Manifestações Culturais Populares e Educação – O corpo que tece conhecimentos

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Manifestações Culturais Populares e Educação – O corpo que tece conhecimentos Lucio Bernard Sanfilippo Mestrando em educação pelo Proped/Uerj Resumo

O presente artigo é uma reflexão a respeito do corpo e suas potencialidades educativas, sobretudo quando se pensam as danças populares – e todos os seus universos musicais que não separam corpo, dança e música -, os processos culturais envolvidos nas diversas realidades espaço-temporais em que se dão e as redes educativas que se formam nos e com esses processos. Pensa a inclusão desses caminhos de produção de conhecimentos na Educação Física e na educação formal como uma forma de se valer do afeto e da ludicidade das manifestações para um movimento de horizontalização dos conteúdos, de solidariedade, contribuindo para emancipação social e democratização dos saberes.

Para isso, contamos como principais

interlocutores Boaventura de Souza Santos, Muniz Sodré, Inês Barbosa Oliveira e Paul Gilroy. É um texto que resulta de um trabalho que tem sido desenvolvido há alguns anos em diversos ambientes educativos.

Palavras-chaves: Educação; corpo; danças populares; Educação física; redes educativas, cultura.

Aprendendo com o gesto Quando pensamos em Educação Física, nos vêm logo à cabeça as aulas na quadra da escola ou em uma academia de ginástica, onde os profissionais têm tido ao longo do tempo a função da promoção da saúde e da capacidade física por meio da prática de exercícios e atividades corporais. Musculação, ginástica, artes marciais, atividades desportivas têm sido vistas por muita gente como as únicas que permitam atingir estes objetivos. Mas o trabalho do profissional, sobretudo o do professor, pode ir muito além do aprendizado/ensino dos movimentos e/ou do aperfeiçoamento deles. Vamos saltar as discussões acerca do conceito de saúde, porque elas estimulariam muitos outros artigos, e vamos nos concentrar em outras possibilidades corporais

de

que

atividades

compõem

a

Educação Física. Ao entrarmos em contato com o rico universo das

culturas

populares,

especificamente

das

mais

danças,

percebemos que temos mais que movimentos isolados a trabalhar. São

gestos

geração Figura 1 CPCAC

Oficina de Danças Populares com Lucio Sanfilippo no

a

passados geração

de que

carregam na sua execução todo

um imaginário ligado como numa rede a um sem fim de conhecimentos das mais variadas naturezas. Assim, o profissional pode não só trabalhar com o aprendizado/ensino do movimento, mas com aquele proporcionado por ele. Em outras palavras, em vez de somente ensinar e aprender o gesto, pode-se aprender e ensinar por intermédio dele. Qualquer dança popular que se manifeste traz com ela uma história, um lugar, um jeito, uma marca que representam de alguma maneira a população que a executa e produz. Considerando toda a dinamicidade das culturas, é possível dizer que a população também é afetada pela manifestação, uma vez que, por exemplo, o contato com pais e avós praticantes do Jongo –

manifestação

cultural

de

origem

africana do sudeste brasileiro – em alguma comunidade, influencie o dia a dia da família onde o indivíduo tenha nascido.

Deste modo, uma rede de

conhecimentos se tece e se estabelece, construindo símbolos e significados múltiplos que podem em seus mais singulares fragmentos despertar para os mais plurais caminhos de saberes.

Figura 2 Tambores tradicionais de Jongo

Em se tratando do Jongo mais especificamente que tenho uma relação de aprendizado há alguns inúmeras possibilidades.

Ao nos depararmos com o

F o da Serrinha, com i g anos, apresentam-se u Amassar café, passo r a

tradicional de lá, é impossível não nos remetermos ao ambiente das fazendas 3

de café do Vale do Paraíba, onde os negros vindos de Angola, Congo, Moçambique etc. foram submetidos ao trabalho escravo.

Um gesto que

poderia parecer simples – trabalhado de forma simples pelo professor que não se preocupe muito com as (não) fronteiras dos conhecimentos –, em poucos minutos, já nos transporta para a geografia, para a história e para biologia, só para citar alguns dos saberes que a escola cristalizou como importantes para os currículos formais. O Jongo, o Coco, o Maracatu, o Tambor de Crioula, o Frevo, o Samba, o Maxixe, o Boi, e tantas outras manifestações culturais, que têm sido evidentemente desenvolvidas, em sua maioria, pelos negros que foram escravizados ou por seus descendentes – ou modificadas por eles, como no caso da Ciranda que veremos à frente - acontecem por todo o território brasileiro, independentemente da visibilidade que a mídia e a educação formal lhes dão. Elas revelam processos educativos que se desenvolvem nas ruas, nas casas, nas praças, nas comunidades, nas cidades. “As músicas e danças africanas transformavam-se, perdendo alguns elementos e adquirindo outros, em função do ambiente social” (SODRÉ, 2007, p.13). Nas transformações de que nos fala Muniz Sodré, estão envolvidos incomensuráveis saberes.

É

preciso que se lhes reserve um espaço para estudo e possível inclusão nos debates dentro do ambiente escolar. As pesquisas com as danças populares

podem render surpresas muito agradáveis aos profissionais que busquem diversificar suas atividades.

Os saberes envolvidos nas manifestações

culturais são incomensuráveis e qualquer recorte pode gerar produção de conhecimentos que a Educação Física e a educação formal não devem ignorar. Ainda mais se levarmos em consideração que a comunidade que frequenta a escola é a mesma que produz esses saberes – e é produzida por eles também – e vai poder cada vez mais se enxergar na escola, criando e resgatando laços que só facilitarão os processos de inclusão social e construção de cidadania.

A Dança do Trabalho Muitas das danças populares surgiram em meio ao trabalho executado. Agradecendo, amenizando, comemorando, durante, antes ou depois, o ritmo e as melodias constituem-se parte importante da atividade e marcam um território no tempo – e vice-versa -, porque, como bem nos fala Muniz Sodré (2007), “(...) música não se separa de dança, corpo não está longe da alma, a boca não está suprimida do espaço onde se acha o ouvido.” Paul Gilroy, a respeito do potencial comunicativo dessa música que não se concebe isolada, nos adianta que “A música, o dom relutante que supostamente compensava os escravos, não só por seu exílio dos legados ambíguos da razão prática, mas também por sua total exclusão da sociedade política moderna, tem sido refinada e desenvolvida de sorte que ela propicia um modo melhorado de comunicação para além do insignificante poder das palavras – faladas ou escritas.” (GILROY, 2012, p.164)

No nordeste brasileiro, existe o coco, muito comum em tantos estados da região.

Segundo algumas coquistas1 como Beth de Oxum2, o coco é

manifestação nascida nos quilombos. Ela, inclusive, em inúmeras conversas informais, cita Palmares como um lugar de referência para o “nascimento” do coco.

1

Antônio Nóbrega, cantor e pesquisador, conta essa história em seu

Coquista – como se chamam as pessoas que cantam o coco. Beth é casada com Quinho Caetés e tem uma Sambada de Coco em Guadalupe, Olinda-PE, onde fazem o coco de umbigada, um estilo de coco. 2

programa Danças Brasileiras3 apresentado no Cança Futura.

Assim como o

jongo, o coco é um ritmo que amenizava o trabalho. Enquanto se quebravam os cocos, batendo palmas e as cascas umas nas outras, cantava-se. Diz ela, a Beth de Oxum, que, depois de libertos, os praticantes puderam acrescentar outros instrumentos como ganzá, zabumba, caixa, atabaques, alfaias etc., e o coco ganhou sotaques4 variados em cada região onde se estabeleceu. De roda, de umbigada, de embolada, de trupe, o coco é expressão negra, brasileira, rica em nuances: o de roda canta cantigas curtas de respostas fáceis para a roda responder ao canto do coquista; o de umbigada preza essa característica de muitas Figura 4 Apresentação de Lucio Sanfilippo com a Cia de Aruanda na Rio + 20

manifestações brasileiras, como o samba-de-roda do Recôncavo, o

tambor de crioula ou o jongo do sudeste, que é o momento da dança em que os umbigos se encontram; o de embolada é quase um trava-línguas, quase sempre de improviso; o de trupé5é famoso em Pernambuco e também em Alagoas. Em Arcoverde-PE, dança-se de tamancos e em comunidades de Maceió-AL, dança-se com sapatos.

A peculiaridade é que se conta nas

comunidades que o trupé nasceu da solidariedade, para, sapateando, ajudar a “assentar” o chão de barro da casa do vizinho. Conquistas políticas foram conseguidas nos universos do coco.

As

Quebradeiras de coco babaçu – que quando cantam denominam-se Encantadeiras6 - são exemplo disso. Organizadas – são mais de 300 mil - , criaram cooperativas e ganharam na Justiça o direito de extrair o coco em terras cercadas, já que, por algumas gerações, suas famílias sobrevivem do artesanato, da produção de cosméticos, do trançado de palhas, onde tudo se aproveita. A palmeira do babaçu demora 96 anos para crescer dar fruto e não daria tempo de plantar e colher ainda nesta vida.

3

Aqui se pode conferir https://www.youtube.com/watch?v=Q871ol8aUKU Sotaque – nesse caso, como se chamam os estilos de coco. 5 Trupé – corruptela de tropel, que no contexto do coco significa um estilo de sapateado. 6 Entrevista https://www.youtube.com/watch?v=25yJOcmIMpc 4

Estas são apenas algumas informações depreendidas dos universos da manifestação coco. Há muitas outras que conheço e desconheço e que estão neste

momento

sendo

tecidas,

redimensionadas

e

que

podem

ser

compartilhadas junto com os gestos que envolvem a dança e a música desses verdadeiros complexos culturais.

Conhecimentos como estes normalmente

não são divulgados nas grandes mídias e nem aproveitados como exemplos de emancipação pela educação formal e oportunidade de democratização dos saberes, estímulo à sua horizontalidade.

A respeito desses dois últimos,

principalmente, Inês Barbosa de Oliveira, em seu livro Boaventura & a Educação, nos ajuda a pensar: “É preciso deixar claro que a democratização dos saberes não é apenas a democratização do acesso a determinados saberes sistematizados e estruturados numa ordem reconhecida, que podem funcionar como auxiliares tanto na compreensão da realidade social como na melhoria da respeitabilidade social, em função do valor que é socialmente atribuído a esses saberes, mas também, e sobretudo, a democratização das relações entre os diversos saberes chamados ‘não formais’, ‘cotidianos’, ou do ‘senso comum’ que integram nossas competências de ação social e que podem nos permitir pensar processos de tessitura do conhecimento-emancipação, ligado à ideia de solidariedade (grifo meu) e as formas de relacionamento social fundadas não na ordem e na hierarquia, mas em possibilidades de criação de uma ‘ordem’ social autoorganizada, a partir de processos de negociação mediados por relações de autoridade partilhada.” (OLIVEIRA, 2008, p.128)

Boaventura de Souza Santos (2010, p.32), para auxiliar nossa discussão, diz que alguns conhecimentos são produzidos mesmo como inexistência. “Tudo aquilo que é produzido como inexistente é excluído de forma radical porque permanece exterior ao universo que a própria concepção aceite de exclusão considera como sendo o Outro”, escreveu ele a respeito do pensamento ocidental que ele denomina abissal e sobre que ele discorre em Epistemologias do Sul (SANTOS, 2010, p32).

Precisamos atentar para a

existência de saberes tecidos em redes que estão fora do que considera como realidade esse pensamento hegemônico de que nos fala o sociólogo português. Essa separação do que realmente importaria estudar e o que é desconsiderado, do que seja ciência e o que é senso comum, parece-me, afeta diretamente o corpo como produtor de conhecimentos, como criador de

memórias e como templo de linguagens. Digo isso, porque esse corpo que brinca nas manifestações corporais, que conta histórias, que toca instrumentos, que dança e canta não tem tido muito espaço na educação formal a partir de um certo período no ensino fundamental até a pós-graduação. Quanto tem sido deixado de lado, talvez porque não se considere como relevante, como realidade, como existência, esse corpo que enreda saberes? A propósito, a Educação Física na escola, muitas vezes, não tem tido ao longo dos tempos o mesmo valor que as demais disciplinas. Costuma-se dar mais importância a conteúdos de matemática e língua portuguesa, física, química e biologia, e à Educação Física se reserva o espaço para que os alunos gastem energia e “descansem a mente” para deixá-la pronta aos saberes considerados mais essenciais à educação e formação do indivíduo. Assim, pouco valorizado, fica o corpo também pouco aproveitado enquanto teia de saberes e tessitura de conhecimentos. Perde-se ao não se aproveitar o que podem gerar as atividades culturais que envolvem esse corpo em várias instâncias dos cotidianos dentro e fora do ambiente formal de ensino.

Afetos que se enredam Trabalhando com as danças populares há cerca de 15 anos, tenho percebido um fator intrínseco que constitui-se forte aliado: a ludicidade. Com ela, emergem, muitas vezes, sentimentos que remetem à infância e o ambiente se torna propício à produção e troca de conhecimentos pelo afeto que se estabelece. Não raro, os sorrisos se desenham nos rostos dos praticantes e a festa, que qualquer brincadeira infantil tem como característica, toma de novo seu lugar nas ações cotidianas de que tenha-se distanciado seja lá por que motivo. O movimento dos corpos pode ser trabalhado de forma a desvelar uma série de formações e informações que envolvem as manifestações culturais. Quando se dança, contam-se histórias, cantam-se as críticas, tocam-se as lutas, festeja-se a comunidade. É o que acontece com a ciranda, uma das danças que mais considero potentes em afeto.

A

ciranda

é

manifestação

de

agradecimento. de

mãos

À beira-mar,

dadas,

pessoas

celebram a pesca farta e agradecem,

inclusive,

pela

volta do pescador com vida. Levantando os braços, pés indo e vindo como as ondas do mar, canta-se e dança-se a

Figura 5 Ciranda na Oficina de Danças Populares Lucio Sanfilippo no CPCAC

vida da comunidade. Contam os brincantes que essa manifestação veio da Europa, dos campos, da colheita da azeitona em Portugal, e aqui no litoral foi redimensionada, recriada.

A geografia influencia a história – o contrário

também é corrente - e, hoje, no Brasil, o mar é tema constante na ciranda cujo mote, antes, era o campo.

Em Pernambuco, Itamaracá, terra de Lia7

cirandeira, a ciranda tem contornos negros e adereços indígenas que modificaram aquela que veio com os portugueses. Tem bumbo, ganzá, metais e caixa e a batida desta última, desconfio, traz traços do agueré, complexo cultural que envolve toque, dança e festa dos candomblés brasileiros que estou pesquisando no Mestrado no Proped/Uerj. O professor Muniz Sodré (2007, p.21), mais uma vez, nos fortalece as ideias, contando que “todo som que o indivíduo humano emite reafirma a sua condição de ser singular, todo ritmo a que ele adere leva-o a reviver um saber coletivo sobre o tempo, onde não há lugar para a angústia, pois o que advém é a alegria transbordante da atividade, do movimento induzido.”. Alegria e saber coletivo andam de mãos dadas na ciranda das manifestações populares. Tocando, cantando e dançando, corpos mostram-se nos tempos e nos espaços, revelando maneiras de viver e se organizar no mundo, a despeito da consideração dos pensamentos abissais ocidentais já abordados antes sob as a palavras de Boaventura (2010). Na ciranda praieira de Lia de Itamaracá, ninguém é diferente de ninguém quando, de mãos dadas, entra-se na roda. Todos ficam iguais, e não tem primeiro nem último, mais ou menos importante. Celebrar e agradecer é a 7

Lia de Itamaracá – cirandeira merendeira, eternizada nos versos “essa ciranda quem me deu foi Lia, que mora na Ilha de Itamaracá”.

ideia principal. Balançar imitando as vagas do mar, cantando as belezas e as tristezas do cotidiano é a onda que importa. Afinal, como nos diz Simas (2014, p. 37), “nós somos herdeiros dos homens que bateram tambor na fresta e criaram a subversão pela festa”. A despeito das tristezas da escravidão, produziram-se alegrias que os corpos hoje cantam, dançam e tocam nas manifestações culturais espalhadas pelo Brasil. Quando a escola e a academia vão trazer isso oficialmente para seus ambientes e festejar coletivamente essas vitórias? Quando esse afeto e essa ludicidade serão aproveitados efetivamente pelos universos da educação formal em nosso país?

Algumas experiências educativas com as Danças Populares

Em 2001, ainda graduando em Licenciatura Plena Educação Física no Laboratório de Culturas Populares e Folclore do Instituto de Educação Física e Desportos – IEFD - da UERJ, aprovei um projeto que trabalhava com as festas cíclicas brasileiras, como carnaval e festas juninas. Tínhamos como público os seguranças recém-concursados do campus da UERJ e alunas da UnATI8. O trabalho era centrado no coco e na ciranda e a receptividade era emocionante. Ainda hoje, encontro com alguns seguranças pelo Campus, que lembram com felicidade, quase 15 anos depois, dos encontros, não raro, pergutando: “como vai o coco, professor?”. Em seguida, iniciamos uma oficina de jongo dentro do horário da aula de capoeira que já acontecia efetivamente no IEFD. Lá, contávamos com cerca de 40 alunos, entre estudantes da UERJ e extra-muros9. Acabou minha bolsa e continuei dando aula por mais dois anos, por pena de terminar com a turma cheia. Quando os horários não me permitiram mais continuar com a oficina no Instituto, fundamos – inicialmente com Vanusa de Melo e Dario Firmino, hoje comigo tocando sozinho o projeto - a Oficina de Danças Populares que já levou jongo para a Argentina e para o Haiti, para Belém do Pará e ciranda para Araputanga-MT numa cooperativa de produtores de leite, só para citar alguns 8 9

UnATI - Universidade da Terceira Idade. Extra-muros – frequentadores - não alunos da UERJ - de diversas comunidades.

exemplos, e funciona até hoje, passeando pelo estado do Rio de Janeiro e pelos espaços e tempos escolares e extra-escolares. Sempre numa perspectiva de unir o gesto, a ludicidade, o afeto aos conteúdos mais ricos que envolvem e transbordam das manifestações, o trabalho com as danças tem sido da mais alta receptividade.

Até em pós

gradução na Argentina, inclusive, na Universidade de Santo Andrés, em Buenos Aires, trabalhei a aura lúdica e a riqueza das culturas populares, que tem gerado debates prósperos. Em Buenos Aires, há a Funceb, Fundación Centro de Estudios Brasileños, que tem parceria com a referida Universidade e estuda nossa cultura. Essa aula na pós-graduação em Buenos Aires, é um desdobramento do convite que recebi em 2008, por Teresa Salgado10, para pensar uma ementa para a pós-graduação em africanidades que ela criara na Atlântica Educacional. Montei, então, o módulo Expressão Corporal e Musicalidade – um diálogo África-Brasil, que foi uma experiência de riqueza incomensurável com professores e profissionais das mais diversas áreas, cujo trabalho, hoje, tem influência das danças e dos universos populares. Na moda, em sala de aula, em apresentações artísticas, esses saberes estão sendo democratizados, valorizados, redimensionados, atestando sua riqueza e aplicabilidade nos processos educativos.

Conclusão Exemplos são muitos de como esses saberes tecidos em redes nos mais variados espaços e tempos podem contribuir para a emancipação e democratização dos conhecimentos. Evidências são também abundantes de que o corpo que se expressa cantando, dançando, tocando instrumentos guarda uma memória, é tempo e espaço de processos culturais e educativos. Aos educadores, cabe pesquisar de que forma trazer os sujeitos e as produções culturais para os universos educativos, explorando como são tecidos nas miudezas dos cotidianos esses modos de organização, essas 10

Maria Teresa Salgado Guimaraes da Silva é doutora em Letras Vernáculas e professora da UFRJ. Ela mantinha uma pós-gradução ÁFRICA E BRASIL: LAÇOS E DIFERENÇAS – Convênio UCP/Atlântica Educacional.

maneiras de estar no mundo, que têm colorido de festas as vidas dos povos pelo Brasil afora através dos tempos. A festa pode e deve voltar oficialmente à escola, diariamente, nas redes e laços, nos pequenos momentos, nos mais módicos lugares. A Educação Física tem um papel fundamental na pesquisa e valorização dos processos educativos que utilizam de forma incisiva o corpo que brinca e aprende/ensina cantando, dançando e percutindo instrumentos.

E precisa

voltar com carinho seus olhos para as manifestações culturais, como mais um leque de possibilidades a serem trabalhadas em seus conteúdos. Apontando os benefícios de sua pesquisa para a educação como um todo, ela ganha a visibilidade e o respeito da escola formal. A escola e a comunidade precisam dançar de mãos dadas a ciranda que celebra e agradece, que coloca lado a lado os conhecimentos, que não separa primeiro de último, que não discrimina os dedos que se entrelaçam em agradecimento. É girando juntos que os sorrisos ganham os rostos e os afetos multiplicam-se, compartilham-se e as energias são renovadas. É na roda que podemos trabalhar com alegria para que as diferenças não gerem desigualdades. Temos muito a ganhar, se a escola reencontrar a ludicidade de seus primeiros momentos, aqueles da educação infantil, em que a brincadeira era valorizada como tempo e espaço de aprendizagem/ensino e permitir que os corpos vivam sua plenitude, comemorando sua vocação de templo de saberes. Quem sabe assim, a comunidade possa se estender na escola, e a escola possa, de maneira mais efetiva, refletir essa comunidade, junto com ela, dançando e cantando as alegrias, resolvendo as demandas, acolhendo as críticas e necessidades e celebrando a vida cotidianamente.

Bibliografia

GANDRA, Edir. Janeiro:

Jongo da Serrinha: Do terreiro aos palcos. Rio de

GGE – Giorgio Gráfica e Editora/Uni-Rio, 1995

GIFFONI, Maria Amália Corrêa. Danças Folclóricas Brasileiras e suas Aplicações Educativas. São Paulo: Ed. Melhoramentos, 1964 GILROY, Paul. O Atlântico Negro: modernidade e dupla consciência. São Paulo. 2 ed. Rio de Janeiro: Universidade Candido Mendes, Centro de Estudos Afro-Asiáticos, 2012. MAURÍCIO, Ivan, CIRANO, Marcos, ALMEIDA, Ricardo de. ARTE POPULAR E DOMINAÇÃO O caso Pernambuco. Recife: Ed. Alternativa, 1978. OLIVEIRA, Inês Barbosa de. Boaventura & a Educação. 2. Ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2008. RIBEIRO, M. de Lourdes Borges. O Folclore na Escola - Cadernos de Folclore 5. Mec 1976 SANTOS, Boaventura de Souza. Para além do pensamento abissal: das linhas globais a uma ecologia de saberes. In SANTOS, Boaventura de Sousa e MENESES, Maria Paula. Epistemologias do Sul. São Paulo: Cortez, 2010 SANFILIPPO, Lucio Bernard. Interdisciplinando a Cultura na Escola com o Jongo. Rio de Janeiro: Editora Multifoco, 2010. SIMAS, Luiz Antonio. Pedrinhas Miudinhas: ensaios sobre ruas, aldeias e terreiros. Rio de Janeiro: Mórula Editorial, 2013. DANÇAS

BRASILEIRAS



https://www.youtube.com/watch?v=Q871ol8aUKU

Canal

Futura

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