Miqueias, o profeta da roça - Uma hermenêutica sociológica.

July 3, 2017 | Autor: José Ademar Kaefer | Categoria: Sociology, Prophets, Pastoral Theology, Bible, Miqueas
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Miquéias, o profeta da roça - Uma hermenêutica sociológica

José Ademar Kaefer ([email protected]) Miqueias1 é um desses profetas que fazem jus ao título, que sem hesitar chamam sobre si a responsabilidade de denunciar as injustiças praticadas contra o povo sofrido. É por isso que ele é inspiração em todos os tempos. Nascido em Morasti Gat (1,1), um povoado no interior de Judá, Miqueias é conhecido nos círculos bíblicos latino-americanos como o profeta camponês. Isso faz sentido porque seu povoado ficava junto à Sefelá, uma franja de terra fértil que seguia em paralelo à costa do Mar Mediterrâneo, e conhecida como celeiro agrícola de Judá. Esta era sempre uma das regiões economicamente mais afetadas em tempos de guerra. E, conforme Mq 1,1, Miqueias viveu num período de duas grandes guerras: a guerra siroefraimita contra a Assíria, que resultou na tomada da Samaria em 722/720 a.C., e a guerra da coalizão anti Assíria de 705 a 701 a.C., liderada pelo rei Ezequias de Jerusalém. Além da guerra que tornava os campos agrícolas palcos de batalhas, os camponeses eram espoliados pelos comerciantes, pelos magistrados, pelo latifúndio e pelos chefes do estado (2,1-2; 3,1-12). E é contra essa realidade de completa injustiça que o profeta fala em nome de Javé, única esperança dos pobres. Destacam-se no livro de Miqueias três aspectos principais: -Denúncias: “Ai (hoi) dos que planejam iniquidades” (2,1) -Conflito: campo x cidade (3,1-12). Contra os “cabeças da casa de Jacó e Judá”. -Esperança messiânica (Mq 5,1-2)

1. Contexto do profeta Conforme o enunciado do livro 1,1, estaríamos nos anos dos reis Joatão (743-735), Acaz (735-716), e Ezequias (716-687). Talvez no final do reinado de Joatão, 736 a início de Ezequias, 701. Os pesquisadores preferem uma data entre os anos 727-701. Portanto, Miqueias terá vivido num período de duas grandes guerras: a guerra siroefraimita contra a Assíria, que resultou no tomada da Samaria em 722/721 a.C., e a guerra da coalizão anti Assíria de 705 a 701 a.C., liderada pelo rei Ezequias de Jerusalém, que resultou na destruição quase total de toda a Judá, a exceção da capital Jerusalém, que se rendeu.

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Talvez a abreviação de mikayah “quem é como Javé”.

Se assim, Miqueias teria atuado logo depois do profeta Oseias, só que no sul, Judá, e mais ou menos no mesmo tempo do profeta Isaías. Em 1,8-15 o livro de Miqueias fala da destruição da várias cidades em Judá, inclusive da cidade do profeta, Morasti Gat, possivelmente em 701 a.C, por Senaquerib, rei da Assíria. Jeremias cita Miqueias (Jr 26,17-19), que atuou no tempo do rei Joaquim, que reinou entre 605-598, sobre a destruição de Jerusalém e o templo. Mas, pode ser que esse texto não seja de Jeremias.

2. Estrutura do livro Mas, o livro de Miqueias, como todos os livros proféticos, não tem somente palavras do profeta, também tem muitos adendos, que, aliás, são o grosso do livro. Depois da apresentação do v.1, o livro de Miqueias pode ser divido em três partes:

A) 1,2-3,12: Oráculos de Miqueias. Essa é a parte considerada mais original do livro. É possível que aqui nos encontremos ainda por volta do ano 700 a.C.. Ela pode ser dividida em: Oráculo contra a Samaria (1,2-7); Lamento pela destruição das cidades, possivelmente por Senaquerib, rei da Assíria (1,8-16); Denúncia contra os poderosos que cobiçam as terras, contra os comerciantes que arrancam a carne do povo, contra os mercenários e contra as autoridades políticas (2,1-3,12).

B) 4,1-5,14: Oráculos pela reconstrução de Jerusalém. Esta parte deve ser do exílio e pós-exílio, pois fala do sonho de um novo recomeço, de peregrinação à montanha de Sião, da reconstrução do templo, do fim da guerra, da reunião dos dispersos, de tempos messiânicos etc. –

C) 6,1-7,20: Oráculos de julgamento e de salvação. Esta parte pode ser dividida em outras duas: a) 6,1-7,7: denúncias contra Israel Norte; b) 7,8-20: esperanças pela reconstrução. É possível que na primeira parte (6,1-7,7) encontremos textos antigos provenientes de Israel Norte, como a referência ao Êxodo (6,4-5) e a Amri e Acab (6,16). A exploração comercial, a violência e injustiça social de (6,9-14 e de 7,1-7) pode tratar-se dos tempos de Jeroboão II, mas também pode referir-se a Jerusalém antes do exílio, ou até mesmo à injustiça social no pós-exílio.

A segunda parte (7,8-20) é claramente exílica ou pós-exílica, pois trata da culpa, da desolação e da esperança pela reconstrução.

3. Morasti Gat ou Tell el-Judeideh Morasti Gat, a terra natal do profeta Miqueias, era uma cidade no interior de Judá, em torno de 35 Km a sudoeste de Jerusalém, perto de Maresa. Veja no mapa.

Ao redor de Morasti Gat havia muitas fortalezas militares para controlar a fértil região. É por isso que ela é a região onde a guerra foi mais intensa.

A planície de Sefelá, onde se situa Morasti Gat

Subindo o sítio arqueológico de Morasti Gat

4. Referências bibliográficas: HAHN, Noli Bernardo. A Profecia de Miquéias e “meu povo”: memórias, vozes e experiências. Petrópolis, Estudos Bíblicos v. 73, p. 92-101, 2002. JÚNIOR, Vicente D. Castro. A Ruína de Sião e Jerusalém em Miquéias 3,9-12. São Paulo: Pontifícia Faculdade de Teologia Nossa Senhora da Assunção, Dissertação, 2008. KESSLER, Rainer. Miquéias e a questão da terra no antigo Israel. Goiânia: Fragmentos de Cultura, v. 11, p. 791-800, 2001. LAGO, Lorenzo. Miquéias: Resistir ou Perdoar? Estudos Bíblicos, Petrópolis: Vozes, v. 72, p. 21- 34, 2002. NOVA BÍBLIA PASTORAL. São Paulo: Editora Paulus, p.1139-1145, 2014. PIXLEY, Jorge. Miquéias o livro e Miquéias o profeta. RIBLA, Petrópolis, n.35/36, p. 206-211, 2000. QUIÑONES, A., LOPEZ, F. Amós e Miqueias: Dois profetas lavradores. São Paulo: Paulinas, 1993. REIMER, Haroldo. Ruína e reorganização, o conflito campo-cidade em Miquéias. Revista de Interpretação Bíblica Latino-americana, Petrópolis, n. 26, (1997), p.99-109. SCHWANTES, Milton. "Meu Povo" em Miquéias. A Palavra na Vida, n. 15, Belo Horizonte, 1989. SUAIDEN, Silvana. Miqueias 6,1-8: Um texto paradigmático na interface da crítica profética com a sabedoria israelita. São Bernardo do Campo: Universidade Metodista de São Paulo, Dissertação, 2012. ZABATIERO, Julio Paulo Tavares. Miquéias: Voz dos Sem Terra. Petrópolis: Vozes, 1996. José Ademar Kaefer [email protected]

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