Monumento à Anita e Giuseppe Garibaldi – um século como reflexão sobre o tratamento à arte e à memória sul-rio-grandense

September 16, 2017 | Autor: Jose Francisco Alves | Categoria: Public Art, Arte Y Esfera Pública, Art in public space, Art in Public Spaces, Arte Pública
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Descrição do Produto

Apoio: ISSN 2178-8685

as partes n.º 8 Revista do Atelier Livre da Prefeitura de Porto Alegre

Realização: Atelier Livre da Prefeitura de Porto Alegre

Dez./2013

Diretora do Atelier Livre Eleonora Fabre Professores Efetivos: Ana Flávia Baldisserotto Ana Luz Pettini Daisy Viola Miriam Tolpolar Niura Ribeiro Wilson Cavalcanti Secretaria: Enir Elizabeth Lucia Demarchi Lautert Rejane Santos da Silva Impressores: Nelcindo Rosa Estagiárias: Alice Brauwers

Escultura

Solda/oficina

Secretário Municipal da Cultura Roque Jacoby

Fornos

Prefeito de Porto Alegre José Fortunati

Espaço Alternativo

Saguão

Ana Isabel Lovatto Cláudio Ely José Francisco Alves Neusa Poli Sperb Renato Garcia

Xilogravura / Metal

Cerâmica

Pátio interno Secretaria

Biblioteca

Litografia

Direção

Primeiro Piso

Rogério Rosa

Entrada

Estrutura Física ATELIER LIVRE

Priscila Moreira Desenho

As Partes, n.º 8, [Dezembro de 2013] periodicidade variável. Tiragem impressa (2500) e publicação on-line (e-book) ISSN 2178-8685 Revista do Atelier Livre da Prefeitura de Porto Alegre Edição José Francisco Alves, Editor Alexandre Böer, Jornalista Responsável, MTb 7927 Conselho Editorial para a edição Eleonora Fabre, Artista Plástica e Mestre em Poéticas Visuais (UFRGS), Diretora do Atelier Livre. Fernando Fuão, Doutor em Arquitetura pela Escuela Tecnica Superior de Arquitectura de Barcelona,

Pintura

Sala X

Eletrogravura

Informática

Desenho

Reuniões

Segundo Piso

Depósito

Auditório

Pintura

Prof. da PósGraduação em Arquitetura da FAU-UFRGS.

José Francisco Alves, Doutor em História, Teoria e Crítica da Arte (UFRGS). Prof. do Atelier Livre. Niura Ribeiro, Doutora em História, Teoria e Crítica da Arte (UFRGS), Profa. do Atelier Livre.

http://danielescobar.com.br/works/2011-2012/the-world/

Diagramação e tratamento de imagens José Francisco Alves

Agradecimentos especiais Daniel Escobar

ATELIER LIVRE XICO STOCKINGER Centro Municipal de Cultura Lupicínio Rodrigues Av. Érico Veríssimo, n.º 307 (Esquina Av. Ipiranga) 90160-181 PORTO ALEGRE-RS - B R A S I L (51) 3289.8057 / 3289.8058 [email protected] http://atelierlivre.wordpress.com/

Trabalho especial para a capa

The World (detalhe), 2011

Daniel Escobar

(Santo Ângelo-RS, 1982) Vive em Porto Alegre - RS. Graduado em Artes Visuais pelo Instituto de Artes da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Em 2013 realiza a individual Paredes Falsas selecionada no Programa de Exposições do Centro Cultural São Paulo (CCSP), participa da X Bienal de Arquitetura de São Paulo, do 18º Festival Internacional de Arte Contemporânea Sesc VideoBrasil e integra a curadoria Além da Biblioteca, apresentada no Itochu Aoyama Art Square, em Tóquio (Japão) e na Frankfurter Buchmesse, em Frankfurt (Alemanha). Entre suas mostras recentes destacam-se as individuais Fictitious Topographies - RH Gallery em New York, Campos Migratórios - Funarte MG em Belo Horizonte e Você Está Aqui - Mamute Estudio Galeria em Porto Alegre. Sua trajetória inclui a participação no programa Bolsa Pampulha, residência artística concedida pelo Museu de Arte da Pampulha (MG), o Prêmio Funarte de Arte Contemporânea em duas edições consecutivas (SP/2010 e MG/2011), e o Prêmio Fiat Mostra Brasil (SP). Em Porto Alegre realizou mostra individual no Goethe-Institut, em 2005, recebeu o Prêmio Artista Revelação na primeira edição do Prêmio Açorianos de Artes Plásticas e participou do programa Artista Convidado do Atelier de Gravura da Fundação Iberê Camargo. Entre 2008 e 2012, residiu em Belo Horizonte onde manteve seu estúdio e desenvolveu diversos projetos artísticos. Possui obras em acervos públicos no Brasil e no exterior.

Daniel Escobar // Studio Av. Cauduro 209/302, Bom Fim | 90035-110 | Porto Alegre +55 51 3508 9235 +55 51 8310 9424 www.danielescobar.com.br

as partes

n.º 8

Sumário

D e z./2013

[Capa]

Trabalho Especial

Daniel Escobar

NOTAS >> Atelier Livre em circuito pág. 2 ~ 7 Arte gaúcha perde dois mestres do Atelier Livre em 2013 pág. 8

Artigos Monumento à Anita e Giuseppe Garibaldi – um século como reflexão sobre o tratamento à arte e à memória sul-rio-grandense José Francisco Alves pág. 9 ~ 12 Sementes Que Germinam: projeto colaborativo cresce organicamente a partir do engajamento de artistas, alunos e vizinhos Ana Flávia Baldisserotto pág. 13 ~ 14 O Artista Enquanto Produtor de Si Felipe Bernardes Caldas pág. 15 ~ 16 Considerações sobre o mercado de arte no Brasil

Celso Fioravante pág. 17 ~ 18

A imagem poliglota Adolfo Montejo pág. 19 ~ 21 r.u.a. Porto Alegre: laboratório nômade de cartografias artísticas experimentais Lilian Amaral pág. 22 ~ 24 Um espaço para a gravura brasileira Miriam Tolpolar

pág. 25 ~ 26

Pesquisa de doutorado, entre a lente e o pincel: interfaces de linguagens Niura Legramante Ribeiro pág.27 ~ 29 Da possibilidade de desdobrar e actualizar os Géneros da Pintura pela instalação pictórica Margarida P. Prieto e Rui Macedo pág.30 ~ 32

As Partes 8 > dez. 2013 pág.

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Monumento à Anita e Giuseppe Garibaldi – um século como reflexão sobre o tratamento à arte e à memória sul-rio-grandense José Francisco Alves Quando Porto Alegre entrou na segunda década do Século XXI iniciou-se um período mais frequente de comemorações centenárias de bens culturais importantes, mostrando que há testemunhos concretos de que estamos envelhecendo. Por isso, mais do nunca é – realmente – necessário se preservar e bem cuidar esses marcos de nossa memória cultural. Em 25 de janeiro de 2013 completou 100 anos o Monumento a Júlio de Castilhos, um dos mais importantes do país em seus aspectos histórico, plástico e simbólico. Para assinalar o fato, as comemorações ocorreram à partir de iniciativas particulares e apesar de bem assinalada a efeméride por palestra junto ao monumento e exposição fotográfica, o resultado mais evidente foi o clamor pelo seu estado lastimável. Há mais de uma década essa homenagem se apresenta em estado de exponencial imundice, resultado da “autorizada, livre, cidadã e democrática” depredação e pichação, estado que vem arraigando-se, sem reação concreta, como uma característica normal da paisagem porto-alegrense. O fato é que o mesmo localiza-se às barbas dos poderes instituídos, os quais permanecem hirtos e impassíveis (tal qual a estátua de Júlio de Castilhos) em relação à vergonha que constituiu-se a situação desse monumento. Eu sempre me pergunto o que os guias “turísticos” falam aos visitantes da cidade diante daquilo.

Capa de A Federação, Porto Alegre, 19 de setembro de 1913. As Partes 8 > dez. 2013 pág.

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20 de Setembro trata-se da efeméride gaúcha mais sagrada, o dia do estopim da Revolução Farroupilha, em 1835. Poucos sabem, mas as primeiras comemorações em forma de arte pública à essa epopeia foram de iniciativa dos ítalo-brasileiros: O Monumento à Anita e Giuseppe Garibaldi (1913) e o Obelisco a Tito Livio Zambeccari (1925). Posteriormente, nas comemorações do Centenário Farroupilha, houve um significativo número de monumentos à revolução e à República Rio-grandense, cuja obra mais importante foi a estátua equestre de Bento Gonçalves (1936), de Antônio Caringi. E assim, em 20 de setembro de 2013, foi assinalado o centenário do Monumento a José e Annita Garibaldi (como foi chamado à época) Sua inauguração, fartamente noticiada e descrita em minucias pela imprensa da época, marcou um tempo em que o desvelamento dos monumentos eram animadas e concorridas festas cívicas. Para tais eventos, os funcionários públicos eram dispensados para assistirem e havia desfiles de militares, autoridades, escolares, bandas de música, fogos, declamações e discursos insossos ou mesmo inflamados. No caso desse monumento, não faltou a presença do mandatário do estado, Borges de Medeiros. E esse quadro não só ocorria em monumentos ‘políticos’, mas em celebrações como a do Monumento à Árvore (1910), na Praça Guia Lopes. Hoje, apesar da fama ecológica da cidade de Porto Alegre, esse marco também resta como mais um dos nossos monumentos semidestruídos, esquecidos no exílio da memória, em razão do descaso e evidente falta de educação e cultura por parte de todos. Um dos aspectos que podemos relembrar hoje desse pioneirismo em celebrar a Revolução Farroupilha, por meio do monumento a Garibaldi, foi que a iniciativa partiu de cidadãos e organismos privados. Como de costume, eram organizadas comissões que arrecadavam fundos, contratavam o artista e administravam a construção. E este monumento não foi qualquer um, tratou-se de uma promoção de vulto. Toda a obra (base e estátuas) foi realizada na Itália, esculpida em mármore – e não como era o mais comum, fundida em bronze sobre pedestal de granito – e, portanto, caríssima. É por isso que contam-se nos dedos os conjuntos estatuários de porte, realizados em mármore, existentes no Brasil. Em 4 de abril de 1907, uma das primeiras praças então afastadas do centro da cidade, no Bairro Cidade Baixa, a Praça da Concórdia, foi denominada Garibaldi em comemoração ao centenário do “herói dos dois mundos”. A partir disso, iniciou-se uma encomenda para o monumento, sendo il Comitato formado inicialmente por Angelo Crivelaro e Francisco Provenzano, entre outros. Para realizá-lo, em março de 1908 os organizadores oficializaram à marmoraria Fratelli Giorgini, de Massa-Carrara, a contratação para o trabalho de erigir o monumento ao “invicto cidadão Giuseppe Garibaldi e Anita Ribeiro, sua companheira”, num orçamento estimado entre 12 e 18 mil liras. O proprietário da firma, Vittorio Giorgini, por sua vez encarregou o desenho do monumento ao artista florentino dell’Ottocento, Filadelfo Simi (1849-1923), o qual acompanhou a execução do mesmo junto ao ateliê de Italo Frediani, em Forte dei Marmi, Toscana. Esse artista, predominante pintor, recentemente teve sua importância na Itália destacada pela pesquisadora Alba Tiberto Beluffi, por meio de Filadelfo Simi – un uomo, un artista (Pisa, 1996), base para o documentário homônimo de Francesco Speroni (1997), e Simi & Giorgini – Storia e Cultura fra 800 e 900 (Pisa, 2003). Este último, justamente sobre a parceria entre a firma e o artista; ambos, os protagonistas do monumento a Garibaldi. Nesses livros e documentário, figura em destaque a história do nosso monumento ao casal Garibaldi como uma das mais importantes realizações de Filadelfo Simi.

Estudos de Filadelfi Simi para o monumento em Porto Alegre. Cortesia de Alba T. Beluffi.

As Partes 8 > dez. 2013 pág. 10

Nos bozzettos iniciais acima, levantados pela pesquisadora Alba T. Beluffi, os estudos não atenderam ao pedido de Porto Alegre para que o monumento retratasse o casal. No primeiro, um desenho, Garibaldi apresentava-se sobre um elevado pedestal, com dois leões à base. No segundo, um mármore assinado pelo artista, o projeto ainda mostrava Garibaldi sozinho, retratado em aspecto amigável, bonachão, com uma águia a seus pés a observá-lo. No terceiro, também tridimensional, finalmente incluiu-se Anita e o mesmo serviu como base para o monumento final: “uma obra de arte psicologicamente penetrante e bem equilibrada no movimento das massas”, conforme observou Alba Beluffi. Também esse monumento público trata-se, senão do primeiro, de um dos primeiros a materializar no mármore ou bronze a participação de uma mulher como protagonista de realizações na sociedade brasileira. Porém, há muito tempo o estado de miséria, vandalismo e abandono do Monumento à Anita e Garibaldi, o primeiro monumento à Revolução Farroupilha, é absolutamente inaceitável, uma vergonha, um abandono sem precedentes no espaço urbano atual brasileiro. O que infelizmente não nos damos conta ao estufarmos o peito sul-rio-gransense como um povo tido como “cultuador de sua história e tradições”, é que esse ufanismo desmedido é uma sucessão de pura retórica, equívocos históricos e incoerência. Como podemos obliterar nessa devoção cega os modos e as formas com que o patrimônio histórico farroupilha/gaúcho é mal tratado? Não é somente a situação do monumento aos Garibaldi que isso revela, é o estado dos demais memoriais e acervos alusivos a nosso maior feito histórico; o que se dirá do tratamento dado aos “outros” monumentos. Se faltam banheiros melhores ou iluminação no tal “Acampamento Farroupilha” – evento que sabe-se lá o que tem a ver com a memória gaúcha, e, principalmente, a história farroupilha – o mundo parece que vai desabar! No entanto, não temos nem de longe – muito longe – um museu como o Museo del Gaucho, em Montevidéu, onde a figura e a cultura antropológica do gaúcho é identidade nacional e cujo povo não precisa de organização para-oficial que dite pela votação em suas reuniões as formas de ser gaucho. Aqui no Rio Grande do Sul, de uma maneira que é absolutamente incompreensível, não temos um museu histórico que faça jus ao nome, como em Florianópolis existe o Palácio Cruz e Souza; em Curitiba, o impressionante Museu Paranaense. Seria faltar com a verdade considerar que o Museu Júlio de Castilhos, por suas acanhadas

Montagem do monumento, Praça Garibaldi, em Porto Alegre. Fototeca/Museu de Porto Alegre. As Partes 8 > dez. 2013 pág.

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Foto do monumento concluído. Utilizado na capa de A Federação, 19 de setembro de 1913. Arquivos de Filadelfo Simi. Cortesia de Alba T. Beluffi.

instalações, má estrutura, falta de recursos e inadequada conservação do seu confuso e indeterminado acervo possa ser considerado como tal, apesar do trabalho militante de seus dedicados diretores. Se formos falar no Museu Histórico Farroupilha (em Piratini), a situação é mais constrangedora. O Museu Antropológico do RS, então, pasmem, encontra-se há mais de dez anos encaixotado no décimo andar de um edifício comercial da capital. Como pode? Essas são considerações que mostram, afinal, na prática, como os povos cuidam, preservam e divulgam as culturas. Como visto, aqui fazemos de uma maneira diversa, ou seja, não o fazemos como o fazem os uruguaios, catarinenses e paranaenses na preservação dos acervos ao ar livre e museológicos que tratam das suas culturas distintivas e sobre a história de cada povo. E na mesma data (20 set. 2013) registrou-se também outro centenário despercebido, importante para a história da arquitetura, da arte e dos costumes porto-alegrenses, a inauguração da célebre Confeitaria Rocco. E foi naquele novíssimo e requintado estabelecimento que, na mesma noite, dirigiram-se em petit comité, para celebrar, as autoridades e organizadores do monumento a Garibaldi. Quanto à situação desse belíssimo edifício, no chamado ‘Centro Histórico’ da capital gaúcha, trata-se de outra pária do nosso valiosíssimo patrimônio cultural do início do Séc. XX, que ainda resta. Abandonado no atoleiro dos ad infinitum projetos e ideias que nunca são levadas a cabo, ele pertence a um período em que a arquitetura porto-alegrense foi um fenômeno mundial de qualidade e exemplo sem par da união entre arte e arquitetura. Mas esta é mais uma das nossas memórias culturais esquecidas.

José Francisco Alves é Doutor em História da Arte e membro do ICOM e ICOMOS. Desde 200o, é professor de escultura e teoria da arte no Atelier Livre. Editor de As Partes.

As Partes 8 > dez. 2013 pág.

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