uma série de dimensões essenciais à dignidade pessoal não foi contemplada (direta e expressamente) no texto constitucional, é preciso ter presente que o direito ao livre desenvolvimento da personalidade e o direito geral de personalidade que dele resulta, sendo "expressão direta do postulado básico da dignidade humana", abarcam toda manifestação essencial à personalidade e o direito geral de personalidade que dele resulta, de modo especial o direito à identidade pessoal e moral. [grifei]
Segundo o respeitabilíssimo autor mencionado, porque a cláusula geral de proteção da personalidade é aberta, entende-se que o rol de direitos especiais de personalidade não é taxativo.
Em tempo, é de se esclarecer que a impetrante não quer aqui o reconhecimento da ocorrência de dano moral. Quer apenas demonstrar que se está na iminência de uma grande frustração que é também pessoal, consistente na percepção da ineficácia do sistema jurídico, no qual, por ora, crê; o qual tem o direito de ver funcionar.
As sucessivas desculpas e promessas advindas da Assembleia Legislativa se fazem sentir como um desrespeito à impetrante, que, conhecedora da lei, detecta o uso da inércia como uma ferramenta para que a denúncia caia no esquecimento, como se fosse um ato inútil ou fantasioso. A impetrante, com muita frequência, tem percebido, através dos comentários de outros cidadãos solidários, a expressão de lástima pela persistência inexitosa. Isso demonstra que o descaso está afetando diretamente a imagem da denunciante, que passa a ser vista como se fosse um Dom Quixote.
Se o sistema é o conjunto de ferramentas pelo qual se busca alcançar a ordem, afrontá-lo equivale a pôr esta ordem em risco, porque um sistema forte é aquele composto de regras que encontram eficácia no plano prático. Considerando que advêm do Estado as linhas do ordenamento, a violação de garantias constitucionais, sobretudo quando decorrentes de atos estatais, denota sempre ameaça ao regime político atual, o democrático. A participação do povo não é apenas "permitida", ela é bem-vinda e essencial. Os direitos fundamentais limitam a atuação do Estado perante os administrados. A cidadania é um direito fundamental e, como tal, deve ser plenamente respeitado.
Quando nem o Estado respeita as linhas que o legitimam, essas diretrizes se enfraquecem. Posteriormente, é o próprio Estado como agora o conhecemos que se enfraquece. Na falta de disposições eficazes, o que vem no lugar ninguém sabe.
Ao protocolar a denúncia por crime de responsabilidade, a impetrante foi muito parabenizada; contudo, em seguida, as mesmas pessoas lhe diziam que a medida não vingaria. O pensamento que toma conta do brasileiro no que diz respeito às tentativas de coibir ilicitudes estatais é o de que "tudo acaba em pizza".
Advogados e demais operadores do direito sabem que nem tudo o que parece "acabar em pizza" aos olhos do cidadão juridicamente leigo de fato foi arquivado por motivos ilegais. A insuficiência probatória, excludentes de ilicitude, e muitos outros institutos do direito autorizam a baixa de processos. O que não se pode admitir, no entanto, é que nem mesmo um ato de arquivamento motivado seja realizado.
"Não vai dar em nada" é o que dizem informalmente as pessoas, já descrentes. Inexiste sintoma mais claro de enfraquecimento do sistema, de descredibilização do Estado, que deveria ser o braço forte a girar este sistema. A impetrante procurou o Poder Legislativo em razão de ato ilícito do Poder Executivo – que, inegavelmente, descumpriu ordem judicial, lesando, de uma só vez, garantias fundamentais de servidores, e o princípio da Separação dos Poderes, praticando ato passível de causar intervenção federal.
O Poder Legislativo silenciou, em verdadeira cumplicidade. Nesse sentido, o ato ilícito praticado pelo Chefe do Poder Executivo também é abarcado na análise da ameaça de ineficácia da medida buscada com o presente Mandado de Segurança. O Poder Executivo já extrapolou os limites legais, mesmo advertido por ordem judicial. A denúncia protocolada almejava rechaçar o que ocorreu. Mas, embora investida de pretensão legítima, até agora não surtiu efeito. O Poder Legislativo não poderia deixar de tomar posição diante de uma ilegalidade originária de outro setor do Poder. O Poder é uno, e todas as três divisões devem zelar pelo seu exercício regular.
O que brota desta inércia é a descrença, cujas raízes ganham mais força a cada dia. Se há quase dois meses o Poder Legislativo se abstém de dar uma resposta ao pedido legítimo e constitucionalmente fundamentado da impetrante, com o Judiciário se espera que seja diferente.
Sem que nenhum "efeito colateral" surja dos atos ilegais de quem ousa desrespeitar o ordenamento, o terreno se torna cada vez mais "propício" às ilicitudes. Os desvios praticados por detentores de poder são ainda mais intoleráveis, porquanto são estes que têm o encargo especial de zelar pela ordem. Perseguir a ordem – e o progresso – é o que os legitima a representar o povo.
Estado é poder. Os agentes estatais têm poder direto e contínuo, têm influência política; dessa forma, o agente que atua dissonante ao sistema representa ameaça real e constante lesão a este.
São objetos deste Mandado de Segurança ilegalidades perpetradas por meio de atos (omissões) estatais, provenientes de onde deveriam emergir apenas atuações que afirmassem a essência do sistema vigente. O desvalor de retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício está gravado no art. 11, inciso III, da Lei 8.429/92 – Lei da Improbidade Administrativa. Pela natureza das omissões objetos deste remédio, portanto, a ineficácia já está ocorrendo, renova-se a cada dia de inércia prorrogada. É a ineficácia do próprio ordenamento. A relevância do fundamento é evidente, pois o que se quer é o respeito às normas que estabelecem processo previsto na Constituição Federal, além de cumprimento de direito fundamental consubstanciado no direito de certidão – de aplicação imediata, sublinhe-se, conforme o §1º do art. 5º da Carta Magna.
É importante acrescentar que os pedidos da impetrante perante o Presidente da Assembleia vêm tendo sua análise postergada desde o dia 1ª de setembro. Estamos quase em novembro, e logo aquela Casa Legislativa entrará em recesso. Também por esta razão, invoca-se a suspensão liminar do ato que deu motivo ao pedido – ou seja, a suspensão da inércia, com o impulsionamento da denúncia –, pelo receio de que a decisão sobrevenha em véspera de recesso, dilatando ainda mais a espera pela eficácia dos direitos constitucionais invocados.

VI – DOS PEDIDOS
Ante o exposto, requer:
Seja deferida a assistência judiciária gratuita à impetrante, tendo em vista sua insuficiência econômica para arcar com as despesas que envolvem a atividade processual, sem prejuízo de seu sustento;
A notificação da autoridade coatora, e do órgão de representação judicial da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, nos termos do art. 7º, incisos I e II, da Lei 12.016/09;
Seja dada vista ao Ministério Público, conforme determina o art. 12 da Lei 12.016/09;
Sejam determinadas, em caráter liminar, a realização dos atos sobre cuja omissão aqui se reclama, quais sejam, o fundamentado juízo de admissibilidade da denúncia por crime de responsabilidade e a expedição da certidão requerida na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul;
Seja fixado um prazo razoável para a realização do juízo de admissibilidade por parte do Presidente da Assembleia, sob pena de multa diária, nos termos do art. 461, §4º, do Código de Processo Civil;
A procedência da presente ação, com a concessão definitiva da segurança.

Termos em que pede e espera deferimento.
Dá-se à causa o valor de alçada: R$ 7.765,00.

Porto Alegre, 26 de outubro de 2015.


Letícia de Souza Furtado
OAB/RS 93.308



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