Mediação judicial e garantias constitucionais

July 17, 2017 | Autor: Irapuã Santana | Categoria: Direito Processual Civil, Garantias Constitucionais, Mediação
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Humberto Dalla Bernardina de Pinho Ana Carolina Squadri Santanna Eneisa Miranda Bittencourt Sobreira Michele Pedrosa Paumgartten (organizadores)

MEDIAÇÃO JUDICIAL E GARANTIAS CONSTITUCIONAIS Série Mediação e seus desdobramentos na contemporaneidade

1ª edição

Niterói 2013

MEDIAÇÃO JUDICIAL E GARANTIAS CONSTITUCIONAIS A MEDIAÇÃO E SEUS DESDOBRAMENTOS NA CONTEMPORANEIDADE Comissão Científica Fabiana Marion Spengler (UNISC) Humberto Dalla B. de Pinho (UERJ/UNESA)

Gilvan Luiz Hansen (UFF) Delton Ricardo Soares Meirelles (UFF)

Comissão Executiva Giselle P. Yacoub Marques (PPGSD/UFF) Juliana Barbosa Torres (PPGSD/UFF) Tânia Márcia Kale (PPGSD/UFF) Solange Machado Blanco (UFF) Francis Noblat (PPGSD/UFF)

Gabriel Lima de Almeida (UFF) Vitor Cadorin (PPGSD/UFF) Fabiana Alves Mascarenhas (PPGSD/UFF) Esther Benayon Yagodnik (PPGSD/UFF) Mariana Paganote Dornellas (UFF)

Apoio

Editoração, padronização e formatação de texto Francis Noblat (PPGSD/UFF) Conteúdo, citações e referências bibliográficas Os autores UFF / SDC / BFD Catalogação na Fonte: Bibliotecário Dempsey Bragante (CRB-7 6197)

M488

Mediação judicial e garantias constitucionais [livro eletrônico] / Humberto Dalla Bernardina de Pinho, Ana Carolina Squadri Santanna, Eneisa Miranda Bittencourt Sobreira, Michele Pedrosa Paumgartten (organizadores). – Niterói : PPGSD – Programa de Pós-graduação em Sociologia e Direito, 2013. 1.403,217 Kb ; pdf - (A mediação e seus desdobramentos na contemporaneidade). ISBN 978-85-89150-10-1 (recurso eletrônico) 1. Mediação. 2. Acesso à justiça. 3. Poder judiciário. 4. Direitos e garantias individuais. I. Título. CDD 341.46

É de inteira responsabilidade dos autores os conceitos aqui apresentados. Reprodução dos textos autorizada mediante citação da fonte.

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AGRADECIMENTOS A presente obra é resultado de um trabalho coletivo de amigos e parceiros que, trabalhando em conjunto, possibilitaram esta publicação. Este é um dos quatro volumes de uma coleção que foi organizada a partir de estudos desenvolvidos pelos participantes do I Seminário UFF :: UERJ :: UNESA :: UNISC — A mediação e seus desdobramentos na contemporaneidade, que aconteceu nos dias 04 e 05 de julho de 2013, na Faculdade de Direito da UFF. O seminário, de iniciativa dos professores Dr. Delton Meirelles (UFF), Dr. Gilvan Hansen (UFF), Dr. Humberto Dalla (UERJ/UNESA) e Dra. Fabiana Spengler (UNISC), possibilitou a reflexão sobre o tema da mediação sob dife-rentes aspectos, contando com a colaboração de diversos estudiosos da área. Por meio de um espaço criado pela proposta dos idealizadores do evento, foi possível institucionalizar o debate sobre o tema da mediação, viabilizando a troca de experiências com um diálogo entre as instituições participantes, com base nos temas centrais das políticas públicas de acesso à justiça; mediação, cidadania e democracia; a mediação judicial e garantias constitucionais; e a mediação extrajudicial e justiça restaurativa. As exposições iniciais e as reflexões geradas por cada grupo de trabalho permitiram a aproximação e intercâmbio de diversas perspectivas sobre a temática, possibilitando um panorama sobre o atual estado da mediação no Brasil, assim como seus desdobramentos na sociedade contemporânea. Desta forma, cada livro desta coleção é resultado das pesquisas dos diversos estudiosos nas temáticas centrais do evento. Agradecemos a participação dos pesquisadores Profa. Juliana Loss de Andrade (Carlos III-Madrid/Espanha), Prof. Ricardo Goretti (FDV/ES), Profa. Luciane Moessa de Souza (Procuradora BACEN), Prof. Chiara Besso Marcheis (Universidade de Torino/Itália), além dos profesores organizadores e coordenadores dos grupos de trabalho que contribuiram de forma significativa para todas as reflexões e resultado do seminário. O evento contou com a importante colaboração da Pró-Reitoria de Extensão da Universidade Federal Fluminense (PROEX), Centro de Apoio à Extensão da Universidade Federal Fluminense (CEAEX), Faculdade de Direito da Universidade Federal Fluminense, Laboratório Fluminense de Estudos Processuais (LAFEP/UFF) e Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Direito da Universidade Federal Fluminense (PPGSD), além da Coordenação de Aperfeiçoa-mento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), responsável pelo iii

financiamento de alguns pesquisadores participantes do seminário. Deixamos registrado nosso agradecimento. Aos professores e alunos, membros das comissões científicas e organizadora, e todos os participantes do evento, agradecemos pelo empenho e colaboração essenciais à realização e sucesso deste trabalho. Giselle Picorelli Yacoub Marques

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APRESENTAÇÃO Com a institucionalização da mediação, mediante sua introdução no Poder Judiciário, algumas questões de ordem processual devem ser analisadas, como a manutenção dos princípios da mediação e a aplicação das garantias constitucionais do processo nesse novo instrumento judicial. Considerando que a mediação é originariamente um meio privado de solução de conflito, princípios como da autonomia da vontade e da confidencialidade se confrontam com princípios de ordem pública aplicados num processo sob ingerência e controle do Judiciário. O debate torna-se ainda mais complexo com a entrada em vigor do Novo Código de Processo Civil, cujos princípios processuais terão um alcance ainda maior. Uma leitura moderna do princípio do contraditório, por exemplo, irá vigorar no sentido de garantir um processo mais cooperativo. Além disso, será exi gida uma fundamentação analítica da sentença, dentre outros princípios que conferem uma nova ideologia ao processo. Inserida no âmbito judicial, a mediação perde uma parte de sua característica privatista para se amoldar à feição processual, voltada para a solução do conflito com a garantia da realização de um processo justo. Nesse contexto, debate-se na doutrina acerca da previsão legal da mediação obrigatória, sendo que o argumento de sua defesa está circunscrito à celeridade processual e o seu repúdio tem como base a preservação de um dos princípios da mediação, que é a autonomia privada, característica considerada fundamental para o correto manuseio do instrumento. Também foi debatido no GT3 as iniciativas legislativas de outros países no que diz respeito à implementação da mediação no Judiciário. Enfim, esses foram os temas analisados pelo Grupo, que conjuntamente colocou em pauta as iniciativas legislativas no Brasil. Humberto Dalla Bernardina de Pinho Ana Carolina Squadri Santanna Eneisa Miranda Bittencourt Sobreira Michele Pedrosa Paumgartten

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ÍNDICE A MEDIAÇÃO NO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL BRASILEIRO: CRÍTICAS A EFETIVAÇÃO DO INSTITUTO DE COMPOSIÇÃO DE LITÍGIOS, A PARTIR DE UMA ANÁLISE CONSTRUTIVA DAS TRADIÇÕES CIVIL LAW E COMMON LAW 2 Cláudia Moreira Hehr Garcia Tauã Lima Verdan MEDIAÇÃO OBRIGATÓRIA À LUZ DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS E DA PRÓPRIA MEDIAÇÃO 20 Abel Rafael Soares A MEDIAÇÃO COMO CAMINHO PARA A EFETIVIDADE DA GARANTIA DA RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO NA ESFERA PRIVADA INTERNACIONAL 30 Ana Carolina Machado Ratkiewicz Joseane Ceolin Mariani de Andrade Pedroso A MEDIAÇÃO COMO MEIO DE SE PROMOVER O ACESSO À JUSTIÇA E A PRESERVAÇÃO DO PROCESSO JUSTO 45 Caroline Gaudio Rezende Suellen Kercia Peris de Souza Soares MEDIAÇÃO PARAPROCESSUAL NO JUDICIÁRIO BRASILEIRO: SUAS TÉCNICAS, PRINCÍPIOS, PARADOXOS E COLISÕES COM O PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO 58 Alice Boechat da Costa Soares OS PRINCÍPIOS ORIENTADORES DA MEDIAÇÃO NO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL E AS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS 76 Marina Beatriz Pereira Corrêa Raquel Helena Duarte Cordeiro CONFLITO, INDISPONIBILIDADE E MEDIAÇÃO SOB A PERSPECTIVA DOS SISTEMAS AUTOPOIÉTICOS 88 Sidney Rosa da Silva Junior O NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL BRASILEIRO (PROJETO DE LEI Nº 8046/2010), A MEDIAÇÃO E A CONCILIAÇÃO: MEIOS COMPLEMENTARES DE TRATAR CONFLITOS PARA UMA OUTRA JURISDIÇÃO? 110 Fabiana Marion Spengler Theobaldo Spengler Neto MEDIAÇÃO E VÍCIO DE VONTADE: A POLÍTICA PÚBLICA DE PROPAGAÇÃO DA DESIGUALDADE 127 Irapuã Santana

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A MEDIAÇÃO NO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL BRASILEIRO: CRÍTICAS A EFETIVAÇÃO DO INSTITUTO DE COMPOSIÇÃO DE LITÍGIOS, A PARTIR DE UMA ANÁLISE CONSTRUTIVA DAS TRADIÇÕES CIVIL LAW E COMMON LAW Cláudia Moreira Hehr Garcia Tauã Lima Verdan O trabalho se propõe a verificar as condições da formação da Federação dos Estados Unidos da América e do Brasil, utilizando tais informações como “pano de fundo” para a formação dos sistemas jurídicos adotados pelos dois países. Por meio de comparativo entre os sistemas civil law e common law, especificamente no que tange a Alternative Dispute Resolution – ADR do tipo mediação, pretende-se demonstrar que o teor sobre o tema, contido no Projeto de Lei n.º 8046/2010 – Projeto do novo Código de Processo Civil, deixa a desejar no que se refere a essência do instituto da mediação.

Introdução Não é possível compreender o sistema jurídico de uma sociedade sem se pautar na cultura local. Como o Estado é constituído pelos homens e não por um “Leviatã” com vida e atitudes próprias, a cultura social de um Estado democrático consta impregnada nos ordenamentos jurídicos. Diante disso, o presente artigo pretende demonstrar que a construção social dos Estados Unidos da América e do Brasil fortificam suas opções pelos sistemas common law e civil law respectivamente. Dessa forma, o artigo se propõe a tratar das diferenças entre os sistemas jurídicos dos dois países, em principal, naquilo que se refere à ADR - Alternative Dispute Resolution (Resolução Alternativa de Litígios) do tipo mediação, na intenção de demonstrar que a inclusão do instituto no Projeto do novo Código de Processo Civil pode não corresponder ao que exatamente se espera dele. Para tanto, no primeiro capítulo, far-se-á uma análise da construção federalista dos dois países, demonstrando que o processo de independência desses e a construção cultural de ambas as sociedades são tão antagônicas quanto seus sistemas jurídicos. Após, serão analisadas algumas diferenças clássicas entre os dois sistemas, com atenção especial para os tipos de ADR, com ênfase na mediação, com a devida análise do texto do Projeto de Lei 2

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aprovado pela Câmara dos Deputados que, na atualidade, aguarda manifestação do Senado Federal. Por fim, apresenta-se um capítulo em vias de conclusão, onde doutrina processual defende a mesclagem dos dois sistemas jurídicos naquilo que ambos apresentam de melhor, em virtude, principalmente, do processo de globalização. A conclusão é apresentada a seguir, com uma retrospectiva de todos os assuntos abordados conduzindo o leitor à compreensão real dos desígnios do instituto mediação e a demonstração de sua utilização pelo sistema jurídico brasileiro. Para realização do trabalho, adotou-se uma metodologia de pesquisa bibliográfica, com análise de Projetos de Lei e legislação pertinente.

I. A cultura local como instrumento norteador do ordenamento jurídico Não se pode observar o sistema processual de um país separado da cultura do povo que o compõe. Todo sistema jurídico reflete os princípios basilares da nação que o adota, e ainda, transparece a cultura popular do local. Nesse sentido, é de interesse do presente ensaio que se analise a construção cultural americana e brasileira com fins de demonstrar que as diferenças entre os sistemas civil law e common law se distanciam e se aproximam conforme a confluência cultural de tais nações, se é que isso é possível. Sob o foco de que os processos judiciais “refletem os valores, sentimentos e crenças (a “cultura”) da coletividade que os utiliza”, Oscar Chase (2003, p. 116) demonstra que a cultura americana se reflete nas regras processuais que disciplinam os litígios. Em uma análise mais detalhada sobre o modo de vida americano, é possível verificar a importância que o “indivíduo” representa dentro do sistema. Para melhor reflexão, mesmo que sucinta, cabe relembrar a formação do povo americano por meio das lutas pela independência e, também, sua formação religiosa, o que se entende por relevante neste estudo. I.ii. Da colonização dos Estados Unidos da América e do Brasil A colonização Americana foi impulsionada no século XVI com o reinado de Elizabeth I, entretanto, somente com o reinado de Jaime I, no século XVII, com a criação da Companhia de Londres e da Companhia de Plymouth que a colonização realmente ocorreu. As colônias que à época da independência

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somavam treze foram colonizadas de formas diferentes ao Sul, ao Norte e no Centro. (AQUINO; LEMOS; LOPES, 1990, p. 83-85). Devido ao clima favorável, as colônias do Sul desenvolveram o sistema de plantations com predominância do trabalho escravo, caracterizando-se assim, como colônias de exploração. Diferentes disso, as colônias do Norte, que não apresentavam boas condições climáticas, serviram de colônias de povoamento principalmente para as famílias protestantes que fugiam das perseguições religiosas ocorridas na Inglaterra (Ibid., 1990, p. 88). As colônias do centro foram colonizadas por último, sendo utilizadas como prêmio para nobres ingleses que quisessem aumentar suas terras produtivas. (Ibid., 1990, p. 85-82). Como não podia deixar de ser, a Metrópole se interessou pelas colônias de exploração deixando as colônias de povoamento à sua sorte. Contudo, apesar da adversidade climática, estas colônias respaldadas pelos ideais religiosos começaram a reger-se sem maiores interferências o que resultou em comércio com outras regiões além da própria Inglaterra. Além disso, todas as colônias possuíam Governador, Conselhos e Câmaras, o que “reforçava os sentimentos de autogoverno.” (AQUINO; LEMOS; LOPES, 1990, p. 93). Concomitante ao autogoverno das colônias, a Inglaterra teve seu “tesouro enfraquecido devido aos gastos com as guerras européias e coloniais” (AQUINO; LEMOS; LOPES, 1990, p. 113) e, por isso, e também visando frear o comércio autônomo das colônias, o Parlamento inglês taxou vários itens com impostos rigorosos. Dessa forma, inconformados com o retrocesso social, político e comercial que a Inglaterra tentava impor às colônias americanas, os colonizadores deram início a Guerra da Independência que culminou com a Declaração da Independência americana em 04 de julho de 1776. Em 1781, quatro anos após a promulgação da Constituição dos Estados Unidos da América, as treze colônias assinaram um tratado conhecido como Artigos de Confederação, o que lhes rendeu o reconhecimento internacional de Estados independentes que, uma vez reunidos em confederação, deram origem aos Estados Unidos da América. Entretanto, cabe ressaltar que apesar de assinado em 1781, os Artigos de Confederação já estavam escritos desde 1777, restando apenas a ratificação por parte de todas as colônias, o que ocorreu em 1781. Nesse ínterim, tais artigos serviram como base para a formação da Constituição Americana. Entretanto, o referido tratado assinalava em seu artigo segundo o seguinte: “Each State retains its sovereignty, freedom, and independence, and every power, jurisdiction, and right, which is not by this confederation, expressly delegated to the United States, in Congress assembled.” (UNITED STATES OF AMERICA, 1781).1 1

Cada Estado mantém a sua soberania, liberdade, e independência e todo poder, jurisdicional, naquilo que não for por esta Confederação expressamente delegado aos Estados Unidos reunidos em Congresso. Tradução nossa.

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Com o tempo percebeu-se a fragilidade da Confederação, pois existiam vantagens em se manter unidos os Estados que antes formavam as treze colônias, entretanto, interesses individuais que correspondiam aos ideais de soberania, liberdade e independência dos Estados-membros, contidos no artigo segundo do tratado de confederação, colaboravam para a concorrência entre os mesmos e deixava em aberto a existência do direito de secessão que poderia contaminar a união dos Estados. A partir disso, surgem as primeiras ideias de federação. Artigos escritos por Alexander Hamilton, John Jay e James Madson (2003) disseminaram ideais federalistas que culminaram em um novo Congresso na cidade de Filadélfia no ano de 1787. Nessa época, os autores acima citados publicaram no “Daily Advertiser de Nova Iorque uma série famosa de artigos destinados a esclarecer o espírito público nos Estados recém-libertos do jugo britânico preparando-os para receber favoravelmente as instituições republicanas delineadas na projetada Constituição.” (HAMILTON, 2003. p. 05). O teor dos artigos tratava da separação política entre federalistas do Norte e republicanos do Sul. Aqueles liderados por Hamilton e estes por Thomas Jefferson, cujas discussões, principalmente sobre o que tange ao poder centralizador, terminaram por criar uma nova forma de governo, o federal. O federalismo americano apresenta a união dos Estados por meio de um poder central expresso pela figura do Presidente eleito; o poder central se divide em executivo, legislativo e judiciário; o direito de secessão é extinto; o poder político é compartilhado pela união (poder central) e pelos Estados federados; a base do Estado federado é a Constituição e nesta consta a divisão dos poderes de cada ente da federação. Diferente disso, o Brasil foi colonizado a partir do século XVI. O povoamento do território se deu exclusivamente com fins de exploração, o que resultou em latifúndio e mão de obra escrava conforme se exige o sistema de plantations. Portugal dividiu o Brasil em 15 imensos lotes de 300 kilômetros de largura cada um, destinando a doação desses àqueles que possuíssem condições financeiras de colonizá-los por conta e custas próprias. Vários direitos foram cedidos aos donatários, restando à Coroa o monopólio do pau-brasil e o recebimento de percentuais sobre outros bens. Entretanto, tal sistema não resistiu devido aos grandes gastos dos donatários com a proteção das capitanias, transporte de colonizadores, ataque dos índios, e também, devido ao alvará expedido por D. João III que declarava “as capitanias do Brasil território de “couto e homizio”, ou seja, uma região na qual crimes cometidos anteriormente 5

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em outros lugares ficavam instantaneamente prescritos e perdoados.” (BUENO, 1999, p. 91). Até 1791 as Capitanias ainda existiam, mas Portugal já havia implantado os governos gerais devido à falência daquelas. Todavia, naquilo que foi possível, o sistema de capitanias auxiliou na colonização e na formação de vilas que mais tarde, em período republicano, transformar-se-iam em Estados. As revoltas internas no Brasil ocorriam desde o século XVII. A maioria delas pregava sentimentos republicanos regionais, tendentes ao desmembramento de territórios até então componentes da colônia. No sentido de unificação nacional, em 1808, a Corte portuguesa foi transferida para o Brasil criando-se o Reino de Portugal, Brasil e Algarves, em 1815. (ANDRADE; ANDRADE, 2003, p. 33). Dom João retornou a Portugal e a Independência do Brasil foi proclamada em 1822, por seu filho Dom Pedro I que, mantendo o Estado unitário, outorgou uma Constituição em 1824. Entretanto, Manuel Correia de Andrade (2003, p. 46) demonstra que ideais federalistas permeavam o Brasil no final do século XVII. Em 1891, com a proclamação da República e a queda da Monarquia, o sistema federativo foi implantado à imagem e semelhança dos Estados Unidos da América, passando o Brasil a se denominar “Estados Unidos do Brasil”. Diferente do movimento federalista ocorrido nos Estados Unidos da América, no Brasil, a federação se formou de dentro para fora, em movimento centrífugo, enquanto naquele, o movimento foi de fora para dentro, em movimento centrípeto. Em suma, é possível notar que enquanto o povo americano se organizava na busca pela liberdade sob a base da igualdade por meio do respeito à individualidade de cada um, no Brasil, o movimento se dava ao contrário, pois uma vez colônia exclusiva de exploração, a colonização se deu por meio de indivíduos desinteressados pela construção da nova pátria. Outra questão que cabe salientar, diz respeito à religião. A América do Norte foi predominantemente povoada por protestantes puritanos, enquanto no Brasil houve a predominância católica. Aparentemente, talvez não seja possível identificar a influência da religião nos sistemas processuais dos países em discussão, mas, conforme os ditos de Gilvam Hansen2(informação verbal), a colonização puritana não negava a existência de Deus, mas ao contrário, defendia que para alcançá-lo dever-se-ia trabalhar muito e, portanto, acumular bens não seria sinônimo de pecado. Diferente disso, a filosofia católica afirmava que para se alcançar o reino dos céus, os homens deveriam se contentar com o pouco, dividindo com os demais seus bens mais preciosos. Dessa forma, a 2

HANSEN, Gilvan. Aulas de Epistemologia. PPGSD-UFF. 1º semestre de 2012. A informação foi verbalizada no decorrer dos estudos sobre Karl Marx.

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filosofia religiosa apoiava o individualismo americano, enquanto no Brasil, o fato ocorria ao inverso. Outra questão relevante que pode se conjugar ao fator de formação religiosa dos Estados Unidos e do Brasil é o laissez-faire. Com a política Americana de afastar o Estado das relações privadas valorizou-se o querer-poder individual. O “cidadão tem direito a ser deixado em paz pelo Governo” (CHASE, 2003, p. 120), o que não se alterou com a aplicação da política do welfare state, ao contrário, se fortaleceu, uma vez que perante o Estado consignou-se obrigações para com os indivíduos, o que ocorreu de forma diferente no Brasil, onde a implantação de tal política foi considerada por alguns como um simulacro. (STRECK; MORAIS, 2003, p. 58). Portanto, a formação do povo, sua religião, suas guerras, vitórias e derrotas, corroboram para a formação da identidade e, consequentemente, das diferenças comportamentais dos povos, o que inclui o pensamento, comportamento e atitudes jurídicas.

II. As principais diferenças processuais entre os sistemas jurídicos civil law e common law Na intenção de demonstrar que as diferenças existentes nos sistemas jurídicos de cada povo se pautam não só, mas principalmente, nas suas origens culturais, apresentar-se-á, ainda que de forma sucinta, algumas diferenças clássicas entre os sistemas civil law e common law. Para tanto, serão utilizados como exemplo dos sistemas informados quando aplicados, o Brasil e os Estados Unidos da América. Entretanto, antes de adentrar propriamente ao estudo das diferenças mais pontuais, insta salientar que os dois grandes grupos de sistemas ocidentais em estudo – civil law e common law – se apresentam conforme a cultura romano-germânica e anglo-saxônica respectivamente e, conforme Barbosa Moreira, são classicamente classificadas como: processo inquisitória e processo adversarial. (MOREIRA, 2007, p. 40-41). O processo adversarial sugere uma disputa entre as partes com pouca intromissão do Estado, enquanto o processo inquisitorial se apresenta sob o controle desse. Diante do processo de formação dos Estados Unidos da América e do Brasil é possível reconhecer que o individualismo, igualitarismo e ideais de liberdade estão exemplificados no processo adversarial, diferente do que ocorre no Brasil, cujo assistencialismo e dependência estatal despontam no processo judicial. 7

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Baseado nos estudos de Oscar G. Chase é possível afirmar que as principais diferenças processuais existente no processo americano são: o júri civil; a discovery do pré-trial dominada pelas partes; o juiz passivo e os peritos escolhidos pelas partes. (CHASE, 2003, p. 118). Os Estados Unidos da América são o único país a utilizar em seu sistema processual o júri civil. Nem mesmo a Inglaterra, precursora de tal prática, manteve em seu ordenamento (com raras exceções) tal instituto jurídico. Não é difícil ver como o histórico apego americano ao júri se funda em valores americanos centrais. É essencialmente uma instituição igualitária, populista e antiestatista. É “fortemente igualitária” porque confere a pessoas leigas, sem qualificação especial alguma, um poder de afirmação de fatos superior ao do juiz. Conquanto seja verdade que o juiz presidente do julgamento pode rejeitar o veredicto do júri e proferir decisão “como de lei” contra a parte favorecida pelo júri, esse poder é limitado. (CHASE, 2003, p. 128).

Essa limitação reforça o poder dos jurados que, como representantes da sociedade, por vezes emitem veredictos com força de lei. Assim, “os jurados são bem conscientes de seu poder de agir como “minilegislador” em casos tais” (CHASE, 2003, p. 128). Em outras palavras, a existência do júri civil possibilita a participação ativa da sociedade na economia, consumo, atos privados, entre outros, por meio das decisões emanadas. As decisões do júri civil possuem o poder de modificar as práticas sociais servindo como indicadores comportamentais da sociedade America. Óbvio que o júri civil é um instrumento governamental, mas uma vez instrumentalizado pelos cidadãos americanos transparece aos litigantes os valores individuais e antiestatais, conforme a cultura americana, mesmo porque, o veredicto deve se apresentar como uma unanimidade entre os jurados. Deve-se alcançar o consenso social. No sistema civil law, tendo como modelo o Estado brasileiro, o júri se aplica exclusivamente no sistema penal. Não existe júri civil. As decisões civis são emanadas por juiz singular ou por colegiados que representam o Poder Judiciário. A sociedade não possui direito de se manifestar em tais causas. Outro mecanismo jurídico adotado pelo sistema americano é a discovery no pre-trial. Tal procedimento comprova automaticamente a prevalência do individualismo, do antiestatismo e do igualitarismo nas relações judiciais. As regras processuais americanas permitem aos advogados tentar descobrir provas fora do tribunal e, não obstante, ter o apoio da autoridade judiciária no reclamar a cooperação de adversários e testemunhas. Consoante as típicas regras americanas, cada parte tem o poder de exigir do adversário (ou de testemunhas potenciais) que se submeta a perguntas orais sob juramento sem a presença do juiz (deposition), que responda sob juramento a perguntas escritas (interrogatories), que abra seus arquivos à inspeção, ou, quando se põe em questão a condição física ou mental,

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Cabe ressaltar que a discovery no pré-trial não ocorre de forma igualitária em todos os países que adotam o sistema common law. Na Inglaterra, por exemplo, os atos de investigação não são tão amplos como ocorre nos Estados Unidos. Na Inglaterra, apesar do sistema instituído ser também o common law, os julgamentos concentrados constituem regra e não exceção. (CHASE, 2003, p. 132-133). Mas, diante da formação cultural do povo americano, o desenvolvimento do processo, principalmente nessa fase, tende a “nivelar o campo de jogo” (Ibid.). Em outras palavras, encontra-se garantido o ideal americano por meio da possibilidade igualitária das partes construírem suas defesas conforme a competência de cada uma, diante a liberdade de investigação que possuem. Outras duas questões a se discutir são a participação do juiz no processo judicial e o papel dos peritos. Quando se trata do sistema common law, os juízes são pouco participativos, afinal, o processo é praticamente gerido pelos advogados. Ao contrário, no sistema civil law, onde o processo é de total responsabilidade do Estado, os juízes são ativos e responsáveis pelo direcionamento do processo. Aos advogados cabe menor participação. Nesse item, cabe ressaltar que reformas processuais ocorridas nos últimos anos estão possibilitando uma participação maior do juiz no processo (resultado da confluência entre os sistemas jurídicos), mas a postura do magistrado nos dois sistemas ainda é muito diferente. Tratando do papel dos peritos no processo americano, estes atuam escolhidos e pagos pelas partes. Quando cada parte apresenta como testemunha um perito, ao júri cabe decidir qual possui a tese mais plausível. No sistema civil law o perito é neutro e de confiança do juiz que lhe estendeu o encargo. Apresenta-se como perito e não como testemunha do processo. Além das diferenças clássicas apresentadas, a utilização da autocomposição de litígios também se apresenta diferente nos dois sistemas apesar de ambos adotarem praticamente os mesmos institutos. Dessa forma, devido o interesse do tema versar sobre a mediação de conflitos, passa-se a análise individual da autocomposição de litígios. II.i. A autocomposição de litígios e sua diferente aplicação nos sistemas common law e civil law

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No decorrer da evolução na busca por solucionar os conflitos sociais, a autotutela foi a primeira a surgir. Logo depois, a autotutela deu lugar a autocomposição, que ao invés de fazer uso da vingança contra o ofensor, passou a ressarcir a vítima por meio de uma indenização estabelecida por um árbitro, um terceiro eleito pelas próprias partes. Por último, surgiu a heterocomposição, com a intervenção de terceiro não escolhido pelas partes. Em outras palavras, o Estado tomou para si a responsabilidade em resolver os conflitos, tornando-se o harmonizador oficial da sociedade. (ALMEIDA NETO). A autocomposição representou e ainda hoje representa um dos meios mais democráticos de resolução de conflitos, pois o que prevalece é a vontade das partes, a espontaneidade de decisão, independente da eficácia ou da solução dada pelo terceiro desinteressado. Nos países que adotam o sistema common law a autocomposição de litígios é representada pela sigla ADR, que significa Alternative Dispute Resolution (Resolução Alternativa de Litígios). As ADR’s cresceram de forma significativa e visam incentivar as partes a negociar o resultado do processo. (MIRANDA NETTO; MEIRELES, 2011). Nos Estados Unidos costuma-se referir que o início do movimento a favor dos modelos alternativos ao processo clássico coincide com um simpósio jurídico ocorrido em 1976, para celebrar o septuagésimo aniversário do conhecido discurso de Roscoe Pound, um dos maiores juristas da primeira metade do século XX, sobre o tema “The Causes of Popular Dissatisfaction with the Administration of Justice” (“As causas da insatisfação popular com a administração da justiça”). Observou-se, naquele evento, que a despeito de todos os aperfeiçoamentos introduzidos no sistema judiciário e inobstante as inúmeras alterações e inovações no âmbito do processo civil, nos setenta anos transcorridos desde o discurso de R. Pound, persistia o baixíssimo índice de aprovação popular em relação ao funcionamento do poder judiciário e ao serviço por ele prestado. Diante de tal percepção, defendeu-se, no referido simpósio, que talvez pouco adiantasse reformar o processo civil tradicional. A coisa correta a fazer, foi então sustentado, seria “afastar do judiciário algumas espécies de controvérsias, que deveriam ser desviadas para órgãos alheios ao aparato judicial, de natureza particular, e que operassem segundo um procedimento mais flexível e informal”. Com isso, seria mantido o processo civil clássico da Common Law para as demandas mais complexas, de maior valor econômico e envolvendo partes capazes de enfrentar o custo mais elevado de tais demandas. (FACCHINI NETO, 2011, grifos nossos).

Ao final dos anos 70, alguns Estados americanos começaram a implantar os procedimentos de Resolução Alternativa de Litígios, mas foi com a publicação da Civil Justice Reform Act de 1990, que as ADR’s passaram a permear definitivamente o cenário americano. (FACCHINI NETO, 2011, p. 120). A Alternative Dispute Resolution, não se apresenta como um movimento estanque pautado em uma única técnica. Várias são as formas de solução alternativa dos 10

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litígios. Além da diferenciação clássica entre formas de resolução endoprocessual e extraprocessual, essa última pode se apresentar solucionada pelas próprias partes por meio de acordo ou através de uma decisão emanada por um estranho à relação, não participante da máquina pública. (FACCHINI NETO, 2011, p. 121). O primeiro deles – modelo conciliatório – visa compor a controvérsia através de uma solução acordada entre as partes. Várias técnicas inserem-se nesse modelo, como é o caso da mediation, da early neutral evaluation e do summary jury trial. Já o modelo decisional (decision-oriented) procura a solução dos conflitos através de uma decisão emanada de um terceiro, que não o juiz estatal. O arquétipo desse último modelo é a arbitragem. (FACCHINI NETO, 2011, p. 121).

Na justiça americana, além da mediação e da arbitragem, outros institutos também se apresentam como opção para a resolução alternativa dos litígios. Mesmo porque, insta salientar que o processo de mediação e arbitragem, na maioria das vezes, se realiza por meio de empresas privadas americanas que oferecem esse tipo de serviço. Dentre as outras formas alternativas pode-se citar o Summary Jury Trial e o Ministral, que nada mais são que processos simulados, capazes de indicar o andamento que provavelmente seguirá o processo. Entretanto, a alternativa mais recomendada na fase inicial de um processo é o Early Neutral Evaluation, que conta com a avaliação de um terceiro neutro que apresentará parecer a respeito do provável curso do processo. A conciliação também está inserida no processo judicial americano, aliás, após a publicação da Alternative Dispute Resolution Act of 1998, passou a ter importância destacada na justiça federal. (Ibid., 129-130). Portanto, pode-se afirmar que é expressivo o incentivo à Resolução Alternativa de Litígios no sistema common law, muito bem exemplificado pela denominada Alternative Dispute Resolution (ADR) dos Estados Unidos, “a vasta maioria das ações civis americanas termina por acordo antes do julgamento”(CHASE, 2003, p. 121), representado pelos meios de negociação, mediação e da arbitragem, desonerando de maneira significativa o Poder Judiciário Americano. No sistema civil law brasileiro não ocorre dessa forma. Ao contrário do sistema common law exemplificado pelo modelo jurídico americano, no Brasil, a autocomposição de litígios surge com o objetivo de desafogar a jurisdição brasileira, uma vez que os tribunais se encontravam e ainda se encontram abarrotados de processos. 11

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Na verdade, traçando um paralelo analógico entre a formação dos dois países, Estados Unidos e Brasil, é possível afirmar que o movimento centrípeto e centrífugo não ocorreu apenas na formação da Federação. Quando o assunto é autocomposição o movimento se repete. Nos Estados Unidos, a autocomposição surge a partir da inconformidade social, quando a sociedade não satisfeita com o sistema jurídico procura novos métodos para acelerar e baratear a resolução de seus conflitos. No Brasil, o movimento se fez ao contrário, uma vez que a verificação da necessidade de transformação partiu dos próprios Tribunais que percebendo não ser possível dar solução a tantos conflitos, investiu na propagação de modalidades autocompositivas e no cerceamento do acesso aos Tribunais Superiores. No que tange as formas de autocomposição de litígios, pode-se afirmar que no Brasil existe a negociação, a conciliação, a arbitragem e a mediação. Lembrando que a arbitragem se apresenta no ordenamento jurídico brasileiro como um método processual previsto em lei. Na verdade, a negociação é uma característica comum em todos os métodos alternativos de solução de conflitos. Porém, na negociação como um meio autocompositivo não existe a figura de um terceiro imparcial, a busca pela solução do conflito se faz apenas pelos envolvidos no litígio. A primeira vista, a negociação não é muito eficaz, não sendo considerado necessariamente um meio autocompositivo. Sendo assim, pode-se dizer que no Brasil, a conciliação, a mediação e a arbitragem são os mais conhecidos modelos autocompositivos de litígios. A conciliação é conhecida no Brasil desde a Constituição de 1824, quando em seu artigo 161, anunciava que “sem se fazer constar, que se tem intentado o meio da reconciliação, não se começará processo algum”. Entretanto, sua consonância com direitos e garantias fundamentais, princípios processuais e efetividade de direitos, o que garantiu sua real aplicabilidade, só ocorreu com sua inserção no Código de Processo Civil em 1973, sendo ratificado o modelo autocompositivo com a publicação da Lei 9.099, de 26 de setembro de 1995, conhecida nacionalmente como a Lei dos Juizados Especiais. Portanto, existe conciliação fora da esfera jurídica, mas sua predominância é na esfera judicial. A arbitragem no Brasil é disciplinada pela Lei n.º 9.307, de 23 de setembro de 1996, e quando se está diante de litígios relativos a direitos patrimoniais, é facultado às pessoas capazes que se valham dela para solucioná-los. Ressalta-se que a arbitragem é instituída a partir do momento em que a nomeação de um arbitro é aceita por uma ou ambas as partes e, ao ser instituída, existe a necessidade de resultar numa sentença arbitral que constitui título executivo judicial. Também é preciso salientar que esta lei permite várias possibilidades das partes se conciliarem durante o processo. Tal fato privilegia o princípio da autonomia das vontades. 12

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Por fim, a Mediação. Tratando-se de instituto de autocomposição de litígios ainda não regulamentada por lei que conforme Projeto do novo Código de Processo Civil passará a constar também do rol dos procedimentos de autocomposição de litígios endoprocessuais sendo utilizada também nos tribunais brasileiros, cabe aqui, uma análise minuciosa sobre o instituto. Aliás, cabe ressaltar que alguns Tribunais de Justiça brasileiros se anteciparam à aprovação de tal Projeto, e por si, lançaram projetos de mediação nos locais de suas competências. II.i.i. Da mediação A mediação é um meio alternativo simples, essencialmente extrajudicial de resolução de conflitos e efetivo no acesso a justiça. Ocorre quando as partes elegem um terceiro (mediador) alheio aos fatos para conduzi-las à solução do conflito por meio de um acordo sem que haja uma interferência real do mesmo. O objetivo da mediação é responsabilizar os protagonistas, fazendo com que eles mesmos restaurem a comunicação e sejam capazes de elaborar acordos duráveis. A mediação não é instituto jurídico, mas sim, uma técnica alternativa na solução de conflitos que propõe mudanças na forma do ser humano enfrentar seus problemas. Ocorre que, como os demais procedimentos de autocomposição de litígios adotados pelo sistema jurídico brasileiro, a mediação está sendo incluída no Processo Civil como ocorreu com a conciliação e a arbitragem. Entretanto, no que se refere a sua efetividade extra ou endoprocessual, algumas comparações com o sistema americano são necessárias. Em leitura à proposta contida no Projeto de Lei n.º 8.046, de 22 de dezembro de 2010 não é difícil perceber que se trata da regulamentação endoprocessual da mediação, instituto jurídico não regulado até o momento. Entretanto, diferente do Projeto de Lei n.º 4.827, 10 de novembro de 1998, de autoria da Deputada Zulaiê Cobra, que tentava regulamentar tal instituto, a proposta do Novo Código de Processo Civil se projeta menos didática e mais institucionalizada. Afirma-se isso porque a Seção V, onde se encontra o conteúdo, enuncia-se conjuntamente mediação e conciliação sob as mesmas bases teóricas, diferentemente do que fora proposto no primeiro Projeto de Lei. Diante das diferenças dos institutos Humberto Dalla Bernardina de Pinho apresenta o seguinte conceito de mediação: 13

MEDIAÇÃO JUDICIAL E GARANTIAS CONSTITUCIONAIS A MEDIAÇÃO E SEUS DESDOBRAMENTOS NA CONTEMPORANEIDADE Temos sustentado, numa definição simples e direta, que a mediação é o procedimento por meio do qual os litigantes buscam o auxílio de um terceiro imparcial que irá contribuir na busca pela solução do conflito. Esse terceiro não tem a missão de decidir (e nem a ele foi dada autorização para tanto). Ele apenas auxilia as partes na obtenção da solução consensual. Quer me parecer que a mediação é muito mais um conjunto de técnicas, experiências e hábitos culturais, que vão se estabelecendo na comunidade, do que uma definição teórica. (PINHO, 2011)

Portanto, bem diferente da conciliação, a mediação exige um terceiro imparcial à causa, com capacidade de proporcionar harmonia entre partes com intuito de produzir uma solução independente, sem a intromissão ou direcionamento proporcionado pela parcialidade do mediador. Para tanto, é necessário que as partes sintam a necessidade dessa interferência benéfica e, por vontade própria, busquem a mediação como opção à resolução do litígio. Diferente disso encontra-se a conciliação, cuja característica pressupõe a existência de um terceiro não interessado que direcione a causa por meio de seu conhecimento jurídico. Ambos os institutos estão timidamente conceituados nos parágrafos do artigo 145, do Projeto do novo Código de Processo Civil, mas suas diferenças são tão amplas que mereciam melhor distinção. A mediação pressupõe a escolha de um mediador que agrade a ambas as partes, enquanto na conciliação este auxiliar da justiça já se apresenta institucionalizado, situação que poderá ser modificada com a introdução do artigo 146, do Projeto de Lei 8046/2010. Mas, na atualidade, o que se verifica nos Tribunais são conciliações ou tentativas de conciliação impostas às partes e, pelo menos no que se percebe, diante do patamar de igualdade instituído pela leitura da Seção que trata de ambos os institutos, a mediação tende a caminhar pelo mesmo percurso ou a ser confundida com a conciliação. Para a institucionalização da mediação necessário será: Em primeiro lugar, para que seja instituída a mediação, mister que exista a concordância de ambas as partes na adoção de tal meio de solução de conflitos, pois, como vimos anteriormente, a opção pela mediação é, e tem que ser, sempre voluntária. Imprescindível que as partes estejam optando pela mediação de boa-fé, e que conduzam todo o processo nessa perspectiva. Ademais, importante que as partes escolham conjuntamente um mediador (e se emprenhem verdadeiramente nesse processo de escolha), que seja de sua irrestrita confiança e esteja apto a compreender aquele conflito, suas dimensões e potencialidades. (PINHO, 2011).

Em outras palavras, a mediação não combina com a celeridade quantitativa exigida pelo judiciário brasileiro, uma vez que suas bases se pautam na busca de um consenso qualitativo que só pode ser alcançado com o tempo e com a mudança cultural das partes que preferencialmente esperam ouvir, atender uma 14

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ordem do Estado a tomar uma decisão por si. Sobre tal assunto, Dierle José Coelho Nunes (2011, p. 174) afirma “que existem situações em que os acordos são impostos, mesmo quando sejam inexeqüíveis para permitir a pronta “resolução do caso”, com a adequação à lógica neoliberal de produtividade”, e isso, por óbvio, não é o que se espera da conciliação e muito menos da mediação de conflitos. Nesse caso, como ficará o cadastro do mediador disposto nos § 3º e 4º do artigo 147 do Projeto do novo Código de Processo Civil? O mediador também terá que cumprir meta 2 (dois)? Será dispensado de suas funções se não alcançar sucesso nos casos que mediar? Será punido por demora na execução do procedimento? Muitas outras questões podem ser suscitas como a modificação das disciplinas básicas nos cursos de Direito com intuito a alterar a cultura legalista e litigiosa que predominam nas academias; a condição de que o mediador possa ser outro profissional que não o advogado ou bacharel, uma vez que seu saber jurídico poderia influenciar no consenso autônomo das partes; e, principalmente, a questão da mudança cultural, situação que se apresenta emperrada uma vez que o sistema civil law se distingue do common law, principalmente quando se trata das especificidades da justiça americana, berço de onde o modelo das ADR’s foi retirado.

III. Da confluência dos sistemas civil law e common law e a efetividade da mediação no Brasil Conforme demonstrado no decorrer do trabalho, as formas de resolução alternativa de litígios brasileira não são exatamente um modelo original. Muito de sua aplicabilidade advêm das Alternative Dispute Resolution existentes no modelo jurídico americano pautado no sistema common law. Entretanto, exatamente por isso, torna-se necessária a análise dos sistemas e a cultura social que permeia os povos formadores de cada um deles. Como dito alhures, o sistema jurídico americano tem como base cultural os mesmos princípios formadores do seu povo: liberdade, igualdade, privacidade, laissez-faire; muitos desses conhecidos pelos brasileiros somente após a Constituição de 1988. Nesse sentido, a atuação pré-processual americana é muito forte. Há uma cultura antiprocessualista, entendida como antiestatista, o que favorece a resolução dos litígios antes do trial, ainda no processo da discovery, o que resulta a esse país e a Inglaterra que compartilha do mesmo sistema, com 15

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algumas técnicas diferentes, um ínfimo percentual de causas ajuizadas (TARUFFO, 2003, p. 148). No Brasil, ínfima são as conciliações, sendo preferência cultural da nação o litígio e o assistencialismo judiciário. Contudo, alguns autores defendem uma oxigenação dos sistemas civil law e common law, no sentido de se misturarem naquilo que cada um tem de melhor, causando, inclusive, distinção entre países que adotam o mesmo sistema jurídico. Michelle Taruffo (2003, p. 142) alerta para a análise científica daquele que faz a mensuração e a diferenciação dos sistemas jurídicos. Primeiro no que tange a “neutralidade da pesquisa”, o que dificilmente existirá, afinal, o pesquisador jamais será “passivo, neutro ou indiferente à sua própria cultura”. Outra questão é o “objeto” da comparação que, quando extremamente micro, não se presta para avaliar o objeto. Portanto, as questões básicas que diferem os sistemas civil law e common law não são mais suficientes para distinguir um sistema do outro. Questões como predominância do processo escrito e oralidade, inquisitivo e adversarial, não se prestam mais como características determinantes dos sistemas citados, mesmo porque, a modernidade e a eliminação das fronteiras culturais resultaram na adaptação dos sistemas para atender as demandas mundiais. Em outras palavras, Barbosa Moreira afirma o seguinte: Semelhante divisão, vale ressaltar, não há de ser concebida em termos estáticos. Tem o sabor do óbvio o asserto de que os ordenamentos jurídicos se acham em constante evolução – nos dias que correm, provavelmente, com maior rapidez do que noutros tempos. Ao estudioso não é lícito deixar de tomar em consideração esse dinamismo. Semelhanças e dessemelhanças podem aumentar e diminuir, quiçá desaparecer. Nem é necessária, às vezes, uma expressa reformulação de textos legais. À margem deles, mudanças culturais fazem sentir-se na maneira de compreender e valorar o comportamento humano. A interpretação e aplicação das normas jurídicas não escapa a esse processo evolutivo. É oportuno, para não dizer indispensável, que de vez em quando se retomem as comparações, a fim de verificar se ocorreram modificações capazes de tornar obsoletas posições clássicas, ou se – e em que medida – ainda é possível reputá-las válidas. (2007, p. 41).

Portanto, da mesma forma que o sistema common law ampliou a participação dos juízes nas lides e adotou a idéia de códigos processuais, o sistema civil law adotou o limite recursal e pode muito bem implementar as Alternative Dispute Resolution. Entretanto, a formação cultural da sociedade brasileira não pode passar despercebida. Para que os tipos de resoluções alternativas de litígios implantados no Brasil alcancem sua real efetividade como ocorre no sistema jurídico americano, necessário será repensar o papel do Poder Judiciário no Brasil.

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Conclusão O trabalho se apresenta com o escopo de comparar a formação cultural do povo americano e do brasileiro por meio da construção de suas federações na expectativa de demonstrar que tal formação influi na formação do sistema jurídico de cada local. Uma vez demonstrada a existência da divisão do ocidente em dois sistemas jurídicos: common law e civil law, traça-se uma diferenciação entre ambos, tendo como ponto principal a Alternative Dispute Resolution – ADR. As ADR’s do sistema americano influenciaram no sistema jurídico brasileiro, principalmente após a Emenda Constitucional nº 45 de 2004, quando a celeridade processual e a dignidade da pessoa humana se tornaram princípios mestres do Processo Civil brasileiro. Uma vez comparadas as ADR’S com os meios alternativos de resolução de conflitos adotados pelo sistema jurídico brasileiro, fez-se uma análise sobre a possível regulamentação da mediação no Projeto de Lei n.º 8046/2010, que ainda sem alterações propostas pela Câmara dos Deputados, possivelmente instituirá um novo Código de Processo Civil no Brasil. Dessa forma, é possível concluir que mesmo adotando a mais moderna doutrina que aponta para uma convergência entre os sistemas jurídicos em razão da própria globalização, ainda há de se analisar se o instituto mediação coaduna com o perfil cultural da sociedade e do próprio Estado. Não será deturpando ou institucionalizando o instituto da mediação que se alcançará a meta de desafogar o Judiciário por meio da retomada pelo cidadão da capacidade de resolução dos seus próprios litígios, uma vez que esse é o objetivo fiel do instituto. Caso o objetivo do Estado seja conduzir a sociedade educando-a a resolver seus próprios conflitos, o que não seria uma tarefa fácil, uma vez que se encontra enraizado no brasileiro a cultura do jeitinho, das facilidades, da dependência e do assistencialismo, dever-se-ia impulsionar a mediação privada, configurando a necessidade dessa ou de outro meio de ADR, para a partir daí, alcançar-se o direito de pleitear em juízo. Mas, aparentemente ao contrário, o Estado novamente prefere incluir, inchar a máquina pública ou invés de delegar ao cidadão o direito de tentar solucionar por si os seus próprios conflitos. E não adianta dizer que a jurisdicionalização da mediação não interfere na sua essência extraprocessual, o que poderá ocorrer a qualquer tempo dependente da vontade do cidadão. Tal afirmativa não é real, pois uma vez o mecanismo disposto dentro do Poder Judiciário, quem o requererá fora de lá? 17

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Para o brasileiro o que importa é a ordem do juiz, mesmo que o exercício da jurisdição esteja sendo exercido por um auxiliar, aos olhos da sociedade, obteve-se uma resolução hierárquica. Sendo assim, para que a mediação exerça seu efetivo papel na sociedade brasileira, necessário será não destinar à mediação o mesmo procedimento dado à conciliação. Em outras palavras, a mediação não deve ser empurrada aos litigantes, esta deve ser querida por eles. Deve-se valorizar e implementar a mediação extraprocessual e privada, bem como, alterar a visão institucional do Poder Judiciário que ao invés de retirar, inclui mais atividade à jurisdição. Pelo Projeto do novo Código de Processo Civil, mesmo com a regulamentação endoprocessual dos meios alternativos de resolução de conflitos, o processo continua a empanturrar os tribunais, só que agora em mesas diferentes, as mesas dos mais novos serventuários, os mediadores.

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MEDIAÇÃO OBRIGATÓRIA À LUZ DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS E DA PRÓPRIA MEDIAÇÃO Abel Rafael Soares A mediação obrigatória traz em seu bojo polêmicas pois se refere a determinados princípios constitucionais, em especial, a duração razoável do processo e a inafastabilidade do controle jurisdicional. A mediação não afetará o processo a ponto de ferir a sua celeridade e não afastará o controle judicial, uma vez que não impede o ingresso da ação judicial e não há pretensão de que a mediação substitua o processo judicial. Há autores que entendem que a mediação obrigatória violaria os próprios princípios da mediação, tais como o da voluntariedade, uma vez que sua obrigatoriedade violaria seu caráter voluntário e o da autonomia. A voluntariedade permanece, pois a única obrigatoriedade é destinada ao ente estatal, que tem que a propor, não sendo essencial o comparecimento da parte, assim, o princípio da autonomia permanecerá respeitado.

Considerações iniciais A mediação obrigatória traz em seu bojo polêmicas uma vez que se referem a impressão de irem de encontro com determinados princípios constitucionais, em especial, a duração razoável do processo (art. 5º, LXXVIII) e a inafastabilidade do controle jurisdicional (art. 5o, XXXV). Por este motivo, há divergências de opinião sobre o assunto, inclusive, entre juristas. Além disso, há quem acredire que há violação aos princípios próprios da mediação a autonomia da vontade e a voluntariedade. Então, diante da polêmica se a mediação obrigatória estaria afetando ou não estes princípios, buscaremos esclarecer essa dúvida para o leitor, mostrando que, na realidade, estes princípios não são desrespeitados. Primeiramente, vamos nos ater aos dois princípios constitucionais mais intimamente relacionados à mediação obrigatória, que são os alvos das maiores polêmicas e indagações.

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ABEL RAFAEL SOARES

I. Mediação e princípios constitucionais I.i. Princípio da duração razoável do processo O princípio da duração razoável do processo encontra-se insculpido no artigo 5o, LXXVIII da Constituição Federal vigente, que dispõe: “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.” A insatisfação da sociedade com a demora da prestação jurisdicional é a base do princípio da duração razoável do processo. Como a mediação não estará junto da massa de processos judiciais, a tendência é que, inclusive, um futuro processo seja mais rápido, tendo em vista que outros casos que virariam processos não se tornarão porque foram solucionados pela via da mediação. Então indaga-se: será que a mediação obrigatória viria a prejudicar a duração razoável do processo porque, de certa forma, seria incluir mais um procedimento dentro ou antes do processo? Algumas reflexões devem ser feitas sobre isso, uma vez que, ao mesmo tempo há quem pense que a mediação obrigatória estaria inflando o procedimento judicial, há quem se preocupe com a possibilidade de as mediações passarem a ser feitas em série, de modo automático. PINHO é um autor que ressalta que a preocupação com a duração razoável do processo não deve fazer com que as mediações obrigatórias sejam feitas automáticamente. O citado professor alerta para algo que a prática jurídica tem demonstrado. Nos mutirões, por exemplo, de Juizados Especiais, acontecem audiências em série, uma seguida da outra, na qual o juiz procura ser rápido para dar conta de tantas audiências previstas em pauta. O autor afirma que seria um “erro grave pensar em executar mediações em série, de forma mecanizada, como hoje se faz com as audiências prévias ou de conciliação nos juizados especiais e na Justiça do Trabalho.” (PINHO, 2009, p. 73). PINHO prossegue explicando que a mediação (obrigatória) pode ser prévia ou incidental, porém que a respeito da incidental, é necessário amadurecer a ideia conforme a realidade brasileira para que haja equilíbrio entre princípios do acesso à justiça e a duração razoável do processo. PINHO afirma que “parece ser um verdadeiro despautério cogitar da existência, num mesmo processo, de uma sessão de mediação, uma audiência preliminar e ainda uma audiência de instrução e julgamento na qual, novamente, tenta-se a conciliação.” (PINHO, 2009, p. 77). Uma ideia para não inflar o procedimento seria substituir, por exemplo a audiência preliminar pela mediação.

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A mediação é um procedimento que pode ser feito durante semanas, contando com diversas sessões, podendo participar co-mediadores, assim, não pode a mediação ser feita de modo rápido, desta forma há um considerável risco da mediação obrigatória, caso não realizada por um mediador preparado, inflar o procedimento judicial. E desta forma, a mediação incidental, talvez, não seja viável na realidade judiciária brasileira se não contar com limites. Há quem defenda que a mediação não poderia ser judicial porque desvirtuaria sua natureza consensual e participativa. A judicialização exige processo, e este requer atos solenes, formais, sendo impossível, nesse ambiente, atentar para o sentimento das pessoas envolvidas no conflito. “A justificativa é o receio de que ocorra com a mediação o que ocorreu com os Juizados, para os quais foram trazidos os efeitos e o engessamento do Judiciário, abandonando-se seus princípios orientadores de celeridade e informalidade. (LUCHIARI, 2012, p. 78). A mediação, se contar com determinado limite temporal, não afetará o processo a ponto de ferir a sua celeridade e a duração razoável do processo. Por mais que a mediação não deva ser feita automaticamente, o mediador precisa ter bom senso e não prolongar as sessões além do necessário. CACHAPUZ (2011, p. 39) alerta da necessidade de diligência, que deve-se assegurar-se de que a mediação não se alongue em demasia. De acordo com a autora, deve ser dada ênfase na rapidez e qualidade do serviço sem, entretanto, impor prazo para o seu término, “pois, com isso poderia descaracterizar a mediação ao forçá-la a uma solução.” Desta forma, a mediação obrigatória não estaria afetando a duração razoável do processo. I.ii. Princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional NERY JUNIOR (1998, p. 91) salienta que “podemos verificar que o direito de ação é um direito cívico e abstrato, vale dizer, é um direito subjetivo à sentença desde que preenchidas as condições da ação.” Desde que o Estado reclamou para si o monopólio do uso da força, vedando a autotutela privada, assumiu para si o dever de assegurar uma prestação jurisdicional àquele que a busca. Este princípio está previsto no artigo 5o, XXXV da Constituição Federal de 1988 que assim dispõe: “A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.” TAVARES afirma que: Sendo o direito de ação a possibilidade de exercer todos os meios necessários à obtenção de uma solução jurisdicional definitiva, evidentemente que esse direito não se esgota na mera possibilidade de ingressar em juízo, alcançando, além da provocação ampla, também a possibilidade de desenvolver uma participação

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ABEL RAFAEL SOARES processual ampla, envolvendo a argumentação e a produção probatória, bem como a própria decisão final em si, colocando termo ao litígio da maneira mais adequada possível. Assim, o direito de ação não é apenas a possibilidade de provocar o processo judicial, mas também o direito de acompanhá-lo, com todas as implicações daí decorrentes. (TAVARES, 2008, p. 669).

Assim, a mediação obrigatória tem relação com o princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional, uma vez que este princípio engloba a ampla participação processual das partes. Não se trata apenas de poder ingressar com a ação, este poder não é obstruído com a mediação, e sim de realçar a possibilidade de argumentação e terminar o litígio de forma adequada a atingir a paz social. Há quem acredite que a desvalorização da solução adjudicada de conflitos, através da sentença, pelo Poder Judiciário violaria o princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional, tendo em vista que a mediação pode por termo ao processo através de um acordo. A mediação não afastará o controle judicial, uma vez que não impede o ingresso da ação judicial e não há pretensão de que a mediação substitua o já conhecido processo judicial, sendo apenas mais uma alternativa de solucionar conflitos, daí o ser espécie de um meio alternativo de resolução de conflito, só que é uma forma mais colaborativa e que requer maior participação das partes, uma vez que elas mesmas buscarão uma solução para os seus problemas. A mediação é um complemento à pacificação social. Além disso, MARINONI ressalta que este princípio também é chamado de direito de acesso e como tal, este não se reduz ao mero direito de ir ao juízo, mas também significa que “todos têm direito à adequada tutela jurisdicional ou à tutela jurisdicional efetiva, adequada e tempestiva.” (MARINONI, 1997, p. 20) Com o mesmo modo de pensar, LUCHIARI afirma que a Constituição Federal não assegura um acesso meramente formal à Justiça (mera possibilidade de ingresso em juízo), mas sim um acesso qualificado, que exige efetividade, celeridade e adequação da tutela jurisdicional, que levam em última análise, à pacificação social. (LUCHIARI, 2012, p. 123). A mediação obrigatória, principalmente a incidental, não viola o princípio em tela porque a ação já teria sido ajuizada e no caso de insucesso da mediação, ou seja, não obtenção do acordo final, a ação seguiria seu curso com o juiz competente (FOLLE, 2013). Eis a explicação de TAVARES sobre este princípio: O princípio em questão significa que toda controvérsia sobre direito, incluindo a ameaça de lesão, não pode ser subtraída da apreciação do Poder Judiciário. Sob esse enfoque, o comando constitucional dirige-se diretamente ao legislador, que

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MEDIAÇÃO JUDICIAL E GARANTIAS CONSTITUCIONAIS A MEDIAÇÃO E SEUS DESDOBRAMENTOS NA CONTEMPORANEIDADE não pode pretender, por meio de lei, delimitar o âmbito de atividade do Poder Judiciário, até porque uma ocorrência dessas chocar-se-ia frontalmente com o princípio maior a separação de poderes. Consequência direta do princípio é a nãoaceitação da chamada instância administrativa forçada, ou jurisdição condicionada. (TAVARES, 2008, p. 667).

Com efeito, o princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional é intimamente ligado ao acesso à justiça, que, por sua vez, é materialmente informado pelo princípio da igualdade de oportunidades (MOREIRA, 2004, p. 103), que, de acordo com BOBBIO visa estabelecer “chances ou pontos de partida” para que os indivíduos possam competir em situações que exigem disputa (mercado de trabalho; acesso a determinadas instituições) com as mesmas condições e oportunidades daqueles segmentos que já são legitimados socialmente.” (BOBBIO, 2002, p. 31). A mediação obrigatória, exatamente por dispensar a presença de advogado, dá maior chance de igualdade na hora da resolução do conflito. Na lição de SANTOS, os cidadãos de baixa renda encontram-se afastados dos mecanismos de solução formal de conflitos por três motivos básicos: desinformação jurídica, descrença ou hesitação em acionar os mecanismos de prestação de justiça e dificuldades materiais de acesso. Eis suas palavras: Em primeiro lugar, os cidadãos de menores recursos tendem a conhecer pior os seus direitos e, portanto, a ter mais dificuldades em reconhecer um problema que os afeta como sendo problema jurídico. Em segundo lugar, mesmo reconhecendo o problema como jurídico, como violação de um direito, é necessário que a pessoa se disponha a interpor a ação. Os dados mostram que os indivíduos das classes baixas hesitam muito mais que os outros em recorrer aos tribunais mesmo quando reconhecem estar perante um problema legal. Em terceiro e último lugar, quanto mais baixo é o estrato socioeconômico do cidadão, menos provável é que ele conheça advogado ou que tenha amigos que conheçam advogados, menos provável é que saiba onde, como e quando pode contratar o advogado, e maior é a distância geográfica entre o lugar onde vive e a zona da cidade onde se encontram os escritórios de advocacia e os tribunais. (SANTOS, 1986).

Seguindo o mesmo raciocínio, concorda com o autor acima MOREIRA, para quem a falta de acesso à justiça processual é um problema que atinge grande parte da população, que ainda encontra-se faticamente alijada, dentro de um quadro de desigualdades socioeconômicas, de um direito efetivo de suscitar e obter proteção judicial em caso de conflito (MOREIRA, 2004, p. 50). Explicados os princípios constitucionais que são potencialmente atingidos com a mediação obrigatória, passaremos ao estudo dos princípios da mediação que poderiam vir a ser atingidos com a institucionalização da mediação.

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II. Princípios da mediação A mediação é regida por diversos princípios. O princípio da autonomia da vontade e voluntariedade, se refere devido ao fato da mediação ter caráter voluntário, uma vez que será uma opção dos mediados, que elegem em comum acordo o mediador e se encerra no momento desejado pelas partes. Este princípio é o que mais sofre polêmica em relação à mediação obrigatória. Outros princípios, que aqui não serão abordados, mas que valem ser citados a título de informação são: imparcialidade; independência; credibilidade; competência; confidencialidade; acolhimento das emoções (CAHALI, 2012, pp. 60-1). Esses princípios não são atingidos pela mediação obrigatória, uma vez que estão mais relacionados com a conduta do mediador do que com o procedimento em si. De acordo com SPENGLER, teme-se que mediação e Direito não possam conviver paralelamente, pacificamente, pois possuem valores que interagem desestruturando-se mutuamente. “A mediação não pode ser considerada justiça porque é privada de critérios de igualdade, o que pode ser entendido como falta de garantias de isonomia no tratamento de todos aqueles que a ela recorrem, de certeza e de direitos, uma vez que baseia-se em princípios éticos.” (SPENGLER, 2008, p. 132). II.i. Princípio da voluntariedade e autonomia da vontade Nem todos os juristas concordam que a mediação seja obrigatória e juridificada, pois temem a possibilidade da perda de seu caráter não decisionista e não autoritário de tratamento de conflito. Entretanto, não há a pretensão de cristalizar as suas principais características que lhe permitem conservar a fluidez possibilitadora de adequação a situações diversas (SPENGLER, 2008, p. 129). Além dos princípios constitucionais, existem autores que entendem que a mediação caso venha a ser obrigatória dentro de um processo (mediação incidental), violaria os próprios princípios da mediação, tais como o princípio da voluntariedade, uma vez que a previsão de requisitos formais e sua obrigatoriedade violaria o seu caráter voluntário e até mesmo o princípio da autonomia da autonomia da vontade das partes. Estes princípios possibilitam que as partes realizem suas próprias escolhas no encaminhamento dos seus projetos de vida. (GOULAR, 2013). GOULAR entende que:

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MEDIAÇÃO JUDICIAL E GARANTIAS CONSTITUCIONAIS A MEDIAÇÃO E SEUS DESDOBRAMENTOS NA CONTEMPORANEIDADE No processo, a instauração da mediação incidental obrigatória além de afastar a voluntariedade do instituto, inova em criar uma nova fase processual, o que contraria o princípio da celeridade processual, uma vez que suspenderia o processo para a realização da mediação e, depois de finalizada a mediação, o processo teria seu prosseguimento. Isso veemente se contradiz com a função jurisdicional de promover a justiça de maneira célere. Muito tem se criticado a mediação obrigatória, especialmente os defensores da teoria pura da mediação. Alegam que os princípios como a voluntariedade, autonomia da vontade das partes, confidencialidade são distorcidos com essa modalidade de mediação, bem como os tribunais poderão ter acesso as informações adquiridas por alguns mediadores. (2013).

A voluntariedade das partes permanece, pois a única obrigatoriedade é destinada ao ente estatal, que tem que propor a mediação. A determinação para comparecimento à sessão é que seria obrigatória neste tipo de mediação, e essa obrigatoriedade se dirige ao agente estatal, não sendo essencial o comparecimento da parte, assim, o princípio da autonomia permanecerá respeitado. Inclusive, de acordo com SPENGLER, a mediação obrigatória (ou facultativa) auzilia as partes conflitantes a tratarem seus problemas com autonomia, reduzindo a dependência de um terceiro (juiz), possibilitando o consenso (SPENGLER, 2008, p. 121). Segundo WARAT, autonomia significa a “possibilidade de escapar do mundo das palavras e dos mitos que nos exilam do real. A vontade persistente de toda República é a de manter os cidadãos felizes como dependentes incuráveis das palavras e dos mitos.” (WARAT, 2004, p. 15). A decisão autônoma é democrática, “tomada como espaço consensuado, mediado, que, ao respeitar as diferenças, produz respostas aos conflitos. Assim, torna-se um trabalho de reconstrução simbólica dos processos conflitivos.” (SPENGLER, 2012, p. 121). Os mecanismos de resolução dos conflitos através da atividade jurisdicional deverá ser exceção, criando a cultura de prioridade a outros mecanismos de resolução de conflitos, como forma ainda de desafogar o Poder Judiciário. LUCHIARI demonstra preocupação com o fato de que há quem entenda que a mediação obrigatória possa comprometer a autonomia. O autor afirma que é preocupante o fato de não só sustentarem que a judicialização dos meios alternativos de solução de conflitos viola o princípio da autonomia da vontade, mas querem alijar o Poder Judiciário do movimento de divulgação e implantação desses meios no Brasil, pois com isso o cidadão desacreditar, cada vez mais, na Justiça, bem como não se atingindo a propalada pacificação social. poderá facilmente ser submetido a oportunistas para “resolver seus conflitos”, passando a desacreditar, cada vez mais, na Justiça, bem como não se atingindo a propalada pacificação social. (LUCHIARI, 2012, p. 79).

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A respeito da autonomia, GOULAR afirma que a “resolução dos conflitos através da atividade jurisdicional deverá ser exceção, criando a cultura de prioridade a outros mecanismos de resolução de conflitos, como forma ainda de desafogar o Poder Judiciário.” (GOULAR, 2013). LUCHIARI complementa, explicando que paralelamente à utilização dos meios alternativos de solução de conflitos no Judiciário, é importante a difusão desses meios em outras áreas, tais como educação, saúde, desenvolvimento urbano, dentre outros. Assim, facilitará a mudança de mentalidade, não apenas dos operadores do Direito, mas da própria comunidade. (LUCHIARI, 2012, p. 79). Segundo NETO, a partir do afastamento progressivo dos formalismos e da mudança de mentalidade, inclusive dos julgadores, será possível imaginar-se uma garantia de acesso irrestrito e pacificação rápida, por parte da Justiça, na busca de uma ordem jurídica justa, onde as partes tenham tratamento igualitário perante o processo. (LAGRASTA NETO, 2011, p. 104). De acordo com ALMEIDA, Pautadas na autonomia da vontade, que tem um amplo espectro na Mediação, as pessoas em desacordo elegem, ou não, o instituto; decidem, a cada momento, sobre a sua permanência no processo; negociam a operacionalização – entrevistas conjuntas ou privadas, intervalo e duração das reuniões, extensão do sigilo para os mediandos, forma e percentual do pagamento devido a cada um; escolhem as alternativas de solução e as avaliam em relação a custos e benefícios para os envolvidos direta e indiretamente; definem a solução para cada proposição; optam pela maior ou menor formalidade do encaminhamento a ser dado ao acordo, quando o tema não exigir homologação judicial. (ALMEIDA, 2013).

Na realidade, quando está incluída no texto legislativo, estabelece a obrigatoriedade de ir, mas não de fazer, uma vez que ninguém, regido pelo livre-arbítrio, é obrigado a negociar. ALMEIDA nos conta que há teóricos que consideram interessante a obrigatoriedade, somente, da pré-mediação, com a intenção de provocar conhecimento e conseqüente difusão (ALMEIDA, 2013). No Canadá existe um serviço de pré-mediação obrigatória para resolução de casos relacionados ao Direito de Família, que antecede o julgamento dos conflitos no sistema judicial. Neste sistema, antes das partes ingressarem com a ação judicial, as partes devem comparecer a uma entrevista que varia de quinze a vinte minutos, na qual são informadas sobre a mediação, seu procedimento e obrigações do mediador e dos mediados e após certo prazo, devem optar pela tentativa de mediação ou pelo julgamento da causa. (LUCHIARI, 2012, p. 80).

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Conclusão Podemos concluir que a mediação obrigatória está em consonância com os princípios constitucionais vigentes e, inclusive, com os princípios da própria mediação. Nossa Constituição Federal, logo em seu preâmbulo, retrata uma sociedade que se fundamenta na harmonia social e que está comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias e a mediação é uma forma desse tipo de solução. A mediação obrigatória, dependendo da forma como for implantada, não trará nenhum prejuízo ao princípio da duração razoável do processo, contudo, a mediação em sua característica peculiar de não haver pressa, podendo (devido a vontade das partes), durar até meses e neste caso sim o procedimento ficaria inflado. Contudo, ressalta-se que seria uma decisão das partes. Se o procedimento ficasse longo, a culpa seria das próprias partes que não reconhecem que a mediação está sendo infrutífera. Neste caso não cabe, nem mesmo, ao mediador finalizar o procedimento. A mediação obrigatória não afeta ao princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional porque não será pré-requisito para o ingresso da ação. Além disso, este princípio também se refere ao acesso à justiça com o máximo de igualdade possível e a ampla participação das partes durante os procedimentos e a mediação é uma forma de efetivar isso, ainda mais porque dispensa a presença de advogado, tornando equivalentes, por exemplo, uma simples pessoa e um empresário experiente. A mediação obrigatória também não viola princípios da própria mediação como voluntariedade e autonomia da vontade porque a obrigação é do ente estatal. Este sim tem, obrigatoriamente, que oferecer às partes a chance de submeter o conflito a mediação, contudo, as partes podem se recusar à tal, logo a autonomia da vontade também é respeitada. Logo, a mediação obrigatória é um instituto que se encaixa perfeitamente aos ditames do Estado Democrático de Direito e com os princípios constitucionais e de mediação.

Bibliografia ALMEIDA, Tania. Mediação de conflitos: um meio de prevenção de controvérsias em sintonia com a atualidade. Disponível em: Acesso em 18 de junho de 2013. BOBBIO, Norberto. Igualdade e liberdade. Rio de Janeiro: Ediouro, 2002. CAHALI. Francisco José. Curso de arbitragem: mediação, conciliação, Resolução CNJ 125/2010, 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012.

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ABEL RAFAEL SOARES CACHAPUZ, Rozane da Rosa. Mediação nos conflitos e direito de família, 4ª ed. Curitiba: Juruá, 2011. FOLLE, Francis Perondi. Reflexões acerca da mediação prévia obrigatória no processo civil. Disponível em: . Acesso em 14 de junho de 2013. GOULAR, Leandro Henrique Simões; SANTOS, Douglerson. A obrigatoriedade da mediação incidental à luz da reforma do Código de Processo Civil. Disponível em: . Acesso em 15 de junho de 2013. LAGRASTA NETO, Caetano. A conciliação judicial – avanços, retrocessos e esperança. In: RICHA, Mogana de Almeida; PELUSO, Antônio Cézar (coord). Conciliação e mediação: estruturação da política judiciária nacional. Rio de Janeiro: Forense, 2011. LUCHIARI, Valéria Ferioli Larasta. Mediação judicial: análise da realidade brasileira – origem e evolução até a Resolução nº 125, do Conselho Nacional de Justiça. Rio de Janeiro: Forense, 2012. MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela antecipatória. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. MOREIRA, Helena Delgado Ramos Fialho. Poder Judiciário no Brasil: Crise de eficiência. Curitiba: Juruá, 2004. NERY JUNIOR, Nelson Nery. Princípios de processo civil na Constituição Federal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998. PINHO, Humberto Dalla Bernardina de. Uma leitura processual dos direitos humanos. O direito fundamental à tutela adequada e à opção pela mediação como via legítima para a resolução de conflitos. In: KLEVENHUSEN, Renata Braga. Temas sobre Direitos Humanos em homenagem ao Professor Vicente de Paulo Barreto. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2009. SANTOS, Boaventura de Sousa. Introdução a sociologia da administração da justiça. Revista de ciências sociais. Nº 21, novembro de 1986. SPENGLER, Fabiana Marion. A mediação como alternativa à jurisdição no tratamento de conflitos. Revista da AJuris. Ano XXXV, nº 109, março de 2008. TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. 6a ed. São Paulo: Saraiva, 2008. WARAT, Luis Roberto. Surfando na pororoca: o ofício do mediador. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2004.

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A MEDIAÇÃO COMO CAMINHO PARA A EFETIVIDADE DA GARANTIA DA RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO NA ESFERA PRIVADA INTERNACIONAL Ana Carolina Machado Ratkiewicz Joseane Ceolin Mariani de Andrade Pedroso Atualmente, o Poder Judiciário vem enfrentando uma crise, que compromete a efetividade das demandas jurídicas, fazendo-se necessário que se encontrem caminhos para superá-la. Isso se mostra ainda mais premente em casos de conflitos com vínculos estrangeiros, devido à morosidade que costuma caracterizá-los. Assim, é que, permeado pela análise do Direito Fraterno, e através do método dedutivo, este trabalho propõe-se a verificar pertinência do recurso à mediação em prol da solução de tais impasses. Conclui-se pela viabilidade da mediação como método alternativo à via judicial para o tratamento de conflitos ligados a jurisdições de distintos Estados, permitindo que estes resolvam-se de forma consideravelmente rápida e eficaz, indo ao encontro da garantia constitucional da razoável duração do processo.

Considerações Iniciais No atual contexto de mundo globalizado, é natural que surjam litígios que apresentam elementos estrangeiros, exigindo a cooperação de jurisdições de distintos países para solucioná-los Em razão das especificidades que possuem, tais demandas costumam apresentar um tempo de duração consideravelmente longo, o que, sem dúvida, compromete a efetividade dos direitos que se destinam a concretizar. Diante disso, faz-se necessário que se encontrem caminhos para superar os obstáculos que impedem a pronta e efetiva atuação jurisdicional, o que suscita o recurso à mediação como alternativa para o alcance do propósito comentado. Tendo isso em conta, o presente trabalho tem por objetivo analisar a viabilidade de que se recorra à mediação para promover a efetividade dos conflitos que apresentam vínculos internacionais, ressaltando-se os pontos controvertidos que envolvem o assunto. O método de abordagem a que aqui se recorre é o dedutivo, porque se parte de premissas e idéias gerais para chegar-se a um resultado específico. Realmente, é com base no estudo da mediação, vista de uma maneira geral, que

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se chegará à conclusão pela sua (in)viabilidade em um aspecto particular, qual seja, a mediação aplicada aos conflitos dotados de aspectos estrangeiros. Para que se atinja a finalidade proposta, a abordagem do tema está dividida em dois tópicos: primeiramente, discorre-se sobre a crise jurisdicional contemporânea, refletindo-se acerca dos desafios que se impõem para superá-la, em prol da adequada realização de direitos nas demandas em que se fazem presentes vínculos estrangeiros. Em um segundo momento, centra-se o estudo, especificamente, na mediação como mecanismo de solução de conflitos, destacando-se suas principais características e particularidades, de modo a enfatizar as vantagens de sua utilização, em especial nos conflitos transfronteiriços. Outrossim, é necessário assinalar que o trabalho permeia-se pela análise do Direito Fraterno, o qual deve ser visto como uma nova estratégia de tratamento de conflitos, posto que surge em prol da recomposição de uma sociabilidade baseada em um Direito compartilhado e convencionado, propondo a idéia de jurisdição mínima e de consenso. É relevante referir que esta pesquisa não possui a pretensão de esgotar o tema, mas propiciar reflexões acerca dos principais pontos que o envolvem, vindo-se a pensar sobre caminhos que objetivam superar as crises e dilemas aqui elencados. Assim é que, consideradas as premissas expostas, passa-se, a seguir, ao desenvolvimento do artigo.

I. A razoável duração das demandas juridicas frente à crise do estado nos tempos de globalização A razoável duração das demandas jurídicas pode considerar-se um pressuposto fundamental da garantia do acesso à Justiça, pois somente é possível cogitar acerca da efetividade da prestação jurisdicional caso os litígios tenham um tempo de tramitação adequado. Nessa perspectiva, o princípio do acesso à Justiça deve ser interpretado no sentido de que não se imponham obstáculos a quem tem/teve seu direito lesado, ou que esteja sob a ameaça de vir a tê-lo. Isso se consubstancia na previsão do artigo 5º, XXXV da Constituição Federal Brasileira de 1988, ao prever que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito” (BRASIL, 1988). O direito de acesso ao Poder Judiciário, portanto, deve ser efetivo e material, o que significa dizer que a resposta apresentada pelo Estado precisa dirimir o conflito existente ou legitimar a situação ofertada tempestivamente. Nesse contexto, a emenda Constitucional nº 45/2004 inseriu, no artigo 5º da 31

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Carta Magna, o inciso LXXVIII, o qual estabelece que “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”. (BRASIL, 1988). Não obstante, a garantia do prazo razoável está consagrada em tratados internacionais, caso da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, denominada de “Pacto de San José” que a prevê no artigo 8.º mediante a seguinte redação: Toda pessoa tem o direito a ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido com antecedência pela lei, na sustentação de qualquer acusação penal formulada contra ela ou para a determinação de seus direitos e obrigações de ordem civil, laboral, fiscal, ou de qualquer outro caráter. (CONVENÇÃO AMERICANA SOBRE DIREITOS HUMANOS, de 1969)1

Há que se advertir, porém, que o acesso à ordem jurídica em um prazo razoável depende das transformações nos instrumentos que possibilitam a realização das garantias asseguradas aos cidadãos, sendo que o aprimoramento das técnicas processuais e a modernização do sistema jurídico são fatores determinantes na duração dos litígios. De fato, a tempestividade da prestação jurisdicional é pressuposto do acesso efetivo, e não apenas formal, à Justiça, já que a delonga dos feitos pode comprometer sobremaneira a efetividade dos direitos pleiteados. Segundo Cappelletti (1998, p. 13), o acesso justo e efetivo à ordem jurídica seria, necessariamente, o centro da moderna processualística, o que pressupõe que se alarguem e aprofundem os seus objetivos e métodos. Em relação à Ciência Jurídica, Menezes Direito pondera que o maior esforço que a ciência do direito pode oferecer para assegurar os direitos humanos é voltar-se, precipuamente, para a construção de meios necessários à sua realização nos Estados e, ainda, para o fortalecimento dos modos necessários de acesso à Justiça com vistas ao melhoramento e celeridade da prestação jurisdicional. (1998, p. 142).

Neste viés, faz-se necessário oferecer ao processo mecanismos que permitam o cumprimento de sua missão institucional, evitando que ele represente um instrumento de violação de direitos. Assim, cabe ao ordenamento jurídico atender, de maneira completa, clara e eficiente, ao pedido daquele que exerce seu direito à jurisdição, garantindo-se-lhe a mais ampla defesa.

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O artigo comentado está disponível em: Acesso em: jun., 2013.

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Entretanto, verifica-se que o Poder Judiciário vem enfrentando crises e desafios, em razão da complexidade das relações sociais e dos conflitos que daí se originam (GHISLENI; SPENGLER, 2011, p.10). A solução das lides, em que a aplicação das leis positivadas ocorre através do juiz, não compreende, via de regra, uma ação democrática que vise à transformação social necessária entre as partes litigantes. Logo, os conflitos submetidos ao Poder Judiciário possuem mecanismos complexos e que dependem não apenas da aplicação das leis, mas, sim, de outros fatores que não estão regulamentados. (RESTA, 2005, p.74-75) Como resultado, o sistema jurisdicional vê-se diante de uma conflituosidade crescente, podendo-se denominá-la de “explosão de litigiosidade,” o que implica, como o próprio nome sugere, um aumento significativo de demandas; mas, por outro lado, um escasso aprofundamento em prol de sua resolução. Constata-se que tal “explosão” dá-se tanto quanto à qualidade como à quantidade das lides levadas ao Poder Judiciário (WARAT, 2001, p. 58). Não restam dúvidas de que isso provoca o enfraquecimento do Estado, verificando-se a significativa transformação no exercício de sua soberania, diante da quase total perda na exclusividade de dizer e aplicar o direito. Sobre a questão, são muito interessantes e esclarecedoras as palavras de Faria, que ressalta a influência que tal contexto provoca em matéria temporal, visto que se assiste a um descompasso entre o tempo processual e o tempo da economia globalizada, como se vê na seguinte passagem: Em se tratando de termos organizacionais, o Poder Judiciário e o MP foram estruturados para operar sob a égide dos códigos e leis processuais cujos prazos e ritos são incompatíveis com a multiplicidade de lógicas, valores, procedimentos decisórios e horizontes temporais prevalentes na economia globalizada. [....] O tempo do processo judicial é o tempo diferido, encarado como sinônimo de segurança e concebido como uma relação de ordem e autoridade, representada pela possibilidade de esgotamento de todos os recursos e procedimentos numa ação judicial. [....] O tempo da economia globalizada é o tempo real, o tempo da simultaneidade. (2004, p. 115).

Contribuindo para a análise do tema, Morais e Spengler apontam outros motivos para a crise jurisdicional, conforme se observa no trecho abaixo: [...] as crises por que passa o modo estatal de dizer o direito - jurisdição - refletem não apenas questões de natureza estrutural, fruto da escassez de recursos, como inadaptações de caráter tecnológico - aspectos relacionados às deficiências formativas dos operadores jurídicos - que inviabilizam o trato de um número cada vez maior de demandas, por um lado, e de uma complexidade cada vez mais aguda de temas que precisam ser enfrentados, bem como pela multiplicação de sujeitos envolvidos nos pólos das relações jurídicas, por outro. (2008, p.78)

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Em concreto, referida conjuntura decorre da crise por que vem passando o Estado na atualidade, especialmente em função do fenômeno da globalização, que impõe novos desafios aos países.2 Entre eles, destaca-se o fato de o Poder Judiciário deparar-se com demandas que apresentam elementos estrangeiros, o que é resultado direto da maior circulação de bens, serviços, capitais e pessoas por distintos Estados, transcendendo os limites das fronteiras nacionais. Araújo (2011, p.293) descreve tal situação, ressaltando a importância de que os países atendam às solicitações oriundas de jurisdições estrangeiras. Como é natural, daí originam-se conflitos das mais diversas naturezas, decorrentes do crescente contato entre entes privados, o que é típico do mundo contemporâneo. Nessa esfera, destaca-se a importância do Processo Civil Internacional, ramo que se insere no âmbito do Direito Internacional Privado, tendo por finalidade tutelar os mais variados interesses que surgem a partir da intensificação de tais relações. Esclarecendo sua relevância e função, Virgós Soriano e Garcimartín Alferez (2007, p. 38) ensinam que […] el cometido específico del DPCI en la actualidad sería asegurar la tutela judicial efectiva de los derechos e intereses legítimos que se derivan de esas relaciones; esto es, debe encargarse de garantizar una realización transfronteriza adecuada de los derechos subjetivos inter privatos en un mundo caracterizado por el fraccionamiento jurisdiccional.3

Todavia, embora o ramo jurídico citado tenha por objeto a solução de demandas dotadas de vínculos internacionais, a sua natureza é nacional, de modo que cada Estado possui suas regras próprias relativas à matéria. Com efeito, o Direito Processual Internacional é, em essência, predominantemente territorial, pois, como novamente assinalam Virgós Soriano e Garcimartín Alférez, “[...] cada Estado sólo puede ejercer sus atributos de soberanía dentro de su territorio o en los espacios libres de la soberanía de otro Estado.”4 (2007, p. 61). Nesse prisma, os problemas e desafios que cada Estado enfrenta em sua esfera interna refletem diretamente na resolução dos conflitos que trazem elementos estrangeiros, posto que, na verdade, estes serão solucionados pela 2

Entre os vários conceitos que se atribuem à globalização, aqui se pode entendê-lo como “[...] a construção de uma ordem mundial cuja filosofia e estrutura prescindem, transcendem e se contrapõem ao Estado.” (SEITENFUS; VENTURA, 2001, p.181) 3 Em tradução livre: “[…] o cometido específico do DPCI na atualidade seria assegurar a tutela judicial efetiva dos direitos e interesses legítimos que se derivam dessas relações; isto é, deve encarregar-se de garantir uma realização transfronteiriça adequada aos direitos subjetivos inter privatos em um mundo caracterizado pelo fracionamento jurisdicional.” Aclara-se que, quando os autores citam “DPCI,” referem-se ao “Direito Processual Civil Internacional.” 4 Em tradução livre: “[...] cada Estado só pode exercer seus atributos de soberania dentro de seu território ou nos espaços livres da soberania de outro Estado.”

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jurisdição de um dos países envolvidos no litígio. Assim, como resposta à atual situação de crise que enfrentam os Estados, despontam os denominados “métodos alternativos de resolução de conflitos” - conhecidos como “alternative dispute resolutions” (ADR)5 que se caracterizam por promover um modelo de cultura de paz, que deve ser vislumbrado como uma forma de solucionar a crise jurisdicional aludida. Na perspectiva nacional, observa-se que o Brasil carece de costume para a prática de soluções negociadas de conflitos, ocasionando visões equivocadas quanto aos institutos da mediação, conciliação e da arbitragem (BRAGA NETO apud WEINGÄRTNER, 2009, p.13). É imprescindível, contudo, que se superem tais impasses, fazendo-se imperiosa a busca por novas e eficazes alternativas, a fim de que se evite o total colapso do sistema judiciário. Entre os meios de solução de conflitos que contribuem para que se atinja referida finalidade, adquire especial relevância a mediação, tema que será abordado no próximo item. Em tal oportunidade, discorrer-se-á sobre as possíveis vantagens que sua utilização acarreta na solução dos litígios, tanto dos nacionais como daqueles que apresentam vínculos com jurisdições estrangeiras. De fato, é preciso que se pense acerca de métodos que favoreçam o tratamento adequado das demandas com caráter internacional, tendo em vista a morosidade que costuma caracterizá-las. Isso ocorre porque a sua solução requer a cooperação entre os diferentes Estados a que se ligam os litigantes, o que, evidentemente, causa maior demora da resposta jurisdicional exigida. Assim, para que se cumpra a garantia constitucional do prazo razoável na tramitação de demandas jurídicas, é imprescindível que se desenvolvam meios céleres de solução de litígios, que assegurem a sua efetividade nos tempos de globalização. É o que se desenvolverá a seguir.

II. A mediação como estratégia distinta à jurisdição nos casos de conflitos com vínculos internacionais Inicialmente, é fundamental que se analisem os principais contornos da mediação, para que, na seqüência, reflita-se sobre os seus possíveis benefícios em relação à tutela jurisdicional clássica. Nesse viés, a mediação pode ser 5

Esta é a terminologia que adota o “Livro Verde sobre Resolução dos Litígios em Matéria Civil e Comercial,” desenvolvido na esfera da Comissão das Comunidades Européias, em 2002, que se abordará com mais detalhes na seqüência. Disponível em: Acesso em: jun., 2013.

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considerada um procedimento para a resolução de controvérsias que se enquadra como um dos métodos alternativos à tradicional litigância perante o Poder Judiciário. Quanto ao assunto, Morais e Spengler lecionam: A mediação, assim como as demais formas de tratar os conflitos, não constitui um fenômeno novo, na verdade sempre existiu e passa a ser redescoberta em meio a uma crise profunda dos sistemas jurídicos de regulação dos litígios - no cenário brasileiro, por exemplo, assiste-se não só a uma crise estrutural (instalações), funcional (pessoal), substancial (métodos) do Poder Judiciário, como a uma crise generalizada nas instituições (crise na educação, saúde, previdência social, economia). (2008, p. 134).

Diante desse cenário, a mediação é compreendida como uma estratégia distinta à jurisdição, mostrando-se um meio idôneo para o tratamento de conflitos. Segundo Warat (1998, p.5), “a mediação é uma forma ecológica de resolução dos conflitos sociais e jurídicos; uma forma na qual o intuito de satisfação do desejo substitui a aplicação coercitiva e terceirizada de uma sanção legal.” Trata-se, pois, de uma alternativa em que uma terceira pessoa - o mediador auxilia e acompanha os litigantes na resolução do conflito aparente. Destarte, o mediador possui a principal tarefa de propiciar o acordo entre as partes, que deve ser mutuamente aceito e estruturado, vindo a manter a laço fraterno entre as pessoas envolvidas. (HAYNES; MARODIN, 1996, p.11). Em tal contexto, a fraternidade apresenta-se como uma nova possibilidade para a solução dos conflitos, desvinculando-se das decisões impostas pelo Estado, à medida que, grosso modo, este não mais consegue tratá-los apropriadamente em razão das crises que enfrenta. Por conseguinte, a relação entre mediação e fraternidade pressupõe uma convivência baseada na cidadania, nos direitos humanos, na jurisdição mínima, no consenso, no direito compartilhado e na mediação. Trata-se, em suma, de um modelo democrático, ausente de violência, assentando-se no bem comum (GHISLEINI; SPENGLER, 2011, p.10). Relacionado ao ideal de fraternidade, desponta, nessa conjuntura, o Direito Fraterno, que surgiu durante a Revolução Francesa, de 1848, vindo acompanhado dos valores da liberdade e da igualdade (MAIA, 2010, p.16). Segundo palavras de Resta (2004, p.15), pode-se entender o Direito Fraterno como aquele que transcende os limites da cidadania, respeitando os direitos humanos, de maneira que se “[...] recoloca em jogo um modelo de regra da comunidade política: modelo não vencedor, mas possível”.6Logo, fundamenta6

Referente ao assunto, torna-se útil a leitura de DERRIDA, Jacques. Políticas da amizade. Tradução de Fernanda Bernardo. Porto: Campo das Letras, 2003.

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se o Direito Fraterno como fomentador de políticas públicas gestoras da mediação de conflitos, a qual, por sua vez, consubstancia-se como um método de tratamento dos mesmos. A mediação é, geralmente, uma maneira de construção e gestão da vida social, que se processa com a interferência de um terceiro neutro, que, de forma não autoritária, ajuda as partes envolvidas a resolver o conflito, proporcionado o (re)estabelecimento da comunicação entre elas. Elucidado tais aspectos, Bacellar assevera que a mediação pode ser definida como técnica ‘lato senso’ que se destina a aproximar pessoas interessadas na resolução de um conflito e induzi-las a encontrar, por meio de uma conversa, soluções criativas, com ganhos mútuos e que preservem o relacionamento entre elas. (2004, pp. 173/174).

Nesses termos, o mediador propicia meios para que as partes construam, por si mesmas, suas respostas ao conflito. Em outras palavras, o profissional auxilia os envolvidos a buscar compreender melhor os principais pontos do problema e, a partir disso, tratar o conflito de forma satisfatória para ambos. (MORAIS; SPENGLER, 2008, p.134). Constata-se que são diversos os conflitos que podem ser objeto de mediação7, o que justifica a sua crescente relevância como modo de solucionálos. Com efeito, a mediação é uma alternativa viável à resolução de [...] problemas relativos às questões do quotidiano, tais como discordâncias entre membros de instituições de ensino e lazer, discussões familiares e entre vizinhos e conflitos sobre o meio ambiente têm sido as principais matérias levadas á discussão através da mediação, muito embora seja permitido discutir em tal processo praticamente qualquer conflito que venha a interessar às partes sua discussão desta forma. (MORAIS; SPENGLER 2008, p.162)

No que diz respeito às questões familiares, assume particular relevância a mediação familiar internacional, a que se pode recorrer como meio de tratar as crises matrimoniais. Tal possibilidade ganha destaque na União Européia, em que se elaborou a Recomendação n.º R (98) 1 do Comitê de Ministros do Conselho da Europa aos Estados Membros sobre a Mediação Familiar, a qual se aplica a conflitos que apresentam elementos internacionais.8 7

Sobre a possibilidade de utilizar a mediação no tratamento dos mais variados conflitos sociais é importante a leitura de SIX, Jean François. Dinâmica da mediação. Tradução de Giselle Groeninga de Almeida, Águida Arruda Barbosa e Eliana Riberti Nazareth. Belo Horizonte: Del Rey: 2001. 8 Disponível em Acesso em: jun, 2013.

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Segundo observam José Fernández Rozas e Sánchez Lorenzo (2007, p.380381), “[...] la mediación familiar resulta, además, particularmente indicada en supuestos transfronterizos, tanto por los factores de multicultualidad implicados como por los límites que suscita la eficacia internacional de las respuestas judiciales.”9 Na verdade, deve-se reconhecer que é na União Européia que a matéria relativa à mediação como alternativa à solução de conflitos referentes às relações privadas internacionais encontra-se mais desenvolvida. De fato, naquela esfera, há “Livro Verde sobre Resolução dos Litígios em Matéria Civil e Comercial,” elaborado no marco da Comissão das Comunidades Européias, em 2002, que é um importante documento sobre o assunto.10 Entre as matérias de natureza civil e comercial reguladas por tal diploma legal, incluem-se as relações de trabalho e de consumo, o que comprova o amplo leque de supostos em que é possível utilizar a mediação. Igualmente, há que se mencionar o quão significativa é a referida opção para garantir uma solução mais rápida dos conflitos, o que vai ao encontro da garantia da razoável tramitação das demandas jurídicas. Tal vantagem, aliada aos baixos custos oriundos dessa alternativa, pode-se conferir no trecho abaixo, que integra o “Livro Verde” apontado: Os litígios transfronteiras, ainda mais do que os litígios nacionais, são caracterizados pela morosidade e pelos custos processuais. Com a realização do mercado interno, a intensificação dos intercâmbios, a mobilidade dos cidadãos e os litígios entre nacionais de diferentes Estados-Membros, entre pessoas residentes em Estados-Membros diferentes, acentuados nomeadamente pelo crescimento do comércio eletrônico transfronteiras, independentemente da importância ou do valor do litígio, têm tendência a aumentar e eles os processos transfronteiras introduzidos perante os tribunais. Aos problemas práticos de excesso de carga dos tribunais, há a acrescentar questões muitas vezes complexas de conflitos de leis e de jurisdições, bem como dificuldades práticas de ordem linguística e financeira.

Nessa linha, vislumbra-se o fato de que a mediação surge não como um método substitutivo ao processo jurisdicional, mas como um meio auxiliar, complementando o modelo tradicional, uma vez que, em muitos casos, este último não é capaz de, satisfatoriamente, desenvolver soluções efetivas e justas aos conflitos que lhe são submetidos. De qualquer modo, embora a mediação não vise propriamente substituir a função jurisdicional, cumpre anotar o que observa Vezzulla (1995, p.67-68), 9

Em tradução livre: “[...] a mediação familiar resulta, ademais, particularmente indicada em supostos transfronteriços, tanto pelos fatores de multicultualidade implicados como pelos limites que suscita a eficácia internacional das respostas judiciais.” 10 Disponível em: Acesso em: jun, 2013.

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que chama a atenção para o maior protagonismo que a mesma vem assumindo em países que a adotam há bastante tempo. O autor noticia que uma porcentagem superior a setenta por cento dos casos, que antes eram decididos pelo Poder Judiciário, passaram a ser resolvidos através do recurso à mediação. O êxito da mediação na resolução de conflitos é inquestionável, pois tal método busca superar a segurança, da previsibilidade e da certeza jurídica típicas do normativismo jurídico, viabilizando o cumprimento dos objetivos atinentes à autonomia, à cidadania, à democracia e aos direitos humanos. Estáse diante, portanto, de uma proposta diferenciada, com a adequação de novas abordagens linguístico-temporais em relação à jurisdição tradicional. (MORAIS; SPENGLER, 2008, p.158-159). Nesse aspecto, o principal objetivo da mediação é o restabelecimento da comunicação entre os sujeitos, além da prevenção e do tratamento dos conflitos. Ela configura-se, por conseguinte, em um meio de transformação e evolução da sociedade, vindo a garantir-lhe a paz,11como se pode perceber mediante a leitura da passagem abaixo, retirada do “Livro Verde,” já comentado: É conveniente, em especial, salientar o papel dos ADR como instrumentos ao serviço da paz social. Na verdade, nas formas de ADR em que os terceiros não tomam qualquer decisão, as partes deixam de se confrontar, enveredando, pelo contrário, num processo de aproximação, escolhendo elas próprias o método de resolução do diferendo e desempenhando um papel mais activo (sic) neste processo sendo elas próprias a tentarem descobrir a solução que melhor lhes convém. Uma vez resolvido o litígio, esta abordagem consensual aumenta as hipóteses de as partes poderem manter as suas relações de natureza comercial ou outra.

Assim é que, face à mencionada crise jurisdicional, que, conforme sabido, encontra em uma de suas principais causas a morosidade na solução das demandas, é imprescindível que se recorram aos meios alternativos ou complementares ao processo judicial, por apresentarem maiores chances de solucionar os conflitos de maneira mais célere e, portanto, efetiva.12 Contudo, 11

Em relação à questão, é oportuna a leitura de SALES, Lília Maia de Morais. Justiça e Mediação de conflitos. Belo Horizonte: Del Rey, 2004; SALES, Lília Maia de Morais. Mediação de Conflitos: família, escola e comunidade. Florianópolis: Conceito Editorial, 2007; e SALES, Lília Maia de Morais. Mediare: um guia prático para mediadores. 2.ª ed. Fortaleza: Gráfica da Universidade de Fortaleza, 2005. 12 De fato, conforme o texto do citado “Livro Verde,” “os ADR inserem-se plenamente no contexto das políticas sobre o melhoramento do acesso à justiça. Os ADR desempenham, de fato, um papel complementar em relação aos procedimentos jurisdicionais, na medida em que os métodos aplicados nos ADR são muitas vezes mais adaptados à natureza dos litígios. Os ADR podem assim permitir às partes encetarem um diálogo, que sem isto teria sido impossível, e avaliarem elas próprias a oportunidade de recorrerem aos tribunais.” Disponível em: Acesso em: jun., 2013.

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ainda há muito receio quanto à utilização de tais meios alternativos, incluindose a mediação. Realmente, há juristas que criticam o instrumento mediativo, alegando motivos como o fato de que é a mediação relativamente nova na tarefa de resolução de conflitos, além de figurar como uma técnica não disciplinada legalmente por alguns países. Não obstante, a mediação processa-se na perspectiva de uma verdade consensual, a qual se opõe à chamada “verdade processual” (MOORE, 1998, p.32-34). Na prática, o temor fundamenta-se em que a rápida aceitação da mediação como técnica não corresponda às expectativas teóricas, tanto que, atualmente, as maiores dificuldades e resistências quanto a sua utilidade não são de natureza essencialmente técnica, mas ideológica (EDWARDS, 1986, p. 668-684, passim). Desta feita, entende-se que o risco da introdução da mediação no sistema jurisdicional é minimizá-la à condição de mero serviço de um sistema judiciário em crise, desconsiderando seu papel na promoção da paz social. (COSI; FODDAI, 2003, p.68-69) Ponderando sobre algumas das vantagens e desvantagens da mediação na solução de conflitos, pode-se dizer que “a vantagem fundamental é a nãosubmissão a uma lex previa, o que permitirá um grau maior de atenção ao caso concreto, favorecendo a identificação de uma pluralidade de caminhos condizentes com as características de cada conflito” (SPENGLER; SPENGLER NETO, 2012, p.35-36). A desvantagem, porém, advém da falta de previsibilidade no processo que conduz ao acordo, o que decorre das muitas possibilidades que se oferecem ao tratamento do conflito. Isso pode levar a um distanciamento entre as partes, dificultando a solução do problema. Deve advertir-se, entretanto, que é possível amainar tal desvantagem caso o mediador possua recursos que permitam levar as partes a alcançar um denominador comum quanto ao objeto da controvérsia. (SOLER, 2004). Inobstante as críticas expostas, considera-se que existem mais vantagens do que desvantagens no recurso à mediação, eis que o seu objetivo principal é a (re) aproximação das partes e a construção de uma solução por escolha delas próprias, orientando-se pela igualdade e liberdade. Ademais, consoante já exposto, a mediação contribui significativamente para a pronta solução dos conflitos, apresentando aspectos positivos na tutela dos direitos. Evidentemente, tal vantagem adquire especial notabilidade em demandas que apresentam vínculos estrangeiros, que, como ressaltado, requerem, em geral, mais tempo para solução, devido às peculiaridades que lhes são inerentes.

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Desse modo, a mediação apresenta-se como um caminho para que se alcance a efetividade dos direitos os mais diversos, o que só é possível caso os procedimentos que os realizam tramitem em um prazo razoável, objetivo que, em definitivo, a mediação auxilia a alcançar.

Considerações finais O presente artigo teve por escopo analisar a viabilidade da mediação como método alternativo ao Judiciário na solução de conflitos em que se configuram elementos estrangeiros, como forma de garantir-lhes um tempo de duração adequado e razoável. Conforme se infere, tais demandas vêm ocorrendo com cada vez mais freqüência na atual época de globalização, pois é natural que, devido à maior mobilidade de pessoas, bens, serviços e capitais entre diversos países, surjam conflitos oriundos de tais relações, cabendo ao Direito buscar meios efetivos para solucioná-los. A fim de responder à referida problemática, o trabalho estruturou-se em duas partes: primeiramente, tornou-se indispensável contextualizar o tema diante da atual crise que vem enfrentando a jurisdição, em face justamente das novas demandas que lhe exigem breve solução. Nessa linha, demonstrou-se que é preciso que se superem os obstáculos internos que, normalmente, comprometem a efetividade dos direitos, posto que, em concreto, os litígios são julgados pelo Poder Judiciário de cada país, mesmo nos casos em que neles se verifica a presença de caracteres internacionais. Em um segundo momento, analisaram-se as particularidades da mediação como método alternativo de solução de conflitos, ressaltando as suas principais características e a natureza dos conflitos em que sua utilização mostra-se cabível. Não obstante, ressaltou-se que a mediação vai ao encontro do conteúdo do Direito Fraterno, visto que este se fundamenta no alcance do bem comum, através de métodos apropriados de solução dos conflitos. Por meio do estudo realizado, percebe-se o quão essencial é o desenvolvimento de mecanismos eficazes para a solução dos conflitos que surgem no contexto da globalização, o que impõe novos desafios ao Poder Judiciário. Com efeito, a estrutura e forma de atuação tradicionais da jurisdição vêm dando sinais de que já estão um tanto quanto obsoletas para enfrentar as rápidas transformações por que passa o mundo contemporâneo, sendo necessário que se considerem outras maneiras de lidar com os impasses que daí surgem. Nessa perspectiva, não restam dúvidas de que a mediação desponta como um caminho interessante frente aos problemas expostos, especialmente pelo 41

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fato de assinalar-se pela celeridade na resolução dos conflitos, ademais dos outros aspectos positivos que lhe são próprios, já aqui referidos. Em se tratando de conflitos com vínculos estrangeiros, a mediação cobra ainda mais relevância, uma vez que contribui para a sua rápida e eficaz solução, propiciando que se atenda à garantia da razoável duração das demandas jurídicas, garantia basilar dos Estados democráticos na atualidade.

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A MEDIAÇÃO COMO MEIO DE SE PROMOVER O ACESSO À JUSTIÇA E A PRESERVAÇÃO DO PROCESSO JUSTO Caroline Gaudio Rezende Suellen Kercia Peris de Souza Soares A mediação ganha grande importância no cenário brasileiro a partir da apresentação do Projeto de Lei 8046/2010 que trata do novo Código de Processo Civil. Tendo em vista a crise de jurisdicidade que hoje se encontra no Estado brasileiro os meios alternativos de solução de conflito ganham destaque sob inspiração do movimento que passou a ocorrer na Europa a partir dos anos 80 em que houve uma renovação da compreensão quanto ao Acesso à Justiça, passando o Poder Judiciário a ter um papel subsidiário a parir do entendimento de que nem sempre ele é o mais apto para a solução dos conflitos. Assim, a mediação passa a ser debatida no Brasil. Todavia, a sua introdução no sistema pátrio deve vir acompanhada da discussão quanto aos princípios constitucionais, ou seja, a preservação ao processo justo para ser validamente aplicada.

Introdução Desde meados do século passado debate-se meios de melhorar o Acesso à Justiça aos cidadãos para que estes pudessem realmente se sentirem tutelados e seus direitos preservados. Isto decorre do papel de predominância que o Poder Judiciário passou a ter na sociedade do pós guerra e o entendimento de que o acesso garantido não poderia ser apenas o de ingresso, mas o também de saída. Aliado a esta noção a compreensão de que o andamento processual deveria ser adequado àqueles que provocassem a inércia da jurisdição a fim de que esta fosse prestada de maneira correta. Assim, o conceito de Justiça passou por uma modificação, pois esta passa a ser entendida não como ela que está inserida no provimento jurisdicional, mas sim, integra também todas as fases da instrução processual. O Acesso é prévio e ainda posterior, pois o comando jurisdicional deve produzir seus efeitos concretos perante o jurisdicionado. Caso contrário, será uma mera folha de papel. Neste contexto de modificação da vida social e com reflexos no mundo jurídico surgiram as ondas renovatórias de Mauro Cappelletti que se propagaram por todo mundo e passaram a serem incorporadas nos ordenamentos ocidentais. Dentre as medidas propostas a terceira onda cuida da renovação de 45

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uma maneira mais profunda que é uma alteração no próprio Poder Judiciário e da cultura social no que tange ao mesmo. Quanto a este último aspecto a reforma diz respeito ao uso de mecanismos que não se utilizem da atividade do magistrado. Retornado-se, desta feita, ao pensamento dos processualistas clássicos em que colocavam a jurisdição como a última racio. Doravante, nos últimos anos os meios alternativos à jurisdição, em especial a mediação, vem ganhando força e destaque, tendo em vista a propalada moderna crise do Poder Judiciário em que se mostra saturado e sem perspectivas de melhora de modo interno, embora os ordenamentos tenham empreendido inúmeras reformas. A mediação ganha importância, tendo em vista que duas das causas apontadas para o problema do exercício da atividade jurisdicional são a sua demora na prestação da atividade ou/e um resultado que não agrada as partes envolvidas no conflito. Logo, verifica-se que a Crise do Judiciário é um problema que não se cinge ao Estado brasileiro e que na realidade começou a ganhar espaço no direito europeu no fim década de 80 quando a Inglaterra insere o instituto da mediação em seu ordenamento jurídico. Hoje a mediação ocorre em diversos ramos jurídicos e tem grande atuação no continente europeu, haja vista a edição das diretivas da União Europeia buscando, desta forma, uma adequação entre os membros do bloco econômico das regras que regulam o tema. No que tange o Brasil embora o tema não seja propriamente uma novidade, pois vem sendo debatido desde os idos da década de 90 quando houve a apresentação do primeiro projeto de lei a respeito do sue uso, surge o instituto da Mediação como um novo meio de se atingir o Acesso à Justiça. Em especial, atualmente ganhou um novo fôlego com a apresentação do Projeto de novo diploma processual (PL 8046/2010) que traz inserido este instituto como um auxiliar ao Poder Judiciário. Na Exposição de Motivos está expressa sua importância no novo ordenamento processual proposto. Pontue-se que a mediação não é analisada apenas sob a perspectiva da inserção da terceira onda de Mauro Cappelleti, mas também aplicada tendo em vista a quarta onda. Nesta aduz-se a busca pela efetividade, ou seja, a ordem jurídica justa. Assim, ao serem analisadas as duas ondas em conjunto é o uso de novos mecanismos para se obter uma real pacificação do conflito. No contexto moderno do Judiciário pátrio a mediação é vista como um meio de se perquirir o ideal de Justiça que hoje é vigente (em todo mundo) em que o Poder Judiciário e a Justiça são efetivos quando é prestado com celeridade e economia. Todavia, sem haver o descuido com os princípios e garantias processuais, considerando que este novo Código levado a submissão do Congresso irá estar inserido na fase do neoprocessualismo, isto é, do respeito e aplicação do processo justo que não se limita apenas ao respeito do princípio 46

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do devido processo legal. Mas este ao lado dos outros princípios constitucionais para que, desta feita, ele ganhe seu alcance máximo. Diante deste cenário em que a mediação é uma das apostas da Comissão de Juristas do projeto de novo CPC por ser entendida como um novo meio de se ter o Acesso à Justiça vem a baila no presente trabalho como o instituto na forma a qual foi apresentado no Projeto irá promover o Acesso material à Justiça sem deixar de tutelar as garantias de um processo justo de maneira íntegra, haja vista que não pode haver ponderação na aplicação das garantias processuais inseridas na Carta Magna. Cuidado este que é depreendida do estudo realizado na Exposição de Motivos do Anteprojeto de proposta de novel codificação.

I. A 3ª Onda Renovatória de Cappelletti: A mediação como meio de se oportunizar o Acesso à Justiça As mudanças sócio-jurídicas ocorridas após o fim da Segunda Guerra Mundial que em termos de direito constitucional deu ensejo a Terceira Geração de Direitos Fundamentais teve como conseqüência a eclosão de novos direitos em âmbito material. Nesta perspectiva, tendo em vista a forma de Estado adotada (Democrático de Direito) muitos destes direitos passaram a estar expressos na Constituição, que a partir deste momento passou a ser o principal documento normativo do Estado, provido de força política. Caráter este que se propagou em diversos textos constitucionais que à exemplo da Alemanha passaram a seguir o modelo do constitucionalismo de direitos (BARROSO, 2008). Neste mesmo período o Acesso à Justiça passa a ser um postulado de orientação mundial, sendo previsto não apenas na Carta Política do Estado, mas em Tratados e Convenções Internacionais. A Declaração dos Direitos do Homem foi o paradigma na proteção a estes direitos passando a ter status de garantia indeclinável do indivíduo no Estado. Ou seja, um dever do Estado em garantir de forma plena. Todavia, devido as mudanças acima mencionadas e segundo a premissa de que o direito processual é instrumento do direito material e, logo, aquele sendo provocado deve preservar de maneira adequada o direito material (caso contrário este direito estaria comprometido - assim, o direito processual deve acompanhar estas mudanças a fim de poder haver a correspondência entre os dois ramos do direito) são lançadas na década de 50 as três ondas renovatórias por Mauro Cappelletti. 47

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Em sua obra entitulada Acesso à Justiça escrita com a colaboração de Bryant Garth, atenta preliminarmente que o entendimento inicial quanto do que se entende por este direito estava passando por transformação à época devido as mudanças sócio jurídicas. Aduz que não poderia mais ser entendido como um direito formal, isto é, posto a disposição do indivíduo. O conceito que estava sendo formado era da necessidade de haver um real Acesso à Justiça ao cidadão, ou seja, material. Para tanto era preciso serem realizadas modificações no direito processual vigente e nesta linha apresenta as três frentes de modificações que entendia serem apropriadas para que houvesse a complementariedade no sistema jurídico entre o direito material e processual, sendo elas: a justiça gratuita aos hipossuficientes econômicos; tutela aos direitos coletivos em sentido lato e uma reforma interna no Poder Judiciário e na forma de solucionar os conflitos (CAPPELLETTI, 2002). A última, objeto da presente pesquisa, é mais do que uma consequência das duas outras mudanças lançadas por Cappelletti. É apresentada como uma nova análise do Acesso à Justiça, tendo em vista que de acordo com suas exposição deve ser entendida de maneira ampla. Neste sentido o doutrinador italiano expõe que a terceira onda “centra sua atenção no conjunto geral de instituições e mecanismos, pessoas e procedimentos utilizados para processar e mesmo prevenir disputas nas sociedades modernas”. (CAPPELLETTI, 2002). Assim, o instituto da mediação integra este novo viés de se perseguir o Acesso, tendo em vista que como exposto na obra a formação dos novos direitos materiais levam existência também de novas formas de composição do conflito, uma vez que o Judiciário deve se adaptar internamente a estas mudanças do ordenamento. A mediação oportuniza o Acesso à Justiça adequado, tendo em vista a existência de que conflitos de determinadas naturezas podem ser melhores resolvidos sem a participação direta do Juiz. Mas sim a partir da exposição dos fatos pelas “partes” e uma cooperação mútua a fim de se chegar a um denominador comum. E, desta feita, todos saírem satisfeitos e haver consequentemente a real pacificação do conflito. Isto decorre a partir da constatação da inefetividade sob dois vértices, quais sejam: a demora na prestação da atividade jurisdicional e a percepção moderna em que se observa que o título jurisdicional não tem tido o condão de resolver a lide permanecendo o conflito - que se soma a insatisfação de ambas as partes. Quanto ao primeiro ponto o inchaço pela qual passa o Judiciário devido ao grande número de demandas faz com que o retorno status que anterior fique postergado. Assim, a demora pode levar a um acirramento do conflito. No que tange os efeitos do título executivo esta em alguns momentos devese pelo tempo da solução da lide que pode ter levado ao perecimento do direito. 48

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Ou então devido ainda passar pela fase executiva, em que determinados casos não cabe a execução provisória ou a mesma pode ser suspensa. Assim, passa a ganhar força a compreensão do exposto por Cappelletti em meados do Século passado em que para se atingir Justiça não se faz necessário obrigatoriamente a presença de uma decisão judicial. A Justiça que sempre foi analisada sob o conteúdo da decisão passa a ser analisada numa concepção mais ampla. E neste contexto pode ser atingida pelo acordo (em sentido lato) entre as partes havendo o real fim do litígio. No entanto, essa percepção que é mais recente na Europa e em especial no Brasil é antiga nos Estados Unidos onde a mediação ao lado de outros institutos (conciliação e arbitragem) que compõe o mecanismos da ADR (Alternative Dispute Resoluction) se desenvolveu fracamente. E é um modelo de mecanismos substitutivos da jurisdição mundial. Quanto a Europa o uso da mediação para resolução dos conflitos só passou a ter relevância apenas no fim da década de 80. Ela é intronizada a princípio na Inglaterra, em que adotou o sistema norte-americano. A posteriori o instituto passa a ganhar espaço nos demais ordenamentos do bloco europeu como uma continuação do Acesso à Justiça delineado por Cappelletti sob a vertente da quarta onda como será a seguir analisado.

II. A Mediação na União Européia: nota quanto as reformas no Processo Civil a partir da década de 1980 No final da década de 80 a Inglaterra traz para seu sistema processual as ADR, dando especial ênfase ao uso da mediação em seu sistema. A partir deste momento verifica-se que houve a inauguração do movimento de mudanças na própria legislação inglesa para que houvesse uma justiça efetiva prestada de maneira célere e econômica, ou seja, um novo momento da interpretação e aplicação do Acesso à Justiça (denominada de quarta onda renovatória do processo). Na Inglaterra este processo culminou com a edição da legislação codificada de um Código de Processo Civil em abril de 1999 após a elaboração dos relatórios sobre o Acesso à Justiça no país por Lord Woolf - sendo extensível a sua aplicação ao Pais de Gales (MOREIRA,1999). Quanto ao tema da mediação no direito inglês compete ao Ministro da Justiça a elaboração de políticas sobre o instituto. A partir da inserção destas políticas realiza a sua promoção objetivando que a provocação do Poder Judiciário seja secundária. Como aponta Loukas Mistelis com a aplicação da 49

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mediação o Judiciário inglês anseia que a solução do conflito seja feita pela própria comunidade a qual surgiu a resistência (MISTELIS, 2003). Cabe ressalvar que na ordenação britânica o tema não se restringe apenas a seara do direito civil, mas é inclusive extensiva ao direito penal. E tem resultados positivos de sua aplicação havendo a solução da lide (MISTELIS, 2003). Assim, a mediação é a protagonista nos conflitos ingleses e o Judiciário tem caráter subsidiário. Como anteriormente apontado, após o direito inglês diversos países passaram a debater a introdução deste mecanismo dando ensejo as diversas reformas que se verifica por toda a Europa inserindo-se no anseio pela Justiça efetiva e justa, sem que necessariamente haja a intervenção do Poder estatal. E caso o Judiciário deva participar mecanismos internos zelando pela economia, celeridade e efetividade do título jurisdicional. A importância da mediação no direito europeu é tamanha que os debates quanto as suas regras de aplicação possuem pauta nas diretivas da União Europeia. A partir da edição das mesmas almeja-se a harmonização das regras quanto ao tema. Neste sentido expõe Capelletti: “Un’altra dimensione fondamentale del diritto e della giustizia nel mondo contemporaneo è quella transnazionale” Esta deve-se pois a exemplo das demais áreas em que “necessaria anche un’espansione transnazionale del diritto; fenomeni naturalmente transnazionali necessitano di una disciplina giuridica anch’essa di livello transnazionale. E assim, há consequentenmente “la crescente importanza di organismi come la Comunità Europea, il Consiglio d’Europa” (CAPPELLETTI, 1994b). No entanto, pontue-se que é na Itália, a onde há um sistema diferente do modelo norte americano, que a mediação tem grande repercussão havendo vários estudos, inclusive no direito brasileiro quanto ao modelo italiano do instituto. Observa-se, desta feita, que a Europa viveu no final do Século XX um novo movimento de Acesso à Justiça que é denominado de quarta onda renovatória do processo. Embora a mediação integre a terceira onda renovatória do direito processual como acima abordado devido as novas técnicas de resolução de conflito o instituto passa a ser fundamental para se perquirir as balisas deste novo movimento de Acesso à Justiça em que se preocupa com a Justiça efetiva e sem delongas desnecessárias. Isto se encontra presente nas reformas na legislação europeia que passaram a adotar novos mecanismos para promoção de direitos, dentre eles o instituto objeto de estudo. E este movimento tanto de uma Justiça célere e efetiva como do entendimento da medição como uma forma de se atingir a este novo conceito de Acesso à Justiça chega no Brasil, tendo em vista a Crise do Poder Judiciário. O problema da prestação da atividade do Estado Juiz ensejou diversas reformas 50

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na legislação processual vigente e levou ainda a edição dos Pactos Republicanos (I e II) culminando na apresentação do novo Projeto de Lei 8046/2010 de novo Código processual para o direito brasileiro que regula a mediação judicial no ordenamento.

III. A mediação no Brasil O tema é relativamente novo no ordenamento pátrio. No entanto, embora haja ainda uma resistência da sociedade quanto a sua aplicação e até mesmo dos próprios operadores do direito, em termos acadêmicos está em franco desenvolvimento. E na proposta de novo CPC é uma das novidades e apostas para cumprimento dos fundamentos deste Projeto de Lei. III.i. Breve histórico no ordenamento Embora as ondas renovatórias do processo acima abordadas tenham sido debatidas em âmbito acadêmico brasileiro desde os idos da década de 70 verifica-se sua inserção no ordenamento pátrio na década seguinte, tanto em sede infraconstitucional como na própria Carta Constitucional, que adotou o modelo de constitucionalismo de direitos. Logo, uma gama extensa de direitos materiais previstos no texto. Todavia, verifica-se que apenas a primeira como segunda são inseridas no direito brasileiro (a prestação a justiça aos hipossuficientes econômicos e aos direitos coletivos). Assim, a terceira onda embora fosse necessária (até mesmo para o maior sucesso daquelas duas outras) não foi implementada no direito brasileiro. Houve a permanência da estrutura tradicional do processo e do Poder Judiciário pretérita a inserção dos novos direitos e das mudanças que este provocou no cenário sócio jurídico. Atrelado a estes fatos acima expostos verifica-se um fortalecimento das instituições democráticas e também uma conscientização do indivíduo dos seus direitos, o que levou uma busca grande da sociedade pelo Judiciário e a formação da cultura de litigiosidade. Consequentemente, percebe-se que o Judiciário tenha se mostrado mais acessível ele permaneceu no Brasil posto apenas no sentido dele estar com as portas aberta ao indivíduo que se sentisse lesado ou ameaçado na forma prevista no art. 5º, XXXV, CF. Assim, o direito ao acesso consubstanciado na Constituição se revela ainda como de natureza formal.

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O real e efetivo acesso, isto é, Acesso à Justiça material é um anseio que vem se formando desde a década de 90 quando o sistema judicial começou a demonstrar a sua ineficiência perante as demanda modernas culminando o que hoje se chama e tanto desperta debate que é a Crise do Poder Judiciário. No entanto, a busca do Acesso nesta concepção moderna de efetiva, célere e econômica ganha espaço mais recentemente nos últimos anos levando a criação do projeto de novo CPC que reestrutura o direito processual posto se adequando a nova Constituição (inserção do neoprocessualismo) e a realidade dos Tribunais e da sociedade. Já a partir dos anos 90 a mediação passa a ser debatida no Brasil embora ainda em termos legislativos se mostre muito longe do que se discute no direito norte americano e europeu por ser o assunto incipiente. O primeiro debate em termos de legislação houve com a proposição do primeiro Projeto de Lei sob o nº 4827/98. Como não teve andamento o Projeto posteriormente se uniu as proposições criadas pelo IBDP (Instituto Brasileiro de Direito Processual) formando um Projeto de Lei único. Contudo, não houve êxito. Em 2005 um novo projeto sob o nº 4891 foi proposto. Mas também não houve evolução (DALLA,2011). Logo, o debate se restringiu em âmbito doutrinário a partir de estudos do instituto no direito comparado. No entanto, é a partir da proposta de novo Código de Processo Civil (PL 8046/2010) que o tema passa a ganhar bastante destaque no direito nacional, tendo em vista ser um dos meios de se perquirir a solução efetiva da lide. A inserção do instituto decorre de um processo de amadurecimento da percepção de que mudanças internas na estrutura do Pode Judiciário não são suficientes para uma melhor prestação da atividade do Estado-Juiz (DALLA, 2011). A adaptação do Judiciário não será suficiente para dar a resposta almejada ao indivíduo, tendo em vista o grande número de demandas e complexidade das relações modernas. A reorganização estrutural do processamento dos atos, a modificação do andamento processual e aumento de pessoal não basta para se ter a Justiça nos conceitos e anseios modernos. Neste sentido, os meios alternativos ganham destaque e passam a ser entendidos como um novo mecanismo de se ter o acesso na forma a qual o projeto de novo diploma processual propõe: uma justiça célere, efetiva e econômica. O Brasil, portanto, segue o caminho dos demais ordenamento retornando como os demais as ideias iniciais do processo de que a jurisdição tem atuação secundária. Ou seja, apenas quando a solução do conflito não é obtida pelos meios consensuais das partes é que o Judiciário entra para a resolução do conflito com o uso dos instrumentos clássicos. Sua intromissão dar-se-á secundariamente, quando frustrada esta possibilidade. 52

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A mediação é, assim, vista como um meio de atingir a pacificação social sem que o Judiciário intervenha diretamente. Não obstante, enquanto o Projeto de novo Código se encontra em andamento no Congresso Nacional o tema teve sua regulamentação pela Resolução 125 do CNJ o que demonstra o fomento desta atividade no direito pátrio. Atualmente, uma nova comissão foi instituída em paralelo a edição do projeto de CPC tratando também da regulamentação do instituto, tendo em vista as incertezas do futuro CPC. III.ii. Projeto de Lei 8046/2010: o anseio pelo acesso efetivo O Judiciário brasileiro enfrenta uma crise de confiabiliadade por diversos fatores e neste âmbito houve a formação do I Pacto Republicano que deu ensejo a Emenda Constitucional 45 denominada de Reforma do Poder Judiciário. As bases deste texto foram solucionar a demora da prestação da atividade judicial, pois como leciona Humberto Theodoro Júnior: "A primeira grande conquista do Estado Democrático é justamente a de oferecer a todos uma justiça confiável, independente, imparcial e dotada de meios que a faça respeitada e acatada pela sociedade". Assim, uma das medidas adotadas neste documento político foi a positivação no ordenamento do princípio da efetividade processual no art. 5, L XXVIII. Desta feita, como é sabido diversas reformas foram empreendidas sobre o vigente Código (algumas já haviam sido efetuadas na previamente ao Pacto) a fim de adequá-los a nova realidade social e também constitucional, haja vista os princípios constitucionais descritos na Constituição. Porém, a renovação das disposições processuais almejando a simplificação dos atos processuais se mostraram infrutíferas, tendo em vista que o Judiciário continuou sendo provocado e a demora na solução das lides permaneceu. Neste sentir, como fruto do II Pacto Republicano nasce o projeto de um novo CPC pretendendo resolver o problema atual do Judiciário. Mas para tanto diferente das reformas anteriormente realizadas a principal diferença para o projeto atual está que a Comissão de Juristas percebe que o Judiciário não está apto a resolver todos os conflitos sociais e busca, desta feita, diminuir a cultura do “Judiciário paternal”. No desejo de prestar uma Justiça que passa a ser entendida pelos conceitos de celeridade e efetividade e correspondente a ordem jurídica justa a mediação ao lado do incidente de resolução de demandas repetidas são as grandes apostas deste novo CPC. 53

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Quanto ao instituto da mediação, objeto da presente pesquisa, na forma prevista no projeto enviado ao Congresso os mecanismos alternativos de resolução de conflitos são auxiliares da justiça. Desta feita, ela é a mediação judicial em que apesar do Judiciário ser provocado o Juiz propõe a instauração da mediação a fim de poder oportunizar este debate diretamente pelas partes sem a intervenção direta do Estado- Juiz. Contudo, ressalve-se que nada impede a realização da forma extrajudicial, que não está regulada no projeto por opção da Comissão de Juristas (DALLA, 2011). Todavia, neste sentido deve-se atentar pela forma a qual este novel instituto será aplicado no Brasil, sem comprometer a preservação do processo justo, que é aquele a qual mantém integras as garantias processuais esculpidas na Carta Magna.

IV. O processo justo O entendimento a cerca sobre o processo prestado de maneira justa tem início a partir da nova ordem constitucional na qual Kazuo Watanabe debate quanto a necessidade de ser feito a partir daquele momento o acesso a ordem jurídica justa. Para tanto ele traz quatro bases, quais sejam: o direito à informação e conhecimento do direito substancial; direito de acesso à Justiça de maneira organizada em que é constituída por magistrados sensíveis a realidade social e comprometidos com o objetivo de realização da ordem jurídica justa; direito à preordenação dos instrumentos processuais; e por fim, o direito à remoção de obstáculos existente que impeçam o acesso efetivo à Justiça. (WATANABE, 1988). A noção de processo justo, como brevemente acima exposto, é o processo que alberga as proteções processuais de índole constitucional. Isto decorre como expõe Leonardo Grecco da necessidade da tutela jurisdicional ter que ser efetiva dando concretude aos direitos descritos na Carta Magna sendo um direito de natureza fundamental. Ademais há ainda um conteúdo mínimo de respeito destes princípios (GRECO, 2005). Nesta hodierna concepção quanto ao processo ganha especial destaque o princípio do devido processo legal devido ao mínimo de requisitos para a formação do processo como afirma Daniel Mitidieiro, pois este é um direito de natureza fundamental (MITIDIEIRO, 2011). Ademais prossegue o autor de que o processo justo gera os efeitos: vertical horizontal e vertical com repercussão lateral, pois respectivamente atinge o Estado impondo deveres a ele, também obriga aos particulares e reflexos na ordem privada (MITIDIEIRO, 2011).

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A partir do exposto, passa a se analisar como a aplicação da mediação irá preservar o processo justo. IV.i. Preservação dos princípios constitucionais pela mediação Considerando que o processo justo é a preservação dos princípios processuais constitucionais, no presente trabalho serão levado a debate os seguintes princípios: Acesso à Justiça; Efetividade Processual, Devido Processo Legal; Duração Razoável do Processo e Contraditório e Ampla Defesa. O Acesso à Justiça previsto no art. 5, XXXV é o princípio fundador da discussão quanto ao uso da mediação, tal decorre da busca pela Justiça de maneira palpável a sociedade, surgindo assim ela como um novo viés de pacificação da lide sem que o Judiciário através do comando do juiz. Como este é o princípio de maior anseio e motivador da aplicação da mediação observe-se, portanto, que independentemente da legislação a qual esteja prevista estará sendo tutelado. Desta feita, quanto a este princípio não há maiores discussões, sendo pacifico a sua preservação e busca de concretude. Quanto a efetividade este um dos princípios processuais que levam a formação da propositura do PL 8046/2010 ao lado do Acesso à Justiça. Para que se tenha este princípio preservado a efetividade, seja na economia ou celeridade devem estar presentes, pois o Acesso à Justiça é o fim da efetiva prestação jurisdicional. E neste contexto, a mediação vem promover o princípio com a diminuição de processos em que há a ingerência direta do magistrado, uma vez que ficará a cargo do mediador a ajuda na pacificação. Infrutífera a medida se valerá das regras processuais judiciais. O devido processo legal surge da constatação que nem todo litígio é melhor resolvido a partir da cognição judicial, como previamente exposto. Com a conscientização de que conflitos de determinada natureza podem ser melhor tratados a partir das regras da mediação se perquire o princípio do devido processo legal. Insere assim o postulado na visão moderna de não se restringe a observância dos atos processuais, mas na visão moderna acima exposta (THEODORO, 2005). Quanto a duração razoável esta pode ser analisada sob duas vertentes. A primeira aquela a qual está ligada aos princípios do Acesso à Justiça e efetividade em que busca desonerar o Estado Juiz. Mas ainda há sob o prisma de que todo processo tem seu tempo de amadurecimento como colocado por Aristóteles. Na mediação o ajuste através das tratativas é por um período sem estar fixado para que realmente tenha a solução da controvérsia (ARISTÓTELES, 55

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2007). Neste aspecto vem a debate os princípios do contraditório e ampla defesa em que pela paridade de armas dadas as partes elas levam a discussão sem supressão da palavra. Todavia, cabe salientar que o correto uso da mediação em conformidade ao processo justo é a sua facultatividade. O caráter obrigatório levaria a desconfiguração do instituto e assim não se atingiria o encerramento da lide. Podendo até provocar o efeito inverso.

Conclusão Por todo o exposto, a presente pesquisa buscou demonstrar como a mediação na forma apresentada em projeto de novo CPC se relacionará com o conceito de processo justo vigente hoje em todo os Estados Democráticos de Direito. Premissa esta obrigatória para a constitucionalidade do instituto. Após a exposição da sua formação a partir da terceira onda renovatória de Mauro Cappelletti, a sua inserção no continente europeu e sua chegada no Brasil a onde em termos legislativos foi até a apresentação do projeto de novo CPC enfraquecida, como ela pode levar o Acesso à Justiça na concepção material de se ter a lide pacificada. E seu dialogo com os princípios inseridos na Carta Magna da efetividade, devido processo legal, duração razoável do processo e, por fim, contraditório e ampla defesa. Doravante, independente do futuro do PL8046/2010 apresentado e do mais recente projeto de lei quanto ao tema o uso e a aplicação do instituto é uma realidade mundial e já do ordenamento pátrio, tendo em vista regulamentação do CNJ. E assim, independentemente do local a qual esteja regulada ela deve seguir as balisas de respeito ao processo justo perseguindo o real ao Acesso à Justiça e respeito as garantias do processo que são inderrogáveis e sendo válido o seu uso.

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MEDIAÇÃO PARAPROCESSUAL NO JUDICIÁRIO BRASILEIRO: SUAS TÉCNICAS, PRINCÍPIOS, PARADOXOS E COLISÕES COM O PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO Alice Boechat da Costa Soares O artigo trata da reflexão acerca da possível colisão de princípios contida na adoção da mediação como método “alternativo” paraprocessual de solução de conflitos pelo Judiciário, método também submetido aos princípios e garantias constitucionais processuais. O paradoxo formado, a partir do aperfeiçoamento do diálogo proporcionado pela mediação e que pode conduzir ao acesso à justiça e à efetividade do processo e o prejuízo que a mesma pode gerar com relação à inviabilidade dos princípios e garantias constitucionais processuais, clama pela aplicação ponderativa dos norteadores da razoabilidade e da proporcionalidade à adoção harmônica desse método ao aperfeiçoamento do Judiciário, merecendo instigação ao debate deliberativo quanto às medidas necessárias que amenizem o choque de princípios da mediação paraprocessual com os que ordenam o direito constitucional processual brasileiro.

Introdução O presente artigo faz reflexão acerca da adoção e utilização prática da Mediação, como método alternativo autocompositivo de solução de conflitos, na forma paraprocessual, naturalmente regida por princípios próprios e, com natureza distinta dos modelos de sistematização jurídicos, mas que corre em paralelo ao trâmite processual das ações judiciais, submetido aos ditames dos princípios constitucionais processuais. A mediação, como método tipicamente flexível, leve e informal, criado a partir da reunião de objetivos e linhas de atuação oriundas de outras ciências, possui uma concepção distinta do processo judicial, que é rígido, adversarial e, formal. A união dessas duas sistematizações, em atuação paralela, possibilita o destaque das suas diferenças principiológicas, o desafino de concepções, o que traz insegurança aos juristas, operadores de direito e acadêmicos quanto aos efeitos e consequências jurídico-processuais da interseção do processo com a mediação paraprocessual pré-judicial ou incidental, no Judiciário. A mediação tem adquirido prestígio pelas dificuldades que o processo tem atravessado como sistema de normas a conduzir as ações, para prever, regular as diversas situações e necessidades dos jurisdicionados envolvidos em 58

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conflitos que se refletem nas distintas formas que o direito processual precisa incorporar para, além de conceder andamento processual coerente e justo, trazer efetividade aos direitos e deveres relacionados nos pedidos elencados nas petições das ações que, para agravar a crise, abarrotam o Poder Judiciário. O método tem logrado êxito, em certos tipos de conflitos levados ao judiciário, por ser instrumento estimulador do diálogo, o que viabiliza ao cidadão, paradoxalmente, o acesso à justiça e, maior efetividade reflexa, do processo judicial. O agente facilitador capacita as partes a deliberarem suas decisões, mesmo na via judicial, o que representa outra forma de gerência do conflito, mas que também traz satisfação ao cidadão que recorreu à máquina judiciária. Nos processos judiciais que envolvem relações de cunho continuado referentes, por exemplo, aos litígios de família e, de vizinhança, a mediação tem sido eficientemente utilizada como método, não mais tão alternativo, pois, a partir de sua adoção como desejado pela Resolução 125 do Conselho Nacional de Justiça – CNJ, a mesma foi introduzida no âmbito judicial, de forma mais efetiva e oficial, conforme, indiretamente, a nova ideologia neoconstitucionalista que lhe gostaria de conceder o Projeto PLS 166/2010 do Novo Código de Processo Civil brasileiro, quando almeja um processo mais humanizador, constitucionalizado, portanto e, que reage contra a morosidade. Entretanto, a partir da utilização da mediação paraprocessual como instrumento hábil à resolução de conflitos no Poder judiciário, tanto de maneira mais tímida, a pré-judicial, bem como na forma mais usual, incidental, após a propositura da ação, se constatam colisões de concepções quando se faz a sobreposição de ditames constitucionais processuais que regem o processo com algumas técnicas da mediação e, princípios norteadores da conduta do mediador. Essa colisão de princípios que regem o processo com a dinâmica da mediação, no campo teórico, é inevitável, por possuírem naturezas e origens distintas, algo bem constatável a partir da utilização empírica das duas processualísticas, a convencional judicial e a alternativa autocompositiva de conflitos, juntas. A contraposição teórico-principiológica é natural na sociedade contemporânea em razão da sofisticação obtida em resposta à necessária elaboração de novos caminhos que obrigam a inter-relação dos institutos, jurídicos ou não, que compõem os ramos do direito e, de outras ciências. A multidisciplinariedade que une esses vários ramos do direito com outras ciências é a tradução da realidade que clama a mediação ao processo. Essa constatação gera preocupações no meio acadêmico, pois é sabido que a 59

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multidisciplinariedade gerada numa sociedade pluralista, multicultural e complexa propicia o conflito de paradigmas, de valores. Neste contexto, existe a dinâmica reflexa e acentuada do progresso: extensão e melhoramento dos meios de comunicação, desenvolvimento científico-tecnológico, cada vez mais consumo, aumento da crise referente à degradação ambiental, necessidade de acesso célere à justiça e outros diversos fatores que conduzem ao maior número de ações judiciais propostas perante o Judiciário. E o tratamento do conflito no âmbito das relações humanas, real gerador de todo esse contexto caótico? Esse choque de modelos é positivo. Bem traduzido e compreendido proporcionará a adequação do procedimento da mediação na sistemática processual do Judiciário, obtida também, até natural e espontaneamente. A multidisciplinariedade é mais rica para abarcar formas distintas de tratamento de conflitos, pois eles são heterogêneos e, de múltipla natureza e, os princípios orientadores da mediação são totalmente diversos e, em certos aspectos, até parecem ser antagônicos aos princípios constitucionais do processo, de tão diferentes, eis que a mediação e a estrutura processual jurídica possuem utilidades, papéis, concepções e filosofias distintas na condução dos conflitos, o que é bom. Fundamental a utilização da razoabilidade e proporcionalidade para o encontro de respostas. Talvez por esta forma se encontre os meios da adequação e adaptabilidade fundamentais às soluções, provisórias ou definitivas, do casamento dos princípios constitucionais processuais com as técnicas e instrumentos da mediação. A pesquisa científica deseja fomentar a deliberação, via diálogo acadêmico, sobre a contribuição positiva e estupenda da mediação para o direito, incluindo no debate os receios sobre o futuro da parceria entre a mediação e o processo, sobretudo, com relação à necessária prudência na observância dos princípios e garantias fundamentais constitucionais processuais para compor essa parceria e, a vigilância contínua do direito na implantação de medidas a minimizar choques de princípios ou, outras prejudicialidades, para preservação dos direitos fundamentais relativos ao processo e, da continuidade no uso desse belo método que é a mediação paraprocessual, no âmbito do Judiciário. O momento atual é oportuno ao novo debate, ponderativo e sem obsessões positivistas, sobre as formas de acomodação dos princípios da mediação com os princípios constitucionais do processo, duas sistemáticas distintas, mas absolutamente imprescindíveis à Justiça. Para uma sobreposição eficiente do Princípio Constitucional Processual do Contraditório, estabelecido no artigo 9º do Projeto 166/2010 do Novo CPC com as técnicas da mediação, indispensável comentar sobre a sua natureza, 60

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apresentando a estrutura, função, a deontologia e ferramentas do mediador a melhor compreensão dos antagonismos envolvidos na interação da mediação com o contraditório “formal” do processo.

I. As interações harmônicas e antagônicas da mediação paraprocessual com o Poder Judiciário Um conflito é visto como elemento vivencial extremamente negativo, mas é, por outro lado, absolutamente normal a sua ocorrência e, inevitável na vida de qualquer indivíduo. Um conflito possui um escopo muito mais amplo do que simplesmente as questões juridicamente tuteladas sobre as quais se assenta a discussão no âmbito de um processo judicial, descrições apresentadas pelo autor, em sua petição inicial e, na contestação do réu. Esse aspecto do conflito corresponde à lide processual.1 Da observação sobre o desenrolar dos conflitos de cunho continuado, ocorrentes nas áreas de direito de família e de vizinhança, além desses conflitos terem a tendência a se tornarem piores por meio da “escalada do conflito”, muito se distingue aquilo que é tratado e trazido pelas partes ao conhecimento do Judiciário (lide processual) daquilo que efetivamente é interesse das partes (lide sociológica). Somente a resolução integral do conflito, que corresponde à lide sociológica conduzirá à efetiva pacificação social.2 Por isso, deve-se registrar que diversos fatores objetivos e subjetivos contribuem para o conflito além daquele problema que se apresenta no pedido mediato e imediato e, na causa de pedir constantes do processo judicial, pois podem representar uma forma superficial de determinação do objeto que poderia ser compreendido até pelas partes constantes do processo. O mediador, através da escuta ativa pelo exercício da atenção e interação estabelecidas com as partes, que se dá concentradamente nas sessões individuais, terá meios para considerar os aspectos emocionais dificultosos sobre o conflito, para cada parte, reeducando suas reações negativas à condução do diálogo produtivo ao encontro de soluções por si mesmas. A autocomposição pela mediação encontra-se prevista em diversas disposições legais, tais como nos artigos 277, § 1º e 331, artigos relativos à conciliação exercida nas audiências preliminares e, no artigo 125, inciso IV do Código de Processo Civil. Nota-se que não há lei específica que discipline a 1

AZEVEDO, André Gomma de (org.). Manual de Mediação Judicial. Brasília/DF: Ministério da Justiça e Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento. PNUD, 2009, p. 55. 2 Idem, Ibidem, p. 55

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atuação do mediador por ser procedimento recente no Brasil, tem característica interdisciplinar, reunindo técnicas de outros ramos do saber humano, quais sejam, a psicologia, comunicação, administração, semiótica, matemática aplicada etc. A atividade da mediação não tem relação direta com a interpretação e a aplicação do direito.3 Um dos obstáculos à usufruição pelo Brasil, de forma mais intensa, dos institutos da conciliação e da mediação reside na resistência, pelo próprio meio acadêmico e, em razão da estrutura adversarial, contenciosa e, adjudicatória, que foca só na figura do juiz-autoridade para tratamento dos conflitos de interesses, entendimento sustentado na formação acadêmica dos operadores de Direito que não possuem contato diário com a mediação.4 Praticamente nenhuma Faculdade de Direito nacional oferece aos alunos, em nível de graduação, conhecimento relacionado à solução “alternativa” dos conflitos em seus currículos, o que já é conteúdo constantemente fornecido, há mais de trinta anos, nas Escolas dos Estados Unidos da América, tendo tido como uma das precursoras na área sobre Mediação Escolar, a Professora Gail Sadalla.5 Contudo, felizmente, essa tendência tem sido alterada pelo CNJ, conforme os termos da Resolução nº 125, de 29 de novembro de 2010.6 Curiosamente, no Brasil, durante o período da Constituição do Império, ainda em 1824, o artigo 161 fazia referência sobre a necessidade da tentativa de reconciliação entre os litigantes antes do início do processo.7 A esta altura frisa-se que, no Projeto de Lei de Mediação, no artigo 2º, demonstrou ter o Brasil adotado o tipo de mediação “passiva”, diferenciando-a da mediação ativa, essa segunda considerada como a conciliação. Neste sentido, o Projeto do Novo CPC acolhe a esses dois institutos adotando os dois termos: conciliação e mediação. A conciliação pode ser considerada a mediação ativa. O conciliador incorpora papel participativo sugerindo, mais explícita e diretamente, sobre a formação do acordo num brainstorming com as partes.8

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AZEVEDO, Op. cit., p. 189. GRINOVER, Ada Pellegrini, WATANABE, Kazuo e NETO, Caetano Lagrasta (coord). Mediação e gerenciamento do processo: revolução na prestação jurisdicional : guia prático para a instalação do setor de conciliação e mediação, 2ª. reimpr. São Paulo: Atlas, 2008, p. 06 5 Idem, Ibidem, p. 06 6 Atualmente, o Conselho Nacional de Justiça vem divulgando e incentivando a cultura em prol da autocomposição dos litígios via incentivo às Faculdades de Direito nacionais como, por exemplo, a I Competição Nacional de Mediação do Poder Judiciário, a ser realizada nos dias 12 e 13 de agosto/2013, na qual foram oferecidas 50 vagas a estudantes de Direito de todo o país, visando estimular as faculdades jurídicas a estruturarem Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania em apoio aos Tribunais de Justiça e aos Tribunais Regionais Federais. 7 GRINOVER, Op. cit., p. 07. 8 PINHO, Humberto Dalla Bernardina de. Direito processual civil contemporâneo, vol. 1: teoria geral do processo, 4ª. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 904 4

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A mediação judicial é um ato processual, embora o seu conteúdo não tenha regras pré-determinadas como ocorrem do direito processual, mas ainda assim e, justamente por isso, vem se tornando um método atraente, pois o acesso ao Judiciário não pode ser confundido com o acesso à Justiça: à ela inclui-se os jurisdicionados à margem do sistema, educando todos os usuários a gerir seus conflitos por ações comunicativas, propagadas pela mediação.9 O objetivo principal da justiça pode ser, na realidade, a busca de solução dos conflitos oriundos de relações humanas continuadas, principalmente, de forma conjunta e, com a participação dos jurisdicionados, de maneira interdisciplinar, com a ajuda do aparato legal disponível no ordenamento jurídico brasileiro para o maior acesso à justiça e para potencializar a efetividade processual, mas não a concentração neste aparato como um objetivo fim, numa perdição positivista ou, num puro “formalismo kelseniano”.10 Pode-se conceder à mediação, com relação a sua estrutura, marcante flexibilidade procedimental, bem distinta da dinâmica existente pelo processualismo obtido na ação judicial. De um modo geral, dentro da sua simplicidade peculiar, a mediação é bastante dinâmica, constituída, basicamente, por sessões individuais e conjuntas e, pelo tom informal.11 O mediador tem papel consagrado como auxiliar da justiça, conforme dispõe o Art. 7º da Lei nº 9.099/1995. Ele não tem atuação diretamente ligada ao conhecimento do direito, mas tem real importância no processo judicial, de forma indireta.12 O mediador promove o entendimento entre as partes trabalhando, basicamente, por meio de perguntas dirigidas aos mediandos. Na perspectiva que neste artigo se deseja focar, como todo mediador é um pacificador, uma conduta Ética para o Pacificador será toda aquela importante a 9

Análise feita em Prefácio no qual consta belo testemunho do Ministro da Justiça, Tarso Genro, In: AZEVEDO, André Gomma de., Op. cit., p. 13 10 Termo utilizado por Gregório Peces-Barba Martínez, In: Lecciones de Derechos Fundamentales, Lección Octava: El Poder Político Democrático: La positivación de los derechos y la limitación del poder (Colección Derechos Humanos y Filosofia del Derecho). Editora Dykinson, p. 221 11 AZEVEDO, Op. cit.., pp. 54/55. A estrutura da mediação, quanto à Flexibilidade Procedimental: a mediação é, a coordenação lógica e cronológica de atos, mas, apesar da existência de uma estrutura, esses atos se põem disponíveis ao mediador, sem forma rígida a ser seguida, flexibilizando o procedimento com o que se sucede nas sessões com as partes e, conforme o ritmo do progresso dos mediandos. Com relação às Sessões Individuais: o mediador pode realizar sessões individuais com cada uma das partes, ao seu critério, se considerar que essa medida é adequada e conveniente, pois, com as etapas do procedimento de mediação, reconhecerá o momento ideal no qual deverá proporcionar a comunicação confidencial entre ele e com cada um dos mediandos, em apartado. Por fim, quanto ao Tom Informal: a característica mais forte do método é a informalidade, pois é peculiaridade apreciada tanto pelos mediadores como pelas partes, já que o conflito gera no indivíduo a sensação de extremo desconforto e estresse. É de bom proveito que a equipe composta de mediadores e observadores não se apresente como figuras de autoridade. A autoridade do mediador é o resultado final do relacionamento que ele conseguiu travar com as partes, pois desta forma se favorece e estimula a comunicação sem barreiras. 12 AZEVEDO, Op. cit., p. 189

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alcançar a Paz. Existem virtudes importantes para todo Pacificador e, portanto, para o ser do Pacificador.13 Esse agir é espontâneo e, por isso a mediação é flexível e, por manter-se livre, será desenhada conforme a personalidade do mediador, que externalizará suas capacidades com subjetividade e pessoalidade. Conforme a deontologia correspondente à conduta do mediador, os princípios que norteiam a mesma são: Princípio da Neutralidade e Imparcialidade de Intervenção, da Consciência Relativa ao Processo, do Consensualismo Processual, da Decisão Informada, da Confidencialidade, do Empoderamento das Partes, da Validação, da Simplicidade e, outros.14 Necessário se faz, portanto, o respeito às diretrizes estabelecidas por um código de ética para manter a qualidade na condução do procedimento e, para resguardo da sua eficiência.15 Na hipótese de extinção da ação pela autocomposição por ambos, o Princípio da Razoável Duração do Processo se viabiliza sob dois aspectos: 1º) pelo reflexo positivo obtido na própria demanda na qual se obteve a autocomposição e; 2º) por ser menos uma ação na pauta, reduz-se o número de ações e, desse decréscimo, se acelera e antecipa o julgamento de ações nas quais a autocomposição seria impossível ou, bastante remota. A mediação incidental obrigatória, para Ada Pellegrini Grinover, não fere o Princípio da Inafastabilidade do Acesso à Justiça e de seus tribunais, dispositivo contido no artigo 5º, inciso XXXV da atual CRFB, eis que, a mediação, de qualquer forma, só terá utilidade após o ajuizamento da demanda, tendo, por essa razão, já sido providenciadas a distribuição da demanda e a intimação dos litigantes, efeitos processuais próprios da realização da diligência do ato citatório de uma demanda instaurada16, o que tampouco proibirá o juiz de julgar.17 Neste caso, nada impedirá que a parte desinteressada na mediação requeira, após o prazo de 60 dias do ingresso do caso conflituoso no Centro de Mediação, que o mesmo retorne à Vara Judicial de origem e para qual foi distribuída a ação judicial, o que não fere o Princípio da Duração Razoável do Processo, eis 13

BUHR, Alexandre Dittrich. A arte do Pacificador, 2ª ed. Florianópolis: Conceito Editorial, 2007, pp. 40/61. O autor, de forma surpreendente, adiciona diversas e belas virtudes que um pacificador deve possuir e, que são benvindas ao mediador. Os pacificadores possuem algumas características que os identificam e outras que, inclusive, os tornam únicos entre eles, quais sejam: ter a mente aberta para mudanças, imprevisível, estrategista, humildade, compaixão, vontade, espiritualidade, paciência, perdão, serenidade, consciência da morte, retórica, talento, coragem, lealdade, alegria, amor, impecabilidade, poder. 14 AZEVEDO, Op. cit., pp. 190/194. 15 AZEVEDO, Op. cit., p. 191 16 ALMEIDA, Rafael Alves de, ALMEIDA, Tania e CRESPO, Mariana Hernandez (org.). Tribunal Multiportas: investindo no capital social para maximizar o sistema de solução de conflitos no Brasil. Rio de Janeiro: FGV, 2012, p. 98 17 PINHO, Humberto Dalla Bernardina de. Direito processual civil contemporâneo, vol. 1: teoria geral do processo, 4ª. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 98.

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que, além desse período de tempo gasto ser curto, é oferecido ao cidadão o contato com a função educativa que delineia a mediação.18 Em diversos países, tais como na Argentina, Inglaterra e, nos Estados Unidos da América, nesse último, principalmente em seus Estados da Flórida e Texas, a própria legislação conduz à usufruição da mediação, em uma ou mais sessões, para resolução dos conflitos no âmbito das relações privadas antes de desembocarem no Poder Judiciário. É nítido o raciocínio oposto nesses países, pois depositam na mediação prévia uma confiança e, um papel de pressuposto da demanda judicial. Mas se submetem esta condição ao cidadão, é porque nesses países já se criou a cultura tendente à utilização da mediação por entenderem a mesma ser como instrumento paraprocessual e, prévio à movimentação da máquina judiciária.19 Para a manutenção da boa adaptabilidade da mediação paraprocessual, deve ser realizada pesquisa empírica, interdisciplinar e, o contínuo monitoramento da implementação da reforma que se pretende estabelecer, eis que bons exemplos de reformas realizadas em sistemas jurídicos e políticos, nos seus países de origem, podem operar de forma adversa quando transplantadas numa outra cultura e, principalmente, se transplantadas simploriamente.20

I.i. Os princípios e garantias constitucionais do processo no Projeto de Lei do Senado nº 166/2010 do Novo CPC Para o direito processual neoconstitucional os Princípios são as verdadeiras diretrizes condutoras da relação processual válida, legítima, efetiva. Essa tendência neoconstitucional recai sobre os 12 primeiros artigos do Projeto de Lei do Senado nº 166 de 2010 para construção do Novo Código de Processo Civil. Nesta concepção neoconstitucional contemporânea as normas processuais tomam a feição de regras ou princípios. Também se estabelece direta ligação entre a Constituição da Republica e a legislação infraconstitucional.21 Essa tendência ideológica é flagrante, pois adotada pela autuação pelo Senado do PLS 166/10, de texto formado por 1008 artigos divididos em cinco 18

ALMEIDA, Rafael Alves de, ALMEIDA, Tania e CRESPO, Mariana Hernandez, Op. cit., p. 98 GARCEZ, José Maria Rossani. Negociação. ADRS. Mediação. Conciliação e Arbitragem, 2ª ed. rev. e ampl., 2ª tiragem rev. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, pp. 50/51 20 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryan. Acesso à Justiça, trad. e rev. Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre: Sergio Antônio Fabris Editor, 2002, pp. 162/163. 21 PINHO, Humberto Dalla Bernardina de. Os princípios e as garantias fundamentais no projeto de Código de Processo Civil: breves considerações acerca dos artigos 1º ao 12 do pls 166/2010. Disponível em . Acesso em 10 maio 2013, pp. 01/02 19

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livros, quais sejam: Parte Geral, processo de Conhecimento, Processo de Execução, Processo nos Tribunais e meios de impugnação, e Disposições finais e transitórias, a parte geral dividida por 11 títulos, em razão da intencional ligação entre as normas infraconstitucionais com os princípios processuais da atual Carta Magna. O Título I refere-se aos Princípios e Garantias, das normas processuais, da jurisdição e da ação e, a abordagem dos primeiros artigos do capítulo I, intitulado “Dos Princípios e Garantias Fundamentais do Processo Civil”.22 Ressalta-se que o texto base, como primeira versão do Projeto, já recebeu nova versão que incluiu mais de 700 sugestões obtidas em audiências públicas, sugeridas por órgãos governamentais e pela sociedade civil, disponibilizada em fins de novembro de 2010, mas que ainda será objeto de votação. Portanto, ora a versão original passa por debate pela Comissão de Juristas, ocorrendo as modificações sucessivas apresentadas por Substitutivo demonstrado pelo Senador Valter Pereira.23 O artigo 1º do Projeto do Novo CPC determina que o processo conterá nova forma de ordenação, disciplina e interpretação a aproximá-lo com os valores e princípios da Constituição. O legislador adotou a Teoria do Direito Processual Constitucional, unindo o direito adjetivo com os postulados de justiça constitucionalizada, o que torna indispensável observar a tendência evolutiva natural do processo, eis que inserido numa sociedade dinâmica, já intuída e desejada por Mauro Cappelletti nas suas ideias sobre as três “Ondas Renovatórias” que indicavam os pontos de estrangulamento do direito processual a produzir deficiência na justiça, no período Pós Segunda Guerra Mundial.24 Mauro Cappelletti, resistente ao Dogmatismo e ao Positivismo, defendia o acesso à justiça por meio da extinção do exagero formal do processo, que já havia encontrado a sua essência e, a autonomia do direito substantivo. Conforme as explanações do processualista Humberto Dalla, passou-se a compreender que o processo obteve quatro grandes fases de evolução: a primeira fase, em 1970, relativa ao acesso à justiça; a segunda, em 1980, com a preocupação sobre a instrumentalidade do processo; em 90, a efetividade do processo; em 2000 tendência do processo à jurisdição adequada.25 O processo pode amadurecer e se renovar, alcançando o ponto de equilíbrio entre o dinamismo eficiente que a sociedade contemporânea exige (rapidez e 22

PINHO, Op. Cit., pp. 01/02 Idem, Ibidem, pp. 01/02 PINHO, Op. cit., p. 03 25 Aula memorável do processualista Humberto Dalla Bernardina de Pinho, em 06 de Março de 2013, durante o Curso de Pós-Graduação Stricto Sensu – Mestrado em Direito da UNESA, linha de pesquisa Acesso à Justiça e Efetividade do Processo. 23 24

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agilidade no julgamento) e a garantia da sofisticação técnica jurídicoprocessual, mas condizente com a cultura da sociedade brasileira e, com a cooperação moral desta, a dar efetividade aos princípios processuais constitucionais garantidores do processo justo; deve-se querer mais, a decisão justa, e o processo composto de elementos, premissas, ferramentas indispensáveis à execução de um sistema de controle, monitoramento e avaliação da viabilização desses princípios constitucionais à manutenção do mesmo como instrumento legítimo.26 A garantia do acesso à justiça, como direito fundamental, não se restringe ao direito do cidadão de recorrer ao Estado provocando a função jurisdicional quando entender ter sofrido lesão a algum direito a ser satisfeito, mas inclui o direito de defesa, um dos mais importantes: o direito de ser ouvido (o que é totalmente viabilizado pela mediação) para contribuição na formação do convencimento do julgador (o que é substituído pela autocomposição pelos mediandos) e, portanto, de influir, diretamente, na atividade jurisdicional, principalmente por quem figura no polo passivo de uma ação judicial.27 Neste aspecto, importante a atuação contributiva de métodos alternativos de solução de conflitos na seara jurídico-processual. Mas, para legitimidade desse entrosamento, indispensável se faz a afinação dessa adaptação conforme o que dispõe os princípios e normas do processo constitucionalizado. Essas discussões, na via acadêmica, bem como os esclarecimentos em Audiências Públicas sobre a legislação adequada à adoção da mediação judicial, a inserção de conteúdo sobre os métodos alternativos de solução de conflitos no ensino formal nacional, o estímulo ao desenvolvimento e uso da mediação nas controvérsias que envolvem políticas públicas28 e, os pareceres de expertises na matéria sobre direito adjetivo focalizados na conscientização geral relativa à pacificação social e, principalmente, nas questões que se refiram à adequação do uso da mediação e conciliação na Justiça, mas em conformidade com o processo, com os direitos, princípios e garantias constitucionais processuais, são discussões imprescindíveis.

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PINHO, Op. cit., p. 03 GRECO, Leonardo. Garantias Fundamentais do Processo: O Processo Justo. Disponível em . Acesso em 22 Junho 2013, p. 04 28 SOUZA, Luciane Moessa de. Mediação de conflitos coletivos: a aplicação dos meios consensuais à solução de controvérsias que envolvem políticas públicas de concretização de direitos fundamentais. Belo Horizonte: Forum, 2012, pp. 15/16 27

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I.ii. Princípio do Contraditório: sua possível mitigação em razão da adoção da mediação no processo O Princípio do Contraditório encontra-se previsto no artigo 5º, inciso LV do atual Diploma Constitucional e no artigo 9º do Projeto 166/2010 do Novo Diploma Processual brasileiro. Sendo essencial ao processo, basta haver o procedimento em contraditório para que haja processo, conforme o processualista Elio Fazzalari. Ao contrário de Fazzalari, Cândido Rangel Dinamarco conclui que o processo é todo procedimento em contraditório ativado por uma relação jurídica processual.29 O contraditório se manifesta através do diálogo entre as partes, desenvolvido por meio da ciência dos termos e atos do processo, permitindo a todos, justamente em razão da ciência prévia, a correspondente manifestação sobre cada ato e termo processual praticado. Por meio do contraditório, portanto, se permite às partes, bem como aos eventuais terceiros, a participação deliberativa e em iguais condições, podendo interferir no destino decisório final do processo anteriormente à formação do convencimento do julgador. Neste sentido, ao longo do procedimento de mediação, o diálogo entre as partes é travado, tão somente, entre ambas, sem a direta participação de eventuais terceiros no conflito. Há o instrumento da Rede de Pertinência, às vezes utilizado na mediação, que é o chamamento de terceiro a integrar a lide sociológica quando envolvido de forma indireta no conflito, mas ainda assim, restar importante sua presença para o cumprimento de eventual entendimento ou acordo entre os mediandos, os protagonistas do conflito. Com relação à Teoria do Processo, a mesma pode ser considerada suficiente a explicar o fenômeno da adequação do uso da mediação pelo Judiciário (por isso a intitulação mediação paraprocessual) sem colisões significativas com a sistematização peculiar exigida pelo Princípio do Contraditório, sob certo aspecto, quando é apresentada por Fazzalari por defender que, basta haver contraditório para que haja processo, o que não é suficiente para Cândido Rangel Dinamarco, por acreditar que, para haver procedimento (jurisdicional ou não)30 em contraditório, deverá o mesmo ser formado por uma relação jurídica processual. A vertente a qual é defendida por Fazzalari é facilmente constatada quando um litígio objeto de tratamento pela mediação paraprocessual gera imediata desconsideração das relações jurídicas processuais que geraram aquele primeiro, isso porque ocorre a suspensão da ação judicial para ingressar no tratamento pelo método alternativo endoprocessual, restando a lide sociológica, 29 30

PINHO, Op. cit., p. 17 Idem, Ibidem, p. 17

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autônoma e independente do contexto jurídico, ou seja, somente o conflito. Por isso estarem o acordo entre os mediandos e, a própria mediação, ao critério dos mesmos. Nota-se na mediação paraprocessual a presença do contraditório oral, no seu aspecto informal, indispensável ao próprio caminhar da mediação, pois durante o seu procedimento é obrigatória a observância de verdadeiro diálogo ordenado e instantâneo, paritário e simétrico, a dar vazão à expressão oral dos mediandos, mas sem estar o diálogo preso à relação jurídica processual, inclusive suspensa para ingressar na mediação judicial, o que não é defendido por Cândido Rangel Dinamarco, por acreditar dever sempre existir a relação jurídica processual para que exista procedimento em contraditório regedor do processo. Portanto, quando analisada a Teoria do Processo no âmbito da mediação incidental à ação, resta flagrante a existência de relação conflituosa interpessoal tratada por método “alternativo” autocompositivo, dentro do próprio judiciário mas, sem a existência de duas posições adversariais, como as contidas nas figuras de vítima/agressor, credor/devedor, vítima/culpado, que existiriam numa relação jurídica processual convencional submetida à análise do magistrado, sob o controle do contraditório jurídico-formal. Fazendo análise sob outro aspecto, ainda que não haja relação jurídica processual na mediação, o que, num primeiro momento, poderia impedir a formação do contraditório, há alguns aspectos ideológicos dele presentes na mesma, aspectos característicos do Princípio do Contraditório e, que estão flagrantemente presentes, principalmente, na condução das sessões conjuntas: no igual número de minutos concedido a um mediando para fala, sendo permitido ao outro, proibida a interrupção no momento da fala de um pelo outro, número e tempo iguais de sessões privadas para ambos, atos que conduzem ao tratamento paritário, simétrico, contribuidores ao acordo que, se não concretizado na mediação, será a questão principal do litígio melhor transmitida ao Juiz quando a relação jurídica processual ser resgatada no âmbito judicial-adversarial. O momento da fala, reservado aos mediandos, corresponderia à oportunidade concedida às partes, no âmbito jurídico formal adversarial e do contraditório formal, para cumprimento de despachos alternados, determinados pelo magistrado. Contudo, inexiste na mediação a necessidade de juntada de documentos comprobatórios, produção de provas, pois a mediador não é o julgador. Nota-se que tampouco há, no ponto de vista da mediação, a necessidade de participação dos mediandos para preparar o convencimento do 69

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magistrado, eis que inexiste a presença da figura de um julgador. Neste ponto, o contraditório “formal” não faz sentido para a mesma. Na mediação paraprocessual a processualística é inversa. O mediador permanece absolutamente distante de elementos e recursos jurídico-probatórios disponíveis pelo direito, pois assim é resguardada a sua imparcialidade e neutralidade, elementos estruturais fundamentais à formação da segurança dos mediandos na pessoa do mediador, garantindo, desta maneira, a mediação legítima, mais promissora, no ponto de vista da total possibilidade de condução do mediador a gerar bons frutos na autocomposição do acordo pelas partes. Quando estimula-se as partes ao encontro de opções para a resolução de um conflito31, ou de uma briga, na realidade necessário não é a permanência, como cães farejadores, na procura da verdade real, mas tão somente, focar nas principais versões expostas na fala de cada uma dos mediandos32 e, fixar nos interesses, questões e necessidades comuns a ambos.33 Através da fala dos mediandos restará flagrada a origem do conflito ou, o caminho a ser tomado para a aproximação da origem do mesmo, o que já é suficiente a auxiliar o mediador para conduzir os mediandos a atacar as controvérsias e, não mais, a si mesmos. A mediação pode servir como um tratamento para dissolver medos, conflitos internos, esperanças frustradas, inseridos em relações interpessoais de cunho continuado, que se não tratados, podem provocar uma guerra ou, uma escalada do conflito sem precedentes. E, sendo claramente detectados, podem servir para a busca da solução do conflito. Com relação ao contraditório “informal”, manifestado na mediação judicial, pode ser constatado a partir da própria expressão que o constitui como garantidor da ciência bilateral dos atos e termos do processo, jurisdicional ou não.34 Aqui, pode-se pinçar que o mencionado processo não jurisdicional se constituiria na hipótese da mediação incidental ou paraprocessual que, por meio da oralidade, permite a ciência bilateral instantânea pelos mediandos, em 31

Nesse parágrafo estão expostas três técnicas importantíssimas a serem usadas pelo mediador. A primeira intitula-se Geração de opções/perguntas orientadas a geração de opções, uma das ferramentas mais eficientes para superação de impasses. O papel do mediador, como facilitador passivo (na mediação “passiva”, que é a paraprocessual e, a adotada pelo Judiciário), o que o diferencia do conciliador (mediação “ativa”) não sugere soluções. Portanto, por meio de perguntas, estimula as partes a pensarem em novas opções para resolução de seus impasses. É o momento no qual é desenvolvido o papel educativo da mediação. 32 Audição de Propostas Implícitas, pois o mediador que mantem a escuta ativa no momento das duas versões expostas por cada mediando consegue captar quando ambos, implícita e involuntariamente, sem perceberem (porque estão vidrados no conflito), propõem suas próprias soluções para seus impasses. 33 Identificação de Questões, Interesses e Sentimentos. Deve ocorrer na maior parte do procedimento e, pela fala dos mediandos o mediador consegue separar os interesses reais, dos subterfúgios e, os sentimentos negativos que poderão ser trabalhados, preferencialmente, em sessões individuais para a desconstrução do conflito. 34 Idem, Ibidem, p. 17

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interação absoluta, por meio do diálogo deliberativo, sobre todas as questões que envolvem o conflito. Trazendo a análise da expressão que menciona sobre a ciência bilateral dos atos e termos de um procedimento, no âmbito do método alternativo resolutivo, com a consequente possibilidade de manifestação sobre os mesmos pelos mediandos, é notável que essa garantia do contraditório “informal” é reservada a ambos durante a mediação, já que o andamento da mesma se dá na presença dos dois, realizado por meio da manifestação instantânea dos dois, conduzidas as sessões por mediador, desenrolada só na presença dos dois mediandos e, por meio do diálogo travado entre os próprios. A mediação funciona como um espaço extra-campo jurídico, aberto ao diálogo. O enfoque jurídico constante do Princípio do Contraditório (formal), por esta razão, não possui papel, tampouco espaço ou função no âmbito da mesma, eis que não há foco adversarial, nem a necessidade de contestação de fatos alegados pelo autor para se evitar serem aqueles primeiros, tidos como verdadeiros, ou até a declaração da revelia do réu, tampouco a comprovação de alegações por meio de documentos, pois não há relação jurídica processual, já que a ação judicial foi suspensa para se iniciar a mediação. O único documento existente no método é o Termo de Entendimento, acordo produzido pelas partes, com a ajuda, até certo ponto, dos mediadores que ajudarão na linguagem escrita, simples, para adaptação de seus termos ao jargão jurídico, mas sem a necessidade de excessivo rigor técnico-jurídico. E não é por esta razão que não deva ser a sua condução administrada sem o crivo do Princípio do Contraditório, mas é que, talvez, a essência positivista do contraditório “formal” em nada contribua com o procedimento da mediação. Contudo, nota-se que a dinâmica do contraditório está inserida na mediação, como já referido. O que se deve indagar é em quais aspectos a mediação, portanto, contribui com o direito e, com o Poder Judiciário?

Considerações finais A esta altura do presente artigo, focando na sobreposição do procedimento de mediação com o Princípio do Contraditório, um dos princípios basilares do processo, estabelecido pelo artigo 9º do PLS 166/2010, que traz proteção substancial ao Diploma Processual brasileiro, nota-se que a mediação não corresponde com algumas particularidades do contraditório “formal”, eis que é um método de origem distinta do direito e, com o escopo de tratar as relações humanas sob outro viés: a lógica da composição de interesses. Por isso a sua 71

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“colidência” com o processo ser, talvez, até inevitável, mas, necessária no momento atual. Não que a mediação esteja fundada sobre um mecanismo próprio ou, que seja um método inconstitucional, mas a razão é que por ser uma bela técnica de pacificação social, é leve, composta por conceitos fáceis porque seu único intuito é o de proporcionar a paz, a reconciliação e, o entendimento entre as pessoas. A mediação tem origem na psicologia, na matemática, semiótica, em outras ciências que, não o direito. Entretanto, o momento atual requere essa parceria, que ora é perfeita: o direito e a mediação. Fundamental também se faz a vigilância do direito sobre esse procedimento inserido no Judiciário à reserva dos princípios e garantias constitucionais relativos ao processo e, como reflexo, ao bom aperfeiçoamento da mediação, no que couber, obviamente, pois assim também a legitima. A mediação, como técnica galgada em intensa simplicidade, possui princípios e regras também frágeis, que ficariam muito vulneráveis à descaracterização absoluta deste método pacificador se fossem forçosamente adaptados para satisfazer a rigidez positivista e, o cumprimento das formalidades de um conjunto de regras formadoras e condutoras do processo, ainda muito ligadas no contexto adversarial e, inclusive, adjudicatório. Em razão deste método pacificador ter o foco principal na qualidade e na sustentabilidade do diálogo entre as pessoas, via um “bate-papo” transformador das brigas em entendimento, inviável se torna a alteração, muito significativa, na sua estrutura. Por essa razão que os Estados Unidos da América e Argentina, já há muito, fornecem o conhecimento sobre Mediação (EAU no âmbito escolar, Argentina, pré-judicialmente), por entenderem como pode ser simples e fácil desconstruir um conflito, principalmente quando visto como elemento formador inevitável na vida do homem e presente, previamente, como fomentador, em todas as ações judiciais, pois se assim não fosse, elas não se materializariam no Judiciário. Até uma criança, em sua idade tenra, pode transformar uma briga em entendimento. É só desfocar as posições adversariais, manter-se neutro e imparcial e, estar aberto de “corpo e alma” para ajudar dois semelhantes que se encontram em estado raivoso, na iminência de praticar a violência verbal ou, até mesmo, física. A nova era está para o direito processual, mas também para os cidadãos, que precisam cooperar com o Estado e, com os mecanismos de prevenção de litígios disponibilizados por ele, concretizando a pacificação no cotidiano social. Por isso a mediação possuir um caráter educativo, disciplinando as partes a sustentarem uma escuta ativa entre ambas, pelo debate ordenado e respeitoso, trazendo a si, mutuamente, o equilíbrio emocional para fazerem suas escolhas 72

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em conjunto, através da demonstração saudável de seus desejos, anseios, medos, mágoas, ao alcance da superação mútua e, à consequente busca de objetivos comuns como regência de seu próprio destino, em total independência e autonomia com relação às decisões adjudicatórias estatais. Prazeroso imaginar se os Tribunais de Justiça pudessem exercitar, após devido processo seletivo e preenchimento oficial de cargos por mediadores judiciais, essa desconstrução do conflito, todo o tempo, nos litígios contínuos de família, de vizinhança, pelo menos... Ironicamente, a mediação tampouco inclui em suas técnicas o exaurimento de etapas com o cumprimento de normas jurídico-processuais conforme dispõe o artigo 9º do Projeto 166/2010, mas instiga o contraditório informal, oral e dialógico, natural e, intrínseco que sempre se fará presente e, indispensável em todas as relações humanas sociais, políticas, jurídicas, econômicas e, que efetiva os direitos e garantias processuais contidos na ordem constitucional, no âmbito do Estado Democrático e Social de Direito brasileiro. A mediação judicial pode promover acordos parciais. Também viabiliza o Teste de Realidade, técnica que permite a experimentação de alguns objetivos e interesses autocompostos pelos mediandos para serem aplicados na vida cotidiana, por exemplo, de um casal e filho, quando a mediação, envolvendo direitos e deveres na seara de família, clama a conclusão, por si próprios, sobre qual seria a melhor forma de guarda (alternada ou compartilhada) do menor e, suas novas condições e cláusulas, só obtidas pelo cotidiano familiar experimental. Nesse aspecto, a mediação proporciona a decisão justa ao menor, resultante da experimentação de interesses positivos, mediados, na vida cotidiana das pessoas. Ela servirá como técnica auxiliar do Judiciário no tratamento distinto dispensado a cada tipo diverso de litígio por sua ligação com o conflito, pois, ainda que se encontre o Judiciário em estado de colapso, o cidadão “quer ver” justiça. Deve-se, pela “boa oportunidade” que ora se apresenta, utilizar a mediação nas escolas, universidades, como resposta positiva na consideração deste método estimulador nas políticas públicas, na política educativopedagógica a nova cultura pacificadora a minimizar o conflito e as ações judiciais, preventivamente, implantando a mediação no ensino do país, o que já vem tardiamente. E, ainda que não haja acordo, como resultado final das sessões de mediação, as partes conseguem conduzir de forma mais branda a peleja quando retornam ao processo judicial. Por isso se faz imprescindível a pesquisa de satisfação do usuário, neste aspecto. Quanto mais informações a justiça obtiver quanto à 73

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impressão que o usuário obteve sobre o serviço que lhe foi oferecido pela mediação, melhor poderá se tornar o mesmo, pelo Tribunal. Quando o resultado final das sessões de mediação se constitui pela autocomposição integral de um entendimento através do documento adequado, o Termo de Entendimento, viabiliza-se a conversão do documento em sentença homologatória de acordo pelo juiz para lhe conceder força de título executivo judicial, se assim for do interesse das partes. Ao cidadão deve ser concedido o direito de conhecer e usufruir de outro procedimento não adjudicatório como serviço disponibilizado pelo Estado, pois já que inserido num conflito que lhe traz desconforto emocional, lhe conceda, em contrapartida, uma escuta ativa (técnica utilizada na mediação), podendo optar pelo fim do conflito, o que conduz na efetividade do processo judicial e no acesso à justiça, já que é sabido que a autocomposição produz bem-estar às partes pela capacidade de ambas na autodeterminação e autossuficiência, proporcionando outros benefícios, dentre eles, mais economia financeira, menos desgaste emocional e, até a efetividade dos Princípios Constitucionais Processuais da Cooperação e da Razoável Duração do Processo, constantes do próprio Projeto 166/2010 do Novo Código de Processo Civil, o que pode parecer, neste ponto, algo paradoxal. Não se sabe como se dará a recepção cultural e jurídica sobre a utilização da mediação no Judiciário, pela sociedade brasileira. Poderiam ser utilizados, para a harmonização das técnicas e elementos essenciais estruturais da mediação, tais como a confidencialidade nas sessões individuais, a flexibilidade procedimental, a informalidade, a oralidade, com as garantias e Princípios Constitucionais Processuais da Publicidade, do Contraditório, a maior referência guiada pelos Princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade para que sirvam de apoio aos critérios da boa aplicação e ao uso adequado da mesma, obrigando a observação do processo constitucionalizado, mas evitando também a mera obsessão positivista no exaurimento de regras e procedimentos que acabam por distanciar o cidadão, paradoxalmente, do acesso à justiça, da própria efetividade do processo e, consequentemente, da decisão justa, essa última que também pode ser construída pelas próprias partes, autocompositivamente, com a mediação paraprocessual, principalmente nos conflitos de cunho continuado.

Referencias Bibliográficas ALMEIDA, Rafael Alves de; ALMEIDA, Tania; CRESPO, Mariana Hernandez (org.). Tribunal Multiportas: investindo no capital social para maximizar o sistema de solução de conflitos no Brasil. Rio de Janeiro: FGV, 2012.

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MEDIAÇÃO PARAPROCESSUAL NO JUDICIÁRIO BRASILEIRO: SUAS TÉCNICAS, PRINCÍPIOS, PARADOXOS E COLISÕES COM O PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO ALICE BOECHAT DA COSTA SOARES AZEVEDO, André Gomma de (org.) Manual de Mediação Judicial. Brasília/DF: Ministério da Justiça e Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD, 2009. BUHR, Alexandre Dittrich. A Arte do Pacificador, 2ª. ed. Florianópolis: Conceito Editorial, 2007. CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à Justiça, trad. e rev. Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 2002. GARCEZ, José Maria Rossani. Negociação. ADRS. Mediação. Conciliação e Arbitragem, 2ª ed. rev. e ampl., 2ª tiragem rev. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004 GRECO, Leonardo. Garantias Fundamentais do Processo: O Processo Justo. Disponível em . Acesso em 22 Junho 2013. GRINOVER, Ada Pellegrini; WATANABE, Kazuo; NETO, Caetano Lagrasta (coord.). Mediação e Gerenciamento do Processo: guia prático para a instalação do setor de conciliação e mediação. Com Prefácio de Vicenzo Vigoriti, 2. Reimpr.- São Paulo: Atlas, 2008. MARTÍNEZ, Gregório Peces-Braba. Lecciones de Derechos Fundamentales (Colección Derechos Humanos y Filosofía del Derecho). Editora Dykinson. PINHO, Humberto Dalla Bernardina de. Direito processual civil contemporâneo, vol. 1: teoria geral do processo, 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012. ____. Os princípios e as garantias fundamentais no projeto de Código de Processo Civil: breves considerações acerca dos artigos 1º a 12 do pls 166/10. Disponível em: Acesso em 10 maio 2013. SOUZA, Luciane Moessa de. Mediação de Conflitos Coletivos: a aplicação dos meios consensuais à solução de controvérsias que envolvem políticas públicas de concretização de direitos fundamentais. Prefácio de Humberto Dalla Bernardina de Pinho. Belo Horizonte: Fórum, 2012.

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OS PRINCÍPIOS ORIENTADORES DA MEDIAÇÃO NO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL E AS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS Marina Beatriz Pereira Corrêa Raquel Helena Duarte Cordeiro O texto aborda os princípios informadores da mediação tratados no PL 8.046 de 2010 (§ 1º do art. 144) com intuito de observar a sua importância como meio mais adequado para heterocomposição de litígios. O texto também intenta demonstrar como alguns princípios processuais assegurados na Carta de 1988 imbricam-se em determinados pontos com a proposta da mediação. A saber: a) princípio da independência e da autonomia da vontade versus inafastabilidade do Poder Judiciário; b) informalidade versus devido processo legal; c) confidencialidade versus publicidade; d) mitigação do princípio da razoável duração do processo. Em outros pontos esses princípios reforçam a ideia da mediação enquanto meio promissor – caso da neutralidade que é confirmada pelo princípio da imparcialidade.

I. Conceito e classificação da mediação O passo inicial do presente artigo é a definição do que vem a ser a mediação enquanto método consensual de solução de litígios, para, então, poder partir aos aprofundamentos do tema. A princípio, a doutrina conceitua: A mediação é uma espécie de autocomposição coordenada por uma terceira pessoa, o mediador, que é um profissional qualificado que atua no intuito de levar os litigantes a uma solução embasada na identificação e eliminação das causas que geraram o conflito. Assim, os litigantes chegam por si próprios à solução mais acertada para sua desavença, em comum acordo. (WAMBIER, 2011).

Daí extrai-se o cerne desse método, qual seja a busca das partes não somente à solução do conflito, mas a solução de sua causa evitando, assim, que novos conflitos da mesma ordem se dêem naquele âmbito (ao menos no que tange às partes envolvidas).

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Um ponto a se destacar é que na mediação tem-se um terceiro, o mediador, que irá levar às partes ao consenso, podendo sugerir soluções, mas nunca intervindo diretamente na negociação em pauta. Confirmando essa ideia, nos ensina Humberto Dalla¹: Entende-se a mediação como o processo por meio do qual os litigantes buscam o auxílio de um terceiro imparcial que irá contribuir na busca pela solução do conflito. Esse terceiro não tem a missão de decidir (e nem a ele foi dada autorização para tanto). Ele apenas auxilia as partes na obtenção da solução consensual.

Ainda neste sentido é o art. 145 do PNCPC (Projeto do Novo Código de Processo Civil): Art. 145. A realização de conciliação ou mediação deverá ser estimulada por magistrados, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial. [...] § 2º O mediador auxiliará as pessoas interessadas a compreenderem as questões e os interesses envolvidos no conflito e posteriormente identificarem, por si mesmas, alternativas de benefício mútuo. (grifos nossos)

Outro ponto a se destacar no art. 145 supra é que o legislador traz à baila a mediação ao lado de outro instituto, a conciliação. Não rara é a confusão encontrada entre esses institutos, entretanto, há que se destacar algumas diferenças: a conciliação só se dará de maneira endoprocessual, diante de um conciliador representante do Poder Judiciário, podendo se dar em qualquer momento no processo. A mediação, ao contrário, pode ser realizada tanto no do decorrer do processo, como pode ser um procedimento extrajudicial. Ela pode ocorrer “antes da procura pela adjudicação. Contudo, nada impede que as partes, já tendo iniciado a etapa jurisdicional, resolvam retroceder em suas posições e tentar, uma vez mais, a via conciliatória”². Essa é a mediação incidental, aquela que decorre do processo judicial, nascendo de um processo já existente. A mediação pode ser, ainda, passiva ou ativa. É passiva quando o mediador não intervém diretamente no procedimento da solução dos litígios, apenas ouvindo e facilitando a solução da controvérsia. Por outro lado, será ativa quando o mediador intervier diretamente, realizando propostas conciliatórias ou outras soluções. A mediação ativa muito se assemelha à conciliação, e acaba por ser afastar da intenção central da mediação, qual seja a solução da controvérsia de maneira 77

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livre pelas partes em litígio. Dessa maneira, entende-se por não ser a maneira que mais convém dentro deste tipo de procedimento. Ainda, há que se destacar que a mediação, ao contrário da conciliação, não se dá, necessariamente por operadores do direito. Ao contrário, há quem aconselhe a maior eficiência deste meio mais adequado quando realizado por outros profissionais, como por exemplo, psicólogos, psicanalistas, etc, auxiliados paralelamente por um operador do direito, atuando este como um comediador. Interessante notar que, ao revés do defendido pelos estudiosos do tema, o PL 8.046 de 2010 só traz a possibilidade expressa da mediação, assim como a conciliação, quando ambas se encontrarem inseridas do âmbito processual, com conciliadores e mediadores devidamente registrados nos cadastros dos tribunais, sendo ainda vedado aos conciliadores e mediadores cadastrados o exercício da advocacia, quando for o caso, conforme § 5º do art. 147 do referido Projeto de Lei: Art. 147. Os tribunais manterão um registro de conciliadores e mediadores, que conterá o cadastro atualizado de todos os habilitados por área profissional. [...] § 5º Os conciliadores e mediadores cadastrados na forma do caput, se inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil, estão impedidos de exercer a advocacia nos limites da competência do respectivo tribunal e de integrar escritório de advocacia que o faça.

Todavia, somos do entendimento que essa vedação legal pode acabar por interferir no propósito da mediação. Entendemos, por outro lado, que o fato de haver hoje normatização quanto à mediação já representa grande avanço a tal procedimento, atuando na difusão da mediação e auxiliando, ainda, a desafogar o judiciário naquelas causas onde é cabível a mediação.

II. Princípios da mediação no Projeto do novo CPC O Projeto de Lei 8.046 de 2010 visa trazer para o ordenamento jurídico brasileiro muito mais do que uma reforma processualística, mas a construção de um novo código de processo civil. Ao que nota-se logo do art. 1º, o Projeto tem como objetivo ser ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e princípios fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil. Art. 1º. O processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e os princípios fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código.

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Frente à emersão do referido projeto nos valores e princípios fundamentais constitucionais, o mesmo buscou em seu texto firmar a mediação como meio eficaz e democrático de pacificação social. Para tanto, em seu art. 144, §1º, norteou o funcionamento da mediação por meio do principio da independência, neutralidade, autonomia da vontade, confidencialidade, oralidade e informalidade. Art. 144. Cada tribunal pode criar setor de conciliação e mediação ou programas destinados a estimular a autocomposição. [...] § 1º. A conciliação e a mediação são informadas pelos princípios da independência, da neutralidade, da autonomia da vontade, da confidencialidade, da oralidade e da informalidade.

O princípio da independência pontua a condução da mediação a fim garantir que a mesma seja realizada de modo que o interesse de apenas um dos particulares envolvidos no conflito não venha influenciar a composição deste. Assim, a imparcialidade dos sujeitos é coroada, não podendo o acordo ser induzido por qualquer uma das partes. No que condiz ao princípio da neutralidade, existe a ideia de imparcialidade do mediador ao conduzir a lide, não podendo haver interesse específico sobre o litígio. Assemelha-se ao principio da imparcialidade existente para a atuação dos magistrados e árbitros. Cabe ressaltar que, caso ocorra a parcialidade do mediador, o mesmo deve ser afastado de sua função sob pena de vício do acordo firmado. A autonomia da vontade foi introduzida no referido projeto a partir da ideia do referido princípio consagrado no direito contratual. Em suma, a mediação é uma forma autocompositiva, na qual competem as partes a solução do litígio. Diante disto, tal princípio seria atingido em decorrência do caráter voluntário do meio e em virtude das partes chegarem juntas a um comum acordo para a composição do conflito, manifestando assim a vontade de ambas. O projeto respalda a mediação com o princípio da confidencialidade, pois os conflitos envolvem questões de foro íntimo das partes que, por vezes, não caberiam tornarem-se públicas. Assim, as partes podem ter plena certeza que o que será dito será utilizado unicamente para a realização do acordo, preservando a intimidade das partes. Tal princípio condiciona a função de mediador ao sigilo, de modo que são proibidos de depor ou divulgar o que for discutido pelas partes ao longo da mediação. No que tange a oralidade e informalidade, estes são princípios que se vinculam, pois ambos contribuem para a diminuição dos atos escritos e formais,

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promovendo a menor complexidade do procedimento e em um curto espaço de tempo.

III. Garantias constitucionais e os princípios informadores da mediação no PL 8.046 de 2010 Neste momento é preciso uma análise dos princípios de direito processual e princípios constitucionais, já que informam o proceder dos atos processuais. Vale ressaltar que a mediação, como já dito anteriormente, está prevista no referido projeto de lei de maneira endoprocessual, entretanto nada obsta que aconteça extraprocessualmente, é o que dispõe o art. 153 do projeto do novo CPC: Art. 153. As disposições desta Seção não excluem outras formas de conciliação e mediação extrajudiciais vinculadas a órgãos institucionais ou realizadas por intermédio de profissionais independentes.

Assim, a ponderação aqui realizada se dá no intuito do reconhecimento dos valores constitucionais e processuais do ordenamento vigente, comparando-os com o que nos informa o art. 144, § 1º do PL 8.046 de 2010 aqui já citado, para que, ao final, se possa observar as distinções atinentes ao processo como conhecemos e à mediação, método alternativo mais adequado na solução de determinados litígios. A intenção, por óbvio, não é atacar o processo, ou suas garantias. Mas deixar evidente que há outras maneiras de solução para controvérsias, e que estas podem e devem ser utilizadas e difundidas no meio jurídico. Desta vista, propomos traçar um paralelo entre os princípios processuais e constitucionais e os princípios informadores da mediação. III.i Princípio da independência e princípio da inafastabilidade do Poder Judiciário O princípio da inafastabilidade jurisdicional indica que aquele que vê seu direito lesado ou ameaçado pode se acorrer do Poder Judiciário para a solução legal do litígio envolvido, tal previsão encontra-se no art. 5º, XXXV da Constituição Federal de 1988, que versa que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. Neste sentido, o interessado deve provocar o Judiciário para ver sua pretensão analisada e ter a garantia de uma decisão que vá solucionar o conflito existente. 80

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O princípio da independência, por outro lado e como já dito, informa que não estão as partes atreladas a uma decisão impositiva sobre o conflito existente, já que elas devem ser livres para chegar à solução do conflito existente. Contrariamente ao observado nos processos judiciais, no procedimento da mediação não se tem a obrigatoriedade de acessar o judiciário, nem tão pouco de ver seu conflito decidido por base de uma decisão impositiva. E ainda que observado o procedimento da mediação dentro do processo judicial, este deverá facilitar às partes um acordo em comum, onde possam transigir quanto à solução mais adequada em cada caso. Outro ponto que podemos ver de maneira paralela ao princípio da inafastabilidade jurisdicional é a autonomia da vontade. A autonomia da vontade, como mencionado anteriormente, foi um principio consagrado no âmbito do Direito Privado, em particular no âmbito contratual. Entretanto, no âmbito do procedimento da mediação, pode-se entendê-la como a maneira pela qual o litígio será composto, ou seja, a importância da participação ativa das partes, sem intervenções externas (até mesmo do mediador), para uma solução consensual. Assim, a solução alcançada pelas partes deve se dar de maneira que estas observem os obstáculos envolvidos, podendo transigir sobre o acordo mais favorável para a retirada desses obstáculos, constituindo uma verdadeira manifestação da sua vontade e da intenção de solucionar o conflito. Desde modo, tal princípio veio a ser indispensável para nortear a medição, uma vez que esta se trata de uma forma autocompositiva, na qual cabe as partes envolvidas no conflito chegar a um resultado comum, o que acaba por tornar imprescindível a garantia da autonomia das envolvidos, a fim de que possam manifestar livremente as suas vontades na composição do acordo. Ao longo do âmago do Projeto de Lei 8.046 de 2010, o referido princípio foi destacado na redação do art. 145, §2º, bem como no art. 146, caput, como segue: Art. 145. § 2º O mediador auxiliará as pessoas interessadas a compreenderem as questões e os interesses envolvidos no conflito e posteriormente identificarem, por si mesmas, alternativas de benefício mútuo. Art. 146. O conciliador ou o mediador poderá ser escolhido pelas partes de comum acordo, observada a legislação pertinente.

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Tentando alcançar os objetivos da mediação, alguns tribunais brasileiros se lançaram a difundir tal método, como foi o caso do Tribunal de Justiça de Bahia e do TJ de Minas Gerais. Entretanto, observa-se que nestas tentativas, a mediação acabou por se dar de maneira muito atrelada ao judiciário, o que também ocorre no projeto do novo Código de Processo Civil. III.ii. Princípio da informalidade em paralelo ao princípio constitucional do devido processo legal O principio da informalidade visa o abrandamento dos rigores formais dos ritos, a fim de proporcionar as partes um resultado prático e efetivo, já que a mediação se trata de procedimento de autocomposição, no qual se ressalta o princípio da autonomia da vontade das partes para a solução do conflito. A informalidade anseia pela simplificação do procedimento, redução das formalidades e a redução da possibilidade de incidentes que possam postergar o resultado. Assim, pode-se caracterizar a mediação como um procedimento efetivo para a composição de conflitos que objetiva conduzir as discussões de modo a auxiliar as partes a chegarem a um resultado comum, destinando a estas a liberdade para organizar o procedimento a ser empregado na mediação. O referido princípio não dever ser utilizado como pretexto para a inviabilização da aplicação das garantias constitucionais. Contudo, mesmo assim, a redução das formalidades pode se contrapor com determinados princípios do ordenamento jurídico, como, por exemplo, o devido processo legal. O principio do devido processo legal está assegurado no artigo 5º, inciso LIV, da Constituição de 1988 que versa: “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”. No que condiz ao referido artigo, Bandeira de Mello ressalta uma importante consideração: Note-se que "privar" da liberdade ou da propriedade não é apenas simplesmente elidi-las, mas também o é suspender ou sacrificar quaisquer atributos legítimos inerentes a uma ou a outra. Vale dizer: a privação não precisa ser completa para caracterizar-se como tal.

Contudo, cabe destacar, que o devido processo legal é um princípio fundamental do qual se desdobram outros princípios, não se limitando apenas ao referido artigo constitucional. Assim, o devido processo legal vem garantir todos os meios inerentes para a defesa do direito como o direito ao contraditório, ampla defesa, a igualdade entre as partes, a proibição da prova ilícita, entre outros, conforme ressalva a doutrina: 82

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MARINA BEATRIZ PEREIRA CORRÊA RAQUEL HELENA DUARTE CORDEIRO O conteúdo da fórmula vem a seguir desdobrado em um rico leque de garantias específicas, a saber: a) antes de mais nada, na dúplice garantia do juiz natural, não mais restrito a proibição de bills of attainder e juízos ou tribunais de exceção, mas abrangendo a dimensão do juiz competente (art, 5º, incs. XXXVII e LIII); e b) ainda em uma série de garantias, estendidas agora expressamente ao processo civil, ou até mesmo novas para o ordenamento constitucional. (GRINOVER, 2011)

Uma vez que a mediação é adornada pelo princípio da informalidade, a mesma dispensa procedimento rígido ou rito específico, característica esta que leva as partes a prerrogativa de organizar o procedimento que será utilizado. Tendo em vista que a organização do procedimento acaba por ficar a mercê das partes envolvidas na composição, existe a possibilidade do princípio do devido processo legal ser fatalmente contraposto, pois algum ato do procedimento da mediação definido pelas partes pode afetar negativamente ou impedir a ampla defesa e o contraditório, violando o princípio da independência que, assim como o princípio da informalidade, também é taxado como um dos princípios orientadores da mediação. Por tal motivo, a figura do mediador, elencada no art. 145, §2º do Projeto de Lei nº 8.046 de 2010, é de suma importância, na medida em que o mesmo possui a função de auxiliar as pessoas interessadas a compreenderem as questões e os interesses envolvidos no conflito e, posteriormente, identificarem alternativas. Assim, as partes são auxiliadas e orientadas durante toda a mediação pelo mediador, de maneira a resguardar o principio da informalidade, do devido processo legal e da independência. III.iii. Paralelo entre a confidencialidade no procedimento mediatório e o princípio da publicidade O princípio da confidencialidade trás para a mediação o sigilo necessário para que todos os fatos, situações, documentos, propostas e informações realizadas ao longo do procedimento permanecem salvos de serem divulgados tanto durante como depois da composição do conflito. Obrigatoriamente, todos os participantes, inclusive o mediador, devem manter as informações em segredo, mesmo que seja para utilizá-las em um processo judicial futuro. Deste modo, as partes podem ter a segurança de que tudo que foi discutido não será exposto para outrem, garantindo a intimidade das partes e a autonomia da vontade das mesmas. O Projeto de Lei 8.046 de 2010, buscando guardar o referido princípio, trouxe em seu corpo de texto o art. 144, §§2º e 3º, bem como o art. 148, III: 83

MEDIAÇÃO JUDICIAL E GARANTIAS CONSTITUCIONAIS A MEDIAÇÃO E SEUS DESDOBRAMENTOS NA CONTEMPORANEIDADE Art. 144, § 2º A confidencialidade se estende a todas as informações produzidas ao longo do procedimento, cujo teor não poderá ser utilizado para fim diverso daquele previsto por expressa deliberação das partes. [...] § 3º Em virtude do dever de sigilo, inerente à sua função, o conciliador e o mediador e sua equipe não poderão divulgar ou depor acerca de fatos ou elementos oriundos da conciliação ou da mediação. Art. 148. Será excluído do registro de conciliadores e mediadores aquele que: [...] III – violar os deveres de confidencialidade e neutralidade;

O princípio da confidencialidade pode se mostrar favorável a mediação, mas aparentemente pode vir a esbarrar no princípio da publicidade. Contudo, a luz do art. 5º, LX da Constituição Federal, torna-se possível notar que a confidencialidade é um fator limitante à publicidade quando para a defesa da intimidade ou interesse social, quando este diz que “a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem.” O princípio da publicidade é mais uma garantia à imparcialidade e transparência das atividades jurisdicionais. Trata-se de uma importante ferramenta fiscalizatória, pois permite que a sociedade tome conhecimento das decisões e das movimentações realizadas pelo judiciário, conforme é garantido no art. 93, IX da Constituição Federal: Art. 93, IX. todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação.

Como já mencionado, o princípio da publicidade acaba por esbarrar na defesa da intimidade ou interesse social, destacando assim a linha tênue existente entre o referido princípio e o princípio da dignidade da pessoa humana, o qual também possui garantia constitucional. Observa-se que a mediação é um procedimento que visa à composição de conflitos de forma diferente da proposta pelo processo judicial. Na mediação as partes juntas discutem e refletem, a fim de chegar a um acordo que seja reflexo da decisão atingida por ambas. Trata-se de um procedimento envolvido pela autonomia das partes, no qual as mesmas expõem situações de foro íntimo, que quando difundidas na sociedade acabam por colocá-las em situação constrangedora, atingindo assim a dignidade da pessoa humana. Portanto, a confidencialidade chancelada pelo Projeto de Lei 8.046 de 2010 como principio orientador da mediação não pode ser caracterizada como violação ao princípio da publicidade, refere-se apenas a um princípio que veio 84

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limitar o principio da publicidade, já que a confidencialidade neste caso ocorre para defender a intimidade das partes. Contudo, cabe ressaltar ainda que a confidencialidade na mediação pode ser quebrada quando contrariar a ordem pública. III.iv. Mitigação do princípio da razoável duração do processo no decorrer da mediação O princípio da razoável duração do processo foi introduzido no ordenamento jurídico brasileiro pela Emenda Constitucional 45 de 2004, a chamada Emenda da Reforma do Judiciário, acrescentando o inciso LXXVIII ao art. 5º da Constituição, que diz que “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.” O projeto do novo CPC, seguindo a orientação constitucional, também trata deste princípio em seu art. 4º, dizendo que “as partes têm direito de obter em prazo razoável a solução integral da lide, incluída a atividade satisfativa”. Em tempo, este princípio encontra-se atrelado a celeridade processual, não devendo o judiciário ou as partes contribuírem para a mora na apreciação da lide. Todavia, na mediação, para alcançar os resultados pretendidos, se disporá de um tempo distinto, com reuniões frequentes numa busca consensual pela causa do conflito. Assim, a ideia de um tempo razoável para se processar uma demanda não se comportaria neste modelo, já que para as peculiaridades de cada caso, o tempo à disposição também será distinto. Este ponto deve ser ressaltado para que não se caia no erro que se tem observado, por exemplo, nas audiências de conciliação e audiências prévias ou preliminares. Neste sentido, destaca a doutrina que³: Obviamente chegar a um acordo por meio do processo de mediação não é tarefa fácil. Exige tempo, dedicação e preparação adequada do mediador. […] A mediação é um trabalho artesanal. Cada caso é único. Demanda tempo, estudo, análise aprofundada das questões sob os mais diversos ângulos. O mediador deve se inserir no contexto emocional-psicológico do conflito. Deve buscar os interesses, por trás das posições externas assumidas, para que possa indicar às partes o possível caminho que elas tanto procuravam. É um processo que pode se alongar por semanas, com inúmeras sessões, inclusive com a participação de comediadores, estando as partes, se assim for de seu desejo, assistidas a todo o tempo por seus advogados, devendo todos os presentes acordar quanto ao procedimento utilizado e a maneira como as questões são postas na mesa para exame.

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Observa-se, desta maneira, que a ideia de tempo razoável para a chegada num acordo em comum é por muito distinta da ideia do tempo razoável num processo jurisdicional mais complexo, e até mesmo do que temos visto nas audiências conciliatórias.

Considerações finais Finalmente, podemos extrair algumas conclusões acerca do tema abordado: (i) a mediação, enquanto procedimento mais adequado para a solução de determinados litígios não almeja a exclusão do processo como se conhece; (ii) a contradição superficial demonstrada entre a mediação e alguns princípios processuais constitucionais, em verdade, marca a diferença dos procedimentos distintos; (iii) a utilização da mediação deve ter cuidados especiais em seu proceder, em particular quanto à mecanização das decisões que se combate – e que vemos ocorrer aos montes em procedimento semelhante, como a conciliação. Em tempo, cumpre destacar que a mediação não é procedimento para ser usado em qualquer caso que se acorra ao judiciário. A mediação terá alcançado com louvor seus objetivos quando vislumbrada em relações interpessoais e continuadas. Uma decisão impositiva, que não perpasse os abalos e “porquês” da demanda, não pode ser considerada eficiente nessas situações. Aqui encontramos um dos pontos de atenção da mediação, e também o local onde se encaixa no cenário jurídico. A mediação, neste sentido, é procedimento de filtragem, não devendo ser enxergada como corrente. Neste sentido, a análise aqui realizada, contrapondo princípios informadores da mediação aos princípios processuais constitucionais não se verifica no sentido de evidenciar contrariedades existentes. Contudo, constata-se como elemento diferenciador de ambas as maneiras, a mediação e o processo judicial. Essa distinção importa na análise inicial do caso concreto, ou seja, na constatação da possibilidade do procedimento mediatório. A decisão pela tentativa de mediar pode surtir grandes efeitos no processo, inclusive no que tange à celeridade para a solução final. Contudo, o PL 8.046 não impede que as partes busquem a mediação em qualquer tempo. O espaço que este procedimento ganhou no Projeto do Novo Código de Processo Civil, em virtude de uma maior popularização dos meios alternativos de solução de conflitos, só tem a acrescentar ao ordenamento jurídico brasileiro, desafogando e oxigenando o Judiciário, além de conferir às partes a possibilidade de transigirem e alcançarem conjuntamente a solução mais adequada. 86

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Bibliografia WAMBIER, Luiz Rodrigues e TALAMINI, Eduardo. Curso Avançado de Processo Civil: Teoria Geral do Processo e Processo de Conhecimento, 12ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. NEVES, Daniel Amorim Assumpção Neves. Manual de Direito Processual Civil, 5ª ed. São Paulo: Editora Método, 2013. CINTRA, Antônio C. de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo, 27ª ed. São Paulo: Malheiros, 2011. MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo, 26ª ed. São Paulo: Malheiros, 2009. DALLA, Humberto. A mediação no direito brasileiro: evolução, atualidades e possibilidades no projeto do novo Código de Processo Civil. Disponível em: . Acesso em: 06 mai. 2013. DALLA, Humberto. Mediação: redescoberta de um velho aliado na solução de conflitos. Disponível em: . Acesso em 06 mai. 2013. DALLA, Humberto; DURÇO, Karol Araújo. A mediação e a solução de conflitos no estado democrático de direito. O “juiz Hermes” e a nova dimensão da função jurisdicional. Disponível em: . Acesso em: 06 mai 2013. DALLA, Humberto. A mediação na atualidade e no futuro do processo civil brasileiro. Disponível em: . Acessado em: 06 mai. 2013. CHATT, Cidinei Bogo. Mediação: um Meio Facilitador para Resolução de Conflitos. Disponível em: . Acessado em: 19 mai. 2013. DALLA, Humberto; PAUMGARTTEM, Michele Predrosa. A Garantia de Acesso à Justiça e o Uso da Mediação na Resolução dos Conflitos Submetidos ao Poder Judiciário. Disponível em: . Acessado em: 19 mai. 2013. Quadro Comparativo CPC atual e PL 8.046 de 2010. Câmara Legislativa. Disponível em:
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