Marketing presentation na arquitetura da cidade: design e consumo na Rua Oscar Freire-SP

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Marketing presentation na arquitetura da cidade: design e consumo na Rua Oscar Freire – SP


RESUMEN
Este artículo se centra en cómo la arquitectura y el diseño puede influir en la percepción de consumidores y como una posible estrategia de marketing para las ciudades y áreas de interés, desde el estudio de caso sobre la calle Oscar Freire en Sao Paulo.

Palabras-clave: marketing emocional, comportamiento del consumidor, memoria, diseño estratégico, arquitectura, puesto de venta

ABSTRACT
This article focuses on how architecture and design can influence the perception of consumers and their role as a possible marketing strategy for cities and areas of interest, from case study at Oscar Freire Street in São Paulo.

Key-words: emotional marketing, consumer behavior, memory, strategic design, architecture, point of sales

RESUMO
Este artigo aborda aspectos da arquitetura e do design capazes de influenciar a percepção dos consumidores e seu papel como possível estratégia de marketing para cidades e áreas de interesse, a partir de estudo de caso na Rua Oscar Freire, em São Paulo.

Palavras-chave: marketing emocional, comportamento do consumidor, memória, design estratégico, arquitetura, PDV




É possível que nosso olhar sobre a urbe não seja afetado pela velocidade, seja ela de uma caminhada, de um carro, de um navio, de ônibus ou de um bonde? Evidentemente, a cidade observada se apresentaria diversamente de acordo com a rapidez ou lentidão em que é apreendida por nossos olhos e, da mesma forma, também a percepção desta experiência seria alterada. Segundo Guattari(1992) a arquitetura de uma cidade dialoga conosco no sentido em que nos interpela de diferentes modos, sejam eles estéticos, funcionais, históricos, afetivos,..., e respondemos de diferentes formas às suas perguntas, subjetivando nossa experiência com estes espaços. Para ele, os edifícios e construções são máquinas enunciadoras, capazes de se comunicar, de transmitir mensagens, de estabelecer relações entre o objeto arquitetônico e os seres humanos.
As relações entre arquitetura, comunicação e marketing tem sido evidenciadas e discutidas especialmente a partir de 1977, data de lançamento da primeira edição do livro Aprendendo com Las Vegas em que os autores discutem o simbolismo da forma arquitetônica, a partir de um corredor comercial, a Las Vegas Strip: "Essa arquitetura de estilos e signos é antiespacial; é uma arquitetura mais de comunicação do que de espaço; a comunicação domina um espaço como um elemento na arquitetura e na paisagem." (Venturi, Scott-Brown & Izenour, 2003, p.33) Entretanto, a percepção desta arquitetura da cidade está fortemente relacionada à velocidade dos veículos que por ali passam e, assim, os elementos arquitetônicos são vistos rapidamente e a certa distância, o que, segundo os autores, contribui para uma leitura rasteira desta mensagem. Entretanto, o corredor comercial que se destina a transeuntes precisa, por sua vez, ampliar o tempo de contato e fruição entre uma pessoa e um ponto comercial destinado à venda, o chamado ponto de venda (PDV).
Este fator foi determinante para a decisão de transformar nosso estudo de caso, a Rua Oscar Freire (OF) em São Paulo, num grande calçadão de compras para pedestres, ou seja, a rua deixaria de se configurar como um corredor comercial que privilegiava veículos para passar a fortalecer a relação de contato entre os PDV's e os transeuntes. Para tanto, esta reforma necessitou lidar com várias escalas de arquitetura, do urbanismo ao design de interiores, e também com diversos stakeholders (comerciantes, moradores, poder público, concessionárias de energia e água, associação de lojistas).
Este aglomerado de empresas de comércio de artigos e serviços de luxo teve seu início nos anos 1980 com a fixação de restaurantes sofisticados e, posteriormente, com a abertura das importações no Brasil, passou a receber as maiores grifes mundiais, tornando-se endereço obrigatório para os grandes estilistas brasileiros. A OF divide dois bairros na cidade, o Jardim América e o Jardim Paulista, e teve sua área de influência ampliada para uma região que atualmente abrange um quadrilátero entre a Avenida Rebouças, as Alamedas Casa Branca e Tietê e a Rua Estados Unidos (Romero, 2008).
A intervenção urbana mais significativa ocorreu a partir de 2006, no trecho entre as ruas Melo Alves e Padre João Manuel, em foi feito um recapeamento asfáltico, o alargamento das calçadas com a inserção de mobiliário urbano (bancos, lixeiras e totens informativos) e novo paisagismo, a instalação de novos sistemas de drenagem e iluminação e a organização dos vendedores ambulantes. Segundo Romero (2008), a rua conseguiu ampliar o número de visitantes e estima-se uma média de trinta e três mil pessoas circulando no local diariamente, quase o dobro da média anterior, o que significa que as transformações urbanas ocorridas na região tiveram um impacto na percepção dos usuários em relação àquela região da cidade e, poderíamos acrescentar, no próprio comportamento dos consumidores.
De maneira geral, os pontos comerciais necessitam de uma constante avaliação para se adequarem às exigências e expectativas de seus clientes e, além disso, serem capazes de se comunicar com eles. O incremento da competitividade nos negócios tornou esta necessidade ainda mais premente uma vez que os consumidores dispõem de mais informação e, consequentemente, de um senso crítico mais aguçado. Assim, a forma com que um ponto comercial se apresenta ao consumidor ganha mais relevância: a experiência de compra e o bem-estar do cliente devem ser considerados desde a parte externa da loja até as ações de merchandising desenvolvidas em seu interior (Basso, 2008). Entendemos que o design pode se apresentar como uma importante estratégia de marketing para regiões, cidades e pontos de venda (PDV) em geral, conforme veremos mais adiante. A maneira com que um lugar se apresenta para seu consumidor, ou seja, os elementos de seu marketing presentation são determinantes para a obtenção dos resultados desejados.

A memória e o design do lugar
Sabendo-se que uma cidade é, sobretudo, o locus onde se desenrolam as tramas das vidas humanas, se este lugar é interceptado por mudanças profundas, sintomáticas, também as formas de percepção destes espaços serão alterados. A paisagem urbana de uma região ou cidade é fortemente influenciada pelo olhar de seus habitantes, usuários, consumidores, clientes:
[...] uma cidade é algo mais do que o somatório dos seus habitantes: é uma unidade geradora de um excedente de bem-estar e de facilidades que leva a maioria das pessoas a preferirem – independentemente de outras razões – viver em comunidade a viverem isoladas. (Cullen, 1971, p.9)
Para Rossi (1995), a cidade é o locus da memória coletiva ao relacionar fatos e lugares e sua relação com os citadinos constitui a imagem predominante da paisagem. Por mais que alguns espaços determinem seu próprio uso, nenhum projeto arquitetônico ou urbanístico é capaz de responder completamente às demandas subjetivas individuais. As formas de olhar uma cidade ou região devem considerar o caráter mutante e criativo que cada pessoa é capaz de criar, ou seja, deve ser considerada a forma como as pessoas podem trabalhar seu imaginário ao rememorar um espaço.
Cada indivíduo é capaz de suscitar diferentes olhares sobre um mesmo aspecto da urbe. A memória é capaz de ser criativa e esta criação é, acima de tudo, subjetiva no sentido em que constrói conexões singulares, irreproduzíveis. As pessoas não são capazes de lembrarem-se exatamente das mesmas coisas, da mesma forma. Cada um rememora um fato a sua maneira e, a sua maneira, recria aquele fato. Portanto, se a própria cidade pode ser entendida como uma arquitetura, enquanto construção da cidade no tempo e como artefato do homem, ela também será uma construção da memória dos indivíduos.
Entretanto, a imagem criada a partir de determinada paisagem ou região também pode ser entendida para além de suas características arquitetônicas, artísticas, econômicas, tecnológicas, simbólicas, históricas ou sociais. Gaio e Gouveia (2007) destacam que alguns lugares fazem uso de estratégias de marketing para comunicar seus atributos e posicionar-se como um lugar atrativo e competitivo junto a seus stakeholders (investidores, residentes, visitantes, entidades públicas, empresas e outros), criando relações vantajosas aos envolvidos: "A interpretação da cidade como um produto e consequente orientação de marketing assume-se então como um processo dinâmico que toma por base a identidade e activos físicos e psicológicos do território em toda a sua complexidade". (Gaio & Gouveia, op.cit., p.28)
Uma vez que o marketing se caracteriza pelo reconhecimento e satisfação das necessidades de determinado público, ou de uma percepção favorável de determinado produto, também os lugares podem ser entendidos como produtos a serem promovidos (Gaio & Gouveia apud Kotler et al., 1999, 2002). Assim, a imagem de um lugar remete a um conjunto de percepções e juízos de valor dos stakeholders e, quando falamos de uma área comercial como a Rua Oscar Freire, nosso estudo de caso, a imagem mental do público consumidor se torna ainda mais relevante, predispondo-o para uma identificação com aquela imagem, incentivando a experimentação e o envolvimento, enfim, comunicando valores.
Dessa forma, o investimento de cidades e regiões no consumo tem se tornado uma importante estratégia de marketing, capaz de revitalizar cidades inteiras. Para tanto, estes lugares se utilizam de transformações urbanas, ou revitalizações, que podem se originar a partir de diferentes intenções e posicionamentos.
Dois exemplos paradigmáticos na história da Arquitetura e do Urbanismo ocorreram no século XIX, sendo um em Paris e outro em Barcelona. Sob o governo de Napoleão IV, foi realizada em Paris uma grande transformação urbana, idealizada pelo engenheiro Haussmann, que tinha o intuito de "higienizar" a cidade e evitar novos levantes da população (Benevolo, 1993). Por sua vez, a cidade de Barcelona na Espanha passou por grandes mudanças projetadas pelo arquiteto Ildefons Cerdá. Desde aquela época até a atualidade, estas transformações urbanas e a própria cidade tem sido utilizadas como ferramentas, ou objetos, de marketing, para vender produtos.
Em geral, os grandes eventos desportivos mundiais vem acompanhados de profundas transformações nas cidades que os recebem e, desde as Olimpíadas de Barcelona, realizada em 1992, tem sido o grande objetivo das cidades candidatas ao posto de anfitriãs. Estas transformações implicam na revisão e reestruturação da malha viária, dos equipamentos urbanos e requalificação de áreas degradadas, bem como para a criação de novas áreas residenciais para impulsionar o crescimento de novas regiões.
Outras cidades, como Buenos Aires, fizeram uso de capital privado e público para requalificar sua antiga zona portuária em Puerto Madero, que se transformou em uma região de grandes investimentos imobiliários e para onde afluem turistas do mundo todo para se divertir, e consumir, em seus restaurantes e bares.
No campo institucional destaca-se a cidade de Bilbao, apadrinhada com a chegada do Museu Guggenheim e o projeto do conhecido arquiteto Frank Gehry, que deixou de ser uma cidade portuária para se tornar um dos destinos mais visitados na Espanha, atrás de Madrid, Barcelona e Sevilha.
Portanto, realizar revitalizações urbanas em uma cidade e uma região não é algo novo em si. A novidade talvez resida nos diferentes propósitos pretendidos e, aqui, nos interessa ressaltar os propósitos que envolvem mudanças na percepção dos consumidores a respeito de um determinado lugar. Optamos por nos referir a lugar ou lugares para denominar tanto uma cidade ou região, quanto as lojas que possam fazer parte de nossa análise.
Outro importante aspecto desta estratégia de marketing diz respeito ao entendimento de seu público consumidor. Como comunicar a ele os valores pretendidos? Como fazer para que determinado público se identifique com um lugar?
Para desenvolver esta discussão, faz-se necessário retomar alguns conceitos sobre comportamento do consumidor trazidos por Solomon (2008) que se mostraram bastante relevantes para esta pesquisa. Este autor nos aponta que diariamente somos impelidos a lidar com um bombardeio de informações e sensações, para os quais escolhemos dar atenção a certos estímulos e ignorar outros, baseados em nossa visão de mundo, nossas experiências, concepções e desejos (Solomon, op.cit.). Assim, percebemos que a forma com que pautamos os significados dos produtos ou serviços com as sensações que eles provocam está relacionada tanto a um trabalho de memória (Bosi, 1979) quanto às reações imediatas de nossos receptores sensoriais. É importante ressaltar que entendemos a memória enquanto processo cognitivo de criação, não como um acervo intacto do passado. Bosi (1979) afirma que na maior parte das vezes, lembrar não é reviver, mas refazer, reconstruir, repensar, com imagens e ideias de hoje, as experiências do passado. Uma imagem lembrada não pode ser a mesma que experimentamos na infância, por exemplo, porque nós não somos os mesmos de então. Para ela, a memória é trabalho.
Huyssen (2000) destaca as diferentes formas de representação do real e de suas memórias e alerta para a relação entre tempo, espaço e as estruturas de percepção da vida cotidiana nas sociedades de consumo: "Espaço e tempo são categorias fundamentais da experiência e da percepção humana, mas, longe de serem imutáveis, elas estão sempre sujeitas a mudanças históricas" (Huyssen, op.cit., p.30). Não somente as formas de se perceber determinado lugar são influenciadas pelos processos cognitivos individuais como também as transformações sociais, históricas e econômicas são capazes de alterar nossa percepção sobre os lugares. O comportamento do consumidor também estará atrelado a estas condicionantes.

Quando o lugar se transforma em PDV
Do ponto de vista do espaço físico, o PDV (ponto de venda) deve traçar estratégias que alinhem as expectativas do consumidor e seu referencial mnemônico, para trabalhar a maneira com que este consumidor percebe o espaço e agrega significado a ele. Assim, os elementos que compõem um PDV, como luz, cores, mobiliário, precisam estar organizados de forma a despertar determinadas sensações nos consumidores: "O estudo da percepção, então, concentra-se no que acrescentamos a essas sensações em estado bruto a fim de lhes dar significado" (Solomon, op.cit., p.69). A percepção sugere que atravessemos um caminho entre a seleção, a organização e as interpretações das sensações que temos ao nos deparar com determinado espaço ou ambiente para, enfim, atribuir significados a ele.
A forma como cada espaço nos interpela diz muito sobre suas motivações, porém as expectativas do consumidor só podem ser plenamente atendidas a partir da compreensão de que a experiência cultural do consumidor será determinante para a compreensão das intenções do negócio (PDV). "[...] o indivíduo interpreta o significado de um estímulo de acordo com suas próprias concepções, necessidades e experiências" (Solomon, op.cit., p.69). Dessa forma, a luz, a cor, o som, as texturas, os odores e o design de um espaço tornam-se instrumentos que proporcionam valor hedônico, ou seja, são características capazes de ir além das funções básicas e da qualidade de um PVD, mas que também são capazes de causar impacto emocional nos consumidores.
O autor afirma, ainda, que o design deixou de ser território apenas para pessoas altamente sofisticadas, firmando-se como fator de lealdade e de adesão de consumidores que escolhem as empresas não só pelo que podem oferecer aos seus desejos, mas também pelo bom design que encontram nas lojas, nas embalagens e nas vitrines: "o design era algo para se pensar depois. O marketing atraía os clientes por meio da eficiência, e não pela estética" (Solomon, op.cit., p.71). Todo o PDV se tornou uma grande vitrine, contemplando desde a calçada em que a loja se localiza, a fachada que volta para a rua, os diversos ambientes internos, a iluminação, as cores e cada peça de mobiliário, bem como o aroma, as lembranças e os estados de espírito que evocam. Cada um destes aspectos é explorado para conquistar os consumidores em um ponto comercial, sobretudo quando se trata de um público com elevado referencial de precedentes, como acontece com os consumidores da Rua Oscar Freire, foco de nosso estudo de caso.
Galhanone, Marques, Mazzon e Toledo (2011) afirmam que "o público-alvo do mercado de luxo anseia por experiências especiais de compra e credita uma importância particular à questão espacial interna e geográfica das lojas". Portanto, a localização dos pontos comerciais de luxo em regiões relevantes para este mercado favorece o reconhecimento do consumidor de luxo e contribui para o fortalecimento do valor e da imagem da marca.
Esta localização concentrada de marcas de luxo em determinados lugares é uma estratégia utilizada em diversas partes do mundo e pode ser facilmente reconhecida na Rua Oscar Freire, em São Paulo, onde se formou um quadrilátero entre a Avenida Rebouças, as Alamedas Casa Branca e Tietê e a Rua Estados Unidos. Galhardi e Celeguim (2007) reconhecem esta região como um cluster a que estão sendo incorporados novos negócios que atestam sua plena atividade competitiva e expansiva. Entendemos que esta área de influência do mercado de luxo, na cidade de São Paulo, pode ser entendida como a configuração física de um mapa perceptivo, portanto não houve necessidade de configurá-lo nesta pesquisa, partimos da acepção de que o mapa já estava consolidado na mente dos consumidores.
A definição de uma determinada imagem para um lugar, e de como o design pode contribuir para transmitir e corroborar com esta imagem, passa também pela compreensão do público-alvo pretendido, ou seja, é preciso entender para quem o design vai trabalhar, quem irá consumi-lo. Determinados grupos sociais apresentam características semelhantes em termos de comportamentos, gostos e hábitos.
No caso de pessoas de alto poder aquisitivo, o referencial de expectativas em relação ao PDV pode surgir de parâmetros internacionais, e estes podem ser os precedentes reconhecidos e esperados pelo consumidor de alto padrão que frequenta lojas no exterior. Galhanone, Marques, Mazzon e Toledo (op.cit.) sobre essa temática enfatizam que:
O espaço interno das lojas de luxo favorece a aura de prazer e encantamento do momento de consumo, caracteriza o produto ofertado como distintivo e de alta qualidade, e cria nos clientes um sentimento de pertencimento, graças à interação social promovida pela frequência às lojas pelo mesmo estrato social. (Galhanone, Marques, Mazzon e Toledo, op.cit.)
Portanto, a tomada de decisão para o consumo está fortemente pautada pela influência interpessoal no segmento do consumidor de luxo, que privilegia o prestígio, a exclusividade, o atendimento pessoal, a experimentação dos produtos na loja e valoriza o design sofisticado do PDV, a tradução física da imagem e do posicionamento da marca prestigiosa (Galhanone, Marques, Mazzon e Toledo, op.cit.). O posicionamento perceptivo (Solomon, op.cit.) torna-se fundamental para atrair estes consumidores, que através de algum dos vieses interpretativos buscarão os atributos funcionais e simbólicos que são familiares a seus desejos e pressupostos. Galhanone, Marques, Mazzon e Toledo (op.cit.) colocam que "novos enfoques de marketing para os produtos de luxo veem os consumidores como seres emocionais, em busca de experiências prazerosas, e não apenas como decisores racionais focados nas características e benefícios dos produtos". O design destes espaços comerciais também é desenvolvido de forma a tornar-se coerente com as experiências de compra que seus produtos ou serviços oferecem, estimulando o consumo hedônico, ou seja, o design deve ser capaz de causar impacto emocional nos consumidores e ir além das funções básicas de um PDV (Solomon, op.cit.).
Assim, podemos compreender a estreita, e importante, relação estabelecida entre marketing, design, comportamento do consumidor e memória para configurar os espaços de venda no mercado de luxo e definir os critérios de marketing presentation.

A rua Oscar Freire como objeto de estudo
No trabalho de campo na região da Oscar Freire procuramos observar se o caráter do mapa perceptivo pré-estabelecido, se verifica com, e apesar das mudanças físicas ao longo da rua. Perguntamos-nos se algo se modifica neste percurso, seja o tipo de loja ou comércio, o padrão das construções, o design dos pontos comerciais, as calçadas, a arborização, o mobiliário urbano, o tipo de pessoas e consumidores, os fluxos de veículos e pessoas. Como poderíamos descrever o marketing presentation desta região? Os aspectos de design da cidade e dos pontos comerciais influenciam na percepção do espaço e nas características destes espaços? Existe relação entre design e as estratégias de marketing? A seguir descrevemos os critérios de análise utilizados, o trajeto realizado na região, os limites e dificuldades encontrados e as principais descobertas.
Considerando-se que o marketing presentation de uma loja, cidade ou lugar, se faz através de suas características físicas somadas às características psicológicas e socioculturais, além do poder aquisitivo e das visões de mundo de determinado consumidor, o primeiro critério de análise desta pesquisa se deteve sobre os aspectos físicos do quadrilátero compreendido pelo aglomerado conhecido como Oscar Freire (OF). A configuração deste quadrilátero, conforme esclarecemos anteriormente, se define através da Avenida Rebouças de um lado e a Alameda Casa Branca no sentindo longitudinal da OF, e a Rua Estados Unidos e Alameda Tietê no sentido transversal. Dessa forma, este quadrilátero se define por barreiras físicas muito claras, motivo pelo qual optamos por iniciar a pesquisa de campo percorrendo sua principal via, a própria Oscar Freire.
Este percurso se iniciou a partir da esquina com a Rua Consolação, em direção à Alameda Casa Branca, pelo lado direito da calçada, retornando-se em direção à Avenida Rebouças pelo lado esquerdo. O trajeto inicial permitiu perceber que além das barreiras físicas construídas pelo planejamento urbano da região, também a topografia natural do terreno foi relevante para o estabelecimento da concentração de lojas nesta rua. No sentido em que trafegam os veículos, da Avenida Rebouças para a Alameda Casa Branca, à direita as ruas descem em direção à Rua Estados Unidos e sobem em direção à Alameda Tietê. Portanto, torna-se clara a relação entre a configuração espacial e a definição da OF como principal artéria do quadrilátero, a partir do qual se irradiam as demais áreas de influência e se localizam os negócios relacionados ao mesmo público-alvo.
Definimos anteriormente a importância dos aspectos físicos das lojas e cidades, desde a observação das calçadas e mobiliário urbano até o design do interior das lojas, para a percepção do PDV pelos clientes, em especial o consumidor de luxo. Este aspecto do marketing foi bastante relevante para a definição do projeto de reforma e da execução das obras de melhoria da OF, realizadas em 2006. Entretanto, observamos que agora, seis anos após a realização das obras, a qualidade dos aspectos físicos é bastante divergente ao longo da rua.
O projeto inicial se fragmentou em diversas partes, algumas originais e bem preservadas, outras degradadas e outras modificadas em função das constantes obras realizadas dentro dos pontos comerciais. A partir da Rua Rocha Azevedo a calçada da OF não segue mais o padrão do projeto e se configura como um mosaico de pisos e padrões de desenhos de calçada como no restante da cidade de São Paulo, ou qualquer outra cidade do país. Todas as ruas adjacentes à OF também seguem este padrão onde cada proprietário de terreno é responsável pela calçada diante de seu imóvel; daí as diversas soluções de desenhos para as calçadas. Entretanto, se entendemos que se trata de uma região voltada ao consumidor de luxo e que exige produtos de qualidade, uma uniformidade de soluções para a calçada e o mobiliário urbano atenderia melhor ao tipo de percepção que este consumidor requisita de um espaço ou ambiente.
Em contraste com o espaço público, as lojas e pontos comerciais apresentam uma qualidade superior de design e favorecem os aspectos hedônicos do consumo, valorizando a ambiência como um todo, não somente nas formas e materiais utilizados, mas também nos aromas utilizados nas lojas que exalam para seu exterior, a temperatura agradável dos ambientes internos, um apurado gosto na seleção dos produtos expostos que tiram partido da correta iluminação e, principalmente, os serviços ofertados, diferenciais de cada loja. O serviço de segurança é comum a quase todas as principais marcas de luxo do mercado e, ao mesmo tempo, contribui para a configuração de um cenário da OF que não prevíamos inicialmente na pesquisa: ao longo de toda a rua, encontramos dezenas de seguranças, vestidos em ternos pretos, em pé ao lado das portas ou de frente para elas, ou ainda sentados nos bancos da rua, sob a sombra das árvores, conversando entre si.
No momento da pesquisa bibliográfica esperávamos encontrar como atores do cenário, homens e mulheres bem vestidos fazendo suas compras, acompanhados de seguranças pessoais, mas não uma população permanente de outros atores, também importantes para nossa análise. Somam-se aos seguranças das lojas, os entregadores de material de construção e os manobristas dos serviços de valet, responsáveis por estacionar os veículos já que a rua não dispõe de estacionamento suficiente. A rua se mostrou ainda mais democrática: estudantes de escolas secundárias, mães, babás e crianças, pessoas que trabalham em empresas de todos os tipos, editores de moda, judeus ortodoxos, idosos e moradores da região; todos contribuem para informar que a OF é um lugar integrado à vida da cidade e não um gueto para pessoas de alto poder aquisitivo. Assim, também fazem parte deste cenário outros tipos de comércio, como farmácia, supermercado, posto de gasolina, banco, hotel, restaurantes e cafeterias. A rua também abre espaço para novos designers de roupas, joias e acessórios, que montam bancas dentro de uma galeria chamada "Mercadinho Chic", operado pela associação comercial da região.
Além da segurança, outro aspecto observado como um critério importante para a experiência de compra do consumidor de luxo diz respeito à tranquilidade e ao ambiente propício para a compra. Relatos de consumidores apontam que a tranquilidade e o ambiente agradável são fatores que os levam a escolher a OF como destino de suas compras, tornando-se também um lugar de passeio para levar os filhos pela manhã. Entretanto, não foi o que observamos nos dias de visita a campo. A rua tem um forte trânsito e constantemente se formam engarrafamentos que, somados às obras efetuadas nos pontos de venda que geram muito barulho e enchem as ruas de caçambas e trabalhadores, contribuem para tornar a rua bastante agitada, diferente do que esperaríamos de uma rua em que consumidores de luxo buscam exclusividade e elegância para suas compras e passeios. Por outro lado, a percepção dos frequentadores sobre o lugar mostra que a imagem de um lugar tranquilo, agradável e elegante é mais forte em suas memórias, fato corroborado pela forte presença de estrangeiros e turistas nas imediações da OF. Isto nos mostra que, apesar das deficiências de determinados aspectos físicos do marketing presentation, a imagem percebida pelo imaginário dos consumidores colabora também para a vertente turística da região.
Nosso trajeto pelas demais ruas do quadrilátero nos mostrou que a vida residencial é muito mais forte nestas vias, onde quase todos os edifícios são residenciais, onde encontramos áreas muito mais tranquilas e arborizadas, porém de topografia mais difícil para o pedestre. A vida cotidiana é bastante presente nestas ruas, existindo inclusive uma feira livre que acontece às quintas feiras na Rua Barão de Capanema, o que deixa um odor característico na via.
Outro trajeto realizado foi a partir da Avenida Paulista, pela Rua Augusta, até a Rua Oscar Freire, onde observamos a crescente melhora na qualidade dos pontos comerciais à medida que se aproxima das imediações do referido quadrilátero, o que significa que o design do ambiente urbano e dos PDVs são influenciados pelo mapa perceptivo consolidado para a região, reforçando a importância do marketing presentation.

Marketing presentation na arquitetura

As referências trazidas pela área de marketing, em especial sobre o comportamento do consumidor e o marketing presentation podem contribuir para o processo de design como um todo, além de fortalecer a imagem de marca e os atributos que o consumidor relaciona a estes produtos, serviços ou PDVs. O marketing relacionado ao consumidor de luxo tem se tornado cada vez mais complexo porque precisa vender experiências de consumo relacionadas a códigos, comportamentos e estilos de vida, além de transmitir uma imagem de qualidade, desempenho e autenticidade para um público que preza pela exclusividade, pela raridade ou escassez de determinado produto ou serviço, agregando a eles valores simbólicos e subjetivos.
Se, em geral, somos capazes de visualizar e perceber determinados atributos através da memória e da imaginação, podemos entender que o apelo visual que percebemos em determinados lugares pode ser trabalhado pelos designers e projetistas para iniciar um diálogo com seus consumidores através das percepções que eles constroem a partir do que transmitimos nos espaços físicos, sejam eles lojas ou cidades. Um design que cause empatia nos consumidores vai além de perguntar o que eles querem; o design precisa participar do ao entendimento de mundo do consumidor que pretende atingir e se utilizar destas ideias e valores para incorpora-los ao projeto. Isso permitirá que o consumidor possa interagir com o design, se apropriar dele e entendê-lo como uma parte de si mesmo.
Os resultados da pesquisa nos levaram a entender que os aspectos de design da cidade e dos pontos comerciais são capazes de influenciar na percepção espacial do consumidor de luxo e na construção de uma imagem positiva na memória dos usuários deste espaço. As relações afetivas de identificação com o lugar, apontados pelos entrevistados; as ambiências detectadas nos diferentes cenários encontrados, seja em função do horário do dia ou dos diferentes atores envolvidos, e as relações sociais estabelecidas a partir do design dos ambientes nos apontam para uma valorização das experiências destes consumidores com o espaço da Rua Oscar Freire.
Além disso, detectamos que a força do mapa perceptivo da região na consolidação e preservação de seu marketing presentation são responsáveis não somente pela renovação coerente das propostas ofertadas pela região – novos entrantes como lojas, designers ou restaurantes -, como também são um forte ingrediente na divulgação turística da área como uma das ruas mais chiques do mundo. Apesar das condições precárias por vezes detectadas, a Oscar Freire vende muito bem a atmosfera desejada pelas marcas de luxo e seus clientes. A imagem percebida continua a produzir efeitos emocionais nos clientes, influenciando seu tempo de visita e ampliando as possibilidades de tomada de decisão para o consumo.
As respostas obtidas não esgotam as análises possíveis sobre o tema e o local, uma vez que entendemos que tanto uma cidade quanto uma pesquisa possuem caráter dinâmico e são passíveis de uma constante atualização.


NOTAS



A coleta de dados foi realizada na segunda quinzena de novembro de 2012, na Rua Oscar Freire e no quadrilátero compreendido pela Avenida Rebouças, Alamedas Casa Branca e Tietê e Rua Estados Unidos. Para o levantamento de dados foram realizadas entrevistas informais sem questionário definido, uma observação disfarçada do pesquisador como cliente oculto e também foram feitas fotografias dos aspectos analisados.


Marketing presentation é a denominação utilizada na área de marketing para descrever as características físicas de um ponto de venda, ou seja, como ele se apresenta para seu consumidor.


Entende-se aqui o olhar não como algo relacionado somente à visão, mas também a todas as demais vias sensoriais: paladar, olfato, tato e audição.


Conjunto de empresas que trabalham no mesmo setor e concorrem entre si, mas que se reúnem em uma determinada região para colaborarem em ganhos mútuos, como na atratividade de clientes, na participação coletiva em feiras e eventos e na redução de custos com fornecedores, logística, infraestrutura, tecnologia, dentre outros.


Uma das metodologias muito empregadas na área de marketing e, particularmente, no que diz respeito ao comportamento do consumidor, é a utilização de um mapa perceptivo, com o intuito de "retratar onde os produtos ou marcas estão 'localizados' na mente dos consumidores" (SOLOMON, 2008). Entretanto, o mapa perceptivo na Rua Oscar Freire, em São Paulo, já se encontra pré-estabelecido uma vez que entendemos que as grifes, lojas e demais pontos comerciais escolhem por estar naquela localização para se posicionarem junto aos consumidores como pertencentes a um mesmo grupo de lojas com atributos simbólicos semelhantes.


Para estudar os fenômenos a serem pesquisados, acrescentamos a esta pesquisa uma contribuição do campo da Arquitetura, mais especificamente, uma contribuição dos pesquisadores do grupo de pesquisa Qualidade do Lugar e Paisagem (APO/ProLUGAR) do Programa de Pós-Graduação em Arquitetura da FAU/UFRJ, que pesquisam a relação pessoa-ambiente e a avaliação do desempenho do ambiente construído. A ferramenta denominada Observação Incorporada somou-se a outros instrumentos e ferramentas consolidados em Avaliação Pós-Ocupação (APO), área da Arquitetura que estuda os projetos e construções após sua ocupação pelo usuário final. Portanto, a Observação Incorporada pode ser entendida tanto como um processo e um produto, ou um instrumento e um resultado, no sentido em que possibilita que o observador contemple o ambiente em questão como uma experiência aberta onde ambiente, usuários e outros objetos, além dele mesmo, participam da análise ou da interpretação do fato observado. (RHEINGANTZ et al. (2009) Observando a Qualidade do Lugar: procedimentos para avaliação pós-ocupação, disponível em http://www.fau.ufrj.br/prolugar/publicacoes.htm)


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Mariane Garcia Unanue

É graduada em Arquitetura e Urbanismo (UFJF), doutoranda em Arquitetura (PROARQ/UFRJ), mestre em Memória Social (UNIRIO), MBA em Marketing e Negócios (UFJF). Foi sócia no Omni Studio Arquitetos, consultora em Gestão do Visual de Lojas do SEBRAE-MG, coordenadora da graduação em Design de Interiores (CES/JF) e professora nos cursos de graduação em Arquitetura e Urbanismo e Design de Interiores (CES/JF). Atualmente é professora na graduação em Arquitetura e Urbanismo e na Pós-graduação em Arquitetura de Interiores (UFJF).



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