MATERIALISMO E ANSEIO DE REDENÇÃO: APRECIAÇÃO DA OBRA DE MAX HORKHEIMER EM SEU CONJUNTO

May 29, 2017 | Autor: Maurício Chiarello | Categoria: Critical Theory, Critical Theory of Technology, Max Horkheimer, Dialectical Materialism, Frankfurt School
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KRITERION, Belo Horizonte, no. 100, Dez/99, p.57-80

MATERIALISMO E ANSEIO DE REDENÇÃO Apreciação da obra de Max Horkheimer em seu conjunto1 Maurício CHIARELLO

RESUMO. Uma interpretação, tornada canônica desde Habermas, considera a obra de Max Horkheimer drasticamente fraturada no seu desenrolar pela redação, em conjunto com Theodor W. Adorno, da Dialética do Esclarecimento. Incapaz de se conjugar com a primeira teoria crítica, a obra tardia teria desembocado, por força de suas aporias, num beco sem saída. No intuito de desbaratar tal interpretação e restituir à obra a identidade que lhe é própria, o presente trabalho procura, num primeiro momento, mostrar o quanto a crítica da razão tradicional ou instrumental não se deixa dissociar, no pensamento de Horkheimer, de uma dimensão teológica desde sempre atuante, conferindo-lhe inegável unidade. Num segundo momento, procura evidenciar o quanto a argumentação habermasiana, que insiste no caráter aporético da crítica radical da razão e desdenha uma possível autorreflexão da razão por meio da arte e da teologia, faz vista grossa para o tema da ofuscação da dominação na trama da imanência, crucial tanto para Horkheimer como para Adorno. Assim, a preocupação com a perpetuação inconsciente da dominação desloca-se, com Habermas, para a de sua legitimação. Palavras-chave: Horkheimer, M. – Habermas, J. – Materialismo Interdisciplinar – Teologia – Teoria Crítica.

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Artigo publicado originalmente na Revista Kriterion sob o título: O mal na trama da razão: Breve apreciação da obra de Max Horkheimer em seu conjunto.

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ABSTRACT. An interpretation, rendered canonical since Habermas, considers the way Max Horkheimer’s work unfolds severely fractured by its composition, together with Theodor W. Adorno, of the Dialectic of Enlightenment. Incapable of conjoining with the first critical theory, the late work would have led to a dead end, by force of its aporia. Aiming at destroying this interpretation and restoring the work to an identity of its own, the present paper intends, at first, to show how the criticism of traditional or instrumental reason doesn't dissociate itself, according to Horkheimer, from a theological dimension always in action, granting it an undeniable unity. Secondly, it intends to make clear how the habermasian argumentation, which insists on the aporetic character of the radical criticism of reason through art and theology, overlooks the theme of the darkening of domination in the immanence plot, crucial to both Horkheimer and Adorno. Thus, the concern with the unconscious perpetuation of domination moves, with Habermas, to its legitimation. Keywords: Horkheimer, M. – Habermas, J. – Interdisciplinary Materialism – Theology – Critical Theory. O menor sinal de sofrimento sem sentido, que experimentamos no mundo, desmente toda filosofia da identidade, a qual intenta dissuadir a experiência do sofrimento2. Theodor W. Adorno

A posição especial ocupada por Max Horkheimer no Círculo de pensadores de Frankfurt levou não raro a interpretações de sua obra incapazes de apreendêla em sua verdadeira singularidade. Como diretor do Instituto e editor da Revista de Pesquisa Social, Horkheimer desempenhou incontestavelmente um papel chave tanto na determinação como na organização das principais linhas de investigação nele desenvolvidas. Consequentemente, sua obra, notadamente a inicial, deixou-se pouco desvincular dos trabalhos realizados pelos teóricos reunidos sob sua coordenação. Boa parte da recepção de sua filosofia até hoje se ressente de uma identificação apressada de sua obra com o conjunto da produção teórica da Escola de Frankfurt. Bem o reflete o pequeno número de estudos consagrados especificamente à sua filosofia proporcionalmente aos dedicados à Escola de Frankfurt no seu todo, ou a outros de seus membros renomados como Adorno, Benjamim e Marcuse. Um fator a mais comprometeu a justa exegese desta obra em sua totalidade. Se no geral a produção teórica dos pensadores de Frankfurt transformou-se no decorrer do período histórico conturbado, no qual a eclosão da Segundo Guerra Mundial pôs por terra a esperança acalentada na revolução iminente, a obra de Horkheimer em particular ressentiu-se profundamente deste golpe. Malgrado as divergências existentes entre as muitas periodizações propostas na tentativa de acompanhar o desdobrar de sua obra, os comentadores são unânimes em reconhecer o radical “corte epistemológico” que representou . No original: “Die kleinste Spur sinnlosen Leidens in der erfahrenen Welt straft die gesamte Identitätsphilosophie Lügen, die der Erfahrung ausreden möchte”. A sentença consta da obra Dialética Negativa.

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a elaboração, em conjunto com Adorno, da Dialética do Esclarecimento (publicada pela primeira vez em 1944 e reeditada em 1947)3. Ora, muitos são os trabalhos dedicados a explorar esta filosofia fraturada, no seu desenrolar histórico, em dois momentos capitais dificilmente conjugáveis, e de rara felicidade são os que logram articulá-los satisfatoriamente. A maior parte, porém, ou toma um dos momentos pela totalidade da obra, ou elege um deles em detrimento do outro em vista de determinados interesses, ou ainda põe em questão o conjunto da obra, quer pela impossibilidade de sua conciliação, quer pelas aporias a que teria sido conduzida. Ademais, quanto ao conteúdo temático, os estudos da obra de Max Horkheimer realizados até o presente podem ser agrupados, exceção confirmando a regra, ou entre os que se interessam pela crítica da razão instrumental, ou entre os que tratam de sua relação tardia com a Teologia. Ora, a nós nos parece que a apreciação isolada destes temas deixa escapar o essencial. Como procuraremos mostrar a seguir, a crítica da razão tradicional ou instrumental não se deixa dissociar da dimensão teológica de seu pensamento e, mais ainda, a articulação que entre elas se estabelece atravessa de ponta a ponta a obra de Horkheimer, conferindo-lhe uma incontestável unidade. Tomemos a caracterização do desenvolvimento da obra de Horkheimer feita por Habermas, a nosso ver emblemática, em seus traços principais, de uma boa porção dos comentários empenhados em explorar a distância, para não falar em divergência profunda, que separa a filosofia tardia de Horkheimer da primeira Teoria Crítica. Avalia ele que a aproximação de seu pensamento com o de Adorno, por ocasião da redação conjunta da Dialética do Esclarecimento, teria promovido uma ruptura irremediável com o programa de materialismo interdisciplinar da década de 1930, ruptura esta duplamente comprometedora da obra. Primeiro, na medida em que a filosofia tardia não mais corresponderia ao programa materialista inicial, a obra mostrar-se-ia incoerente no seu todo. Em segundo lugar, porque a obra tardia, crivada de contradições resultantes da incompatibilidade entre as convicções persistentes da primeira fase e as novas teses assumidas a partir da década de 1940, ver-se-ia condenada a um impasse insuperável. Ao que nos parece, Habermas é bastante injusto nesta sua apreciação. Não seria mesmo demasiado recriminá-lo por carregar intencionalmente nas tintas no sentido de salientar a coerência de uma fase inicial não menos complexa e conceitualmente tensa que a tardia, e mesmo questioná-lo pelo julgamento segundo o qual a filosofia de Horkheimer teria sido levada a um beco sem saída em função de pressupostos 3

Em sua conferência “Teoria Crítica Ontem e Hoje” (1970), o próprio Horkheimer divide a Teoria Crítica em duas.

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equivocados ou mal elucidados, em proveito assim, não é preciso dizê-lo, da proposta de uma salvadora mudança de paradigma. Sem desconhecer o mérito do esforço de clarificação conceitual empreendido por Habermas na obra daqueles que conheceu de perto e de quem, afinal, fez-se inicialmente discípulo, podemos nos perguntar se sua proposta teórica não termina por dirimir tensões não só essenciais ao pensamento de Horkheimer, como ainda latentes na realidade, ou melhor, se sua hermenêutica analítica não alivia a força das contradições que travejam o discurso filosófico que quer ir além de si mesmo  e não por mera confiança na eficácia do artifício retórico. Ao tomar tais contradições como aporias que um novo paradigma seria capaz de contornar, não procuraria Habermas sanar uma falha ali mesmo onde se encontra sua virtude? Mas acompanhemos esta caricatura  a expressão não é exagerada  elaborada por Habermas que, pela força de seus traços, figura a obra de Horkheimer deformada por uma fratura insanável e disparatada em sua fase final4. Habermas estima que o programa de materialismo interdisciplinar levado a efeito na década de 1930 e expresso nas contribuições a Zeitschrift für Sozilforschung tenha sido o único conceito coerente de toda sua obra, seu momento capital e pelo qual ela deve ser levada a sério. Sim, porque desde então faltará a seu pensamento um laço unificador: sua filosofia tardia será atravessada por uma “contradição de forma alguma dialética que se revela abertamente e que Horkheimer muito menos se dispõe a resolver”5. Deste então, isto é, desde que entre 1941 e 1944 consuma-se a viragem para uma filosofia negativista da história. Habermas descreve da seguinte maneira este consistente programa materialista dos anos 30: “O conceito de materialismo teve sempre para Horkheimer uma conotação de crítica da filosofia; ele se punha como um pensamento pós-metafísico. Junto com Marx, Horkheimer também acreditava que com a filosofia de Hegel o pensamento filosófico tinha chegado ao fim – que todo idealismo, que procurava manter-se fiel à tradição formal em continuação da filosofia hegeliana, entorpecia-se como ideologia e só servia para ocultar a miséria concreta e o sofrimento individual sob conceitos gerais transfiguradores. Juntamente com Marx, Horkheimer entendia que somente uma realização prática poderia salvar o conteúdo de verdade da filosofia. Mas Horkheimer, aliás cético como Marx, achava-se numa situação em que procedia a esperança 4

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No que segue, baseio-me no ensaio de Habermas “Bemerkungen zur Entwicklungsgeschichte des Horkheimerschen Werkes” (1986). Jürgen HABERMAS, “Bemerkungen zur Entwicklungsgeschichte des Horkheimerschen Werkes”. In SCHMIDT, A. & ALTWICKER, N. (org.) Max Horkheimer Heute: Werk und Wirkung. Frankfurt: Fischer Verlag, 1986, p. 166.

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histórica numa revolução iminente. Deste modo, no passo mediador para a reconstrução e o aperfeiçoamento, as teorias científicas, imunes à ilusão idealista, ganhavam um peso próprio. Sim, esta teoria social obteve uma nova significação na perspectiva da conservação do conteúdo ocidental de uma filosofia esgotada. Horkheimer trata da superação [Aufhebung] da filosofia por meio da teoria social; a transformação científico-social fornece a única chance de sobrevivência para o pensamento filosófico”6. Ora, a Teoria Crítica da década de 1930 de forma alguma renega a filosofia a ponto de reduzi-la à investigação conduzida pelas ciências sociais. Ao enfatizar o peso próprio que, é certo, Horkheimer concede neste momento às teorias científicas frente às correntes idealistas, Habermas deixa na sombra o outro lado, isto é, a crítica não menos contundente da teoria tradicional. Se, com efeito, as teorias científicas encontram-se imunes à ilusão idealista, não se deve desconhecer, em contrapartida, o quanto não escapam da ilusão reificante que justamente a Teoria Crítica busca superar. Esta tensa transposição do conteúdo racional da tradição filosófica para o âmbito científico não se faz sem mediações, muito menos num só sentido. Em outras palavras, esta Aufhebung da filosofia por meio da teoria social não é tal que renegue sem mais toda filosofia como idealismo em favor da investigação das ciências sociais: “Ao contrário da atividade científica nas disciplinas modernas, a teoria crítica da sociedade, mesmo enquanto crítica da economia, permanece filosófica”7. De proveniência hegeliano-marxista, o programa de materialismo interdisciplinar dos anos 30 consistiu, na realidade, numa crítica dialética da relação entre filosofia e ciências especializadas. Embora comece com dados e resultados analíticos das ciências especializadas, a eles não se limita, pois não são ainda tidos como conhecimento, mas fragmentação do objeto do conhecimento. Na reconstrução dos objetos sociais no processo histórico concreto, nesta etapa de representação distinta da pesquisa, tem lugar o pensamento dialético que faz jus ao nome de filosofia, e isto na medida em que, não se reduzindo ao positivismo, põe-se, ao mesmo tempo, como crítico de uma especulação pretensamente desinteressada própria da metafísica. A coerência que Habermas valoriza neste programa integrador da filosofia com as ciências especializadas mitiga a problemática de seu conteúdo dialético. As tensões que o atravessam são afinal as mesmas que aproximam e distinguem

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Ibidem, p. 164. Max HORKHEIMER, GS, 4. Do ensaio “Filosofia e Teoria Crítica” (1937) [Tradução brasileira: Benjamin, Horkheimer, Adorno, Habermas: Textos Escolhidos (col. Os pensadores). São Paulo: Abril, 1979, p. 159]. Todas as citações de Max Horkheimer referem-se à edição em 18 volumes de suas obras completas, que abreviamos aqui pela sigla GS: Gesammelte Schriften. Frankfurt: Fischer Taschenbuch Verlag, 18 vol., 1985-1991. O número posposto à sigla designa o volume desta edição.

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a Teoria Crítica da Tradicional, e a unificação pretendida, longe de considerarse consumada, põe-se como meta de um programa materialista que exige a práxis histórica. Certo é que, neste momento, a reconciliação era uma possibilidade que se punha no futuro imediato da práxis revolucionária, enquanto que, a partir da Dialética do Esclarecimento, sua realização parecerá mais do que nunca problemática no horizonte da história. Certo é que desaparece, na filosofia tardia, a esperança de que por meio da revolução o conceito tradicional e instrumental de razão burguesa daria lugar a um conceito enfático de razão. Mas se esta teoria torna-se então pessimista também quanto à resolução das contradições por intermédio da práxis, não perde, porém, o anseio por um conceito enfático de razão que, aliás, já norteava o programa de materialismo interdisciplinar. O profundo corte biográfico que marca a obra de Horkheimer corresponde inegavelmente à eclosão da Segunda Grande Guerra  a barbárie e não a revolução. Sua motivação exterior mais imediata, porém, Habermas a situa em abril de 1941, quando então Horkheimer transfere-se para a Califórnia no intuito de colaborar exclusivamente com Adorno, deixando atrás de si o Instituto de Morning Side Heights, seu círculo estreito de colaboradores, os últimos números da Revista, enfim, “um mundo que tinha organizado e inspirado intelectualmente”8. Habermas entende que o trabalho intelectual conjunto que resultou na redação da Dialética do Esclarecimento significou para Horkheimer a admissão de uma constelação temática própria da filosofia de Adorno e incompatível com seu pensamento até então. Assim, enquanto para Adorno a Dialética inserir-se-ia naturalmente na linha de sua obra, para Horkheimer, ao contrário, ela teria exigido uma revogação do programa seguido pela Revista de Pesquisa Social9. As novas teses assentidas, destacadas por Habermas, compõem a imagem estereotipada mais largamente difundida da filosofia tardia de Horkheimer. Em primeiro lugar, a de uma filosofia

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Jürgen HABERMAS, op. cit., p. 167. Segundo Habermas, “o fato da Dialética do Esclarecimento permanecer uma coleção de fragmentos não constituiu intenção original de Horkheimer. Tinha ele planejado uma obra sistemática e, até então, empregado uma forma de exposição convencional. Contudo, Adorno estava desde muito cedo convencido de que o caráter fragmentário da exposição é o único apropriado ao pensamento filosófico” (op. cit., p. 170). Ora, Habermas negligencia aqui uma componente assistemática atuante desde os primeiros escritos de Horkheimer. Não é descabido lembrar a coletânea de fragmentos Dämmerung (1936), que acolhe apenas uma parte das inúmeras notas tomadas entre 1926 e 1931. Consoante à forma fragmentária da exposição, não poucos destes aforismos tecem críticas veementes aos coerentes sistemas metafísicos e às racionalizações da filosofia idealista: “sistema global de dissimulação da verdade”, “bem pensada exegese de mentiras” são alguns dos epítetos conferidos a estas construções lógicas justificadoras dos sofrimentos humanos. Difícil crer, ademais, que o abundante volume de fragmentos de Notizen 1950-1969 (e também aqui nem todos os redigidos ao longo das décadas de 50 e 60 foram escolhidos por Horkheimer para sua publicação póstuma) teria vindo à luz apenas em função daquele “profundo corte biográfico”.

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negativista da história: afastando-se da concepção materialista, ela passaria a admitir uma lógica intrínseca ao processo histórico orientada para o mundo totalmente administrado; paralelamente, a esperança revolucionária, perdendo sua ancoragem no mundo, tornar-se-ia utópica no mau sentido. Em segundo lugar, a de um ceticismo científico: compartilhando com Adorno sua desconfiança quanto ao positivismo em geral e quanto à sociologia em particular, ela distanciar-se-ia da proposta marxista de entendimento teórico dos processos sociais e aproximar-se-ia de Nietzsche pela crítica radical da razão, pela denúncia de seu profundo parentesco com a dominação. Por fim, a de uma guinada teológica: a religião surgiria agora como a única instância capaz de emprestar à vida um sentido transcendente ao princípio de auto conservação da razão instrumental dominante; somente ela permitiria ainda distinguir o verdadeiro do falso, o moral do imoral. Para Habermas, porém, Horkheimer não teria podido renunciar resoluta e absolutamente a suas convicções primeiras. Ele teria continuado a fiar-se instintivamente no potencial racional da sociedade do capitalismo desenvolvido, mantendo uma atitude afinal positiva quanto à forma estatal da democracia ocidental e quanto à forma de vida da civilização ocidental. Para tanto, teria contribuído seu engajamento na reconstrução do Instituto de Pesquisa Social, quando participou de projetos de revitalização da pesquisa social empírica, visando renovar a conexão entre as atividades científicas estabelecidas. Estas convicções renitentes, convivendo agora lado a lado e sem termo de conciliação com a nova constelação temática, explicariam o caráter aporético da obra tardia: “A filosofia tardia é marcada por um dilema: a Dialética do Esclarecimento não pode ficar com a última palavra, mas ela impede o caminho de volta para o materialismo dos anos 30”10. Farei aqui umas poucas e breves observações procurando sustentar, contra esta interpretação habermasiana de uma ruptura na obra, que as contradições que marcam a filosofia tardia já se faziam presentes no programa de materialismo da década de 1930, apenas agora radicalizadas. Mais ainda, que a distensão conceitual que Habermas diagnostica na filosofia tardia como sendo a “sobreposição de dois movimentos contrastantes” é antes um leitmotiv da obra que se faz sentir, de fato, desde o seu começo. Segundo a apreciação habermasiana da relação entre a filosofia e as ciências especializadas na obra tardia, a aporia que a compromete consiste, in nuce, em que sua crítica radical rejeita a razão e, ao mesmo tempo, não abandona a confiança no potencial emancipador desta mesma razão. Aqui, como repetidamente em outros trabalhos seus, Habermas reporta-se a ela como a

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Jürgen HABERMAS, op. cit., p. 175.

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aporia da crítica autoreferente da razão: “Se o esclarecimento é compreendido como um processo irrefreável de autodestruição, de onde ainda extrairia o direito para este diagnóstico a crítica que o estabelece? Desde Nietzsche é sempre a mesma coisa: a crítica radical da razão procede de modo autorreferente; a crítica não pode ao mesmo tempo ser radical e deixar incólume o próprio padrão de avaliação”11. Em outros termos, uma autocrítica totalizante da razão não tem como escapar do paralogismo da petição de princípio: ela desacredita a si mesma ao pôr sob suspeição o esclarecimento. Bem considerando, a inconsistência da crítica filosófica de Horkheimer resultaria, para Habermas, do fato de pretender contar unicamente com a virtude esclarecedora da razão, enquanto a de Adorno, nisto mais coerente, respaldar-se-ia na experiência estética da arte moderna como fonte independente de conhecimento capaz salvaguardar a crítica. Ora, não nos parece que aqui, como avalia Habermas, a posição de Horkheimer seja inteiramente distinta da de Adorno. Em diversas passagens Horkheimer sublinhou a correspondência da Teoria Crítica tardia com a arte12. Certo é que, em conjunto com a arte, o apelo à tradição da grande filosofia e às imagens religioso-metafísicas assume na sua filosofia tardia uma importância que não têm na de Adorno. Mas nem por isso deixam de fundar um conjunto de referência recíproca capaz de guardar distância da concepção predominante de razão, distância esta que torna possível a crítica de seu caráter meramente instrumental na medida em que nele se preserva o anseio pela ideia de uma totalidade reconciliada. Mas tal distanciamento é também, e isto é fundamental, apenas suficiente para que esta razão tome consciência de sua perversidade radical, e não tal que resvale para o irracionalismo, como quer a interpretação habermasiana do inteiramente outro. No mal existente manter sim presente o outro, mas sem abrigar-se na sabedoria divina. A religião não aparece para Horkheimer como um reservatório da moral, como “única instância capaz de emprestar um sentido transcendente à razão de auto conservação”. Ao contrário, devemos dizer que a moral para ele mais genuína é a que advém da autocrítica da razão, possível graças ao distanciamento próprio do conceito, à dimensão transcendente que se preserva na própria razão. Essa tomada de distância frente à racionalidade dominante não recusa por princípio a razão quando coloca em questão sua própria natureza. Afirmar o contrário seria desconsiderar a vertente do pensamento do Horkheimer

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Ibidem, p. 171. Mesmo Habermas observa, numa nota de rodapé do trabalho supracitado, sem, portanto, lhe conceder a devida relevância, que Axel Honneth lhe indicara a presença deste motivo também em Horkheimer (cf. nota 25).

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de acordo com a qual não é na racionalidade subjetiva e instrumental em si mesma que radica o mal, mas em sua hybris, vale dizer, na absolutização da verdade científica (assim como, por outro lado, continua a denunciar, na esteira de Kant, a hybris do absoluto metafísico). Assinalar os limites que este conceito de razão teima em esquecer na identificação positivista da verdade com a ciência é tarefa mor a que se propõe esta filosofia tardia, em que a evocação de um conceito enfático de razão cumpre o papel de despertar a crítica. Na medida em que tal crítica não renega pura e simplesmente o conceito tradicional de razão instrumental, mas sim pretende levá-lo além de si mesmo, o Horkheimer tardio permanece fiel, é justo dizê-lo, à proposição de Teoria Tradicional e Teoria Crítica (1937): “O futuro da humanidade depende da existência do comportamento crítico que abriga em si elementos da teoria tradicional e dessa cultura que tende a desaparecer”13. Tornou-se agora apenas mais pessimista quanto a esta tendência histórica, com que a crítica julgava então contar, no sentido da superação das contradições existentes entre a crítica filosófica e as teorias científicas. Pelo que, a Teoria Crítica tardia vê-se obrigada a conviver com a manutenção destas contradições, mas sem perder de vista a exigência de conciliação. É notável, assim, como numa de suas últimas conferências, “O pensamento de Schopenhauer em relação com a ciência e a religião” (1971), Horkheimer venha a interpretar a doutrina de Schopenhauer à luz de um esforço paradoxal de conciliação da ciência com a religião, pelo que a enaltece14. Em favor da tese da ruptura, Habermas quer nos fazer crer que o Horkheimer tardio, perdendo a esperança teórica dos anos 30 de que o conteúdo racional da tradição filosófica fosse levado a termo pela teoria crítica da sociedade, só poderia buscar refúgio na teologia: “É o mesmo pensamento obstinadamente pós-metafísico, crítico da filosofia, que ainda coage Horkheimer a considerar como única alternativa ao positivismo desconsolador, não novamente a filosofia, e também não o conteúdo da dialética negativa, mas sim a teologia”15. Ora, ele aqui faz vista grossa para o quanto já na década de 1930 aquela esperança teórica de transposição científica da filosofia se deixava tingir pela crítica da teoria tradicional, o que observamos atrás, e o quanto, por outro lado, a dimensão teológica se fazia já atuante na Teoria Crítica inicial, do que trataremos mais adiante.

Max HORKHEIMER, GS, 4, p. 213. Do ensaio “Teoria Tradicional e Teoria Crítica” (1937). [Tradução brasileira: Benjamin, Horkheimer, Adorno, Habermas: Textos Escolhidos (col. Os pensadores), op. cit., p. 156]. 14 Ver Max HORKHEIMER, GS, 7, pp. 240-52. Da conferência “O pensamento de Schopenhauer em relação com a ciência e a religião” (1971). 15 Jürgen HABERMAS, op. cit., p. 174. 13

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Isto posto, gostaria ainda de referir-me ao ensaio de Alfred Schmidt “Die geistige Physiognomie Max Horkheimers” contra esta interpretação habermasiana de uma ruptura insanável no desenrolar da obra de Horkheimer. Schmidt vê na obra tardia, especialmente em Notizen 1950-1969, a exposição da camada mais profunda de seu pensamento, aquele Abgrund hinter jedem Grunde nietzscheano onde vêm a tona as contradições mais fecundas de um pensamento levado ao limite. Os Notizen seriam, assim, o documento mais elucidativo não só da filosofia tardia de Horkheimer, mas o mais revelador de toda sua obra: “Os Notizen são o legado espiritual de Horkheimer. Eles devem substituir aquela obra abrangente que a morte o impediria de escrever, conforme repetiu nos seus últimos anos de vida”16. Frequentemente mal compreendida, a fase tardia não representaria “nenhuma ruptura brusca com as fases anteriores de seu pensamento, mas sim sua superação dialética”17. Concedamos a esta Aufhebung o peso hegeliano devido: não um mero renegar da fase passada, mas o reassumir de seu conteúdo de verdade. De forma mais aguda que todas as pregressas, na fase tardia o pensamento de Horkheimer toma consciência das dissensões, quiçá insanáveis, que atravessam o mundo e reverberam em sua obra. Mas que nela se exprimem desde o começo: “Desde o princípio, o pensamento de Horkheimer move-se, o que raramente se compreende, numa dupla frente: contra uma metafísica ‘doadora de sentido’ e contra um positivismo avesso ao conceito, que nega abstratamente todo o sentido que transcenda o aqui e o agora”18. É, com efeito, uma constante em toda sua obra este embate dialético, esta crítica recíproca entre o imanente e o transcendente que seu pensamento procura promover visando a reconciliação, sempre ciente, porém, de que a verdadeira conciliação não é a que se consuma pelo conceito, mas a que requer e só pode efetivar-se por meio da práxis material, vale dizer, através da transformação do contexto sócio-econômico. Como em toda contraposição dialética, também aqui cada lado diz a verdade a respeito do outro, pelo que a metafísica é capaz de assinalar os limites do positivismo e vice-versa. Num estudo extremamente feliz, Matthias Lutz-Bachmann insiste na relevância que o tema da religião possui em Horkheimer, procurando demonstrar a surpreendente continuidade da ideia de religião ao longo de toda sua obra, desde os ensaios da Revista de Pesquisa Social até os aforismos póstumos de Notizen 1950-1969  dissipando, de resto, o sensacionalismo com

Alfred SCHMIDT, “Die geistige Physiognomie Max Horkheimers”. In: _____. Drei Studien über Materialismus, Munique: Carl Hanser Verlag, 1977, p. 131. 17 Ibidem, p. 109. 18 Ibidem, p. 84. 16

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que os comentários dos anos 70 exploraram a dimensão teológica na obra final de Horkheimer: “A preocupação de Horkheimer com a religião, sobretudo a cristã, atravessa toda sua obra e não se separa de seu questionamento central. Se no último período Horkheimer se ocupa com o tema da religião talvez mais claramente que no primeiro, pode-se mostrar, em contrapartida, que a problemática religiosa está estreitamente vinculada com os escritos da década de 1930. Assim, a questão da religião é colocada quando Horkheimer discute o problema da limitada faculdade cognitiva do homem sob o pano de fundo da crítica do conhecimento de Kant e Schopenhauer. [...] A questão da religião se põe quando se trata do problema da filosofia da história e do limite de uma fundamentação filosófica ou positiva da ação”19. Com muita acuidade, Bachmann observa que o conceito teológico de infinito, evitando manifestar-se ostensivamente, faz-se onipresente na obra pelo seu avesso: na insistente designação da finitude humana. Levar teoricamente a sério o infinito significa admitir o não compreensível e o não realizável, reconhecer limites ignorados pela faculdade cognoscitiva e pela capacidade ativa humanas como condição de possibilidade de sua transcendência. O que é outra forma de referir-se ao pessimismo metafísico que marca este materialismo com o paradoxal signo da esperança. Com efeito, a crítica horkheimeriana da religião não coincide com o ateísmo professado pelo marxismo oficial, mas tampouco deságua numa nova dogmática: “Ela se entende antes como parte do esforço no sentido de colaborar para o esclarecimento filosófico dos limites da faculdade cognoscitiva humana. Isto desloca sua filosofia para a vizinhança espiritual de Schopenhauer ao mesmo tempo em que, com Marx, estabelece a capacidade dos homens de revolucionar sua história através de ações práticas. O que Horkheimer critica é o otimismo do saber absoluto, a hybris que salta para fora dos limites inexcedíveis do conhecimento humano e a certeza de já possuir a chave da reconciliação da humanidade  como ocorre na filosofia hegeliana, na religião, especialmente a cristã, mas também no conceito de totalidade marxista. Seu materialismo reflete ‘a consciência da caducidade das ações humanas’, e ‘a amargura do fim’, tal como ele o exprime”20. Embora Horkheimer acolha a denúncia marxiana do caráter ilusório da religião, como formulada na Introdução à Crítica da Filosofia do Direito de Hegel, não consente, em contrapartida, que a ideia de religião seja suplantada pela crítica do direito e da política. As análises científicas, a crítica filosófica e

Matthias Lutz-BACHMANN, “Humanität und Religion: zu Max Horkheimers Deutung des Christentums”. In SCHMIDT, A. & ALTWICKER, N. (orgs.). Max Horkheimer Heute: Werk und Wirkung, Frankfurt: Fischer Verlag, 1986, p. 108. 20 Ibidem, pp. 114-5. 19

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mesmo o recurso à práxis transformadora da sociedade não terminam por dispensar a ideia de Deus e a imagem da suprema justiça a ele associada: “Deus é também ilusão dos homens para Horkheimer; mas no conceito de Deus articula-se ao mesmo tempo a esperança dos homens em franquear os limites estabelecidos pela natureza e pela história. Não é a recusa desta imagem que distingue o homem progressista atual do anterior, mas sim o conhecimento dos limites de sua realização”21. Já nos trabalhos dos anos 30, Bachmann reconhece atuante um pessimismo metafísico que não se conjuga facilmente com uma crença despreocupada no progresso como a que se articula no marxismo vulgar. Em oposição à apatia da atitude positivista, o pensador materialista e o religioso comungam no sentimento de abandono infinito dos homens e no anseio pelo advento da justiça universal. Assim é que Horkheimer julga legítimo encontrar nos escritos de todo grande pensador materialista um vestígio de tristeza metafísica. Num curto ensaio que remonta ao ano 1935, mas que bem poderia figurar entre as obras da fase tardia, Horkheimer escreve: “No conceito de Deus preservou-se por muito tempo a ideia de que há outra medida além daquela que se exprime na natureza e na sociedade em sua ação recíproca. Da insatisfação com o destino terreno, o reconhecimento de um ser transcendente extrai o seu poder mais forte. Se a justiça está com Deus, então não está no mundo na mesma proporção. Na religião estão depositados os desejos, os anseios [Sehnsüchte] e os protestos de inúmeras gerações”22. Uma vez assinaladas estas linhas de força  que passam pelas categorias teológicas da finitude e da reconciliação, assim como pela crítica recíproca entre o imanente e o transcendente  capazes de conferir à obra a identidade que lhe é própria, seria preciso atentar para o quanto, e de que maneira, a radicalidade introduzida na teoria a partir da Dialética do Esclarecimento configura efetivamente um ponto de inflexão a mudar o perfil da obra. Procurarei tratar desta virada que melhor compreende o “corte habermasiano” sob quatro aspectos: 1) quanto ao pessimismo metafísico; 2) quanto ao anseio de emancipação; 3) quanto à racionalização dos afetos e 4) quanto ao conceito materialista de natureza. 1. Horkheimer faz ao longo de toda sua obra um uso crítico do pessimismo, o que bem pode depor contra a tese de uma ruptura brusca no desenvolvimento das formulações da Teoria Crítica. Contudo, alguns comentadores que insistem neste pessimismo em prol da tese da continuidade, perdem de vista a especificidade da mudança ocorrida. Há uma passagem do ensaio

21 22

Ibidem, p. 114. Max HORKHEIMER, “Gedanke zur Religion” apud Matthias Lutz-BACHMANN, op. cit., p. 113.

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“Materialismo e Metafísica” (1933) muito citada para evidenciar o traço pessimista marcante da Teoria Crítica já dos anos 30, e que reza: “Apesar de todo o otimismo que o materialismo possa sentir com relação à mudança das condições, apesar de toda valorização da felicidade que brota da solidariedade e do esforço pela mudança, ele carrega consigo um traço pessimista. A injustiça passada é irremediável. Os sofrimentos das gerações anteriores não serão jamais compensados”23. Freqüentemente omitida, a continuação da passagem é, contudo, surpreendente, porque insiste no seu otimismo quanto ao futuro: “Todavia, enquanto o pessimismo nas correntes idealistas costuma referir-se, hoje, ao presente e ao futuro na terra, isto é, a impossibilidade da futura felicidade universal, e costuma manifestar-se como fatalismo ou decadência, a tristeza inerente ao materialismo diz respeito aos fatos do passado”24. Gérard Raulet assinala com justeza que o Horkheimer de 1937 guarda distância do otimismo lukácsiano, aquele que encontra no proletariado a classe destinada a resolver as contradições intrínsecas ao desenrolar dialético do processo histórico25. Com efeito, Horkheimer desde então já não compartilha desta certeza tranquilizadora: nada pode garantir absolutamente a realização revolucionária de uma sociedade racional. Exacerbando, contudo, esta dúvida, e mesmo negligenciando o que há de marxiano no materialismo desta primeira Teoria Crítica, Raulet atribui a ela uma esperança teórica desencarnada, de que dependeria a realização da razão na história. Como se esta Teoria Crítica inicial não se compreendesse francamente distinta da mera utopia, como se sua esperança não se pretendesse enraizada no conhecimento de tendências concretas latentes no processo histórico: “Ainda que Marx não tenha demonstrado o socialismo, mostrou que no capitalismo existem tendências evolutivas que o fazem possível. Os nele interessados sabem onde agarrar-se. A ordem socialista não é impedida pela história mundial; é historicamente possível, mas se faz efetiva não por uma lógica imanente, e sim por homens decididos pelo melhor, formados na teoria  ou não se faz absolutamente”26. Que o desenrolar subsequente da história tenha fraudado, e com horror inconcebível, o conhecimento destas tendências e a aposta nelas depositada, em nada modifica a pretensão desta teoria materialista anterior à Segunda Grande Guerra de ancorar-se no real. Assim, Raulet despoja a utopia teórica dos anos

Max HORKHEIMER, GS, 3, p. 86. Do ensaio “Materialismo e Metafísica” (1933). [Tradução brasileira: Teoria Crítica: Uma documentação, São Paulo: Perspectiva, 1990, p. 43]. 24 Idem Ibidem. 25 Cf. Gérard RAULET, “Kritik der Vernunft und kritischer Gebrauch des Pessimismus”. In SCHMIDT, A. & ALTWICKER, N. (orgs.). Max Horkheimer Heute: Werk und Wirkung, Frankfurt: Fischer Verlag, 1986, pp. 31-51. 26 Max HORKHEIMER, GS, 2, p. 344. Do apontamento “Ceticismo e moral” de Dämmerung. 23

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30 de seu caráter concreto, considerando como um mero prolongamento seu o anseio teológico pelo inteiramente outro do último Horkheimer. O que não significa, por outro lado, que esta Teoria Crítica inicial confie cegamente numa lógica intrínseca ao desenrolar histórico. Desde já, seu materialismo acolhe o elemento de fantasia, de anseio pelo melhor que, ainda que de forma confusa ou irracional, reverbera na própria realidade concreta  no que, aliás, guarda parentesco com a genuína esperança religiosa. 2. O apontamento “Esquecimento” de Dämmerung (1936) não deixa dúvidas sobre a renitente componente teológica que habita este pensamento materialista desde seus começos. A teoria efetivamente emancipadora se faz consoante à ideia da vinda do messias: “Se alguém está profundamente abatido, exposto a uma eternidade de tormentos que os demais homens lhe infligem, então eleva, como uma ilusão liberadora, a ideia de que virá aquele que está na luz e lhe permitirá de novo conhecer a verdade e a justiça. [...] É amargo morrer na obscuridade. Iluminar tal obscuridade é a glória da investigação histórica”27. Gostaria aqui de sublinhar a confluência, almejada por este pensamento, de um movimento no fundo de duplo sentido. A esperança de redenção, esta imagem de justiça plena e do sumo bem, anima certamente o pensamento do primeiro Horkheimer. Contudo, precavendo-se contra a teologia dogmática, ele não se põe como um discurso sobre o transcendente, vale dizer, como um discurso alheio às preocupações materiais da imensa maioria dos homens. Ao contrário, o anseio redentor que acolhe e do qual se faz porta-voz brota, efetivamente, de uma realidade concreta que clama por um mundo melhor: “Com todos os problemas que pode possuir o pensamento da eternidade, serão mais propriamente os que sofrem, em seu desespero, os que o produzirão, e não os funcionários dele encarregados. Este pensamento tem a propriedade de aparecer mais na esperança ingênua e mais toscamente sensível, como o mais puro e sublime, do que na metafísica espiritualista e na teologia; esta fez dele algo refinado, sem substância, desterrado do âmbito das representações dos homens, para poder superar mitologicamente suas contradições com a realidade; a teologia subtraiu-o das ilusões demasiado materiais dos dominados e o acomodou melhor aos fins dos dominantes”28. Nesta primeira fase,

27 28

Ibidem, p. 452. Do apontamento “Esquecimento”. Ibidem, p. 451. Do apontamento “O insondável”. Entre tantas outras passagens correlatas que podemos encontrar nos ensaios da década de 1930, tomemos esta, extraída de “Materialismo e Metafísica” (1933): “A vida da maioria das pessoas é tão miserável, as privações e humilhações são tão inúmeras, os esforços e as conquistas encontram-se em sua maior parte num descompasso tão flagrante, que é por demais compreensível a esperança de que esta ordem não seja a única verdadeira” (GS, 3, p. 83. Tradução brasileira: Teoria Crítica: Uma documentação, op. cit., p. 41).

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para repeti-lo mais uma vez, a esperança de redenção genuína revela-se impulso latente na história visando transcender as insuportáveis condições materiais da maior parte da humanidade. Reconhecê-la como tal implica, no mesmo movimento, desembaraçar-se das ilusões quer consoladoras, por parte do reino do além da teologia, quer justificadoras, por ingerência dos princípios metafísicos. Ao explicar o reino transcendental como uma hipótese que extrai seu alento da esperança concreta dos homens, ao compreender que o anseio pelo reino dos céus nasce de um desejo de felicidade frustrado ao longo de toda vida terrena, este materialismo pretende desbaratar tanto a racionalização idealista como a justificação teológica, elegendo como meta a transformação das condições concretas que determinam o infortúnio. Notemos que aqui, na medida em que o anseio redentor desta teoria se faz estrita e conscientemente correlato à esperança revolucionária, na medida em que pretende corresponder a um anseio antes constatado na realidade, evitando assim fundamentá-lo filosoficamente como o fazem as correntes idealistas, esta teoria materialista admite um elemento positivo. Tal pretensa confluência entre expressão teórica e constatação prática do anseio emancipador, já então tensa, mostrar-se-á paradoxal na filosofia tardia: a constatação nada exprime, e a expressão nada pode constatar, sobre o que retornaremos. A ambivalência que Horkheimer demonstra em face da ideia religiosa de salvação, já latente nos escritos iniciais mas que se manifesta mais claramente na obra tardia, poderia ser formulada na seguinte questão: são as mazelas da dura e crua realidade terrena que engendram o anseio concreto por um mundo melhor, que a teologia transfigura na ilusão consoladora de um reino transcendente, ou, ao contrário, é a imagem enfática do sumamente bom que, contraposta à fatídica realidade deste nosso mundo, possui a virtude de despertar o anseio por algo além? Em outras palavras, o bem absoluto não passa de reflexo transfigurador do mal existente, este sim real, ou é o mal existente que só se descortina frente à ideia do verdadeiramente bom? Ao longo de toda a obra de Horkheimer, estes dois elementos jamais encontram-se dissociados: por um lado, não há princípio metafísico que se sustente diante da visão dos males deste mundo; por outro, não há mal que se veja, não há sofrimento que se exprima, senão no apelo a uma realidade transcendente. Contudo, fica aqui sugerido que o primeiro Horkheimer mais se aproxima desta explicitação da ilusão transcendente a partir da realidade imanente, à semelhança da necessidade metafísica schopenhauriana. E também, por extensão, à semelhança do pensamento de Nietzsche, no desmascaramento do céu das ideias como aparência enganadora, que extingue o real anseio por um mundo melhor na crença compensatória de um além. Importa ressaltar, porém, que o primeiro Horkheimer não desacredita meramente os valores da

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religião e da moral, mas sim procura fazê-los corresponder à realidade, resgatando a genuína esperança de redenção que neles se exprime, isto é, aquela que, como um impulso contra a realidade, brota dos homens oprimidos e sofridos. Quando o último Horkheimer passa a insistir na necessidade de preservação da religião no bom sentido, é porque a imagem de um ser absoluto, da suprema justiça, afigura-se lhe então mais do que nunca indispensável para que, graças a sua iluminação, a realidade terrena cobre consciência das trevas que a envolve. No impulso voltado a desmascarar o caráter ilusório dos ideais transcendentes, a primeira Teoria Crítica conciliaria mais facilmente Marx com Schopenhauer (muito embora incline-se para Marx, afastando-se de Schopenhauer, na confiança depositada na instauração destes ideais no mundo por uma práxis revolucionária). Já na obra tardia de Horkheimer, que quer persistente a contradição capaz de assinalar o caráter finito e imperfeito do existente, somente graças a qual pode brotar o anseio pela reconciliação, a doutrina de Schopenhauer ganha o primeiro plano em detrimento de Marx e Hegel (ambos criticados pelo otimismo com que conceberam a reconciliação dos ideais com a realidade, quer pelo sistema de pensamento, quer pela práxis futura). 3. Poderia a razão, como pretende a primeira Teoria Crítica, incorporar os afetos dos dominados contra os dominadores e assim conciliar a pesquisa científica especializada com o anseio emancipador? Em outras palavras, poderia uma teoria que vai além de sua concepção tradicional reconhecer os afetos denegados pela prescrição de neutralidade axiológica, compreendendo que a alardeada imparcialidade ou objetividade científica significa na verdade uma franca opção pelo estado de dominação reinante? Mais ainda, seria ela capaz de reconhecer que a exigência de neutralidade implica a censura dos afetos emancipadores, mas não daqueles que atuam em nome da perpetuação da ordem existente, e assim, na exata medida em que se libera da reificação vigente, assumir conscientemente os anseios latentes na realidade no sentido de promover uma organização mais justa e racional da sociedade?29 Já nos apontamentos de Dämmerung (1936) ecoa a vertiginosa sondagem nietzscheana da vontade de verdade. Não há conhecimento completamente independente das pulsões afetivas; a afirmação da busca desinteressada da verdade não passa de ilusão ideologicamente eficaz. O pensamento que renega os afetos subjacentes, pondo-se como pensamento pelo próprio pensamento, como um pensamento fetichizado que manifesta um completo desinteresse

29

Cf. em Dämmerung o apontamento “Afetos censurados”: GS, 2, pp. 442-3.

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pelo destino da sociedade e de todos os seus membros, de modo que “não resta amor ou ódio algum, medo ou vaidade, nem sequer a menor centelha de compaixão ou mesmo de solidariedade”30, este pensamento perde sua razão de ser, que é a de ser instrumento de melhoramento das relações humanas. Como notamos, o primeiro Horkheimer não julga que o pensamento burguês reclame o sacrifício dos impulsos afetivos em geral e extraia daí sua eficácia, mas sim que, entre tantos afetos velados que o animam, renegue, em nome de uma suposta aspiração desinteressada pela verdade, somente os que anseiam a transformação da ordem existente, os que assim corresponderiam ao interesse do proletariado pela revolução. Os ensaios da década de 1930, notadamente “Egoísmo e Movimento Emancipador” (1936), aprimoram estas considerações com o refinamento de uma teoria marxista estudada em profundidade. Gostaria apenas de salientar que neles o mecanismo de dominação interior já é entendido como inseparável do processo civilizador, não limitado, portanto, à sociedade burguesa. Para esta primeira Teoria Crítica, a renúncia aos instintos naturais faz efetivamente parte do processo de domínio técnico da natureza. A diferença é que, a esta época, e em conformidade com seu marxismo, esta teoria contava que o domínio sobre a natureza havia atingido um ponto que não mais justificava o nível de renúncia exigido das massas oprimidas. Destarte, a crítica dirigida contra a moral idealista, contra a ideologia e contra a reificação vigente na ciência atinha-se a que estas, e cada qual a seu modo, legitimavam tal renúncia tornada supérflua31. Ora, a razão instrumental e subjetiva, tal como concebida a partir da Dialética do Esclarecimento, não tem a sua própria genealogia associada ao sacrifício das pulsões mais vitais do sujeito? Com efeito, na esteira de Nietzsche, a crítica passa a recair agora sobre a adaptação incondicional ao existente, estratégia de auto conservação predominante ao longo da história da humanidade calcada no autodomínio, subjugação das pulsões naturais mais vitais. Trata-se, desde então, de algo mais radical que a censura tácita, por parte de uma racionalidade tradicional, dos afetos que colocam em jogo os

30 31

Ibidem, p. 364. Do apontamento “O esforço desinteressado pela verdade”. Mesmo a doutrina do ressentimento de Nietzsche não escapa desta crítica. Ela não deixa de renegar, apesar de tudo, o anseio emancipatório dos oprimidos, o ímpeto revolucionário da classe operária. Horkheimer a vê como uma fina artimanha que reserva a crítica ao sistema somente àqueles que nele estão interessados, enquanto os que sofrem a opressão vêm-se estigmatizados como amargurados, invejosos e vingativos ao manifestar seu descontentamento (GS, 2, p. 336. Do apontamento “Sobre a doutrina do ressentimento”). “De fato, Nietzsche está muito satisfeito com a existência das massas; em nenhum momento se mostra verdadeiramente inimigo do sistema baseado na exploração e na miséria [...]. As metas de Nietzsche não são as do proletariado. Mas se pode notar que a moral que este filósofo da classe dominante recomenda ao proletariado, isto é, que seja pacífico, é só um engodo. Ele mesmo inculcou nas massas que só o medo os impede de romper este aparato” (Ibidem, p. 338. Do apontamento “Nietzsche e o proletariado”).

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interesses burgueses de dominação de classe. Trata-se de seu recalcamento mais profundo, um sacrifício da natureza pulsional por um agir instrumental voltado exclusivamente para a auto conservação como princípio da civilização. A indiferença axiológica da teoria tradicional deixa de ser vista como uma reificação circunstancial determinada sobretudo pela estrutura econômico-social existente; ela passa a ser considerada constitutiva da racionalidade instrumental predominante. A cegueira do positivismo para com a dominação reinante tem como condição transcendental a segregação dos anseios de redenção. Como por princípio tal racionalidade promove uma adaptação incondicional ao existente, cai por terra a tese, sustentada pela primeira Teoria Crítica, do interesse da classe inconfesso atuante na teoria tradicional. Embora a noção de reificação tenha assim sofrido um alargamento no tempo e no espaço, tornando-se mais inextricável que jamais, não desaparece do pensamento tardio de Horkheimer, assim como de Adorno, a esperança de sua superação. Certo é que agora a tarefa do pensamento crítico consistirá, num exercício análogo ao do proceder psicanalítico (mas que também guarda afinidade com a experiência estética), no despertar dos anseios de emancipação e reconciliação há muito adormecidos e profundamente recalcados. Em Horkheimer também as imagens religioso-metafísicas do mundo, nas quais se preserva a ideia enfática da verdade, desempenham neste ponto um papel decisivo. 4. Da Teoria Crítica inicial para a tardia, a reificação deixa de ser compreendida como um episódio vinculado, em última instância, à estrutura mercantil burguesa, e tendente com ela a ser superada, e passa a ser atribuída à própria razão imperante na história da civilização, a razão instrumento de conservação. Na primeira fase marcadamente marxista, a natureza remete a uma exterioridade irredutível à razão, a um resíduo resistente à consumação de uma definitiva reconciliação do conceito com seu objeto. Se aqui desejamos encontrar a marca do pessimismo schopenhauriano, devemos reconhecê-la na opacidade insuperável desta natureza. Materialismo cuja autenticidade consiste justamente na concessão do primado radical da matéria sobre a consciência, donde decorre a impossibilidade, no limite, de uma representação conceitual definitiva e satisfeita consigo mesma. Mas para a Teoria Crítica inicial, esta opacidade da natureza deve-se, sobretudo, à cegueira para com a totalidade social, à incapacidade da teoria tradicional de reconhecer suas limitações e determinações para tornar-se entendimento teórico dos processos sociais. Se podemos já aqui falar de um contexto de ofuscamento, ele diz respeito à esta obtusidade do conceito de razão tradicional para com práxis histórica em que no entanto se insere. Ora, na fase tardia, a filosofia de Horkheimer passa a denunciar, antes de mais nada, a impassibilidade da concepção 74

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instrumental de razão. O ofuscamento remete agora mais diretamente a uma natureza dolente, mas também à própria natureza dominadora deste conceito de razão triunfante. O processo pelo qual a razão instrumental consuma seu domínio sobre a natureza circundante vê-se agora inseparável de um processo de insensibilização pelo qual o indivíduo adquire o domínio de si mesmo sacrificando sua natureza mais íntima. Neste sentido, a natureza em geral não se vê apenas oprimida, mas igualmente silenciada. A violência que sofre consiste fundamentalmente na mutilação de sua capacidade compreensiva e expressiva  tese que nos parece decisiva para a justa apreciação da filosofia tardia, e sobre a qual insistiremos mais adiante. Podemos, porém, entender esta mudança da primeira para a última teoria crítica na perspectiva do recrudescimento da noção de reificação, cuja superação torna-se mais remota e desesperançada no pensamento tardio, restabelecendo, deste modo, a linha de continuidade relativa ao conceito de natureza na filosofia de Horkheimer. Afinal, a própria noção de dominação da natureza de cunho marxiano da primeira Teoria Crítica que, como notamos, reveste-se da conotação positiva de reordenação social, não estaria prenhe da ideia subsequente de uma natureza dolente em seu silêncio? E isto na exata medida em que aquela Teoria Crítica tencionaria trazer à luz uma ordem social caótica e injusta para a qual a teoria tradicional, entregue a si mesma, mostra-se indiferente, e que, por isto mesmo, aparece a esta como uma segunda natureza. O elemento de apatia frente ao sofrimento circundante podemos já deslindar, assim, na reificação da teoria tradicional, elemento este que justamente a crítica deve superar visando ao estabelecimento de uma ordem mais justa e racional. Reciprocamente, não podemos negar que a natureza dominadora que se acusa na racionalidade instrumental tardia continua consistindo na sua incapacidade para visar a uma totalidade objetiva harmoniosa, uma vez que tal conceito de razão deixa-se cegamente reger por interesses subjetivos isolados. Daí a ênfase posta, na obra tardia, sobre um pensamento tributário da tradição metafísicoreligiosa que ainda preserva a imagem de uma totalidade reconciliada, somente em face da qual a razão seria capaz de ver-se refletida como poder desapiedado. Sem esta imagem de redenção, que se sabe ilusória e vã como toda imagem, a realidade dilacerada por interesses antagônicos encontra-se fadada a perdurar na inconsciência de sua desgraça e de seus infortúnios. Justo seria, portanto, dizer que remete sobretudo à dor da existência, humana e inumana, o substrato último da realidade, a matéria que se furta às representações conceituais, que esta filosofia materialista, desde muito cedo embebida do pessimismo metafísico schopenhauriano, procura trazer à luz, fazendo reluzir com ela o anseio concreto por sua superação. Assim é que a

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filosofia idealista, a metafísica e a religião são por ela enquadradas como representações transcendentes abstraídas dos reais sofrimentos humanos e nada preocupadas, muito menos ocupadas, com uma ação concreta para sua erradicação. Assim também, por outro lado, a concepção instrumental e subjetiva de razão, legitimada filosoficamente pelo positivismo, é censurada por privar a natureza do conceito capaz de exprimir os tormentos que lhe inflige o processo de domínio técnico. Aqui a crítica recai sobre uma representação de estreita imanência aos fatos que julga desprovido de sentido todo conceito que a eles não se atenha, que lhes transcenda. Por conseguinte, seria preciso conceder a devida atenção ao caráter ostensivamente não propositivo da Teoria Crítica, que já durante o programa materialista inicial reivindica o direito a uma formulação negativa32 e que, mais tarde, reconhecerá amiúde seu débito para com o preceito judaico que proíbe uma imagem de Deus, uma representação afirmativa do bem absoluto: “Vez ou outra, perguntam o que fazer, e exigem uma resposta da filosofia como se ela fosse uma seita. Estão em apuros e desejam indicações práticas. Contudo, mesmo representando o mundo em conceitos, a filosofia corresponde-se com a arte porque em razão de uma necessidade intrínseca  precisamente por nela não intervir propósitos utilitários  apresenta um espelho ao mundo. Tem, é verdade, uma relação mais estreita com a prática que a arte, fala num sentido não figurado, mas literal. Mas não é um imperativo. Os signos de exclamação lhe são estranhos. Ela substituiu a teologia mas não encontrou nenhum novo céu que pudesse indicar, nem mesmo um céu terreno. Mas não pode, é certo, abandonar sua ideia, e por isso sempre se interroga sobre o caminho que leva até ele. Como se não tivesse sido precisamente sua a descoberta de que o céu para o qual se pode indicar o caminho não é nenhum céu”33. Adorno também reconhece a afinidade da formulação negativa do marxismo da década de 1930 com a teologia judaica: “O materialismo secularizou a proibição teológica de representar a Deus ao não permitir configurar a utopia positivamente; esta é sua figura de negatividade. Ele concorda com a teologia ali onde é mais materialista”34. Ela se põe como designação do mal no intuito de fazer jus ao anseio pelo Lemos no ensaio “Teoria Tradicional e Teoria Crítica” (1937): “A Teoria Crítica não tem [...] nenhuma instância específica para si, a não ser os interesses ligados à própria Teoria Crítica de suprimir a injustiça social. Esta formulação negativa, expressa abstratamente, é o conteúdo materialista do conceito idealista de razão” (GS, 4, p. 213. Tradução brasileira: Benjamin, Horkheimer, Adorno, Habermas: Textos Escolhidos, col. Os pensadores, op. cit., p. 156). Nenhuma instância para si, isto é, nem a consciência do proletariado, nem a ciência econômica, nem uma práxis autônoma; ela se proíbe assim de afirmar um possível portador do bem ou da verdade, delegando a esta instância a salvação futura. 33 Max HORKHEIMER, GS, 6, p. 253. Do apontamento “Teoria Crítica” de Notizen 1950-1969. 34 Theodor W. ADORNO, Negative Dialektik. In _____. Gesammelte Schriften, Frankfurt: Suhrkamp Verlag, 1973, vol. 6, p. 207. 32

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melhor. Mas tal desiderato crítico só pode ser devidamente compreendido quando se tem presente que o envolvimento da razão com o poder é inseparável de seu ocultamento, ou melhor, inseparável da incapacidade crônica que a própria razão, enredada na dominação, manifesta para dela dar-se conta. Num bonito artigo, Jeanne Marie Gagnebin lembra a afirmação de Adorno segundo a qual “o conhecimento não tem outra luz senão aquela que a redenção irradia sobre o mundo”35. Com todas as suas privações, o contexto sócio-político de dominação compromete o próprio entendimento do sofrimento reinante; o reconhecimento de suas feridas fica prejudicado na ausência de uma perspectiva de redenção. O tema eminentemente adorniano do contexto geral de ofuscamento [Verblendungszusammenhang] perpassa também a obra de Horkheimer, notadamente a tardia. Ofuscada pelo esclarecimento triunfante, pesa uma maldição sobre a humanidade cujo poder se deve grandemente ao fato de não ser nomeada. Ora, cumpre exigir da razão dominante uma autocrítica porque se mostra avessa a ela; cumpre designar o mal imperante porque perdura acobertado na trama da imanência; cumpre evidenciar o preço que pagamos pelo progresso porque impera a ideia de que no futuro será necessariamente melhor. Como já notamos, insistindo no caráter aporético da autocrítica da razão, Habermas desacredita este desígnio de autorreflexão que se serve da arte e da teologia para apresentar um espelho ao mundo; também desvaloriza este deliberado caráter não propositivo da teoria como um impasse da crítica. No fundo, menospreza o tema da ofuscação do mal na trama da imanência, sobre o que farei a seguir algumas breves indicações. Para o Horkheimer tardio, tal como para Adorno, a esperança de um mundo melhor vive da contemplação das cadeias que subjugam as criaturas e da nostalgia da distância que com ela desperta36. Quanto mais essas cadeias se fazem invisíveis, quanto mais se suprime a distância, mais se nega a liberdade. Ora, o progresso técnico que alcança um controle cada vez maior sobre a natureza, que a domestica cada vez mais eficazmente consumando sua assimilação pela cultura, faz desaparecer a distância, e com ela a possibilidade de reconciliação. Atentemos para isto: a dominação que avança imperceptivelmente com o progresso científico consiste sobremaneira em seu próprio esquecimento, e na correlata liquidação da esperança de emancipação. A natureza perdura dominada na inconsciência da dominação que a vitima: “Com seus refinados telescópios e microscópios, fitas magnéticas e aparelhos

Ver Jeanne Marie GAGNEBIN, “Do Conceito de Razão em Adorno”. In Sete Aulas sobre Linguagem, Memória e História, Rio de Janeiro: Imago, 1997, p. 117. 36 Tamanha é a concordância que o pensamento de Adorno demonstra a este respeito com o de Horkheimer, que as linhas a seguir puderam ser inspiradas em três notáveis aforismos de Minima Moralia: “Mamutes” (§ 74), “Intellectus sacrificium intellectus” (§ 79) e “A três passos de distância” (§ 82). 35

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radiotelefônicos, os indivíduos tornam-se [...] mais cegos, surdos e incomunicáveis; a sociedade, mais inextricável e desesperançada; suas execuções [...], mais violentas e sobre-humanas que jamais. Sobre todo o mundo e até o sol impõe-se o radicalmente mau como dominação sobre todas as criaturas [...]. O malvado esqueceu o anseio [Sehnsucht] e só conhece o seu contrário, a concordância com aquilo que já é”37. Importa sublinhar aqui o quanto este processo de domesticação, que se consuma no esquecimento dos sacrifícios exigidos em seu nome, atinge não só a natureza exterior, mas sobretudo a interior, pois é o total domínio de si mesmo que explica em grande medida a persistência do ofuscamento generalizado. Nos escritos de Adorno e Horkheimer, a criatura animal reprimida via de regra remete metaforicamente às pulsões anímicas recalcadas: os afetos e paixões de que vive a fantasia e a imaginação, todo este complexo psíquico afeito à arte e à cultura segregado pela objetividade da razão instrumental38. A conquista do autodomínio, contrapartida indissociável das conquistas técnicas, leva a termo um processo de domesticação interior que exige o sacrifício do intelecto, isto é, o controle das emoções e dos desejos por uma crescente objetividade. Ora, na medida em que só a imaginação e a fantasia possibilitam a representação livre da mera verificação fatual, aquela em que o objeto pode ser visto mesmo na sua ausência, seu sacrifício sustenta a cegueira generalizada. Operando sem distanciamento, o pensamento torna-se incapaz de exprimir pelo fato mesmo de só poder confirmar o já identificado. Tal distanciamento do dado objetivo, somente graças ao qual torna-se possível a reflexão e a crítica, não deve, porém, ser acatado como uma zona de segurança, e sim como um campo de tensões. O pensamento transcendente deve possuir a consciência tácita da irresponsabilidade decorrente do exagero que lhe permite desembaraçar-se do peso do fatual. Mas se sua pretensão ao absoluto é temerária, sem ela torna-se impossível a consciência concreta do condicionamento do conhecimento objetivo, sem ela não pode fazer a experiência de seus limites, condição para que sejam ultrapassados. Um belo aforismo de Notizen 1950-1969 traduz exemplarmente este campo de tensões em que se move a filosofia: “O paradoxo da filosofia consiste em querer ser expressão [Ausdruck] e asseveração [Aussage] ao mesmo tempo. Mas a expressão 37

Max HORKHEIMER, GS, 6, p. 288. Do apontamento “O mal na história” de Notizen 1950-1969. Citação admiravelmente consoante ao pensamento de Adorno expresso pela frase: “Tudo o que hoje em dia se chama comunicação é, sem exceção, puro ruído com que se encobre o mutismo do enfeitiçado” (Negative Dialektik, op. cit., p. 341). 38 No aforismo “Mamute” (§ 74) de Minima Moralia, o zoológico de Hagenbeck  que reproduz à perfeição o meio ambiente de cada espécie, onde barreiras naturais substituem as grades,  é imagem especular acabada da alma moderna: inteiramente domesticada pelo autodomínio, sua natureza pulsional aplacada dispensa agências externas de controle.

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não pode ser verificada, e a asseveração não constitui nenhuma expressão”39. Expressão e asseveração ao mesmo tempo: expressão de um juízo de valor que reclama por sua verdade; asseveração de um juízo objetivo cuja veracidade se constata na realidade. O paradoxo do juízo filosófico estaria, portanto, em pretender ser simultaneamente prescritivo e descritivo, procurando fazer valer a força normativa do expressivo sem poder negar a potência normativa do factual. Na exata medida em que a filosofia, distanciando-se da mera constatação factual científica, busca a expressão que não confirma a dominação do existente, esta lhe aparece como falsa e impotente frente ao poder de asseveração positivista. Em duas palavras, evitando a constatação que nada exprime de novo, exprime o que não pode ser constatado ou verificado. A verdadeira expressão, que é expressão de dor  “e existe uma expressão que não seja dolorosa?”40  vê-se, assim, desacreditada pelo triunfo tão avassalador quanto real de uma mentalidade positivista. Mas há, ademais, uma dificuldade inerente ao distanciamento próprio do conceito, e que se associa ao incontornável elemento narcísico do pensamento compassivo: ele só pode exprimir uma dor que em última instância é sua, mesmo pretendendo que lhe seja alheia. De modo que também a filosofia que, ao contrário do positivismo, incorpora a dor no seu sistema termina por afirmá-la abstraída da realidade  muito embora, e paradoxalmente, continue dependendo dela a esperança de vir a exprimi-la verdadeiramente. Gostaria por fim de chamar a atenção para o quanto é devedora do principium individuationis schopenhauriano esta imputação de embotamento e apatia feita à razão subjetiva de auto conservação. Há uma passagem extraordinária para este propósito que extraio da Dialética do Esclarecimento, mais especificamente da nota “Le Prix du Progrès”. Nela, a descoberta e o emprego da anestesia clínica, um procedimento da técnica médica, se faz metáfora viva de todo desenvolvimento técnico-científico. Supressão ilusória da dor, pois que não elimina efetivamente a dor a partir de suas causas, mas sim pela incapacidade de senti-la, a anestesia promove a inconsciência de toda crueldade da intervenção cirúrgica, esta, por sua vez, uma alegoria da violência a que se submete a natureza em geral, inclusive e sobretudo a humana: “O animal estaria vingado pelo sofrimento de seu carrasco: cada operação seria uma vivissecção. Surgiria então a suspeita de que não nos comportamos com os homens e com as criaturas em geral de maneira diferente da maneira pela qual nos comportamos em relação a nós mesmos depois de ter sofrido uma operação, ou seja, cegos para o sofrimento. O espaço que nos separa dos outros significa, para o conhecimento, a mesma coisa que o tempo que se intercala entre nós e o sofrimento de nosso próprio passado, a saber, uma barreira insuperável. Mas a dominação perene da natureza, a técnica médica e não médica, tira sua força dessa cegueira [Verblendung]; só o esquecimento a tornaria possível. A perda da lembrança como condição transcendental da ciência. Toda reificação é um esquecimento”41. A denegação temporal e

Max HORKHEIMER, GS, 6, p. 286. Do apontamento “O paradoxo da filosofia” de Notizen 19501969. “O paradoxo da filosofia”. Aussage significa declaração, depoimento, denotando deste modo uma modalidade de enunciação asseverativa que contrasta com o caráter expressivo de Ausdruck, tanto pela positividade do enunciado como pela referência a sua veracidade assegurada pelo testemunho ou garantida pela verificação experimental. 40 Ibidem, p. 191. Do apontamento “Expressão e dor” de Notizen 1950-1969. 41 Max HORKHEIMER, GS, vol. 5, pp. 261-2. [Tradução brasileira: Dialética do Esclarecimento, Zahar, Rio de Janeiro, 1985, pp. 214-5.] 39

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espacial do sofrimento, a cegueira para com ele, seu esquecimento como condição transcendental da ciência. Ora, o trecho que acabamos de citar, da edição de 1947, resulta de uma reformulação da versão original da nota publicada na edição de 1944. Nela, a vinculação desta tese com a doutrina de Schopenhauer exprime-se com todas as letras numa frase surpreendente: “A anestesia age como o principium individuationis”. Vale citá-la por inteiro: “O animal estaria vingado pelo sofrimento de seu carrasco. {Não apenas por isso, contudo. A morte não é a perda radical da ‘capacidade residual da substância nervosa’? A vida não seria como um sonho, mas como uma anestesia. Comportar-nos-íamos, com respeito aos outros homens, para não falar das demais criaturas, da mesma forma que o doente, segundo a opinião de Flourens, no período em que se encontra sob o efeito da droga: vítima de ilusão [Wahnhaft]. A anestesia age como o principium individuationis. Os positivistas poderiam, porém, aprender até que ponto se chegou aqui com sua ciência: suas proposições protocolares reduzem-se, por princípio, a uma anestesia. Elas seriam a exteriorização da vida esquecida de si mesma sob o efeito de anestésicos, ou melhor, da morte impossibilitada de ser recordada. Na sua linguagem reificada, eles tê-la-iam mortificado. A realidade reitera a metafísica e os antiquados fisiologistas franceses. A comprovação da legitimidade de tais especulações exige, todavia, uma análise diferenciada do pensamento de Schopenhauer, que ainda toma partido em demasia do positivismo de Flourens}”42. Por mais que a realidade pareça confirmar os positivistas e a metafísica schopenhauriana, por mais que o feitiço do pensamento reificado pareça estender-se sobre tudo o que vive, reluz uma figura de liberdade sob o feitiço. A análise diferenciada, a que se refere a última frase da citação, é aquela que reconhece que a razão não é pura e simplesmente idêntica ao principium individuationis e seu cego impulso de auto conservação. Intervém aqui a capacidade de reflexão que distingue a conduta humana da animal e que pode, por princípio, quebrar o feitiço, muito embora se encontre perversamente a seu serviço: “Esta perversão é a que o amplifica e o converte em mal radical, carente da inocência de ser simplesmente assim”43. Esperamos ter feito compreender o quanto, especialmente para a filosofia tardia de Horkheimer, esta figura de liberdade depende do esclarecimento de tal perversão, vale dizer, da contemplação com plena consciência de tal maldição e da incapacidade de tolerá-la quando existe a possibilidade de pôr-lhe fim.

42 43

Ibidem, p. 262. A versão de 1944 corresponde ao texto entre chaves. Theodor W. ADORNO, Negative Dialektik, op. cit., p. 339.

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Maurício CHIARELLO Instituto de Filosofia e Ciências Humanas Universidade Estadual de Campinas, Brasil. [email protected]

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