MORADIAS EM CENTROS HISTÓRICOS: Análise do mercado de aluguéis residenciais no Centro Histórico de Belém – Pará – Brasil

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MORADIAS EM CENTROS HISTÓRICOS: Análise do mercado de aluguéis residenciais no Centro Histórico de Belém – Pará – Brasil MORHY, S. (1); TOURINHO, H. (2); LOBO, M. (3) 1. Universidade da Amazônia. Curso de Arquitetura e Urbanismo Avenida Alcindo Cacela, 287, Belém-Pará, CEP 66.060-902 E-mail: [email protected] 2. Universidade da Amazônia. Programa de Mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente Urbano Avenida Alcindo Cacela, 287, Belém-Pará, CEP 66.060-902 E-mail: [email protected] 3. Universidade da Amazônia. Programa de Mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente Urbano Avenida Alcindo Cacela, 287, Belém-Pará, CEP 66.060-902 E-mail: [email protected] RESUMO O centro comercial tradicional de Belém surgiu e se desenvolveu em torno do porto com implantação dos principais estabelecimentos comerciais, administrativos, religiosos e de residências das camadas mais abastadas da sociedade. Para o centro convergiam as principais vias e meios de transportes coletivos, tornando-se a centralidade urbana de maior acessibilidade, além de espaço de grande valor econômico, simbólico e arquitetônico. A partir de 1970, com o crescimento populacional e da malha urbana, o centro passou a enfrentar problemas de congestionamentos e degradação do patrimônio arquitetônico e urbanístico, provocados pelo uso do automóvel; deslocamento das moradias de alta renda para outras áreas; descentralização das atividades (privadas e públicas); demandas de novas tipologias de espaços comerciais, etc. Ao longo do tempo, o Centro Histórico de Belém (CHB) acumulou importante patrimônio histórico, artístico e cultural resultando no seu tombamento pelo Município, Estado e União e na realização de obras de requalificação arquitetônica e urbanística, mediante a inserção de atividades voltadas ao turismo e lazer. O presente trabalho objetiva identificar o perfil socioeconômico da população que alugou imóveis residenciais no CHB, nos últimos cinco anos, e apontar os principais motivos que fizeram as pessoas escolher morar no CHB, mesmo que nenhuma política pública relevante de incentivo à moradia foi implantada no CHB neste período. Para isso, foram levantados dados do Censo Demográfico do IBGE (2000/2010) e sistematizados dados do banco de dados da pesquisa Mercado Imobiliário em Centros Históricos das Cidades Brasileiras (MICH) – Belém. Os levantamentos evidenciaram que a população residente no CHB aumentou apenas 7,5% no período 2000-2010 (de 10.067 para 10.817 habitantes), mas o número de domicílios incrementou bem mais: 23,5% (de 2.630 para 3.249), sendo que os domicílios próprios elevaram-se em 249 unidades (de 1.680 para 1.929) e os alugados em 357 unidades (de 820 para 1.177). Quanto ao perfil dos inquilinos, 65.2% têm renda familiar de até 6 salários mínimos, 45.7% trabalham como autônomo, 71.8% têm no máximo escolaridade média e 70.22% utilizam, mesmo que esporadicamente, meio motorizado individual de deslocamento. Os principais aspectos citados pelos inquilinos como motivadores a escolher morar no CHB foram as proximidades: de atividades de comércio e serviços (44.8%); do local de emprego (44.8%); e, das residências de parentes ou amigos (44.8%). Com a crise de mobilidade urbana é explicável que os tempos e custos de deslocamentos pesem na decisão dos moradores, pois 42.6% dos inquilinos trabalham no próprio CHB, 80% realizam suas compras cotidianas na área central e 55.3% buscam lazer no interior do próprio CHB. A pesquisa permite inferir que é possível pensar políticas voltadas à reconversão de imóveis vazios 1 FORUM PATRIMONIO: ambiente Construído e Patrimônio Sustentável Belo Horizonte, v.8, n.1. Jan / Jun. 2015 ISSN 1982-9531 http://www.forumpatrimonio.com.br/

e/ou subutilizados do CHB para o uso habitacional, especialmente pela via do aluguel, contemplando segmentos de renda média e baixa da população que trabalha e demanda os bens e serviços ofertados no CHB. As vantagens da centralidade da área são os fatores que mais motivaram as pessoas a escolher morar no CHB, podendo ser exploradas para atrair novos moradores e, por esta via, reverter o processo de degradação física do CHB. Palavras-chave: Mercado Imobiliário de Aluguel; Habitação; Centro Histórico de Belém.

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1. INTRODUÇÃO Centros históricos geralmente são repositórios de expressivo patrimônio cultural. Além de abrigarem um conjunto de edifícios e de espaços públicos relevantes para a preservação da memória histórica coletivamente produzida, são referências simbólicas e representam a identidade cultural dos moradores da cidade. Desde os anos 1970 os centros das cidades vêm sofrendo profundos processos de transformação, provocados, dentre outros, pelo deslocamento, para outras áreas da cidade, das residências das camadas de maior renda e das atividades de comércios e serviços mais sofisticadas, além da própria expansão demográfica e da malha urbana, que estimulam a descentralização de algumas atividades econômicas. Essas modificações vêm sendo discutidas, tanto em âmbito internacional, quanto nas escalas nacionais e locais. O caso do Centro Histórico de Belém não foge a esta regra. Surgido no período colonial, tendo como marco inicial a implantação do Forte do Castelo, teve seu crescimento, direcionado para o sudeste e depois em direção ao Norte, se conurbando à periferia metropolitana a partir, sobretudo, da década de 1980. Ao longo deste processo, segmentos das camadas de maior renda se deslocaram para bairros localizados no entorno do centro histórico, para o centro expandido e para os condomínios fechados de alta renda localizados na periferia, deixando um estoque expressivo de imóveis residenciais desocupados que ingressaram no mercado de locação. Parte desses imóveis foram absorvidos e adaptados para o uso por atividades de comércios e serviços; outra parte manteve-se com o uso habitacional. O presente trabalho integra uma pesquisa mais ampla, realizada em rede, intitulada Funcionamento do Mercado Imobiliário em Centros Históricos das Cidades Brasileiras (MICH), que estuda, em sua primeira fase os centros de Belém, São Luis, Recife e Olinda, e cujo módulo de Belém se desenvolve no âmbito da Universidade da Amazônia. Em termos específicos, objetiva identificar o perfil socioeconômico da população que alugou imóveis residenciais no CHB, nos últimos cinco anos, e apontar os principais motivos que fizeram essas pessoas escolherem morar no CHB, num contexto em que, apesar dos investimentos públicos realizados na qualificação de imóveis e espaços públicos, nenhuma política pública relevante de incentivo à moradia foi implementada no CHB. 3 FORUM PATRIMONIO: ambiente Construído e Patrimônio Sustentável Belo Horizonte, v.8, n.1. Jan / Jun. 2015 ISSN 1982-9531 http://www.forumpatrimonio.com.br/

Para isso, foram levantados dados do Censo Demográfico do IBGE (2000/2010) e utilizados os dados da pesquisa de campo da pesquisa MICH coletados em 2013. Referida pesquisa, com base no Cadastro de Endereços do IBGE de 2010, aplicou questionários em 362 domicílios (5.35% do universo total de 6.762 endereços que integram o CHB), representando uma amostra aleatória e sistemática, que apresenta nível de confiança igual a 95% e margem de erro de 5%, para mais e para menos. Do total de endereços entrevistados, 47 unidades eram alugadas para o uso habitacional, os quais serviram de base para este artigo. A amostra utilizada neste trabalho é parte da amostra da pesquisa anteriormente citada, sendo constituída por 47 domicílios alugados no CHB. Como o peso de cada endereço é de 18,577, tem-se um total estimado de 873 domicílios. O próximo passo foi realizar os testes de significância das variáveis categóricas com somente uma resposta. O nível de significância adotado (valor-p) foi de 0,1. Como algunas variáveis possuem mais de duas categorias, utilizou-se o teste exato multinomial. Outro motivo para a escolha desse teste é que algumas dessas categorias registraram valores empíricos menores do que 5 (cinco), situação em que não é recomendável o uso dos dois testes mais comuns para variáveis nominais: o qui-quadrado e o G (MCDONALD, 2014). Nas variáveis com múltiplas respostas, o teste não foi aplicado. O teste exato multinomial, realizado por meio do programa estatístico R com o uso do pacote EMT (Exact Multinomial Test), consistiu em verificar a adequação do ajuste (goodness of fit) dos valores percentuais empiricamente registrados pelas categorias de cada variável a uma distribuição uniforme de probabilidade de ocorrência das mesmas. Dessa forma, a hipótese nula a ser testada em cada variável é a de que não há diferença significativa entre os valores das suas categorias. Vale ressaltar que os formulários habitacionais aplicados com os inquilinos abrangem um grande número de informações sobre: a edificação, suas características físicas e dimensões; a negociação do contrato de aluguel; as opiniões dos inquilinos sobre a área central; e, informações socioeconômicas sobre a família que mora no imóvel. Dentre essas informações, foram selecionadas as que permitem fazer a caracterização do perfil socioeconômico dos moradores e aquelas que possuem relação, direta e/ou indireta, com as motivações de morar no CHB. 4 FORUM PATRIMONIO: ambiente Construído e Patrimônio Sustentável Belo Horizonte, v.8, n.1. Jan / Jun. 2015 ISSN 1982-9531 http://www.forumpatrimonio.com.br/

Além disso, utilizam-se também informações dos Censos Demográficos do IBGE dos anos de 200-2010. É de se destacar que, de acordo com dados do Censo do IBGE, a ociosidade imobiliária domiciliar é de 16% do total dos imóveis dos bairros da Cidade Velha e Campina, o que revela o potencial que o CHB apresenta para a implementação de políticas de redução do déficit habitacional, inclusive aquelas relacionadas ao mercado de aluguel. Assim sendo, entender o perfil dos moradores e os motivos que os têm atraído a morar no centro pode contribuir para estas políticas. O artigo está estruturado em quatro partes. Na primeira faz uma breve caracterização do CHB e sua formação; a segunda traça o perfil socioeconômico dos inquilinos de imóveis habitacionais do CHB; a terceira apresenta os motivos para morar no CHB relacionados pelos inquilinos de imóveis habitacionais indicados na pesquisa do MICH; e, por fim, na quarta, apresentam-se algumas conclusões preliminares.

2. FORMAÇÃO DOS CENTROS E CENTRO HISTÓRICO DE BELÉM 2.1 - A formação dos centros urbanos A formação do centro comercial principal das cidades brasileiras tem origem com a implantação de estabelecimentos que movimentavam grandes quantidades de mercadorias em torno portos, ferrovias ou rodovias. A atividade atacadista passou a atrair outras atividades, como o comércio a varejo e indústrias, além de mão-de-obra e vias de acesso, iniciando, assim, a formação do centro propriamente dito. Uma vez constituído o embrião do centro, as grandes edificações das cidades brasileiras eram lá construídas: as igrejas, os fortes, os mercados, os quartéis, os palácios dos governantes, etc. Os primeiros largos e praças lá se situaram, e as primeiras linhas de bonde, ruas e avenidas eram projetadas indo até o centro comercial. Todo esse patrimônio, que conta a história de cada cidade, transformou o centro comercial original num centro histórico de grande valor artístico, arquitetônico e simbólico. A concentração de atividades terciárias, dos postos de trabalho e as necessidades de consumo fizeram com que parte significativa da população urbana procurasse o centro para morar, trabalhar, recrear, etc. Consequentemente, o centro comercial se torna o local mais valorizado da cidade, formado, inicialmente, por residências e comércio. 5 FORUM PATRIMONIO: ambiente Construído e Patrimônio Sustentável Belo Horizonte, v.8, n.1. Jan / Jun. 2015 ISSN 1982-9531 http://www.forumpatrimonio.com.br/

Os centros das cidades brasileiras, portanto, começam com o intenso fluxo de pessoas consumindo e trabalhando em uma determinada área da cidade e, principalmente, com o crescimento do comércio varejista formando uma centralidade diversificada e especializada no local. Segundo Villaça (2012), quando surgem os deslocamentos espaciais urbanos sistemáticos e, com eles, começa a se formar aquilo que se chama de “centro do aglomerado”, a organização do espaço passa a se fazer em termos de otimização dos tempos gastos nos deslocamentos dos membros dessa sociedade. Villaça (2012) argumenta que a constituição do centro de uma cidade tem origem no impulso, inato do ser humano, de poupar o tempo gasto nos seus deslocamentos espaciais. Para atender a crescente demanda de fluxos de pessoas e mercadorias, entrando e saindo da área central é necessária a criação de grandes vias e a disponibilização de meios de transportes que dão acesso direto a este centro, tanto para as pessoas quanto para as mercadorias, beneficiando os estabelecimentos do centro comercial e valorizando o uso do seu solo. Com isso, novos estabelecimentos passam a ter interesses sobre o centro comercial, como as lojas de departamento e escritórios de profissionais liberais, visto que há uma grande concentração de pessoas na área central. Villaça (2001) explica que aumento da mobilidade espacial motivada pelo aumento da taxa de motorização das classes de mais alta renda e pela nova forma de produção do espaço que faz emergir condomínios fechados em áreas periféricas ou amenidades em outras áreas da cidade, fez com que as elites se desinteressassem pelos centros principais. Com isso, os comerciantes de lojas elitizadas e os profissionais liberais vão atrás do consumidor, formando outros centros comerciais, constituindo outro processo denominado de descentralização (CORRÊA, 1995). Para Villaça (2001) o abandono dos centros comerciais principais começa com o surgimento dos primeiros subcentros voltados para as camadas de alta renda. Diz, ainda, que as transformações dos centros principais de nossas metrópoles nas décadas de 1950 a 1960 são uma consequência de seu abandono pelas camadas de alta renda. Registra que a década de 1960 marcou, em todas as metrópoles brasileiras e mesmo em cidades médias, o início do desenvolvimento de grandes “sub-regiões urbanas” de comércio e serviço voltados para as camadas de alta renda; para essas sub-regiões transferiram-se lojas, consultórios, cinemas, restaurantes, bancos, profissionais liberais, etc. que atendiam 6 FORUM PATRIMONIO: ambiente Construído e Patrimônio Sustentável Belo Horizonte, v.8, n.1. Jan / Jun. 2015 ISSN 1982-9531 http://www.forumpatrimonio.com.br/

àquelas camadas e que se localizavam no centro principal. Como consequência o centro tradicional deixa de ser a única centralidade urbana e se formam o que Tourinho (2006; 2007) denomina de novas centralidades. Com a mudança do consumidor de alta renda para outras áreas da cidade, o centro comercial principal passou a se especializar um novo perfil de consumidor – o de classe baixa, que é atraído pelo preço de mercadorias mais baratas. Para este consumidor o que mais importa é o preço baixo da mercadoria, e não a aparência ou as características arquitetônicas ou das instalações físicas das lojas. Por isso, dentre outros motivos, os comerciantes locais deixam de investir na aparência de suas lojas, resultando num declínio do conjunto que compõem o centro histórico. Villaça (2001) enfatiza que na origem do processo popularmente chamado de “decadência” ou “deterioração” do centro está no seu abandono por parte das camadas de alta renda e na sua tomada pelas camadas populares. Complementa que, neste processo, os edifícios do centro tradicional, abandonados, perderam seu valor imobiliário e foram deixados a deteriorar. Portanto, foi o abandono pelas elites que fez com que os edifícios se deteriorassem, pois não compensava mais mantê-los. Não foi a deterioração que provocou o abandono. Este quadro vai ser notado em praticamente todos os centros de cidades brasileiras, e terá repercussões no mercado imobiliário. Muitas das famílias que abandonam a localização central se mantêm proprietárias de imóveis, ou os vendem para outra parte da elite composta por proprietários que investem no centro para obter renda fundiária no mercado de compra e venda ou no mercado de aluguel. Nas áreas tombadas destes centros tradicionais, o processo de deterioração dos imóveis centrais tende a se agravar, dadas as dificuldades e os elevados custos de manutenção dos edifícios e as restrições que são impostas, pela legislação de preservação do patrimônio, à renovação e à construção de novos imóveis. A necessidade de mesclar usos habitacionais com os outros usos vem sendo ressaltada em todos os estudos e manuais de urbanismo, desde as primeiras críticas ao movimento moderno na arquitetura até os dias atuais. Tal necessidade se potencializa nos casos de sítios históricos onde se nota um conjunto de infraestruturas instaladas e, não raramente, uma expressiva ociosidade de imóveis. 7 FORUM PATRIMONIO: ambiente Construído e Patrimônio Sustentável Belo Horizonte, v.8, n.1. Jan / Jun. 2015 ISSN 1982-9531 http://www.forumpatrimonio.com.br/

Para ocupar estes espaços com uso residencial, contudo, é necessário haver, além da oferta, uma demanda por imóveis centrais para fins de moradia.

2.2 - Caracterização do Centro Histórico de Belém - CHB O CHB está localizado na extremidade sudoeste da área continental do Município, sendo delimitado pelos: rio Guamá, baía do Guajará; Avenida Assis de Vasconcelos; Rua Gama Abreu e Avenida Almirante Tamandaré (Figura 1).

Figura 1: Localização do Centro Histórico de Belém. Fonte: Banco de dados da Pesquisa MICH-Belém.

O CHB passou por todas as etapas pelas quais passaram os demais centros das cidades brasileiras. Nele, inicialmente, desenvolveu-se uma zona portuária com atividades atacadistas, que se expandiu devido ao crescimento do comércio varejista e de serviços especializados, atraindo pessoas em busca de empregos e residências para a área central. No final do século XIX, com a economia local aquecida pela produção da borracha exportada pelos cais de porto próximos da área central do comércio - obras públicas de infraestruturas foram realizadas. A criação de novas vias, de boulevards e a expansão da malha viária foram realizadas para receber o crescimento econômico e intenso da área, 8 FORUM PATRIMONIO: ambiente Construído e Patrimônio Sustentável Belo Horizonte, v.8, n.1. Jan / Jun. 2015 ISSN 1982-9531 http://www.forumpatrimonio.com.br/

aumentando o valor do solo urbano no centro e atraindo estabelecimentos e serviços mais sofisticados e especializados (Figura 2).

A

B

Figura 2: Centro Histórico de Belém A – Avenida 16 de Novembro. Fonte: PARÁ (1998, p. 86) B - Avenida João Alfredo. Fonte: PARÁ (1998, p. 116)

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Mesquita (2008) data no período do ciclo da borracha a introdução de consideráveis melhorias infraestruturais, tais como, a iluminação a gás, o calçamento das ruas com paralelepípedos de granito importado, a modernização do sistema de abastecimento de água além do incremento do sistema de comunicação com o telégrafo entre outros, tudo proporcionado por estreitas relações comerciais com os países europeus. Segundo COHAB (2009, p.56) o dinamismo econômico da economia gomífera se fez sentir também em termos de prédios públicos, com a construção da casa da Câmara e Cadeia, do Palácio de Governo, este último projetado pelo arquiteto Antônio José Landi, dentre outros prédios relevantes localizados no CHB. Com o crescimento e fluxo intenso de pessoas na área, os moradores de classe alta deixam seus sobrados e vão morar em palacetes em outras áreas da cidade, reduzindo sua frequência no centro comercial. Seguindo o deslocamento espacial das moradias das camadas mais abastadas, os donos dos estabelecimentos passam a localizar atividades nas áreas onde esta classe foi morar, iniciando o processo socioespacial de descentralização, instalando lojas distribuídas ao longo das avenidas Presidente Vargas, Padre Eutíquio, Nazaré e Braz de Aguiar. Posteriormente, com o crescimento da população para áreas mais periféricas da cidade, surgiram os subcentros de Icoaraci, Cidade Nova e Entroncamento. Uma das diferenças do CHB para centros de algumas cidades brasileiras é que a economia do centro comercial de Belém permaneceu sempre aquecida apesar da mudança do perfil de consumidor e do seu declínio físico. Em nenhum momento, ao longo de sua história, o CHB registrou a desocupação e deterioração de áreas expressivas, como existe em alguns centros brasileiros. O CHB conta um pouco a história da cidade. As construções das igrejas, do forte da cidade, dos mercados do Ver-o-Peso e de Carne, de fábricas - como a Palmeira, já demolida -, dos palácios dos governantes, dos sobrados com seus revestimentos em azulejos portugueses, etc. constituem o patrimônio histórico de Belém. A preocupação com a preservação deste patrimônio resultou no seu tombamento pelo Município (Lei Orgânica do Município de Belém de 30 de março de 1990 regulamentado pela Lei Municipal nº 7.709 de 18 de maio de 1994) e pela União (Portaria nº 54, de 8 de maio de 2012 do Ministério da Cultura) e na realização

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de diversas obras de requalificação arquitetônica e urbanística, mediante a inserção de atividades voltadas ao fomento do turismo e lazer. Apesar destes investimentos ainda persiste uma elevada taxa de ociosidade nos imóveis do CHB. Entretanto, diferentemente do que ocorre em vários centros históricos, levantamentos dos dados do Censo Demográfico do IBGE evidenciam que a população residente no CHB aumentou 7.5% no período 2000-2010 (de 10.067 para 10.817 habitantes). Além disso, o número de domicílios particulares permanentes incrementou bem mais no mesmo período (23.5%), passando de 2.630 para 3.249 unidades, sendo que os domicílios próprios elevaram-se em 249 unidades (de 1.680 para 1.929) e os alugados em 357 unidades (de 820 para 1.177). Estes dados revelam certo dinamismo do CHB, em especial do mercado imobiliário habitacional, sobretudo do mercado de aluguel. Antes de entender o que está motivando as pessoas a irem morar em imóveis alugados no CHB é preciso investigar qual o perfil socioeconômico dessas pessoas.

3. INQUILINOS DOS IMÓVEIS HABITACIONAIS DO CHB A Tabela 1, utilizando dados da Pesquisa MICH-Belém, apresenta uma síntese do perfil socioeconômico dos moradores de domicílios alugados localizados no CHB. Com base nela verifica-se que, embora a metade dos inquilinos seja natural de Belém (50%), é expressiva a presença de locatários procedentes de outros municípios paraenses (39.1%), sugerindo que o CHB é porta de entrada dos imigrantes interioranos à capital, e que a esta área representa importante espaço de articulação entre o continente urbano e as comunidades e populações que vivem em cidades e áreas rurais ribeirinhas da Amazônia.

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Tabela 1 - Características socioeconômicas dos inquilinos de imóveis habitacionais do CHB, 2013 CARACTERÍSTICAS

Naturalidade

Sexo

(3)

(2)

Estado civil

(2)

(3)

Instrução

Renda familiar (3) mensal

Relação de (3) trabalho

Participação em (2) grupo/associações

Belém Interior do Pará Outros Estados Outros países Feminino Masculino Solteiro Casado Vive com companheiro(a) Outro Alfabetizado Funcional Fundamental Médio Superior Pós graduação Menos de 1 SM 1 a 3 SM 3 a 6 SM 6 a 10 SM Mais de 10 SM Empregado com carteira assinada Empregado sem carteira assinada Servidor público Autônomo Aposentado Outro Sim Não

PARTICIPAÇÃO (%) 50.0 39.1 10.9 0.0 50.0 50.0 32.6 30.4 21.7 15.2 0.0 10.9 60.9 6.5 21.7 2.2 32.6 30.4 15.2 19.6 28.3 4.3 2.2 45.7 6.5 13.0 39.1 60.9

(1)

QUANTIDADE 427 334 93 0 427 427 279 260 186 130 0 93 520 56 186 19 279 260 130 167 241 37 19 390 56 111 334 520

Fonte: Banco de dados da Pesquisa MICH-Belém (1) Estimativa do número de domicílios pela expansão da amostra. (2) Valor-p > 0,1. (3) Valor-p ≤ 0,1.

A presença dos sexos feminino e masculino é equilibrada. Em relação ao estado civil, a despeito das diferenças nos percentuais registrados pela amostra, o valor-p maior do que 0,1 indica que não negada a hipótese nula de que os percentuais de participação das quatro categorias são semelhantes. No que concerne ao nível de instrução os locatários, na grande maioria (60.9%), têm nível de escolaridade média. Estes, associados aos 28.2% que possuem nível superior ou pós12 FORUM PATRIMONIO: ambiente Construído e Patrimônio Sustentável Belo Horizonte, v.8, n.1. Jan / Jun. 2015 ISSN 1982-9531 http://www.forumpatrimonio.com.br/

graduação, revelam que, no mercado de aluguel no CHB, as pessoas que estão demandando imóveis para moradia não são compostas pelas camadas mais pobres e menos qualificadas da população. Esta hipótese é reforçada pela constatação de que, em 68.1% dos domicílios alugados, há moradores que estudam, conforme indicado na Figura 2.

Figura 2: Domicílios do CHB com pessoas que estudam, 2013. Fonte: Banco de dados da Pesquisa MICH-Belém.

Quanto ao emprego e à renda dos responsáveis por domicílios alugados no CHB, verificouse, na pesquisa de campo, que apenas 34.8% dos locatários auferem renda mensal superior a seis salários mínimos e 45.7% trabalham como autônomos (Tabela 1). A despeito disso, cerca de 70% dos inquilinos dispõem, e utilizam mesmo que esporadicamente, carros (48.94%) ou motocicletas (21.28%) próprios nos seus deslocamentos (Figura 3).

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Figura 3: Meios de deslocamento usado pelos inquilinos do CHB, 2013. Fonte: Banco de dados da Pesquisa MICH-Belém.

Dos inquilinos habitacionais que caracterizaram seus domicílios a maioria mora em apartamentos (57.0%), e as unidades domiciliares descritas são compostas, normalmente, por: uma sala de estar/jantar (70.0%), uma cozinha (97.7%), um dormitório (63.0%), um banheiro (76.9%), uma área de serviços (77.4%), e não possuem garagem (87.5%). A densidade de ocupação domiciliar também é significativa, especialmente se se considera o modelo básico do imóvel alugado descrito anteriormente. Como mostra o gráfico da Figura 4, 44.8% dos domicílios são ocupados por quatro ou mais pessoas, havendo casos de mais de 8 pessoas residindo em um domicílio.

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Figura 4: Pessoas por domicílio alugado no CHB, 2013. Fonte: Banco de dados da Pesquisa MICH-Belém.

São fortes as relações dos inquilinos com os equipamentos e serviços disponíveis no CHB, conforme se pode notar ao se analisar os dados da Tabela 2, também obtidos no banco de dados da Pesquisa MICH-Belém: dos 705 inquilinos que declararam trabalhar, 52.6% exercem atividades no próprio CHB; 80.4% realizam compras cotidianas no CHB; 59.6% costumam usar seus tempos livres nos espaços públicos, equipamentos de lazer, culturais e religiosos localizados no próprio CHB. Além disso, 42.6% têm a maioria de seus familiares e 34% têm a maioria de seus amigos morando no CHB. O uso de equipamentos localizados fora do CHB para serviços de saúde (76.6% dos casos) e de educação (29.8% dos casos) não chega a se constituir em problemas visto que estes serviços, tanto de natureza pública como privada, são facilmente encontrados em bairros localizados no entorno imediato do CHB, como os bairros do Reduto, Nazaré, Batista Campos e Jurunas.

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Tabela 2 - Onde os inquilinos de imóveis habitacionais no CHB desenvolvem atividades, 2013. CARACTERÍSTICAS Na área Fora da área (3) Local de trabalho Não trabalha Não respondeu Na área Local onde realiza (3) compras diárias Fora da área Localização do hospital ou Na área posto de saúde que Fora da área (3) utiliza NS/NR Na área Localização da escola que Fora da área (3) filhos utilizam Não se aplica Não respondeu Na área Onde costuma ir no tempo Fora da área (3) livre Na área/Fora da área Na área Onde moram os (2) familiares Fora da área Na área Onde mora maioria de Fora da área (3) amigos Não respondeu

PARTICIPAÇÃO (%)

(1)

QUANTIDADE

42.6 38.3 17.0 2.1 80.4 19.6 19.1 76.6 4.3 21.3 29.8 44.7 4.3 55.3 40.4

371 334 149 19 687 167 167 669 37 186 260 390 37 483 353

4.3 42.6 57.4 34.0 63.8 2.1

37 371 502 297 557 19

Fonte: Banco de dados da Pesquisa MICH-Belém (1) Estimativa do número de domicílios pela expansão da amostra. (2) Valor-p > 0,1. (3) Valor-p ≤ 0,1.

O perfil dos moradores dos imóveis e das relações sociais e espaciais que se tornam possíveis estabelecer, no CHB, ajudam a compreender os fatores que estimulam estes inquilinos a escolherem esta área da cidade como local de moradia, como se verá a seguir.

4. MOTIVAÇÕES PARA MORAR NO CHB Para entender os motivos que fazem as pessoas escolherem locais para morar, Hermann e Haddad (2005, p.2) conceituam as amenidades urbanas como “um conjunto de características específicas de uma localidade com contribuição positiva ou negativa para a satisfação dos indivíduos”. Esclarecem que as amenidades não estão restritas a características naturais, como áreas verdes, praias, clima etc. Também estão incluídos na 16 FORUM PATRIMONIO: ambiente Construído e Patrimônio Sustentável Belo Horizonte, v.8, n.1. Jan / Jun. 2015 ISSN 1982-9531 http://www.forumpatrimonio.com.br/

definição os bens (ou males) gerados pelo próprio homem, tais como trânsito, poluição, oferta de entretenimento, segurança etc. Assim, para estes autores, as escolhas dos indivíduos dependem, além da preferência por um conjunto de bens materiais, de uma parcela de bens não-materiais que refletem a qualidade de vida dos centros urbanos. Entendendo amenidades urbanas como conjuntos de características específicas de uma localidade, os centros históricos das cidades brasileiras possuem características comuns de concentração de estabelecimentos de comércio, de serviços e de empregos. Como enfatiza Villaça (2001), os centros tradicionais de nossas metrópoles, apesar de suas notórias “decadências”, continuam sendo os focos irradiadores da organização espacial urbana. Onde há maior concentração de lojas, escritórios, serviços e empregos de nossas áreas metropolitanas, bem como a concentração de grande parcela do patrimônio histórico, artísticos e arquitetônico. Tais características podem ser um atrativo para a população desejar morar nos centros das cidades, pois as moradias nestas áreas têm uma grande vantagem locacional, em razão do pouco tempo despendido nos deslocamentos casatrabalho e da proximidade dos vários estabelecimentos de comércio, serviço e entretenimento. A ocorrência destas relações socioespaciais dos inquilinos com o ambiente do CHB ficaram claras nas análises feitas no item 2 deste artigo. Segundo pesquisa realizada por Venâncio (2003) com os moradores do tombado centro histórico de São Luis, o sentimento dominante sobre o centro é de que “aqui tem tudo que os bairros têm e os bairros ficam longe de tudo” (p.10). A condição central permite a apropriação do espaço da cidade por parte dos seus habitantes, já que “aqui é possível se dispensar o uso do automóvel” (p.10). O centro resgata uma atividade vital e básica do ser humano: o caminhar, o andar, e no caso de Belém, o próprio flanar. Os depoimentos dos moradores de São Luís, no texto citado, revelaram que o centro, é sim, um lugar de morar, há uma celebração de vida em comunidade. A permanência do lugar antigo permitiu a continuidade de modos tradicionais de morar. No entanto, para os moradores do centro de São Luís, o centro tradicional ser considerado área de conservação e preservação histórica não influenciou na sua permanência no lugar. Bandeira, Bomfim e Sales (2012, p.214), ao estudar o entorno do Pajeú, área central de Fortaleza, trabalham com os conceitos de afetividade e apropriação do espaço. Tais constructos elaborados pela Psicologia Social e Psicologia Ambiental, respectivamente, forneceram os elementos para compreensão dos processos de construção dos significados 17 FORUM PATRIMONIO: ambiente Construído e Patrimônio Sustentável Belo Horizonte, v.8, n.1. Jan / Jun. 2015 ISSN 1982-9531 http://www.forumpatrimonio.com.br/

que resultam da relação pessoa x ambiente. A pesquisa de Bandeira, Bomfim e Sales (2012) destacou que, morar no centro possibilita, além do acesso às atrações relativas ao consumo, a oportunidade de fruição de símbolos históricos e culturais que se mesclam à boa presença de parques e praças. Neste contexto, cabe questionar: Estes fatores foram considerados pelos inquilinos que escolheram morar no CHB. Que outros fatores, na visão dos inquilinos, estão sendo determinantes na decisão de morar no centro de Belém? Quais são os atrativos que o CHB oferece a essas pessoas na atualidade? Os principais motivos que levaram os inquilinos de imóveis residenciais a escolherem morar no CHB foram as proximidades: dos locais de emprego (citado por 44.68% dos entrevistados); das atividades de comércio e serviços (citado por 44.68% dos entrevistados); e das residências de parentes ou amigos (21.28%) (Figura 5). No caso dos motivos que motivaram a escolha do domicílio propriamente dito, a importância da proximidade de atividades de comércio e serviços cede lugar para fatores como o preço do aluguel, as características do espaço interno e outros (Figura 6).

Figura 5: Motivos para morar no CHB dos inquilinos de imóveis do CHB, 2013. Fonte: Banco de dados da Pesquisa MICH-Belém.

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Figura 6: Motivos dos inquilinos de imóveis do CHB para morar no domicílio, 2013. Fonte: Banco de dados da Pesquisa MICH-Belém.

A proximidade de estabelecimentos de comércio e serviços, onde se concentra a oferta de empregos além da oferta de bem e serviços, é o aspecto que, majoritariamente, foi apontado como o que mais valoriza os domicílios localizados no CHB. Além destes, em entrevistas, muitos inquilinos revelaram acreditar que os domicílios onde moram são valorizados por estarem localizados no centro histórico, que é uma área turística.

%

Figura 7: Fatores que valorizam morar no CHB segundo os inquilinos de imóveis do CHB, 2013. Fonte: Banco de dados da Pesquisa MICH-Belém. 19 FORUM PATRIMONIO: ambiente Construído e Patrimônio Sustentável Belo Horizonte, v.8, n.1. Jan / Jun. 2015 ISSN 1982-9531 http://www.forumpatrimonio.com.br/

Com a crise de mobilidade urbana é explicável que os tempos e custos de deslocamentos pesem na decisão dos moradores e na valorização dos imóveis "bem localizados", pois, como visto anteriormente: mais da metade dos inquilinos trabalha no próprio CHB; 80.4% realizam suas compras cotidianas na área central e 59.7% buscam lazer no interior do CHB (Tabela 2). Dentre os fatores indicados pelos inquilinos que desvalorizam os domicílios do CHB estão: a insegurança contra a violência urbana (furtos, assaltos, etc.); o estado de conservação dos imóveis; a falta de garagens e estacionamentos para abrigar seus veículos; etc. (Figura 6). As limitações impostas pelas legislações de preservação para fazer reformas e adaptações nos domicílios e a falta de conservação dos edifícios patrimônio histórico foram os outros motivos indicados nas entrevistas.

% Insegurança/ Domicílio Falta de Infraestrutura Localização Imóvel: Falta área violência mal garagem/ urbana do domicílio quente, de lazer conservado estacionamento precária ruim pequeno,andar baixo, mal dividido

Outros

Figura 8: Fatores que desvalorizam morar no CHB segundo os inquilinos de imóveis do CHB, 2013. Fonte: Banco de dados da Pesquisa MICH-Belém.

Nenhum desses fatores negativos, todavia, foram suficientemente fortes para afetar de maneira determinante o grau de satisfação dos locatários de domicílios no CHB e a esperança que têm de que os imóveis que habitam sejam valorizados no futuro. Como se pode verificar ao analisar os dados da Tabela 3: 68.1% dos inquilinos consideram muito bom ou bom morar nos imóveis alugados no CHB, percentual que se amplia para 95.8% se se considerar os que responderam regular; 68.1% acha que o domicílio que mora vai se valorizar no futuro; e, 78.7% não tem vontade alguma de mudar para outra área da cidade.

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Tabela 3 - Satisfação dos inquilinos com os imóveis alugados no CHB, 2013. CARACTERÍSTICAS

Grau de satisfação

(2)

Estado de conservação (2) atual

Perspectiva de valorização ou desvalorização dos (2) imóveis do CHB Vontade de mudar

(2)

PARTICIPAÇÃO (%)

Muito bom Bom Regular Ruim Muito ruim Muito boa Boa Regular Ruim Muito ruim Valoriza Desvaloriza Não sabe/Não respondeu Sim Não

23.4 44.7 27.7 4.3 0.0 10.6 44.7 34.0 8.5 2.1 68.1 17.0 14.9 21.3 78.7

(1)

QUANTIDADE 204 390 241 37 0 93 390 297 74 19 594 149 130 186 687

Fonte: Banco de dados da Pesquisa MICH-Belém (1) Estimativa do número de domicílios pela expansão da amostra. (2) Valor-p ≤ 0,1.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS Os dados de crescimento dos domicílios alugados para fins habitacionais revelam que existe motivações para morar no CHB, sendo possível pensar políticas públicas voltadas para a reconversão de imóveis vazios e/ou subutilizados para o uso habitacional, por via de financiamento para casa própria e aluguel social. Essa política, se bem estruturada, pode contemplar segmentos de renda média e baixa da população que trabalha e demanda os bens e serviços ofertados no CHB, visto que número expressivo de famílias nesta faixa já vem alugando e comprando imóveis na área investigada, além de minimizar a histórica problemática referente ao déficit habitacional em Belém. As vantagens decorrentes da centralidade da área são os fatores que mais motivaram as pessoas a escolher morar no CHB, mas há outros fatores que podem ser mobilizados para atração de novos moradores pelas políticas públicas e, por esta via, para a reversão do processo geral de degradação física do CHB. Sendo a proximidade de empregos um fator importante, o mercado composto por funcionários públicos pode ser explorado de modo

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mais contundente, assim como aquele integrado pelos parentes e amigos daqueles que já habitam o CHB. Em 2007 a Companhia de Habitação do Estado do Pará realizou um estudo com o objetivo de subsidiar sua atuação no provimento de moradias no CHB. A pesquisa concluiu que, até porque o CHB dispõe de boa capacidade de infraestrutura instalada, existe viabilidade de mercado para a implantação de uma política voltada à conversão de imóveis desocupados e subutilizados em unidades habitacionais, bem como, um número expressivo de famílias dispostas a adquirir imóveis na área investigada (COHAB, 2009). Outro estudo, realizado por Mercês, Tourinho e Lobo (2015) também identificou a existência de oferta e de demanda potencial para reconversão de imóveis vazios, desocupados e subutilizados no CHB, agora para o uso habitacional na modalidade de aluguel social. Por fim, os dados apresentados no presente artigo permitem inferir que, adensar o CHB com uso residencial, pensando o mercado de aluguel como uma forma de acesso a moradia, é uma possibilidade a ser considerada, especialmente se contemplar os segmentos de renda média e baixa da população que trabalha e demanda os bens e serviços ofertados no CHB. As vantagens da centralidade da área são os fatores que mais motivaram os inquilinos a escolher morar no CHB, podendo estas características, dentre outras apontadas, serem exploradas para atrair novos moradores e, por esta via, reverter o processo de degradação física do CHB.

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