Mediação Comunitária: influências dos países centrais e das organizações internacionais nas diretrizes da mediação como política pública na América Latina.

June 2, 2017 | Autor: Valter Bonanni | Categoria: Mediation (Law), Políticas Públicas
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XIII Congreso Nacional y III Latinoamericano de Sociología Jurídica “Debates socio-jurídicos en torno a los cambio sociales en Latinoamérica” Universidad Nacional de Río Negro, Sede Atlántica – SASJU Escuela de Humanidades y Estudios Sociales Carrera de Abogacía Viedma, Rio Negro, Argentina, 8, 9 y 10 de noviembre de 2012

MEDIAÇÃO COMUNITÁRIA: A Influência dos Países Centrais e das Organizações Internacionais nas Diretrizes da Mediação como Política Pública na América Latina.

Delton Ricardo Soares Meirelles, Professor Titular do Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Direito da Universidade Federal Fluminense – PPGSD/ UFF. [email protected] Valter Eduardo Bonanni Nunes, mestrando do Programa de Pós-graduação em Sociologia e Direito da Universidade Federal Fluminense – PPGSD/UFF. [email protected]

Comission de Trabajo: Procesos de Globalización y Glocalización: La incidencia en el campo jurídico

VIEDMA/2012

Resumen. En este estudio se propone identificar la influencia de los países centrales y las organizaciones

internacionales

en

las directrices de los programas más importantes

relacionados con la mediación de la comunidad en América Latina. Identificada esta influencia, vamos a investigar la hipótesis sobre el etnocentrismo de las políticas públicas que se ocupan de la propuesta de la emancipación y el empoderamiento de la sociedad en la solución de conflictos y el desarrollo de la ciudadanía. Temas como el etnocentrismo, la globalización,

el

multiculturalismo,

la

soberanía

será

fundamental

para

el enfoque

comparativo de los compromisos internacionales de los países de América Latina con organizaciones internacionales tales como los Objetivos de Desarrollo del Milenio (ODM) del Programa de las Naciones Unidas para el Desarrollo (PNUD), el Banco países centrales mundiales y otros involucrados y las leyes y los primers desarrollados para este tipo de progama en los países de América Latina. En este paso vamos a comprobar la cantidad de valores de la cultura, las costumbres locales y se están considerando y la eficacia de la propuesta de emancipación.

INTRODUÇÃO Em primeira ordem, cumpre investigar os principais atores políticos, ideológicos e financeiros do programa que fundamenta a mediação comunitária como política pública para a América Latina. Nessa tarefa serão extraidas do conteúdo dos relatórios dos organismos internacionais. os referenciais teóricos deste programa qualificado como política pública, programa este, alinhado a uma serie de medidas de promoção de “acesso à justiça”, medidas essas implantadas com maior vigor a partir da década de 1990, com a consolidação da democracia na América Latina que, por exemplo, no Brasil desencadeou a primeria geração de reformas normativas, com o objetivo de se establecer regras de um sistema político, jurídico e económico para maior segurança jurídica tanto interna quanto externa. Nessa esteira foram instituídos no Brasil, o Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90) criação dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais e a promoção da prática da conciliação (Lei 9.099/95), os Tribunais de Arbitragem (Lei nº 9.307/96) e normas de teor semelhante nos diversos países da América Latina Nessa linha investigativa, evidenciou-se como maior protagonista político, ideológico e financeiro a Sistema das Nações Unidas (ONU), organização esta, formada após a Segunda Guerra Mundial, presente no Brasil dentre outros países da America Latina desde a década de 1960, através de organismos como Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e o Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD), que figuram como instituições de maior influência política, ideológica e financeira, determinante nas transformações institucionais e econômicas da America Latina nas últimas quatro décadas. Cumpre destacar que o Grupo Banco Mundial faz parte do rol das Agências Especializadas e o PNUD se encontra no rol dos Programas e Fundos do Sistema ONU, ambos sob comando do Conselho Econômico e Social (ECOSOC). Após identificar as principais instituições internacionais provedoras de políticas, ideologias e financiadoras de projetos de reformas normativas e, posteriormete institucionais, investigarse-á as características instituições receptoras de tais subsídios, percorrendo pelo processo de

formação dessas instituições, o ambiente institucional que concebe e distribui estes subsídios e como estes alcançam o público alvo. 2. ORIGEM: ATORES EXTERNOS Para melhor entendimento do contexto em que se encontram§ as instituições internacionais provedoras do programa “Justiça Comunitária”, importa conhecer a estrutura do Sistema das Nações Unidas, em que se encontram o PNUD e o BIRD, conforme o organograma disponível no site http://www.onu.org.br:

Para delimitação do assunto ao objeto em análise, isto é, quanto o instituo da medição comunitária, cumpre situar no organograma acima os órgãos do Sistema Nações Unidas que fomentam diretamete o programa em questão com subsídios políticos, ideológicos e financeiros.

Cumpre esclarecer que o BIRD compõe a estrutura do Banco Mundial juntamente com a Associação Internacional de Desenvolvimento (AID) e estes fazem parte do Grupo Banco Mundial, composto por mais três instituições: Sociedade Financeira Internacional (SFI), Agência Multilateral de Garantia de Investimentos (MIGA) e Centro Internacional para Arbitragem de Disputas sobre Investimentos (CIADI). O Banco Mundial foi concebido nas conferências de Bretton Woods em 1944 (lideradas massivamente pelos EUA e o Reino Unido), que resultou na criação do BIRD, do Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT), desde a sua criação a presidência do Banco Mundial é ocupada por um americano e o FMI por um Europeu. A missão do BIRD, à época de sua criação, se limitava a reconstrução dos países devastados pela Segunda Guerra Mundial, mas com o tempo forjou-se um organismo que agregou o objetivo de financiar o desenvolvimento dos países mais pobres e de auxilio financeiro. A função do EOSOC é coordenar atividades e formular recomendações de cunho econômico e social para Agências Especializadas, demais instituições e programas integrantes do Sistema das Nações Unidas relacionadas à atividade de desenvolvimento, comércio internacional, industrialização, recursos naturais, direitos humanos, população, questões de gênero, ciência, tecnologia, prevenção de crimes, bem estar social entre outras questões relacionadas à economia e à sociedade, que são desenvolvidas em Comissões Funcionais, Comitês Permanentes e outros órgãos temáticos. Estão também subordinadas ao ECOSOC as “Comissões Regionais”, com a finalidade fomentar o desenvolvimento social e econômico e fortalecer a relação de parceria entre os países das respectivas regiões, nessa estrutura. No caso da America Latina, têm-se a Comissão Econômica para América Latina e o Caribe (CEPAL), criada em 1948, que dos 44 membros, além dos países da América Latina, fazem parte o Canadá, França, Japão, Países Baixos, Portugal, Espanha, Reino Unido, Itália e Estados Unidos da América. .

O PNUD como um dos programas do ECOSOC atua ostensivamente em várias políticas públicas e reformas institucionais na America Latina, dentre elas os programa de política publica de acesso à justica que contempla a Mediação Comunitária. No tocante às “Agências Especializadas”, o Grupo Banco Mundial (GBM) exerce suas atividades através do Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD), agente político-financeiro para projetos sociais e econômicos de países de renda média, dentre eles os países integrantes do CEPAL. Promover o desenvolvimento e eliminar a pobreza no mundo, através do fomento técnico e financeiro de projetos é também uma das metas primordiais do PNUD, suas atividades compreendem em gerenciar os programas que apoia através de relatórios e estudos sobre o desenvolvimento humano sustentável, executar projetos que contribuam com a melhoria de vida nos 166 países que possui representação, é responsável por elaborar o Índice de Desenvolvimento

Humano

(IDH),

sendo

o

organismo

internacional responsável pela

coordenação das demais agências, fundos e programa do Sistema das Nações Unidas. Os trabalhos desenvolvidos pelo PNUD nos membros do CEPAL visam principalmente contribuir para o cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), compromisso firmado em 2000 na cidade de Nova York, na Cúpula do Milênio, promovida pela ONU, com a finalidade de melhorar os indicadores sociais, ambientais e econômicos e combater a pobreza, dentre outros males da sociedade. Os compromissos deliberados na Cúpula das Nações resultaram no estabelecimento oito objetivos que deverão ser alcançados até 2015, a saber: 1. Redução da pobreza; 2. Atingir o ensino básico universal; 3. Igualdade entre os sexos e autonomia da mulher; 4. Reduzir a mortalidade da infância; 5. Melhorar a saúde materna; 6. Combater o HIV; 7. Garantir a sustentabilidade ambiental; 8. Estabelecer uma parceria mundial para o desenvolvimento. Diante dos oito

objetivos de desenvolvimento do milênio, o PNUD desenvolve sua atividade

e sua coordenação nos países em que atua, focando nos seguintes desafios:



Governança Democrática



Redução da Pobreza



Prevenção de Crises e Recuperação



Energia e Meio Ambiente/Desenvolvimento Sustentável



HIV/AIDS

Para aferir o avanço na qualidade de vida da população dos países em direção ao cumprimento desses desafios, em 1990, o PNUD lançou universalmente o conceito de Desenvolvimento Humano, que considera três dimensões básicas que devem ser consideradas: renda, saúde e educação, base para determinar o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e fundamentar o Relatório de Desenvolvimento Humano (RDH), publicado anualmente. No Brasil, por exemplo, baseado em sua experiência de criação e implantação de projetos desde o início da década de 1960, o PNUD, no contexto atual, considera primordial focar suas atividades em quatro “áreas-chave”: 1.

Alcance dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio – com foco particular na redução de desigualdades e nos grupos sociais mais vulneráveis, além de continuar fortalecendo as capacidades da sociedade civil e incentivando uma maior participação da mesma na const rução das políticas e cumprimento dos direitos.

2.

Desenvolvimento Sustentável e Inclusão Produtiva - com enfoque no fortalecimento de capacidades para mitigação e adaptação aos efeitos das mudanças climáticas visando a erradicação da pobreza, a redução de desigualdades e a inclusão produtiva.

3.

Segurança Cidadã – Redução da vulnerabilidade a todas as formas de violência.

4.

Cooperação Sul-Sul – Contribuir para a agenda global de desenvolvimento, fortalecendo a agenda de triangulação de cooperação e a transferência de conhecimento.

É no desafio “Governabilidade Democrática” e na área-chave “1”,

elencadas pelo PNUD,

que os programas que contemplam a Mediação Comunitária estão inseridos e por isso o PNUD está presente tanto na coordenação do programa quanto na capacitação dos agentes comunitários, através de seus consultores internacionais e na elaboração das diretrizes e direcionamento do programa como política pública estatal, através dos respectivos órgãos nos países em que atua. Após a identficação das orgãos internacionais que fomentam tanto política quanto ideologica e financeiramente as reformas instituicionais prescritas para a America Latina, cumpre

compreender como funciona o sistema representativos, específicamente do Banco Mundial e no PNUD, por serem esses, nomeadamente os orgão internacionais constante nos documentos públicos dos respectivos países contemplados, acerca dos projetos que envolvam a Mediação Comunitária. O sistema de votação da Assembleia da Geral da ONU conta com a participação dos 193 representantes de cada país membro, com direito a um voto e dentre as deliberações desta assembleia está a escolha dos 54 membros do Conselho Econômico e Social (ECOSOC), com mandato de três anos, que conta com a participação de membros dos países centrais e periféricos que elegem seu presidente sob o mesmo critério de voto unitário para cada membro, através de maioria simples para o mandato de um ano, atualmente seu presidente é o embaixador da Eslováquia, Milos Koterec. Nesse passo, evidencia-se os Estados Unidos da América como principal membro desse sistema, presente desde a assinatura da Carta das Nações Unidas, em São Francisco, a 26 de junho de 1945, desempenha papel de destaque nas decisões políticas e econômicas, conjugando seu forte poder de decisão no GBM, especialmente no BIRD e sua presença pioneira na cúpula dos membros permanentes da ONU que, além dos EUA, é composta por mais quatro representantes dos seguintes países: China, França, Rússia e Reino Unido, todos gozando de estabilidade e poder de veto. O Grupo Banco Mundial, integrante do núcleo de “Agências Especializadas” do Sistema das Nações Unidas, compõe sua hierarquia quanto ao poder de voto baseada na percentagem de capital subscrito de cada país e sua credibilidade política e econômica, tanto que os membros com maior poder de voto correspondem aos países mais ricos e influentes do sistema capitalista, conforme demonstra brilhantemente o Doutor em História pela Universidade Federal Fluminense na obra: “O Banco Mundial como ator político, ideológico e financeiro (1944-2008)” (Civilização Brasileira, 2010. p.38-39): A estrutura decisória do Banco Mundial está estabelecida pela cláusula V do seu estatuto. A instância máxima é o Conselho de Governadores, onde cada país está representado por um governador e um suplente, com mandato renovável de cinco anos. Comumente é o ministro da fazenda ou o presidente do banco central do respectivo país que exerce a função de titular. O Conselho realiza uma assembleia geral por ano, coincidindo com a assembleia geral do FMI. Existe também a Diretoria Executiva, a qual cabe conduzir no dia a dia as operações . do BIRD, conforme as atribuições delegadas pelo Conselho. É formada por vinte e quatro membros, não necessariamente governadores. Cinco devem ser nomeados diretamente pelos cinco maiores acionistas do Banco, que na atualidade são Estados

Unidos, Japão, Alemanha, França e Reino Unido. Os demais diretores representam países ou grupos de países e são eleitos pelos governadores que não hajam sido nomeados como diretores executivos pelos cinco maiores acionistas. Não se aplica o princípio da igualdade de voto entre os países, que rege a maior parte das organizações internacionais do sistema ONU, nem o voto ponderado de acordo com o tamanho da população. O poder de voto cada membro está condicionado pela sua subscrição de capital, definida formalmente em função do tamanho da economia doméstica e da renda per capita e, informalmente, da força política dos Estados no sistema internacional. Em outras palavras, a desigualdade de poder político e riqueza que caracteriza o sistema internacional se reflete no Banco Mundial, modelando a sua estrutura de tomada de decisão.

Para melhor ilustrar a linearidade entre a desigualdade social e econômica dos os países ricos e os periféricos e o desequilíbrio de poder entre os países membros no BIRD, cumpre apresentar as tabelas 16 e 17 da obra supracitada, conforme se verifica na página 43:

Os dados apresentados demonstram um sistema que garante aos cinco membros permanentes, o protagonismo na condução política, ideológica e financeira quanto à elaboração das atividades e à escolha dos países contemplados com apoio financeiro e técnico, e como demonstrado acima, os EUA possui o poder de voto duas vezes maior que o segundo colocado e quatro vezes maior que o terceiro. Além do BIRD, cumpre ressaltar que o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), organização financeira internacional, sediada em Washington, EUA e criada em 1959, no seio da Organização dos Estados Americanos (OEA), também está presente em projetos com o propósito de financiar o desenvolvimento econômico, social e institucional e promover a integração comercial na região da América Latina e Caribe e que atualmente figura como maior banco regional do mundo. Cabe destacar ainda, que apesar de ter nascido no seio da OEA não tem relação institucional com esta organização, nem com o Grupo Banco Mundial, entretanto na sua composição possui 48 membros entre mutuários e não mutuários, os não mutuários (22 membros) são que não recebem financiamento algum, mas tem influência nas regras de aquisições do BID e fazem parte do Diretório Executivo de 14 membros que supervisionam o funcionamento da instituição, dentre os não mutuários constam os países membros da União Europeia, Estados Unidos, Canada, Japão, Japão, Israel, Croácia e Suíça. Quanto ao poder de voto, mais uma vez evidencia-se a hegemonia americana, conforme demonstra a tabela abaixo:

A caracterização da relação de poder entre os membros das instituições que fomentam as transformações institucionais e as políticas públicas nos países periféricos, demonstra uma hierarquia que explicita peso do poder político, ideológico e financeiro nas diretrizes institucionais dos países periféricos. Evidenciou-se na exposição dos dados apresentados a coincidência das lideranças nos diversos órgãos apresentados, permitindo visualizar um organismo complexo, mas muito bem definido em relação ao poder entre os países centrais e periféricos. A primeira geração de reformas avançou em direção ao sistema macroeconómico, em que o Fundo Monetário Internacional (FMI) era o principal ator. A segunda geração de reformas tem o objetivo de reformas institucionais, sob orientação do Banco Mundial, que dentre outras medidas resultou na criação de instituições nacionais reformistas, conforme observa André Luiz Nascimento

dos

Santos

em sua dissertação: “A influência das organizações

internacionais na reforma dos judiciários de Argentina, Brasil e México: O banco mundial e a agenda do acesso à justiça”, como requisito para obtenção do título de mestre em Administração pela Universidade Federal da Bahia (SANTOS, 2008. p. 75-76): A partir de uma breve análise desse cenário, não há como negar que, dentre as ações retóricas e práticas de todas as OIs em relação aos Judiciários latino -americanos, a que mais se destaca é a atuação do Banco Mundial, tanto do ponto de vista simbólico, como da materialidade da ação. Ao longo de uma década, o Banco Mundial formulou diagnóstico, propôs agenda, financiou projetos e avaliou resultados. Não por outra razão, foram três documentos direcionados, exclusivamente, ao setor judicial latino-americano e à necessidade de se implementar reformas. Sob o ponto de vista do Banco Mundial, a América Latina e Caribe encontram-se em um processo de desenvolvimento econômico, na qual a década de 80 foi um período significativo para a consecução da agenda macroeconômica, mais sob a coordenação do FMI que do BM. Nesse período, segundo o posicionamento do Banco, a estabilização das economias, fruto das reformas econômicas, criou uma atmosfera propícia para uma segunda geração de reformas focadas nas instituições públicas e na microeconomia (anos 90). A partir desse contexto, as instituições judiciais seriam um dos campos estratégicos para a implementação dessas reformas de segunda geração. Na visão do Banco Mundial, Judiciários eficazes e eficientes seriam instrumentos valiosos para o desenvolvimento do setor privado, o encorajamento do desenvolvimento de toda a sociedade, alívio da pobreza e consolidação da democracia. (WORLD BANKBANCO..., 1996, p. 1): Durante a década de 1980, os esforços do desenvolvimento foram voltados para a agenda macroeconômica que, devido às necessidades, teve prioridade sobre as reformas institucionais. "Durante décadas, os governos da América Latina falharam em desenvolver as instituições necessárias para gerir os problemas básicos das suas populações porque concentram a maior parte de seus recursos no gerenciamento dos arranjos econômicos e na regularização de quase todos os aspectos da vida econômica". Todavia, como a estabilidade econômica tornou-se parte da realidade, muitos países começaram a trabalhar para alcançar a equidade social bem como reformas políticas e econômicas. Como resultado, o processo de desenvolvimento agora evoluiu em uma segunda geração de reformas com um objetivo mais abrangente que incide sobre as reformas institucionais como, por exemplo, a

reforma judicial. Nas palavras de um ministro da Justiça, "não é suficiente construir rodovias e fábricas para modernizar o estado [...] é também necessário um confiável sistema de justiça". Um governo eficaz exige instituições jurídicas e judiciais que funcionem para realizar objetivos inter-relacionados de promover o desenvolvimento do sector privado, de incentivar o desenvolvimento de todas as outras instituições sociais, reduzindo a pobreza e consolidando a democracia. Os princípios jurídicos que apoiam o sistema econômico vigente na América Latina são nominalmente baseados na liberdade de exercitar direitos individuais e de propriedade. Mas, a legislação não tem sentido sem um sistema judicial eficaz para aplicá-la (WORLD BANKBANCO..., 1996, p.1 tradução nossa).

No caso da justiça brasileira, por exemplo foram criadas a Secretaria de Reforma do Judiciário (SRJ), do Ministério da Justiça e o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), vinculado ao Poder Judiciário, são as instituições nacionais reformistas criadas a partir de 2003 culminando na aprovação da Emenda Constitucional 45/2004. Nesse sentido,

André Luiz Nascimento dos Santos, identifica em sua investigação

supracitada, a coerência entre as diretrizes e “propostas” dos Organismos Internacionais, principalmente aos pertencentes ao sistema ONU e as metas estabelecidas pela Secretaria de Reforma do Judiciário (Op.cit. p. 97-98): ...sendo o Brasil um país onde vige a separação dos Poderes, não é de se espantar que o comprometimento do Executivo com a reforma de um outro Poder tenha outras motivações para além do que se apregoa nos discursos oficiais. Além do interesse por um Judiciário satisfatório, não devem ser esquecidos os compromissos firmados pelo país com as instituições de Bretton Woods, sobretudo, ao longo das crises econômicas da década de 1990. Compromissos esses em que, como já tem sido dito exaustivamente ao longo desse trabalho, a reforma do Judiciário é uma pauta a ser perseguida. Assim, de acordo com os balanços e diagnósticos produzidos pela referida Secretaria, a reforma do Judiciário brasileiro, que ainda está em curso, envolve os seguintes passos: reforma da Constituição Federal (já realizada em 2004); reformas infraconstitucionais (programas em curso envolvendo desde questões ligadas a administração da Justiça à programas alternativos ao Judiciário); diagnósticos, censos e pesquisas (adoção de recursos estatísticos a fim de auxiliar os processos de reforma); e a formulação de um pacto nacional tendo como fim último a reforma do Judiciário. Dentre todos esses passos articulados por essa Secretaria de Estado, destaca -se o “Pacto de Estado em favor de um Judiciário mais rápido e republicano”. Essa articulação foi responsável por um pacto público firmado por Executivo, Legislativo e Judiciário, em 15 de 98 dezembro de 2004, com o fim de cooperação recíproca em prol da agenda de reforma do Judiciário. Tal agenda composta por onze itens específicos era justificada com argumento de trazer mais rapidez e efetivação dos valores republicanos, a partir de outro Judiciário. Essa agenda comum traduz o voluptuoso status de política pública que a reforma se transformou. Dentre os onze itens: a) a implementação da reforma constitucional do Judiciário; b) reforma do sistema recursal e dos códigos de procedimentos; c) maior aporte para a Defensoria Pública e a melhoria no acesso à Justiça; d) implementação e ampliação dos Juizados especiais e da Justiça itinerante; e) execução fiscal mais célere; f) precatórios mais céleres; g) maior aporte da atuação estatal nas graves violações contra Direitos Humanos; h) informatização dos Judiciários; i) produção de dados e indicadores estatísticos; j) coerência entre a atuação administrativa e as orientações jurisprudenciais já pacificadas; l) incentivo à aplicação de penas alternativas. Observa-se que os pontos destacados nesse pacto nacional estão muito próximos das prescrições emanadas pelo Banco Mundial para a reforma do Judiciário na América

Latina. Nesse sentido, finalizamos este item com uma das interrogantes que nortearam nossos pressupostos ao longo dessa pesquisa: a reforma do Judiciário brasileiro é um movimento autêntico ou um fruto de uma política regional prescrita pelo Banco Mundial?

A questão levantada pelo autor coincide com a investigação proposta nesse trabalho, com recorte ao caso dos programas que incluem a Mediação Comunitária como proposta de transformações institucionais, pois a hipótese condutora dessa pesquisa é que um

instituto

que tem em como fundamentos “emancipação” e “cidadania”, “empoderamento da cidadão” e “descentralização de poder”, necessita preservar a autenticidade dos valores locais e deve partir de uma construção de dentro para fora, sem o compromisso de cumprir cartilhas vinculadas à objetivos exógenos,

com princípios e diretrizes baseadas em culturas

etnocêntricas. Ainda como exemplo de programas que buscam promover a Mediação Comunitária, vale destaque no Brasil o programa “Justiça Comunitária”, contido na pasta de ações da Secretaria de Reforma do Judiciário do Minstério da Justiça com o apois institucional do PNUD e do Banco Mundial (Foley, 2010), no Chile, o Centro de Mediación Vecinal y Comunitario, inserido no Plan Comunal de Seguridad Ciudadana de la Municipalidad, com o apoio Institucional do BID (Banco de Buenas Praticas en Prevencion del Delito en América Latina y el Caribe, 2010) e na Argentina, Programa de Mediação Comunitária, uma política pública da cidade de Buenos Aires, nos Centro de Gestion e Participacion, parte de um sistema descentralizado da cidade Buenos Aires (Ley 4540/1997 CHUBUT), também com a participação do PNUD. Todos esses programas merecem ser estudados a fundo para se verificar o impacto institucional interno, inclusive os reflexos sociais nos países contemplados, para que sejam analisadas as singularidades de cada Estado e como estes se comportam em relação aos programas importados e adaptados às diversas realidades institucionais, culturais, financeiras, em diferentes dinámicas federativas e políticas 3. CONCLUSÃO

Diante da análise dos organismos internacionais e do funcionamento do Sistema ONU, verificou-se que os programas que visam instutucionalizar a “mediação comunitária” na

America Latina é concebido, executado e supervisionado pelos diversos orgãos que compõe o Sistema ONU. Essa pesquisa cumpriu sua proposta ao confirmar a hipótese que independente do conteúdo e do discurso assentados na promoção da emancipação das comunidades, no empoderamento do cidadão, na descentralização do poder e na mudança paradigmática da justiça, verifica-se que certa incoerência quanto à forma e às estruturas que alicerçam este programa. Sob a égide da denominada segunda geração de reforma, proposta pelo Banco Mundial, que a partir de relatórios obtidos no meados da década de 1990, sugeriu a transformação das instituições nacionais, o que se evidência em ambos os cenários (interno e externo) é a tentativa de perpetuação de um sistema hegemônico de poder, guardadas as devidas proporções internacionais e locais, que se baseia na quebra da dicotomia Estado x Sociedade Civil, um movimento de globalização baseada no controle e na procedimentalização das transformações locais, numa pós-nacionalidade baseada na sustentação de um modelo etnocêntrico com fins econômicos em que interesses públicos se confundem com interesses privados, que vem se inserindo no maior número de nações. Nessa segunda geração de reformas, observa-se no caso em tela um movimento de aglutinação da Justiça Comunitária pela Justiça Formal, uma estatização legitimadora de lideranças comunitárias orquestradas por organismos internacionais através de metas, relatórios, cartilhas e certificados, vinculados ao fomento financiero, técnico e ideológico. Verifica-se ainda, a necessidade de maior aprofundamento e discussão dos caminhos possíveis que programas como o em análise podem se tornar viáveis, tendo em vista que o discurso de emancipação das comunidades e protagonismo do cidadão perante as instituições é legítimo e alimenta a possibilidade de se superar as barreiras institucionais sedimentadas no decorrer da história das nações, principalmente nos países periféricos, onde suas demandas sociais e econômicas estão diretamente ligadas ao seu histórico de dependência e subordinação aos modelos hegemônicos.

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