MÍDIAS LOCATIVAS E A EXPERIÊNCIA DO ESPAÇO URBANO – UM ESTUDO SOBRE REMEDIAÇÃO, IMEDIAÇÃO E HIPERMEDIAÇÃO EM UNCLE ROY ALL AROUND YOU

May 23, 2017 | Autor: Laryssa Tarachucky | Categoria: Mobile Technology, Urban Studies, Experience Design, Remediation, Locative Media
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Laryssa Tarachucky, Maria José Baldessar, Luciane Maria Fadel

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MÍDIAS LOCATIVAS E A EXPERIÊNCIA DO ESPAÇO URBANO – UM ESTUDO SOBRE REMEDIAÇÃO, IMEDIAÇÃO E HIPERMEDIAÇÃO EM UNCLE ROY ALL AROUND YOU Laryssa Tarachucky Doutoranda PPGEGC Programa de Pós-Graduação em Engenharia e Gestão do Conhecimento. Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis (Brasil). Email: [email protected]

Maria José Baldessar Docente PPGEGC Programa de Pós-Graduação em Engenharia e Gestão do Conhecimento. Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis (Brasil). Email: [email protected]

Luciane Maria Fadel Docente PPGEGC Programa de Pós-Graduação em Engenharia e Gestão do Conhecimento. Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis (Brasil). Email: [email protected]

Resumo A popularização das tecnologias de informação e comunicação (TICs) vem gradativamente atuando sobre a vida urbana, transformando-a. Em termos de experiência espacial, aplicativos desenvolvidos para interfaces móveis de comunicação criam novas maneiras de agir no ambiente urbano e de interagir com ele, fundindo espaço físico e espaço virtual e criando um espaço híbrido. “Mídia locativa” é o termo utilizado para designar tecnologias (dispositivos, sensores e redes) e serviços (mapeamento, redes sociais, realidade aumentada, informações turísticas e comerciais, entre outros) baseados em localização, e podem ser do tipo analógico ou do tipo digital. As mídias locativas digitais mediam processos de informação, comunicação e orientação das pessoas na cidade e oferecem possibilidades de interação com o espaço urbano até então inéditas. Este trabalho compõe um conjunto de estudos que tem como objetivo a exploração dos usos de mídias locativas digitais para a criação de novas maneiras de aprofundar a experiência e a prática espacial urbana. Serão analisados, por meio do método close reading, aspectos de imediação e hipermediação do jogo Uncle Roy All Around You, desenvolvido pela companhia Blast Theory, em parceria com o Mixed

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Reality Lab, no ano de 2003. Como base teórica, nos apoiaremos em Bolter e Grusin (2000), Van Looy e Baetens (2003), Benford et al. (2004), McLuhan (2007) e Waal (2014).

Palavras-chave remediação, imediação, hipermediação, mídias urbanas, jogos locativos

Abstract The popularization of information and communication technologies (ICTs) is gradually acting on urban life, transforming it. Applications developed for mobile communication interfaces create new ways of acting within the urban environment and interact with it, merging physical space and virtual space and creating a hybrid space. "Locative media" is the term used to designate technologies (devices, sensors and networks) and services (mapping, social networks, augmented reality, among others) based on location, and may be analog or digital. The digital locative media mediate information and communication processes and the flow of people and supplies in the city and offer different possibilities of interaction with the urban space. This paper is part of a set of studies that aims at exploring the uses of digital locative media to create new ways to deepen urban urban experience and practice. By means of close reading method, we will analyze the aspects of immediacy and hypermediacy of the game Uncle Roy All Around You, developed by Blast Theory in partnership with Mized Reality Lab in 2003. As a theoretical basis, we consider the works of Bolter e Grusin (2000), Van Looy e Baetens (2003), Benford et al. (2004), McLuhan (2007) e Waal (2014).

Key words remediation, immediacy, hypermediacy, urban media, locative games

Introdução A ascensão das mídias móveis vem causando uma reanálise de nossas práticas espaciais cotidianas. Somadas às tecnologias sensíveis à localização, as mídias móveis vêm atuando de forma a orientar nossos corpos pelas narrativas dos lugares (Farman, 2015), agindo sobre nossa percepção de espaço (Saker & Evans, 2016), nossa espacialização (de Souza e Silva & Frith, 2012), nossa privacidade (Sadowski, 2016) e até mesmo sobre nossas interações sociais no espaço público e senso de comunidade (Gordon & de Souza e Silva, 2011; Galloway & Ward, 2005). Mídia locativa (do inglês locative media) é um termo utilizado para fazer referência ao “conjunto de tecnologias e processos infocomunicacionais cujo conteúdo informacional vincula-se a um lugar específico” (Lemos, 2007, p. 207). As mídias locativas digitais implicam em processos de emissão e recepção de informação mediados por dispositivos móveis digitais (a exemplo do GPS, smartphones, palms, laptops, bluetooth e etiquetas de rádio frequência), utilizados para agregar ou obter conteúdo informacional a respeito de uma determinada localidade. Um dos

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objetivos da pesquisa nessa área tem sido explorar criticamente e entender os papeis e os impactos das mídias móveis digitais na experiência individual do lugar (Farman, 2012; Saker & Evans, 2016; Humphreys & Liao, 2013), tendo como frequente objeto de pesquisa as intervenções artísticas (Hemment, 2006; Townsend, 2006; Townsend, 2008; Wilken, 2010; San Cornelio & Alsina, 2010; San Cornelio & Ardevol, 2011; Prutzer, 2013) e os jogos (De Lange, 2009; de Souza e Silva & Hjorth, 2009; Farman, 2009; Lemos, 2010; Hjorth, 2011; Ruiz, Stokes, & Watson, 2012; Frith, 2013). Muitas das transformações na percepção e atuação sobre a cidade são antecipadas pelo meio artístico. Os artistas sabem que “estão empenhados na criação de modelos vivos de situações que ainda não amadureceram na sociedade como um todo. No seu jogo artístico, descobrem o que realmente está acontecendo – e por isso parecem estar ‘à frente de seu tempo’” (McLuhan, 2007, p. 273). A arte atua como um ‘sistema de alarme premonitório’, capaz de nos capacitar para identificar e reagir a questões sociais e psíquicas com razoável antecedência. Blast Theory é uma companhia inglesa de artes performáticas reconhecida pela exploração de meios de comunicação interativos para a criação de performances e arte interativa, envolvendo, em geral, cultura popular, jogos e a experiência do ambiente urbano. Entre seus trabalhos mais difundidos está Uncle Roy All Around You (URAAY) 1, que utiliza performance ao vivo e tecnologia pervasiva em um jogo em que os participantes deviam encontrar-se com o tio Roy em um tempo máximo de 60 minutos. Tendo como tema central a confiança, o jogo caracterizava-se por promover a interação entre jogadores de campo, jogadores online, atores e cidadãos comuns em um ato de experienciação espacial até então pouco explorados. URAAY foi criado em 20032, e estava alocado na área central de Londres, Inglaterra. URAAY representa uma mudança de paradigma no que se refere a como as mídias móveis locativas são praticadas e sua característica inovadora despertou o interesse de pesquisadores pelo mundo todo, que investigaram questões relacionadas aos tipos de participação no jogo (Gordon & de Souza e Silva, 2011), aos tipos de interação (Luchetich, 2007; Benford, et al., 2013), à sua classificação enquanto locative game (de Souza e Silva & Hjorth, 2009), aos elementos de sua narrativa (Wilken, 2014) e de seu design (Flintham, et al., 2003; Benford, et al., 2004, Benford, et al., 2006;), entre diversos outros que o citam como exemplo de uso das novas tecnologias de mídia digital para a proposição de formas alternativas de experienciar a cidade.

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http://www.blasttheory.co.uk/projects/uncle-roy-all-around-you/

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Vale destacar que no ano de 2003 eram poucos os dispositivos móveis que combinavam telefonia e computação. O primeiro

smartphone da Apple, por exemplo, foi lançado em 2007. Antes disso, os dispositivos mais conhecidos (e ainda acessíveis apenas a uma pequena parcela da população mundial) eram o Blackberry 5810, de 2002, o Nokia 9000, de 1996, e o IBM Simon, de 1993, cujas funcionalidades ainda estavam limitadas ao acesso de e-mails e agendas pessoais. Pode-se dizer que os aplicativos para smartphones foram popularizados apenas em 2008, com o lançamento da App Store da Apple.

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Objetivos Como parte dos estudos desenvolvidos no contexto do Grupo de Pesquisa Mídia e Convergência – MídiaCon, da Universidade Federal de Santa Catarina, este artigo trata da exploração dos usos de mídias locativas digitais para a criação de novas maneiras de aprofundar a experiência e a prática espacial urbana. Mais especificamente, busca-se compreender a remediação no jogo Uncle Roy All Around You, identificando a presença das lógicas de imediação e hipermediação no que diz respeito à experiência de dois de seus usuários: o jogador de campo e o jogador online.

Metodologia A metodologia utilizada para o desenvolvimento deste trabalho é denominada close reading (Van Looy & Baetens, 2003). Close reading é um método específico de análise literária – utilizada também para a análise de mídias digitais – que usa a interpretação de uma pequena parte da mídia como forma de pensar sobre ela como um todo. Este tipo de análise requer que o pesquisador analise cuidadosamente aspectos específicos de uma mídia e compreenda os efeitos de pequenas partes dela no restante do conjunto, perguntando-se o motivo da escolha de cada um dos elementos e como ele interage com os demais. Após a seleção das interfaces e o levantamento de material de análise, obtidos por meio da webpage da companhia Blast Theory, as etapas de análise seguiram a seguinte ordem 3: (1) resumo, (2) desconstrução e (3) interpretação. A etapa 1 (resumo) consistiu em reconhecer a mídia. As interfaces do jogador de campo e do jogador online foram observadas, contudo sem inicialmente fazem assunções e anotações sobre elas. O objetivo nesta etapa era compreender as intenções de imediação e hipermediação por parte dos artistas da Blast Theory no momento de seleção dos elementos de composição dessas interfaces4. Na etapa 2 (desconstrução), cada um dos elementos das interfaces acima citadas foi desconstruído em termos de imediação, hipermediação e remediação. A análise das interfaces levou à descrição de seus elementos e à anotação detalhada sobre eles. À desconstrução seguiu-se a interpretação dos dados observados (etapa 3), que buscou revelar a razão da escolha dos elementos das interfaces em função das lógicas de imediação e hipermediação relativos a cada um dos tipos de usuários analisados (online e de campo).

1. Remediação: imediação e hipermediação Remediação é um termo utilizado para fazer referência à ideia de que toda nova mídia toma por base uma ou mais mídias precedentes, às quais são dadas novas roupagens ou são agregados

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A ordem seguida para esta análise teve como base o trabalho de Fadel (sem ano).

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As perguntas nesta etapa enviam a tentativa de entender o que acontecia naquela mídia, qual a intenção dos artistas e em

que contexto o artefato estava inserido.

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novos propósitos, mantendo sua estética e/ou conteúdo (Bolter & Grusin, 2000). A interface gráfica do computador, que surgiu em substituição às linhas de comando, por exemplo, pode ser considerada uma remediação da mesa de trabalho, de suas pastas, folhas de papel, lixeira e demais elementos. Para Bolter e Grusin (2000), são quatro os estágios de remediação. No primeiro estágio o meio antigo é evidenciado no novo meio sem qualquer crítica ou tentativa de alteração. No segundo, as diferenças entre os meios são enfatizadas. No terceiro estágio o meio antigo é remodelado pelo novo meio, mas a presença do antigo ainda é percebida. Por fim, no quarto estágio o meio antigo é totalmente absorvido pelo novo meio. A remediação, segundo Bolter e Grusin (2000), opera em duas lógicas distintas (e complementares): a imediação e a hipermediação. Por imediação entende-se a tentativa de tornar a mídia o mais imperceptível quanto possível (transparência). Por sua vez, a hipermediação reconhece múltiplos atos de representação e os torna visíveis ao usuário (opacidade).

2. Uncle Roy All Around You: mediação Caracterizado por de Souza e Silva e Hjorth (2009) um jogo de realidade híbrida (HCR 5), URAAY mescla dois modelos de computação: o pessoal e o pervasivo6. No modelo pessoal (jogador online), o acesso digital à informação é feito por meio de um computador ligado à rede e não prevê interação física com o espaço. Já no modelo pervasivo (jogador de campo), o acesso se dá por meio de um PDA (personal digital assistant) e as informações (pistas) são liberadas para o jogador conforme este explora um espaço físico pré-determinado. Os jogadores online devem colaborar com os jogadores de campo para que estes encontrem o escritório do tio Roy, que é uma localidade física real (Benford, et al., 2004), compartilhando informações que são referentes a localidades específicas. Tendo como critério a necessidade de uso de uma mídia digital para a participação no jogo, são dois os tipos de jogadores cujas experiências de imediação, hipermediação e remediação são aqui analisadas: os jogadores online e os jogadores de campo7. Os jogadores de campo acessam o jogo por meio da compra de um ticket que os permite jogar por um tempo máximo de uma hora.

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Acrônimo de Hybrid Reality Game. Nos HRG, as ações no ambiente digital têm implicações diretas no ambiente físico e

vice-versa. 6

Utiliza-se aqui a denominação de modelos de computação dada por Farman (2015).

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Para Gordon e de Souza e Silva (2011), a definição da participação de cada um dos jogadores é complexa. Em uma

primeira observação, fala-se da fragilidade da distinção entre local e remoto, uma vez que, de certa forma, mesmo os jogadores online participam fisicamente do jogo ao terem seus avatares presentes na interface móvel do jogador de campo. Além do jogador que porta o PDA, no ambiente físico há também os personagens da peça e os transeuntes, que por vezes são abordados pelos jogadores de campo e solicitados a responder alguma pergunta ou fazer alguma indicação. Da mesma forma, questiona-se a distinção entre jogador e expectador. Segundo Gordon e de Souza e Silva (2011), embora os expectadores não pareçam estar jogando, eles estão integrados ao espaço em virtude de serem parte do público do jogo.

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Antes de começar o jogo, eles devem trocar todos os seus pertences por um dispositivo de mão (PDA) que os auxilia na exploração do ambiente físico por meio de um aplicativo baseado em localização (fig. 1). Esta estratégia, segundo Benford et al. (2004, p. 2), foi usada com a intenção de “[...] aumentar sua sensação de antecipação, vulnerabilidade, dependência do tio Roy e isolamento e desconexão com a experiência diária da cidade” 8. Conforme exploram o ambiente físico, completam suas tarefas e compartilham sua localização, os jogadores de campo vão recebendo novas pistas sobre onde é o escritório do tio Roy. No entanto, as pistas que recebem são ambíguas: enquanto algumas são confiáveis, outras incentivam os jogadores a “perder tempo” com atividades relacionadas à cultura local, mas que não levam ao escritório do tio Roy. Os jogadores de campo “podem ver os jogadores online explorando a mesma área da cidade no mapa em seu computador de mão com objetivos diferentes” (Lemos, 2010, p. 58); Figura 1 – mapa do jogador de campo (Benford, et al., 2004)

O dispositivo de uso do jogador de campo exibe o mapa da localidade que ele deve explorar. Nele, há a indicação das ruas, quadras e demais elementos da vizinhança. Há também a indicação de algumas de suas missões: o alvo vermelho no canto superior direito da figura 1 indica o lugar para onde o jogador de campo tem que se dirigir a fim de receber sua primeira pista. Ao contrário do sistema de posicionamento disponível para os dispositivos atuais, no URAAY o jogador deve mover o cursor “me” pelo mapa e indicar manualmente seu próprio posicionamento. O botão “I am here” serve para que o jogador de campo indique para o jogador online sua posição. Assim que o faz, ele recebe uma mensagem de texto que lhe dá uma pista sobre para onde ir. Há também outras quatro funcionalidades: de rotação do mapa (botão “rotate map”), de distanciamento e aproximação do mapa (botão “zoom in/out”), de envio de mensagem de voz (botão “send audio") e de pedido de ajuda (botão “help”).

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Tradução dos autores para: “[…] increase their sense of antecipation, vulnerability, dependence on Uncle Roy and isolation

and disconnection from the everyday experience of the city”.

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Por outro lado, os jogadores online experienciam o jogo pela internet, e exploram um modelo 3D do ambiente físico por meio do uso de um avatar (fig. 2). É possível encontrar outros jogadores online, enviar mensagens de texto públicas e acessar cartas com detalhes sobre o posicionamento dos jogadores de campo. Os jogadores online podem contactar os jogadores de campo por meio de mensagens de texto privadas ou podem ouvir as últimas mensagens de áudio gravadas pelos jogadores de campo. Podem, ainda, ter acesso às mesmas pistas que os jogadores de campo recebem, e optar por uma visualização do tipo bird’s eye, que permite visualizar a localização de todos os jogadores (online e de campo). Figura 2 – interface do jogador online: posicionamento do jogador de campo (esfera vermelha), informações do jogador de campo (direita) e caixas de mensagem de texto (base) (Benford, et al., 2004)

A interface do jogador online é um tanto mais complexa que a interface do jogador de campo. Sua tela é dividida em duas colunas (de tamanhos diferentes). A maior parte da tela está destinada à visualização do modelo 3D da cidade. O jogador pode movimentar-se pelo modelo usando as setas de seu teclado. Neste modelo, além da representação da cidade, o jogador pode visualizar seu avatar (figura branca), o posicionamento dos demais jogadores online (esfera branca) e o posicionamento dos jogadores de campo (esfera vermelha). Uma vez que o jogador de campo tenha compartilhado sua localização e, portanto, pedido ajuda, sua demarcação de lugar muda de formato como forma de alertar o jogador online (fig. 3). Na base esquerda da tela, o jogador tem acesso ao chat dos jogadores online e na base direita tem acesso aos cards dos jogadores de campo e à funcionalidade de envio de mensagem para estes. No canto superior direito, a tela apresenta a quantidade de jogadores online e de campo.

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Figura 3 – interface do jogador online: visualização da declaração do jogador de campo (Benford, et al., 2004b)

Quando um dos jogadores de campo chega ao escritório do tio Roy, o jogador online pode acompanhá-lo e assistir o jogador de campo ao vivo por meio de uma webcam instalada no escritório (fig. 4).

Figura 4 – interface do jogador online: visualização do jogador de campo por meio da webcam do escritório do tio Roy (Benford, et al., 2004)

Segundo de Souza e Silva e Hjorth (2009), a experiência do jogo é construída tanto na exploração/navegação do ambiente da cidade quanto na construção das relações entre os participantes ao longo do jogo. Para as autoras, a busca por um lugar desconhecido, feita apenas com a ajuda de pequenas pistas, leva a uma experiência mais próxima à da deriva, do parkour ou mesmo da flanérie, do que de um jogo propriamente dito.

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3. Imediação, hipermediação e remediação em Uncle Roy All Around You Ambos o PDA e a interface gráfica do jogador online remediam de alguma forma a cidade. A interface gráfica do jogador online oferece um segundo estágio de remediação do ambiente urbano tridimensional, ou seja, dá volume e espacialidade aos seus elementos, mas deixa evidente suas diferenças.

No caso do PDA, acontece a remediação da representação

bidimensional da cidade. Aqui, a interface do jogador de campo, promovida por uma mídia móvel com reconhecimento de local (location-aware mobile media), permite ao usuário visualizar sua localização em um mapa na tela de seu dispositivo móvel (Sutko & de Souza e Silva, 2011). Ao inserir no meio elementos interativos oriundos dos sistemas de georreferenciamento, a cartografia da cidade é apresentada em um terceiro estágio de remediação. Ao inserir no meio elementos interativos oriundos dos sistemas de georreferenciamento, a cartografia da cidade é apresentada em um terceiro estágio de remediação. Pode-se afirmar que o dispositivo PDA remedia a cartografia do urbano imediato e circundante, e a interface online remedia a ambiente de jogo vivido pelo jogador de campo. A experiência URAAY, por sua vez, remedia antigas práticas de intervenção artística (especialmente antigas práticas teatrais) e dão uma nova significação para os jogos ao ar livre. A imediação está presente de maneira mais evidente no ambiente criado para o jogador de campo – leia-se: a interface gráfica do dispositivo de mão somado à ambiência urbana criada para a experiência. Os mapeamentos, as orientações, as figurações e as interações são todos elementos pensados para criação de uma experiência imersiva 9, uma imediação perceptiva, que busca a transparência – embora não a alcance por completo. Para sustentar essa afirmação, defende-se aqui que a mídia neste caso é formada pelo conjunto de experiências entregue pelo jogo, e não apenas a interface criada para o PDA. A interface gráfica em si oscila entre imediação e hipermediação: na tentativa de reconhecer seu posicionamento dentro do ambiente urbano (percebendo, portanto, a mídia), o usuário se vê obrigado a buscar a imersão. Por sua vez, a experiência do jogador online é claramente mais hipermidiática. “Na lógica da hipermediação, o artista (ou o programador multimídia ou o designer) se esforça para fazer com que o observador reconheça o meio como um meio e que aprecie esse reconhecimento” (Bolter & Grusin, 2000, pp. 41-42). A interface criada para o jogador online multiplica os sinais da mediação e tenta reproduzir a experiência sensorial humana. A hipermediação neste caso também se manifesta na criação de um espaço multimídia no mundo físico, um jogo a céu aberto.

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Lushetich (2007) observa que o aparecimento esporádico de personagens com mensagens e orientações para o jogador

de campo faz com que o jogador fique em dúvida sobre o que é real e o que é cenário.

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Conclusões O uso das mídias móveis digitais representa um novo paradigma em relação à exploração e experienciação do ambiente urbano. Em especial as mídias locativas digitais, somadas às tecnologias ubíqua e pervasiva, levam a uma forma até então inédita de orientação pela cidade e de possibilidade de conexão e interação simultaneamente ao corpo em movimento. Essa experiência não é nem totalmente transparente, nem totalmente opaca: ela oscila constantemente entre imediação (imersão) e hipermediação (percepção da presença da mídia). A remediação provocada pela inserção no mundo real é, neste caso, uma oscilação entre hipermediação e percepção espacial. Um questionamento frequente a respeito das mídias móveis é sobre sua atuação como elemento fortalecedor de processos de individualização, atuando de maneira contrária à interação e coesão social. O aspecto lúdico de URAAY torna as interações entre os participantes mais descompromissadas. Entretanto, se pensarmos no desenvolvimento de mídias urbanas gamificadas – ou seja, em tecnologias de mídia que de alguma forma influenciem a experiência de uma localidade física (Waal, 2014) por meio da inserção de elementos de jogos em contexto de não jogos – o uso dessas tecnologias móveis locativas somadas aos elementos de jogos parece potencialmente úteis para o fortalecimento da coesão social em comunidades urbanas. Como pesquisas futuras, sugere-se o estudo dos tipos de interatividade e agência nos jogos móveis locativos desenvolvidos no contexto artístico e sobre como estes aspectos podem ser revertidos para a mobilização real de grupos urbanos.

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ACTAS ICONO14 – V Congreso Internacional de Ciudades Creativas | 01/2017 | ASOCIACIÓN DE COMUNICACIÓN Y NUEVAS TECNOLOGÍAS C/ Salud, 15 5º 28013 – Madrid (España) | CIF: G - 84075977 | www.icono14.es/actas

Laryssa Tarachucky, Maria José Baldessar, Luciane Maria Fadel



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