MAPAS, MEMÓRIAS E MENTES: ESPAÇO, TEMPO E CONHECIMENTO NAS AÇÕES HUMANAS / FASCÍCULO 3 - MENTES: NAS MÃOS DE QUEM PROCURA CONHECIMENTO ESTÁ O MUNDO

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MAPAS, MEMÓRIAS E MENTES:  espaço, tempo e conhecimento nas ações humanas

MENTES nas mãos de quem procura conhecimento está o mundo

Fortaleza, 2008

Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva Ministro da Educação Fernando Haddad Secretária de Educação Básica Maria do Pilar Lacerda Almeida e Silva Diretora do Departamento de Políticas da Educação Infantil e Ensino Fundamental Jeanete Beauchamp Coordenadora Geral de Políticas de Formação Roberta de Oliveira Coordenadora do Humanas Núcleo de Estudos e Pesquisas em Educação Continuada para as Humanidades Maria Neyara de Oliveira Araújo Universidade Federal do Ceará (UFC) Reitor Prof. Ícaro de Souza Moreira Comitê Gestor Humanas Profa. Dra. Maria Neyara de Oliveira Araújo [email protected] Prof. Dr. José Aires de Castro Filho [email protected]

Milena Marcintha Alves Braz Joannes Paulus Silva Forte Adalberto Ximenes

MAPAS, MEMÓRIAS E MENTES:  espaço, tempo e conhecimento nas ações humanas

MENTES nas mãos de quem procura conhecimento está o mundo

Gráfica Editora R. Esteves Tiprogresso Ltda. Fortaleza, 2008

Projeto Gráfico Alfredo Jr. Capa Georgia Cruz e Deise Pequeno Ficha Catalográfica Francisca Danielle Guedes Gráfica e Editora Tiprogresso

B794m Mapas,memóriasementes:espaço,tempoeconhecimentonasaçõeshumanas. Fascículo 3 – Mentes: nas mãos de quem procura conhecimento está o mundo./ Milena Marcintha Alves Braz, Joannes Paulus Silva Forte, Adalberto Ximenes. – Fortaleza: Tiprogresso, 2008. 40p.

Inclui bibliografia. ISBN 978 - 85 - 98766 - 27 - 0

1. Sociologia da educação 2. Mente, pensamento e ideologia 3. Educação e ação docente 4. Educação, complexidade e interdisciplinaridade 5. Educação e novas tecnologias I - Título CDD 370.19

Apresentação........................................................................................................................... 8 1

A mente e o pensar........................................................................................................... 9

1.1 Os tipos de pensamento............................................................................................... 11 1.2 Como se formam as mentes......................................................................................... 12 1.3 Mentes e ideologia........................................................................................................ 16 2 A PRODUÇÃO SOCIAL DAS MENTALIDADES...................................................... 19 2.1 Alteridade e educação: por um currículo baseado no contexto............................. 20 2.2 Superar o etnocentrismo para formar as novas gerações........................................ 24 2.3 A profissão de professor: ação docente para a mudança das mentalidades........ 28 3 APRENDIZAGEM E COMPLEXIDADE..................................................................... 31 3.1 Como pensar educação e complexidade?.................................................................. 32 3.2 Como pensar a interdisciplinaridade?....................................................................... 34 3.3 Como pensar as novas tecnologias?........................................................................... 36 4

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................................. 38

Apresentação Este texto foi escrito a seis mãos. São três alunos dos cursos de Pós-Graduação em Sociologia e em Filosofia, da Universidade Federal do Ceará. Diferentes estilos, tendo, entretanto, em comum, uma lição bem aprendida de Marx: “Os filósofos limitaram-se a interpretar o mundo de distintos modos, cabe transformá-lo”. O que estes três jovens pretendem com suas reflexões é encontrar, junto aos professores da escola básica, um modo de transformar a educação para as gerações mais novas.

A mente e o pensar

Milena Marcintha Alves Braz* Há já algum tempo eu me apercebi de que, desde meus primeiros anos, recebera muitas falsas opiniões como verdadeiras, e de que aquilo que depois eu fundei em princípios tão mal assegurados não podia ser senão mui duvidoso e incerto; de modo que me era necessário tentar seriamente, uma vez em minha vida, desfazer-me de todas as opiniões a que até então dera crédito, e começar tudo novamente desde os fundamentos, se quisesse estabelecer algo de firme e de constante nas ciências. (DESCARTES, 1973) “Penso, logo, existo”. Associada ao nome do filósofo francês René Descartes, a afirmação anterior é bem conhecida por todos nós e denota a possibilidade da existência humana através da atividade mental, do pensar. O filósofo, para concluir a sentença, ponderou sobre várias dúvidas existenciais que, segundo registro da história, ocorreram num processo angustiante que o levou a concluir que, se poderia duvidar de questões pertinentes à sua existência enquanto um ser físico, ou ainda, refletir sobre suas próprias dúvidas, ele existia. Segundo Elias (1994, p. 83), chega-se aí ao cerne de uma forma peculiar de autoconsciência: as percepções sensoriais, e, portanto, o conhecimento dos objetos físicos, inclusive o próprio corpo, tudo é duvidoso e ilusório. Se, em duvidar, compreendemos melhor a realidade em que vivemos, então poderíamos tomar como ponto de partida a seguinte premissa: “Existo, logo, duvido”. O “pensar”, neste caso, está associado à atividade humana que garante a existência dos homens em sociedade. Raciocinando assim poderíamos associar “mentes” a várias outras palavras:

Bacharel em Ciências Sociais pela Universidade de Fortaleza (UNIFOR), socióloga, mestre e doutoranda em Sociologia pela Universidade Federal do Ceará (UFC), tutora da área de Ciências Sociais do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Educação Continuada para as Humanidades (HUMANAS-UFC-REDE-MEC) e professora da Faculdade Integrada da Grande Fortaleza (FGF). Endereço eletrônico: milena@virtual. ufc.br. *

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MENTALIDADES IDÉIAS IDEOLOGIAS IDEAIS CONHECIMENTOS PENSAMENTOS SABERES CRENÇAS VALORES SENTIMENTOS CULTURAS SOCIEDADES CLASSES ESPAÇOS PODERES TEMPOS RESISTÊNCIAS UTOPIAS HISTÓRIAS MÍOPES MENTAIS Sem perder de vista estas associações, iremos agora pensar sobre outros significados atribuídos à palavra “mente”. Para isto, recorremos ao dicionário Aurélio Buarque, que descreve o significado de “mente” remetendo à “inteligência, espírito, pensamento, concepção, imaginação, intuito, tenção”. Percebemos que a “mente” está muito ligada à racionalidade, ou seja, à faculdade que o homem possui de “pensar” sobre as coisas. Segundo o referido dicionário, “pensamento” significa, “ato ou efeito de pensar, faculdade de pensar logicamente, poder de formular conceitos, o produto do pensamento; idéia, mente, recordação, lembrança, MENTES: nas mãos de quem procuraconhecimento está o mundo

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modo de pensar; opinião, etc.” Vimos também, na citação anterior a possibilidade do homem questionar sobre sua forma de pensar e assim direcionar esta atividade para que se torne mais eficiente a ponto de promover mudanças no próprio homem. A elaboração de novas formas de viver será respaldada pelos registros que estes homens possuem na memória, igualmente impulsionada pela imaginação e pelo desejo, que são inerentes à natureza humana. Por meio da associação de pensamentos o homem é capaz de inovar. Quem compreenda quais são as melhores maneiras de pensar e porque são melhores, mudará, se quiser, as suas próprias maneiras até que se tornem mais eficientes, isto é, até que executem melhor o trabalho de que é mais capaz o pensamento do que qualquer outra operação mental. (DEWEY, 1959, p. 13).

Poderíamos agora formular o seguinte questionamento: haveria uma “boa receita” para o pensar? Como “pensar” da melhor forma? 1.1 Os tipos de pensamento John Dewey (1959, p. 14) descreve alguns processos mentais ocorridos nas mentes dos seres humanos os quais designamos “pensamento”. Trata-se de um processo mental automático e desregrado, no curso desordenado de idéias onde entra “tudo aquilo que se passa pela cabeça”, ou seja, tudo que pensamos durante o sono através dos sonhos. Ou, em estado de vigília, onde também sonhamos, construímos castelos, viajamos, compramos um carro, assim como, outras vezes, nos deixamos levar por correntes mentais caóticas, medos, fobias, melancolias etc. O autor descreve pensamento também como “imaginação”, algum acontecimento que não presenciamos, mas ouvimos falar e aí imaginamos como sucedeu. Existe aí um traço inventivo, criado por nossas mentes, algo distinto da observação. Neste caso, o ato de pensar aplica-se a coisas não sentidas ou diretamente percebidas pelos sentidos, a coisas que não são vistas, ouvidas, tocadas, cheiradas, nem provadas (DEWEY, 1959, p. 15). Um terceiro sentido atribuído ao pensamento é a “crença”. Consiste esta numa idéia que já recebemos pronta de nossos antepassados. Nas palavras do autor, “uma crença refere-se a algo além de si própria, por onde se aquilata o seu valor: faz uma afirmação sobre algum fato, algum princípio ou lei. Significa que determinado fato ou lei é aceito ou rejeitado, que é algo de próprio a se afirmar ou, pelo menos, aquiescer” (DEWEY, 1959, p. 13). A presente discussão nos orienta para uma compreensão de que através de nossas “mentes” somos capazes de formular diversos tipos de pensamentos, de compreensões sobre a realidade vivida. Assim, se são várias as formas segundo as quais podemos formular sobre representações a respeito do nosso mundo vivido, interessanos refletir sobre qual a melhor forma de pensar para que isto resulte positivamente em nossas vidas. Dewey, ao descrever as formas mentais relativas à imaginação e à crença, acrescenta que a maneira que acredita ser mais proveitosa para se pensar, é o que ele denomina “pensamento reflexivo”, que é uma “espécie que consiste em examinar mentalmente o assunto e dar-lhe consideração séria e consecutiva”. Adverte, porém, que, existem algumas semelhanças entre o pensamento reflexivo e os demais, sendo que, o primeiro diferencia-se dos outros, devido a este envolver raciocínio lógico, questionamentos e pesquisas. Em suas palavras defende que “o pensamento reflexivo faz um ativo, prolongado e cuidadoso exame de toda crença ou espécie hipotética de conhecimento, exame efetuado à luz dos argumentos que a apóiam e das conclusões a que chega” (DEWEY, 1959, p. 18). Nas comparações efetivadas pelo autor, ele acrescenta que, no primeiro caso, “tudo aquilo que passa pela cabeça”, ou seja, a sucessão de coisas pensadas, que não tem necessariamente uma ordem ou fim, contém semelhanças com o “pensamento reflexivo”, no que concerne a um curso fortuito de coisas através do espírito, “porque

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também consiste em uma sucessão de coisas pensadas; mas a diferença é que não basta a mera sucessão irregular ‘disto ou daquilo’” (DEWEY, 1959, p. 14). A reflexão é uma conseqüência, e não uma seqüência, havendo uma ordem consecutiva em que cada idéia engendra a seguinte como seu efeito natural e, ao mesmo tempo, apóia-se na anterior ou refere-se a esta. Em segundo lugar, o autor faz a distinção entre o “pensamento reflexivo” e a “imaginação”, a qual se dá porque o primeiro “traz um propósito situado além da diversão proporcionada pelo curso de agradáveis invenções e representações mentais. Esse curso deve conduzir a algum lugar; deve tender a uma conclusão possível de constituir uma substância exterior à corrente de imagens” (DEWEY, 1959, p. 15). As crenças são, para o autor, as mais fáceis de tornarem-se “pensamentos reflexivos”, pois elas “envolvem precisamente essa realização intelectual e prática1; e, por conseguinte, cedo ou tarde, requerem investigação a fim de se descobrirem as bases em que repousam” (DEWEY, 1959, p. 17). O autor nos leva a concluir que a melhor forma de pensar é adotando uma postura reflexiva, perseguindo o questionamento de nossas crenças, ou seja, duvidando daquilo que nos foi passado como verdades, e nunca ousamos desconfiar. Ou, mesmo questionando, não fomos buscar as bases de prova para crer, ou não, naquilo que nos foi ensinado. 1.2 Como se formam as mentes Até agora, vimos sobre os significados atribuídos à palavra “mente”, bem como, sobre as formas de “pensamento” designadas por John Dewey. Através da nossa leitura, podemos deduzir então, que os seres humanos são capazes de pensar, articular signos, unir representações a outras, e criar novas coisas, a partir da razão, e, assim, tomar decisões, realizar ações. Partindo desta afirmativa, faz-se oportuno acrescentar que estes seres pensantes existem e existiram, em todos os cantos do universo e em todos os períodos. Outra questão relevante para nossa discussão é considerar, que, estes indivíduos são introduzidos na arte de pensar desde seu nascimento. MENTES: nas mãos de quem procuraconhecimento está o mundo

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A partir deste ponto, nossa reflexão sobre os modos e as formas do conhecimento poderá tomar dois caminhos: um pelo qual seríamos guiados mais diretamente por Jean Piaget (1971) e a sua Psicologia Genética, e outro mais recortado pelas diferentes trilhas das diversas abordagens das Ciências Sociais. Seguiremos pelo segundo caminho. Antes, porém, queremos chamar sua atenção, caro professor, para a importância das pesquisas de Piaget (1971) e para a contribuição fundamental que as mesmas podem oferecer no seu trabalho diário com os estudantes.

1 O autor utiliza esta afirmação em contraposição às duas formas anteriores “tudo que passa pela cabeça” e a “imaginação”, pois, para ele, “o pensamento nos dois primeiros sentidos mencionados, pode ser prejudicial ao espírito, desviando a atenção do mundo real, redundando, muitas vezes, em perda de tempo. Por outro lado, se é com moderação que nos entregamos a tais pensamentos, é bem provável que nos causem um legítimo prazer, que nos sejam, mesmo, uma necessária recreação. Mas que, em nenhum dos dois casos, ousem pretender à verdade; que não se intitulem algo que a mente deva aceitar, afirmar e adotar como base de ação. É possível que constituam uma realização emocional, nunca, porém, intelectual e prática” (DEWEY, 1959, p.7).

A epistemologia genética criada por Piaget (1971) é uma matéria interdisciplinar que se ocupa com todas as ciências. Assim, não chega a ser uma disciplina filosófica, como a epistemologia tradicional, uma vez que se afasta da especulação, tendo estudado a gênese das estruturas e dos conceitos científicos, tal como de fato se constituíram em cada uma das ciências. Além disso, esses estudos procuraram desvendar os processos fundamentais de formação do conhecimento na criança por meio da experimentação, realizada nas situações de simples constatação de fatos concretos até as mais altas abstrações. Preocupado com a teoria do conhecimento, Piaget (1971) observa as características do pensamento infantil, construindo a noção de egocentrismo que, sem dúvida, irá nos servir para a compreensão de diversos fenômenos da ordem cultural. O egocentrismo implica a noção de centração e descentração, isto é, a capacidade da criança de considerar a realidade externa e os objetos como diferentes de si mesma e de um ponto de vista diverso do seu. O egocentrismo na linguagem infantil implica a ausência da necessidade, por parte da criança, de explicar aquilo que diz, por ter certeza de estar sendo compreendida. Trata-se de um pensamento pré-lógico, pré-causal, mágico, animista e artificialista. Para Piaget (1971), a construção do mundo objetivo e a elaboração do raciocínio lógico consistem na redução gradual do egocentrismo, em favor de uma socialização progressiva do pensamento. Somente com a descentração das noções é que a criança pode chegar ao estágio da lógica operacional, assim como chegar ao nível do julgamento moral. Ou seja, a princípio, a moral é dirigida de fora, passando a autônoma na medida em que a criança, ao sair do seu egocentrismo, compreende a necessidade da justiça equânime e da responsabilidade individual e coletiva, independentes da autoridade ou da sanção imposta. Apresentamos essa pequena digressão em torno do pensamento de Jean Piaget (1971) a fim de conduzirmos a reflexão para o objetivo desse texto, o qual faz parte de uma trilogia em que pretendemos apresentar ao professor algumas questões sobre o “estar no mundo”, partilhando mapas, memórias e mentes. A trilogia caracteriza-se por ser uma produção coletiva e interdisciplinar, cujo significado é motivar, entre os professores de educação básica, o desejo pela reflexão sobre o “fazer histórico”, ato fundamentalmente humano, o qual implica na conjunção espaço-tempo-conhecimento – MAPAS, MEMÓRIAS E MENTES. Estamos nos encaminhando agora para uma reflexão sobre as mentalidades, em sentido sociológico (mentalidade não mente...), ou seja, com a intenção de indicar as atitudes, as disposições e os comportamentos institucionalizados em grupo e adaptados para caracterizar o próprio grupo. Neste sentido é que se diz, por exemplo, a mentalidade brasileira, a mentalidade primitiva, a mentalidade burguesa, história das mentalidades etc. A rigor, queremos pensar sobre a construção social da realidade, partindo da seguinte questão: é possível a vida social sem pressuposições compartilhadas entre os membros de uma sociedade? Os sociólogos Peter Berger e Thomas Luckmann (1986) examinaram o conhecimento do senso comum, ou seja, aquilo que os indivíduos tomam como real, e destacaram

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que a percepção desses fatos “óbvios” da realidade social pode diferir entre pessoas de culturas diferentes, e até mesmo, entre pessoas diferentes de uma mesma cultura. A tarefa da pesquisa na ciência social será analisar os processos pelos quais os indivíduos percebem o que, no real, é real para eles. E não será de fundamental importância, na tarefa dos professores, a compreensão desse fenômeno? Esta compreensão nos dá subsídios, para formular as seguintes indagações: 1) Como é formado o pensar dos indivíduos? 2) Como se formam as “mentes”? Para Norbert Elias (1994) o indivíduo só se constitui enquanto tal, na relação com a sociedade em que vive. É na inter-relação em sociedade, que os homens formam suas idéias, influenciados pelas representações já existentes na sociedade: Ao nascer, cada indivíduo pode ser muito diferente, conforme sua constituição natural. Mas é apenas na sociedade que a criança pequena, com suas funções mentais maleáveis e relativamente indiferenciadas, se transforma num ser mais complexo. Somente na relação com outros seres humanos é que a criatura impulsiva e desamparada que vem ao mundo se transforma na pessoa psicologicamente desenvolvida que tem o caráter de um indivíduo e merece o nome de ser humano adulto. (ELIAS, 1994, p. 27). Assim, a constituição dos indivíduos, como seres pensantes, é moldada e influenciada pelo tipo de relações sociais que são travadas entre estes e os sujeitos sociais que os precedem na sociedade: O modo como essa forma realmente se desenvolve, como as características maleáveis da criança recém-nascida se cristalizam, gradativamente, nos contornos mais nítidos do adulto, nunca depende exclusivamente de sua constituição, mas sempre da natureza das relações entre ela e as outras pessoas. (ELIAS, 1994, p. 28).

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Quando o indivíduo nasce, toda uma sociedade já subsiste com suas idéias, crenças, representações. O novo ser é introduzido em um mundo que já traz no seu bojo todos os conceitos considerados certos ou errados para esta convivência. Dessa forma, as pessoas inicialmente aprendem a pensar com sua família, depois com a escola, a comunidade e a sociedade em que vivem, aprendendo de certa forma, o que já estava pronto. Alguém poderia indagar: uma vez que aprendemos o que já se encontrava pronto, como poderão ocorrer as mudanças? Como dissemos anteriormente, o “pensar” é algo construído socialmente, existindo como possibilidade apenas para os homens em detrimento dos animais. Os primeiros são dotados de um complexo sistema mental, o qual possibilita a formulação de raciocínios lógicos – indutivos e dedutivos – dando margem a novos pensamentos. Quanto ao aspecto da mudança, é preciso considerar a dimensão do tempo em

que a mesma é percebida por nós. As análises políticas, por exemplo, construíram as noções de conjuntura e estrutura justamente para que o pensamento pudesse dar conta das dimensões temporais. Por sua vez, as análises antropológicas lançam mão do conceito de contato intercultural, enquanto que as análises sociológicas distinguem os processos de re-socialização dos indivíduos em face de novas temporalidades. A capacidade humana de refletir, ao ser dialeticamente conduzida, é tratada por Karl Marx (1982, p.16) como sendo um processo metodológico que resulta no que ele denomina de “concreto pensado”. Para este pensador, [...] a investigação tem de apoderar-se da matéria, em seus pormenores, de analisar suas diferentes formas de desenvolvimento, e de perquirir a conexão íntima que há entre elas. Só depois de concluído esse trabalho, é que se pode descrever, adequadamente, o movimento real. Se isto se consegue, ficará espelhada, no plano ideal, a vida da realidade pesquisada, o que pode dar a impressão de uma construção a priori. (MARX, 1982, p.16) A fim de evitar o julgamento a priori ele ressalta a necessidade de distinção formal entre o método de exposição e o método de investigação. A matéria a que Marx faz referência é a matéria social, aquela que permite a distinção entre os homens e os animais e que oferece aos primeiros a possibilidade de refletir: Pode-se referir a consciência, a religião, e tudo o que se quiser como distinção entre os homens e os animais; porém, esta distinção só começa a existir quando os homens iniciam a produção dos seus meios de vida, passo em frente que é conseqüência da sua organização corporal. Ao produzirem os seus meios de existência, os homens produzem indiretamente a sua própria vida material. (MARX & ENGELS, 1989, p. 19). Por sua vez, a matéria social é produzida pelos homens em face das relações que mantém entre si e com a natureza, relações estas que são objetivadas na forma de instituições, e que se impõem ao comportamento humano. Deste modo, podemos nos referir ao um campo de tensões em que se batem e se refazem constantemente as estruturas e as ações, a História e as biografias, enfim, o comportamento e o pensamento dos homens. Devemos ressaltar o marco das possibilidades que ficam em aberto quando nos referimos às ações, às biografias e ao pensamento humanos e dizer que o mundo é um mundo alienado e falso enquanto o homem não destrói sua objetividade inerte e se reconhece e à sua própria vida “por trás” da forma fixa das coisas e das leis. O reconhecimento, ou, autoconsciência, que surge daí é acompanhado da ação, portanto, da transformação. Conforme Erich Fromm (1979, p.36), para Marx, o homem caracteriza-se pelo “princípio do movimento”, o qual não deve ser interpretado mecanicamente, mas

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como impulso, vitalidade criadora, energia; a paixão humana, para ele, “é a faculdade essencial do homem esforçando-se energicamente por alcançar seu objeto”. Podemos retirar daí a noção de “produtividade” em contraste com a noção de “receptividade” que perpassa o pensamento de Marx como um herdeiro de Hegel. A idéia do homem produtivo, em Hegel, é a do indivíduo que é ele mesmo, na medida em que não é passivo-receptivo, mas ativamente relacionado com o mundo; que é um indivíduo apenas no processo de apreender o mundo produtivamente, e assim tornando seu o mundo. Significa isto dizer que o desdobramento de todas as faculdades, capacidades e potencialidades individuais só se torna possível por meio de ação contínua, e nunca pela exclusiva contemplação ou receptividade. É no contexto dessas formulações que podemos compreender o sentido que Marx empresta ao trabalho humano, como sendo uma categoria histórica fundamental. O pensamento precisa debruçar-se sobre esta ação, retirar-lhe as amarras ideológicas, a fim de que o sujeito pensante possa assenhorear-se da própria vida, retornando em forma de ação. O homem produtivo de Marx, portanto, contrapõe-se ao homem alienado, este sendo o filho de uma sociedade em que a produção de coisas úteis é dada como meta em si mesma. Contra essa concepção ele lembra que “a produção de coisas úteis em demasia redunda em pessoas inúteis em demasia”. (MARX, 1993). São os homens que produzem as suas representações, as suas idéias etc., mas os homens reais, atuantes e tais como foram condicionados por um determinado desenvolvimento das suas forças produtivas e do modo de relações que lhe corresponde, incluindo até as formas mais amplas que estas possam tomar. A consciência nunca pode ser mais do que o Ser consciente; e o Ser dos homens é o seu processo da vida real. (MARX, 1989, p.25)

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Nas formulações de Marx, fica evidente a sua compreensão de que as representações não têm origem de uma pura abstração do mundo das idéias, mas, antes, das próprias relações materiais que os homens produzem em sociedade, ou seja, não são formulações mentais e abstratas que dão sentido às relações sociais, mas exatamente o seu inverso. São as relações sociais materiais que são as responsáveis pelas idéias e representações construídas pelos homens. Assim, na produção de nossa vida material, aprendemos e trocamos idéias com nossos familiares, amigos, professores etc, pensamos sobre variados assuntos e para todos eles temos uma compreensão, uma explicação, uma resposta. A forma como pensamos está intimamente relacionada com o tempo e o espaço em que estamos inseridos, ou seja, a sociedade, a cultura, o trabalho, a educação, as crenças religiosas. 1.3

Mentes e ideologia

O termo ideologia foi cunhado por Destut de Tracy, no ano de 1801, para indicar a análise das sensações e das idéias. Napoleão Bonaparte, porém, lançou mão do mesmo para expressar seu desprezo pelos ideólogos franceses que lhe faziam oposição, caracterizando-os como doutrinários que não mantinham contanto com a realidade, sendo assim, pessoas destituídas de senso político.

É com este significado que o termo ideologia percorre o pensamento moderno, sendo empregado para indicar, não as análises filosóficas, mas uma doutrina mais ou menos destituída de validade objetiva, embora mantida pelos interesses claros ou ocultos daqueles que deles se servem. Na segunda metade do século XIX, em obras como “A sagrada família”, de 1845, e “Miséria da Filosofia, de 1847, Marx emprega o termo para indicar a dependência das crenças religiosas, filosóficas, políticas e morais em vista das relações de produção que se constituem a cada fase da história econômica. Ideologia seria, assim, o conjunto daquelas crenças, cuja finalidade não é outra senão expressar uma determinada parte das relações econômicas, servindo à defesa dos interesses prevalecentes em cada fase das relações de produção. Como vimos anteriormente, para Karl Marx, o pensamento é produto das relações materiais, do trabalho que o homem executa para reproduzir sua existência, para assegurar sua sobrevivência no mundo social. Assim posto, são as relações de produção a base material que determina as formas do pensamento: Os pensamentos da classe dominante são também, em todas as épocas, os pensamentos dominantes, ou seja, a classe que tem o poder material dominante numa dada sociedade é também a potência dominante espiritual. A classe que dispõe dos meios de produção material dispõe igualmente dos meios de produção intelectual, de tal modo que o pensamento daqueles a quem são recusados os meios de produção intelectual está submetido igualmente à classe dominante. Os pensamentos dominantes são apenas a expressão ideal das relações materiais dominantes concebidas sob a forma de idéias e, portanto, a expressão das relações que fazem de uma classe, a classe dominante; dizendo de outro modo, são as idéias do seu domínio. (MARX & ENGELS, 1989, p. 56). Assim, a classe dominante, detentora dos meios de produção, produz a consciência social da época. Dizendo de outro modo, as idéias produzidas no mundo social, em todas as épocas, constituem-se na “ideologia” da classe dominante. É importante ressaltar, quanto ao significado do termo, aquilo que diz respeito à função principal da ideologia, qual seja, aquela de persuadir. A ideologia não é uma representação absoluta do poder de uma classe sobre outra, de modo que sua eficácia depende de sua capacidade de controlar e dirigir o comportamento dos homens numa determinada situação. Sendo assim, o alcance de sua força pode ser relativizado sempre que ela se apresentar muito distante da realidade vivida por aqueles considerados “dominados”. Mas, na prática, como podemos compreender o termo ideologia? Sugerimos uma incursão a um exemplo prático de nossa realidade social, para uma melhor compreensão do termo. Procederemos assim, sobre sua elucidação numa realidade específica que envolve a relação cidade e campo. Para a análise, escolhemos uma frase, extraída da fala de uma professora2: “O 2 A fala foi registrada durante um encontro entre a equipe do Humanas/UFC e alguns professores da Escola de Ensino Infantil e Fundamental Alice Moreira, em Sítios Novos, Caucaia, Ceará, em 18 de junho de 2005.

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campo é um local afastado (da cidade), situado numa região privilegiada, mas desprestigiado”. Analisando a representação que esta professora tem do campo, podemos imaginar que ela tem clareza de que a zona rural é uma região privilegiada, devido à possibilidade de retirar do trabalho na terra e da criação de animais, a sobrevivência. Poderíamos, ainda, supor, que, outro privilégio em residir no campo seria a convivência com um ar mais puro, por exemplo, devido ao número reduzido de fábricas, se comparado com a cidade. Entretanto, a sua fala comporta um paradoxo, pois o campo, ao mesmo tempo em que é privilegiado é desprestigiado. Como poderíamos pensar esta segunda afirmativa? Por que desprestigiado? Para compreender, temos que retomar um pouco o processo de urbanização que se desenvolveu, juntamente, com o sistema capitalista. A emergência deste sistema provocou uma crescente necessidade de instalação de indústrias nas cidades, o que ocasionou a demanda de mão de obra nas cidades. A cidade é o resultado da concentração da população, dos instrumentos de produção, do capital, dos prazeres e das necessidades, ao passo que o campo põe em evidência o fato oposto, o isolamento e a dispersão. A oposição entre a cidade e o campo só pode existir no quadro da propriedade privada; é a mais flagrante expressão da subordinação do indivíduo à divisão do trabalho, da subordinação da atividade determinada que lhe é imposta. (MARX & ENGELS, 1989, p. 62)

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A sociedade capitalista baseia-se na ideologia da igualdade. Esta ideologia tem no mercado o seu parâmetro fundamental, de modo que a equivalência na troca estabelece o equilíbrio necessário para a manutenção do sistema. Aí, os homens aparecem como iguais diante da lei, do Estado, do mercado etc. Assim, muitos moradores da zona rural foram atraídos para as cidades. Esta migração foi respaldada principalmente pelo “pensar” que a cidade oferecia uma vida melhor, já que prometia trabalho, saúde, educação. Porém, esta ideologia da vida melhor na cidade fez com que esquecêssemos de questionar algo imprescindível para uma subsistência na cidade. A cidade e as indústrias podem absorver a todos? A questão, aqui, não é saber as vantagens ou desvantagens de residir em um ou outro local, já que as opiniões divergem se formos comparar em qual lugar a vida é melhor. A questão é saber de onde parte o interesse de considerar a cidade melhor. Ou de pensar o campo como um espaço atrasado, sem perspectivas de vida. A análise inicial destas idéias contribui para uma reflexão a respeito de nossas mentalidades, ou seja, sobre a possibilidade de uma nova forma de concebermos o mundo em que vivemos. E qual é o contexto por excelência para o exercício desta reflexão? Exatamente este que você está pensando: a ação educativa. Qualquer lugar ou circunstância, onde se realiza um trabalho educativo, já que a educação consta de um processo amplo que ultrapassa os muros da escola e se dá em qualquer espaço onde existam pessoas dispostas a ensinar e aprender. Nestes espaços é que podemos reformular, a nosso favor, as formas de pensar o mundo em que vivemos.

A Produção Social Das Mentalidades

Joannes Paulus Silva Forte* Nosso cérebro não se encontra num tonel, mas em nosso corpo. Nossa mente não se encontra em nosso corpo, mas no mundo. E, quanto ao mundo, ele não está em nosso cérebro, nosso corpo ou nossa mente: estes é que junto com os deuses, os verbos, as pedras e a política, estão nele. (GEERTZ, 2001, p. 181) Pensar sobre diferença e educação significa pensar sobre mentes envolvidas por diversos processos sociais dos quais destacamos três, a saber: trabalho, desenvolvimento e educação. Esses processos se entrecruzam e fazem parte das mais diversas realidades de todas as regiões dessa invenção sócio-histórica3. Aqui estamos pensando na invenção do Brasil. E o que será o brasileiro? Você já havia refletido acerca dessa qualificação que hoje designa o que é próprio do Brasil? Desde as primeiras investidas de colonização, o brasileiro significa o explorador do Brasil, a serviço da metrópole portuguesa. O praticante do comércio das riquezas destas terras, que passaram a ser o chão do que hoje chamamos de sociedade brasileira. Assim, vai ocorrendo a produção social das mentalidades, própria dos processos sociais inerentes à história do Brasil, cujo conteúdo é fundamental para a formação das novas gerações. Além das disciplinas que temos em nossas escolas fortemente marcadas pelas idéias colonizadoras, a inserção de temas como a história e a formação social da África e das populações indígenas são de suma importância para o desenvolvimento de olhares críticos sobre a sociedade brasileira, tendo como ponto de partida conteúdos * Bacharel e Licenciado em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Ceará (UFC), sociólogo (MTEDRT-CE 298), mestrando em Sociologia (UFC), tutor da área de Ciências Sociais do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Educação Continuada para as Humanidades (HUMANAS-UFC-REDE-MEC), integrante do Grupo de Estudos sobre Trabalho e Transformações Capitalistas (GET) e do Núcleo de Estudos de Religião, Cultura e Política (NERPO), ambos do Departamento de Ciências Sociais da UFC, e professor de Ciências Sociais do curso de Bacharelado em Direito da Faculdade Luciano Feijão (FLF). Endereço eletrônico: [email protected].

3 A palavra invenção tem o sentido de criação por meio da intervenção cultural de homens e mulheres que acontece processualmente. A expressão “invenção sócio-histórica” designa a construção social do Brasil. Como qualquer outro país ou qualquer outra abstração da realidade material ou do pensamento, o Brasil vem sendo feito desde a sua colonização até os dias atuais.

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disciplinares que retratem as origens e peculiaridades culturais de povos que influenciam maciçamente a formação sócio-histórica do Brasil e os seus processos sociais particulares4. Entendemos que as mentalidades são elaboradas social e historicamente num processo dialético5 do qual fazem parte as diferenças e as condições materiais de vida das pessoas. Considerando a história da construção social do Brasil e do que chamamos de sociedade brasileira, incluindo-se como parte dessa sociedade as criações sociais e jurídicas, também fruto de uma mentalidade, como a LDB 9394/96, é que vamos nos debruçar sobre os desafios dos professores deste país na gigante tarefa de preparar as novas gerações para o “mundo do trabalho”, para a “prática social” e para o “exercício da cidadania”. Para tanto, articularemos esta discussão ao conceito de alteridade, numa perspectiva ecológica cuja maior contribuição poderá ser a criação de uma sociedade diferente baseada na diversidade e na interdependência, pois não existimos, a rigor coexistimos, assim como a terra não é nossa, mas nós é que somos da terra6. 2.1 Alteridade e educação: por um currículo baseado no contexto7. A palavra alteridade designa o outro. Este, por sua vez, significa o diferente; ou seja, o diverso do que somos, social e culturalmente. A palavra outro (alter) vem do latim álter, um substantivo masculino que indica o outro ser ou outra pessoa, em relação a determinado indivíduo; aquele que é percebido ou concebido como uma pessoa ou um ser distinto e separado daquele que pensa, sente e age sobre ele. Para a Antropologia Social, o outro significa o indivíduo, considerado um componente de um sistema de classificação de relações interpessoais, em particular de uma terminologia de parentesco (nomenclatura de traços semelhantes de um em relação aos outros indivíduos de uma mesma sociedade ou família). A alteridade, o outro, a diferença, alterna e altera o conhecimento, tecendo outros saberes. O conhecimento é fruto do confronto entre as diferenças. É uma característica própria dos seres vivos de reagir ao mundo e de intervir nele. Para além da apropriação do MENTES: nas mãos de quem procuraconhecimento está o mundo

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objeto pelo pensamento, como quer que se origine essa apropriação: como definição, 4 A Lei Federal nº 10.639/03 prevê a inserção da Educação das Relações Raciais e o ensino da História e da Cultura Afro-Brasileira e Africana nas Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica. 5 Diz respeito ao movimento de confronto entre unidades contrárias (de pensamento, por exemplo) que geram uma nova unidade. Essa nova unidade será uma unidade contrária em relação a uma outra unidade, esta também produzida no movimento de choque entre partes contrárias. O movimento referente a esse processo, ao qual nos referimos como dialético, é intenso e ininterrupto, produzindo incessantemente o que chamamos de realidade sócio-histórica da qual fazem parte as mentalidades. Para o filósofo alemão Georg Wilhelm Friedrich Hegel (*1770-†1831), “todo real é racional”. Segundo Hegel, a dialética é a natureza verdadeira e única da razão e do ser que são identificados um ao outro, e, ao mesmo tempo, definem-se segundo um processo racional. Tal processo ocorre pela união incessante de contrários, presente nas idéias de tese e antítese. Com isso, a união desses dois contrários é a síntese. Karl Marx (*1818-†1883) foi influenciado pelas idéias de Hegel, chegando a entender a dialética como um processo de descrição exata do que é a realidade. Desse modo, o que chamamos de realidade – ou real – é visto como dinâmico e inacabado. O mundo não é um conjunto de coisas prontas, finalizadas, mas de processos, onde as coisas e os reflexos delas na consciência – os conceitos – estão em incessante movimento de elaboração. 6 Este trecho foi extraído do filme Sonhos, de Akira Kurosawa. 7 A palavra contexto, neste caso, significa cultura. Para Geertz (1989, p. 20), o contexto está relacionado às estruturas sociais estranhas e desconhecidas que compõem a teia de significados e sentidos a qual o cientista social alemão Max Weber (*1864-†1920) chamou de cultura.

como percepção, apreensão, análise, ou de qualquer outro modo, ele é uma produção histórica e coletiva que ocorre por meio da atividade mental humana numa relação de interação entre as pessoas e o mundo que constroem: os homens e as mulheres fazem o mundo com as outras formas de vida e o mundo faz os homens e as mulheres, e isso incessante e concomitantemente. Da mesma forma, os homens e as mulheres fazem as sociedades, e, ao mesmo tempo, as sociedades fazem os homens e as mulheres com valores, normas e regras sociais. Assim, são elaboradas as mentalidades construídas e construtoras de ideologias que, geralmente, permitem apenas a visão da aparência, escondendo a essência das coisas e desconsiderando a diferença que pode ser avistada por meio da crítica aos pensamentos e às práticas orientadas por eles. A diferença é uma categoria fundamental do trabalho dos professores na construção de homens e mulheres com o poder de criticar, de reformular e de criar modelos de trabalho, de desenvolvimento e de educação diferentes dos que marcam a sociedade brasileira atualmente. Fala-se do questionamento e da crítica à mentalidade vigente. Portanto, como poderemos elaborar uma mentalidade que abrace as diferenças e que supere as desigualdades sócio-econômicas em consonância com a alteridade e com a diversidade dos educandos da escola brasileira? O outro pode fazer parte de um outro grupo, de outra família ou de outra sociedade. No entanto, o outro do qual trataremos aqui é o da nossa própria sociedade, considerando os seus traços mais peculiares e distintos. Referir-nos-emos a esse outro como um outro-nós, por fazer parte da mesma sociedade e assimilar o mundo geralmente a partir do mesmo idioma, dos mesmos códigos, ícones, valores e símbolos socialmente elaborados e re-elaborados no decorrer dos processos sócio-históricos. Pode-se dizer que o outro são os outros; ou seja, indivíduos constituídos por processos culturais diferentes, podendo eles fazer parte da mesma sociedade, no nosso caso a brasileira. Os outros captam o mundo a partir do mapa de sentidos e significados construídos nos processos sociais hierárquicos pelos quais passaram e passam. Geertz (1997, p. 86), em seus estudos sobre o conhecimento e as formas de saber locais8, afirma ser necessário que os antropólogos vejam o mundo do “ponto de vista dos nativos”. Isso significa buscar entender o outro atentando para o que ele pensa sobre o que ele faz. Para Geertz (1997, p. 89), o que importa “(...) é descobrir que diabos eles acham que estão fazendo”. Já para o professor e para a professora, como é possível considerar o saber local de seus educandos, seus pontos de vista, para preparar as aulas e ministrar os conteúdos disciplinares da biologia, da química, da filosofia, da geografia e de outras disciplinas, tendo em mente que esses conteúdos são dirigidos a educandos de espaços socialmente contextualizados? Para trabalhar com o educando (o outro) é necessário considerar o contexto. Para isso podemos lançar mão da teoria matemática dos conjuntos, vejamos:

8 Os estudos do antropólogo Clifford Geertz foram baseados nas realidades sociais de Bali, de Marrocos e de Java, e ainda inspirado no trabalho do físico e matemático polonês, Bronislaw Malinowski (*1884†1942) (1978) que, por sua vez, pesquisou as relações de troca material e simbólica entre as tribos de um arquipélago situado na Nova Guiné chamado Ilhas Trobriand.

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Conjunto B

C x Aj z Eg m k r P y Ao observarmos a figura, constatamos que a unidade A está contida em B. Inferimos que o educando A está no conjunto B. Conclui-se que, por exemplo, crianças estudantes em um assentamento rural pertencem ao contexto de uma realidade sóciocultual, histórica e geográfica específica: o assentamento rural onde vivem; da mesma forma acontece com as crianças que fazem parte de populações de áreas periféricas das cidades, de áreas costeiras e ribeirinhas, de populações indígenas, etc. Não se pode deixar de perceber que o conjunto B é constituído por uma diversidade de elementos. É fato que todos esses elementos são letras, porém diferentes. De forma similar acontece com os educandos. Eles fazem parte de um contexto comum que é composto por uma diversidade imensurável de traços peculiares. Embora haja características gerais entre crianças e adolescentes que compõem uma população indígena, cada educando dessa população possui traços que são apenas seus. Em outras palavras, na relação ensino-aprendizagem é importante observar que, por exemplo, todos os 35 estudantes de uma população costeira ou ribeirinha de uma mesma turma de 4ª série do Ensino Fundamental, possuem diferenças entre si, e, se não são essas diferenças econômicas ou de costumes e tradições, elas são físicas, psicológicas ou próprias de sua convivência com familiares, vizinhos, amigos, dentre outras experiências cotidianas. Por tais diferenças, os estudantes não aprendem da mesma forma, tampouco no mesmo ritmo. Contudo, é possível considerar a diversidade entre os educandos na elaboração de um plano de atuação junto aos mesmos, visando a dar conta dos conteúdos disciplinares com base em seus traços culturais singulares, e não deixando de acolher as diferenças de cada educando que integra aquela turma de 4ª série. Alguns problemas das escolas de todo o Brasil residem na diversidade do modo de ser e de viver dos educandos, em contraposição a um mesmo padrão escolar. A MENTES: nas mãos de quem procuraconhecimento está o mundo

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idéia de uma “escola especial” repousa no fato de que toda escola é peculiar. Possui uma história específica vinculada à vida de seus agentes escolares. Todas as escolas são únicas dadas as suas constituições próprias. Se todas as escolas são especiais, é indispensável que os seus profissionais (professores, gestores e funcionários) reflitam acerca dessa dimensão sócio-histórica da qual fazem parte. Para lidar com as mais variadas especificidades: culturais, históricas, geográficas, econômicas, corporais e psicológicas, a formação continuada incessante traz à tona a importância em reconhecermos na construção das mentalidades muito do que se pensa sobre a educação escolar para, inclusive, estarmos atentos às nossas idéias e às nossas práticas. Como os programas das disciplinas podem ser vinculados aos fatos e às experiências que os educandos vivenciam em seu cotidiano? Vejamos alguns exemplos: a existência de escolas que hoje ocupam prédios de antigas fábricas desativadas em um bairro de tradição operária pode ser um objeto para o trabalho com os conteúdos de

história e de geografia, discutindo o processo de ocupação do bairro, de industrialização e de desativação das fábricas até o momento da criação das referidas escolas, como é o caso do bairro de Carlito Pamplona, em Fortaleza-CE; uma escola construída às margens de uma estrada de ferro cuja importância está na própria noção de “espaço”, de “lugar”, de “modernização” e de “trabalho”, etc. das pessoas que fazem parte de seu entorno social (familiares de educandos, moradores, associações, sindicatos, igrejas, cooperativas, fábricas, mercearias...); o lixo atirado nas ruas e em outras áreas públicas, aumentando o risco de contaminação por doenças, a exemplo da leptospirose transmitida pela urina dos ratos; o crescente desemprego no comércio, na indústria e no setor de serviços e a ocupação de crianças, adolescentes e adultos como “flanelinhas” em sinais de trânsito e em outras atividades sem carteira assinada e sem direitos sociais; o caso do referendo para decidir acerca da proibição ou não da comercialização de armas de fogo e munição no Brasil; a história de um operário que produz 40 pares de calçados por dia e recebe como salário o equivalente à produção de apenas dez pares poderia ser apropriada para fazer uma análise com os conteúdos da matemática, e, ao mesmo tempo, da sociologia sobre a exploração da força de trabalho; tomar como objeto o mar, o rio, o canal ou o esgoto que corre próximo à escola pode ser uma boa escolha para articular os recursos teóricos da biologia, da química, da geografia e da história; lançar mão dos artesanatos produzidos por populações indígenas para discutir as artes; etc. Há também a possibilidade de utilizar filmes, fotos, figuras, charges, músicas e matérias de jornais e revistas que, das mais diversas formas, estejam relacionados ao cotidiano dos estudantes. Por meio da TV e do rádio são transmitidos práticas e discursos. As emissoras enviam imagens e sons que trazem valores políticos, estéticos, religiosos e ideológicos sob a forma de programas policiais, de fofocas a respeito da vida privada de personalidades famosas do Brasil e do exterior, programas de auditório, de noticiários, de novelas, de desenhos animados e até mesmo de cultos religiosos9. Nas programações das emissoras de TV e rádio, no Brasil, há a reprodução da dominação de grupos político-econômicos sobre a população do país por meio do incentivo ao consumo, bem como existe a manifestação de preconceitos e orientações para gostarmos ou não de alguma coisa. Porém, também podem combater discriminações, trazer informações e instruções sobre as políticas dos governos, o lazer, a arte e a educação, incentivando ao pensamento e à crítica, fato revelador de uma ambigüidade. E como podemos identificar isso? Certamente, com o olhar vigilante e crítico que a formação escolar pode ajudar a criar. Esses aparelhos são responsáveis por boa parte da formação educacional de crianças, de adolescentes e de adultos e podem servir aos professores nas disciplinas ministradas para a análise de fatos e a utilização de exemplos extraídos das programações veiculadas por eles. 9 Existem, inclusive, cursos de ensino fundamental e médio que são parcialmente ministrados pelos meios de comunicação mais populares: os televisores e os aparelhos de rádio. No Brasil, eles estão presentes em residências, supermercados, consultórios médicos, restaurantes, escolas, veículos, além de serem super potentes na educação não-formal de crianças, adolescentes e adultos.

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Desta forma, como os professores podem refletir à luz da história de seus “lugares”, das suas práticas e dos seus saberes visando a estender essa reflexão aos estudantes, para que eles também dêem continuidade à mudança de suas mentalidades pautada nas perguntas sobre a forma que experimentam o tempo e o espaço; ou seja, sobre o que vivenciam e em que condições essa vivência acontece? A utilização de computadores, datashows, câmeras de vídeo e de fotografia, por exemplo, pode colaborar com a ação do professor. No entanto, é indispensável refletir sobre o que pensamos e fazemos em relação à ação docente para a formação dos educandos. O ponto central é fazer apropriações das experiências vividas pelo outro (pelos estudantes), de modo a construir materiais didáticos e metodológicos para formar as novas gerações. Vale ressaltar, que, ao fazer uso das “situações vividas” para articular os conteúdos disciplinares, os professores estarão, criativamente, construindo novas tecnologias (para além das tecnologias materiais como o computador, a internet, o DVD, o vídeo-cassete, etc.) capazes de ajudá-los a enfrentar os seus desafios, quais sejam: 1) preparar os educandos para o mundo do trabalho; 2) para a prática social; e 3) para o exercício da cidadania, como preconiza a LDB 9394/96. 2.2 Superar o etnocentrismo para formar as novas gerações O etnocentrismo10 significa a consideração dos conceitos, categorias, normas e valores morais e orientação sexual da própria sociedade ou cultura como modelo aplicável a todas as demais, desconsiderando, assim, as características específicas da outra sociedade. Segundo Rocha (2004), o etnocentrismo é definido como “(...) uma visão do mundo onde o nosso próprio grupo é tomado como centro de tudo e todos os outros são pensados e sentidos através dos nossos valores, nossos modelos, nossas definições do que é a existência”. (ROCHA, 2004, p. 07) acrescenta que o etnocentrismo pode ser visto, do ponto de vista intelectual, como uma “dificuldade de pensarmos a diferença”; do ponto de vista das relações afetivas, manifesta-se como estranheza, medo, hostilidade, aversão, intolerância, ojeriza etc. MENTES: nas mãos de quem procuraconhecimento está o mundo

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As ciências sociais, com o intuito de analisar o etnocentrismo, e em busca da objetividade científica, trazem a noção de relativização. O ato de relativizar é originário da dúvida e do estranhamento das coisas tal como elas se apresentam à primeira vista. Bem diz o ditado popular que “nem tudo que reluz é ouro”. A relativização daquilo que se apresenta como um juízo de valor torna possível a desmistificação11, ou seja, a desvendamento de tudo o que se nos apresenta como absoluto e incontestável. Portanto, o ato de relativizar nos proporciona o entendimento de que, para além das diversas versões da vida e do mundo (verdades parciais), podemos construir e aces10 Sobre os temas do etnocentrismo e do relativismo cultural ver Boas (2004), Clastres (2003) e (2004), Da Matta (1981); Lévi-Strauss (1952) e Mead (2003). 11 Forma figurativa que significa retirar o estatuto de místico das coisas e dos fatos que se apresentam como realidade. Trata-se de ir além das aparências. Deste modo, desvelamos os mistérios que se escondem atrás do chamado “real” para possibilitar a descoberta do que está para além do ponto até o qual os nossos olhos alcançam, ou, simplesmente, retirar o véu do real, como nos ensinou um dos pais fundadores das Ciências Sociais no século XIX, o cientista social francês Émile Durkheim (*1858-†1917) (1999).

sar uma versão crítica em relação às demais, a qual será, de agora em diante, designada verdade real, que conheceremos se fizermos o esforço da relativização das idéias e dos fatos. Por exemplo, dizer que um acidente de trabalho na construção de um edifício é “apenas” um acidente, significa dizer que esta forma de pensar está naturalizando um fato (o acidente) como se não houvesse processos sócio-históricos que influenciaram nas condições de vida e de trabalho que os trabalhadores enfrentam ao desempenhar as suas atividades. Ao levar em conta tais processos, não se poderia considerar como acidente a queda de um trabalhador da construção civil que estivesse a trabalhar, sem se alimentar, no vigésimo andar de um prédio, sem a utilização de material de segurança. Poderíamos, então, nos questionar: mas qual o motivo pelo qual ele caiu? Alguém (sem relativizar) diria de pronto: “porque chegou a sua hora!”. No entanto, ao relativizarmos, veremos o que está por trás da “hora” que soa como algo inevitável, ou predestinado. Ao pensarmos sobre isso chegaremos ao entendimento de que houve uma construção história em face do processo de exploração do trabalho pelo capital, o qual detém uma lógica interna que não leva em conta a vida humana, e sim os lucros do capitalista e a reprodução ampliada do capital. Tal processo nos fornece uma explicação baseada nas relações sociais tecidas historicamente. Para além de “porque chegou a sua hora”, há um meio de captarmos uma imensidão de dados que se escondem na intimidade dos discursos sociais. Por exemplo, o dado de que a maior parte dos “acidentes” de trabalho ocorrem ao final das manhãs, hora em que o trabalhador já não suporta a fome. O acidente, que diz respeito a um fato não previsto, é diferente de uma ação que prevê um fato, caso do nosso operário. Portanto, há outras possibilidades de entender o chamado acidente de trabalho. Ao invés de acidente, tal acontecimento pode ser visto como um fato previsível diante das condições precárias de trabalho. Para aquele trabalhador, a única perspectiva possível de subsistir seria vender a sua força de trabalho em condições precárias a fim de garantir o salário que, quando muito, poderia sustentar minimamente a sua família e perpetuar a sua subordinação. Nestas condições, poderíamos dizer que a queda e a conseqüente morte do trabalhador, aparentemente consideradas um acidente, significa muito mais uma “morte anunciada”, inscrita na lógica própria do regime do capital. Conforme Rocha (2004), geralmente as pessoas não praticam suficientemente o ato de relativizar as relações diárias. A idéia de que noções como bonito, feio, eu, pessoa, casamento, certo, errado, limpeza, entre tantas outras, presentes em uma determinada sociedade, acontecem da mesma forma em todo o mundo, é o que chamamos de visão etnocêntrica, ou seja, a cultura de quem lança o olhar ocupa a posição central de todas as coisas existentes naquela sociedade. É mister analisar realidades específicas não lhes fazendo julgamentos prévios de valor. Só assim poderemos ver as diferenças entre as sociedades e os sujeitos sem generalizar noções, como se o mundo todo fosse orientado pelos mesmos valores

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culturais que nos são próprios. Como manifestação do etnocentrismo, as sociedades e grupos de maior influência sobre outros possuem a tendência de criar classificações dicotômicas e valorativas como o “atrasado” e o “avançado”, o “desenvolvido” e o “subdesenvolvido”, elaborando significados preponderantes assimilados pelas pessoas como se fossem naturais, como se não tivessem sido desenvolvidos de forma imposta. Ao mantermos uma vigilância sobre os nossos valores, sobre as nossas “verdades”, os nossos “certos” e “errados”, podemos acessar os valores do outro e, assim, conhecê-lo e pensar sobre o sentido que atribui à sua vida e às suas ações sem, necessariamente, deixarmos de ser quem somos e acreditarmos nas coisas da nossa sociedade. Enfim, não há sociedades e grupos superiores, nem inferiores. Há sociedades que reproduzem as desigualdades sócio-econômicas e não respeitam as diferenças culturais, gerando assim rótulos confeccionados simbolicamente por meio de práticas sociais hierárquicas e reprodutoras de mentalidades, o mais das vezes, hierarquizantes. No caso dos professores, o motivo da busca pelo conhecimento da diversidade entre os seus educandos está na tentativa de preparar as suas atividades e construir os seus materiais didáticos, de modo a validar a libertação pelo caminho da crítica e invalidar a dominação que segue pelo caminho da venda da força de trabalho e do consumismo. Ao buscarmos a verdade real, podemos captar as diferenças entre uma sociedade e outra, assim como entre um estudante e outro, partindo de uma identificação por contraste para driblarmos as posturas discriminadoras e excludentes em relação ao sexo, orientação sexual, religião, etnia, características físicas, costumes. Quando não relativizamos, julgamos uma pessoa a partir do que temos como parâmetro moral ideal. Por exemplo, um estudante pode ser punido durante uma aula pelo fato de estar sorrindo, por tentar desviar a atenção ou por ter fixado o olhar em um colega na classe. O sentido do sorriso, do olhar e da demonstração da falta de atenção às aulas pode apontar para o desrespeito e para a ironia. No entanto, essas ações também poderão ser alimentadas por outros sentidos, talvez, de caráter muito pessoal do educando ou de suas condições de vida atual. MENTES: nas mãos de quem procuraconhecimento está o mundo

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Uma das possibilidades de conquistarmos os estudantes é, antes de tudo, conhecê-los para darmos seqüência ao processo educacional. Ângela Linhares (1999)12 descreve dois episódios que presenciou em determinada escola de ensino fundamental e médio, os quais são bastante significativos para exemplificar as questões aqui discutidas. O primeiro é o de uma menina que olhava fixamente para uma “esperança” (o inseto), no momento em que a aula ocorria; o segundo, diz respeito a um menino que ri na sala de aula. Sobre eles, vejamos o que nos diz a autora: 12 Linhares (1999) desenvolveu a sua pesquisa de mestrado sobre o tema da educação. A partir de estudos teóricos e de pesquisas empíricas, a autora analisou cinco rituais da realidade escolar, em Fortaleza-CE, abordando as dimensões da arte e da cultura sob a perspectiva da sensibilidade e do amplo desenvolvimento dos educandos. A pesquisadora enfocou, ainda, o problema da diferença e do traço tradicional que impera nas práticas pedagógicas escolares. Tal traço é visto como não propício ao desenvolvimento de um processo educacional capaz de libertar a escola, os professores e os educandos das amarras políticas tecidas ao longo da história do Brasil. Assim, Linhares buscou desvelar os “elementos para uma concepção mais totalizadora da razão”.

O tempo depois do recreio, era de calor aumentando, após a correria e, ainda, mais com a falta d’água. A professora estava cansada e intrigou-se com a menina que estava lá atrás, num canto, com a carteira quase virada de costas para a professora. Sobre uns pés enérgicos e rijos, a menina viu a professora. Olhou-a pelos pés. Melhor: adivinhou-a. A professora avançou, no segredo, e quase matou a esperança, aquele insetinho verde de pernas fininhas. A um olhar da professora, a menina quis um sorriso que não saiu. A professora insistiu: ‘Tá vendo? O que significa isso? O que estava fazendo com isso?’. E a menina: ‘Eu olhava’. E poderia ter dito: ‘Eu brincava’ ou ‘Eu sonhava’ ou ‘Eu pensava’. Seria a mesma coisa. Outra lógica furando a idéia de que só se está a fazer algo se se tomar as coisas para si. Melhor: se se tomá-las como instrumento. Ou: a vida ‘se contando’ e pedindo passagem entre. (LINHARES, 1999, p. 236-37). O segundo episódio ocorreu no mesmo dia. Sobre este, destacamos o trecho em que a autora encontrou um menino em pé, por longas horas, na sala dos professores: – Por que você está aqui assim?, perguntei. – Porque eu ri, disse ele. E riu. O vice-diretor, chegando por trás de onde eu estava explicou: – É um cínico. Ri muito. (LINHARES, 1999, pp. 236-37). A autora então se pergunta: “como ter ainda um olhar que, de repente, em meio ao avesso, pára a um canto e... olha? Como ter ainda um menino que ri?!”. (LINHARES). E segue comentando: É esse olhar que se quer acudir. Começando pelo nosso. Para que olhe estranhando. Desabitue-se do que parece comum e natural, e queira enxergar de outro modo o que parece ter existido sempre. Esse construir e desconstruir os ritos e fatos comuns da cultura, em seus gestos e símbolos, é o caminho de uma alfabetização estética. (LINHARES, 1999, p. 237, grifos nossos). Para Linhares (1999), assim também é que se inscreve nos corpos a determinação da finalidade do trabalho-mercadoria: (...) a aprendizagem da alienação com relação ao processo de trabalho é exercida desde as primeiras letras. Onde o ensaio dos grupos sujeitos em seu processo de singularização? Onde processos de singularização? Onde a reflexão sobre o caminho do desejo e a tarefa de pensar o pensamento? A aprendizagem

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assim passiva prepara este mundo do sacrifício para o mundo do trabalho do modo como ele se dá para as classes populares, exercício de se por diante do mercado como coisa. Esse exercício de trabalho, (...) é o modelo eleito nas práticas pedagógicas na escola. (LINHARES, 1999, p. 247). Aquilo a que estamos chamando de “verdade real”, ou saber crítico, incomoda por mexer com os poderes que se alimentam da desigualdade e estão “muito bem, obrigado!”. A articulação entre os conteúdos das disciplinas e a “realidade concreta” do vivido pode nos ajudar a reconhecer o que há de mais especial em nossas escolas. Torna-se, assim, possível garantir um espaço socialmente contextualizado onde se cria e recria, deslocando-se da lógica da transferência e abraçando a produção mesma de saberes com o poder de interpelar o real. 2.3 A profissão de professor: ação docente para a mudança das mentalidades Até este ponto de nossa caminhada pelas páginas que se passaram, vimos que a profissão de professor é de demasiada importância. No entanto, contraditoriamente, acaba sofrendo de igual descaso e esquecimento, motivados pelo imenso desconforto e pela ruína que pode causar aos “poderosos”. O que assusta é seu potencial de, com o livro, a palavra, o giz, o pincel, o quadro, a reflexão e a crítica, aniquilar a sutil “fome de conhecimento” que conserva as “raízes do Brasil”. São produtos disso o problema dos baixos salários em comparação a outras profissões e às más condições de trabalho. Para além das dificuldades práticas que os professores enfrentam, exercer o papel de mestre requer preparo e responsabilidade. Apesar das adversidades, se você está na condição de professor, o seu dever é preparar as novas gerações para estranharem, para duvidarem e para indagarem. Se isso se realiza, amanhã os professores poderão ter o espaço que lhes privam em razão do prejuízo que podem causar aos que exploram e concentram, quem sabe. MENTES: nas mãos de quem procuraconhecimento está o mundo

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Certamente, não há nenhuma receita para enfrentar situações-problema em se tratando de práticas, comportamentos e orientações que são alvo de coerção social por parte dos demais educandos e de outros protagonistas da sociedade. Entretanto, cabe ao Estado garantir que a formação das pessoas ocorra segundo os princípios da LDB 9394/96. O fato de um estudante ser homossexual ou “portador de diferenças”, físicas, auditivas, visuais, etc. não pode excluí-lo do ambiente escolar, independente de suas opções ou condicionamentos, assim como o professor pode intervir da forma que achar conveniente (considerando os postulados que devem reger a educação nacional brasileira). Com a crítica, cuja realização está na desconstrução dos pensamentos e das idéias, no intuito de identificar os enganos etnocêntricos e os preconceitos impressos por seus autores, podemos reconstruir o que havíamos desconstruído, ainda nos cabendo criticar tais reconstruções ad infinitum. Para desconstruir ou desmontar as noções

preconceituosas e os sentimentos de aversão, devemos estranhar (tornar estranho) o familiar – o comum e o natural – para identificarmos a diferença e entendê-la, visando a sua incorporação pelo corpo de professores, gestores e funcionários da escola. O estranhamento é uma condição humana que, ao se confrontar com algo que está fora de sua expectativa (o diferente), causa uma “quebra”, um choque cultural que, talvez, seja gerado pela constatação da diferença. Esse choque gera o etnocentrismo. Para movimentar a noção de estranhamento sobre os fenômenos e fatos que classificamos como familiares (corretos e aceitos) e sobre os que identificamos como esquisitos ou errados, é necessário questionar a realidade. É crucial a elaboração de perguntas sobre os nossos valores e modelos, bem como é relevante fazê-lo com os do outro. Vejamos a crônica “A Burocracia”, de Eduardo Galeano (2005), publicada no Livro dos Abraços, que nos leva a concluir que a pergunta, elemento essencial para a desconstrução das aparências, é a possibilidade de uma partida, além de ser o portal para a tomada de decisões mais conscientes: A Burocracia Sixto Martinez fez o serviço militar num quartel de Sevilha. No meio do pátio desse quartel havia um banquinho. Junto ao banquinho, um soldado montava guarda. Ninguém sabia por que se montava guarda para o banquinho. A guarda era feita porque sim, noite e dia, todas as noites, todos os dias, e de geração em geração os oficiais transmitiam a ordem e os soldados obedeciam. Ninguém nunca questionou, ninguém nunca perguntou. Assim era feito, e sempre tinha sido feito. E assim continuou sendo feito até que alguém, não sei qual general ou coronel, quis conhecer a ordem original. Foi preciso revirar os arquivos a fundo. E depois de muito cavoucar, soube-se. Fazia trinta e um anos, dois meses e quatro dias, que um oficial tinha mandado montar guarda junto ao banquinho, que fora recém-pintado, para que ninguém sentasse na tinta fresca. (GALEANO, 2005). Duvidar radicalmente de tudo e questionar a existência de todas as coisas são tarefas a serem desempenhadas por qualquer cidadão como condição sine qua non para a conquista do poder de decidir os rumos da sua vida e da sociedade: Se algo ou alguma coisa existe, quem fez? Quando passou a existir? Por que existe? O que é isso? De onde veio? Como foi feito? Como funciona? Estas perguntas, dentre outras aparentemente irrelevantes, impulsionam o pensamento para a desmistificação de tudo o que elaboramos social e historicamente em meio às lutas entre grupos distintos. Os resultados dessas lutas são a produção de formas de pensar e de modelos preponderantes que legitimam os padrões de desenvolvimento econômico desigual e destruidor de todos os sistemas vivos, de educação nos moldes de um adestramento das pessoas para um mundo do trabalho subordinado ao capital e para a submissão aos sofrimentos que a vida lhes proporciona. Sobre

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esses padrões, podemos erguer as nossas críticas e reflexões para pensar a prática docente e os desafios postos aos professores em sua tarefa de formar as pessoas. Eis a necessidade de questionar as mentalidades construídas historicamente pelas práticas sociais hierárquicas em meio aos processos sociais de trabalho, de desenvolvimento e de educação vivenciados pela sociedade brasileira: fazer da escola uma instituição que abrace o mosaico composto por cada singularidade das novas gerações. Ou seja, criar uma escola básica inclusiva que acolha a diversidade para, assim, construirmos um país de todos.

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Aprendizagem e Complexidade

Por Adalberto Ximenes* A educação formal mantém ainda ritualística linear, com base na percepção muito equivocada de transmissão de conhecimento.(DEMO, 2002) A atividade educacional é uma prática que vem desde o surgimento da humanidade, desde os tempos primitivos. Nas comunidades tribais, a educação das crianças e dos jovens era uma tarefa em conjunto, uma tarefa de todos os adultos da comunidade. Com os adultos as crianças recebiam todos os conhecimentos (caça, pesca, luta...) necessários à sobrevivência e também necessários à inserção na vida social (participação nos rituais sagrados, rituais de casamentos...) de sua comunidade. Com o desenvolvimento e amadurecimento das sociedades, a importância da educação foi aumentando cada vez mais. É na Grécia antiga (séc. VI – III a.C. aproximadamente) que a educação, juntamente com a filosofia, tornou-se uma preocupação fundamental para a sociedade. Naquela época, estabeleceram-se lugares específicos (escolas) e pessoas específicas (professores) para instruir os jovens. Também houve uma preocupação com os conteúdos (tipos de conhecimento) e com a forma (aprendizagem e prática pedagógica) dessa instrução a ser transmitida. Com os gregos, a educação deixa de ter um caráter predominantemente militar e de sobrevivência para ter um caráter mais social e geral da vida humana. Ela deixa de ser apenas uma transmissão de conhecimentos e inserção dos jovens na vida social, para ser também uma atividade com um fim de uma formação completa do homem. Para os gregos, a vida não se reduzia somente em suas necessidade materiais, mas também em suas necessidades espirituais. Por causa disto, a educação deveria ter também uma formação mais ampla, o que acabou originando um aspecto importante da mesma: a de que ela não deveria ser apenas transmissão de conhecimentos já adquiridos, mas também a busca de novos conheciLicenciado em Filosofia pela Universidade Estadual do Ceará (UECE), mestre em Filosofia pela Universidade Federal do Ceará (UFC), tutor da área de Filosofia do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Educação Continuada para as Humanidades (HUMANAS-UFC-REDE-MEC). Endereço eletrônico: [email protected]. *

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mentos. A educação deveria incentivar o jovem a pensar e a ser autônomo. Só assim ele poderia decidir e agir corretamente frente aos novos e possíveis problemas, assim como às novas mudanças, que o mundo poderia lhe apresentar. Muito tempo se passou desde a época grega clássica e a discussão sobre a educação vem acumulando muitas contribuições, atribuindo-lhe novos significados e tarefas. Não vivemos mais a realidade dos primeiros teóricos educacionais. Contudo, apesar de todas as influências teóricas e de todas as mudanças ocorridas no mundo, a educação continua sendo uma das principais tarefas e questões sociais. Nela ainda depositamos os nossos valores culturais e as nossas esperanças para um futuro melhor. É por isso que ela surge sempre, em todas as épocas, como questão atual. Estamos sempre precisando nos perguntar o que é a educação. E, a partir desta pergunta nos surgem outras: Qual a finalidade da educação? A educação tem como meta somente a transmissão de conhecimentos ou ela tem também como meta proporcionar uma formação mais geral e humana, uma formação que possibilite a emancipação, a liberdade e a autonomia humana? E o que é liberdade? E autonomia? Autonomia é apenas uma atividade e conquista individual ou ela é uma conquista social feita com trocas? Nos capítulos seguintes trataremos da situação da educação no mundo atual – mundo este que é complexo – e, a partir desta perspectiva, pensaremos um pouco sobre aprendizagem e complexidade. Tentaremos também, discutir um pouco, brevemente, sobre a questão das tecnologias e a educação. 3.1

Como pensar educação e complexidade? Antes de qualquer assunto podemos, de imediato, nos perguntar: o que é com-

plexidade? O que é isso, e, o que esse assunto tem a ver com a educação? Ora, se considerarmos a educação como a transmissão/construção de cultura e conhecimentos e também como o espaço de formação de autonomia humana, então, a educação está intimamente relacionada com a realidade e com o conhecimento do mundo do qual ela faz parte e que ela quer transformar. E é aqui que entra a questão da complexidade. MENTES: nas mãos de quem procuraconhecimento está o mundo

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Complexidade é um termo13 atribuído a um conjunto de teorias científicas e sociais que têm um ponto em comum. Todas elas compreendem o mundo, a cultura e o conhecimento humano como um “todo”. Um todo em que as partes estão interligadas. Estas teorias também entendem que a aprendizagem e o conhecimento não são algo estático, ao contrário, seriam algo em constante construção e atualização, assim como a própria natureza. Toda a questão sobre a educação está sempre situada na época histórica e cultural em que ela é abordada. Isto equivale a dizer que os estudos sobre a educação e prática pedagógica são resultantes do conhecimento que a humanidade atingiu em cada época de sua existência. E é exatamente este conhecimento que os homens têm 13 Complexidade é etimologicamente uma palavra de origem latina que vem de “complexus”, “complectere”, e significa: que abraça, que é entrelaçado junto, que é tecido junto. Ela também tem o significado de algo que é formado de muitas coisas, que tem muitas variáveis, se contrapondo, desta forma, à mera significação de algo complicado ou simples.

em cada momento histórico, que lhes proporciona a sua percepção de mundo, a sua “visão de mundo”. É a partir desta última que os homens pensam e traçam suas estratégias para agir no mundo, inclusive estratégias educacionais. Se observarmos as épocas históricas, por exemplo, a época grega antiga, veremos que as teorias de Sócrates, Platão e Aristóteles eram teorias que estavam relacionadas à realidade social e ao conhecimento que eles tinham do mundo. É sob esta perspectiva que podemos afirmar que o sentido da educação grega compartilhava da visão de mundo que os gregos possuíam. Por exemplo, como Platão compreendia que a verdade estava no mundo das idéias, então o conhecimento para ele era algo que se elevava gradualmente do mundo material para o mundo espiritual. Deste ponto de vista, Platão entendia que cabia à educação proporcionar esta elevação espiritual do homem. Com a educação o homem poderia alcançar toda a grandeza e bondade de sua alma, ele poderia chegar à verdade. Já Aristóteles compreendia que a verdade poderia ser alcançada nas coisas práticas da vida. Por isso ele defendeu um conhecimento e uma educação mais prática e social. Contudo, apesar de todas estas diferenças, eles tinham algo em comum: eles eram gregos e viviam entre os séculos V e III antes de Cristo. Os gregos daquela época exaltavam sua liberdade individual e política (a democracia, por exemplo), exaltavam sua vida social avançada e civilizada (“moderna”), e, também se orgulhavam de viver e de traçar o futuro de sua sociedade através da razão. Desta forma, a educação compartilhava daquele contexto social comum, definindo-se como uma atividade voltada à preparação dos jovens para serem cidadãos capazes de agir racionalmente sobre suas vidas. Em nossa época atual, toda discussão educacional também não é diferente das épocas anteriores. Enquanto atividade e processo social situado historicamente, a questão da educação é fruto de nosso entendimento (conhecimento) sobre o mundo e fruto de nossos anseios sobre uma vida melhor neste mundo. Aqui voltamos novamente à questão da complexidade. Você já percebeu aonde queremos chegar? Pretendemos chegar a uma relação entre a educação e o nosso conhecimento atual. Um conhecimento que esteja à nossa altura e que seja capaz de compreender o mundo em que vivemos, pois, é a partir de nossa compreensão de mundo (visão de mundo), que poderemos traçar estratégias educacionais para ele. Desta maneira, a pergunta que dá o título a esta seção – como pensar educação e complexidade? – pode ser substituída por esta: como pensar a relação entre educação e nosso conhecimento atual sobre o mundo? Continuemos a análise sobre a complexidade e o conhecimento, ou pensamento, que ela defende. Complexidade é um termo bastante utilizado por muitos cientistas e filósofos em diferentes áreas do conhecimento: física, química, biologia, matemática, computação, filosofia, sociologia... Para estes estudiosos, esta palavra tem um significado comum: a) o sentido de um pensamento que não simplifica as coisas, tanto as coisas naturais quanto as sociais; b) o sentido de um pensamento que procura ligar todas as partes fragmentadas da realidade em busca de uma visão de conjunto, ou seja, a tentativa de uma visão comum com a qual possamos ver a realidade como um todo que tenha

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sentido e não como um amontoado de partes sem sentido algum. Com o tempo e com as contribuições de diferentes cientistas, a complexidade deixou de ser uma simples idéia para se transformar em uma teoria, a chamada “teoria da complexidade”. Hoje em dia, há cientistas (como, por exemplo, Edgar Morin14) que se dedicam a aprimorar a teoria da complexidade, e que ressaltam ser esta uma das melhores formas de conhecimento para se estudar o mundo (tanto o mundo natural como o mundo social). Para eles, a teoria da complexidade é uma “ótica” de se ver a realidade. Seria através desta ótica que poderíamos reconhecer que a realidade é “complexa”, ou seja, que as coisas não são tão simples como parecem e nem que estas coisas estão tão separadas umas das outras, sem nenhuma relação entre si. Para a teoria da complexidade, somente quando pudermos religar e relacionar as diferentes partes da realidade, é que poderemos entender o mundo e dar-lhe um significado. E, é a partir daqui que entra sua contribuição para a educação. Pois, uma vez que a educação tem como tarefa principal possibilitar uma conscientização dos homens com a tarefa de transformar o mundo para melhor, então, a primeira coisa que uma teoria educacional tem de fazer é sintonizar-se com esse mundo, e compreendê-lo. Portanto, se é somente a partir de quando conhecemos a realidade que nós podemos traçar estratégias e ações pedagógicas para agir no mundo, então, a educação deve, para se sintonizar com o mundo, partir de uma “ótica” (visão de mundo) capaz de compreender este mundo. A teoria da complexidade, dentre as variadas teorias contemporâneas, poderia nos auxiliar, minimamente, na nossa percepção de que tanto a educação quanto a aprendizagem é “complexa”. 3.2 Como pensar a interdisciplinaridade? A chamada “interdisciplinaridade” é uma forma específica de aprendizagem. Relacionando-a com a teoria da complexidade, nos surge, de imediato, uma conclusão óbvia: se o conhecimento não é linear, como enfatiza a teoria da complexidade, então, a aprendizagem e o ensino também não o são. Tente refletir um pouco sobre estas perguntas: O que é o currículo escolar para você? O que são as disciplinas escoMENTES: nas mãos de quem procuraconhecimento está o mundo

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lares? Qual é a finalidade deles? Enquanto você pensa nas perguntas acima, vejamos o que podemos entender por interdisciplinaridade: a) em primeiro lugar, interdisciplinaridade pode ser uma palavra que significa a relação (inter-relação) entre duas ou mais disciplinas, relação esta que tem algum ponto em comum, algum objetivo integrador; b) em segundo lugar, interdisciplinaridade pode ser um método ou um assunto exclusivamente relacionado às práticas pedagógicas; c) em terceiro lugar, interdisciplinaridade pode ser uma palavra relacionada não somente às práticas pedagógicas, mas, também aos próprios conteúdos do ensino, ela pode ser algo que esteja relacionado a uma busca da “unidade do saber”, à busca de uma unidade dos diversos tipos de conhecimento; d) 14 Edgar Morin é um cientista social francês contemporâneo que vem se ocupando com a teoria da complexidade. Ele procura fazer uma certa organização e sistematização da teoria da complexidade aproximando-a da perspectiva social. Suas idéias têm tido grande destaque, principalmente na área educacional.

em quarto lugar, interdisciplinaridade pode ser uma palavra que defina um projeto ou uma proposta educacional voltada para um ideal, para uma forma de vermos, de conhecemos e de agirmos no mundo; e) e, em quinto e último lugar, interdisciplinaridade pode compreender as quatro definições acima mencionadas! Quando afirmamos, por exemplo: “A gincana no colégio foi interdisciplinar, teve atividades de matemática, de biologia, de história...” Ou: “Eu sou um professor interdisciplinar, nas minhas aulas eu gosto sempre de abrir um espaço para falarmos de outras coisas”. Nos dois exemplos anteriores não houve interdisciplinaridade. Cada área do saber poderia estar presente no mesmo momento, porém, elas não compartilhavam de um ponto comum (cada uma trabalhava seus temas e métodos separadamente) e, desta forma, não proporcionavam uma aprendizagem dinâmica e instigante, muito menos proporcionavam a visão das coisas de uma forma interligada e complexa. Por muito tempo se considerou que ensinar era basicamente “transmitir” conhecimentos. Essa forma de abordagem educacional tinha como pressuposto que o conhecimento era “estático” (que era algo acabado) e não um “processo”. Também tinha como pressuposto que a aprendizagem, pelo estudante, era algo “mecânico”, uniforme (linear) e igual para todos. Este tipo de educação não desenvolve, ou mesmo possibilita, nem a capacidade de pensar e nem a autonomia do educando e, muito menos, o prepara para os desafios do mundo. Este tipo de ensino se refere à aprendizagem não como um processo interativo e dinâmico, mas, como algo condicionado e metódico. Desta forma, tal pedagogia pode acabar eliminando a iniciativa e o interesse do estudante pelo conhecimento, pode, também, desrespeitar os limites e o alcance de sua aprendizagem. E mais, este tipo de ensino pode, até mesmo, moldar e aprisionar o educando a um tipo pré-determinado de comportamento social, ao invés de proporcionar exatamente o contrário: uma aprendizagem integral e ampla capaz de instigar o educando a uma postura crítica e autodeterminante. Como estamos observando, a educação é algo complexo e está relacionada com o nosso conhecimento, com a sociedade e com os nossos projetos sobre o mundo. A partir destas referências, é que são traçadas as formas e as estratégias do ensino escolar, bem como, a partir de um projeto social de educação é que as propostas de ensino são sistematizadas e estruturadas. Assim se dividem e se distribuem as áreas do saber na forma de disciplinas. Desta maneira se sistematizam e se organizam as disciplinas na forma de currículo escolar, onde se privilegiam ou não determinadas disciplinas na hora da escolha. Portanto, é desta forma também que pode surgir, ou não, uma estrutura fragmentária de ensino onde, às vezes, há pouca relevância para a aprendizagem do educando, de forma que este, não raro, não encontra nenhum sentido na educação e acaba perdendo o estímulo e o interesse de estudar. Você acha que um currículo rígido e inflexível é adequando a uma aprendizagem compatível com a nossa sociedade? E quanto à realidade de alguns brasileiros, como por exemplo, as comunidades indígenas, as comunidades costeiras e ribeirinhas de pescadores, as comunidades de periferia urbana, as comunidades do campo e de assentamentos rurais, etc?

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Pelo que vimos até aqui, como você percebe a prática docente, de acordo com o conceito da interdisciplinaridade? Como podemos pensar a interdisciplinaridade? Uma coisa deve ficar clara, interdisciplinaridade15 não significa eliminar as disciplinas escolares e nem exigir um professor “pluri-especialista”. Interdisciplinaridade significa a possibilidade de se oferecer vários pontos de vista na abordagem de um fenômeno (de um conteúdo) e, assim, possibilitar ao educando a percepção de que as coisas se relacionam umas com as outras, de forma que ele possa adquirir uma visão de conjunto, uma visão complexa, o primeiro passo para uma constituição de sentido e para uma postura consciente e crítica. Você quer um exemplo de interdisciplinaridade? O que você acha destes fascículos que você está lendo agora? Eles são frutos de um trabalho interdisciplinar! Fruto do trabalho de uma equipe de estudiosos de várias áreas do conhecimento. Nós temos um tema comum: a educação. Uma idéia comum: a educação como um processo complexo. Um objetivo comum: compreender a educação enquanto construção de autonomia. Na realização deste estudo nós adotamos várias formas de abordagem sobre o tema, que compreendem as várias áreas do conhecimento: a geografia (“mapas”), a história (“memórias”) e, as ciências sociais e a filosofia (“mentes”). Não estamos aqui “transmitindo” conhecimento a você, mas sim, instigando-o a pensar conosco, a interagir, a contribuir e a construir seu próprio conhecimento e sua própria autonomia. Estamos ressaltando a construção de conhecimento através de “trocas”. Não estamos lhe impondo (ou trazendo) a verdade absoluta sobre a educação, mas, tão somente tentando contextualizá-la e enfatizá-la como um processo complexo e interdisciplinar para a construção da autonomia. 3.3 Como pensar as novas tecnologias? A nossa intenção neste capítulo não é tratar extensivamente as chamadas “tecnologias educacionais”, enumerando-as e analisando-as pontualmente. Delimitaremos nossa análise a uma abordagem crítica sobre as tecnologias, ou seja, à reflexão sobre até que ponto elas podem nos auxiliar no ensino/aprendizagem. MENTES: nas mãos de quem procuraconhecimento está o mundo

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Este é um tema bastante atual e de crucial importância para qualquer discussão sobre a educação, principalmente por vivermos em um mundo dito “tecnificado” ou “tecnológico” – fato este que faz com que a educação no século XXI não possa negar a grande contribuição que estas tecnologias podem trazer. No entanto, o que é tecnologia? As tecnologias são aplicações da ciência para satisfazer às necessidades e interesses humanos. Portanto, elas não têm um fim em si mesmo, o seu valor e a sua utilidade são atribuídos pelo homem. Afirmar que a tecnologia (ou as tecnologias) não tem um fim em si mesmo, significa dizer ela pode ser boa ou má, depende da utilidade e da finalidade que nós damos a ela. Devemos sempre ressaltar que o foco de todas as nossas atividades deve 15 Edgar Morin desenvolve uma interessante proposta de interdisciplinaridade no seu texto “Os setes saberes necessários à educação do futuro”. Nele, o autor discute as grandes barreiras e os erros que a educação deve superar. Um destes erros é a apresentação dos conhecimentos pelas disciplinas escolares: de forma fragmentada, sem contextualização e sem ligação como os outros saberes.

ser o homem. Os valores atribuídos às coisas são valores obtidos apenas por participarem do mundo humano. A partir desta perspectiva, devemos ver as tecnologias como “ferramentas”. Não devemos “endeusá-las” ou “mitificá-las”. Um computador não é exclusivamente uma “maravilha“ da ciência, ele é uma ferramenta que serve ao homem. O valor dele está, não em ser um computador, mas em ser útil ao homem, em ser uma ferramenta capaz de ter uma boa utilidade, como, por exemplo, no auxílio à educação. Uma vez que definimos um pouco o que são as tecnologias, o que poderíamos dizer por “novas”? Ou melhor, será que o fato de ser novo tem importância? O que podemos chamar de novo? Seriam a informática e o computador com seus “softwares”, jogos, textos e figuras animadas, sons e imagens, internet, hipertextos, cursos “on-line”? E, o que é “velho”? Seria a TV, o cinema, o vídeo, o rádio, o correio, a fotografia, os meios de comunicação de massa...? Em educação é difícil definir o que é novo e o que é velho. Isto depende muito da realidade de cada lugar. Há, por exemplo, escolas super modernas, conectadas com as novas tecnologias e com excelentes professores. Nelas o computador e a internet, por exemplo, são coisas comuns. Mas, há também escolas que não são tão modernas, e que também possuem excelentes professores, onde, o computador e a internet são algo de extremamente novo e raro. De acordo com o exemplo dessas duas realidades diferentes, qual delas é a melhor? Qual delas pode educar melhor, preparar os jovens para o mundo? De onde vem o êxito da educação? Estas são questões bastante relevantes e passíveis de uma longa discussão. Entretanto, para concluirmos nosso estudo, vimos que é evidente que não podemos negar que vivemos em um mundo tecnológico, e, a educação, como preparação dos jovens para o mundo e os seus desafios, tem a obrigação de conhecer e de situar-se neste mundo. O problema não é a tecnologia em si, mas as diversas formas de usá-la. Dependendo de seu uso, as tecnologias podem se tornar grandes ferramentas (até mesmo indispensáveis) para a educação, ferramentas essas capazes de trazer grandes vantagens e contribuições. Quem pode negar a importância dos computadores para as escolas? A questão que se coloca é o cuidado em não nos deixarmos levar pelo “endeusamento” das tecnologias apresentado, principalmente, pelo “mercado”, pois, para este, as tecnologias são meras “mercadorias”. E, como mercadorias elas devem ser vendidas de qualquer modo, não importa para quê e como. Não devemos ter uma atitude ingênua frente às tecnologias (e ao mercado também), mas sim, uma atitude crítica. Caso contrário, corremos o risco de a própria educação ficar submetida (se é que já não está) às leis do mercado, de ela poder virar um “produto”, uma “mercadoria”. Se isto ocorrer, a educação pode desvirtuar-se de seu ideal e acabar adquirindo os mais diversos valores e resultados, podendo, até mesmo, fugir ao seu papel central e elementar: o papel humanizador.

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