Monty Python: O período de formação dos integrantes, o humor britânico na TV e o surgimento de um estilo (1959–1969)

May 25, 2017 | Autor: R. Faustini Dos S... | Categoria: Humor, Monty Python
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Relatório Final de Iniciação Científica – PIBIC Universidade Estadual de Campinas – Instituto de Artes Orientando: Rodrigo Faustini dos Santos Orientador: Gilberto Alexandre Sobrinho

Monty Python: o período de formação dos integrantes, o humor britãnico na TV e o surgimento de um estilo (1959-1969) Resumo: O grupo britânico de humor Monty Python formou-se para criar o programa de televisão Monty Python’s Flying Circus para a BBC, em 1969. O programa inovou o que se conhecia como humor de esquetes, assim como a linguagem televisiva, criando um estilo próprio e potencialmente reconhecível. A partir do estudo de diversas fontes, textuais e audiovisuais, esta pesquisa traça os diferentes perfis de formação dos integrantes do grupo, da universidade à indústria televisiva (até o início de Flying Circus), e busca compreender o formato de programa de humor que objetivaram implementar. Para a compreensão do “lugar” do grupo Monty Python no horizonte da televisão, foi realizado um estudo que marcou os contextos dos programas de humor alternativos da televisão britânica e a relações, diretas e indiretas, entre esses programas e as formações individuais dos integrantes do grupo de humor. Palavras-chave: Monty Python’s Flying Circus, televisão experimental britânica, humor televisivo Introdução: Pythonesque, Monty Python como paradigma do humor alternativo inglês Num estudo de literatura comparada, o autor Darl Larsen (2003) elegeu como temática o diálogo possível entre dois artefatos culturais britânicos: as obras de Shakespeare e toda a obra produzida pelo grupo de humor Monty Python em sua carreira, no século XX. Tal dinâmica de discurso é tornada possível pela possibilidade de se identificar, em ambos os casos, um forte traço estilístico de forma e conteúdo, assim como uma grande sobrevida cultural de suas obras, como Paradigmas de forma em suas respectivas áreas de atuação. Inegável no caso do “Bardo de Avon”, o legado do grupo Monty Python pode ser observado, por exemplo, na inclusão do adjetivo Pythonesque no Dicionário de Oxford: Pythonesque a. [-ESQUE] Of, pertaining to, or characteristic of Monty Python’s Flying Circus, a popular British television comedy series of the 1970s, noted esp. for its absurdist or surrealistic humour. (OXFORD DICTIONARIES, 2013)

De acordo com Larsen, “Algo é descrito como ‘Pythonesco’ (...) quando uma situação, evento, realização ou produto final é absurdamente tolo, iconoclasta, verbalmente ou visualmente vulgar, em ritmo acelerado, ou se, por intervenção humana, algo foi construído de forma a contrapor-se a qualquer lógica”1 (LARSEN, 2003, p.28). A aplicabilidade do termo favorece a exaltação, por parte do público, da qualidade do material cômico produzido por John Cleese, Graham Chapman, Eric Idle, Terry Jones, Michael Palin e Terry Gilliam enquanto estes faziam parte de Monty Python, grupo que se formou em 1969 e continuou a produzir material, descontinuadamente, até a morte de Chapman em 1989. Ao mesmo tempo, porém, a existência de Monty Python como um paradigma no humor tende a isolá-lo como um produto independente e descontextualizado de toda uma efervescência cultural de uma época. O estudo da autobiografia dos integrantes do grupo, até a criação de seu programa de televisão, Monty Python’s Flying Circus, permite compreender as raízes do humor tipicamente associado aos Python, desvendando-o a partir da carreira construída pelos seus integrantes antes do programa. Acompanhamos suas experiências universitárias e primeiras atividades no meio televisivo, na conjuntura das mudanças culturais que ocorriam no Reino Unido no pós-guerra, principalmente na 1

Esta pesquisa dependeu de materiais bibliográficos não traduzidos para o português. Nos casos necessários para referência, os trechos foram traduzidos por nós.

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década de sessenta. Observamos também como outras gerações de comediantes ingleses desbravavam um terreno de humor dito “alternativo”, que experimentava com formatos, mídias e o próprio humor como alvo de sátira, sendo precursores da trajetória de Monty Python e sua clássica série de televisão. Muitos desses programas receberam menos atenção durante seus períodos de exibição, e muitos foram perdidos, “fazendo parecer com que Python seja essa coisa que surgiu do nada. A maior parte dos programas que foram precursores [do Flying Circus] tiveram suas fitas cuidadosamente apagadas2 [pela BBC]...” (CHAPMAN, et al, 2005, p.154) – porém, por diversas facilidades trazidas pela era da informática, assim como um cuidado de fãs para resgatar essas séries do esquecimento, vários materiais foram encontrados, permitindo que se verifique como Monty Python’s Flying Circus “foi uma consequência dessa série de programas consecutivos que foram crescendo e crescendo, mas não foram bem lembrados por motivos históricos, como pelo fato de que nós estávamos em Cores” (CHAPMAN, et al, 2005, p.168). Mesmo sem existirem mais como grupo, a “marca” Monty Python persiste com diversos lançamentos e re-lançamentos de DVDs, livros, stage shows, documentários e, no exemplo mais recente, um filme de animação baseado na autobiografia de Graham Chapman, gravada nos anos 1980. Esse rico material permite que se analise, por diferentes pontos de vista, a formação de seus membros, destacando, principalmente, a importância que a juventude dos membros do grupo, a educação superior, o contato com o teatro e as primeiras experiências com rádio, televisão e cinema tiveram para o desenvolvimento de suas carreiras – que se deram num momento bem particular da história. O Sentido da Vida dos Python, Parte II – Crescimento e Aprendizado Os membros de Monty Python são da geração de crianças que nasceram durante a Segunda Guerra Mundial: Cleese, o mais velho, nasceu em Outubro de 1939, logo no começo da guerra, e Palin, o mais jovem do grupo, nasceu em 5 de Maio de 1943. O tema da guerra viria a ser uma constante na série e nos filmes dos Python e era o ponto de partida para o programa de humor de rádio muito popular entre a geração desses comediantes: o Goon Show. O Goon Show era um programa de humor de rádio, com estréia em 1951, feito por ex-membros do exército britânico, que passaram todos a seguir uma rica carreira no entretenimento: Harry Secombe, Michael Bentine (que deixou o grupo em 1953) Peter Sellers e Spike Milligan. Mais de duzentos episódios da série foram feitos, além de LPs terem sido lançados com conteúdo original, filmes e diversas tentativas de adaptação para a televisão. Sua influência é lembrada constantemente pelos membros de Monty Python nas biografias do grupo, assim como toda uma geração do humor “alternativo” britânico aponta para o Goon Show, e, posteriormente, a figura de Spike Milligan, como a raíz de suas sensibilidades cômicas, adeptas ao excêntrico e ao fantasioso. A maioria dos Python viveram em casas de classe média, tendo acesso ao sistema de educação tripartidário da época, instituído pelo Butler Education Act de 1944, que dividia as escolas entre Grammar schools, subsidiadas pelo governo e focadas no currículo acadêmico, as Secondary Modern schools, que continuavam o ensino da escola primária e “em geral, não levavam a lugar algum” (MARWICK, 1999, p.501), e as Secondary Technical schools. Havia também as escolas com mensalidade, as “Public schools”, internatos históricos e instituições de grande porte, em quantidade restrita pela Inglaterra, nas quais John Cleese e Michael Palin estudaram; Terry Jones e Graham Chapman vinham de Grammar schools e Eric Idle estudou numa Boarding School, espécie de internato “que era um inferno” (CHAPMAN, 2005, p.99). O período escolar foi importante na formação do senso de humor desses jovens, por ser o início de uma vivência demarcada pelo que chamam de “schoolboy humor”, sensibilidade que se desenvolvia entre uma cultura dita juvenil, em contraposição à rigidez das figuras de autoridade que conhecaram na Escola3 - curiosamente, todos os fundadores da revista Private Eye, ícone do ‘boom da sátira’4 na década de 1960, estudaram na mesma escola que Michael Palin, no qual já haviam fundado um 2

Era praxe da BBC, assim como outras emissoras, apagar o conteúdo de fitas arquivadas para gravar novos programas, economizando dinheiro (e ingonorando a relevância cultural do arquivo). O assunto é tratado detalhadamente na compilação “Missing, believed wiped” (2001) da BFI. 3 É interessante notar que Roger Waters, que escreveu, com Pink Floyd, Another Brick in the Wall, Floyd “hino” da rebeldia dos alunos ingleses contra a “escola autoritária”, é da mesma geração que os membros de Monty Pyhon. 4 O termo é recorrente nas análises da cultura mídiatica dos anos sessenta em Londres.

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predecessor, Mesopotamia. Como Palin comenta “Para sobreviver naquele ambiente, você realmente precisava ter um senso de humor saudável. Não foi algo que começou na faculdade, transferiu-se [da escola para a universidade]” (CHAPMAN, 2005, p.110) À princípio, podemos dizer que o tipo de humor observado na série Flying Circus pode ser bem descrito como um encontro entre os níveis de aculturação adquiridos por esses performers na Universidade com a imaturidade e irreverência do senso de humor juvenil da escola, criando imagens de contraste cômico entre esses mundos de valores. No famoso esquete sobre Oscar Wilde5 essa característa salta aos olhos: trata-se de um quadro que envolve Oscar Wilde e James McNeill Whistler numa disputa infatilizada pela atenção do Príncipe de Wales, culminando em George Bernard Shaw fazendo sons flatulentos com a boca. Além de se travestirem frequentemente como mulheres e Gumby’s6, outra persona frequentemente encontrada em Python era a do garoto de escola (fig.1).

Figura 1: Pythons (Chapman, Idle e Jones) como garotos de escola sendo entrevistados por Cleese. Os garotos dizem que Idle “escreveu um esquete, o Nudge-Nudge”, cheio de humor imaturo com trocadilhos, que encerra o episódio. 7

Outra constante no humor de Monty Python é o uso de “silly voices” (vozes tolas, cartunescas) para uma gama diversificada de personagens, característica que atribuem conexão direta com o humor dos Goons (que também incluia uma notável parcela de sons gástricos em seus episódios). Ying-tong idle I-po!8 – Goon Show e o nonsense de Milligan “PALIN: Era como escutar Presley fazendo seu Heartbreak Hotel pela primeira vez... Havia algo na forma daquilo que trazia algo de diferente... Havia certa dose de loucura ali.”. (REDHEAD, 1990)

“Provavelmente uma das mais originais e populares séries da história do rádio” (CRISELL, 2001, p.170) o Goon Show foi criado uma vez que Milligan, Bentine, Sellers e Secombe conseguiram gravar um piloto para a BBC. Repleto de um humor de timing rápido, vozes estridentes, roteiros fluídos e efeitos sonoros surreais, o programa continuou com sucesso até os anos 60, principalmente com o público jovem, estabelecendo uma ruptura de gerações entre a audiência: Palin comenta como, embora escutasse programas de humor como “programa em família”, o Goon Show se mantinha como um prazer individual, “quase ilícito”, pois seus pais mal conseguiam ver o atrativo nas vozes ridículas de

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Episódio 39, nº13 da 3ª temporada, transmitido em 18/01/1973 pela BBC, entitulado “Grandstand”. Gumby’s eram personagens imbecilóides com estilo idêntico: lenço na cabeça, bigode igual ao de Hitler, macacão e botas. Um dos poucos personagens recorrentes em Flying Circus, geralmente apareciam no meio de depoimentos de “populares” na rua dizendo absurdos ultra-conservadores (ou simplesmente imbecis), outra constantes nos episódios. 7 Episódio 3, 3º da 1ª temporada, transmitido em 19/10/1969, entitulado “How to recognize different types os tree from a long way away.” 8 Bordão nonsense do personagem Seagoon, do Goon Show, usualmente dito antes desse sair numa aventura. 6

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Sellers e o diálogo nonsense dos roteiros de Milligan9: “mas a sugestão de que a vida é absurda, sem sentido e que as pessoas são totalmente obtusas (...) foi algo que o Goon Show me deu” escreve Michael Palin. (CHAPMAN, 2005, p.54). O programa tinha seu foco no exército e no governo britânico, com os personagens mais frequentes sendo Ned Seagoon, usualmente em posições de governo, e Major Bloodnok, seu aliado, constantemente tendo que lidar com planos do Conde Jim Moriarty e o oficial Hercules para ganhar dinheiro (ou apenas iniciar um conflito). A estrutura do programa era tão maleável que as relações entre os personagens e suas formas poderiam ser modificadas completamente entre os episódios, pois nenhuma cronologia era respeitada – alguns episódios simplesmente focavam-se em personagens completamente novos. Tudo isso envolvendo as dezenas de vozes escrachadas, efeitos sonoros deslocados10 e non-sequiturs típicos dos Goons, e que eram as reais forças motrizes do programa. O uso e abuso da linguagem, e seu acompanhamento sonoro, era intrínseco ao humor “Goon”11: “o estado de alerta de Milligan para as possibilidades cômicas da subversão das correspondências convencionais entre signos e objetos é sugerida tanto pelas piadas feitas para a platéia, quanto as demais feitas pelos próprios personagens” (CRISELL, 2001, p.176). Os roteiros de Milligan brincavam constantemente com o uso de signos, criando uma realidade na qual um escrivão poderia “transcrever uma carta via fluído de gargarejo”; algo poderia ser comprado com uma foto de uma libra e que o ano de 1907 poderia ser tocado por uma orquestra: “Em todos os episódios dos Goons existe uma confiança absurda de que o méio acústico pode ser equivalente a qualquer coisa” (CRISELL, 2001, p.177). A estrutura maleável, o apelo imaginativo e as meta-referências à BBC e ao próprio humor são características que conectam o Goon Show à Monty Python, assim como a inserção de diversas intervenções inesperadas e rupturas em suas narrativas, com digressões que poderiam tomar qualquer proporção que a mente dos criadores escolhesse, numa relação com os espectadores constantemente renovada – o público do Goon Show tinha que ser rápido para aceitar em suas imaginações as ações dos personagens, que entravam em conflito com as leis da física e o senso comum, assim como o de Monty Python era levado de cenas filmadas às animações e imagens de arquivo, em rápidos cortes, com cenas acabando ou se ligando inesperadamente. “O programa [Monty Python’s Flying Circus] conscientemente seguiu o Goon Show, aproveitando muito de seu humor da consciência do meio de comunicação em si... Ele celebrava a maturidade do meio.” (CRISELL, 1997, p.125). Goon Show em outras plataformas CLEESE: Uma coisa que tenho certeza de que aconteceu foi de, um dia, estar assistindo o programa de Spike na TV, Q, e ligar para Jones e falar...Não era isso que deveríamos estar fazendo? JONES: Eu pensei....Ele conseguiu, ele fez algo novo...A partir daí a questão era “Como podemos aproveitar essa descoberta de Milligan? (CHAPMAN et al, 2005, p.191)

Após os trabalhos com os Goons, Milligan continuaria a lançar LPs de humor, que incluiam tanto músicas de semelhante apelo dadaísta, como diversas comedy routines que abusavam de sons concretos, como uma versão de “Noite Feliz” que se encerra numa cacofonia de cachorros latindo e uma serra elétrica, assim como brincadeiras performáticas com o formato do LP, como usar o lado B de um disco para gravar Nothing on this side, uma performance cômica na qual Milligan finge estar sozinho no estúdio, sem nada para fazer. Pythons como Michael Palin, e seu parceiro de comédia na faculdade, Robert Hewinson, diziam-se muito impressionados com esse tipo de trabalho transgressivo, e buscavam efeitos similares em suas primeiras performances de cabaret.

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Exemplo: “BLOODNOK: Aquela noite eu estava tão animado que não me senti cansado, então eu dormi com os meus olhos abertos. Quando acordei, meus olhos estavam fechados. Então eu devo ter cochilado enquanto tentava dormir de olhos abertos.”, do episódio “The Saga of Internal Mountain” (MILLIGAN, 2013) 10 Um roteiro indica a transição sonora:“Galinhas aceleradas, gaitas de fole, grito, splash, galinhas, valsa vienense, galinha, explosão, som de bipe agudo, seguido de um plop.”, do episódio “The Saga of Internal Mountain” (MILLIGAN, 2013) 11 Uma conexão com o mundo fantasioso das animações já estava contido no título do programa, que Milligan dizia ter tirado do nome de uma ilha visitada por Popeye num episódio.

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O trabalho audiovisual mais inovador dos Goons – no caso apenas Milligan e Sellers- se daria na televisão, com a ajuda do jovem diretor Richard Lester12 com os programas A Show Called Fred e Son of Fred, ambos em 1956 para a ITV13. Num dos poucos episódios disponíveis, nota-se sua completa imersão no mundo lunático de Milligan e Sellers: o primeiro esquete começa com Milligan usando uma peruca, como um barbeiro; o primeiro cliente chega, e (evidentemente) usa uma touca para parecer careca. Milligan coloca a peruca no cliente e, na falta de um espelho, usa um quadro para mostrar o resultado ao cliente, que sai contente. O programa segue em cenas diversas de semelhante confusão mental intencional. Uma piada constante no programa, por exemplo, é a troca do objeto em cena com o que deveria representar (cavalos são realmente identificados como uma pessoa batendo dois cocos entre si14), assim como a “revelação” de situações inesperadas pela câmera, como o fato de dois entrevistados, num balcão, estarem na verdade numa piscina, num lapso de representação no “estilo Goon” (fig.3). Num momento de transgressão mais acentuado, uma estranha performance intitulada Jump into a Dustbin and Dance (fig.2) começa e termina sem qualquer motivação, resumindo-se a Milligan e Sellers cantando a música com o mesmo nome em vozes anasaladas e passando a dançar dentro de latas de lixo, envoltos de panos; esse tipo de êxtase cacofônico-cômico também viria a ser encontrado em Monty Python15.

Figuras 2 (esq.) e 3 (dir.): À esquerda, Milligan e Sellers cantam e “dançam” o “Jump into a Dustbin and Dance”, sob um fundo projetado. À direita, dois personagens, num teatro, repentinamente passam a nadar em seus assentos.

Milligan seguiu com diversos projetos para televisão, a maioria de vida curtíssima, devido a seu relacionamento conturbado com a BBC e a ITV, mas no qual ainda encontrava espaço para continuar as experimentações do A Show Called Fred. Seu trabalho mais bem sucedido na televisão veio a ser a série Q, que estreiou em 1969. Nela, Milligan usava todo seu arsenal do absurdo para criar um programa de esquetes no qual as cenas começavam, terminavam e recomeçavam (ou eram largados no meio do caminho) num piscar de olhos, e por motivos tão nonsense quanto os do Goon Show. Nessa mesma época (1969), todos os membros do grupo Python já tinham tido suas próprias experiências na televisão, rádio e teatro, que foram incorporadas em seus trabalhos em conjunto, de forma que Flying Circus também era um aprimoramento das formas de humor com as quais estavam se acostumando a trabalhar em seus anos de Universidade – através dos grupos de Teatro universitário. ‘Get on with it!’: Os Python e Oxbridge “ERIC IDLE: A vida em Cambridge era além do que eu conseguia acreditar. Repentinamente, você estava sob posse de sua vida...O tempo livre [das tarefas acadêmicas] estava sob as suas mãos. Esse senso de liberdade é inacreditável e muito profundo, e a notícia boa era que o privilégio não era ganhar sua própria vida, o privilégio era ter tempo para descobrir quem você era realmente e o que você queria ser num ambiente de pessoas da mesma idade 12

Que, anos depois, marcaria seu lugar na cultura britânica ao dirigir os filmes dos Beatles. ITV era o canal comercial, gerado pelo Television Act de 1954 para tirar o monopólio televisivo da BBC. 14 A mesma piada seria, iconicamente, levada a seu extremo lógico no filme “Monty Python e o Cálice Sagrado”, anos depois. 15 Para um exemplo, ver também a figura 20. 13

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que você. Foi lá onde eu, pela primeira vez, conheci os alunos de escolas públicas...” (CHAPMAN et al, 2005, p.99)

Os membros de Monty Python foram aceitos na Universidade no começo dos anos 1960, nas duas universidades de maior prestígio do Reino Unido – Oxford e Cambridge. Uma elite estudantil, as gerações que passam por esse ensino são chamadas de Oxbridge men, um portmonteau que indica tanto o capital cultural e social entre esses estudantes, como também a cultura identitária masculina associada a eles. Dessa maneira, ao contrário do que uma visão do “zeitgeist dos anos 60” na Inglaterra possa indicar inicialmente, é preciso ter a noção de que, ao chegarem a Oxford e Cambridge, os jovens Python depararam-se com instituições que ainda eram pertencentes a uma cultura de Tradição e do Consenso – Chapman e Cleese, por exemplo, estudavam Medicina e Direito seguindo tradições familiares. Num exemplo da gradativa mudança moral nas universidades, temos, por exemplo, a abertura da universidade de Cambridge, para estudantes do sexo feminino apenas em 1947. Enquanto isso, em 1964, quando Eric Idle presidiu o grupo de teatro Footlights, foi o primeiro a abrir inscrições para mulheres para a trupe. Futuramente, os trabalhos desses comediantes satirizariam o conservadorismo inglês e até mesmo a idéia de permissividade que começaria a se instalar na época. Como mencionado, parte dos membros de Monty Python entrou em Oxford. Eles foram Michael Palin, cursando História Moderna (em 1962), e Terry Jones cursando Inglês (em 1961). O grupo de Cambridge era composto por Cleese, estudando Direito (a partir de 1960), Chapman, Medicina, e Eric Idle, também estudando Inglês (em 1962). As oposições de formação entre os integrantes seria algo que manteria uma caracterísitica própria durante a produção de Monty Python, com as duplas de roteiristas continuando a obedecer a separação universitária16. Os estudos acadêmicos dos membros de Monty Python, principalmente seus conhecimentos sobre História, seriam chave para os conteúdos que criariam futuramente com o grupo. Deram-se ali, também suas primeiras tentativas de criação cômica, direcionadas a um público majoritariamente universitário, com alto capital cultural. “A universidade era esse perfeito mundo seguro no qual todos são inteligentes e você pode começar as suas piadas a partir de um certo nível...Alguns dizem que nosso humor é universitário, mas eu diria que ele é pós-graduando”, diz Eric Idle (CHAPMAN et al, 2005, p.129). Por interesses próprios relacionados à performance, da qual tiveram pouco incentivo anterior em suas vidas, os jovens Pythons de Cambridge logo ficaram sabendo do grupo de teatro de humor chamado de Footlights Dramatics Club, que, todo ano, realizava um ‘revue’17 no campus que, geralmente bem sucedido, conseguiam levar para Londres e para o setor Fringe do Festival de Artes de Edimburgo 18. No fim dos anos 50, figuras que seriam chaves do “satire boom” nos anos 60 estavam se formando ali: David Nobbs, John Bird, e principalmente, Jonathan Miller, David Frost e Peter Cook. Essas figuras demonstrariam que os Footlights poderiam servir como “incubadores” de talento, e que seus graduandos mereciam interesse do mercado, uma vez que conseguiam atrair um novo público, jovem. Enquanto isso, em Oxford, que não possuia uma grande tradição com teatro, mas também fomentava o espaço, Michael Palin juntava-se ao OUDS (Oxford University Dramatic Society) e, paralelamente, juntava-se com o colega Robert Hewison, escrevendo performances conjuntas de cabaret. Já Terry Jones, não optou por participar da OUDS e sim por unir-se a um grupo menor e mais informal, o Experimental Theatre Club, em cujas produções interpretou pequenos papéis cômicos. Posteriormente, juntamente com alguns performers de Oxford, Palin e Jones também levariam revues para o Fringe do Festival de Artes de Edimburgo. Podemos notar, assim, que a Universidade foi um primeiro ponto de encontro desses jovens com questões mais humanísticas e uma cultura jovem centrada no humor. Nota-se como suas trajetórias para um humor iconoclasta e surreal foram mais gradativas do que uma visão superficial da turbulência dos anos sessenta, suas subculturas e o caráter “alucinógeno” dos episódios de Flying Circus, parecem indicar. Mesmo assim, é notável a influência da vida universitária na vida de grandes figuras da cultura juvenil dos anos 60 e 70, principalmente derivadas dos Art Colleges: os Rolling Stones e o Pink Floyd, assim como a estilista “Rainha dos Mods” Mary Quant, o artista pop David Hockney, entre outros. 16

Idle, no entando, costumava escrever sozinho, o que conecta ao seu individualismo na Boarding school. Apresentação teatral, demarcada pela performance de variedades, como esquetes cômicos, músicas e dança. 18 Evento paralelo, sem júri de um dos maiores festivais de Teatro do mundo iniciado em 1947, com apoio da prefeitura e da Universidade de Edimburgo. 17

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O Fringe e Beyond (the Fringe): boom da sátira nos anos de 1960 Um espaço de grande destaque para a produção universitária de Oxbridge era o Festival de Artes de Edimburgo, que desde seu início trazia consigo um evento paralelo e sem júri, o “Fringe Festival”, que virou, então, um grande ponto para essa produção universitária e “alternativa”. Aqueles a procura de material subversivo e jovem buscavam não o West End, e sim os festivais, clubes de teatro e as companhias experimentais ali estabelecidos: nos anos 60 “[o Fringe] havia começado a parecer um festival alternativo existindo apenas para explorar o contraste com a programação oficial [do Festival de Artes]”. (BARTIE, 2013, p.82) Um dos motivos para o crescente interesse do Fringe como um ponto de cultura jovem e subversiva havia sido um revue feito em 1960 por ex-alunos de Oxbridge (e veteranos dos Footlights e dos grupos de Oxford) – devidamente intitulado “Beyond the Fringe”. Era assinada pelos roteiristas/performers Peter Cook, Jonathan Miller, Alan Bennet e Dudley Moore. Uma série de esquetes, monólogos e interlúdios musicais com base principalmente na sátira, o revue teve um impacto imediato com o público: Se algum evento marcou um genuíno ponto de mudança cultural, ele não fora a noite de abertura de Look Back in Anger em Maio de 1956, e sim a ligeiramente ‘caótica’ primeira performance de um revue no Teatro Lyceum, Edinburgo, 22 de Agosto de 1960. Ele expôs o crescente vazio entre as gerações...E ajudou a mdar nossa atitude frente a autoridade para sempre e fez da sátira, no Reino Unido, uma possibilidade. (BILLINGTON, 2007, p. 122)

Dava-se ali o início do denominado “boom da sátira” dos anos 1960, focado na figura de Peter Cook, que viria a fundar a renomada revista de sátira Private Eye, o clube de humor londrino The Establishment e a escrever, com David Frost apresentando, o programa de sátira de sucesso da BBC, That was the Week that Was, em 1963 – essa onda de produções satíricas dos anos 1960, portanto, tinha suas raízes nas trupes teatrais de Oxbridge e no Festival Fringe. Com monólogos que satirizam o governo britânico, a segunda guerra mundial, a Academia, o Império, a hegêmonia e o racismo americanos, a música Clássica e a boemia, Scotland Yard, a Igreja Católica, estereótipos de gênero e a televisão, o arcaico Teatro britânico, a Família Real, a estratificação social britânica e contendo “a primeira vez que um primeiro-ministro vivo fora parodiado num palco do século XX” (BARTIE, 2013, p.80) a veia anárquica de Beyond the Fringe era inegável. Apresentado por “homens de terno”, num minimalismo cenográfico pontuado por linguagem e sotaques extremamente coloquiais, várias cenas desenrolavam-se como uma conversa entre os atores, que encarnavam a si próprios, fortalecendo as relações entre “o mundo lá fora” e os debates temáticos que ocorriam no palco. Em mais uma abordagem que visava acentuar o minimalismo da performance, o uso do deadpan19 era uma constante na apresentação, técnica incomum para o público acostumado com o humor pastelão do Teatro e dos cabarets (fig.4). Um sucesso de formato e conteúdo para seus autores, Beyond the Fringe conseguia equilibrar tanto seu material satiricamente denso, dirigido à crítica social, com esquetes com pequenos toques mais absurdos, como o uso de sacos de papelão como “capas anti-radiação” (numa série de cenas sobre o cotidiano da 2ª Guerra Mundial) ou o clássico esquete em que Dudley Moore, fazendo um teste para uma encenação, descobre ter “uma perna a menos” do que o necessário para interpretar Tarzan, num diálogo recheado de sinônimos como recurso cômico (elemento constante nos esquetes escritos por Graham Chapman e John Cleese, posteriormente). A repercussão que o trabalho de Beyond the Fringe teve na obra futura de Monty Python, era muito mais por suas brincadeiras com a linguagem verbal do que especificamente o trabalho satírico que havia lhe gerado tanto sucesso. Os monólogos de Alan Bennett fazem um uso calculado de termos e combinações foneticamente cômicas, havendo nos esquetes também exemplos germinativos de uma mistura de “alta” e “baixa” cultura que consegue risos autênticos do público e as conversas entre Dudley Moore e Peter Cook conseguem evocar um clima quase improvisado, ao mesmo tempo em que eram cronometricamente ensaiadas, características que ressurgiriam no estilo construído em Flying Circus, unido pelas premissas absurdas que agradavam a essa nova geração de comediantes. 19

Técnina de encenação cômica oposta ao pastelão, na qual o comediante busca manter a sobriedade e a naturalidade de forma a embaçar a percepção de quais são suas colocações “sérias” e quais são as cômicas, ou para gerar o riso pelo contraste entre a seriedade da encenação e o absurdo de sua fala.

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Figura 4: Fechando uma sequência de cenas sobre a guerra, os membros de Fringe satirizam uma reunião da ONU sobre os sobreviventes... “Se o Reino Unido for atacado por uma nação incógnita, nós jogaremos uma bomba atômica na Rússia. Quer dizer, na ‘nação incógnita’ ”, diz Bennett.

Enquanto isso, a turma mais “veterana” dos Footlights, que incluia John Cleese e Graham Chapman, encontrava-se no West End com Cambridge Circus, seguindo uma rota semelhante com Beyond the Fringe – que culminou num tour pela Nova Zelândia e, depois para Nova Iorque, por algumas semanas. Isso significava um comprometimento muito maior, e novo, com o humor e o entretenimento para os jovens estudantes, que deixavam as carreiras acadêmicas de lado20. Após algumas tentativas falhas de se estabelecer por lá, Cleese voltava de uma metrópole para outra – Londres – encontrando a si mesmo, e seus amigos Footlights, com propostas de trabalho para a BBC. Era o início dessa geração no mundo audiovisual, despontados pela figura de Peter Cook e David Frost. “To the Sketch”: BBC e Londres nos anos 1960 O primeiro programa de televisão com uma participação de um Python foi o programa semanal de sátira That Was the Week that Was (ou TW3), apresentado por David Frost, em 1962-1963 para a BBC. Embora a participação tenha sido na forma de pequenas contribuições de roteiro, feitas por John Cleese e Graham Chapman, o programa tem uma marcante importância para sua década, e dele foi derivado o programa The Frost Report, também na BBC, no qual tanto Cleese quanto Idle, Chapman, Jones e Palin trabalharam como roteiristas. TW3, com muito sucesso, havia conseguido “tirar a cultura da sátira dos clubes noturnos para trazê-lo à sala de estar” (GREEN, 1999, p.65), e tanto seu sucesso quanto a própria veiculação se relacionam com novas dinâmicas da sociedade britânica na época, que, junto de suas Instituições governamentais (tal qual a BBC), entravam num período demarcado por novas sensibilidades, no que se identifica como um período de “permissividade” dos valores culturais, centralizados em pessoas específicas no governo e na cultura popular, além da juventude da época. Para o historiador Asa Briggs, existia uma “razão econômica evidente para aquilo que para alguns era uma ‘ruptura’, e para outros uma ‘libertação’. O crescimento do consumo minou os valores puritanos sobreviventes em grande parte da sociedade.” (BRIGGS, 1998, p.306). Essa nova perspectiva de vida, em contraste com os anos de maior restrição no pós guerra, identificava-se pela presença de uma cultura “juvenil, tensões geracionais, percepções conflitantes sobre a ruptura de tradições e instituições nacionais, e a emergência de novas formas de globalismo através das comodidades associadas à cultural popular, particularmente a moda, música, turismo e televisão” (LANDY, 2005, p.15) que passariam a ter um grande foco em Londres, com o rock dos Rolling Stones e dos Beatles (e dezenas de outros derivados), as roupas de Mary Quant, a arte Pop inglesa, o teatro experimental e a British New Wave no cinema aquecendo o mercado cultural de um país, cuja imagem passada era tida como “filistina” (MARWICK, 1999, p. 60).

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Chapman inclusive seguiu para residência em um Hospital em Londres, mas “por indicação da Rainha” trancou um semestre para sair em tour para Nova Zelândia e Nova Iorque com Cambridge Circus. Ao irem para a BBC, os Python comentam como o caráter mal-visto do entertainment era ignorado frente ao caráter digno de trabalharem para uma instituição supostamente focada no interesse do cidadão comum.

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Como aponta Jonatahn Green (1999), a mídia teve um grande papel na criação da idéia de uma Londres moderna em que despontava a cultura jovem de uma sociedade permissiva - mas realmente era possível notar que “o Reino Unido de 1965 era um lugar radicalmente diferente da década anterior. Havia um governo trabalhista; o desemprego era baixo, exportação alta. Nem todos eram a favor de uma nova sociedade, mas a velha guarda estava definitivamente em retaguarda.” (GREEN, 1999, p.71). Enquanto isso, a própria BBC passava por um novo período marcado por mudanças políticas e econômicas: primeiramente, o Ato Televisivo de 1954 havia acabado com seu monopólio televisivo, com a introdução do canal comercial ITV, exigindo da BBC um remanejamento de público e conteúdo21 (em 1962, seu share de audiência já era de 50%), tornando mais populista e menos paternalista, com a inserção de formatos importados e mais game shows – sem contar o leiloamento por programas devido à competição, com abordagens que continuaram com a criação da BBC222, em 1965. Em segundo lugar, uma nova figura para o serviço público veio com a entrada de Sir Hugh Greene como chefe-geral da BBC, com uma proposta reformista que buscava colocá-la “no seio dos turbilhões de forças que estavam a alterar a vida na Inglaterra”. Esse tipo de liberalização vinha através de uma escolha de “fazer a corporação responsável e responsiva para a maior gama de pessoas que pagavam suas taxas de licenciamento [da BBC]” (GREEN, 1999, p.65). Oponente da censura, tanto interna quanto externa, Greene, em 1963, “abandonou o graciosamente datado ‘Livro Verde’ da BBC, em voga desde os anos 30, e propriamente conhecido como a ‘Diretriz dos programas de Variedades para escritores e produtores”. Embora tenha sido simbólica, essa atitude manteve-se exemplar com outro passo dado pela BBC, em favor do clima de “ceticismo saudável proposto por Greene” - a criação do programa de televisão satírico TW3, grande marco da programação televisiva do Reino Unido nos anos de 1960 (GREEN, 1999, p.65). Partindo da idéia de “humor de cara limpa” vindo de Beyond the Fringe, TW3 era apresentado por David Frost em tom sóbrio e honesto, num cenário minimalista que por muitas vezes permitia que câmera, cabos, platéia e equipe aparecessem em cena, num método incomum até então de “exposição do artifício” e que viraria “a cara da nova proposta ‘franca’ da BBC”. A premissa era simples: Frost apresentaria os eventos da semana em retrospectiva de maneira satírica, intermediado por charges ao vivo, números musicais de Millicent Martin, e comentários de outros comediantes, feitos de maneira casual como “numa festa privada. O programa dependia de uma cultura disseminada pela própria televisão” - que visava questionar. (CRISELL, 1997, p.124) A qualidade dos roteiros era incomparável para a televisão britânica, assim como sua coragem em lidar com tópicos controversos: num dos únicos episódios restantes por completo, no primeiro bloco temos um número musical comentando sobre uma onda de tentativas de linchamento de negros nos EUA, feito através da performance de uma velha música tradicional do Mississipi, com dançarinos Minstrels – ou seja, dançarinos brancos em blackface, em ataque direto à falta de política representacional na BBC, que continuava a veicular um programa fundamentado na presença de Minstrels – o Black and White Minstrel Show23; o esquete contém inclusive o uso da palavra “Nigger”, algo que seria inaceitável, mesmo dentro de um contexto de sátira, pelas políticas ultrapassadas do Green Book. Sem qualquer espaço para fôlego entre a forte polêmica exposta por esse esquete, o programa já segue para um segmento fortemente criticado por Mary Whitehouse e outros conservadores dias depois: Guia do consumidor para Religiões, na qual Frost, satirizando o formato de programas de interesse doméstico que testam marcas de produtos para a platéia, passa a analisar os prós e os contras da afiliação de um indivíduo a um número de religiões, sob um ponto de vista capitalista (“O que você investe?” e “Qual o seu lucro?” são pontos da pauta); ele encerra concluindo que “a melhor compra” é a Igreja da Inglaterra, pois é a que estabelece menos compromissos.

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É interessante observar que, em sua maioria, os programas que a BBC estreou, nos anos sessenta, eram humorísticos. 22 Embora esse não tenha sido seu foco inicial, a BBC2 veio sediar muitos programas icônicos do humor alternativo inglês das gerações seguintes, como The Day Today (1993) e Look Around You (2002). 23 O programa continuou a ser exibido até 1978, com o elemento do blackface diminuído, mas ainda assim demonstrando que alguns velhos hábitos demorariam a desaparecer.

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Figuras 5 (esq.) e 6 (dir.): Em 5, Millicent Martin e os Minstrels cantam a música sobre o Mississipi. Em 6, Frost e sua sátira religiosa (a Igreja da Inglaterra é favorável ao Catolicismo uma vez que nessa religião “o indivíduo já começa culpado de antemão”).

TW3 continuou com programas polêmicos e marcantes24 mas foi cancelado por Greene, quase hipocritamente, em 1964, pois o programa passara a incomodar os membros do Parlamento, em face a uma eleição próxima. A próxima empreitada de Frost, então, foi voltar ao ar com um programa similar, mas que não fosse mais incisivo em relação às questões diretamente tiradas dos jornais da semana – em 1965 foi ao ar o The Frost Report, programa no qual Frost, semanalmente, lidava com um tópico qualquer de interesse público (como “Juventude” ou “Crime”) e discutia-o a partir de um monólogo cômico, aproximado do stand-up americano, com inserções fílmicas e pequenos esquetes relacionados que desenvolviam digressões sobre o tema, mantendo o mesmo clima distanciado de TW3, com mais espaço para o escracho com os esquetes - a abordagem do humor, por Frost, agora não era mais tão política, mas sim social. A expertise de David Frost com o meio televisivo havia apenas se expandido: aproveitando seu passado com o teatro fringe e os clubes de sátira, Frost foi em busca de novos talentos para sua equipe de roteiristas, contratando alguns escritores do Private Eye, comediantes do Establishment e Terry Jones, Michael Palin, Graham Chapman e Eric Idle como roteiristas, e John Cleese como roteirista e parte do elenco. Embora parte da mesma equipe, os Python comentam que naquela época, ainda, viviam suas vidas de forma muito independente, há, ainda, alguns anos distantes da formação do grupo de humor. Até aquele ponto, Terry Jones e Michael Palin já estavam tendo alguma experiência dentro da BBC enviando piadas para alguns comediantes veteranos e suas sitcoms, e alguma experiência com curtas sequências cômicas filmadas para talk shows, enquanto Jones arranjara um trabalho como consultor de roteiros na BBC, conseguindo acompanhar algumas produções e reuniões após fazer um curso de direção; Eric Idle participara brevemente de algumas peças de teatro 25 mas também começara a escrever piadas para sitcoms e também para John Cleese e Graham Chapman, que envolviam-se com antigos colegas do Cambridge Circus que começavam o programa I’m Sorry, I’ll Read that Again na rádio da BBC, que assemelhava-se muito ao material que escreviam para o palco, com algumas influências dos Goons, porém, mantendo-se no formato de esquetes. Esses tipos de experiências foram fortalecendo o conhecimento dos jovens escritores quanto ao funcionamento interno da BBC e, unidos do resto de outros membros de sua geração, conseguiram conquistar, aos poucos, seus espaços para criação. Enquanto isso, além de Frost, outros “veteranos” já tinham seus programas, como Alan Bennett e seu On the Margin, do qual restam apenas fragmentos de aúdio, mas que indicam que ele continuara com seu estilo verborrágico e centrado em monólogos, além do famoso “Not Only...But Also...” centrado na nova dupla cômica de Dudley Moore e Peter Cook, cujos pequenos traços experimentais, em meio a esquetes mais tradicionais que focavam-se na capacidade de improviso e caracterização realista inatas a Moore e Cook, que viria a ser algo que interessaria os membros de Monty Python – nota-se um uso de sequências elaboradas e comicamente inúteis nas introduções do programa, enquandrando Cook e Moore em situações improváveis e em 24

O episódio transmitido na semana da morte do Presidente Kennedy foi conservado pelo Congresso americano como historicamente significante 25 Incluindo um pequeno papel na famosa peça Oh! What a Lovely War! , expoente da onda de sátiras da época.

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locais inóspitos, começando o show com introduções “cinematográficas” - assim como Python, que beiravam o anti-humor em seu prolongamento desnecessário das introduções do programa. Embora o impacto da chegada da sátira à televisão já tivesse acontecido com TW3, The Frost Report conseguira manter sucesso com o público e qualidade de seu material - a maioria das retrospectivas do humor britânico na televisão não deixa de mencionar a esquete do “Frost Report on Class”, no qual, identificados por sua altura, John Clesse, Ronnie Barker e Ronnie Corbert ficam em linha representando a Classe “alta”, a média e a trabalhadora, passam a avaliar como um e outro “olham para baixo” e “olham para cima” para enxergar o outro e seus costumes – enquanto, para a classe trabalhadora, resta apenas uma baita dor de pescoço. Enquanto isso, as limitações de trabalho impostas para o programa de horário nobre com temáticas bem fechadas – ou seja, que demandavam um material que não fosse “muito maluco” ou “muito tolo” (CHAPMAN, et al, 2005, p.200) e demandavam premissas rápidas, simples e bem pontuadas no fim, focando-se principalmente em fatos de “interesse público” seriam imposições dos produtores à criação desses roteiristas que seria completamente sublimada uma vez que esses se juntassem para seu próprio programa anos depois, que basicamente subverteria todas essas regras da “semântica” televisiva, em busca de uma liberdade criativa e maníaca semelhante a dos Goons. Primeiros trabalhos autorais As experiências televisivas sob a tutela de David Frost e a BBC, assim como a continuidade de contato com antigos membros dos Footlights permitiu a Cleese, Chapman, Jones e Palin novas oportunidades para a televisão, em rumos diferentes: parte do grupo envolvido com ISIRTA26, junto de Marty Feldman conseguiria fechar um contrato com a ITV, com ajuda da Paradine Productions (de Frost), para produzir a série de esquetes entitulada At Last the 1948 Show em 1967; enquanto isso, Idle, Palin e Jones, sob convite do produtor Humphrey Barclay (ex-Footlights), juntaram-se para realizarem uma série de TV para crianças, na ITV. At last the 1948 Show teve 13 episódios produzidos, em duas temporadas. Nele, as cenas escritas por Chapman, Cleese, Feldman e Tim Brooke Taylor, algumas aproveitadas de Cambridge Circus e ISIRTA, eram entrecortadas por uma espécie de “apresentadora vedete”, Aimi MacDonald, que não fazia menção a ninguém além de si mesma. Embora deixasse de lado as performances musicais normalmente associadas a programas de humor, o programa mantinha uma estrutura mais comum, sem grandes experimentações – embora algumas esquetes já começavam a ser escritas especialmente para o formato de televisão, aproveitando de trucagens de câmera e material de arquivo. Outras esquetes focavam-se na programação para satirizar séries de espionagem, quiz shows (fig.8) ou aulas de inglês para a televisão, apostando na exposição de fragilidades do meio (na última esquete, um ator recusa-se a dizer suas falas corretamente, protestando seu salário). O programa seguia então para o tipo de humor associado a essa nova geração de Cambridge, que, já fatigada com a sátira, buscava um humor centrado em situações absurdas, construção de personagens e piadas com maior elaboração cenográfica, mantendo, porém, suas raízes teatrais e do rádio. Um dos episódios faz referência direta à cultura de programas satíricos da época, da qual queria se distanciar, ao fazer um personagem reclamar que o programa não era satírico o suficiente, e depois colocando o insert sarcástico “A sátira vive!” (fig. 9) em outra cena do episódio. Material do 1948 Show também seria re-aproveitado no especial de John Cleese para a TV, How to Irritatte People e nos episódios para a tv alemã produzidos por Monty Python. Os futuros membros de Python envolvidos no Do not Adjust Your set 27 dizem ter assistido ao 1948 “avidamente”, assim como os membros daquele programa tinha interesse em saber o que os outros membros de sua geração estavam produzindo. Os roteiristas estavam bem contentes com o material que produziam e, inclusive, Monty Python incorporou um dos mais clássicos esquetes do programa para seus stage shows, o “Four Yorkshiremen”.

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Sigla para “I’m Sorry I’ll Read that Again”. Abreviaremos para DNAYS. Nota-se uma longa tendência das séries britânicas adotarem títulos que em si já fossem uma piada, algo que atingiria seu cúmulo com “Monty Pythons Flying Circus” (os comediantes simplesmente achavam o nome Monty Python cômico em si, e “Flying Circus” (algo como “trupe voadora”) havia sido uma sugestão dos produtores da BBC. 27

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Figura 8 (esq.): Cleese no esquete “Cosmo Claphanger Quiz Show” que parodia o sadismo incalculável dos apresentadores de programas de pergunta e respostas com seus participantes, passando a fazer um cumprimento nazista no fim do programa. Figura 9 (dir.): insert irônico do 1948 Show.

Enquanto isso, bem mais cedo na programação, no fim da tarde, Jones, Chapman, Idle e os novatos David Jason e Denise Coffey, além dos Bonzos, apareciam na televisão com o DNAYS. Num formato de programa infantil incomum, os escritores-performes haviam tomado a decisão consciente de “não sermos condescendentes. Nós não iríamos mudar o que gostávamos de fazer, apenas manter a ‘sujeira’ fora” (CHAPMAN, 2005, p.174); DNAYS abria uma nova oportunidade para esses escritores, que agora também eram o elenco do programa. O lado mais infantil do programa era mais evidente nos segmentos de seu único esquete recorrente “Capitão Fantástico” uma série de piadas pastelão e trucagens de filme que ficavam por conta de Denise Coffey e David Jason. De resto, os esquetes seguiam as elaborações dos roteiristas com as limitações de orçamento e experiência na televisão, com o destaque realmente sendo as performances do Bonzo Dog Doh Dah Band (fig.10 e 11), uma banda com performances dadaístas de “estranhas músicas drogadinhas, que ninguém nunca percebia que na verdade eram sobre drogas, o que acabou atraindo outros públicos” (CHAPMAN, 2005, p.176). Os Bonzos sempre apareciam em cena com estranhas fantasias em cenários desconexos e elaborados, que poderiam ou não se relacionar com a música que estavam tocando, com a banda realizando pequenas rotinas com traços vaudevilles no meio, com muito espaço para o acaso.

Figuras 10 e 11: Duas aparições da Bonzo Dog Doo Dah Band com suas fantasias absurdas, em Do Not Adjust Your Set. “Na verdade, eles eram uma banda Dada” (CHAPMAN et al, 2005, p.174)

Um pouco menos estruturado que o 1948 Show em suas cenas, DNAYS era pontuado por diversas piadas curtas, envolvendo trocadilhos ou situações de rápidos desentendimentos e confusão, apostando num ritmo mais rápido que o outro programa, porém contendo piadas menos elaboradas e alguns clichês de caracterização. O episódio com mais destaque (dos que restam) seria o último da primeira temporada, que se apresenta como tal, criando uma nova dinâmica de recepção, com uma continuidade temática (o “erro”): diversas cenas na “sala dos roteiristas” conectam o episódio, fazendo a “cobertura ao vivo” do próprio programa, que culmina na cobertura ao vivo da perda das últimas cenas do episódio; anuncia-se que um esquete contém um “erro deliberado” – a cena inteira é feita de trás para frente; um homem tenta fazer uma apresentação performática com um cão empalhado e todos os equipamentos dos Bonzos quebram (ou são quebrados) no meio da performance.

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DNAYS também durou duas temporadas, e, depois de fazerem certa pressão, os roteiristasperformers conseguiram trocar a direção do programa, que viam como “muito de ‘tia de escola’ ”28 para um que lhe permitissem a liberdade que preferiam, conseguindo então experimentar mais em episódios posteriores. Outra novidade para a segunda temporada foi a contratação de um cartunista americano Terry Gilliam, que contribuiria com algumas piadas e dois desenhos, que impressionaram bastante Jones e o grupo por sua forma de livres associações e humor iconoclasta: um deles era Christmas Postcards e o outro Elephants. A livre estrutura desses cartuns e seu estilo barato e rápido de ser feito, por colagens e recortes impressos seriam peças-chave para o programa Monty Python, criado pouco depois. A animação Christmas Postcards que apareceu no especial de Natal, já apresentava quase todas as características do trabalho de Gilliam que seguiriam para Python: recortes de material de arquivo, efeitos sonoros toscos feitos pelo próprio Gilliam com sua boca, membros autônomos alongados e sem corpo, a “animação” de elementos presentes num desenho ou fotografia de forma a subverter sua mensagem e uma tendência à violência e à iconoclastia, numa animação que inclui uma paródia dos Três Reis Magos e a junção de elementos díspares de uma imagem (no caso um cartão de natal) com outro, aproveitando a natureza englobadora da animação – no primeiro episódio de Python, uma lógica semelhante ocorreria, porém com fotos posadas do século XIX (e com muito mais violência e nudez). Beware of the Elephants começa com uma placa com o título, no qual um homem (feito de recortes de papel) é esmagado por um elefante, restando-lhe apenas a cabeça, que vira uma bola de futebol num jogo de rua - até que todas as cabeças dos jogadores acabam se desprendendo de seus corpos e ziguezagueam pela tela, que se revela ser um zoom de uma lupa, de um comercial de sabão em pó. O desenho continua em associações livres das imagens em rupturas de lógica semelhantes, até voltar exatamente em seu início; dessa vez o primeiro personagem consegue se salvar apontando a ordem de “O Fim” para o Elefante que cai em sua direção. Essa animação é a que Terry Jones indica como a base para o que veio a ser a estrutura do Monty Python’s Flying Circus – ao se depararem com o contrato para 13 programas de uma série da qual não haviam escolhido nem um nome ainda, os Python buscaram em suas experiências passadas com a televisão alguma estrutura para a série. Encantado com a forma livre de Q, Jones também notou como a linha de “fluxo de consciência”29 presente em Elephants – que faz uso de um elemento de cena para puxar a outra, criando certas circularidades conceituais– era ideal para libertar as imaginações dos Python, ao mesmo tempo que fechando cada episódio em algum tipo de continuidade unitária; “então Gilliam virou nossa cola, aquilo que ligaria [as cenas]” (CHAPMAN et al, 2005, p.194). Assim, nos roteiros de Python, quando chegava-se ao final de um esquete, ou quando ele parava de ter graça para os comediantes, as descrições textuais simplesmente explicitavam que haviam “buracos” entre as cenas - diziam a Gilliam que era preciso sair do ponto A (fim do esquete), para se chegar no ponto B (começo do próximo), dando ao animador uma grande liberdade criativa, ao mesmo tempo em que lhe forneciam certo enclausuramente conceitual – a necessidade de encerrar uma cena e iniciar outra sem frases de efeitos ou prolongamentos desnecessários de diálogo.

Figura 12 (esq.): trecho de “Christmas Postcards”, animando um cartão dos Três Reis magos. Figura 13 (dir.): Trecho de “Elephants” demonstrando o estilo “fluxo de consciência” de Gilliam: uma cena segue a outra através de uma deixa visual – no caso, uma cena surge “dentro” da boca de um personagem e o plano se aproxima até enquadrá-la.

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CHAPMAN et al, 2005, p.184. Era exatamente esse o termo usado pelos roteiristas na época, uma vez que aparece em diversos trechos dos diários de Michael Palin, que são citados na autobiografia do grupo. 29

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How to Irritate People e The Complete and Utter History of Britain A transição entre as primeiras temporadas de At Last the 1948 Show e Do Not Adjust Your Set para as suas seguintes foram preenchidas com outros trabalhos desses comediantes: David Frost encomendou um especial para a televisão americana para John Cleese, que incluiu Graham Chapman no elenco e no roteiro, e chamou Michael Palin para alguns papéis. Enquanto isso, Michael Palin e Terry Jones conseguiram vender outra série para a televisão, que durou apenas uma temporada, entitulada Complete and Utter History of Britain, também produzida por Humphrey Barclay e baseada num esquete anterior escrito para o The Late Show30. De todas essas séries, Complete and Utter History tem o mérito de possuir a premissa mais original (e organizada): uma série de esquetes envolvendo períodos e figuras históricas se desenrolam “sob uma cobertura da Mídia e Comunicações como outra qualquer” (CHAPMAN, 2005, p.180) diretamente relacionando o aprendizado acadêmico de Jones e Palin com seus conhecimentos da televisão da época e sua tendência a desconstruir figuras de poder – “Você poderia escrever um programa satírico, mas ele ia parecer apenas como [sendo sobre] história”, explica Palin (CHAPMAN, 2005, p.180), descrevendo o programa como uma mistura da experiência satírica dos programas de humor da época com o toque surreal e cenográfico que ele e Jones gostavam de incluir em seus roteiros. O humor de “Complete and Utter History”, portanto, sempre se construía em diversos níveis, começando pela sátira histórica elaborada pelos roteiristas e acrescentando a maneira como ela é absorvida pela linguagem televisiva: um esquete, por exemplo, imita uma entrevista de jogadores de futebol descansando depois de um jogo, mas os personagens, no caso, são os Normandos logo após terem ganho a Batalha de Hastings (fig.14). O deadpan também era largamente utilizado, como num esquete em que um vendedor de imóveis tenta vender Stonehenge para um casal, como se fosse uma casa como qualquer outra. Outra série de esquestes são comerciais para novos bens da humanidade: mulheres, comida e água, enquanto outro esquete observa “possibilidades de carreira dentro da Royal House”. A experiência com o programa, porém, não foi vista como tão bem sucedida pelos roteiristasperformers: Jones comenta como o trabalho demonstrou a necessidade dele conseguir se envolver mais com a direção, senão muitos elementos-chave para as cenas poderiam ser perdidos na filmagem. Palin também comenta como o trabalho com outros atores, de backgrounds diferentes, por vezes minava a construção cômica do roteiro. Essas experiências apareceriam novamente no Flying Circus, que continha diversos esquetes que brincavam com elementos da história, mas agora com mais sucesso, pois o grupo tinha mais liberdade com a abordagem tomada com seus roteiros e, futuramente, seus filmes. Como Eric Idle comenta, Python logo virou uma “comuna dos roteiristas” (CHAPMAN, 2005, p.197). Já em “How to Irritate People” Cleese trabalhou um roteiro escrito por ele e Chapman. Tomando a forma de um “ensaio” com dicas práticas, Cleese apresentava os esquetes do programa como um tutorial de como irritar pessoas – com resultados comicamente sádicos. Seguem daí diversas cenas nas quais um personagem toma atitudes intencionais de descuido, insistência, falsidade, ignorância, sadismo entre outros, até tirar o “straight man” da cena do sério, o que poderia resultar num chilique, abuso verbal ou violência, acentunando bastante o humor negro de Cleese e Chapman, num programa descrito por David Frost como pós-satírico, numa introdução ao programa.

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Talk show para o qual Palin e Jones contribuiram com pequenas cenas filmadas, que funcionavam como inserts cômicos durante o programa.

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Figura 14 (esq.): Trecho de “Complete and Utter History of Britain” com William, o Conquistador (Michael Palin), sendo entrevistado depois da famosa batalha de Hastings. Figura 15 (dir.): Palin, em pé, como o vendedor num esquete de “How to Irritate People” analisado abaixo. Cleese havia o convidado para o programa, depois de observar de seu trabalho como ator.

O programa também faz a estréia de personagens que seriam incluídas no universo Python: as Pepperpots, homens travestidos de mulheres interpretando senhoras insistentes e fofoqueiras, que adoram aparecer na televisão e falar dos sobrinhos. Alguns esquetes também apareceriam, sob alguma forma, em Python, e um dos esquetes serve como indicativo do tipo de humor observado no início da carreira desses comediantes, versus a maturação dessas sensibilidades no Flying Circus: em Car Shop, um homem quer comprar um carro, atendido por um vendedor (Palin; fig.15) incompetente que tenta convencê-lo de que o carro em questão, claramente inseguro e em péssimo estado, é o carro perfeito para ele, negando qualquer atestado de realidade que só comprova a inadequação do veículo. A mesma estrutura apareceria no mais famoso esquete do Flying Circus – o do “Papagaio Morto”31, mas potencializado por diálogos excessivos, agressividade exacerbada e momentos nonsense. Nele, ao invés da compra de um carro, um cliente tentar conseguir reembolso de algo que já comprou – um papagaio, que descobriu estar morto (o vendedor havia dito que ele estava “apenas dormindo”). Em Python, o diálogo entre os dois segue em fogo cruzado, com uma mudança surreal de locações (que em cena, são a mesma), enquanto o vendedor cria todo tipo de desculpas, afirmando que o papagaio está vivo. Irritado, Cleese passa a arrematar o bicho – um papagaio empalhado - contra o balcão, usando todo tipo de sinônimo lexical para comunicar suaa morte, culminando em “este é um EX-papagaio”.– conseguindo muito mais risos da platéia do que a versão anterior da esquete. Intermissão: ninguém espera um animador americano! É possível notar que a trajetória de um dos membros de Monty Python, Terry Gilliam foi muito pouco mencionada até então – isso se deve ao fato de que Gilliam realmente possui uma trajetória bem independente dentro do grupo, tendo crescido nos EUA e se mudado para Londres nos anos 60 e conseguido então o emprego em DNAYS, finalmente entrando em contato com os futuros membros de Monty Python. Mesmo na série, devido ao intenso trabalho de animação que deveria fazer, em curto tempo hábil, Gilliam mantinha-se isolado, porém dando à série o seu aspecto visual mais distintivo. Gilliam havia crescido em Minessota, filho de um carpinteiro, tendo o que descreve como uma infância idílica, em meio a campos e pântanos. No ensino médio, já praticava seu hobbie de cartuns além de ser líder de torcida, criando também cenários para peças escolares. Foi estudar no sul da Califórnia, com uma bolsa de estudos, numa faculdade de artes liberais, a Occidental College. Lá, Gilliam trocou de curso várias vezes, até se enquadrar nas Ciências Políticas (que exigiam o currículo acadêmico mais curto) o que possibilitou que ele conseguisse para si um ensino bem flexível, com várias eletivas. Logo se envolveu com o jornal da faculdade com alguns amigos, transformando-a numa “revista de humor barato” (CHAPMAN et al, 1999, p.123) para a qual fazia vários cartuns, baseado na revista de qual era fã, a MAD magazine. Gilliam começou a mandar exemplares da sua revista universitária para o editor da MAD, Harvey Kurtzman, sem conseguir muita atenção. Obstinado, Gilliam foi até Nova Iorque com alguns exemplares, e, por coincidência, conseguiu a vaga de emprego deixada por um dos assistentes de edição da revista atual de Kurtzman, HELP! (fig. 16 e 17). 31

CHAPMAN et al, 1999, p.104.

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Help! era uma revista de humor que reunia diversos cartunistas americanos, muitos deles ligados a quadrinhos underground, de conteúdo altamente sugestivo, como os trabalhos de Robert Crumb (cujo personagem Fritz the Cat, fez uma das suas primeiras aparições na revista), além de paródias da cultura pop, fumettis32 (fig. 17) e textos de humor de convidados. A primeira série, de 12 exemplares, foi de 1960 a 1962; a segunda, com 14 e contando com Gilliam, durou até 1965. A revista acabou em 1965, deixando Gilliam sem emprego, que depois passou alguns meses na Guarda Nacional para evitar serviço no Vietnã. Após isso, Gilliam fez um mochilão pela Europa, voltando para os Estados Unidos e conseguindo diversos empregos em Los Angeles como cartunista e publicitário, além de largar um curso de cinema e ir trabalhar de graça num estúdio de stop-motion. Gilliam acabou se mudando para Londres, conseguindo alguns trabalhos como editor de uma revista, e, então, tentando aproveitar o antigo contato de John Cleese, pelo trabalho na Fang, para tentar arranjar algo na televisão – que o levou diretamente em contato com Humphrey Barclay e então, o trabalho no Do Not Adjust Your Set, como animador. O histórico de Gilliam aponta poucas experiências que ajudem a compreender o estilo de animação que veio a criar na televisão britânica, mas o trabalho dos Fumettis na Help!, as pequenas experiências de Gilliam com cinema pelo trabalho no estúdio de stop-motion e filmes caseiros com uma câmera Bolex, além de suas várias viagens, que deveria incluir uma rota cultural, demonstram que Gilliam já tinha interesse pela animação 33. Um dos fatores que moldaram seu estilo, como ele mesmo aponta, era a falta de orçamento, recursos, experiência e tempo: não havia nada mais simples de se fazer do que a animação com recortes, e Gilliam logo aproveitou o arsenal cultural de Londres, visitando museus e fotocopiando seus acervos históricos (o que explica a frequente presença, em Python, de fotografias do século XIX e pinturas renascentistas, por exemplo). As próprias limitações da animação de recortes eram o que levavam a imaginação de Gilliam, ele explica, aos movimentos bruscos e violentos do grotesco, oposto aos movimentos fluídos e harmônicos de uma animação tradicional.

Figura 16 (esq.): Capa da edição #22 de Help! que já contava com Gilliam como co-editor. Figura 17 (dir.) “Fumetti” feito por Gilliam para a revista, com a participação de John Cleese, que se encontrava em Nova Iorque. O contato renderia para Gilliam a aproximação com a TV britânica, anos depois.

É... Ao fim de 1968, Eric Idle, Terry Jones e Michael Palin viam pouco caminho a trilhar com Do not Adjust Your Set e buscavam novas oportunidades. Enquanto isso, Cleese continuava com I’m Sorry I’ll Read that Again e contribuira em dois roteiros para cinema com Graham Chapman, para a Paradine

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Quadrinhos feitos a partir de fotografias posadas; durante sua estadia em NY, Cleese apareceu em uma escrita por Gilliam 33 Em entrevistas, Gilliam menciona apreço pelas animaçoes de recortes dos contemporâneos Jan Lenica e Stan VanDerBeek.

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Productions34, mas que tiveram pouco retorno, e esperava um novo trabalho. A oportunidade chegou quando Barry Took, antigo parceiro de escrita de Marty Feldman 35, havia conseguido um trabalho como “produtor consultor” na BBC e teve a idéia de chamar John Cleese para fazer uma série. Cleese logo convidou Chapman, o parceiro de roteiros, e Palin, com quem acabara de filmar seu especial para TV, que logo passou a envolver Idle, Jones (e Gilliam, posteriormente). Logo, portanto, os comediantes foram se animando com a idéia de ter um programa, antes mesmo de terem qualquer idéia a respeito do que queriam fazer ou qualquer projeto concreto para a BBC. O que ficara claro para eles e Took, porém, era que “naquele estágio, nós já tinhamos um corpo de trabalho que já se impunha na televisão” (CHAPMAN et al, 2005, p.190). Embora o programa tivesse surgido como um veículo para a carreira de John, o grupo começou a se reunir e chamar a idéia de The 5 show; logo os comediantes se reuniram com Michael Mills, chefe de comédia da BBC na época -sem conseguir responder nenhuma de suas perguntas com qualquer tipo de certeza - mas mesmo assim saindo de lá com a confirmação de 13 programas a serem filmados e exibidos na BBC, no que “deve se manter como uma das melhores decisões executivas da história [da televisão] e não aconteceria de jeito nenhum hoje” (CHAPMAN et al, 2005, p.190). Com um programa e elenco confirmados, mas sem nenhum nome ou estrutura na cabeça, coube aos membros do novo grupo estabelecerem o que realmente iriam fazer na televisão, o que passou a ser discutido em reuniões. O estalo realmente veio quando Cleese e Jones assistiram na televisão a mais nova série do ídolo de infância Spike Milligan, cujo anarquismo voltava a televisão com o programa Q (fig. 18 e 19), que possuía uma estrutura agressiva e dispensava começos e fins de esquetes, que ligavam-se a partir de qualquer idéia de Milligan – que tinha as das mais diversas e irreverentes. Indicativo da completa falta de limites que Milligan se impunha na criação de seu programa, de forte cunho autoral, são a presença de, em um só episódio da série, piadas envolvendo Hitler, a política racial na BBC, mulheres de topless, homens travestidos com lingerie feminina, portas para realidades alternativas, entre outros. O que certamente não devia contentar os setores mais conservadores da BBC, que demorou a dar outra temporada a Spike, mas que certamente chamou a atenção dos membros de Monty Python, que o consideram uma base do estilo que buscaram.

Figuras 18 (esq.) e 19 (dir.): Trechos de Q5 de Spike Milligan, que demonstram as experimentações do comediante com o formato de sua série. Na primeira cena, que surge sem explicação como “Ao vivo de Westminster”, Milligan faz sons ininteligíveis com a boca, vestindo uma camisa de força e uma peruca, enquanto um homem vestido de Napoleão tem problemas gástricos e um marujo “toca” um volante de barco. Na segunda cena, o backstage da filmagem é mostrado, com os atores empurrando a porta que vão usar na cena logo em seguida (e mesmo ao usá-la, fazem com total descompromisso com verossimilhança).

Cleese e Jones começaram, então, a quererem estabelecer qual seria o formato da série, e os desenhos de Gilliam surgiram, então, como a saída ideal. Contando com ele para fazer os links, os estilos e idéias dos outros poderiam facilmente se ligar sem necessitarem ter que parar um esquete para começar a outra: uma linha de “fluxo de consciência” começara a ser discutida entre os escritores. 34

Os dois contribuiram com algumas piadas para a excêntrica comédias de humor negro “The Magic Christian” (1999) estrelando Ringo Starr e Peter Sellers; em seguida escreveram o roteiro para o filme “The Rise and Rise of Michael Rimmer”, estrelado pelo ídolo Peter Cook, que não conseguira o sucesso de seu filme anterior, “Bedazzled” (1967). 35 Com quem trabalhou na série It’s Marty, que contou com material escrito por Chapman, Palin e Jones.

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Quanto ao quê exatamente os Python iriam escrever, era pouca novidade para eles próprios: “Nós começamos fazendo todas aquelas coisas das quais eramos impedidos de mandar para outros programas, como o Frost Report 36” (CHAPMAN et al, 2005, p.193). Um dos primeiros esquetes filmados, por exemplo, fora o das “Ovelhas Voadoras”, engavetado pelo produtor de Frost. Outro esquete, clássico da primeira temporada, fora o “Nudge, Nudge”, que Eric Idle havia escrito para Ronnie Barker e que ninguém havia entendido - “não havia piadas [claras] no papel. Dava para notar porque eles rejeitaram” (CHAPMAN et al, 2005, p.200). Esse tipo de liberdade que os escritores deram a si mesmos e para seu material fora algo muito importante para o estilo do programa, pois lhes permitiu escreverem piadas “que você não tinha que explicar. Era um riso que não se ousava nominar, que não conseguíamos dizer o porquê ele funcionava, mas ele funcionava...Era difícil conseguir uma harmonia como essa num grupo de seis pessoas, e era isso que pretendíamos preservar. Se funcionasse, não haviam limites ou regras para nosso material” (CHAPMAN, 2005, p.206). Os membros de Python inclusive compartilhavam cadernos de idéias, que ficavam abertos para qualquer um deles pegar um esboço e desenvolvê-lo sozinho ou em dupla.

Figuras 20 e 21: Dois momentos nonsense em Python. Na primeira, uma esquete na qual Cleese descreve várias características absurdas sobre Lhamas; o esquete termina com uma música espanhola sobre Lhamas e Chapman, vestido de noiva, chegando de moto e explodindo uma sacola. À direita, um cavaleiro chega com uma galinha para interromper a cena que se passa, como já fizera em outros episódios, mas é dispensado por um assistente. Ao invés da cena acabar ali, a câmera segue o caveliro indo embora por um curral, passando por Cleese, que muda o cenário ao anunciar “E agora, para algo completamente diferente”( como o faz em diversos episódios). A principal qualidade de Python residia em sua liberdade ao lidar com esses elementos cômicos absurdos e díspares, sem perder controle da estrutura de suas cenas. (CHAPMAN, 1999)

Conclusão Depois de cerca de um mês escrevendo o material do programa, e combinando o nome Monty Python’s Flying Circus com a BBC, os Python se viram “com o desafio de juntar o material em 30 minutos de segmentos diferentes” (CHAPMAN et al, 2005, p.197) para os episódios. Esses comentários sobre o processo criativo do grupo indicam, assim, que fora depois de terem um montante de material que os Python criavam os episódios e suas lógicas internas, que envolviam os links, as brechas para as animações de Gilliam, além de piadas repetidas espalhadas por toda a temporada37– “Nós todos ficamos muito bons em editar [os roteiros]” (CHAPMAN et al, 2005, p.197) diz Eric Idle. As sessões de escritas dos episódios em si (uma vez que as esquetes eram escritas separadamente) são relembradas como um trabalho árduo e minucioso, pontuadas por conflitos criativos – produtivos – entre os roteiristas. O resultado, assim, foi uma temporada de uma série que se ligava a novos exemplos da “comédia alternativa” britânica com a sua liberdade de temáticas e sua inventividade cênica e de edição, mas que em Python ganhou um componente fundamental: estrutura. Os episódios de Monty Python’s Flying Circus destacam-se até hoje dentre os programas de humor de esquetes pela minúcia pela qual os diferentes temas de um episódio se ligam, a fluidez com a qual uma cena desemboca em uma completamente nova, ou que apresenta alguns elementos das outras cenas reorganizadas: o primeiro episódio, por exemplo, é intercalado por aparições constantes de sons de porcos sendo esmagados – que 36

Numa vingança sarcástica, os Python ainda acrescentam que juntavam algum dinheiro enviando para as sitcoms e talk shows populares da época as piadas que cortavam dos roteiros do Flying Circus. 37

Como, por exemplo, a aparição de Vikings em momentos inesperados nas cenas

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são então marcados num quadro negro – o que serve para os Pythons tanto como uma piada absurda como um elemento de ligação entre algumas cenas, e também como fator externo que permitia que saíssem de uma esquete para outro quando quiserem – bastava, nesse episódio, fazer um dos personagens pisar ou sentar-se em um porco. No final do episódio, um placar de porcos aparece, amarrando tudo de forma absurda, que seria um emblema da série. A primeira temporada é repleta de elementos similares ao dos “porcos mortos”, no que pode ser descrito por um humor de “spam”38: o último episódio da série inclui diversas aparições e variações em cima do esquete Albatross!, assim como o segundo episódio inclui diversas variações sobre a apresentação de um homem com duas narinas, que interrompem o fluxo narrativo de um ponto do programa e o levam para outro, ao mesmo tempo em que criam algum tipo de continuidade dentro do episódio. Apresentando os Pythons muito mais a vontade com o formato de seu programa39, o roteiro do último episódio é repleto de indicações de cortes bruscos, zooms de câmera, inserções fílmicas, fusões de imagem, manipulações de figurinos e objetos de cena, indicações para animações e diversas piadas envolvendo inserções de cartões-título, músicas e imagens em ritmos alterados, legendas cômicas e inclusive piadas entre os próprios Pythons nas descrições das cenas. Como é possível notar, o humor de Python exigia expedientes diversos de produção e pósprodução, o que demandava dos roteiristas uma grande preocupação com estrutura e uma equipe técnica que conseguisse acompanhar suas digressões – com isso em mente, um dos diretores chamados fora Ian McNaughton, que, embora não fosse o mais organizado do mercado, era o diretor de Milligan em Q e demonstrou-se apto para a empreitada. Como Palin indica, a experiência da primeira temporada demonstrou que “Você não consegue uma armadura de metal e uma galinha de plástico do nada. Era preciso todo um tipo de planejamento.”40 Um dos maiores destaques da série fora justamente a sua constante qualidade e continuidade de elaboração já em sua primeira temporada, demonstrando que os membros de Monty Python conseguiam equilibrar um criativo senso de imaturidade com um pragmático exercício de roteirização e representação de seu material. Isso só foi tornado possível tanto por um certo descaso da BBC com o que iriam produzir – o que lhes deu total liberdade – quanto pela completa imersão daqueles comediantes numa experiência contínua de aprendizado dentro do mundo do humor, observando atentamente e participando de diferentes círculos até “montarem suas barracas” dentro de um campo pouco explorado até então, de um senso de humor que fugia da sátira e se baseava na imaginação, metareferência e nos limites cômicos da significação e seus muitos absurdos, sem basear-se numa sátira de indivíduos específicos, mas “apresentando uma revolta contra um sufocante mundo (...) imerso em convenções”. Como Gilliam comenta, sobre suas animações agressivas, Python também havia trazido a violência explícita para o humor - “você podia sair livre mesmo com assassinato”41 – gozando da liberdade que os Python conseguiram na BBC. O que é possível relevar dessa busca, que continua um campo rico, é o papel contra-produtivo que a falta de uma política de arquivo da BBC teve para a história da experimentação com modos de humor e representação que ela mesma havia financiado: o próprio programa do Flying Circus quase teve todas as suas fitas apagadas para serem reutilizadas, o que não aconteceu, pois Terry Jones conseguiu comprá-las antes (REDHEAD, 1999). Por causa disso, o trabalho de muitos comediantes que estavam formando seu estilo e público na época, saindo de modos tradicionais de se pensar e realizar humor – muitos rumos possíveis, risos incomuns – foram perdidos, e, no caso de Spike Milligan, toda uma cosmogonia surreal sobrevive mais nos relatos daqueles que inspirou do que em material arquivado de suas obras. A era digital, porém, facilita o reaparecimento desses materiais desaparecidos através de cópias caseiras, aúdios, roteiros, entre outros – que nunca tiveram lançamento ou reconhecimento oficial – permitindo que essas trajetórias sejam reconstruídas e que as piadas nelas contidas demonstrem de novo seu valor cultural.

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A escolha do termo não é aleatória: o popular “spam” da internet foi nomeado como referência a um esquete de Monty Python sobre o apresuntado enlatado, que surge em todo item de um menu de uma cantina de segunda mão, como se fosse um vírus, num esquete da terceira temporada - que aplica uma estrutura cômica metonímica do estilo do programa como um todo, com suas inserções repentinas, wit verbal e digressões audiovisuais. 39 Mas ainda apresentando cenas mais escrachadas para o pastelão - como numa em que um doutor encontra hippies no estômago de um paciente- tipo de humor que só reapareceria de forma sarcástica no decorrer da série. 40 Depoimento dado no documentário “Life of Python” (REDHEAD, 1999) 41 Depoimento dado no documentário “Life of Python” (REDHEAD, 1999)

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Figura 22: Final de um antecessor de Q, “A series of Unrelated Incidents at Current Market Value”, feito por Milligan em 1961 para a BBC. Milligan, canta “It’s a great big wonderful world” sob projeções da 2ª Guerra Mundial.

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FIDDY, Dick. Missing, believed Wiped: Searching for the Lost treasures of British television. Londres: BFI, 2001. 146 p. GREEN, Jonathan. All dressed up: the sities and the counterculture. 2ª edição. Londres: Pimlico. 1999. 482 p. LARSEN, Darl. Monty Python, Shakespeare and English Renaissence Drama. Carolina do Norte: MacFarland Press, 2003. 236p. MARWICK, Arthur. The Sixites. 2ª edição. Nova Iorque: Oxford University Press. 1999. 903 p. MILLIGAN, Spike. The Goon Show Scripts. Disponível em: Acesso em: 1 ago. 2013. OXFORD DICTIONARY. Verbete "Pythonesque". Disponível em: . Acesso em: 1 ago. 2013. REDHEAD, Mark. Life of Python [filme-vídeo]. Londres, BBC, 1990. Vídeo digitalizado, 57min. Cor. TOPPING, Richard. Monty Python: from Flying Circus to Spamalot. Londres: Random House, 2007. 188p.

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