Melkor, o Inimigo do Mundo: a constituição do vilão em J. R. R. Tolkien

June 29, 2017 | Autor: Alline Rufo | Categoria: J. R. R. Tolkien, Mikhail Bakhtin, Silmarillion, Hero and Villain
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IX Seminário de Pesquisas da Pós-Graduação em Linguística IV Seminário de Produção em Linguística Universidade Federal de São Carlos 30 de setembro, 1 e 2 de outubro de 2015

MELKOR, O INIMIGO DO MUNDO: A CONSTITUIÇÃO DO VILÃO EM J. R. R. TOLKIEN Alline Duarte Rufo (UFSCar – [email protected]) Resumo: O presente trabalho se propõe a compreender como nas relações dialógicas dentro da obra estética constitui-se o sujeito valorado como vilão. Delimita-se como objeto de compreensão Melkor, personagem presente na complexidade narrativa da obra O Silmarillion de J. R. R. Tolkien, obra relato da criação de Arda (mundo onde se passa as histórias de sua mitologia) e os acontecimentos de sua Primeira Era, incluído o surgimento de seu vilão. Recorre-se a teorias advindas da filosofia da linguagem, preconizadas pelo filosofo russo Mikhail Bakhtin, com o intuito de estabelecer um caminho para a compreensão da jornada que o vilão constitui nas suas relações de alteridade com discursos verbais, e não-verbais,a sua corporeidade, constituída como feia, monstruosa, grotesca. Palavras-Chave: Vilão; Melkor; Silmarillion; J. R. R. Tolkien; Mikhail Bakhtin; Abstract: This paper proposes to understand how the dialogical relations constitutes the subject valued as Villain. Defines as object understanding Melkor, this character in the narrative complexity of the work The Silmarillion by J. R. R. Tolkien, the history about Arda's (the world where goes the stories of its mythology) and the events of his First Age, including the rise your Villain. Using to theories arising from the philosophy of language, affirmed by russian philosopher Mikhail Bakhtin, in order to establish a path to understanding the journey of the Villain starting at otherness of verbal relations, his speech; and nonverbal, its corporeality, denoted as ugly, monstrous, grotesque. Keywords: Villain; Melkor; Silmarillion; J. R. R. Tolkien; Mikhail Bakhtin;

Muitos são os vilões que marcam as histórias das quais gostamos, apresentados como forma antagônica aos heróis tramando e persuadindo. Esse é apenas um olhar que se é possível ter sobre esses sujeitos e que, nesse trabalho, não será o nosso foco. Queremos enviesar esse olhar, abraçar e compreender esses sujeitos que são considerados vilões para alguns a partir de um determinado olhar, que pode ser herói em uma outra perspectiva, mas que principalmente, é na relação com os outros que ele se constituíra, como vilão ou como herói. O vilão tem como noção de caracterização ser considerado o mal em personificação. O mal entendido a partir de uma concepção judaico-cristã de oposição ao Bem, criando uma associação entre Bem/Herói/Sublime e

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Mal/Vilão/Grotesco. Nesse trabalho o objetivo é traçar uma jornada desse sujeito valorado como vilão, em contraposição a jornada do herói desenvolvida por Joseph Campbell em sua obra O Herói de Mil Faces, no intuito de compreender como ele se constituí em relação ao herói dentro da obra estética, mais especificamente, dentro de O Silmarillion de J. R.R. Tolkien. Como base teórica do nosso estudo, contamos com a colaboração do filosofo da linguagem russo, Mikhail Bakhtin para melhor compreensão desse sujeito. Utilizando de vários de seus preceitos teóricos, como a questão da alteridade nas relações dialógica dos sujeitos, o corpo grotesco e o signo ideológico. Segundo Bakhtin: Um produto ideológico faz parte de uma realidade (natural ou social) como todo corpo físico, instrumento de produção ou produto de consumo; mas, ao contrário destes, ele reflete e refrata uma outra realidade, que lhe é exterior. Tudo que é ideológico possuí um significado e remete a algo situado fora de si mesmo. Em outras termos, tudo que é ideológico é um signo. Sem signo não existe ideologia. (BAKHTIN, 2010b, p. 31)

Dado o teor ideológico do signo, podemos pensar que tudo que é ideológico é signo, então tudo que é signo é ideológico, tal fenômeno ocorre porque um produto ideológico faz parte de uma realidade, e ao mesmo tempo reflete e refrata um outra, pois esse produto possuí um significado e remete a algo situado fora de si mesmo. Ainda na concepção do autor, esse signo, parte de uma realidade e está sujeito a critérios valorativos ideológicos, ele pode distorcer, ser fiel, falso, verdadeiro, correto, justo. Nesse sentido, Inimigo, enquanto palavra, é um signo ideológico que se constituí na relação entre dois sujeitos falantes, pois segundo Ponzio (2013, p. 175): Tudo o que faz parte da realidade material pode tornar-se signo, e adquire tal valor somente na dimensão histórico-social. Ou seja, aquele que chamamos de inimigo, só é inimigo porque é um signo ideológico carregado com uma significação histórico-social entre dois sujeitos falante que possuem sua ideologia e estão socialmente organizados. E é através da palavra que podemos observar esse fenômeno. Para uma melhor compreensão dessa relação dialógica que constitui o Inimigo, que mais tarde se tornará Vilão, olharemos para uma obra estética, mais especificamente O Silmarillion de J. R. R. Tolkien. A obra em questão diz respeito a Primeira Era das Três Eras que constituem o mundo tolkeniano, que tem sua Terceira Era mais conhecida pelo público em geral dado a amplitude de alcance midiático a que chegaram as adaptações cinematográficas das obras O Senhor dos Anéis e O Hobbit por Peter Jackson.

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Em O Silmarillion temos o relato da constituição do mundo, em outras palavras o mito da criação desse mundo. No nada havia Eru, que dá para vida aos Valar, seres criados de seu pensamento e incube a esses um tema para que companham uma Música, nessa composição Melkor, um dos mais poderosos entre esses seres, se rebela sendo dissonante do tom estabelecido por Eru, tendo assim o primeiro questionamento e se constituindo como esse outro diferente, como Inimigo. Sendo assim, podemos compreender melhor o Inimigo de Melkor em O Silmarillion, pois é quando os sujeitos enunciam que podemos observar as palavras que são empregadas e os sentidos que estas carregam. Melkor só é considerado Inimigo por estar em relação com outros sujeitos que o denominam assim. No entanto, essa denominação se dá no meio ideológico e social no qual os sujeitos fazem parte. Desde o início de sua criação por Eru, Melkor, considerado o mais poderoso e com maiores conhecimentos entre os Valar, possuía, diferente de seus irmãos, o desejo de criar por contra própria, mas para isso era necessário ter a Chama Imperecível, que este nunca encontrou. E era nessas empreitadas em busca da chama que ele desenvolvia seus próprios pensamentos. Quando Eru propôs aos Valar que cantassem a Música, a dissonância surgiu a partir dos pensamentos independentes de Melkor, e é essa dissonância que é o primeiro questionamento das ordens de Eru. E é por questionar o discurso de Eru que Melkor então é considerado o inimigo. Por que o inimigo é o outro, diferente do eu, que pensa diferente de mim e me questiona. Em realidade, é impossível falarmos do Herói, sem falar do Vilão, pois um só existe na relação com o outro. E é na interação social que essa relação se dá. O Vilão não é esse único sujeito, encarnação do mal, mas ele se constituí dessa forma na interação com o Herói e com os outros sujeitos que fazem parte do seu horizonte social, tanto na forma verbal, o seu discurso, quanto os signos não verbais, sua corporeidade. Há então o deslocamento de uma identidade, unitária, para uma alteridade, a construção do eu na relação com o outro. Para que então o vilão seja considerado como tal e seu corpo e forma seja valorado, é necessário um ponto de vista exterior que não seja aquele do eu, mas sim do outro. Existem dois centros de valores, um eu que cresceu e viveu de uma forma, e o outro que cresceu e viveu de outra. Mesmo que um objeto idêntico seja colocado na frente de ambos, ele terá aspectos avaliativos diversos na relação comigo ou com o outros. Quando pessoas diferentes veem a figura de Melkor, podem valorado como a encarnação do mal ou como um sujeito que questionou um sistema ideológico dominante. Assim também a valoração corpórea, seu corpo pode ser valorado como belo e forte ou como feio e monstruoso. O eu é implicado dialogicamente na alteridade, assim como o “corpo grotesco” (Bakhtin, 1965) é

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implicado no corpo do outro. Diálogo e corpo estão estreitamente ligados entre eles (PETRILLI, 2013, p.54). Referências BAKHTIN, Mikhail Mikhailovich. Para uma Filosofia do Ato Responsável. São Carlos: Pedro & João Editores, 2010a. _______. Marxismo e Filosofia da Linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na Ciência da Linguagem.14 ed. São Paulo: Hucitec, 2010b. CAMPBELL, Joseph. O herói de mil faces. São Paulo: Pensamento, 2007. ECO, Umberto. História da Feiura. Rio de Janeiro: Record, 2014. PETRILLI, Susan. Em Outro Lugar e de Outro Modo. Filosofia da linguagem, crítica literária e teoria da tradução em, em torno e a partir de Bakhtin. São Carlos: Pedro & João Editores, 2013. PONZIO, Augusto. No Círculo com Mikhail Bakhtin. São Carlos: Pedro & João Editores, 2013. TOLKIEN, John Ronald Reuel. O Silmarillion. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2009a. _______. The Silmarillion. London: HarperCollinsPublishers, 1999. _______. O Hobbit. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2009b. _______. O Senhor dos Anéis. Volume Único. São Paulo: Martins Fontes, 2001.

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