Mapas sonoros para pesquisa e arquivo

June 27, 2017 | Autor: Claudia Holanda | Categoria: Sound and Image, Soundscape Studies
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Mapas sonoros: pesquisa e arquivo Claudia Holanda http://bug404.net/ Em setembro de 2013, a revista americana Wired chamou a atenção para o crescente número de arquivos sonoros que estavam sendo carregados na web. O título da matéria assinada por Clive Thompson era quase uma convocação: “Listen up! Let’s make the web a louder place”. Um dos destaques do texto é o London Sound Survey, uma intensiva e crescente coleção de gravações sonoras de lugares, eventos e dia a dia da capital inglesa, sob licença Creative Commons. London Sound Survey - O site é uma iniciativa de fôlego e praticamente solitária de Ian Rawes, criador e responsável pelo portal, com sons de vários territórios e épocas de Londres.

Há sons da BBC Radio Broadcasts entre as décadas de 20 a 50, sons dos canais e rios, de ações cotidianas, de atmosferas, sons de fundo e incidentais de toda Londres. A lista é imensa e só cresce. A página abriga ainda trabalhos realizados por outras pessoas, como o Andre’s London. André Louis é cego e captura sons da cidade e das coisas. Ele diz que o som é o que cerca sua vida e, por isso, grava todo tipo de som para mantê-los para posteridade.

No sound survey há também referências históricas textuais sobre o som da cidade desde o século XI até o século XX. Trata-se de uma coleção de descrições a partir de fontes primárias, como autobiografias, diários e leis, bem como romances retratando determinado período. Há ainda um acervo sonoro de gravações originais da rádio BBC desde os anos 1920 aos anos 1950. Eles trazem à vida as vozes das ruas e as circunstâncias da época. Há ainda mapas antigos da cidade de Londres mostrando as mudanças na ocupação do solo.

Depois de gravar mais mil fragmentos do som urbano de Londres, Ian Rawes vem notando a tendência de que enquanto os zumbidos dos carros e aviões crescem, a

quantidade de vozes humanas ouvidas na rua vem diminuindo. Rawes diz na Wired que talvez isso se deva à chegada de novas lojas que afugentam os vendedores ambulantes. Aliado a isso, sua suspeita é a de que sociedades mais ricas e “organizadas” tendem a reduzir os sons em espaços públicos. Estando certo ou não, Rawes e tantos estão fazendo da escuta uma forma de compreensão do mundo.

British library: mapas sonoros para criar e difundir acervos - em se tratando de arquivos e mapas sonoros, é interessante conhecer o projeto da biblioteca britânica: British LIbrary Sound (http://sounds.bl.uk/). São mais de 60 mil registros de música clássica e popular, depoimentos (sobre arte, história da gravação sonora e de sobreviventes da guerra), gravações de ambientes urbanos e naturais. Há ainda os diálogos do Listening Project, iniciado em 2012, onde pessoas foram convidadas a dividir uma conversacom amigos próximos ou parentes com objetivo de perceber como são as relações hoje em dia através dos discursos. A biblioteca hospeda atualmente nove soundmaps, o que faz pensar sobre os usos dessa ferramenta e como o som pode ser pesquisado e entendido. Os mapas disponíveis na página são: Accents & Dialects; Uganda recordings; Wildlife Recordings; Soundscapes; Music from India; Jewish survivors of the Holocaust;Traditional music in England; Your accents e UK Soundmap. Em parceria com oNational Trust, National Trust for Scotland e audioBoom, estão produzindo o mapa sonoro da costa marítima do Reino Unido, o Sounds of our Shores. O UK soundmap se declara como o primeiro mapa sonoro da nação. A instituição pediu para que as pessoas gravassem sons do ambiente, seja em casa, no trabalho ou em momentos de diversão. Mais de dois mil registros foram enviados por cerca de 350 contribuidores entre julho de 2010 a julho de 2011, quando encerrou o período de coleta sonora, pois a ideia era formar uma coleção permanente e acessível de como a Grã-Bretanha soou em 2010 e 2011. Ian Rawes – autor do London Sound Survey citado acima – trabalhou no UK sound map. Segundo suas observações, cerca de 80% das gravações foram feitas usando telefones celulares. Os outros 20% envolvem uma gama de dispositivos com gravadores digitais de áudio portáteis. Uma parte importante do trabalho foi ouvir

cada gravação do início ao fim e detalhar onde e quando cada gravação foi feita, o dispositivo de gravação utilizado, e sobre o que é a gravação, o que tornou possível compilar estatísticas descritivas que resumem o conteúdo do Reino Unido Soundmap. Ainda segundo Rawes, a voz humana é o tipo de som mais comum, aparecendo em cerca de metade de todas as gravações. O ruído do tráfego aparece em um quinto das gravações. Pássaros são ouvidos em 16%, passos em 15%, sirenes, sinais sonoros e sinos em 11%, e música ao vivo em 8%. Dos quatro elementos, água exerceu o maior fascínio para os contribuintes, e está representado no UK Soundmap em todos os seus estados. O mapa que retrata sotaques da língua inglesa – your accents – é resultado da mostra “Evolving English: one language, many voices”, onde pessoas de várias partes do mundo, inclusive Brasil, gravaram trechos de textos e palavras em inglês. Os participantes podiam ler a história infantil Mr. Tickle (Roger Hargreaves, 1971) ou uma lista de seis palavras, para ajudar a capturar os sotaques do inglês contemporâneo. Relativo ao mesmo tema, há ainda o mapa sonoro Accents & Dialects, reunindo gravações da BBC Voices, Millennium Memory Bank, Survey of English Dialects and Berliner Lautarchiv British & Commonwealth recordings.

Impossível não ser tocado ao mergulhar nas vozes de judeus que sobreviveram ao Holocausto no Jewish survivors of the Holocaust, narrando experiências no gueto, nos campos de concentração e histórias de fuga. Os áudios são acompanhados de uma ficha técnica com uma curta biografia do entrevistado e um resumo do relato. Essa

coleção é formada por entrevistas de dois projetos de história oral: the Living Memory of the Jewish Community e the Holocaust Survivors’ Centre Interviews.

Todos os mapas seguem o mesmo design e utilizam a base cartográfica do Google maps. O que difere entre eles além da temática é o processo de produção e compilação dos registros sonoros. Os mapas sonoros são usados nesses exemplos como uma plataforma para criar, registrar, organizar, difundir e também visualizar acervos, itens importantes para instituições que tratam de memória como é o caso da biblioteca britânica.

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