Midiatização do Poder: Relações Modalizantes do consumo na periferia

May 30, 2017 | Autor: A. Vasconcellos d... | Categoria: Poder, Consumo, Televisão, Periferia
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PPGCOM  ESPM  –  ESCOLA  SUPERIOR  DE  PROPAGANDA  E  MARKETING  –  SÃO  PAULO  –  15  E  16  OUTUBRO  DE  2012  

MIDIATIZAÇÃO DO PODER: Relações modalizantes do consumo na periferia1

Adriano Miranda 2 Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - SP

Resumo O Estado está construindo novas estratégias para a atuação no território midiático em busca de um processo de governabilidade eficiente e controle dos cidadãos. A midiatização do poder do Estado depende de ordenar a natureza das visualidade de sua atuação, criando uma imagem do Estado a partir da percepção social dos seus serviços. Atuando por vetores modalizantes que possibilitam alterar e modelar a forma de pensar dos cidadãos forma-se uma estratégia midiática do poder. O presente trabalho pretende compreender as articulações do poder no território midiático utilizando a lógica do consumo como manifestação que atua coletivamente pelas mídias de massa.

Palavras-chave: midiatização; poder; periferia; televisão; política.

Estado e mídia vêem nos problemas sociais brasileiros uma oportunidade de construir uma nova imagem do poder, para isso uma simetria de interesses foi estabelecida para atingir o objetivo. A produção televisiva nos últimos dez anos (2002 a 2012) expõe essa relação e atua como um dos vetores da midiatização do poder. O Estado, por sua vez, visa ordenar a natureza das visualidades de sua atuação, criando produtos e modalizando consumidores.                                                                                                                         1

Trabalho apresentado no Grupo de Trabalho COMUNICAÇÃO, CONSUMO, PODER E DISCURSOS ORGANIZACIONAIS do 2º Encontro de GTs - Comunicon, realizado nos dias 15 e 16 de outubro de 2012. 2 Graduado em Comunicação Social (Rádio e TV) e Bacharel em Direito, doutorando da PUC-SP, bolsista da Capes e 2 Graduado em Social (Rádio Visualidade/Comunicação-Cultura), e TV) e Bacharel em Direito, doutorando da PUC-SP, bolsistaProfessor da Capesdee pesquisador do Comunicação grupo ESPACC (Espaçocertificado pelo CNPq. Comunicação Social na Universidade Anhembi Morumbi (UAM-SP). [email protected]

   

 

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O presente artigo se apoia no desenvolvimento da pesquisa em andamento denominada "As estratégias de poder nas imagens - a construção midiática dos territórios do medo", apoiado pela bolsa Capes/Prosup, inserido no programa de Comunicação e Semiótica da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e desenvolvida junto ao Grupo de Pesquisa Espacc (EspaçoVisualidade/Comunicação-Cultura) certificado pelo CNPq.

A mídia televisiva exerce nas favelas das metrópoles brasileiras um grande impacto informacional e tem se tornado o elemento central das estratégias da governabilidade. Não pretendemos tratar no presente artigo os produtos televisivos sob o foco interpretativo, nem como signos de outra coisa, mas utilizaremos a produção midiática como práticas e estratégias concretas de visibilidade dos serviços estatais. Estas produções definem práticas discursivas que vão além da peça em sí. Não procuramos estabelecer o que se pensou, o que quiz dizer ou o que desejou com essas produções mas o seu impacto ambiental na comunicação a partir da veiculação.

A produção televisiva da Rede Globo de Televisão na primeira década dos anos 2000 possui características distintas de outros períodos oferecendo tanto na dramaturgia quanto no jornalismo uma proposta de prestação de serviço público, procurando se afirmar como componente necessário do poder. Na periferia as ações estatais que se estabilizaram e os enunciados que se repetem regularmente caracterizam o fenômeno da midiatização na esfera política. São rupturas e transformações que afetam o regime geral das produções televisivas brasileiras, atuando como forças modalizantes de pensamento do cidadão que reside em áreas degradadas e favelas.

Midiatização No início do século XIX, período de relevantes transformações sociais urbanas, o Estado agia no controle dos espaços públicos expulsando grande parte da pobreza e consequentemente suas manifestações culturais. Configurando assim as regiões periféricas como o lugar habitado pelos 2    

   

 

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indivíduos excluídos das atividades tradicionais e festivas da sociedade (MARINS, 2006, p.143). Atualmente os espaços públicos tornaram-se midiáticos e as trocas sociais são mediadas pelas imagens. O desafio do Estado está em atuar no território midiático, para tal deve criar formas eficientes de governabilidade e controle destes indivíduos neste ambiente. As estratégias de poder no âmbito midiático parte da compreensão das exigências sociais da Cultura Dirigente3 que são expressas nos meios de comunicação de massa.

Nas manifestações midiáticas do poder emergem vetores que apontam para distintas finalidades e distintos grupos sociais, todos com potencialidade de ser utilizados pelo interesse estatal. Entendendo esses vetores como uma orientação aos indivíduos eles emergem nas produções midiáticas oras em estratégias dissuasivas oras em formatos ostensivos, conforme o grau de aderência da audiência.

A última década do século XX foi marcada pela conflituosa expansão demográfica da periferia das metrópoles brasileiras tornando-a local privilegiado da midiatização do poder. Em São Paulo a população que reside em favelas no senso do IBGE de 1973 não atingia 1% da população urbana, esse número salta para 8% no início dos anos 90 chegando a cerca de 1,16 milhões de pessoas. O mesmo ocorre no Rio de Janeiro onde nos últimos 20 anos o senso do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) comprovou que as favelas cresceram em 47% a partir da década de 90.

Enquanto a experiência cotidiana urbana das metrópoles brasileiras incorporava elementos midiáticos em seu ambiente, a Cultura Dirigente direcionava seus discursos aos interesses estratégicos de governabilidade do Estado. Visando alterar e modelar a forma de pensar pelo convívio com os meios midiáticos estes se apresentam como manifestações delegadas dos indivíduos, e em vários momentos expõe o medo coletivo como recurso narrativo para denunciar vários aspectos da sociedade.                                                                                                                         3

Termo  originário  da  obra  de  Jean  Delumeau  caracterizando  a  cultura  coerente  com  os  interesses  do  Estado.  

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O Medo como recurso de midiatização Através do medo se apresenta à sociedade o avanço da violência, as novas técnicas de vigilância e inteligência do Estado, o saneamento dos problemas sociais, os alertas contra ameaças a fim de gerar ações educativas e cognitivas para os cidadãos. O medo se manifesta prioritariamente como uma defesa natural contra ameaças e perigos porém, neste caso, pode ser analisado como mecanismo de modelagem de nosso modo de pensar.

O papel do medo nas sociedades sempre marcou aspectos importantes para a compreensão de ideologias, heroísmos, vergonhas e principalmente o poder do Estado e a Cultura Dirigente. Segundo o historiador Lucien Febvre (1932) não podemos reconstruir a história a partir do exclusivo sentimento do medo, porém toda a civilização é produto de longa batalha contra o medo.

O medo, tema recorrente das produções midiáticas, é uma importante peça para a compreensão da midiatização do poder. O medo humano gerado pela nossa capacidade imaginativa é múltiplo e constantemente mutável conforme os estímulos que percebemos. A produção midiática contribui para a forma coletiva do medo, deformando a percepção da realidade e conduzindo a comportamentos extremistas de urgência.

O meio comunicativo recupera o medo particular e, expandindo-o midiaticamente, cria um ambiente do medo. A psiquiatria estabelece a distinção entre o medo e a angústia. O temor, o espanto, o pavor e o terror referem-se ao medo, a inquietação, a ansiedade, a melancolia, à angústia. Desta forma o medo se refere ao conhecido e a angústia ao desconhecido. A imaginação tem um papel chave na geração da angústia, pois é derivada das imagens mentais do indivíduo, o medo por sua vez tem uma relação do ambiente que cerca o indivíduo referente as ameaças reais. Esse imaginário atua na coletividade proliferando e desencadeando mecanismos do medo pela sensação individual de insegurança. Em nossa evolução histórica a sequência desse trauma coletivo 4    

   

 

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conseguiu superar a angústia “nomeando” os medos, ou até mesmo “fabricando” medos particulares.

Modalizando a Imagem do Estado As modernas concepções de administração pública colocam em pauta a importância da percepção social sobre a eficiência do Estado nas diversas áreas de atuação. Assim, a política atual tem como estratégia definir projetos de leis e ações de governabilidade, considerando a imagem construída pelos indivíduos, usuários de seus serviços. Imagens que expressam a forma de pensar do indivíduo vista de forma coletiva.

Desta forma, compreender a percepção social de uma atuação do Estado é recuperar a imagem criada mentalmente pela complexa relação entre os indivíduos, seus espaços de habitação e convivência e os meios tecnológicos de comunicação. Para isso deve-se compreender o indivíduo como ser midiático, para quem as estratégias do poder se articulam, considerando sua atmosfera cultural e seu acesso aos dispositivos midiáticos.

A ubiquidade de telas e superfícies nas habitações, nos celulares, nas ruas e locais públicos formam sistema contínuo de contato midiático, incide e marca a maneira de pensar destes indivíduos. Os moradores de espaços de exclusão social como periferias e favelas tem suas crenças e valores contaminados prioritariamente pelos meios comunicativos. “Vivemos com imagens e entendemos o mundo por imagens” (BELTING, p.14, 2009). De um lado, a imagem do medo é um dos elementos relevantes difundidos pelo Estado, de outro lado, o medo constitui sua própria imagem.

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Em relação à imagem do Estado, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) elaborou uma série de estudos e pesquisas a fim de subsidiar a elaboração de planos, políticas e programas governamentais criando o Sistema de Indicadores de Percepção Social (SIPS). Segundo sua definição: “esta pesquisa configura um sistema de indicadores sociais para a verificação de como a população avalia os serviços de utilidade pública e o grau de importância deles para a sociedade”. Atuando em temas como Justiça, Cultura, Segurança Pública, Bancos, Saúde, Educação e Trabalho a pesquisa apresenta análises de estatísticas e dados quantitativos.

Em Março de 2011 o Sistema de Indicadores de Percepção Social (SIPS), lançou a pesquisa sobre Segurança Pública no Brasil. Com dados da pesquisa iniciada em 2010 com o seguinte tema: Como os cidadãos de diferentes regiões brasileiras enxergam como o poder público atua em relação ao problema da criminalidade e da violência4.

Neste cenário de periferia a integração do Estado com os indivíduos se qualifica midiaticamente, transformando os meios em território estratégico de poder, quando pretende divulgar sua atuação através de manifestações visuais. Soma-se a esses fatores uma lógica de consumo criando produtos e serviços públicos dirigidos a essa população, oferecidos como forma de inclusão na cidade formal.

Fatores que favoreceram a atuação midiatizada do Estado A produção televisiva nacional de ficção e não ficção desde o início dos anos 2000 tem estabelecido sua função de prestador de serviços sociais em prol da cidadania como um de seus principais vetores de atuação. A emissora de maior expressão nacional, a Rede Globo de Televisão                                                                                                                         4

 Disponível  em:www.ipea.gov.br/.../SIPS/110330_sips_seguranapublica_apresentacao.pdf.  

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publica anualmente um documento chamado Balanço Social da Rede Globo descrevendo suas ações. A empresa divide sua atuação três frentes: programas (Globo Ciência, Ação, Criança Esperança, Globo Cidadania, entre outros) projetos sociais e ações educativas (Ação Global e Amigos da Escola) e a inclusão de temas de responsabilidade social na dramaturgia.

As ações socioeducativas nos programas de entretenimento televisivo, o chamado merchandising social emerge como um vetor que se propõe educar, sendo uma manifestação modalizante do poder. Uma estratégia dissuasiva (BAUDRILLARD) de uma cultura dominante para gerar uma dessubjetivização dos cidadãos. O medo é um fator decisivo na conduta dos consumidores, influenciam seus pensamentos e geram necessidades materiais e imateriais. O medo tornou-se um sentimento que parece informar hegemonicamente as relações sociais entre os cidadãos da sociedade contemporânea e um importante discurso da governabilidade (MARTIN BARBERO).

A produção televisiva nacional, especificamente as séries da Rede Globo, produziu a partir do lançamento e sucesso do filme “Cidade de Deus”(2002) um linha de teledramaturgia como “Cidade dos Homens” (2003 - 2005) “Carandiru, outras histórias” (2005), “Antônia” (2006), Força Tarefa (2009-2011) e Na forma da lei (2010). Essa estética ao mostrar as favelas e áreas degradadas de forma visualmente regular foi pouco a pouco sendo absorvida nas telenovelas, exemplo é a novela Duas Caras (2007). Nestes produtos televisivos da primeira década dos anos 2000, o medo e a relação espaço-social são formadores de uma visualidade que o poder estatal pretende organizar. Segundo o relatório produzido anualmente pela emissora chamado Balanço Social da Rede Globo, em 2008 foram cerca de 600 cenas, em 2009 foram 858 cenas, em 2010 foram 837 cenas e em 2011 foram 452 cenas com o chamado merchandising social. Os temas mais utilizados são violência urbana, violência doméstica, inclusão, diversidade, cidadania e combate ao crime.

O telejornalismo deste período tiveram alguns marcos de mobilização pública que podem ser visto como estratégias de divulgação da ação do Estado: Sequestro do ônibus 174 (2000), Caso 7    

   

 

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Tim Lopes e Rebelião de Bangu I liderado por Beira Mar (2002), Ataque terroristas do PCC (2003), Rebelião de presos no Rio de Janeiro (2004), Proibição da venda de armas de fogo no Brasil e Chacina na Baixada Fluminense (2005), Atentados do PCC que pararam São Paulo (2006), Caso Eloá Pimentel (2008), Disputa de Traficantes Morro dos Macacos e Ocupação Militar do Complexo do Alemão (2010), Morro da Magueira, Vidigal e Rocinha (2011).

Justifica essas produções televisivas a crise gerada pela expansão demográfica das metrópoles brasileiras e os consequentes conflitos sociais. A periferia se transforma em ponto estratégico de governabilidade e planos políticos. Neste período a periferia incorporou elementos midiáticos em seu cotidiano, consomem incessantemente imagens televisivas e buscam participar da cidade que os excluía por meio das mídias de massa. Essa transformação possibilitou ao Estado o uso midiático ao seu favor apresentando uma operação de midiatização do poder de um território ocupado pelo tráfico de drogas e a violência derivada da relação de poder de sua comercialização. As produções televisivas foram alinhadas com os interesses do Estado tendo como discurso a reparação de um problema histórico nas regiões periféricas do Rio de Janeiro e São Paulo. Convêm ressaltar que anteriormente o próprio Estado e mídia homologaram a “Guerra ao tráfico” como medo coletivo valorizando sua atuação social de combate, porém perceberam que tal situação apenas enfraqueceu sua imagem percebida dos serviços de controle e vigilância.

No intercâmbio entre as imagens televisivas do medo previamente homologado e instituído pelo Estado e a campanha midiática de saneamento das operações militares e policiais percebemos como estas visualidades operam como dispositivo de controle e consumo daqueles territórios e expande sua relevância como mecanismo político contemporâneo. As questões de controle e vigilância do Estado e suas ações nos territórios de exclusão podem ser observadas sobre a matriz de Michael Foucault, especificamente as questões referentes ao vigiar e punir atualizados por Giorgio Agamben (2009) Para isso se faz necessário a perspectiva de análise da governabilidade, que trata das instituições e o modo como conduzem indivíduos e grupos, ligados por diferentes relações de poder. 8    

   

 

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As trocas contínuas entre os meios comunicativos e os territórios ocupados pelo medo, a estratégia das imagens se fixam como dispositivos nas relações sociais. Conforme a leitura de Giorgio Agamben para o conceito de dispositivo criado por Michel Foucault, o poder de vigilância do Estado opera as imagens como dispositivo de controle daqueles territórios, ampliado-o como mecanismo político contemporâneo. Dispositivo passa a ser “qualquer coisa que tenha de algum modo a capacidade de capturar, orientar, determinar, interceptar, modelar, controlar e assegurar os gestos, as condutas, as opiniões e os discursos dos seres viventes”(2009, p.40).

Os acontecimentos midiáticos que evidenciam, em sua singularidade, a estratégia do Estado para interferir nessas regiões periféricas podem ser observados sob a ótica do conceito de espetáculo de Guy Debord. Assim, a recuperação midiática das manifestações do medo são imagens que possuem a função de unir a sociedade ao mesmo tempo em que a compõe e se transformam na própria sociedade.

O meio comunicativo e suas trocas atuam na divulgação dos serviços de Segurança Pública tornaram-se dispositivo espetacular de controle pelo qual o Estado articula em seu favor como uma real estrutura de poder. Ressaltando o dispositivo como “um conjunto de práticas e mecanismos (ao mesmo tempo linguísticos e não-linguísticos, jurídicos, técnicos e militares) que têm o objetivo de fazer frente a uma urgência e de obter um efeito mais ou menos imediato” (AGAMBEN, 2009, p.35). E espetacular pelo seu aspecto de unificação da sociedade em prol de um alerta de defesa, se tornando assim parte da sociedade e a própria sociedade simultâneamente.

Conclusão Na periferia das grandes cidades, eclodem novos desenhos do habitar e são o laboratório de experiências urbanas e perceptivas do Estado. Considerado como o mercado emergente do consumo 9    

   

 

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e da comunicação de massa os habitantes das favelas e periferias adquirem aparatos tecnológicos que modelam o seu cotidiano. Compram televisores e cercam de telas seus lares e comércios, buscam serviços clandestinos de canais a cabo e adquirem celulares com conexão de internet. Imprimem novos usos, distorcem e alteram os meios de massa. Procuram participar da cidade que os exclui espacialmente nas brechas das possibilidades patrocinadas pelo meio digital. Os fenômenos das redes sociais com seus perfis e avatares possibilitaram criar outras formas de relacionar com os habitantes da cidade formal. Essa transformação impulsionou o Estado a incluir em suas estratégias o componente midiático ao seu favor nas operações nas regiões de favela e periferia.

Antes o serviço de urbanização se dedicava fornecer elementos do habitar, sua atuação comprendia em edificações coletivas, obras viárias, conjuntos residencias e comerciais. Se considerarmos que a divulgação da imagem desses territórios compõe a atual estratégia de governabilidade, tal lógica influenciou os planos urbanistas. Não se trata de apenas atender uma necessidade primordia do cidadão ma configurar seu uso na cidade e imprimir uma lógica de consumo na relação com os serviços estatais.

Atualmente na região de periferia são realizadas várias ações urbanísticas como: a abertura e ordenação da malha viária; revitalização das habitações, pacificação da uma comunidade, formalização empresas, implantação de sistemas de comunicação, bem como a limpeza e iluminação das ruas. A consequência da reforma urbana nestes territórios é que essas transformações tem um preço e onera o custo de vida destes habitantes. Em muitos casos ocorre a real expulsão dos indivíduos pela lógica da especulação imobiliária e comercial de algumas áreas de periferia.

Um exemplo desta forma de atuação ocorreu na ação denominada "Retomada do Complexo do Alemão" em 2010. O início do projeto ocorre em 2007, com o apelo dos Jogos Panamericanos, um grupos de empresários interessados na consolidação da cidade para eventos de grande porte, nos 10    

   

 

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moldes think tanks, apresentam ao Governador do Estado um projeto que analisava os erros anteriores e explorava a midiatização da operação até a saturação em prol de investimentos políticos e sociais. As ações de implantação das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) iniciadas em 2009 e foram amplamente apoiados e secundados pela mídia em geral. O elemento mais icônico desta ação foi o projeto de Intervenção Urbanística do Complexo do Alemão (IUCA) cujo ponto alto foi a construção de um icônico teleférico que alteraria traçados, trajetos e fluxos nas favelas do Rio de Janeiro. Para tal seria necessário um profundo e efetivo saneamento midiático da imagem estatal, uma ação à altura do monumento físico a ser construído, uma estratégia ostensiva do poder estatal cuja lógica perceptiva torna coerente os investimentos na área.

Tal ação de midiatização se por um lado seduz a audiência com seu espetáculo visual, por outro lado oculta alguns problemas a longo prazo. De tão exuberante e tão alta definição, a espetacularização desta imagem (DEBORD, 1997) se sobrepõe a qualquer questionamento crítico da recepção. Essa imagem vem com um discurso fechado como um dispositivo, porém com uma ambivalência que serve para os dois lados. Pressupõe-se que há um interesse maior das duas partes que supera as leis e a legitimidade, a ética e a lógica política. Com esse interesse confrontado há uma padronização nas ações dos polos sobrepostos e aparentemente opostos. Assim o domínio mediatizado do território vitimado e fragilizado ordenaria as estruturas criando alças governáveis onde todas as culturas dirigentes do local se beneficiariam desta imagem, não só pela governabilidade, mas pela alteração da forma de pensar, que teria efeitos a longo prazo.

Referências AGAMBEN, Giorgio. O que é Contemporâneo? E outros ensaios. Chapecó: Argos, 2009.

ALVARENGA, Galeno. O poder das emoções. São Paulo: G.P.M.A., 2007

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