Modelo Projeto Iniciação Científica FAPESP

October 3, 2017 | Autor: Carlos Pires | Categoria: Literature
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CARLOS HENRIQUE PIRES DE SOUSA

Do Romance Hermético ao Best-Seller: Análise comparativa entre os romances Life of Pi de Yann Martel e Max and the Cats de Moacyr Scliar.

Projeto de pesquisa a ser desenvolvido junto ao Departamento de Letras Modernas, da Faculdade de Ciências e Letras de Assis UNESP, apresentado à FAPESP para solicitação de bolsa de Iniciação Científica. Orientadora Responsável: Professora Doutora Cleide Antonia Rapucci

Assis

2013

1. 2. 3. 3.1 3.2 4. 5. 6. 7.

Sumário Resumo e Palavras-chave Introdução e Justificativa A simbologia na composição do Romance Do Romance Hermético ao Best-seller Objetivos Metodologia Plano de Trabalho e Cronograma de Execução Bibliografia

Página 3 4 11 12 12 13 14 14

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2. Resumo Este trabalho propõe uma comparação entre as obras Life of Pi - a novel (2001), do autor canadense Yann Martel e Max and the Cats tradução de Eloah F. Giacomelli do romance Max e os Felinos (1981) do autor brasileiro Moacyr Scliar. Toma-se por objetivo desta proposta a busca de elementos que indiquem a presença do romance Max e os Felinos na obra best-seller de Martel, vencedora da premiação literária Man Booker conferida pela Inglaterra em 2002. Para tal, com base na bibliografia inicial, a Teoria do Romance de Donaldo Schüler (São Paulo: Ática, 1989) e Literatura Comparada: Textos Fundadores, organizados por Eduardo F. Coutinho e Tania Franco Carvalhal (Rio de Janeiro: Rocco, 1994), entre outros, serão apontados e analisados aproximações e distanciamentos entre os dois romances, e principalmente, a forma como tais elementos foram desenvolvidos na construção de uma obra estrangeira da indústria cultural que obteve reconhecimento internacional e várias refrações, partindo do leitmotiv de uma obra hermética brasileira. Palavras-chave: Moacyr Scliar, Yann Martel, Best-seller, Hipertextualidade, Literatura Comparada. Abstract This research aims to make a comparison between the works Life of Pi - a novel (2001), by the Canadian author Yann Martel and Max and the cats translated by Eloah F. Giacomelli's from the novel Max e os Felinos (1981) by the Brazilian author Moacyr Scliar. The main objective of this project is to seek evidences which suggest the presence of the novel Max and the Cats in Martel‟s best-seller work, winner of the Man Booker Prize , literary award conferred by England, in 2002. Therefore, based on the initial bibliography, Teoria do Romance by Donaldo Schüler (São Paulo: Ática, 1989) and Literatura Comparada: Textos Fundadores, organized by Eduardo F. Coutinho and Tania Franco Carvalhal (Rio de Janeiro: Rocco, 1994), among others, we will point out and analyze similarities and differences between the two novels, and especially how these elements have been developed to build a cultural industry foreign work that gained international recognition and several refractions, originated from the leitmotiv of a hermetic Brazilian work. Key-words: Moacyr Scliar, Yann Martel, Bestseller, Hypertextuality, Comparative Literature.

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3. Introdução e Justificativa Moacyr Jaime Scliar, nascido em 23 de Março de 1937, em Porto Alegre, Rio Grande do Sul foi um importante escritor brasileiro, sétimo ocupante da cadeira de numeração 31 da Academia Brasileira de Letras e detentor de diversos prêmios literários, tais como o Prêmio Jabuti (1988, 1993 e 2009), Prêmio Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA) (1989) e Prêmio Casa de las Américas (1989). Moacyr começou sua produção literária desde jovem e ainda durante a graduação no curso de medicina pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, teve suas crônicas publicadas no jornal da faculdade - O Bisturi -, nas quais Scliar narrava situações baseadas em sua experiência como estudante de medicina provindo de classe média, em relação ao choque que teve ao entrar em contato com a condição humana e a saúde dos hospitais públicos. A partir de tais crônicas, surge o livro Histórias de um Médico em Formação (1962), que foi o precedente de sua obra que tomava saúde pública (sua especialização) como sua temática principal. A vasta produção do autor que passa de 70 livros, conta com diversos gêneros, dentre eles ensaios, crônicas, literatura infanto-juvenil e ficção, que já foram traduzidos para doze idiomas com grande repercussão e crítica. Entre suas obras de maior destaque apresentam-se além de crônicas, os romances O centauro no Jardim (Rio: Nova Fronteira, 1980. Porto Alegre, L&PM), A Estranha nação de Rafael Mendes (Porto Alegre: L&PM, 1983), O ciclo das águas (Porto Alegre: Globo, 1975; Porto Alegre: L&PM, 1996), e Max e os Felinos (Porto Alegre: L&PM, 1981). Com influência de suas origens, além da medicina, Moacyr frequentemente adota como temática de sua obra a imigração judaica no Brasil, o socialismo, a vida da classe média no país e o viajante transcultural. Segundo Zilah Bernd e Regina Zilberman (O viajante transcultural: leituras da obra de Moacyr Scliar. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2004) entendese por viajante transcultural na obra de Scliar, as transferências culturais associadas a diferentes maneiras de relação com o mundo, que faz parte das estratégias de sobrevivência e adaptação do personagem. No Romance Max e os Felinos (1981), tal transferência é representada pela travessia do oceano Atlântico e concretizada na medida em que o personagem se adapta a nova terra, associando o novo à construção de seu ser, sem deixar de ser ele mesmo. No romance, Scliar tece sua narrativa em torno de acontecimentos ligados ao jovem Max, alemão nascido em 1912, que desde sua infância sofre com o autoritarismo de seu pai 4

Hans Schmidt, dono da loja de peles de animais “Ao Tigre de bengala”, assim nomeada por causa da fera que o próprio abatera durante uma expedição na Índia, e após seu empalhamento mantivera como símbolo principal de seu estabelecimento. A estrutura do romance é dividida em três partes: a primeira intitulada “O Tigre Sobre o Armário” introduz o leitor ao universo de Max, narrando assim a infância do personagem, sua relação com a família e seu amadurecimento sexual. A presença da fera empalhada aterroriza o garoto que morava em Berlim e seu pai o julga covarde por este fato. Com o passar dos anos, o regime nazista ascende na Alemanha e por envolver-se com a esposa de um comerciante ligado ao Partido, o jovem torna-se um perseguido político e se vê obrigado a fugir do país. Apaixonado por biologia desde pequeno, Max Schmidt que sempre sonhara com a diversidade da fauna e da flora do Brasil, apressadamente garante, com as joias que ganhara de sua mãe, um lugar na embarcação que vai em direção ao país da América do Sul: o cargueiro Germania, carregado de animais do senhor italiano Ettore, que voltava de uma turnê pela Europa com sua espécie de circo. O que Max não sabia era que o navio já estava preparado para o naufrágio criminoso, no qual o capitão e o dono do circo lucrariam com os seguros da embarcação e dos animais. A segunda parte é intitulada “O Jaguar no Escaler”, e narra a sobrevivência de Max no oceano Atlântico, a caminho do Brasil. O garoto consegue escapar em um dos botes salvavidas do Germania, e ao tentar improvisar uma cabana para proteger-se do sol com os destroços do navio jogados ao mar, sem intenção liberta um jaguar da caixa onde estava preso. O animal pula no escaler no qual Max se encontra. Em poucas páginas, Moacyr Scliar conta a sobrevivência do garoto em convívio com a fera na pequena embarcação, e a chegada de Max à costa do Brasil. Desorientado devido à desnutrição, insolação e falta de água, o garoto não tem certeza se a peripécia com o segundo felino inserido em sua vida foi real ou somente uma alucinação. Max reconstrói sua vida no novo país e encontra uma nova identidade brasileira com o passar do tempo. A maturidade do personagem que já não é mais um garoto se torna evidente após a travessia. Encerrando a narrativa, em sua última divisão estrutural, de nome “A Onça no Morro”, Max já velho, após o término da Segunda Guerra Mundial, casado e com uma filha, volta à Alemanha à procura de seus pais. Berlim está destruída, Max descobre que sua mãe havia morrido logo após sua partida e seu pai estava internado em um sanatório. Na volta ao Brasil, a narrativa passa a ser construída sobre mínimos detalhes. Max encontra evidências próprias 5

de que seu novo vizinho possa ser o nazista que o forçou a sair da Alemanha - porém agora refugiado com a queda do nazismo -, e passa a persegui-lo. A chácara na qual Max e sua família vivem passa a ser atacada e seus animais desaparecem. O terceiro felino aparece na história: para Max, seu novo vizinho é o responsável pelos ataques, enquanto todos acreditam ser apenas uma onça das redondezas. Max entra em confronto com o vizinho que acaba por matar-se em sua presença, é preso por seis anos acusado de homicídio, e ao retorno de sua liberdade passa a criar gatos domésticos. Com os três felinos principais do enredo, Moacyr Scliar possivelmente busca representar o contexto histórico da narrativa, mostrando não somente a crítica evidente que o romance faz ao Regime Nazista, mas também o motivo de ter resgatado a época em que o mundo se viu diante de um gigante repressor. Max e os Felinos foi escrito no período da Ditadura Militar no Brasil e em outros países da América do Sul. O autor cria este paralelo de modo a exercer sua crítica e evitar a censura. Nove anos depois, em 1990, a obra traduzida por Eloah F. Giacomelli para o inglês é publicada nos Estados Unidos pela editora Ballantine Books e no Canadá pela editora Key Potter Books, com o título de Max and the Cats. A obra passa a ter destaque não só nacional, mas também internacional.

Max and the Cats recebe críticas positivas de importantes

periódicos estrangeiros, tais como os seguintes trechos 1 publicados pelo San Francisco Chronicle: “Scliar may be the best writer to introduce us to the wonderful world of American fiction.”2; New York Times: “Like Maupassant or Chekhov, Mr. Scliar writes about unwanted anxieties and meaningful experiences with a delicious, instinctive style”. 3 ; e Publisher‟s Weekly: [Moacyr Scliar] grafts absurd fantasy onto sharp reality to highlight verities of the human condition. Here his zany, canny dreamscapes assert that Germans cannot hide from the atrocities of WWII and will be compelled by their consciences to confront the Nazis in their midst. This message is seamlessly delivered without hint of polemic through the bizarre, hilarious and poignant antics of one Max Schmidt… Terse and whimsical, this engaging subterraneous fantasy strengthens the writer‟s already intrepid voice in Latin fiction.4

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“Reviews” (críticas) retiradas do próprio corpus do romance Max and the cats, em sua edição de 2003 pela Editora Key Porter Books Limited, no Canadá. 2 “Scliar possivelmente é o autor que melhor nos apresentou ao maravilhoso mundo da ficção americana.” (tradução nossa). 3 “Como Maupassant ou Chekhov, o Sr. Scliar escreve sobre preocupações indesejadas e experiências significativas com um estilo instintivo e prazeroso.” (tradução nossa). 4 "[Moacyr Scliar] faz enxertos de fantasia absurda na realidade aguçada com a finalidade de destacar verdades da condição humana. Aqui suas excêntricas, perspicazes paisagens oníricas afirmam que os alemães não podem esconder as atrocidades da Segunda Guerra Mundial e serão compelidos pelas suas consciências a enfrentar os nazistas em seu meio. Esta mensagem é perfeitamente transmitida sem traço de polêmica por meio das peripécias

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Após a boa receptividade em países de língua inglesa, Max e os Felinos é publicado também em Francês, traduzido por Rachel Uziel e Salvatore Rotolo, com o título de Max et les Chats (Paris: Presses de la Renaissence, 1991). Surge então, em 2001 o romance Life of Pi do autor canadense Yann Martel, publicado pela editora Random House of Canada em seu país de origem, e a editora Mariner nos EUA. Originalmente nascido na Espanha em 1963, Yann Martel é filho de canadenses e viajou o mundo antes de começar a escrever: devido à profissão de seu pai (diplomata do governo canadense), foi criado na Costa Rica, França, México e Canadá. Martel estudou filosofia na Universidade de Trent em Peterborough, Ontario, e também morou no Irã, na Turquia e na Índia, onde passou treze meses visitando mosques, igrejas, templos e zoológicos, enquanto estudava textos religiosos que o influenciaram diretamente na composição de Life of Pi. Durante a juventude Martel teve vários empregos não convencionais para um escritor, como segurança, lavador de louças, bibliotecário e plantador de árvores, até que aos 27 anos decidiu dedicar-se exclusivamente à escrita. Sua primeira obra publicada foi uma coleção de contos que interconectam morte e memória em seus temas, com o título The Facts behind the Helsinki Roccamatios (1993), vencedora da premiação Journey no mesmo ano. Em 1996 é publicado seu primeiro romance, Self, que se trata de uma autobiografia ficcional de cunho crítico às barreiras impostas pela sociedade. Porém, foi só com o terceiro livro publicado, Life of Pi, que Yann Martel tornou-se um escritor reconhecido internacionalmente. A obra, que foi rejeitada por cinco editoras inglesas antes de ser publicada originalmente pela editora Random House of Canada (Setembro de 2001), foi vencedora do prêmio inglês Man Booker for Fiction de 2002, de reconhecimento mundial. Essa premiação voltada apenas a ficções redigidas em língua inglesa por autores vivos e cidadãos de um país membro da Commonwealth5, da República da Irlanda, Paquistão ou Zimbábue assegura ao ganhador além do reconhecimento internacional, grande incremento nas vendas da obra premiada. O romance Life of Pi, em suas 319 páginas, narra a história do protagonista indiano Piscine Molitor Patel, que quando criança apropria-se do apelido Pi (em alusão ao número

bizarras, divertidas e comoventes de um Max Schmidt... Lacônica e lunática, esta fantasia subterrânea e envolvente fortalece a voz já intrépida do escritor na ficção Latina.” (tradução nossa). 5 Commonwealth of Nations: A “Comunidade de Nações” é uma organização intergovernamental composta por 54 países independentes, dentre eles o Canadá. Todas as nações membros da organização fizeram parte do Império Britânico, com exceção apenas de Moçambique (antiga colônia do Império Português) e Ruanda. (Disponível em: http://thecommonwealth.org/about-us. Acesso em 22 Set. 2013).

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irracional representado pela letra grega) para não ser ridicularizado por seus colegas. A narrativa, assim como Max and the Cats, é dividida em três partes: antes, durante e após um naufrágio no meio do oceano. Pi Patel é filho do dono do zoológico da cidade de Pondicherry e foi criado junto a seu irmão Ravi, perto de animais.

Na primeira parte do romance (intitulada “Toronto e

Pondicherry”) é narrada a busca de Pi pela figura de Deus e seu envolvimento com três religiões: o hinduísmo, catolicismo e islamismo. Seu pai, sempre racional, o avisa que religião é uma armadilha, porém permite que o garoto siga uma, pois segundo suas próprias palavras, acreditar em tudo é o mesmo que acreditar em nada. Aos dezesseis anos do garoto, a Índia passa por uma reforma constitucional e seu pai, não adepto de mudanças, vende o zoológico e parte com a família e os animais vendidos a bordo do cargueiro Tsimtsum em direção ao Canadá, onde recomeçariam suas vidas. Em uma noite tempestuosa, o cargueiro afunda rapidamente e Piscine, desorientado, consegue escapar em um bote salva-vidas acompanhado de uma zebra ferida, uma hiena, um orangotango fêmea e Richard Parker, o tigre de bengala do zoológico. “O Oceano Pacífico”, segunda e maior parte do texto (extensão que faz contraste com a estrutura apresentada de Max and the Cats, de Scliar), narra a sobrevivência do garoto no oceano em uma pequena embarcação repleta de animais. A hiena acaba por atacar a zebra e o orangotango, e depois é morta por Richard Parker, restando assim na embarcação, apenas o garoto e o tigre de bengala. A narrativa então se desenvolve no conflito de sobrevivência dos dois distintos seres por 227 dias no oceano, usando o fantástico para abordar a busca pela divindade do jovem garoto e a amizade que humano e fera constroem enquanto lutam por sua sobrevivência. Em sua última parte, Pi já sem forças alcança a costa do México onde é achado por pescadores e sem vestígio algum da existência de um tigre na embarcação é questionado pela empresa japonesa que segurava o cargueiro que afundou. O garoto é forçado a contar uma história alternativa sobre o que aconteceu na embarcação: Martel em sua narrativa explicita a simbologia do tigre e deixa ao leitor a função de acreditar ou não na existência do tigre Richard Parker. Publicado em mais de quarenta países, com tradução no Brasil feita por Maria Helena Rouanet (intitulada As aventuras de Pi, Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2012), o romance Life of Pi, de Yann Martel, utiliza a fábula primariamente criada por Moacyr Scliar (a sobrevivência de um garoto que acaba de salvar-se de um naufrágio no meio do oceano, em 8

um bote salva-vidas junto a presença de um felino de grande porte) como alegoria dos anseios e crenças da humanidade. Martel utiliza-se da focalização interna do narrador (cria um personagem para exercer a narração - o escritor em busca de uma ideia para seu livro cujo nome nunca é citado - que possivelmente representa ele mesmo) e do discurso indireto livre para deixar sua obra com toques de verossimilhança. Ele mescla, então, a narrativa indireta da figura do escritor com a narrativa do mesmo escritor fingindo ser o próprio Pi, pois como ele mesmo afirma no paratexto do livro “Author‟s Note” (Notas do Autor) “parecia natural que a história do sr. Patel fosse contada quase toda na primeira pessoa, pela voz dele e através dos seus olhos. Mas quaisquer inexatidões ou erros são meus.” (p. XI). É nessa seção que leva o leitor a confundir realidade e ficção , que Martel agradece à “centelha de vida” de seu romance ao autor brasileiro: I have a few people to thank. I am most obviously indebted to Mr. Patel [o próprio Pi]. My gratitude to him is as boundless as the Pacific Ocean and I hope that my telling of his tale does not disappoint him. […] Also, I am indebted to Mr. Moacyr Scliar, for the spark of life. 6

Vemos então o mesmo leitmotiv em obras distintas. Martel aborda o religioso, e Scliar com ponto de vista crítico e político, tem como objetivo retratar um grande opressor da humanidade do século XX: o nazi-fascismo alemão. O autor também faz um paralelo dessa época com o período pelo qual o Brasil passava quando o romance foi escrito (1981): a ditadura militar. Com a premiação Man Booker a obra de Martel se torna conhecido e o autor é procurado para dar diversas entrevistas sobre a composição e repercussão de sua obra. Dentre elas, ele faz declarações ao Brothers Judd entrevistas de autores

site literário que esboça críticas e expõe

, em entrevista na qual foi questionado se houve história específica,

pessoa ou tigre no qual ele baseara seu livro. O autor canadense conta: Briefly, this is how it happened: Ten years ago. Review in New York Times Book Review by John Updike of a Brazilian novel by one Moacyr Scliar. About Jewish family running zoo in Berlin in 1933. Business bad (i.e. someone just go [sic] elected to power). They decide to move to Brazil. Ship sinks. Jewish

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“Eu tenho algumas pessoas a agradecer. A pessoa com quem mais me encontro em débito obviamente é o Sr. Patel [o próprio Pi, protagonista da obra]. Minha gratidão para com ele não tem fronteiras, assim como o Oceano Pacífico e espero que minha forma de contar sua história não o desaponte. […] Também devo ao Sr. Moacyr Scliar a fagulha de vida.” (tradução nossa).

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zookeeper ends up in lifeboat with black panther. Obvious allegory of Nazi Germany. Not a good review. Did nothing to Updike. But premise sizzled in my mind. I thought "Man, I could do something with that". But book already written, so I moved on and wrote my first novel [Self] and traveled.7

Scliar passa a receber ligações de jornalistas indagando sobre seu posicionamento em relação ao fato de um escritor ter ganhado, na Europa, um prêmio importante baseado em um texto seu. Como ele mesmo declara em um vídeo feito para sua então editora L&PM Pocket anexa nas futuras edições brasileiras de Max e os Felinos em forma texto na Introdução , sua primeira reação foi de estranheza, seguida de uma sensação desagradável ao saber que Martel declarara não ter lido o romance e sim uma resenha negativa de John Updike no periódico New York Times, de um romance de um autor menor que havia estragado uma grande ideia. Daí então, o próprio jornal, publica esclarecimento dizendo que a única resenha em seus registros sobre Max and the Cats, era de autoria de Herbert Mitgand, publicada em 11 de Julho de 1990, e que na verdade, ela tecia elogios ao romance do brasileiro. Scliar diz que apesar de ter sido procurado por vários escritórios de advocacia, inclusive ingleses e canadenses, nunca teve a intenção de processar Martel por plágio, mesmo considerando a ideia como propriedade intelectual: o processo lhe custaria tempo e energia e apesar do ponto de partida de Max e os Felinos estar presente na obra do canadense, as associações de Martel eram totalmente diferentes, não se tratando de uma cópia. Acontece, então, que o livro de Martel teve várias refrações: a polêmica gerada em torno dos resgates que seu romance faz da obra de Moacyr Scliar fez com que houvesse aumento na procura de Max e os Felinos tanto no Brasil quanto em outros países onde foi publicado, causando até a necessidade da produção de novas edições, e vice-versa. Moacyr falece em Fevereiro de 2011, sem chegar a testemunhar a maior de todas as refrações do livro de Martel: no ano seguinte a sua morte é lançado o longa metragem baseado na obra que

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“Resumidamente, foi assim que aconteceu: Dez anos atrás. Resenha no Caderno de Críticas do New York Times, por John Updike, de um romance brasileiro de um tal de Moacyr Scliar. Era sobre uma família judia que administrava um zoológico em Berlim em 1933. Os negócios estavam mal (isto é, alguém tinha acabado de ser eleito ao poder). Eles decidiram se mudar para o Brasil. Naufrágio. O tratador judeu do zoológico acaba por se salvar em um bote junto a uma pantera negra. Alegoria óbvia da Alemanha nazista. Uma resenha desfavorável. Em nada moveu Updike. Mas a premissa ficou em minha mente. Eu pensei „Cara, eu poderia fazer algo com isso‟. Mas o livro já estava escrito, então eu fui em frente, escrevi meu primeiro romance [Self] e viajei.” (tradução nossa). (Disponível em: http://brothersjudd.com/index.cfm/fuseaction/static.home/page/martelinterview. Acesso em: 23 Set. 2013).

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carrega o mesmo nome, Life of Pi, dirigido pelo renomado cineasta chinês Ang Lee, sucesso em crítica e bilheteria, vencedor de quatro estatuetas do Oscar de 2013. O presente trabalho procura, então, identificar a forma como o autor canadense resgatou a fábula de Max and the Cats e inseriu em outro contexto e outra linguagem. Gérard Genette (1982) descreve a tipologia geral de todas as relações que os textos entretêm com outros textos. Seguindo sua categorização, o que acontece entre Life of Pi e Max and the Cats, pode ser chamado de hipertextualidade já que Genette considera hipertexto todo texto derivado de um texto anterior por simples formação (diremos doravante transposição, por variação ou por paráfrase. A imitação caracteriza-se, como na literatura por princípios de continuação ou de pastiche (os exemplos escolhidos são A Bela Helena, de Offenbach, e Dueto dos gatos, de Rossini). Esse desvio por outros territórios estéticos permite sublinhar a importância da distinção, no seio das práticas hipertextuais, da transformação (paródia ou disfarce burlesco) e da imitação (pastiche). Permite sobretudo colocar em evidência a diversidade e a importância das “práticas de arte em segundo grau”.

Seguindo essa linha de raciocínio, a hipertextualidade dos romances se encontra nas personagens principais Max e Pi, e em suas travessias pelo oceano. Para entender o processo pelo qual Martel criou seu romance resgatando o leitmotiv de uma obra brasileira – talvez por essa se tratar de parte de uma literatura que por muitos ainda é considerada periférica e também pelo fato do difícil acesso a obras de língua portuguesa – destaco que é de suma importância a análise da simbologia e estrutura de cada obra.

3.1. A simbologia na composição do Romance Levando em conta que ambos os romances a serem trabalhados na pesquisa são ricos em símbolos que ao contrário da metáfora, constroem analogias pelas entrelinhas do texto, e por sua vez estão diretamente ligados à temática , é evidente que a análise de tal recurso, assim como a linguagem das obras, é de alta importância neste trabalho. Os símbolos tem a capacidade de revelar o que está no inconsciente através de sua dupla adequação, a procura do uso desse recurso no corpus da pesquisa buscará nos textos a pluralidade de significações. Em uma das possíveis leituras, os felinos retratados nestas obras podem ser considerados como representação de um elemento importante na composição do romance, a temática. Vemos então que de forma direta a simbologia torna-se, portanto, elemento-parte da construção da narrativa. 11

Nota-se que a imagem do selvagem junto ao humano no oceano é o que move os dois romances a serem analisados. Propor-se a identificar suas possíveis significações, assim como dos outros símbolos a serem encontrados é essencial para chegar à compreensão das propostas dos autores.

3.2 Do Romance Hermético ao Best-seller Segundo Todorov (2008) em nível mais geral, a obra literária tem dois aspectos: ela é ao mesmo tempo uma história e um discurso. Ela é história, no sentido em que evoca uma certa realidade, acontecimentos que teriam ocorrido, personagens que, deste ponto de vista, se confundem com os da vida real. Esta mesma história poderia ter-nos sido relatada por outros meios por um filme, por exemplo; ou poder-se-ia tê-la ouvido pela narrativa oral de uma testemunha, sem que fosse expressa em um livro. Mas a obra é, ao mesmo tempo discurso: existe um narrador que relata a história; há diante dele um leitor que a percebe. Neste nível, não são os acontecimentos relatados que contam, mas a maneira pela qual o narrador nos fez conhece-los. As noções de história e de discurso foram definitivamente introduzidas nos estudos da linguagem após sua formulação categoria por E. Benveniste.

Ao analisar os respectivos romances sem exercer juízo de valor, vemos que mesmo com o evidente diálogo entre as obras, ambas têm seu próprio cunho e a mesma fábula pôde ser usada em distintos temas e em distintas literaturas. Max e os felinos pode ser tomado como hermético devido a seu formato curto, linguagem elaborada e finalidade artística e crítica, enquanto Life of Pi apresenta as características de um best-seller: ele não é apenas um livro que vende muito, mas sim uma obra que manipula certas táticas e estratégias narrativas e retóricas (BONILLA, 2008), isto é, pode ser inteligível para grande número de pessoas, livre de composições ousadas, geralmente combina ação e mistério como forma de prender o leitor e apresenta linguagem eficaz. Destacar tais características e compará-las quanto à estrutura dos romances trará possivelmente a descrição da forma que Martel seguiu para construir seu texto, partindo do hermético para chegar ao best-seller.

4. Objetivos

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A pesquisa tem como objetivo, sobretudo, responder e levantar discussão acerca das seguintes questões: 1 – Verificar quais elementos encontrados na obra do autor canadense, presentes originalmente no romance hermético brasileiro de Scliar foram resgatados para construção do best-seller Life of Pi ; 2- Analisar a forma como tais elementos foram desenvolvidos quando inseridos em um romance de temática e finalidades diferentes, caracterizando-os como distanciamentos; 3- Destacar a abordagem temática das obras Life of Pi e Max and the Cats e a importância da linguagem na construção de obras distintas. É importante lembrar que o propósito desta pesquisa não consiste em retomar a polêmica sobre a obra de Yann Martel tratar-se de plágio ou não do romance do autor Moacyr Scliar, pois além de questões literárias, o assunto envolve questões jurídicas. 5. Metodologia Para o estudo em desenvolvimento, utilizamos como corpus as obras Life of Pi, de Yann Martel (2001) e Max and the Cats, de Moacyr Scliar (1981). A escolha do livro do autor brasileiro traduzido por Eloah F. Giacomelli para o idioma inglês se dá por esta possivelmente ser a edição que o autor canadense leu para buscar sua spark of life (fagulha de vida), como afirmou. A primeira etapa deste trabalho consistirá na leitura e no fichamento das obras teóricas selecionadas relativas à Literatura Comparada, com ênfase nos textos relacionados à metodologia de comparação de temas e hipertextualidade. Logo, na segunda etapa será feita a releitura dos romances e durante ela o levantamento e análise das aproximações entre eles. Para tal, serão usados o Dicionário de Símbolos, de Jean Chevalier (1969), o Dicionário de figuras e mitos literários das Américas (BERND, 2007), e os ensaios contidos em A Intertextualidade, de Tiphaine Samoyault e Literatura Comparada - textos fundadores, organizados por Eduardo F. Coutinho e Tania Franco Carvalhal (1994), que conta com capítulos de Hutcheson M. Posnett (1886), MariusFrançois Guyard (1951), Claudio Guillén (1959), Harry Levin (1972), entre outros. Com a análise dos elementos que se aproximam, com base na Teoria do Romance (SCHÜLER, 1989), As Musas sob Assédio (GALVÃO, 2005), Paródia, Paráfrase & Cia (SANT‟ANNA, 1988), dentre outros, será possível também destacar quais os distanciamentos

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entre as obras. Assim a próxima etapa implica na identificação dos mesmos, comparação e análise dos fatores que caracterizem seus distintos gêneros. Por fim, serão explicitadas as considerações feitas acerca da utilização dos símbolos e linguagem em questão e, também a partir dessas reflexões, serão discutidas as contribuições desses elementos na construção de temáticas diferentes com o mesmo nó narrativo. 6. Plano de trabalho e Cronograma de Execução Tendo apresentado as questões a serem levantadas nesta pesquisa, proponho agora a sequência cronológica para o desenvolvimento deste trabalho: Meses 1 - 3 - Leitura e fichamento da bibliografia selecionada.

Mês 4 - Releitura do corpus de pesquisa e levantamento das aproximações a serem comparadas nos romances Life of Pi de Yann Martel e Max and the cats de Moacyr Scliar.

Meses 5 - 7 - Aplicação da teoria: análise da simbologia nas aproximações dos romances, pontos em que esses elementos se distanciam e de que forma acontece o distanciamento.

Meses 8 - 10 - Aplicação da teoria: análise dos distanciamentos entre as obras, comparação e identificação dos fatores que caracterizam seus gêneros, com foco na linguagem.

Meses 11 - 12 - Conclusão da pesquisa e redação do relatório final.

7. Bibliografia: 7.1. Corpus: MARTEL, Yann. Life of Pi, a novel. New York: Mariner, 2001. 14

SCLIAR, Moacyr. Max and the cats. Trad. Eloah F. Giacomelli. Toronto: Key Porter Books Limited, 2003. (primeira edição, 1990) 7.2. Obras teóricas iniciais: AGUIAR E SILVA, V. M. de. Teoria da literatura. 8.ed. Coimbra: Almedina, 2002. BARTHES, Roland. Introdução à Análise Estrutural da Narrativa. In: BARTHES, Roland (org.). "Análise estrutural da narrativa". Trad. Maria Zélia Barbosa Pinto. São Paulo: Vozes, 1973. BERND, Zilá (Org.). Dicionário de figuras e mitos literários das Américas. Porto Alegre: Tomo Editorial; Ed. da UFRGS, 2007. BERND, Zilá; ZILBERMAN, R., (orgs.). O viajante transcultural; leituras da obra de Moacyr Scliar. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2004. BONILLA, Juan. La era del best-seller, en La plaza del mundo. Valladolid: Universidad de Valladolid, Secretariado de Publicaciones e Intercambio Editorial, 2008. CHEVALIER, J. & GHEERBRANDT, A. Dictionnaire des symboles. Paris: Seghers, 1969. COUTINHO, Eduardo F.; CARVALHAL, Tania Franco (orgs.). Literatura Comparada: textos fundadores, Rio de Janeiro: Rocco, 1994. EGLETON, T. Teoria da literatura; uma introdução. 5. ed. Tradução de Waltensir Dutra. São Paulo: Martins Fontes, 2003. GALVÃO, W.N. As musas sob assédio: literatura e indústria cultural no Brasil. São Paulo: SENAC, 2005. GENETTE, Gérard. Palimpsestos: A Literatura de Segunda Mão. São Paulo: Editora Nova Cultural, 1982. JUNG, Carl Gerald. O Homem e seus Símbolos. 21 ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1977. KOTHE, Flávio. A narrativa trivial. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1994. REIS, C.; LOPES, A. C. M. Dicionário de teoria da narrativa. São Paulo: Ática, 1988.

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