Maria Graham Callcott: revisão bibliográfica e considerações sobre sua escrita

May 29, 2017 | Autor: Nara Marques Soares | Categoria: English Literature, Travel Writing, Travel Literature
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Maria Graham Callcott: revisão bibliográfica e considerações sobre sua escrita Por Nara Marques Soares Pesquisadora Capes – UFSC (2015)

Este artigo é uma apresentação de alguns resultados de minha pesquisa de Pós-Doutorado na Royal Holloway – University of London, em 2015, possibilitada por financiamento da CAPES (bolsa Pós-doutorado no exterior) e apoiada pelo Nulime (UFSC). Meu objetivo é a publicação de um livro biográfico sobre Maria Graham.

Lady Maria Graham Callcott ficou conhecida com escritora viajante do século XIX e ao final de sua vida contava com uma obra de 16 livros escritos (dois deles publicados após sua morte). No Brasil, onde esteve três vezes, ela ficou conhecida também por ter sido professora de Maria da Glória, futura rainha de Portugal. Maria Graham era excelente desenhista e gravurista e sua obra conta com inúmeros trabalhos artísticos, muitos deles ainda não publicados. Além disso, ela foi coletora de exemplares de botânica e escritora de livros de arte, história e literatura infantil. Podemos ver uma obra diversificada e considerável para uma escritora mulher de uma época em que a autoria assumidamente feminina não era muito comum. A proposta deste trabalho é fazer uma revisão bibliográfica da autora e, ao final do texto, tecer algumas considerações sobre a sua escrita. ***

Em 1812, Maria Graham publicou seu primeiro livro, um diário que fora resultado da viagem que fez em 1809 com seu pai para a Índia. Journal of a Residence in India1 foi publicado em Edimburgo e teve uma segunda edição no ano seguinte, 1813. Embora a escrita fosse ainda iniciante – ela estava com 24 anos na época – já apresentava traços de responsabilidade histórica e de respeito às diversidades culturais

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Journal of a Residence in India. Edinburgh: Archibald Constable and Company. 1812.

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de um país completamente distinto para ela. Traços que Maria Graham manteria em todas as suas escritas de viagens. Foi ali, com certeza, por ter sido sua primeira grande viagem, que ela aprendeu como conviver em longas viagens marítimas e como fazer, na prática da escrita, as anotações de campo. Por exemplo, ao assistir a um ritual, conversou sobre ele com pessoas nativas, com os estrangeiros que viviam no local para captar estas diferenças e depois buscou maiores informações em livros, nas bibliotecas locais, muitas vezes bibliotecas particulares. Pelo menos três pessoas foram de fundamental importância nesta viagem: seu pai, seu futuro marido Thomas Graham e um grande amigo, James Mackintosh (que estava morando em Bombaim). Além deles havia no grupo seus irmãos e um parente mais íntimo chamado J. Glennie, que depois viajaria com ela para o Chile. Durante quase dois anos, com o grupo de ingleses que fazia a viagem, ela visitou templos e conheceu lugares sagrados, conheceu muito de perto a cultura e as religiões de vários locais, teve contato com uma criança sagrada (um menino de 12 anos, reencarnação de um ser sagrado hindu), andou de elefante, teve provavelmente as primeiras notícias sobre a história da colonização portuguesa (que na época das explorações marítimas invadiram terras na Índia e no antigo Ceilão) etc. Ela chegou em Bombaim em agosto de 1809 e voltou para a Inglaterra em 27 de junho 1811, dividindo uma cabine com mais três tripulantes homens. Neste livro há excelentes desenhos de sua autoria das paisagens e dos locais sagrados.

Gravura de Maria Graham para o livro Journal of a Residence in India. Edinburgh: Archibald Constable and Company. 1812.

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O livro também foi publicado em francês em 1818, traduzido por ela mesma2. Em 1814, ela publicou Letters on India; with Etchings and a map3. O livro é uma continuação mais organizada de seus escritos sobre a Índia, com capítulos bem definidos principalmente sobre a cultura hindu, abordando assuntos como história, geografia, escrita, literatura etc. No prefácio, ela comenta que devido à boa recepção do Journal pelo público, ela organizou um tipo de guia para futuros viajantes ao país. Porém, estes tipos de guias do século XIX pouco têm em comum com os guias turísticos atuais. Para se ter uma ideia desta diferença, basta citar que este livro é em forma epistolar (daí o título de Letters). Entre a escrita do Journal e a das Letters, houve uma mudança na organização e na clareza da apresentação dos assuntos. Ambos são escritos empolgados da escritora iniciante, porém o primeiro livro ainda mantém certos espantos diante das diferenças culturais. Ainda se trata de um testemunho de reação e de julgamento de uma moça em sua primeira viagem e traz a mistura de assuntos. (O que, pelo lado espontâneo, o torna tão interessante.) No segundo, parece-me haver um crescimento – um tempo para refletir sobre o que viu e o que deve contar –, provavelmente devido a críticas ao primeiro livro e à maior consciência sobre os assuntos tratados. Depois desta reflexão, o resultado foi um livro que, além do caráter educacional, é também de reivindicação ao respeito cultural nas futuras explorações e no convívio dos ingleses com os nativos daquele país. I perfectly agree with you that many of the evils complained of in the intercourse between the European residents and the native inhabitants of India, are owing to the want of mutual understanding, and of mutual knowledge. The happiness of so many millions of our fellow-creatures, now brought still nearer as our fellowsubjects, cannot be a matter of indifference. But we can scarcely be interested for those whom we do not know, and I have, therefore, always thought, that it would be an acceptable service to collect from the more elaborate works on India such a popular view of the history, literature, science and manners of that country, as should excite an interest in its inhabitants; and by exhibiting a sketch of its former

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Journal d'un séjour fait aux Indes orientales, pendant les années 1809, 1810 et 1811. Traduit de l’anglois de Madame Maria Graham. Genève: J.J. Paschoud. 1818 3

Letters on India; with Etchings and a Map. London: Longman, Hurst, Rees, Orme & Brown. 1814.

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grandeur and refinement, restore it to that place in the scale of ancient nations, which European historians have in general unaccountably neglected to assign to it.4

Mais uma vez, os excelentes desenhos (anunciados no título) são de sua autoria. Ela agradece no prefácio ao amigo e parente, J. D. Glennie, que viajou com eles e que guardou alguns destes desenhos (dela e dele próprio), pois muitos outros se perderam. Este amigo foi seu companheiro também na viagem ao Chile, e para poder cuidar dele, que ficou bastante doente durante a viagem de retorno, Maria Graham instalou-se no Rio de Janeiro por alguns meses. Em outubro de 1814, saiu uma resenha crítica sobre o livro em The Gentleman’s Magazine. Entre outras coisas, a resenha aponta o fato exemplar de sua busca em completar um trabalho de pesquisa, mesmo já tendo conquistado a fama de escritora. Mrs Graham, having secured the approbation of the public by the work mentioned in the title-page, might, without any imputation of vanity, have appeared again as an authoress on a subject which she had already happily illustrated; but such is the modesty and apprehension ever attendant upon superior abilities, that she conceives an humble appeal necessary where others deem it superfluous. Not that we would be understood to imply that an author should repose, wholly upon previous success, and thus become careless of ensuring it in future; on the contrary, we recommend the example of Mrs Graham, who, though already approved as a writer, endeavours to make each new labour the foundation of her fame. Letters on India; by Maria Graham, Author of Journal of a Residence in India With Etchings and a Map.5

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Idem, p. 1-2. Uma tradução minha: “Eu concordo perfeitamente com você que muitos dos males imputados na relação entre os residentes europeus e os habitantes nativos da Índia, são devido à falta de compreensão e de conhecimento mútuos. A felicidade de tantos milhões de nossos semelhantes, agora trazidos para ainda mais para perto como nossos companheiros, não pode ser uma questão de indiferença. Mas não nos interessamos por aqueles que não conhecemos, e eu, portanto, tenho sempre pensado que seria bom conhecer, a partir dos trabalhos mais elaborados sobre a Índia, [para ter] uma visão popular da história, literatura, ciência e costumes daquele país, e estimular o interesse em seus habitantes; e exibindo um esboço de sua antiga grandeza e requinte, restaurá-lo àquele lugar na escala das nações antigas, que historiadores europeus têm, em geral, inexplicavelmente negligenciado”. 5

In: The Gentleman’s Magazine: and Historical Chronicle. From July to December. By Sylvanus Urban. 1814. “Review of New Publications”, p. 357. Tradução minha: “Sra Graham, já tendo assegurado a aprovação do público pelo trabalho mencionado na página de rosto [Journal of Residence], pode, sem qualquer imputação de vaidade, aparecer novamente como uma autora [autoridade] sobre um tema que ela já tinha alegremente ilustrado; mas tal é a modéstia e apreensão sobre suas habilidades superiores, que ela concebe um apelo humilde necessário para aquilo que os outros escritores julgam supérfluo. Não nos é incompreendido que um autor pare inteiramente sobre seu sucesso anterior, e assim torne-se descuidado no futuro; ao contrário, nós recomendamos o exemplo da Sra Graham, que, embora já homologada como escritora, se esforça para fazer com que cada novo trabalho seja fundação de sua fama”.

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Muito interessante notar que no sumário da revista o único nome feminino seja de Mrs Graham (p. 357). A outra autora citada nesse sumário, com o texto na página 360, não tem a identidade revelada pelo nome, pois, como era costume na época, a autora prefere não se identificar usando apenas o famoso “by a Lady”: “Letters from a Lady...”.

Poucos anos depois, em 1819, Maria Graham fez uma viagem de passeio com seu marido Thomas Graham à Itália, durante a qual ela elaborou dois livros e uma série de desenhos. Em Memoirs of the Life of Nicholas Poussin6, de 1820, Maria Graham fez uma biografia do artista francês que viveu por muitos anos na Itália. Nesta biografia, ela apresenta como mote a ideia de que todo artista, independentemente do mecenato, deve ter liberdade de criação. É curioso ver o assunto surgir nas entrelinhas da biografia, em forma ensaística, que preza não apenas os dados e a crítica ao trabalho do artista. Escrevendo sobre as condições favoráveis que Poussin teve em sua vida, ela ensaia um pensamento otimista e incentivador que pudesse vir a servir para reflexão de artistas, principalmente para os artistas ingleses que viviam na época dilemas ligados ao mecenato e, quase sempre, às posições políticas bem definidas destes mecenas. A ideia principal deste ensaio então foi de pensar que a arte está ligada à política, mas que a única política válida na arte é aquela que dá liberdade ao artista; que o artista deve ser livre para criar; e que os artistas estão livres para escolher (aceitar ou não) as condições (éticas) de um mecenas. Assunto que estava sendo bastante debatido na época, principalmente depois dos pensamentos iluministas e de seus seguimentos na Escócia, Irlanda e Inglaterra nos anos seguintes.

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Memoirs of the Life of Nicholas Poussin. London: Longman, Hurst, Rees, Orme & Brown; Edinburgh: A. Constable & Co, 1820.

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Em um momento da biografia, Maria Graham faz uma observação sobre como os italianos tratam os artistas e como Poussin havia se beneficiado disso: The Italians have of all nations the least affectation. What they feel they express, to please themselves, without any consideration of what construction others may put on their actions. In France, where vanity, and in England, where pride, induces every man to consider and foresee his neighbour's judgment, it is difficult for an artist, whose reputation is not already established, to arrive at that intercourse with polite or learned society, which ought to form a part of this education. The Italian painters, on the contrary, were courted into such society. Michel Angelo, in the palace of the Medici, while he received their patronage equally with Politian, was equally treated as their friend and companion; and that nothing vulgar ever enters into his conceptions, may, in part, be attributed to his constant intercourse with the politest and most learned men of this time.7

Ela defende, até certo ponto, que grandes obras artísticas italianas foram feitas durante a república romana, porque o povo italiano desde sempre compreendeu melhor a noção de democracia e de liberdade de expressão também no âmbito das artes e de produções encomendadas, tanto por religiosos quanto pelos governantes. O ponto não explícito pela autora, mas que pode esclarecer melhor, é que os governantes italianos compreenderam que a afinidade de um mecenas com um artista num plano ético, dava7

Memoirs of the Life of Nicholas Poussin. London: Longman, Hurst, Rees, Orme & Brown; Edinburgh: A. Constable & Co, 1820. p. 25-26. Tradução minha: “Os italianos, de todas as nações, têm a menor afetação. O que eles sentem, eles expressam, para agradar a si mesmos, sem qualquer consideração com o que os outros possam pensar sobre suas ações. Na França, onde a vaidade, e na Inglaterra, onde o orgulho induz cada homem a considerar e prever o julgamento de seu vizinho, é difícil para um artista, cuja reputação não estiver estabelecida, se relacionar com a sociedade educada ou culta, [sociedade] a qual deveria ajudar o artista a formar parte de sua educação. Os pintores italianos, pelo contrário, foram cortejados em tal sociedade. Miquelângelo, no palácio dos Medici, enquanto ele recebeu seu mecenato, assim como recebeu Politian [Angelo Poliziano], foi tratado igualmente como seu amigo e companheiro; e se nada vulgar nunca entrou na suas concepções artísticas, pode, em parte, ser atribuído a seu convívio constante com os homens educados e mais eruditos desta época.”

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lhe liberdade ao plano estético. Por isto a importância do convívio e do “cultivo” constante do artista naquela sociedade, para que ambas as partes estivessem abertas e preparadas para mudanças éticas e estéticas. Kant defendeu alguns anos antes, em Resposta à pergunta “O que é o Esclarecimento?”,8 algo muito próximo disso, porém que não se limitava apenas ao plano artístico. Ele defendia que a monarquia de Frederico II deveria servir de modelo para governos que buscavam o esclarecimento de seu povo. Nesta época, Kant viu que uma monarquia como a de Frederico seria o governo ideal para o mecenato, justamente por pensar mais no Esclarecimento do aprendiz (político, escritor, artista, religioso etc) do que em outro motivo imposto pelos tutores. Ele desenvolve no texto, por exemplo, o caso de um religioso: ele deve ser educado com base naquela religião, ter tutores que ensinam dentro daquelas doutrinas, porém sua educação deve tender ao esclarecimento, ou seja, deve ser tal que ele possa pensar por si mesmo, possa questionar as doutrinas, e que nada o obrigue a manter a tradição ou conservar a instituição como ela é. Ele deve estar preparado para deixar de ter tutores, sair da minoridade e propor mudanças, caso necessário, ou até mesmo abandonar seu posto, caso não queria participar mais daqueles fundamentos. Por isto é fundamental pensar que o contexto político em que Maria se encontrava nos anos 1820 – no convívio com amigos e professores que buscavam alternativas ao conservadorismo monárquico – já apresentava outras nuances e problemas referentes aos patrocínios, principalmente pela política do parlamentarismo inglês e pela disputa entre conservadores (Tories) e liberais (Whigs). Então podemos imaginar que o debate da época era sobre a dificuldade que alguns artistas enfrentavam quando seus mecenas eram de tendências diferentes das suas. Muito provavelmente, nem haveria um contrato; mas caso houvesse, o artista era obrigado a produzir algo que não cabia em suas convicções estéticas. Ou seja, por dificuldades financeiras, o artista inglês muitas vezes precisava se submeter às ordens de um mecena com ideias éticas opostas às suas. Também por causa disso, há uma grande ênfase na biografia do artista para a importância que ele passou a dar ao estudo entre arte e ciência. Escreveu ela que: “no 8

Kant, Immanuel. “Resposta à pergunta: O que é o Esclarecimento?” (5 de dezembro de 1783). Traduzido por Luiz Paulo Rouanet. Disponível em: http://www.uesb.br/eventos/emkant/texto_II.pdf

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seu retorno a Paris, ele dedica-se com mais afinco ainda ao estudo das ciências conectadas com sua arte, – anatomia, ótica, e perspectiva...”9. Na época, a ciência ainda engatinhava buscando objetos e métodos para ampliação de campos de conhecimento. Começava um estouro de explorações para conhecimentos das leis da natureza, da física, geologia etc, reflexo também do Esclarecimento alemão (Aufklärung). Não foi uma coincidência que ela tenha ido ao encontro deste artista justamente quando seus amigos artistas buscavam esta união entre ciência e arte; quando os artistas procuravam o tal sonhado “esclarecimento” tanto no âmbito pessoal quanto no âmbito coletivo. Obviamente, Maria Graham conheceu mais profundamente as obras de Poussin quando esteve em Roma, cidade onde o artista viveu e trabalhou por longos anos. A leitura das obras de um artista francês que teve sua formação na Itália feita pela escritora inglesa é também bastante significativa para refletirmos sobre o nacionalismo, o estrangeirismo, as viagens de formação, a quebra de fronteiras etc.

Depois desta viagem à Itália, ela publicou, também em 1820, o livro Three Months Passed in the Mountains East of Rome, during the Year 181910, que teve uma segunda edição já em 1821. Este livro é resultado da viagem que ela fez com o marido Thomas Graham e com o grande amigo Charles Lock Eastlake11. O casal ficou na Itália durante três meses; Eastlake continuou em Roma, onde morou por mais 14 anos. A viagem fora planejada já com o intuito da produção de um livro a partir de uma pesquisa sobre o povo que vivia nas montanhas vizinhas a Roma (costumes, histórias locais etc). A pesquisa foi feita pelos três viajantes, escrita por Maria Graham e ilustrada por Eastlake, que na época estava com 26 anos. Ele desenhou e pintou algumas paisagens e pessoas a partir da pesquisa da escritora. Foi uma parceria que uniu os dois artistas principalmente pelo desejo aventureiro e pelo desejo de conhecer o interior da Itália e seu povo, tentando se diferenciar um pouco das publicações da época, que 9

Graham, op. cit. p. 15 (tradução minha).

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Three Months Passed in the Mountains East of Rome, during the Year 1819. London: Longman, Hurst, Rees, Orme & Brown; Edinburgh: A. Constable & Co, 1820. 11

Charles Eastlake foi o primeiro diretor da National Gallery. Há cartas trocadas entre ele, Maria Graham e Thomas Lawrence, que também esteve na Itália na mesma época. Thomas Lawrence foi depois o pintor real e presidente da Royal Academy of Arts. As cartas estão no acervo da RAA e os assuntos variam entre convites sociais, assuntos de trabalho e algumas sobre Maria Graham estar mandando material artístico, como pigmentos, para os amigos pintores na Itália.

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apresentavam pesquisas de descrição da Itália através da iconologia dos grandes nomes da pintura. A ideia era ir ao interior e procurar aspectos culturais dos camponeses. Porém, para surpresa dos três, além de camponeses, eles encontraram pelo caminho os Banditti, grupos de revoltosos contra o governo. O “pequeno livro”, como foi descrito pela escritora no prefácio, tem mais de 300 páginas e, ao final, quatro apêndices com histórias coletadas por sua pesquisa em campo. Depois da viagem à Itália e da publicação dos livros, Maria Graham acompanhou seu marido Thomas Graham em uma viagem ao Chile. Foi nesta viagem que Thomas adoeceu e morreu antes de chegarem ao destino final. Maria Graham ficou sozinha no Chile e decidiu dedicar-se à pesquisa naquele país, algo que provavelmente ela já havia planejado antes da surpresa da viuvez. Ela repetiu e aprimorou a escrita de viagem exploratória, dando ênfase à pesquisa histórica e cultural. Na ida e na volta, ela passou pelo Brasil. Desta viagem, entre 1822 e 1823, ela escreveu Journal of a Residence in Chile, during the Year 1822; and a Voyage from Chile to Brazil, in 182312, publicado em 1824 e com segunda edição já em 1825.

Primeira página da primeira edição

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Journal of a Residence in Chile, during the Year 1822; and a Voyage from Chile to Brazil, in 1823. London: Longman, Hurst, Rees, Orme & Brown; and John Murray,1824.

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Se no Diário de uma viagem à Índia a escritora ainda apresentava uma linguagem insegura (como alguns críticos comentaram na época), depois da viagem à Itália e de outros escritos, e após viajar para o Chile, ela já ganhara experiência na elaboração textual de seus diários, algo que irá caracterizar sua escrita como historiadora. A partir de então, ela irá sempre, ao falar de outra nação, introduzir uma breve história da formação da nação antes de iniciar as suas “aventuras diárias” e suas pesquisas. Ao desembarcar no Chile, mais precisamente em Valparaiso, ela, recém viúva, foi muito bem recebida pelas pessoas do local, que a ajudaram a encontrar uma casa simples, forneceram-lhe móveis e alguns confortos.

Vista da janela da casa da escritora em Valparaiso. Desenho de Maria Graham.

Ela teve a oportunidade de conhecer outras cidades próximas e vários costumes levados da Espanha, além de costumes dos índios e da população local. Como no trecho abaixo: At night the young ladies Catapos and their brother, Don Jose Antonio, danced for me the Cuando, a national dance. It is performed by two persons, and begins slowly like a minuet. It then quickens according to the music and song, which represent a sort of loving quarrel and final agreement; the skill of the dancer 11

consisting in holding his body steady, beating the ground with inconceivable quickness with his feet in a measure called zapatear (to shoe).13

Ainda em sua estadia no Chile, Maria passou por momentos de angústia durante um terremoto, que no entanto iriam lhe render uma publicação na revista da Sociedade Geológica de Londres e posteriormente uma grande discussão entre os membros da Sociedade. Além disso, ela estreitou laços de amizade com o comandante Cochrane e participou e documentou o momento político do país.

Foi a ida para o Chile que proporcionou à escritora conhecer o Brasil e tornar-se figura importante para a nossa história. Ela esteve no Brasil em três ocasiões: na primeira, quando estava de passagem, indo ao Chile, em 21 de setembro de 1821, na fragata Doris cujo comandante era o marido, Thomas Graham; na segunda, quando retornava do Chile em direção à Inglaterra em 13 de março de 1823, a bordo do Col. Allen, juntamente com Lord Cochrane (ela permaneceu em terra para cuidar do parente, Glennie, que havia adoecido durante a viagem); e na terceira ocasião, quando desembarcou no Rio de Janeiro contratada para ser tutora das crianças reais, em 4 de setembro de 1824. A partir destas viagens, ela escreveu Journal of a Voyage to Brazil, and Residence there, during Part of the Years 1821, 1822, 1823.14 Este é seu livro mais conhecido no Brasil e que vem servindo de referência a vários historiadores ou estudiosos do Brasil desde a época, pois ela conta sobre várias pessoas e sobre a sociedade, além de entrar em questões políticas, já que conviveu com a elite da corte. A primeira parte é um esboço da história do Brasil desde o descobrimento pelos portugueses até o momento em que a escritora conheceu pessoalmente o país. Para esta parte histórica, ela usou como referência os estudos do historiador e poeta romântico Robert Southey (1774-1843), publicados em vários volumes entre 1810 a 1819.15 Já na 13

Graham, Maria. idem. p.216.

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Journal of a Voyage to Brazil, and Residence there, during Part of the Years 1821, 1822, 1823. London: Longman, Hurst, Rees, Orme & Brown; and John Murray. 1824. A primeira tradução no Brasil foi Diário de uma Viagem ao Brasil, e de uma Estada Nesse Pais Durante Parte dos anos de 1821, 1822 e 1823, tradução e edição de Jacobina Lacombe. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1956. 15

Southey, Robert. History of Brazil. Printed for Longman, Hurst, Rees, Orme, and Brown, PaternosterRow, 1810.

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parte do diário, Maria Graham escreve sobre assuntos diversos, como por exemplo, uma conversa que ela teve com Maria Quitéria, a primeira mulher a ganhar o título de Cavaleiro da Ordem do Cruzeiro.

Maria Quitéria. Gravura feita por Augustus Earle, em 1824 para o livro de Maria Graham.

Em agosto de 1823, ela fez uma viagem de alguns dias pelos arredores do Rio, para conhecer a parte rural, a produção, algumas cidades pequenas e a vida em algumas fazendas. Robert Dampier, um jovem clérigo que desenhava, quis ir com ela. Foram noves dias de viagem a cavalo: ela, Dampier e o criado, que levava uma pequena mala de Maria Graham na garupa do cavalo. A história foi contada no Diário, e alguns de seus desenhos fizeram parte da publicação. O livro foi assim composto por várias partes que mostravam a cultura e a história do Brasil da época.

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Depois de suas viagens ao Brasil, ela retornou a Londres, onde morou o resto de sua vida. Nesta volta, Maria Graham foi contratada por John Murray em 1826 como editora da viagem de Lord Byron para as Ilhas Sanduíches (Havaí). Esta viagem foi necessária para levar os corpos do casal real havaiano que morreu durante uma visita à Inglaterra. Porém a viagem também contou como uma expedição exploratória. Para tal feito chamaram o oficial naval britânico Admiral George Anson Byron (1789-1868), 7º. Barão Byron, sucessor em 1824 do título que havia sido do primo poeta, Lord (George Gordon) Byron. Nesse livro, Voyage of H. M. S. Blonde to the Sandwich Islands, in the years 1824-1825,16 Maria Graham fez bem mais do que o trabalho de editora tal qual conhecemos atualmente. Na verdade, ela estaria bem mais para uma ghostwriter, pois ela coletou uma série de informações, de diferentes fontes, para escrever a história. O livro não é assinado por ela – nem como organizadora, nem como editora, – porém não houve segredo nesta autoria; e algumas críticas e resenhas foram publicadas citando seu nome. Muito interessante é a opção pelo uso da 1ª. pessoa do plural para a escrita, já que algumas partes foram compiladas de três diários diferentes: do comandante, do capelão e do desenhista a bordo, ou seja, Robert Dampier, o amigo que viajou com ela por nove dias pelo interior do Rio de Janeiro. Quando o HMS Blonde passou pelo Rio de Janeiro, Dampier embarcou como desenhista oficial da expedição. No retorno a Londres, ajudou Maria Graham com alguns detalhes da expedição, com seus desenhos e com algumas anotações que ele havia feito na viagem. Ela usou as anotações e desenhos de Dampier17, um diário (não bem organizado) do Capelão da expedição, Richard Bloxham, e os detalhes náuticos de bordo do Comandante Lord Byron. Além disso, ela pesquisou com diversas fontes, incluindo livros de outras expedições como a do Capitão Cook, e fez suas próprias investigações, como podemos ver em uma carta dirigida ao diretor do Museu 16

Voyage of H. M. S. Blonde to the Sandwich Islands, in the years 1824-1825. John Murray, London, 1826. 17

Segundo Kathleen Skinner, os descendentes de Dampier mantiveram este diário guardado até 1970, quando fizeram a doação ao museu do Havaí, que publicou o livro Robert Dampier, To the Sandwich Islands on HMS Blonde (Honolulu: University Press of Hawaii, 1971). Cf. Skinner, Kathleen L.. Ships, Logs, and Voyages: Maria Graham Navigates the Journey of H.M.S. Blonde. The University of Texas at Austin. May, 2010. Disponível em: https://repositories.lib.utexas.edu/bitstream/handle/2152/20989/Ships_Logs_Voyages_KL_Skinner_final. pdf?sequence=2

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Britânico18, que guardava o acervo destas expedições. Como dito anteriormente, o livro não é assinado por ela, porém há na introdução a explicação da pesquisa feita pela “editora”.

Ilustração de Robert Dampier para o livro

John Murray chamou novamente Maria Graham para outro trabalho encomendado, desta vez para uma história sobre a Espanha, que deveria ter uma escrita mais popular. O resultado foi o livro A Short History of Spain19, publicado em 1828, e que teve novas edições pelo menos nos anos de 1835 e 1840. O livro foi publicado em dois volumes, o primeiro com 430 páginas e o segundo com 600 páginas. Todo o livro é resultado de muita pesquisa da autora – que havia casado novamente e passara a assinar Maria Callcott –, principalmente feita nas bibliotecas de vários amigos que lhe

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Esta carta está no acervo da British Library e é muitíssimo interessante por que há todo um jogo de palavras da escritora para conseguir acesso aos materiais coletados na expedição. Material que era fruto de ambição dos pesquisadores na época. 19

A Short History of Spain. London: John Murray, 1828.

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emprestaram livros valiosos e raros. Na introdução, ela cita alguns dos livros pesquisados, mas comenta que a referência bibliográfica foi imensa. A ideia era reunir informações destes vários livros, quase todos em espanhol, escrevendo em inglês e com uma linguagem mais acessível para os jovens. Na introdução, a autora explica que “the following little work was written to supply the want of a popular History of Spain, such as might be put into the hands of young persons.” Esta ideia de escrever para jovens iria permanecer como característica de sua escrita a partir daí.

Em 1834, Maria (Graham) Callcott teve seu nome citado de maneira pejorativa e explicitamente agressiva (chamada de ignorante nas ciências) pelo presidente da Sociedade Geológica de Londres, George Bellas Greenough. O texto escrito por Greenough foi publicado no Athenaeum para a Sociedade e atacava Maria Graham e suas observações escritas em seu Diário ao Chile e numa carta para Mr Warburton, de 1824 (e que foi publicada nos anais da sociedade), sobre um terremoto no Chile, ocorrido quando ela morava lá em 1822. O “panfleto” A Letter to the President and Members of the Geological Society, in Answer to Certain Observations Contained in Mr. Greenough’s Anniversary Address of 1834 (London: Printed by T. Brettell) foi escrito como uma resposta em sua defesa depois da afronta e acabou rendendo um caso internacional: no ano seguinte já estava sendo impresso nos Estados Unidos em The American Journal of Science and Arts20. Posteriormente esta carta foi publicada como um apêndice na própria revista da Sociedade Geológica21. A história, principalmente por seu conteúdo controverso para a época, teve desdobramentos por anos, pois o relato de Maria Graham implicava diretamente um assunto primordial do século entre os geólogos: a rivalidade entre netunianos e vulcanianos. Muito basicamente, na época os geólogos dividiam-se em duas teorias:

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The American Journal of Science and Arts, 28 (July, 1835), pp. 236-247, com o título ‘On the Reality of the Rise of the Coast of Chile, in 1822, as stated by Mrs. Graham.’ Disponível em: http://books.google.co.uk/books?id=bl68AAAAIAAJ&pg=PA707&dq=A+Letter+to+the+President+and +Members+of+the+Geological+Society+answer+certain+observations 21

Geological Society of London, November 1833 to June 1838, Vol. II (1838), p. 706.

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uma de que a Terra formou-se a partir do fogo e de erupções vulcânicas (vulcanianos) e a outra de que se formou a partir de maremotos e deslocamentos da água (netunianos). A geologia estava recentemente sendo aceita como ciência (deixando de lado teorias bíblicas da criação do mundo), principalmente com publicações de James Hutton, Abraham Gottlob Werner, Charles Lyell e Charles Darwin. Todos esses foram contemporâneos de Maria Graham e de alguma forma (principalmente James Hutton) ligados a um grande amigo e professor da escritora, John Playfair.

Em 1835, foi publicado Description of the Chapel of the Annunziata Dell' Arena; Or Giotto's Chapel, in Padua22, livro que foi resultado de sua viagem com o marido Augustus Callcott a cidade de Pádua em novembro de 1827. O livro foi impresso por ela mesma, sem editora e com ilustrações de Augustus Callcott. A capela de Annunziata Dell’Arena foi construída pela família Scrovigno de Pádua e pintada por Giotto em 1306. No ano em que Maria Callcott a visitou, a capela estava bastante danificada pelo abandono, e no prefácio ela comenta que gostaria que aquela publicação ajudasse no interesse pela preservação23.

Afrescos de Giotto na Capela de Annunziata Dell’Arena, Pádua

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Description of the Chapel of the Annunziata Dell’Arena; Or Giotto's Chapel, in Padua. [with engravings from drawings by Sir A. W. Callcott.]. London: Printed for the author by T. Brettell. 23

A imagem da Capela é parcial e já após o restauro. Estive recentemente em Pádua e visitei a Capela. É um dos lugares mais belos que já estive; até mesmo pela simplicidade e a quantidade de afrescos. Ela foi totalmente restaurada e é um patrimônio dos mais bem preservados.

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O livro foi feito para uma leitura guiada das imagens e das passagens bíblicas de cada afresco. Nas primeiras páginas há um esboço numerando cada afresco e ao longo do livro um número e a história bíblica.

Também em 1835 foi publicado o livro de maior sucesso de Maria Callcott: Little Arthur’s History of England24. Trata-se das histórias dos reis e rainhas da Inglaterra; e depois que a Rainha Victoria foi coroada, a escritora imprimiu um pequeno livro extra com a história desta Rainha. Este livro teve mais de 70 edições, 800 mil cópias (dado da editora em 1962). A história teve tal sucesso por conta da preocupação pedagógica já demonstrada pela escritora em outras publicações, porém o mais

24

Little Arthur's History of England. http://books.google.co.uk/books?id=eczr-5VcOeMC

London:

John

Murray,

1835.

18

importante é que o livro foi a primeira abordagem da monarquia voltada exclusivamente às crianças. Até o momento, não havia nenhum tipo de história dos reis e rainhas ingleses para os pequenos leitores. Maria idealizou um personagem aprendiz chamado Arthur e um narrador mestre que conta a ele a história da realeza. A partir deste livro, a escritora dedicou-se a outras publicações infantis. No mesmo formato de escrita, em 1836, ela lançou Histoire de France du Petit Louis.25

Essays Towards the History of Painting26 foi escrito também em 1836. E uma pequena continuação, em 1838: Continuation of Essays Towards the History of Painting. Os dois livros foram dedicados também aos jovens leitores, não sendo apenas uma história da arte para jovens, principalmente por não ficar datando épocas e escolas artísticas. A escrita é mais simples, explicativa e com maior liberdade ensaística, e no último capítulo há um ensaio sobre os materiais usados nas artes durante vários tempos – aqui vemos melhor a educadora, mas também a escritora que quer fazer experiências com materiais, mostrando a química, a geologia etc. I have already shown the probable origin of painting, its earliest application to the service of religion, and its use as a method of recording events among, some nations, before the invention of alphabetical writing. (...) as soon as alphabetical writing was either invented or adopted in any country, the imitative arts became free, and improved in feeling, spirit, and expression, as well as in execution.27

A Continuação é mais um ensaio, que saiu numa segunda edição, em 1838. O livro é de grande interesse para jovens pintores. Não se trata apenas de história da arte, mas de sugestões sobre aprender e ensinar arte; sugere divisão de estudos e técnicas de aprendizagem, tudo isto com um texto fluente e espontâneo. Parece-me que é uma tentativa de livro didático para quem quiser se aventurar sozinho a aprender as artes, e também para quem quiser ensinar noções básicas de arte, já apresentando uma didática 25

Histoire de France du Petit Louis Londres: Edward http://books.google.co.uk/books?id=fCMOAAAAQAAJ

Moxon,

1836.

Disponível

em

26

Essays Towards the History of Painting by Mrs Callcott. London: Edward Moxon, Dover street, 1836, e Continuation of Essays Towards the History of Painting London: Edward Moxon, 1838. O livro que consultei na British Library pertenceu ao Rt Honble Thomas Greenville, político e bibliófilo britânico. Ele deixou mais de 20 mil volumes para a British Library. No livro tem duas cartas de Maria Graham para ele (anexadas no exemplar que ela autografou para ele. Nas duas cartas, ela agradece por livros que ele emprestou para ela e troca algumas ideias sobre arte. http://en.wikipedia.org/wiki/Thomas_Grenville 27

Callcott, Maria. idem. p. 170.

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voltada para a arte-educação. Este detalhe é bastante importante, pois Maria Graham também era artista plástica, excelente gravurista, e conviveu com grandes nomes da pintura da época. Esta didática apresentada neste livro, e em outros livros dela, mostra uma preocupação com aqueles (talvez até mais com aquelas) que não tinham acesso a escolas especializadas.

Os últimos escritos de Maria Graham Callcott foram A Scripture Herbal, duas histórias para crianças, suas Reminiscências e as Memórias de Dom Pedro I. Muito provavelmente todas estas últimas publicações foram escritas e/ou revisadas pela autora paralelamente, no curso de seus últimos 10 anos de vida. As histórias para crianças foram publicadas ainda em vida. A Scripture herbal, no ano de sua morte, e o manuscrito Don Pedro foi finalizado e revisado pela autora, porém não foi publicado em inglês até os dias atuais (apenas em Português, um século depois), e as Reminicences ficaram incompletas e foram publicadas na biografia Lady Callcott, de Rosamund Gotch, sua sobrinha-neta. Estes últimos projetos de escrita tiveram, muito provavelmente, motivações diversas, porém com uma coerência que sintetiza as crenças e saberes da escritora. Em 1841, um ano antes da publicação de A Scripture herbal, Maria Graham lançou um livro infantil com 5 histórias curtas: The Little Bracken-Burners; Palm Sunday or Little Mary’s saturday’s walk; Easter Eve or Little Mary’s second walk; Little Mary’s saturday at Home; Whitsun Eve or Little Mary’s Last Saturday.28

Em The Little Bracken-Burners, ela conta um ritual britânico em que meninas e mulheres faziam uma “limpeza” nos terrenos dos campos, retirando as samambaias 28

Palm Sunday; Or, Little Mary's Saturday’s Walk. Kensington. 1840. The Little Bracken-Burners. A Tale: And Little Mary's Four Saturdays London: John W. Parker. 1841. (Second edition, 1847; third edition, 1849; fourth edition, 1854; fifth edition, 1861). Disponível em http://books.google.co.uk/books?id=D1OfLncs_TUC

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(bracken) e queimando-as para vender as cinzas. Era comum na época a fabricação de sabonetes a partir de cinzas desta planta, que ajudavam no clareamento das roupas.29 No primeiro parágrafo, ela apresenta o espaço onde ela viu o ritual: There are still some portions of the midland of England eminently pastoral, where plains exist which are neither meadows nor fields, and hillocks which are neither sheep-walks nor gentlemen’s lawns. These lie chiefly in such parts of the old forests and chases as, either from poverty of soil or scarcity of running water, have offered no temptation to the farmer for tillage, and no promise of advantage to the parish to inclose.

Depois conta a tradição: Bracken-burning is rarely to be seen now-adays: but, five-and-thirty years ago, the travellers on the Western Road might have seen young girls employed, even so near London as Maidenhead thicket, gathering the fern or bracken, and burning it near the road-side, to use, instead of pearlash, for washing their clothes, during the ensuing season.30

E depois continua a história como um pequeno conto, com o grupo de meninas conversando sobre vários assuntos. As outras histórias trazem a menina Mary como protagonista. A menina está sempre preocupada em aprender sobre as plantas. Por exemplo, no conto “Palm Sunday” ela tem uma longa conversa sobre o porquê das palmas na cerimônia religiosa. É importante ressaltar a mistura de assuntos do interesse de Maria Graham: um estudo cultural, o folclore local (não importando onde ela estivesse) acentuando detalhes simples, o intuito religioso por trás, ligado aos estudos biológicos – com desdobramento em práticas culturais que foram adaptadas pela religião a fim de prestar algum serviço 29

O registro da escritora deste ritual foi o único registro que encontrei sobre o assunto. Pesquisei um pouco sobre este uso de samambaias em cinza e descobri, dentro das minhas limitações em estudos de química, que as samambaias possuem uma substância (ácida?) capaz de tirar manchas das roupas. Também descobri que minha avó usava cinza para branquear roupas, porém ela usava a cinza branca de qualquer madeira. 30

Callcott, Maria. The Little Bracken-Burners. A Tale: And Little Mary's Four Saturdays London: John W. Parker. 1841. (Second edition, 1847; third edition, 1849; fourth edition, 1854; fifth edition, 1861), p.34. Tradução minha: Há algumas partes de terras no meio da Inglaterra eminentemente pastorais, onde as planícies não são nem prados, nem campos; e colinas que não são nem pastagens de carneiros, nem gramados para pessoas. Existem principalmente nas partes das antigas florestas e como, quer de pobreza do solo ou escassez de água corrente, não apresentaram qualquer tentação de agricultor na lavoura , e nenhuma promessa de vantagem para a paróquia cercar. (...) A queima de samambaia raramente é vista hoje em dia: mas, 35 anos atrás, os viajantes na estrada do Oeste viam as jovens empregadas, mesmo perto de Londres como no matagal de Maidenhead, reunindo as samambaias e queimando-as perto da beira-estrada, para usar, como pérola-cinza, para lavar suas roupas, durante a temporada seguinte.

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para a saúde. Mesmo que a história não tenha o teor religioso, mantém o caráter cultural, tentando explicar ou relatar algumas tradições. Um trecho interessante (para um livro infantil) é uma longa conversa que Mary tem com a mãe sobre plantar batatas. A mãe diz: Each of your buds is called an eye; now the potato is cut into as many pieces as there are eyes, taking care not to injure the eye. The ground being properly prepared, either with the plough or spade, the potatoes are planted each in a separate hole. The planting is most conveniently done by two persons. A gardener`s line is first stretched across the seed-bed or field. Then one goes with a dibble and makes holes at equal distances all along the line, while another (generally a boy or girl) comes after and drops an eye into each hole along the line, and then another line is made till the bed is full. 31

Para Maria Graham, este contato com a natureza era fundamental, a ponto de transformar uma história infantil num manual de plantio de batatas. E então a conversa continua sobre as batatas e vegetais que são plantados desse modo.

No prefácio de A Scripture herbal32, Maria explica que queria escrever um livro com o objetivo de mostrar a natureza como criação divina, as coisas belas que deus criou. Discurso que desenvolve em outros de seus livros, principalmente nos infantis. Porém ela faz uma pesquisa antropológica e literária ao estudar e escrever onde aparecem certas plantas em passagens da Bíblia e como foram citadas no livro sagrado, trazendo informações científicas sobre cada planta citada: nome cientifico e uso medicinal (e cultural). Ainda no prefacio ela dá várias referências que teve, inclusive na infância, sobre livros que tratavam de reconhecer plantas e achados botânicos, suas origens pela história e seus usos. Alguns desses livros são: Calmet`s Dictionary; Ursini Arboretum Biblicum (1699); Hiller`s Hierophyticon (1725); Scheutzer’s Physica Sacra (1731); 31

Idem. p.108.

32

Callcott, Maria. A Scripture herbal. London: Longman, Brown, green, and Longmans, PaternosterRow, 1842.

22

Celsius’s Hierobotanicon (1745); Forskal de Rebus naturalibus, &c. (1776); Bochart’s Hierozoicon 1793.

A Scripture herbal pode ser lido como um livro de consulta, já que tem a forma de um dicionário/glossário, porém cada planta remete a várias passagens e histórias bíblicas, além é claro de histórias pessoais, que, já sabemos, ela coletou em suas viagens. Por exemplo, a primeira imagem da amêndoa (Almond). Ela desenha a planta com seus frutos e folhas e coloca o nome científico e a referência da passagem bíblica. ALMOND. Amygdalus communis, Common Almond. Linnasan class and order, ICOSANDRIA MONOGYNIA. Natural order, AMTGDALEJE. Gen. xliii. 11. - Exod. xxv. 33, 34; xxxvii. 19, 20. - Jerem. i. 11. - Num. xvii. Eccl. xii. 5.

Logo em seguida, ela desenvolve o texto e comenta a passagem/história e outras informações que ela tem sobre a planta.

Almond, de Maria Callcott para o livro A Scripture herbal. (imagem original nos arquivos da Família Callcott, na Bodleian Library, Oxford.)

23

Maria Graham Callcott fez outros diversos trabalhos. Muitos não foram assinados, mas muitas vezes aparecem em comentários em seus diários, porém sem as referências corretas torna-se difícil encontrá-los publicados. Muitos eram trabalhos encomendados ou a convite de amigos para doação ou outros fins. Entre eles estão os seguintes casos. Publicado em 1842, o livro de Henry Cole, A hand-book for the architecture, sculpture, tombs, and decorations of Westminster Abbey,33 teve a capa desenhada por Maria Graham Callcott. Henry Cole (1808-1882) foi um dos principais promotores de eventos em Londres do meio para o final do século XIX. Foi ele quem fez a grande exposição de Victoria e Albert em 1851. Antes disso, ele ajudou no desenvolvimento da educação da arte industrial. Ele tinha uma relação estreita de amizade com a família Callcott. Também foi ele quem comercializou o primeiro cartão de Natal do mundo em 1843, que teve o desenho de John Callcott Horsley, sobrinho-neto de Maria e Augustus.

Maria Graham Callcott participou, com desenhos, de pelo menos um livro seu, sobre a Abadia de Westminster (a capa é dela). No prefácio ele agradece as várias mulheres que participaram do livro com as gravuras e coloca o “by ladies” na capa. Poucos desenhos estão com o nome da desenhista e da gravadora. O livro apresenta a história, a iconografia dos santos e os espaços e referências arquitetônicas da Abadia.

33

Disponível em: http://books.google.co.uk/books?id=M48VAAAAYAAJ&printsec=frontcover&dq=editions:OCLC15611 5809#v=onepage&q=editions%3AOCLC156115809&f=false

24

Além de ilustrações, ela também fez várias traduções, já que sabia várias línguas, entre elas francês, italiano, espanhol e português. Em uma das viagens, ela comenta que estava aprendendo persa, e em seu diário de viagem à Índia há vários indícios do estudo de sânscrito e outras línguas faladas no país. Algumas traduções foram de textos curtos, outras mais longas como a do livro Memoirs of the war of the French in Spain34, que ela traduziu do francês para o inglês a pedido de John Murray, em 1815. Em uma carta de Charles Eastlake para Thomas Lawrence de 15 de agosto de 1822, Eastlake sugere que um livro de Stefano Ticozzi sobre a vida de Ticiano poderia ser traduzido do italiano para o inglês por Mrs Graham35. Porém não encontrei referências deste livro. Outro trabalho dela foi um prefácio ao livro The seven ages of Shakespeare36. Um ensaio sobre a representação antiga dos estágios da vida humana dividida em sete fases, desde a infância até a velhice. As ilustrações foram feitas por membros da Royal Academy of Art: William Mulready, C. Leslie, Augustus Callcott, John Constable, David Wilkie, Willian Collins, Alfred Chalon, Abraham Cooper, Edwin Landsler, Willian Hilton. O ensaio aparece na forma epistolar, e ao que parece foi escrito espontaneamente pela autora ao saber do assunto da publicação.

Maria Callcott escreveu Don Pedro, traduzido apenas ao português como Escorço biográfico sobre D. Pedro I, bastante tempo depois de sua estada no Brasil, já no fim de sua vida. Ela quis que a narrativa servisse de documento para a história deste imperador. Porém, há nestes escritos uma espontaneidade narrativa que vai muito além da vida de D. Pedro I. Esta vida chega a ser deixada em segundo plano, para dar espaço à história de amizade entre a autora e a Imperatriz Maria Leopoldina. Maria conta

34

Memoirs of the war of the French in Spain. By M. de Rocca. (Translated from the french by M. C.) John Murray, London, 1815. Disponível em: http://babel.hathitrust.org/cgi/pt?id=uc2.ark:/13960/t9h41n72n;view=1up;seq=395 35

Royal Academy of Arts: LAW/4/49 C. Eastlake, 12 Piazza Mignanelli, Rome, Sir Thomas Lawrence, Russell Square, London 15 Aug 1822. 36

The seven ages of Shakespeare. An essay by Lady Callcott. London: John Van Voorst, 1840.

25

muitas das injustiças que a imperatriz sofreu, conta como foi a transição do Brasil colonial ao independente e conta algumas histórias pessoais que ela vivenciou. Este livro não foi publicado em inglês, mas existem dois manuscritos dele, o que conhecemos no Brasil, na Biblioteca Nacional no Rio de Janeiro, e outro na British Library.

Considerações sobre a escrita de Maria Graham Callcott

Os escritos de Maria Graham possuem certas características bem marcadas e que devem ser citadas; características tanto da escritora quanto da época. Seus trabalhos variam entre temas de diários de viagens; estudos sobre países viajados (história, língua, costumes etc); história da arte; biografias de artistas e biografias de reis/rainhas; contos infantis; estudos de técnicas artísticas, de botânica e de geologia; e estudos das escrituras na arte e na botânica. Embora adotando várias vezes a escrita do diário, a força do texto da escritora está no ensaísmo, misturando a pesquisa histórica e a científica, dentro de um aprendizado metodológico que se iniciava na época. Mesmo tendo este rigor de uma pesquisa que seria posteriormente chamada de “científica”, sua escrita é muito espontânea, principalmente nos diários que foram publicados (vale lembrar que alguns diários ainda inéditos são muito mais pessoais e que em alguns momentos a escrita é apenas de anotações rápidas, algo próximo de uma agenda pessoal). Todos os seus livros eram pensados como material didático-pedagógico para quem quisesse aprender um pouco mais sobre lugares, culturas, artistas etc. Em vários de seus prefácios ela deixa explícito o desejo de que aquela seja uma publicação dedicada aos jovens. Porém é importante lembrar que ela tinha consciência da injustiça que se fazia a meninas e a jovens pobres, que assim como ela não tiveram o mesmo acesso à educação que os meninos ricos. Ela escrevia preocupada com a educação destas crianças; talvez uma maneira que encontrou para dar a elas acesso a diversos assuntos que não eram ensinados nas escolas, mas que poderiam ser lidos nos livros, numa linguagem mais acessível e com exemplos mais simples. Em alguns casos, como em seu livro sobre história da pintura, o tom e a forma de abordagem do assunto 26

são quase de um “manual prático” de como fazer sozinho. Algo que na época ainda não era corriqueiro para jovens. Outro exemplo é que ela coloca nos livros infantis a personagem “mãe” ensinando. Talvez possamos pensar que a ideia era fornecer material acessível para as mães lerem para os filhos – a mãe como primeira educadora. Então, sempre com um tom pedagógico, Maria escreve demonstrando sua principal característica: a de ser professora. Tem a preocupação com incentivar aos estudos aqueles que, por motivos diversos, não têm acesso à escola, mas que demonstram interesse em aprender sozinhos. Isto é de fundamental importância, dadas sua história de vida e sua autoformação. Outra característica de sua escrita era com relação às várias línguas que ela sabia. Ao escrever sobre um país, ela estudava primeiramente a língua. Tudo indica que ela tinha realmente facilidade para aprender novos idiomas. Ela teve uma formação no inglês clássico e no moderno e no francês, línguas que dominava fluentemente – além de, como já dito, espanhol, português, italiano, alemão, sânscrito e algo da língua havaiana (variação do polinésio), quando escreveu sobre a viagem de Lord Byron. Na viagem para a Índia há menções do aprendizado do persa com um dos tripulantes. Ela também sabia o latim e outras línguas/dialetos falados na Grã-Bretanha. Por vezes podemos ver em seus escritos, o estudo de variações de dialetos em cada um desses países que visitou. Quando ela veio ao Brasil, teve contato também com idiomas africanos e indígenas. Na introdução de seu Diário, ela escreve e demonstra ter conhecimento dos escritos do Padre José de Anchieta sobre a língua Tupi37 e em algumas passagens ela comenta a origem de algumas palavras indígenas que foram absorvidas pelos portugueses. Em várias publicações pude ver a preocupação em corrigir o vocabulário com erratas. Por exemplo, a primeira edição do diário da viagem ao Brasil traz após o prefácio uma errata colada, provavelmente a mão, após a impressão.

37

Anchieta, José de. Arte de Grammatica da Lingva Mais Vsada na Costa do Brasil, 1595.

27

Em muitas cartas remetidas ou recebidas por ela, há questões do uso de certos idiomas, que comprova uma consultoria minuciosa da escrita entre amigos intelectuais e viajantes da época. Esta característica é bastante importante, pois a diferencia enquanto profissional (escritora, pesquisadora, historiadora etc) de outras escritoras que, mesmo prevendo possíveis publicações, tinham uma escrita mais voltada para curiosidades locais ou algo que conhecemos hoje por guia turístico, ou ainda, o que na época era bastante comum, a escrita de histórias curtas em forma anedótica sobre os costumes ingleses ou do país visitado. Na época em que estava revisando seu manuscrito sobre D. Pedro, sua amiga Caroline Fox lhe escreveu pedindo indicações sobre a Língua Portuguesa. Mesmo tendo sido escrito em inglês, o livro trazia vários vocábulos do idioma nativo, que a amiga não dominava. Quando esta lhe pediu ajuda, Maria Graham escreveu para ela: “15 years ago when I read Portuguese Grammar Vieyra’s was (...) the best and his dictionary was a very useful one.”38 A gramática referida foi escrita pelo Padre António Vieyra e traduzida para o inglês em 1809 39. No manuscrito sobre D. Pedro que se encontra hoje na British Library, pude reparar algumas destas correções feitas pela amiga. Algumas são pequenos detalhes “ouvidos” erroneamente, decorrentes da passagem da oralidade para a transcrição. Um deles, por exemplo, na 13ª página manuscrita, foi uma transcrição de salvas do povo ao imperador. O povo gritava: “Viva o imperador, viva a imperatriz, viva o os deputados”. 38

Carta de agosto de 1835, de Maria Graham para Caroline Fox. Disponível no acervo da família Holland, na British Library, Londres. 39

Vieyra, A. A New Portuguese Grammar in Four Parts. London: F. Wingrave. Soares Barboza, J. Padre António Vieyra. 1809.

28

Na correção “viva o os” estava riscado e substituído por “vivão os deputados”, mostrando a confusão no tempo verbal do verbo viver, que deveria ser conjugado na 3ª. pessoa do plural do tempo presente: “vivam os deputados”. Carl Thompson menciona em seu livro Travel Writing as “Royal Society directives against the use of excessive rhetorical ornamentation in travel accounts”40; afirmando que é mais ou menos nesta época que também se inicia um certo preciosismo por termos corretos na língua nativa. Dentro deste pensamento, também deveria haver exatidão nos objetos e paisagens descritas. Maria Graham seguia um método de escrita que havia começado havia pouco tempo e que fez parte de sua formação: do início das pesquisas científicas. No já citado livro de suas reminiscências, ela conta como foi a sua formação, com quem estudou e com quem teve contato informal de educação. Entre os vários nomes citados, encontramos muitos cientistas importantes, como: Dugald Stewart (1753-1828) filósofo e matemático, que dava aulas de filosofia (moral e ética) e filosofia política e que foi o primeiro a dar um curso de economia política. Teve vários alunos que também conheceram e ficaram amigos de Maria Graham, como Francis Jeffrey e James Mackintosh (os dois que no futuro seriam reitores da Universidade de Glasgow). John Playfair (1748-1819), cientista e matemático, que foi professor de Geometria e de filosofia natural. John Leslie (1766-1832), matemático e físico, que substituiu John Playfair nas disciplinas de matemática e de filosofia natural. Fez descobertas importantes sobre a propagação do calor, aperfeiçoou termômetros e outros instrumentos, e escreveu sobre filosofia da aritmética. Thomas Charles Hope (1766-1844), professor de química, medicina e botânica. Charles Darwin estudou medicina com ele e comentou que suas aulas de química eram as melhores do curso. Além disso, já em 1826, Hope abria suas aulas para estudantes mulheres e dava cursos com público misto, o que era bastante polêmico na época.

40

Thompson, Carl. Travel writing (1st. edition). London: Routledge, 2011.

29

Esse círculo de amigos professores, ela manteve por muito tempo, mesmo morando em Londres. Encontrei durante a pesquisa muitas cartas trocadas entre eles e outros amigos sobre estudos e pesquisas, além de várias anotações de encontros em seus diários pessoais (não publicados). No diário de 1840, por exemplo, ela comenta que Robert Brown a convidou para um encontro, pois havia pesquisado e queria esclarecer sua dúvida “sobre Celsius” surgida em outro encontro. Robert Brown foi um botânico pioneiro nos estudos das células vegetais e o primeiro organizador do departamento de botânica no Museu Britânico (que depois passou para o Museu de História Natural de Londres). Mesmo ganhando bons pagamentos por seus escritos e trabalhos de consulta, tradução e revisão, Maria compreendia que sua condição de escritora era limitada pela sociedade patriarcal, que não dava muito espaço às mulheres. Ela conseguia se desvencilhar até certo ponto destas limitações, mas em vários momentos, lemos isto em seus escritos: Não posso pretender falar do caráter da administração desses ou quaisquer outros ministros portugueses ou brasileiros. Minhas oportunidades de informação foram muito raras. Meus hábitos, como mulher e estrangeira, nunca me conduziram a situações onde pudesse adquirir o necessário conhecimento. Quero somente assinalar o curso dos acontecimentos, que, pelo encadeamento natural, foram as causas dos efeitos que se produziram sob meus olhos.41

Porém sua contribuição para o mercado editorial da época foi preciosa, e seu incentivo aos novos escritores e artistas também está documentado em cartas e em suas publicações. Ao final de sua vida ela contava com 16 livros publicados, assinados com seu nome, diferente da prática de outras mulheres que utilizavam o “by a lady” para não se exporem como escritoras. Além disso, há registro de que ela foi patronesse de uma escola de moças de Kensington e também colaboradora em uma escola de Artes e Ofícios para moças que trabalhavam como gravuristas.

Trabalhos de Maria Graham Callcott publicados (primeiras edições) Journal of a Residence in India. Edinburgh: Archibald Constable and Company. 1812. Letters on India; with Etchings and a Map. London: Longman, Hurst, Rees, Orme & Brown. 1814. 41

Graham, Maria. Diário de uma viagem ao Brasil, op. cit., p.65.

30

Memoirs of the Life of Nicholas Poussin. London: Longman, Hurst, Rees, Orme & Brown; Edinburgh: A. Constable & Co, 1820. Three Months Passed in the Mountains East of Rome, during the Year 1819. London: Longman, Hurst, Rees, Orme & Brown; Edinburgh: A. Constable & Co, 1820. Journal of a Residence in Chile, during the Year 1822; and a Voyage from Chile to Brazil, in 1823. London: Longman, Hurst, Rees, Orme & Brown; and John Murray,1824. Journal of a Voyage to Brazil, and Residence there, during Part of the Years 1821, 1822, 1823. London: Longman, Hurst, Rees, Orme & Brown; and John Murray. 1824. Voyage of H. M. S. Blonde to the Sandwich Islands, in the years 1824-1825. John Murray, London. 1826. A Short History of Spain. London: John Murray, 1828. A Letter to the President and Members of the Geological Society, in Answer to Certain Observations Contained in Mr. Greenough’s Anniversary Address of 1834. London: Printed by T. Brettell. ‘On the Reality of the Rise of the Coast of Chile, in 1822, as stated by Mrs. Graham.’ The American Journal of Science and Arts, 28 (July, 1835), pp. 236-247, Description of the Chapel of the Annunziata Dell' Arena; Or Giotto’s Chapel, in Padua. [with engravings from drawings by Sir A. W. Callcott.]. London: Printed for the author by T. Brettell, 1835. Little Arthur’s History of England. London: John Murray, 1835. Essays Towards the History of Painting by Mrs Callcott. London: Edward Moxon, Dover street, 1836. Continuation of Essays Towards the History of Painting London: Edward Moxon, 1838. Histoire de France du Petit Louis. Londres: Edward Moxon, 1836. The Little Bracken-Burners. A Tale: And Little Mary’s Four Saturdays. London: John W. Parker. 1841. A Scripture herbal. London: Longman, Brown, green, and Longmans, Paternoster-Row, 1842. scor o iográfico de Do Pedro (editor Marcus Venicio Ribeiro). Rio de aneiro: undação Biblioteca Nacional, 2010.

Prefácio de Maria Callcott: The seven ages of Shakespeare. An essay by Lady Callcott. London: John Van Voorst, 1840.

Ilustração de Maria Callcott: COLE, Henry. A hand-book for the architecture, sculpture, tombs, and decorations of Westminster Abbey. (1842).

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Referências Bibliográficas. AKEL, Regina. Maria Graham: a literary biography. Amherst, N.Y.: Cambria Press, 2009. ARFUCH, Leonor. O espaço biográfico: dilemas da subjetividade contemporânea. Tradução de Paloma Vidal. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2010. CALLCOTT, Maria Graham. Correspondência entre Maria Graham e a Imperatriz dona Leopoldina e cartas anexas. Tradução de Américo Jacobina Lacombe. Rio de Janeiro: Itatiaia, 1997. GOTCH, Rosamund Brunel. Maria, Lady Callcott. The Creator of “Little Arthur”. London: John Murray, 1937. AMES, David. “Um pintor Inglês No Brasil do Primeiro Reinado”. In: Revista do Iphan, número 12, ano 1955. KANT, Immanuel. Resposta à pergunta: O que é o Esclarecimento? (5 de dezembro de 1783). Traduzido por Luiz Paulo Rouanet. Disponível em: http://www.uesb.br/eventos/emkant/texto_II.pdf. MURRAY-Oliver, Anthony. “Biographical Introduction”. In: ____. Augustus Earle in New Zealand. 1st. Edition: 1968. Publised by Whitcombe & Tombs Ltd. SKINNER, Kathleen L.. Ships, Logs, and Voyages: Maria Graham Navigates the Journey of H.M.S. Blonde. The University of Texas at Austin. May, 2010. Southey, Robert. History of Brazil. Printed for Longman, Hurst, Rees, Orme, and Brown, Paternoster-Row, 1810. THOMPSON, Carl. Travel writing. London: Routledge, 2011. 1ª. edition The Gentleman’s Magazine: and Historical Chronicle. From July to December. By Sylvanus Urban. 1814. Review of New Publications.

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