MOS MAIORUM NO CONTEXTO DO PRINCIPADO AUGUSTANO EM HORACIO
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Lívia Maria da Silva MOS MAIORUM NO CONTEXTO DO PRINCIPADO AUGUSTANO: UMA ABORDAGEM ILUSTRADA PELAS ODES , DE HORÁCIO ( ODES III, 1; III, 2; III, 3; III, 6) João Pessoa, 05 de novembro de 2015.
Universidade Federal da Paraíba Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes Departamento de Letras Clássicas e Vernáculas Curso de Graduação em Letras Clássicas Componente Curricular: Literatura Latina III Professor: Erick France Aluna: Lívia Maria da Silva Matrícula: 11316272
Introdução ...……………………….………………………………………………………….4 Visão Panorâmica : a intertextualidade das odes ………...…………………………..……….5 Definição e reconhecimento : os principais valores constituintes do mos maiorum nas Odes , de Horácio……………………………………………………………………………………..7 Considerações Finais …...……………..…..………………………………………………...13 Referências Bibliográficas …………………..……………………………………………...14
Introdução No contexto de expansão militar e em meio a guerra civis, após o assassinato do cônsul republicano Júlio César, em 44 a.C., o clima em Roma era de instabilidade e de inseguranças. A partir disso, Caio Júlio César Otaviano, legitimado por meio do testamento de Júlio César como seu filho e sucessor, vê a necessidade de assumir o poder e de empreender uma reestruturação cívica e moral. Para essa reestruturação, Otaviano busca resgatar o conjunto de valores morais e cívicos de caráter consuetudinário, que se sintetizam na expressão mos maiorum (costume dos maiores). Nesta expressão, o que traduzimos literalmente como “maiores” referese aos “mais velhos”, aos ancestrais romanos, simbolizando a reivindicação pela identidade romana através do reestabelecimento (e da manutenção) das condutas tradicionais romanas, que ficaram “esquecidas” nesses ancestrais. Como instrumentos de auxílio no resgate desses valores, Otaviano utilizase do direito, da arquitetura e da literatura. No presente trabalho, analiso como isso se dá através da literatura, mais especificamente, nas Odes (III, 1; III, 2; III, 3; III, 6), de Horácio. Para isso, apresento, primeiro, um panorama dessas Odes em conjunto, com o intuito de contextualizar o leitor, e fazêlo perceber a ligação existente entre as odes , marcando a continuidade do tema. Em seguida, detalho as características das principais condutas constituintes do mos maiorum , situandoas nas Odes1 . Tendo em vista que cada elemento tem características e/ou relações próximas com outros elementos, tornase inviável fazer uma definição deles de forma totalmente isolada. Assim, para facilitar a compreensão do conjunto como um todo sem sacrificar a definição individual de cada elemento, faço a análise sob a seguinte perspectiva: a base do mos maiorum (no contexto do século I a. C.) é o tripé virtus, pietas e fides , pois constitui a essência da identidade romana; os demais valores são subordinados a essa base por serem ou consequência da execução desses valores basilares, ou parte que os compõe. 1
Para isso, utilizei as traduções do professor Erick France UFPB.
Visão Panorâmica: A Intertextualidade das odes Iniciada de forma solene, com uma atmosfera moralizante, a primeira das odes, apresenta faz uma apresentação geral do contexto de decadência moral, elaborando críticas àqueles corruptos de caráter, e incentivando o público alvo (a massa popular romana do século I a. C.) a reconhecer suas falhas de caráter e buscar resgatar os valores morais e cívicos tradicionais. Nesta, o eu se posiciona como consagrador das Musas (v. 2), o que lhe confere autoridade no proferir de seu discurso. Além disso, ilustra as consequências advindas da falta da prática das condutas ancestrais, respaldandose, por um lado, no poder soberano de Zeus capaz de fazer tudo remexer com apenas um franzido (v. 8) ; por outro, na noção de igualdade imposta pela figura de Necessitas da qual não se pode escapar. Em seguida, após reconhecer a existência de desigualdades sociais, o eu apresenta críticas contra tudo aquilo que é excessivo, em contraposição ao sentido de comedimento da virtus moral; ao passo que, incentiva a prática das condutas frugalitas e paupertas, através da promessa do “sono tranquilo”, como também de indagações que sugerem a inutilidade de se desejar excessivas riquezas materiais. É esse tom filosófico de questionamento do final da primeira ode que introduz a seguinte, em que o eu dá continuidade ao incentivo às mesmas condutas de comedimento, ao iniciar seu discurso desejando que a juventude pudesse aprender a experienciar de contento a frugalidade (v. 23). A frugalidade , aqui ilustrada sob a ótica guerreira, é indispensável para se alcançar a virtus, valor que perpassa esta ode, incentivando o comprometimento em defender a pátria tanto na esfera militar, quanto nas esferas moral e patriótica2 , a ponto de destacar como é gratificante e decoroso morrer pela pátria (v. 13). Enquanto a primeira ode foca em apresentar as consequências negativas do afastamento da tradição, esta segunda foca, no geral, em apresentar as consequências de ser detentor da virtus . No entanto, mesmo com essa diferença de estratégia de persuasão do eu de cada ode , podemos perceber mais um ponto que marca a continuidade do tema entre as odes, se observarmos que a volubilidade popular ( Ode II, v. 20) , contrastada à virtus, reitera o sentimento de abominação e rechaçamento do vulgo profano ( Ode I, v. 1). Tendo sido incentivado, através da segunda ode , o cumprimento do dever para com a pátria, a terceira ode objetiva reforçar o caráter romano, chamando atenção para a característica inabalável adquirida por aqueles que são justos e firmes em seu propósito (v. 1), ilustrandoos a partir de ilustres personagens da tradição (Pólux, Hércules, Augusto, os tigres de Baco e Quirino). É inserido, em seguida, o discurso da deusa Juno, na ocasião de boasvindas a Quirino ao conselho dos deuses, discurso este que aponta para ações que, por se afastarem das condutas tradicionais, desencadearam consequências desastrosas, como, por exemplo, a 2
Em relação à defesa da pátria a partir das esferas moral e patriótica, refirome ao não deixarse contaminar por valores morais estrangeiros que contrariam a tradição romana e contribuem para a perda da identidade cultural.
destruição de Tróia a partir do adultério e da quebra com a fides . Na ocasião, o discurso respalda o poeta em relação ao poder de persuasão, considerando o seguinte: o discurso tem sua autoridade garantida, por ser proferido por uma divindade; a divindade que profere o discurso representa, também, o casamento (instituição basilar da formação familiar) o que já anuncia o conteúdo da ode seguinte, em que o apelo à restauração da família romana é desenvolvido mais detalhadamente. Assim, o discurso de Juno finalizase com a promessa de êxito e glória para Roma, observado o caráter indispensável do comedimento; sendo a fuga dos excessos condição imposta para que a promessa viesse a se concretizar. Finalmente, na quarta ode desta sequência ( Ode III, 6), são reunidos vários aspectos, como uma forma de apelo generalizado à revitalização da identidade romana, nas esferas religiosa, política e social: a responsabilidade da geração atual em reparar os delitos dos antigos (v. 1), através do resgate e da manutenção dos tradicionais ritos e cultos sagrados; o reconhecimento da submissão do homem em relação às divindades (v. 5); a decadência bélica romana proveniente do distanciamento da tradição (v. 916); a decadência da civilização como reflexo da desvalorização das instituições basilares da esfera familiar (v. 1732); a valorização da virilidade ancestral como forma de criticar a ausência de ímpeto guerreiro e patriótico da geração atual (v. 3344); e apresentação do efeito gradativo da desvalorização do mos maiorum, através das gerações (v. 4548)
Definição e reconhecimento: os principais valores constituintes do mos maiorum nas Odes , de Horácio (Horácio, Odes, III, 1; III, 2; III, 3; III, 6) Conforme anuncio na introdução, realizarei paralelamente as atividades de definir os valores e de destacálos nas Odes para analisar mos maiorum, partindo do tripé constituinte da essência da identidade romana: virtus, pietas e fides . No entanto, considerando que esses valores tem um princípio religioso muito forte, antes de iniciar a análise propriamente dita, chamo atenção para algo de extrema importância para a compreensão da definição dos valores: “O centro da religião romana, de acordo com Rives, consiste em ritual, não em crença; O que as pessoas faziam é que era realmente importante, não o que elas pensavam” (LEMOS, 2010, p. 49). Assim, à essa característica ritualística da religião romana relaciono a concepção aristotélica, presente no livro II da Ética a Nicômaco , no que diz respeito à conquista de virtudes: “É acertado pois, dizer que pela prática de atos justos se gera o homem justo, e pela prática de atos temperantes, o homem temperante; sem essa prática, ninguém teria sequer a possibilidade de tornarse bom ”. (Aristóteles, 4, 713 grifo meu) De modo que a palavra prática diz respeito tanto à execução da ação, quanto à execução constante da ação, sendo necessário, portanto, ter em mente o caráter consuetudinário da realização dessas ações que levam à virtude, considerando que “a virtude moral é adquirida em resultado do hábito ”. (Aristóteles, 1, 1819 grifo meu) Tendo sido feitas essas observações, volto à definição dos valores basilares do mos maiorum. Assim, virtus é o valor que está relacionado à força física, que engloba as características inatas do indivíduo concernentes, a princípio, à excelência guerreira. No entanto, a virtus tem seu sentido acrescido, posteriormente, pelas noções de comedimento e comprometimento para com a pátria, conforme observa SILVA (2015, p. 68), em nota de rodapé, ao analisar a virtus do princeps : “Com Apolo3, Otaviano firmava seu comprometimento com as tradições ancestrais pela aplicação da disciplina , moral cívica e moderação ” (Grifo meu). Com isso em vista, observemos os seguintes versos em que, num tom erudito remetendo a um acontecimento histórico, o poeta apresenta a perturbação advinda das instabilidades de uma vida que suscite inveja, como consequência para aqueles que almejam em excesso: Com Apolo : referese ao momento em que Otaviano associase ao deus Apolo e construi templos sagrados, com o intuito de mostrar como a preocupação que Otaviano dispensou para a pátria, ao buscar resgatar a identidade romana, através da aproximação pública de ritos sagrados, influencia na construção de sua virtus . 3
Àquele sobre cuja cabeça ímpia pende uma espada desembainhada os festins dos Sículos não produzirão um sabor agradável, o canto das aves e da cítara não lhe recobrarão o sono ( Ode III, 1 , 1720)
O teor de descomedimento nestes versos é proveniente da referência à anedota moral de Dâmocles4 e, ao meu ver, sugere a impossibilidade de existir virtus moral sem disciplina5 e comedimento. Já nos versos seguintes, a virtus , apesar de também poder ser metaforicamente interpretada como a virtus de disciplina, está relacionada à noção de exercício militar dos jovens, advinda do sentido principal do termo, de força física. Vejamos: é gratificante e decoroso morrer pela pátria: e mais, a morte persegue o homem dado à fuga e não poupa dos membros e das costas medrosas da juventude imbele. ( Ode III, 2 , 1316) A intenção é, aqui, conscientizar o cidadão da importância de defender a pátria por meio do serviço militar, ressaltando a virtus ao destacar a gratidão e o decoro como consequência do patriotismo e da cidadania. Outro momento em que o poeta ressalta a virtus em seu sentido principal é representado a partir dos seguintes versos: A juventude que não nasceu desse parentesco impregnou o mar de sangue dos púnicos, abateu Pirro, o monstruoso Antíoco e o terrível Aníbal ( Ode III, 6 , 3336) Sendo a intenção, portanto, incitar a massa romana a resgatar o ímpeto viril para alcançar a virtus . A estratégia de persuasão destes versos consiste em estabelecer uma comparação crítica entre a as gerações anterior e atual, tomando a geração anterior como detentora de virtude por ter agido com bravura frente a inimigos terríveis, em oposição à geração atual Isso posto e sempre tendo em vista que só é possível alcançar esses valores por meio da prática de ações, passemos a analisar a pietas , qualidade daquele que é capaz de externar 4
Faz referência à história de Dâmocles, cortesão na corte do tirano de Siracusa, que desejando em excesso e invejando a potestas e a auctorictas do tirano, concorda em trocar de lugar com este, por um dia. Ao ser feita a troca, o tirano determina que seja pendurada, por crina de cavalo, espada afiada sobre a cabeça de Dâmocles, com o intuito de mostrar para o cortesão a instabilidade de uma vida que suscita inveja. 5 Disciplina : Neste contexto, refirome à busca por refrear os próprios instintos de desejar excessivamente.
seu comprometimento para com as divindades, por meio da prática de rituais de respeito e veneração, reconhecendo, a partir da sua condição mortal, a subordinação do homem às divindades. Por extensão, representa também o comprometimento para com a pátria e a família. Os versos iniciais da ode III, 6 exemplificam de forma clara a prática da fides , ao ser direcionada a atenção para o cuidado em reparar a relação com os deuses, externado na ação do reparo concreto dos templos: Os delitos dos antigos pagarás, Romano, mesmo que inocente, até que ajeites os combalidos templos e oratórios dos deuses e as imagens conspurcadas por fumaça negra ( Ode III, 6, 14) E, em seguida, o conceito de fides é resumido a um verso, com a promessa de reinar aquele que for capaz de reconhecer seu lugar perante os deuses: Reinas6 conforme te portas menor do que os deuses ( Ode III, 6, 5) Outro exemplo desta instituição apresentase temos os versos seguintes, ocasião em que o eu , tido como consagrador das Musas7 , lembra o interlocutor da subordinação humana perante os deuses, ilustrada pelo poder da ilustre figura de Júpiter sobre os reis e, consequentemente sobre as massas. Vem de Júpiter o poder dos reis formidáveis sobre as massas confiadas, sobre os próprios reis, após o ilustre triunfo sobre os Gigantes, e que tudo remexe, bastando um franzido. ( Ode III, 1 , 58) Com isso, o eu busca conscientizar o interlocutor a importância do respeito e da devoção aos deuses, mostrando que, até mesmo os reis formidáveis que dominam as massas, devem respeito às divindades, fontes de seu poder, ficando nítida, portanto, a ideia de que, se essa subordinação recai sobre os líderes, necessariamente também recai sobre as massas. Encerrando a análise do tripé estabelecido como base do mos maiorum , analisemos a fides , que representa a confiança na palavra empenhada, como “meio de assegurar os tratados firmados entre os homens, consolidar as relações entre os indivíduos” (RIBEIRO, 2012, p. 149). Vale observar, portanto, que a fides requer a prática de duas ações simultaneamente: mostrarse confiável por meio de seus atos; e confiar na palavra empenhada por outro8. O verbo latino equivalente, imperas, apresenta forte teor cívico e religioso. Ode III, 1 , 2. 8 Exemplifico a aquisição da fides por também confiar na palavra empenhada, por meio dos versos 587667, do Livro III, da Eneida episódio em que Eneias (apesar de a raça troiana já ter sido enganada por um grego, no episódio do cavalo de madeira) atesta seu caráter piedoso ao ser clemente e confiar na palava empenhada por Aquemênides, suplicante grego abandonado na Sicília. 6 7
Não diferentemente dos outros valores, a fides assume características particulares de acordo com o contexto que está inserida. Assim, apresento três momentos em que se pode detectar referência à fides , nas Odes: 1. Nos versos seguintes a fides está implícita na relação de oposição aos caprichos da volubilidade popular: A Vitrude que desconhece a derrota ignominiosa fulgura pelas honras intocadas, e nem soergue ou depõe as achas sob capricho da volubilidade popular ( Ode III, 2 , 1720) Ao criticar essa ausência de constantia9 no caráter do povo romano, o poeta insere o apelo ao compromisso em assegurar os tratados sociais de conduta moral. 2. Um pouco mais adiante, também na ode III, 2, temos mais um apelo à fides , no que diz respeito à discrição dos rituais sagrados, ao se garantir uma recompensa pelo silêncio fiel, bem como ao apresentar a consequência da quebra dessa fides representada pelo silêncio: Ainda há uma recompensa garantida pelo silêncio fiel: vetarei àquele que divulgar o ritual da mística Ceres que fique comigo sob o mesmo teto ou desamarre comigo o frágil barco ( Ode III, 2 , 2529) 3. A menção à quebra do pacto estabelecido com os deuses, por Laomedonte, além de chamar a atenção para as consequências10 desastrosas advindas do distanciamento do mos maiorum, faz com que, nestes versos, o apelo à fides seja proferido pela deusa Juno, marcando o caráter essencial dessa instituição para a revitalização da moral romana do século I a.C.: “O Juiz desastroso e incestuoso e a mulher estrangeira reviram Ílion, Ílion! em pó, que foi condenada desde que Laomedonte defraudou os deuses, mesmo com pagamento concordado , minha e da casta Minerva com o povo e o líder fraudulento ( Ode III, 3, 1724 grifos meus) 9
O conceito será definido a seguir. A consequência em questão é a condenação de Ílion à destruição, pelas divindades.
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Além disso, é importante, também, observar que a menção à mulher estrangeira faz referência a prática do adultério cometido por Helena, ilustrando a quebra da fides no casamento, resultando na mesma consequência desastrosa mencionada. Concluída a análise dos três valores basilares do mos maiorum , passo a analisar os demais valores, começando pela constantia, instituição que representa justamente o caráter de permanência da prática dos atos de caráter e que perpassa os demais valores constituintes do conjunto, à qual podemos relacionar a ideia aristotélica de prática , mencionada no início da construção dessa análise. Dessa forma, ilustro a constantia a partir dos seguintes versos, considerando o destaque dado pelo poeta a uma reparação necessária, proveniente da ausência desta instituição: Quanto não se diminuiu este tempo que requer reparação? A geração de nossos pais, inferior a dos avós, nos gerou ainda piores, os quais querendo, em breve, dar prole mais rebaixada… ( Ode III, 6 , 4548) Já a gloria , proveniente da virtus , é reconhecimento público das qualidades do cidadão detentor de outros valores constituintes do mos maiorum , por exemplo: em é gratificante e decoroso morrer pela pátria ( Ode III, 2, 13), a gloria é adquirida a partir da prática da virtude guerreira; já em Reinas conforme te portas menor do que os deuses ( Ode III, 6 , 5), a gloria prometida só pode ser alcançada pelo cumprimento da pietas . Honor é o atributo do cidadão diante da coletividade, representando o mérito que este tem em ser parte constituinte do estado e de determinada família, que também pode ser exemplificado pelo verso 5 da ode III, 6. Os valores frugalitas e paupertas estão intimamente relacionados, sendo o primeiro relativo à qualidade de viver sem ostentações ou luxos e, o segundo, relativo à qualidade de poder conformarse com o necessário, levando uma vida modesta. Podem ser reconhecidos nos versos, pelo desejo expresso do eu de que o cidadão romano experienciasse estas qualidades: Possa o menino fortalecido pelo serviço militar enérgico aprender a experienciar de contento a frugalidade e abalar os ferozes Partos em sendo cavaleiro de amedrontar pela lança e leve uma vida ao ar livre e em meio a ações intrépidas. ( Ode III, 2, 16) Outro trecho que ilustra essas instituições é:
sono tranquilo não é negado às casas humildes de homens do campo ou a margem de rio sombreada, ou ao vale do Tempe, batida pelos Zéfiros11 Àquele que deseja o que basta nem 25 preocupa o mar alvorotado nem a violenta investida do ocaso 11 11 de Arcturus ou do nascer de Capricórnio , nem os vinhedos fustigados pelo granizo nem o solo traiçoeiro, ora as árvores culpando as chuvas, ora os astros que ressequem os campos , ora intempéries irregulares . ( Ode III, 1, 2132 grifos meus) Nele é prometida a recompensa da tranquilidade àquele que se contenta com a vida modesta, além da conquista de uma característica inabalável, (seja pelas dificuldades representadas pelo mar , seja pela passagem do tempo, seja pelo reflexo, na agricultura, da mudança de tempo. Nesse reflexo das intempéries irregulares no campo, podemos reconhecer a presença do labor, instituição relativa ao valor ético do trabalho, simbolizando o meio pelo qual o cidadão adquire dignidade e reconhecimento comum, ao promover seu próprio sustento A potestas é a instituição que diz da execução do poder, podendo ser relacionada aos lideres políticos, ou, mesmo, aos deuses. Assim, observemos: “oh, não! não vá o prometido inexperiente nas fileiras provocar o leão áspero ao toque, o qual fúria sanguinária arrebata por entre o foco da devastação” ( Ode III, 2, 812 grifo meu) Neste trecho, no contexto do incentivo ao serviço militar, o termo leão é utilizado para ilustrar de um lado, o ideal de soldado romano, irrefreável, que não pode ser derrotado; por outro, Roma, cidade detentora do poder , que serve de exemplo para as demais. Já em relação à potestas associada a uma divindade, destaco os seguintes versos, em que podemos observar o caráter impositor da qualidade de potestas, exercida pela Virtude : Em relação a Zéfiros, Arcutus e Capricórnio , pode se estabelecer uma relação de mudança de estações, simbolizando a contantia dos valores frugalitas e paupertas , através do tempo 11
A Virtude que destranca o céu aos que não mereciam morrer , se lhe negada passagem, toma seu caminho e impinge os pés na massa do vulgo e o no chão molhado, em fugindo com asa. ( Ode III, 2, 2124 grifos meus) Considerações finais Considerando a perspectiva temporal estabelecida por SILVA (2015), em sua Tese de Mestrado, relativa à união do passado, do presente e do futuro, podemos observar que toda a ação de Otaviano em voltar o olhar para costumes ancestrais (passado), buscando reestabelecêlos (no presente), além de ser constituinte de sua própria virtus e essencial para a aquisição do título de princeps, é repercutida no futuro, dada tamanha importância, por meio da história, da arquitetura e da literatura. Evidentemente, essa constituição da virtus própria também se estendese ao poeta Horácio que, através de suas Odes , pratica sua civilidade, atribuindo à sua obra um caráter educacional e formador.
Referências Bibliográficas LEMOS, Márcia Santos. 2010. O ‘mos maiorum’ e a fortuna do Império Romano no século IV d.C. Dimensões 25: 4662 LEMOS, Márcia Santos. 2013. A elite senatorial, o mos maiorum e a fortuna no Império Romano nas crônicas do século IV d.C. Anais Eletrônicos VI Encontro Estadual de História ANPUH/BA: 110 RIBEIRO, Prisciane Pinto Fabrício. 2012. Elementos cívicos da sociedade romana: o mos maiorum na lírica de Horácio. Anais do I Encontro de Estudos Clássicos da Bahia 1: 146156 ROCHA PEREIRA, Maria Helena. Ideias morais e políticas dos romanos. In: Estudos de História da Cultura Clássica. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1989 SILVA, S. B. Augusto e a ressignificação das virtudes cívicas. In: Usos do passado em Tito Lívio: a construção de uma memória romana à época de Augusto (século I a. C.). 2015. 158 f. Dissertação (Mestrado em História) Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2015 SOUZA, Daniel Aparecido de. 2006. Práticas políticas e o mos maiorum no principado romano: uma leitura de Plínio, O Jovem. Anais do XVIII Encontro Regional de História O historiador e seu tempo ANPUH/SP UNESP/Assis, 24 a 28 de julho de 2006. Cdrom. ARISTÓTELES, Ética a Nicômaco (Livro II) . Tradução de Leonel Vallandro e Gerd Bornheim, a partir da versão inglesa de Sir William David Ross. Abril S.A. Cutural: São Paulo, 1984
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