Mídia Participativa- o Potencial dos Youtubers com Capacidade de Diálogo

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Mestranda do Programa de Pós de Graduação em Comunicação Social da UMESP, e-mail: [email protected]

Neste trabalho será usada a expressão conteúdo audiovisual no lugar da palavra vídeo. Consideramos a primeira mais abrangente, uma vez que ela engloba os sentidos de ouvir e de ver e a origem da palavra vídeo (latim vedere) remete apenas ao olhar.

Disponível em: < http://issuu.com/telaviva/docs/tv_258_tablet?e=1344148/14221243 >. Acesso: 20 nov. 2015.

Disponível em:< https://storage.googleapis.com/think/intl/ALL_br/docs/intimidade-dos-brasileiros-com-youtube_articles.pdf >. Acesso: 18 dez. 2015.

A empresa Google comprou o YouTube, em 2006, por 1,65 bilhão de dólares.
Alex Primo usa o termo interagente no lugar de usuário, pois considera este último limitador, já que ele não transmite a ideia de um grande avanço sobre o conceito de receptor passivo (PRIMO, 2007). Já interagente é "(uma tradução livre de interactantes, não raro utilizado em pesquisas de comunicação interpessoal), que emana a própria ideia de interação" (idem, 2005, p.2).. O r de usu [email protected].
Neste artigo, considera-se como seguidor quem assina ou se inscreve em um canal. A seção "Central de Políticas" do YouTube explica que "inscrição é um compromisso de suporte iniciado pelo usuário em um canal do YouTube. Isso significa que um ser humano real quer que o conteúdo desse canal apareça em seu feed todos os dias. A quantidade de usuários inscritos em um canal do YouTube precisa ser uma métrica que reflete um interesse genuíno nesse canal e não um medidor de atividade automatizada ou falsificada. A inscrição em um canal cria uma relação entre o criador de conteúdo e o consumidor de conteúdo". Disponível em: < https://support.google.com/youtube/answer/6051134?hl=pt-BR >. Acesso: 20 dez. 2015.
A ideia dos "seis graus de separação" faz parte de um estudo realizado pelo psicólogo social de Harvard, Stanley Milgram, no final de 1960, que pesquisou o número de contatos que separavam dois indíviduos quaisquer no mundo.

O conceito de privacidade tem mudado com a expansão da internet. Atualmente, ela pode ser entendida como a capacidade de controlar a informação divulgada sobre si. Não interessa, portanto, a natureza da informação, mas, sim, a garantia do direito de gerenciar a própria reputação. Esta ideia está presente no livro "A googlelização de tudo" de Siva Vaidhyanathan.

Disponível em Acesso: 20 dez. 2015.

Na gíria da internet, troll é um termo que define quem provoca os usuários de uma comunidade com mensagens controversas ou irrelevantes. Assim, esta pessoa, muitas vezes, acaba com uma discussão interessante e causa conflitos, tirando o tópico principal da conversa de foco.

Hater é um termo usado na internet para definir pessoas que postam comentários de ódio ou crítica sem critério.

Disponível em: < https://www.youtube.com/user/joutjoutprazer/about >. Acesso: 29 dez. 2015.

Disponível em: < http://g1.globo.com/tecnologia/noticia/2015/06/gabbie-fadel-diz-nao-ligar-para-tabus-falo-desde-serie-politica-do-egito.html >. Acesso: 29 dez. 2015.
Disponível em: < http://www.cafeinazine.com.br/entrevistas/entrevista-conheca-julia-tolezano-a-jout-jout-do-youtube/#sthash.Jv4yBd88.dpuf >. Acesso: 29 dez. 2015.
Disponível na seção comentários em: < https://www.youtube.com/watch?v=r1i5DiU9IEI >. Acesso: 29 de dez. 2015.




Mídia Participativa: o Potencial dos Youtubers com Capacidade de Diálogo

Krishma CARREIRA
Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo, SP



Resumo
O YouTube é uma plataforma de mídia participativa. Nele, alguns interagentes transformaram-se em comunicadores com considerável reputação e influência porque têm uma base engajada de fãs, compreendem bem o funcionamento do ecossistema YouTube e porque usam esta mídia como meio de conversa, de interação efetiva e sem censuras. Neste artigo, analisamos quatro youtubers que têm um diálogo aberto com os seguidores, seja por escrito ou através de conteúdos audiovisuais nos canais e redes que participam. Eles têm, entre outras características, um perfil inovador e apreço pela customização e pela transparência até da vida mais íntima. A metodologia tem caráter exploratório e baseia-se em pesquisa bibliográfica.

Palavras-chave: influência dos youtubers; mídia participativa; interação digital; participação online; ecossistema do youtube.

Sobre o YouTube
O YouTube foi lançado, em 2005, com o slogan Your Digital Video Repository (Seu Repositório de Vídeos Digitais). Desde o início, ele tornou o ato de publicar conteúdo audiovisual algo fácil e sem necessidade de conhecimento técnico elevado. Por ser uma plataforma conveniente e funcional, este grande arquivo transformou-se no maior agregador de mídia de massa da internet do século atual e alterou profundamente o mercado de comunicação, tanto no aspecto da produção, como da distribuição e do acesso ou interação com o conteúdo audiovisual. O YouTube é um "exemplo do que David Weinberger (2007) chama de 'metanegócio'- uma nova categoria de negócio que aumenta o valor da informação desenvolvida em outro lugar e posteriomente beneficia os criadores originais dessa informação" (apud BURGESS; GREEN, 2009, p.21).
Em outubro de 2015, o YouTube lançou a plataforma Red. Trata-se de uma versão e exclusivos, como shows e filmes, que poderão ter a participação de youtubers líderes de audiência.
O Brasil é o segundo país que mais acessa conteúdo audiovisual no YouTube e o terceiro que mais publica. A figura 1 foi retirada de uma pesquisa da empresa Google, em 2015, e mostra como o YouTube alterou, no país, o consumo deste tipo de conteúdo.

Figura1
Fonte: Google

Segundo Jawed Karim, um dos fundadores da plataforma, o sucesso do YouTube se deve à implementação de quatro recursos: recomendações, capacidade de compartilhar, funções típicas de redes sociais como comentários e a possibilidade do conteúdo ser incorporado em outras páginas da internet (BURGESS; GREEN, 2009, p.19). Na figura 1 é visível o peso do compartilhamento para os consumidores de conteúdo audiovisual.

O YouTube Como Mídia Participativa

Em um sentido mais comum, além de ser uma plataforma, o YouTube é também uma mídia social ou uma rede social, onde os interagentes o utilizam para contar histórias, falar sobre a vida e se aproximar de outros. Quanto a estas expressões, há divergências apontadas por vários autores que debatem estes temas sem abordarem especificamente o YouTube, mas cujas conclusões podem ser aplicadas a ele.
Lon Safko e David K. Brake descrevem as mídias sociais como "atividades, práticas e comportamentos entre as comunidades de pessoas que se reúnem online para compartilhar informações, conhecimentos e opiniões usando meios de conversação". Os meios de conversação "são aplicativos baseados na web que permitem criar e transmitir facilmente o conteúdo na forma de palavras, imagens, vídeos e áudios" (2010, p.5). Então, fazendo a ligação com o YouTube, ele seria uma mídia social que promove conversação. Judy Strauss e Raymond Frost têm essa mesma visão. Para a dupla, "o que torna a mídia social diferente é que o conteúdo não é gerado como um monólogo (…), mas como uma conversa, com todos os participantes tendo a possibilidade de fazer upload de conteúdo e discutir, editar ou classificar os outros conteúdos" (2012, p.233).
Já Alex Primo acredita que a utilização do termo mídia social é feita de maneira trivial.

Os mais afoitos diriam que sociais são aquelas mídias através das quais as pessoas podem conversar na internet. Outros – desejando pretensamente aprofundar o debate (!) – diriam que a rigor todas as mídias seriam sociais, pois são criadas e mantidas no seio da sociedade. Os homens, ora, são os criadores e mantenedores das mídias. Tanto rádio quanto TV, tanto um jornal quanto um blog seriam, pois, sociais. Na esteira deste raciocínio, o termo 'mídias sociais' despir-se-ia de qualquer relevância, já que não aparta nenhuma distinção: se todas as mídias são sociais, nenhuma instância ficaria de fora (2012, p.619).

O termo mídia social é, portanto, difícil de ser definido precisamente. Assim como não é fácil apontar sua origem ou quem o cunhou de fato. Ele pode ser usado em um sentido mercadológico para descrever negócios e dinâmicas, mas também como sinônimo de aplicativo, plataforma, ferramenta, funcionalidades técnicas que permitem interação, colaboração, trabalho em grupo e como conteúdo gerado pelo consumidor.
Primo questiona, inclusive, o que é social, com base na Teoria Ator-Rede de Bruno Latour. Para ele, este é outro termo usado indiscriminadamente, como se fosse algo único e estável. Mas como é fruto de negociação contínua, não só entre elementos humanos, mas também entre homem-máquina, social não poderia ser usado como um adjetivo que qualificaria o sucesso e o comportamento em torno de algum tipo de meio.
O YouTube é um mediador no processo de interação homem-máquina, no sentido atribuído por Bruno Latour. A plataforma não é apenas uma intermediária. Ela transforma significados através de algoritmos, que são uma espécie de conjunto de passos que executam cada operação da plataforma. No caso do YouTube, os algoritmos são secretos e interferem no ranking de conteúdo. Isto é, definem o que é relevante e ordenam a posição do conteúdo de acordo com seus próprios critérios. Os algoritmos levam em consideração o tempo assistido (retenção de público), o número de visualizações, o número de marcações (gostei e não gostei), o número de comentários, os back-links (conteúdo em outros sites), a frequência de postagens, o perfil dos seguidores, entre outros critérios.
Conclui-se, portanto, que a expressão mídias sociais pode ser aplicada ao YouTube, apenas de forma genérica, no sentido da plataforma oferecer um conjunto de serviços online que permitem, entre outras funções, comentários, compartilhamentos, conversas. Com base nestas reflexões, optou-se por usar, neste artigo, o termo mídia participativa.

Embora não seja perfeito, e também carregue consigo alguns dos problemas apontados anteriormente, a ambiguidade do termo é interessante. Mídia participativa poderia referir-se também a mídia que participa. Tomada assim como actante, não apenas como meio de comunicação, o termo deixa de considerar a mídia como mero transmissor, nem a relega ao exterior da ação (PRIMO, 2012, p.636).

Assim, O YouTube é uma mídia participativa porque a plataforma atua no processo comunicativo através dos algoritmos e também porque o próprio interagente (amador ou não) gera conteúdo. Em 1992, Henry Jenkins cunhou o termo cultura participativa. Ele descreve "a produção cultural e as interações sociais de comunidades de fãs (…). Conforme o conceito foi evoluindo, acabou se referindo, atualmente, a uma variedade de grupos que funcionam na produção e na distribuição de mídia para atender seus interessses coletivos " (JENKINS, 2014, p.24).
As mídias que permitem participação, como o YouTube, acabam levando à formação de redes, que são entendidas, aqui, como elos entre pessoas ou organizações que possuem algum tipo de interdependência, como valores e ideias (STRAUSS; FROST, 2012).
As redes são baseadas na confiança entre os integrantes e são divididas entre grupos de influência que, com a internet, "estão expandindo o círculo de amigos que você pode ter e minando a sabedoria convencional que diz que estamos afastados das pessoas que não conhecemos por apenas seis graus de separação (TAPSCOTT, 2010, p.225). As redes mediadas por computadores quebram barreiras como distância e tempo, aproximam pessoas e ampliam o círculo de relacionamentos. Em 1992, o antropólogo britânico Robin Dunbar acreditava que o tamanho natural de um grupo era de 150 pessoas. Mas com a web, alguns internautas, na realidade, se relacionam ativamente com um número bem maior.
Nas redes existem, portanto, fluxo comunicacional entre os atores. Mas para que elas sejam dialógicas e tenham consistência, não basta "alguém entrar em um grupo e postar mensagens" (BENTO, 2015, p.177). Elas precisam ter interação e um fluxo ativo. E é exatamente isto o que os youtubers com muitos seguidores fazem, como exposto a seguir.

Youtuber: a Cultura do Diário da Vida Comum

No YouTube surgiram comunicadores que incorporam a missão mais recente desta plataforma de mídia participativa: broadcast yourself. Ou seja, eles transmitem a si mesmos. Neste artigo, tratamos daqueles que se enquadram no padrão de vlog, isto é, produzem conteúdo em que aparecem falando diretamente para a câmera e tratam de assuntos, muitas vezes, extremamente pessoais. O youtuber usa a mídia YouTube, mas ele próprio também pode ser considerado uma espécie de mídia, "afinal, ele se comunica on-motion (quando se move), on-time (no instante) ou ainda on-line (quando em rede) (GALINDO, 2015, p. 42). Os que têm mais seguidores são os que aprenderam como funciona o ecossistema comunicativo da plataforma. Assim,

ser "letrado" no contexto do YouTube, portanto, significa não apenas ser capaz de criar e consumir o conteúdo em vídeo, mas também ser capaz de compreender o modo como o YouTube funciona como conjunto de tecnologias e como rede social. Para nossos objetivos, o que conta como "alfabetização" é algo pelo menos parcialmente específico à cultura do próprio YouTube. Competências individuais e conhecimentos são necessários, mas nem todos eles podem ser importados de outros lugares (BURGESS; GREEN, p. 2009, p.101).


Os youtubers fazem parte das gerações que Tapscott chama de Y ou Internet (nascidos entre 1977 e 1997) e Z ou Next (nascidos a partir de 1998). Segundo o autor, estas gerações têm oito normas que as definem:
gostam de customizar e personalizar. "Cresceram acessando a mídia que queriam, quando queriam, e sendo capazes de mudá-la. Milhões de pessoas em todo o mundo não acessam simplesmente a internet, elas a criam, produzindo conteúdo on-line" (TAPSCOTT, 2010, p.49);
querem entretenimento em todos os aspectos, do trabalho à vida social;
adoram liberdade;
são investigadores, no sentido de pesquisarem tudo;
apreciam transparência das empresas, órgãos públicos e organizações;
gostam de fluxo de comunicação veloz e valorizam respostas rápidas;
inovam em vários aspectos, inclusive no formato do conteúdo;
gostam de colaboração e relacionamento.

Cada youtuber cria uma persona, a identidade do canal que tem na plataforma e estabelece, assim, a fronteira (diferenciação) entre a sua e as outras comunidades. "Nesse sentido, lembra Raymond Williams, comunicação também tem um sentido de comunidade – as duas vêm da mesma raiz latina, communio – e, por tabela, identidade" (MARTINO, 2010, p.17). Os youtubers fazem parte de uma sociedade guiada pela imagem, onde é possível dizer que o existir é praticamente igual ao aparecer (MARTINO, 2010, p.176).
Tapscott celebra a ideia de que as gerações Y e Z apreciam transparência, mas existe um outro lado que precisa ser observado. Os youtubers, comunicadores do planeta dos comuns, expõem publicamente suas intimidades, traçando uma espécie de diário, em um novo contexto de privacidade. Trata-se de uma cultura de quarto, que expõe uma transparência artificial e cultua o individualismo exarcebado. Mas quando ganham status de celebridade, em função do ranking gerado pelos algoritmos, eles deixam de ser ordinários ou comuns, não porque fazem algo excepcional: "deixam de ser ordinary unicamente porque estão na mídia" (MARTINO, 2010, p. 192). Assim, as vidas dos youtubers são praticamente iguais as dos seguidores, mas, em função da exposição maximizada que se transforma em valor cultuado, são, ao mesmo tempo, completamente diferentes.
A antropóloga Patricia Lange, que estuda mídias sociais, tem uma outra perspectiva sobre o acesso online dos momentos íntimos. Eles "permitem que tabus sociais e preconceitos sejam questionados e remodelados, transformando o trabalho de identidade interpessoal e íntima da vida cotidiana para articular debates mais 'públicos' sobre identidades sociais, ética e políticas culturais" (apud BURGESS; GREEN, P. 2009, p.111). Um exemplo sobre temas levantados por youtubers ocorreu com Lucas Feuerschütte do canal Luba TV. Ele revelou, no YouTube, que é homossexual. "Recebemos manifestações preconceituosas. Gente que dizia nos comentários: 'Nossa, vocês são gays, não quero mais seguir este canal' (...). Eu fiquei nervoso com aquilo, todos achamos horrível, e resolvi que era hora de fazer um vídeo me assumindo de verdade. Foi a primeira vez que vi necessidade de fazer isso. E fiz — explica Luba, que agora recebe milhares de e-mails de adolescentes que não sabem como contar aos pais sobre sua opção sexual".
Com a fama, alguns youtubers conquistaram confiança e boa reputação em função de uma visão positiva (não necessariamente real) que os seguidores têm sobre eles. "Vivemos hoje num mundo em que a força costuma estar associada à capacidade de produzir percepção" (ROSA, 2006, p. 179). Com isto, tornaram-se influenciadores, ultrapassando, em certas circunstâncias, o poder de algumas fontes mais tradicionais. "Eles podem alcançar mais pessoas com menos estágios intermediários. E, nas condições corretas, podem disseminar uma informação (negativa ou positiva) sobre uma causa política, produto ou serviço com a velocidade de um incêndio" (TAPSCOTT, 2010, p.234).
Malcolm Gladwell fala sobre três tipos de influenciadores: os conectores criam vínculos através de mídias participativas; os sabichões e os vendedores, que são hábeis na geração de burburinho sobre um tema (apud TAPSCOTT, 2009, p. 236). Os youtubers mais proeminentes possuem essas características e, por isso, têm mais seguidores.
Alguns comunicadores, no YouTube, fazem constantemente upload de conteúdo, mas necessariamente não conversam de fato com os seguidores. Conversa, aqui, é entendida como o diálogo na forma de texto, áudio ou imagem. Neste ecossistema midiático, quem interage é recompensado e quem não conversa não costuma ir longe. Os youtubers que entendem bem o potencial da plataforma sabem usar a tecnologia digital para o estabelecimento e a manutenção de relações. Eles são capazes de ouvir, entender e responder a base de seguidores, que por essa e outras razões que não são objeto deste artigo, torna-se crescente. Para estes comunicadores, os fãs não são apenas dados tratados friamente. Eles interagem com eles, trocam e compartilham porque compreendem que os seguidores também têm poder de serem mídia e podem colaborar com o potencial comunicativo do canal do youtuber, ajudando ativamente a propagá-lo. "Fazer participar é fazer envolver-se, é fazer-se comum, enfim, é fazer-se participante. É compartilhar para ser compartilhado" (GALINDO, 2015, p. 51).
Neste artigo foi feita uma adaptação, com base em um estudo de marketing de John O'Connor (apud Galindo, 2015), para o universo do youtuber com alta performance de interação. Este comunicador líder:
usa a tecnologia para conhecer melhor e mais intimamente os participantes ativos;
faz gestão do relacionamento, valendo-se das ferramentas tecnológicas disponíveis;
aprimora o conteúdo (tema ou formato) e a divulgação do mesmo.
Os youtubers, com este perfil, lidam habilmente com todos os tipos de interagentes, incluindo os trolls e os haters. Eles

se mostram relutantes em moderar ou banir comentários por acharem esses tipos de controle contrários ao ethos da liberdade que supostamente distingue a cultura participativa (…). Lidar com os haters – que deixam comentários negativos e, muitas vezes, ofensas pessoais – é parte da experiência do YouTube para aqueles que participam do site como uma rede social e algo que o YouTube aceita como parte do jogo, aceitando tanto o mau como o bom. Aprender a "gerenciar" trolls, prática e emocionalmente, é uma das principais competências requeridas para uma participação efetiva e satistfatória (BURGESS; GREEN, p. 2009, p. 129).

A seguir, serão apresentados quatro youtubers brasileiros que têm um diálogo constante com os seguidores.

Sem Medo de Conversar

Kéfera Buchmann do canal 5inco Minutos aborda o que ocorre no cotidiano dela própria, dos familiares e dos amigos. O catarinense Lucas Feuerschütte, o Luba, criou o canal Luba TV, em 2010, onde fala também sobre fatos do dia-a-dia e, às vezes, interpreta alguns personagens. Formada em jornalismo, Julia Tolezano criou o canal Jout Jout Prazer, em 2014, onde avisa "este é o meu, seu, nosso canal! Não temos tema nem roteiro, ok? Eu só meio que vou falando e vocês meio que vão ouvindo". Mesmo sem ter tido a ideia de ser um canal feminista, muitos conteúdos têm essa temática. Feminismo também é um tema comum no canal Gabbie Fadel de Gabriela Fadel. Em 2008, ela "começou a gravar relatos de sua rotina, desde ir ao cinema até dicas para fazer intercâmbio".
A figura 2 apresenta dados sobre o número de assinantes e de visualizações destes canais. Foram colocadas informações sobre alguns canais de emissoras de TV brasileiras com o objetivo de fazer uma comparação entre a base de seguidores delas e a dos youtubers analisados. Como pode ser observado, estes novos comunicadores têm mais inscritos que as emissoras, com exceção do SBT, que possui mais do que Jout Jout e Gabbie, mas menos do que o de Kéfera e do que Luba. Por outro lado, o SBT tem mais visualizações do que todos eles. É importante ressaltar que como algumas emissoras têm mais de um canal no YouTube, optou-se, neste artigo, pelo principal, por ele ser uma espécie de guarda-chuva onde estão os outros canais de programas segmentados.


Figura 2

Canal no YouTube
Assinantes
Visualizações
5inco Minutos
8.826.161
677.753.327
Luba TV
2.813.477
229.602.363
Jout Jout Prazer
952.289
109.240.869
Gabbie Fadel
921.020
41.192.825
Globo
374.839
123.592.036
SBT Online
2.472.512
825.552.409
Rede Record
299.693
105.339.841
Band TV
23.796
11.147.225

Dados de 12/07/2016

Os youtubers analisados neste artigo nasceram a partir de 1990. Eles são, portanto, das gerações Y e Z. Os quatro interagem com a base de fãs ativamente. Algumas dúvidas, observações, comentários e pedidos enviados pelos interagentes, na forma de conteúdo audiovisual ou texto, são respondidos por eles que, através desta troca, adquirem um parâmetro para definição do conteúdo, como explica Julia Tolezano: "eu escolho o tema 5 minutos antes de começar a gravar. Os da terça, que são feitos a partir das sugestões dos seguidores do canal, eu escolho um ou vários dos que me sugerem no Facebook".
Foram selecionados, para análise, seis conteúdos de cada um dos comunicadores abordados neste artigo.
Kéfera criou a playlist Kéfera Responde. Em um dos conteúdos, ela fala: "eu tenho conversado bastante com vocês na fanpage do canal (...) e qual que é o combinado? Era que eu iria responder as perguntas que vocês mandassem (...). As perguntas estão selecionadas e agora eu vou responder".
Figura 3
5inco Minutos
Data
Perguntas respondidas
Visualizações
Comentários
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Kéfera responde
30/08/2014
25
2.276.492
5.578
108.689
668
Kéfera responde#8
14/04/2015
9
2.354.564
5.518
151.971
671
Kéfera responde#9
12/05/2015
9
1.606.869
7.529
150.003
858
Kéfera responde#14
19/07/2015
7
1.780.840
2.429
185.204
1.019
Kéfera responde#16
10/10/2015
5
1.894.313
5.533
197.107
1.312
Kéfera responde#17
18/10/2015
5
1.489.414
4.440
231.199
1.528

Dados: 29/12/2015
Luba montou a playlist Ask Luba.
Figura 4

Luba TV
Data
Perguntas respondidas
Visualizações
Comentários
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Como seduzir Zayn
28/03/2015
21
659.783
2.189
88.993
236
Quer leitinho?
24/05/2015
14
1.111.117
2.676
125.702
547
Queria estar morta
05/07/2015
14
669.015
3.230
106.928
289
Me nota senpai
02/08/2015
15
808.196
2.312
124.833
372
Meu papel de trouxa
23/08/2015
13
632.028
2.349
116.711
327
Perdi o Enem, e agora?
25/10/2015
19
906.566
9.790
124.453
498
O melhor falsete da história
08/11/2015
17
808.248
4.423
154.984
473

Dados: 29/12/2015

Julia criou a playlist Jout Jout responde, onde comenta: "sempre apaixonada pela pergunta de vocês. Queria tanto poder responder todas".
Figura 5
Jout Jout Prazer
Data
Perguntas respondidas
Visualizações
Comentários
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Dislikes
Cajout responde
09/12/2014
21
476,749
390
17,126
41
JoutJouba responde
20/01/2015
19
303,158
308
12,686
31
Cajout responde II
17/03/2015
23
368,973
215
13,510
28
Couve
07/04/2015
24
430,648
325
15,770
122
Cajout responde III
19/05/2015
19
542,283
573
22,125
79
Cajout responde 4
21/07/2015
17
387,649
820
26,295
48

Dados: 29/12/2015


Gabriela interage com os seguidores em Gabbie Fadel Para de Mimimi.

Figura 6

Gabbie Fadel Para de Mimimi
Data
Perguntas respondidas
Visualizações
Comentários
Likes
Dislikes
Pergunte a Gabbie#12
23/09/2014
17
204.584
417
17.100
253
Pare de mimimi III
29/01/2015
07
173.524
668
18.561
244
Namora o Luba? Pergunte a Gabbie#13
05/03/2015
20
338.156
842
29.620
1.189
Amiga, garota de programa? Pare de mimimi IV
21/05/2015
11
233.674
731
21.191
635
Como se faz sexo? Pare de mimimi V
12/08/2015
10
455.823
1.151
30.060
2.044
Tara em cocô – Para de mimimi
13/11/2015
14
135.010
561
18.012
163

Dados: 29/12/2015


Os conteúdos audiovisuais em resposta aos fãs geram muitas novas interações e comentários, como pode ser observado nas tabelas acima. E, por sua vez, levam a novas conversas, como esta selecionada no canal de Gabriela Fadel: "Gabbie, acho que seria legal fazer um especial com os e-mails das pessoas que já passaram pelo PARE DE MIMIMI... Perguntando se as dicas ajudaram, e de que forma ajudaram... Pra ver se você, realmente, tenta ajudar ou ajuda de verdade... "

Conclusões

Levando-se em consideração a análise realizada neste artigo, o YouTube é uma mídia participativa, pois a própria plataforma atua como mediadora em função dos algoritmos que definem os conteúdos mais relevantes (interação máquina-homem), porque permite o compartilhamento do contéudo e a participação ativa dos interagentes. Mas mesmo com a presença de ferramentas que propiciam interação, nem todos os comunicadores da plataforma utilizam a totalidade do potencial de fato. Os youtubers de sucesso, em termos de volume de assinantes e de visualizações, com influência e boa reputação, são os interagentes que se comunicam de fato com a base de fãs, exercitando um diálogo constante, aberto e sem censuras. Em outras palavras, eles promovem engajamento.
Os youtubers com este perfil, incluindo os quatro brasileiros analisados, aprenderam a usar a tecnologia, a plataforma e outras redes para conhecer os fãs, fazer a gestão do relacionamento com eles e para aprimorar o conteúdo. Conclui-se, portanto, que não basta ter uma mídia participativa para estabelecer uma relação de longo prazo entre os participantes do fluxo comunicativo. Para conseguir este feito é preciso participar de fato. E sem medo da conversar.

Referências

BENTO, Laércio. Análise de redes sociais virtuais: da estrutura aos relacionamentos. In: GALINDO, Daniel dos Santos. A comunicação de mercado em redes virtuais. Uma questão de relacionamento. Chapecó: Argos, 2015.

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