\'Mirante do desafogo\' (2013)

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JL /

20defevereiroasdemarçode20I3 • jornaldeletras.sapo.pt

tal como Maya, Biggelow é uma mulher num mundo de homens.

PATRIMÓNIO,

ESPETÁCUL~RTES

*

23 1

ARQUITETURA

I

Ana Assis Pacheco

Django Libertado Ainda não é desta que a Academia vai reparar a injustiça de 1994, em que deu o Oscar a Forrest Gump, em detrimento de Pulp Fiction, o filme mais marcante da década. Em Django Libertado, no meio de alguma polémica, suscitada sobretudo por Spike Lee, Tarantino, ao seu melhor estilo, cria um herói ou anti-herói, em vésperas da Guerra Civil Americana. Em muitos aspetos, o filme aproxima-se de Cães Danados, mas também se encontra a vontade de reescrever a história de Sacanas sem Lei. Mais do que Jamie Foxx, há um grande papel de Christoph Waltz, que não lhe deve valer um novo Oscar. Mas, inevitavelmente, Tarantino é um grande candidato à estatueta para o melhor argumento original.

Guia para um Final Feliz E eis quando senão aparece ... uma comédia romântica. O género nunca foi muito querido pelos Oscars, que não leva a sério aquilo que nos faz rir. Mas a única justificação para Guia para um Final Feliz ter desbravado caminhos até chegar à nomeação para o melhor (e melhor realizador), não é a qualidade da obra por si só, será antes o estatuto que David O. Russell conquistou depois de The Fighter, obra que esteve nomeada para os Oscars e de que muito se falou (era de resto superior a esta). Guia para um Final feliz é uma comédia romântica independente, sobretudo em termos estéticos, que se dá ao luxo de ter Robert De Niro num papel secundário. Há um bom movimento de câmara, sobretudo no início, uma história leve e bem contada, uma certa ideia de que de louco todos temos um pouco, a conjugação explosiva de baseball com danças de salão. Mas também algumas falhas a nível de argumento que fazem com que não seja uma obra brilhante dentro dogénero.

Mirante do desafogo C O pequeno largo estava vazio.

Os plátanos despidos de folhas. O frio instalara-se desde cedo penetrando até aos ossos. Mas à tardinha todos lancharíamos ali perto nas melhores pastelarias do mundo. Depois de percorrermos uma tranquila estrada pelo vale, ao chegarmos cruzámonos logo com aquelas figuras gulosas, trajadas de grossa capa comprida e medalhão vistoso ao pescoço. Confrades felizes seguramente por coisa boa, afinal estamos em Tentúgal. E se todos sabemos o que nos leva até lá, podemos ir mais cedo, ainda sem fome para avistar o antigo mirante de onde há quatrocentos anos as religiosas carmelitas olhavam o mundo. Vergílio Correia, no Inventário Artístico de Portugal - Distrito de Coimbra, chamara a essa parte do edifício, o 'mirante

Nem todo o outsider é bom, nem todo o mainstream é mau. O grande outsiderdos Oscars 2013 é o pior filme de todos. Misterioso apetite new age terá levado a Academia a nomear um illme de um realizador estreante. É tudo tão básico, pequeno, cheio de filosofia barata, em que a manipulação da câmara ma i~ rln

do desafogo'. Construído entre 1632 e 1693, o convento de Nossa Senhora da Natividade fôra fundado em 1559 para a Ordem das Carmelitas Descalças, à qual pertencia a famosa santa Teresa de Ávila (1515- 1582). Na igreja carmelita de Tentúgal, o cadeira! do coro alto, dá-nos conta de que pelo menos 43 religiosas ali viveram. Sabe- se que as fundadoras vieram do convento carmelita que havia em Beja. Do conjunto conventual restou para além da igreja, o mirante. Edificado estrategicamente numa esquina, o seu gradeado é belíssimo pois é em pedra, com pequeníssimas aberturas quadradas, que permitiam que as religiosas pudessem olhar a rua e o mundo lá fora, sem serem vistas. Este elemento arquitetonico é habitual em casas religiosas

TEATRO Helena Simões

No bosque invisível C Nos 40 anos da Cornucópia,

Bestas do Sul Selvagem

I

um espetáculo diferente, em cuja base está o texto O Estado do Bosque (Assírio e Alvim, 2013) de José Tolentino de Mendonça (1965) que, como se sabe, é um poeta singular. Luís Miguel Cintra (ler entrevista no último JL, sobre a peça, a encenação e a companhia) tentou construir com este texto o que de facto não tem

devastação de valores. Para Hegel, o teatro fazia parte da poesia não lhe sendo concedida autonomia; a poesia dramática reunia em síntese a objetividade da épica com a subjetividade da lírica. Tivesse Hegel razão ou não, em todo o caso e nesse sentido O Estado do Bosque resultou num espetáculo hegeliano, sem a sua própria

femininas, havendo - o noutros conventos, não apenas na região de Coimbra, como por todo o país, e também no Brasil. No sul de Portugal, os mirantes distinguem- se por terem um gradeado em cerâmica, de tipo 'claustrum', segundo designação de Henri Stierlin. E em Coimbra, o convento de Celas, que era de religiosas cistercienses tem um mirante com várias janelas sobre a porta, com gradeado em fasquiado de madeira -a precisar de conserto. O mirante, é precisamente uma

característica arquitetónica que nos permite uma viagem nostálgica ao encontro das religiosas que faziam voto de clausura perpétua, e que só . dali, do seu mirante, olhavam o mundo. Ainda na mesma cidade de Coimbra, o mosteiro da Rainha Santa, obra da segunda metade do século XVII, tem o seu mirante situado no ângulo que a igreja faz com o longo edifício do dormitório. Dali, do mirante, podiam as religiosas vislumbrar o mundo que existia lá fora, do qual apenas não faziam parte 'in corpore' .JL

cego concreto e simbólico que, sentado na orla de um bosque indefinido como uma lacuna da nossa sede de verdade - verdade sobre a origem, verdade sobre a finalidade, verdade sobre a fmitude -, portanto um bosque como mistério e ao mesmo tempo via para esse mistério, nos convida a acompanhá - lo nessa peregrinação. Já se compreendeu que é uma peregrinação interior. À sua volta gravitam algumas personagens com os seus parcos destirlos que nunca explicam a sua presença, porém estão a povoar aquilo a que se podia chamar a grande solidão do teatro que se quer morto. É bonita a ideia de utilização da gravação através de telemóvel de uma voz off que é, no fundo, a única a conseguir dialogar

livro e o espetáculo: um dos pontos em comum é que, salvo raras exceções, não falam do labor teatral, mas acrescentam reflexão à reflexão filosófica proposta, com uma nomenclatura pessoal. É mais uma outra reflexão. De facto , o teatro (igualmente o teatro sobre a morte do teatro) efetivamente morreu, como se os atores não existissem, como se de novo não nos encontrássemos com o grande ator Luís Miguel Cintra, com uma estética de espaço natural, aberta, portanto omitida, como se o jogo de ritmos, de falas , de silêncios, não fosse a matéria prima de cada espetáculo. Por isso repito: espetáculo sui generis, diferente, lembrando a personagem de Job, cujas queixas

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