Movimentos Terroristas como Ameaça à Segurança e Estabilidade Política dos Estados Africanos Casos do Boko Haram e do Al-Shabaab

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Rufino Sitoe Movimentos Terroristas como Ameaça à Segurança e Estabilidade Política dos Estados Africanos: Casos do Boko Haram e do Al-Shabaab

2014

INTRODUÇÃO

i.

Tema

Movimentos Terroristas como Ameaça à Segurança e Estabilidade Política dos Estados Africanos: Casos do Boko Haram e do Al-Shabaab.

ii.

Delimitação Espácio-temporal

Esta pesquisa tem como horizonte espacial o continente Africano, particularmente a Nigéria e a Somália. Isto justifica-se pelo facto do Boko Haram e do Al-Shabaab terem sido formados nestes Estados, mas também justifica-se pelo facto da Nigéria e da Somália constituírem o espaço geográfico onde as acções terroristas do Boko Haram e do Al-Shabaab se encontram concentradas. Por seu turno, África é importante por constituir o espaço regional onde a ameaça terrorista se encontra presente.

Quanto ao horizonte temporal, a pesquisa tem como limite inferior os princípios do ano 2000 e como limite superior o ano de 2014. Os princípios do ano 2000 são importantes por ter sido o período em que os movimentos terroristas em estudo foram formados. No caso do Boko Haram, Cook (2011: 9) afirma que foi formado em 2002, enquanto que o Al-Shabaab, Ploch (2010: 6) afirma que foi criado nos anos 2003-2004. E o ano de 2014 constitui o limite superior desta pesquisa pelo facto de ser um ano em que observa-se uma tendência de intensificação das acções terroristas do Boko Haram e do Al-Shabaab. Em que por um lado, o Boko Haram aumenta a frequência de ataques contra cidadãos e entidades governamentais, como pôde ser visto com os ataques contra milícias governamentais e civis no Nordeste da Nigéria1, por outro lado, o AlShabaab leva a cabo um ataque contra o palácio presidencial2.

iii.

Contexto

O estrear do novo milénio foi marcado por um fenómeno não novo, mas que conseguiu atrair as atenções globais para si, o terrorismo. Sobretudo com os ataques terroristas do 11 de Setembro 1

http://opais.sapo.mz/index.php/internacional/56-internacional/26926-dois-ataques-atribuidos-ao-boko-haram fizeram-24-mortos-.html consultado no dia 5 de Outubro de 2013 pelas 14h03min. 22 http://www.france24.com/en/category/tags-thematiques/al-shabaab/ consultado no dia 4 de Março de 2014 pelas 11h02 min.

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de 2001 perpetrados pela Al-Qaeda contra o World Trade Center e o Pentágono nos Estados Unidos da América (EUA), o que resultou numa declaração de luta global contra o terrorismo e todas nações que apoiam movimentos terroristas (Watson, 2009: 1).

Em África, pode-se constatar que os movimentos terroristas que surgiram no novo milénio constituem uma ameaça à segurança e à estabilidade política dos Estados Africanos. Este facto pode ser observado com a intensificação das acções de movimentos terroristas como o Boko Haram e o Al-Shabaab. No caso do Boko Haram, a intensificação verifica-se através dos ataques terroristas que leva a cabo contra forças de segurança, população civil e entidades internacionais na Nigéria, constituindo, deste modo, uma ameaça à segurança e à estabilidade política daquele Estado (Pham, 2012: 4). E, no caso do Al-Shabaab, ataques constantes são levados a cabo contra entidades estatais e internacionais na Somália e, por vezes, além fronteiras, como se verificou com o ataque efectuado pelo Al-Shabaab ao Westgate Mall, em Nairobi, capital Queniana, o que cria um ambiente de pânico e permanente alerta em relação as suas actividades no nível doméstico e regional (Blanchard, 2013: 2 e 3).

iv.

Justificativa do Tema

Este tema mostrou-se pertinente pelo valor académico que o estudo do terrorismo tem para África, pois o terrorismo é uma questão recente nos estudos de segurança na realidade africana. Mas também pela preocupação que o terrorismo constitui aos Estados e às Organizações Regionais africanas. Aos Estados, através dos receios de secessão, como tem estado patente no discurso do Boko Haram na Nigéria, no qual fala-se da pretensão de formar um Estado islâmico no território Nigeriano, o que ameaça a integridade territorial da Nigéria (Cook, 2011: 6). E no caso da Somália, através dos atentados constantes contra forças governamentais e órgãos de soberania, acabando por minar as tentativas de reerguer um Estado na Somália (Ploch, 2010: 8).

O terrorismo é igualmente preocupação para as Organizações Regionais se tivermos em conta a agenda da Comunidade Económica para o Desenvolvimento da África Ocidental (CEDEAO), que tem na sua lista de prioridades o combate ao terrorismo e aos movimentos terroristas na região (Bolaji 2010: 209). Igualmente, encontramos situação similar na África Oriental, onde

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uma iniciativa regional3 foi criada pelos EUA tendo em vista fortalecer as capacidades de combate ao terrorismo no Djibouti, na Eritreia, no Quénia, na Tanzânia e no Uganda (Ploch, 2010: 2).

v.

Problematização

As preocupações em relação aos movimentos terroristas em África têm sido na maior parte das vezes vistas sob espectro de ameaça aos Estados Ocidentais, sobretudo, olhando para os grandes investimentos que estes têm no continente. Estes dados são trazidos por autores como Soria (2012: 2), nos quais fica claro que há um grande receio que os movimentos terroristas Africanos dêem apoio à Al-Qaeda e a África constitua um espaço ideal de reagrupamento da Al-Qaeda, o que pode ameaçar os interesses do Reino Unido no continente. Igualmente, Ploch (2010: 2) clarifica que tanto a Al-Qaeda, como o Al-Shabaab, constituem uma ameaça aos EUA e aos seus interesses na região, daí as preocupações em conter estes movimentos através de iniciativas regionais e bilaterais de segurança com os Estados Africanos.

As preocupações destes Estados são acrescidas pela relação geográfica, cultural, étnica e até económica muito forte entre a África e o Médio Oriente, pois vê-se a África Oriental e do Norte como pontos de entrada e saída de pessoas, armas e mercadorias para o Médio Oriente, assim como, olha-se para as percentagens de população islâmica existente nestas regiões africanas como alvos fáceis de influência pelos movimentos radicais islâmicos existentes no Médio Oriente (Harbeson, 2007: 19-24). Com isto, acaba se ignorando as implicações que os movimentos terroristas africanos podem ter na segurança e na estabilidade política dos Estados Africanos, o que nos leva a questionar até que ponto a existência de movimentos terroristas em África constitui uma ameaça à segurança e à estabilidade política dos Estados Africanos?

vi.

Questões de pesquisa

 Como surge e evolui o terrorismo ao nível Global e da África?  De que forma o Boko Haram e o Al-Shabaab constituem ameaça à Segurança e Estabilidade Política da Nigéria e da Somália?

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The East Africa Regional Strategic Initiative (EARSI)

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 Quais são as implicações das acções do Boko Haram e do Al-Shabaab para a Segurança e Estabilidade Política da Nigéria e da Somália?

vii.

Objectivos

Gerais  Perceber o surgimento e a evolução do terrorismo ao nível Global e da África;  Compreender a ameaça que os movimentos terroristas representam para a Segurança e Estabilidade Política dos Estados Africanos;

Específicos  Estudar a origem e a evolução do terrorismo nos níveis Global e da África;  Estudar o Boko Haram e o Al-Shabaab como ameaças terroristas à Nigéria e à Somália;  Analisar as acções terroristas do Boko Haram e do Al-Shabaab;  Discutir as implicações das acções terroristas do Boko Haram e do Al-Shabaab para a segurança e estabilidade política da Nigéria e da Somália;

viii.

Hipóteses

 O terrorismo surge e evolui ao nível global e da África como forma de reivindicação política;  O Boko Haram e o Al-Shabaab ameaçam os seus Estados através das suas acções terroristas;  As acções terroristas do Boko Haram e do Al-Shabaab implicam a fragilização sócioeconómica e política da Nigéria e da Somália.

ix.

Metodologia do Trabalho

Para o desenvolvimento desta pesquisa, será feito recurso aos métodos comparativo, histórico, hipotético-dedutivo, monográfico e às técnicas bibliográfica e de entrevista. No que diz respeito ao Método Comparativo, este procede pela investigação de indivíduos, classes, fenómenos ou factos, com vista a ressaltar diferenças e similaridades entre eles, o que possibilita o estudo comparativo de grandes agrupamentos sociais, separados pelo espaço e pelo tempo (Gil, 2008:16

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e 17). Este método é usado para comparar os movimentos terroristas Boko Haram e Al-Shabaab a fim de ressaltar algumas diferenças e semelhanças entre os mesmos.

No que refere ao Método Histórico, Vieira (2010: 34) diz que é o que “consiste em investigar as causas históricas que conduziram a uma realidade presente, procurando entender como as instituições do passado moldaram a realidade, em cada estágio da história”. Com este método procurar-se-á trazer o historial do terrorismo até o continente e, em particular, a história do Boko Haram e do Al-Shabaab, como forma de perceber a realidade actual destes movimentos e traçar perspectivas sobre os mesmos.

Com relação ao Método Hipotético-dedutivo, pode-se perceber este método como o que “costumeiramente utilizamos em nossos trabalhos de conclusão de curso. Os passos Básicos do modelo hipotético-dedutivo de Popper incluem a formulação de um problema de pesquisa, a confecção de uma hipótese (possível solução para esse problema) e o teste de verificação da hipótese, que termina por sua comprovação (chamada por Popper de verificação) ou negação (falsificação) ” (Vieira, 2010: 33). Na lógica deste método, foram formuladas hipóteses que durante o trabalho serão testadas de modo a verificar a sua validade.

O Método Monográfico é para Gil (2008: 35), o método que parte do princípio de que “o estudo de um caso em profundidade pode ser representativo de muitos outros ou mesmo de todos os casos semelhantes. Estes casos podem ser indivíduos, instituições, grupos, comunidades, etc.” Este método é representativo desta pesquisa, pois trata de dois casos de estudo, o Boko Haram e o Al-Shabaab, como forma de tirar juízos sobre os outros casos possíveis em África.

A Técnica Bibliográfica Fonseca (2009: 21) diz que “é a base de todo trabalho científico, pois abrange toda a bibliografia já tornada pública em relação ao tema em estudo, desde publicações avulsas, boletins, jornais, revistas, livros, pesquisas, monografias, teses, material cartográfico, etc., …não é mera repetição do que já foi dito ou escrito sobre determinado assunto, mas propicia o exame de um tema sob novo enfoque ou abordagem, chegando a conclusões inovadoras”. Esta técnica será a base do trabalho, pois o material que será usado para a pesquisa será encontrado no

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que já foi escrito e publicado, física ou virtualmente, podendo isto ser visto nas citações e na bibliografia do trabalho.

A técnica de entrevista é, para Gil (2008: 119-120), a técnica em que o investigador coloca-se em frente ao entrevistado e lhe formula perguntas, com o objectivo de obtenção dos dados que lhe interessam a sua investigação. Gil adiciona que é uma técnica de grande vantagem na obtenção dos dados, se comparada a um formulário, pois ela não exige, por exemplo, que o entrevistado saiba ler ou escrever. Contudo, é uma técnica que também traz suas desvantagens, pois é susceptível de ser influenciada pela disposição do entrevistado, é susceptível de ser preenchida por respostas falsas, pode sofrer influência do entrevistador, etc. Para este trabalho, será feito recurso a uma entrevista do tipo espontânea, na qual procurar-se-á do entrevistado extrair informação necessária para sustentar a pesquisa, tendo em conta a forma como as questões serão respondidas.

x.

Estrutura do Trabalho

O trabalho é desenvolvido em quatro capítulos. O primeiro capítulo corresponde ao quadro teórico e conceitual, no qual será apresentada a Teoria Crítica de Estudos de Segurança e a discussão dos conceitos de Terrorismo, Segurança e Estabilidade política. O segundo capítulo estuda a evolução do terrorismo ao nível global e ao nível da África. O terceiro capítulo apresenta o Boko Haram e o Al-Shabaab partindo das suas origens e do seu surgimento até às fontes do seu financiamento. O quarto e último capítulo, discute o Boko Haram e o Al-Shabaab como ameaça à Nigéria e à Somália, respectivamente. E, por fim, o trabalho apresenta as considerações finais e em seguida a bibliografia usada para a sua elaboração.

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CAPÍTULO – 1. QUADRO TEÓRICO E CONCEITUAL

Numa pesquisa científica, o papel que a teoria e os conceitos jogam para a compreensão da pesquisa é crucial, pois a teoria representa a perspectiva assumida para a explicação do objecto que justifica uma determinada pesquisa. Além disso, a teoria representa a melhor ferramenta para a compreensão do assunto em discussão. Por seu turno, os conceitos necessitam de uma desambiguação para que a subjectividade do autor seja apreendida sem grandes constrangimentos de interpretação devido a multiplicidade de entendimentos que se pode ter sobre um determinado conceito. Neste sentido, será abordada a Teoria Crítica de Estudos de Segurança, à luz da qual será lido o trabalho, bem como, serão discutidos os conceitos de terrorismo, segurança e estabilidade política.

1.1.Teoria Crítica de Estudos de Segurança 1.1.1. Origem da Teoria Crítica de Estudos de Segurança A Teoria Crítica de Estudos de Segurança tem a sua origem na Teoria Crítica de Relações Internacionais dos anos 1980. Esta teoria surgiu como alternativa teórica às duas grandes correntes teóricas até então vigentes: o Neo-realismo de Kenneth Waltz (2001)4 e o Neoliberalismo de Axelrod e Keohane (1985)5, dando vazão aos debates inter-paradigmáticos (Castro, 2012: 377). Contudo, na área de Estudos de Segurança, a Teoria Crítica surgiu após o final da Guerra-Fria e com maior destaque após os ataques terroristas do 11 de Setembro de 2001, nos EUA, pois as abordagens tradicionais se revelavam distantes da explicação dos novos fenómenos globais, como o terrorismo e a própria influência dos actores não-estatais na Política Internacional (Bilgin, 2008: 90).

Com efeito, a teoria crítica de Estudos de Segurança dedicou-se ao estudo do terrorismo formando os Estudos Críticos do Terrorismo, com a particularidade de apresentar uma atitude céptica e uma vontade de questionar o conhecimento convencional que as outras abordagens têm sobre o terrorismo. Neste sentido, foi rejeitado o universalismo e o essencialismo no que diz 4

Waltz, Kenneth (2001) Man, the State and War: a Theoretical analysis. Columbia University Press. New York. Axelrod, Robert and Keohane, Robert O. (1985) Achieving Cooperation Under Anarchy: Strategies and Institutions.

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respeito ao terrorismo e, por conseguinte, deu-se prioridade à especificidade, ao contexto, à história e à nuance do terrorismo. O que significa que os Estudos Críticos do Terrorismo defendem que a natureza do terrorismo não tem genuinamente a ver com a violência, mas sim com o contexto, as circunstâncias, as intenções e, crucialmente, os processos de interpretação e do rotulamento político, social, cultural e legal (Jackson, 2009: 3 e 4).

1.1.2. Precursores da Teoria Crítica de Estudos de Segurança A Teoria Crítica de Estudos de Segurança tem como Precursores Booth (1991)6 e Wyn Jones (1999)7. Booth teve o mérito de escrever o artigo “Security and Emancipation”, apelando a repensar-se a Segurança na perspectiva de emancipação8 e concebeu a frase “Estudos Críticos de Segurança”. Por seu turno, o contributo de Wyn Jones encontra-se na acção conjunta com Booth na qual conceberam a primeira Pós-graduação em Estudos Críticos de Segurança na Universidade de Wales, Aberystwyth, em 1995. Posteriormente, este programa tornou-se no curso central do nível de mestrado em Estudos de Segurança (Bilgin et al. 19989 citado por Bilgin, 2008: 92).

1.1.3. Pressupostos da Teoria Crítica de Estudos de Segurança Segundo David (2001: 40), a Teoria Crítica de Estudos de Segurança apresenta três pressupostos principais:  A rejeição unânime dos discursos racionais e objectivos sobre a Segurança, pois a segurança não é definida em função de factores inerentes ou naturais, mas em função de discursos dominantes e de realidades sociais flutuantes. Neste pressuposto fica clara a ideia de que dependendo da força do discurso, alguns assuntos podem ser securitizados, ou se tornar assuntos de segurança. Mas também fica a ideia de que a segurança deve ser vista olhando para cada realidade, pois o que é assunto de segurança em Somália poderá não ser automaticamente um assunto de segurança nos EUA.

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Booth, Ken (1991) Security and emancipation. Review of International Studies. 313–326. Wyn Jones, Richard (1999) Security, Strategy and Critical Theory. Boulder, CO: Lynne Rienner. 8 O autor Jackson (2009: 6) diz que emancipação deve ser compreendida como um processo de contínua aderência crítica e não um ponto final da grande narrativa universal. 9 Bilgin, et al. (1998) Security studies: the next stage?. Nação e Defesa. 84(2): 129 –157. 7

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 O Estado é incapaz de garantir a verdadeira segurança, mesmo a dos indivíduos. Neste pressuposto pode-se apreender a intenção clara de desacreditar o Estado como provedor de segurança, o que encontra evidência nas realidades somali e nigeriana, onde os movimentos terroristas e outras facções criminosas atacam civis e instituições sem, no entanto, o Estado demonstrar capacidade para estancar a onda de ataques;  A sobrevivência, o bem-estar e a emancipação humana e não estatal constituem o objecto de segurança. Por outras palavras, o indivíduo é o principal referente de segurança sob o qual deve ser feito tudo para proteger contra quaisquer ameaças. Contudo, a Teoria Crítica de Estudos de Segurança não ignora a importância do Estado como objecto também de segurança.

1.1.4. Importância da Teoria para o Trabalho A Teoria Crítica de Estudos de Segurança revelou-se particularmente importante por três razões. A primeira razão é por ter trazido um elemento novo e de utilidade aos Estudos de Segurança, que é de olhar para o indivíduo organizado em grupo como fonte de insegurança ao Estado (tal como acontece com os movimentos terroristas), contrariando as outras abordagens que olhavam somente para os Estados como fonte de ameaça à segurança dos outros Estados ou dos indivíduos. Como prova, pode-se tomar os ataques terroristas do 11 de Setembro de 2001 que despertaram o mundo para novas fontes de ameaça aos Estados que não viessem dos outros Estados.

A segunda razão é pelo facto da sua emergência ou fortificação no campo ter-se verificado na explicação do fenómeno terrorismo, o que dá uma base teórica mais ampla para a compreensão do mesmo. E, a terceira e última razão, é pelo facto de colocar em causa a capacidade do Estado de prover segurança, até mesmo aos indivíduos, o que se pode evidenciar tanto na Nigéria, pela fraqueza do Estado, assim como na Somália, pela sua ausência do Estado.

1.2.Quadro Conceitual 1.2.1. Terrorismo O conceito de terrorismo não tem uma definição universalmente aceite, isto porque existem muitas variedades de incidentes terroristas, tais como assassinatos, bombardeios, sequestros de 9

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aviões, raptos e novas ondas envolvendo ataques biológicos, químicos ou armas radiológicas e ataques cibernéticos através de sistemas de computadores e de telecomunicações (Lansford et al, 2009: 3). Entretanto, há elementos de comunhão que devem ser considerados antes da conceptualização do terrorismo. Alguns dos elementos são: a premeditação ou a decisão tomada por um perpetrador de cometer um acto de terror; uma motivação ou uma causa, seja política, religiosa ou económica; os alvos, que normalmente são não-combatentes, como figuras políticas, burocratas ou civis inocentes; e o segredo, quando os perpetradores pertencem a grupos clandestinos ou são patrocinados secretamente por Estados (Mingst, 2009: 212).

Brown (2008: 109) adiciona aos elementos apresentados por Mingst a necessidade de tomar-se em conta o valor político do terrorismo. Neste contexto, Brown procura mostrar que em certas situações uma organização pode ser denominada terrorista tendo em vista alcançar o objectivo político de ilegitimar um grupo. Como exemplo, pode-se tomar o African National Congress (ANC) que foi chamado de terrorista pelo regime do Apartheid com vista a ilegitimar a sua luta perante a comunidade internacional. No entanto, pela legitimidade da sua causa poucos foram os países que consideraram o ANC terrorista. A maioria, considerou o ANC um movimento de libertação.

Após considerar os aspectos trazidos por Mingst e Brown, pode-se trazer o conceito de Wardlaw (1982: 16)10 citado por Williams (2008: 173) que define terrorismo como o uso, ou ameaça do uso, de violência por um indivíduo ou um grupo agindo para, ou em, oposição ao estabelecimento de uma autoridade. Assim, está-se perante terrorismo quando tais acções são destinadas a criar extrema ansiedade e/ou efeito de indução de medo num grupo alvo mais largo que as vítimas imediatas, com o propósito de coagir um grupo [geralmente político] a consentir as demandas políticas dos seus perpetradores.

Wardlaw quando traz a ideia do uso da violência ou ameaça do uso da violência por um grupo ou indivíduo contra um grupo que não é o alvo imediato da acção para o alcance de uma finalidade política tem o mérito de apresentar parte dos elementos essenciais para se conceber uma acção 10

Wardlaw, Grant (1982), Political Terrorism: Theory,Tactics and Counter-measures. Cambridge: Cambridge University Press.

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como terrorismo. Porém, peca por restringir a ideia de terrorismo a um acto somente praticado por grupos ou por indivíduos, quando a história mostra incidentes terroristas que têm patrocínio de Estados, sob denominação de terrorismo de Estado, tal como aconteceu, por exemplo, com o atentado de Lockerbie, na Escócia em 1988 contra um Boeing da Pan Am, sob patrocínio do Estado Líbio.

Tendo em conta os elementos acima apresentados, pode-se considerar terrorismo: primeiro, como um acto de violência ou ameaça do uso de violência; segundo, um acto que pode ser levado a cabo por entidades estatais ou não-estatais; terceiro, tem em vista induzir medo num grupo alvo, normalmente não-combatente, que vai além das vítimas imediatas; quarto, visa alcançar um objectivo político; e quinto e último, é motivado por várias questões (religiosas, culturais, económicas, políticas, etc.).

1.2.2. Segurança O conceito de Segurança, assim como o conceito de terrorismo, não encontra entre os autores consenso. Isto significa que existem várias definições de segurança que dependem da ênfase dada pelas diferentes abordagens teóricas. Com efeito, pode-se encontrar a segurança definida por Williams (2013: 6) como um conceito associado ao alívio de ameaças contra valores centrais, especialmente aquelas que, se não forem combatidas, põem em causa a sobrevivência de um determinado objecto referente num futuro próximo (podendo tal objecto ser um Estado, um grupo ou até um indivíduo).

Por seu turno, David (2000:27) faz menção a três elementos essenciais para se definir segurança, nomeadamente: a preservação de valores centrais, a ausência de ameaças e a formulação de objectivos políticos. Na perspectiva de David, a segurança é concebida ou decidida em termos de grupo, etnia, Estado ou Organização internacional, que são considerados provedores de segurança preocupados em garantir a preservação de valores como, por exemplo, a identidade cultural e religiosa, a integridade territorial e a vida humana perante ameaças militares e nãomilitares. Deste modo, David define Segurança como a ausência de ameaças militares e não militares que pudessem pôr em causa os valores centrais que uma pessoa ou uma comunidade querem prover e que implicassem um risco de utilização de força. 11

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As definições trazidas por Williams e David apresentam diferenças e semelhanças. A diferença reside no facto de, enquanto a primeira olha para a segurança como o alívio de ameaças, a segunda vê segurança de forma absoluta como a ausência de ameaças. Neste sentido, pode-se constatar que a primeira se encontra mais próxima de uma realidade objectiva, pois as ameaças não podem ser eliminadas por completo, mas sim podem ser reduzidas.

Dentre os elementos que se assemelham, pode-se encontrar o facto de ambos buscaram nas suas definições a ideia de segurança associada a salvaguarda de um objecto contra ameaças, que em ambos, vai além do Estado, mas sim até ao grupo ou ao indivíduo, bem como, o facto de a segurança estar intrinsecamente ligada a preservação de valores centrais (exemplos de: identidade, soberania, integridade territorial, independência e vida).

Ainda sobre o conceito de Segurança, pode-se adicionar a perspectiva de um autor nigeriano, Agwai (2007: 137-138), que concebe a segurança como algo que actualmente é sobre a procura de liberdade das ameaças e habilidade dos Estados e sociedades para manter identidade independente e sua integridade funcional contra forças de mudança que eles as vêem como hostis. O mérito da definição de Agwai é de trazer o elemento de integridade funcional das instituições e sociedades como algo inerente à segurança, pois em nenhum momento pode-se sentir seguro se não se pode desenvolver de forma normal as nossas actividades, apesar de se ter aliviado as ameaças que põem em causa a nossa existência ou sobrevivência.

Unindo a visão de Williams, David e Agwai, pode-se ver a segurança primeiro, como um bem que não se adquiri por completo, dado que não se eliminam as ameaças, mas sim reduzem-se, sobretudo as que põem em causa a nossa existência. Segundo, estas ameaças têm a particularidade de ser de carácter militar e não militar, algo inovador tendo em conta a visão estatocêntrica e militar que dominou os Estudos de Segurança durante a Guerra-Fria. Terceiro, a segurança visa a salvaguarda de valores centrais à nossa existência (como a identidade, a soberania, a integridade territorial e a vida). Quarto e último, como a manutenção de uma integridade funcional dos Estados e sociedades.

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1.2.3. Estabilidade Política O conceito de Estabilidade política é um conceito polissémico. Neste sentido, para Sottilotta (2013: 3) a estabilidade política pode entendida em três perspectivas generalizadas. A primeira mais ampla que vê a estabilidade política como a ausência de um conflito civil doméstico e violência espalhada. Neste sentido, um Estado pode estar livre de instabilidade política quando não se verifica ataques sistemáticos à pessoas e propriedades dentro das suas fronteiras geográficas por motivações políticas. Entretanto, o mesmo autor vê esta definição como problemática, pois a situação política de um Estado pode aparentar estar estável durante algum momento (porque não há ataques sistemáticos a pessoas e propriedades), mas o regime pode se encontrar tão frágil que a qualquer momento pode irromper um conflito doméstico. Logo, esta é uma perspectiva limitada.

A segunda perspectiva que Sottilotta apresenta é de olhar-se para a ideia de estabilidade política como a longevidade de um determinado governo. Nesta perspectiva, o problema associado é de ver-se um Estado que experimenta sucessivas mudanças de governo como instável, mesmo se a continuidade nas políticas do governo é mantida por um sistema administrativo relativamente estável em que as normas institucionais estão bem embutidas. De acordo com esta visão, a Itália que experimentou mais de 60 mudanças de governo em 60 anos deveria ser considerada menos estável do que o Egipto que ficou por mais de 30 anos sob liderança de Hosni Mubarak, um líder que recorreu a leis repressivas e imposição de um Estado de emergência para manter-se no poder e garantir a longevidade do seu governo (Ibid.).

A terceira e última perspectiva apresentada por Sottilotta, vê a estabilidade política como a ausência de mudanças estruturais, isto é, a ausência de mudanças interna e externamente induzidas na configuração básica de um regime. Para Sotilotta, esta ideia, como as anteriores, também é problemática na sua ramificação. Primeiro, porque definir mudanças estruturais em si já é difícil. Segundo e último, porque mudanças profundas são possíveis em regimes que mantenham fortes elementos de continuidade em suas configurações constitucionais, económicas e sociais. Portanto, esta constitui uma ideia vaga de estabilidade política (Ibid.: 4).

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Contudo, a terceira perspectiva tem o mérito de trazer um elemento novo a conceptualização anteriormente apresentada, que é a ideia de estabilidade política associada às mudanças externamente induzidas. Exemplo disto foi a Guerra Civil de 16 anos em Moçambique que foi patrocinada por actores externos e que teve consequências drásticas para o país.

De modo a resolver a questão da multiplicidade de entendimentos e multiplicidade de determinantes na compreensão do conceito de estabilidade política, Sottilotta (2013: 4) apresenta-nos a definição da Firma de Consultoria Internacional Eurasia Group que vê a estabilidade política como a capacidade do sistema político de um Estado resistir a choques internos e externos. Nesta lógica, torna-se necessário levar em consideração conceitos e indicadores como índice de desenvolvimento humano, desigualdades, legitimidade política (extensão do apoio ao governo seja em regimes democráticos e não democráticos), constrangimentos à sensibilidade do governo (capacidade de satisfação às necessidades económicas do seu povo) e integração em organizações regionais.

Para além de também tomar em conta factores externos como inerentes a estabilidade política, o mérito da definição da Eurasia Group é de também apresentar a estabilidade política associada às questões económicas, olhando especialmente para os índices de desenvolvimento humano, algo que faz muito sentido num continente como África, onde grande parte dos conflitos é movida por questões económicas ou desenvolvimento.

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CAPÍTULO – 2. ORIGEM E EVOLUÇÃO DO TERRORISMO À NÍVEL GLOBAL E AO NÍVEL DE ÁFRICA

O terrorismo é uma questão de pouca novidade no estudo das Relações Internacionais. Não obstante, importa fazer neste capítulo uma sinopse ao terrorismo global no geral e, em particular, em África de modo a compreender-se o seu processo evolutivo. Para o efeito, procurar-se-á trazer as principais ondas que marcaram a evolução do terrorismo moderno ao nível global e, em seguida, a evolução do fenómeno terrorismo em África olhando para os métodos, alvos, objectivos e a principal tipologia de movimentos terroristas existente durante o processo evolutivo.

2.1.Origem e Evolução Global do Terrorismo A origem do terrorismo é de grande controvérsia entre os académicos. Uns acreditam que o terrorismo teve início há pelo menos 2 mil milénios na região actualmente conhecida como o Médio Oriente e outros dizem que o terrorismo remota especificamente às épocas grega e romana, em que actos terroristas eram normalmente levados a cabo contra governantes (Webel, 2004: 16; Mingst, 2009: 213). Contudo, na época moderna, o terrorismo teve seu início nos anos 1880, na Rússia, sob protagonismo dos anarquistas11, através de assassinatos a oficiais proeminentes do Estado. Esta estratégia foi seguida por outros grupos da época com fins nacionalistas, por exemplo, na Índia e nos Balcãs. Rapoport (2004: 47-65) fala do terrorismo na modernidade fazendo menção a quatro ondas principais.

2.1.1. A Primeira Onda ou a Onda dos Anarquistas A Onda dos Anarquistas teve seu início nos anos 1880 e durou cerca de 40 anos. Esta onda foi caracterizada pela criação de uma doutrina que saiu da expressão convencional de ideias, baseada em cartazes e panfletos que terminariam numa manifestação, para uma forma de acção que vai além do moralmente aceite, passando a incluir a intimidação, a violência psicológica e a 11

Anarquistas são os praticantes do Anarquismo, movimento que atribui, ao homem como indivíduo e à colectividade, o direito de usufruir de toda a liberdade, sem limitação de normas, de espaço e de tempo, fora dos limites existenciais do próprio indivíduo, a liberdade de agir sem ser oprimido por qualquer tipo de autoridade, admitindo unicamente os obstáculos da natureza, da "opinião", do "senso comum" e da vontade da comunidade geral (Bobbio et al, 1983: 23)

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violência física através de assassinatos, na sua maioria, com recurso à dinamite, que era uma invenção recente naquela época. Isto porque para os anarquistas, a moralidade era pura criação histórica. Neste sentido, o terror era visto como a forma mais rápida e efectiva para alcançar os seus objectivos, que eram de destruir convenções.

A onda dos anarquistas conheceu o seu pináculo nos anos 1890, naquela que foi chamada “a idade de ouro dos assassinatos”, quando monarcas (como é o caso do Czar Alexandre II), primeiros-ministros e presidentes (exemplo de Marie Carnot, presidente Francês) eram constantemente abatidos por assassinos que se moviam facilmente pelas fronteiras nacionais e internacionais, facto que conferiu um carácter transnacional ao terrorismo naquela época.

2.1.2. A Segunda Onda ou a Onda Anti-colonial A Segunda Onda teve início nos anos 1920, precipitada pelo Tratado de Versalhes e também durou cerca de 40 anos. Isto porque o Tratado de Versalhes deu surgimento ao sistema de mandatos, o que na concepção dos povos das regiões mandatadas era colonização, algo que deveria ser combatido. Assim, ao combater a colonização, alguns movimentos foram rotulados de terroristas, pois usaram a violência para atingir o objectivo de libertação dos seus territórios e expulsão dos colonizadores. Contudo, em certas situações, a expulsão dos colonizadores trouxe confusão nos povos que permaneceram nos territórios. A título de exemplo, os Árabes e os Judeus na palestina entraram em conflito em virtude da divisão da palestina pela Grã-Bretanha; o caso da Irish Revolutionary Army (IRA), que não aceitou o facto da Grã-Bretanha não se retirar do território Irlandês sem consenso do povo da Irlanda; e a Euskadi ta Azkatasuna (ETA) que, desde os anos 1950, luta pela independência do país Basco (que engloba as províncias de Biscaia, Guipuzcoa, Alava e Navarra) em relação à Espanha.

A segunda onda foi caracterizada por tentar evitar ao máximo a denominação terrorista, pela conotação negativa a si associada, preferindo auto-denominar-se freedom fighters que lutavam contra o terror do governo. Esta denominação era tão atractiva e conferia um elevado grau de legitimidade de causa e da aplicação de certos métodos violentos que todos os movimentos terroristas passaram a auto-denominar-se Freedom Fighters ou Combatentes da Liberdade. Para além disso, esta onda é caracterizada por uma mudança na metodologia do terror, dado que pára 16

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de se assassinar figuras políticas, como era feito na onda anterior, passando-se a assassinar a polícia e a atacar as forças armadas, que eram os olhos e ouvidos do governo.

2.1.3. A Terceira Onda também designada Nova Esquerda A terceira onda foi precipitada pela Guerra do Vietname12 e consequente derrota da superpotência Americana nos anos de 1970 e, durou praticamente duas décadas. Isto porque com a derrota dos EUA, os pequenos grupos militares perceberam que podiam lutar contra gigantes e serem bem sucedidos. É neste contexto que, grupos como a Organização para a Libertação da Palestina (OLP), na Palestina, decidem usar o terror como meio de luta para o alcance da sua auto-determinação.

A Terceira Onda foi muito similar à primeira, pois misturava um nacionalismo e um radicalismo por parte dos movimentos terroristas. Nesta onda, retoma-se o assassinato de figuras políticas como aconteceu, por exemplo, com a tentativa de assassinato à Margareth Thatcher, PrimeiraMinistra Britânica, em 1984; com o assassinato do embaixador britânico na Irlanda em 1976, pela IRA; e com o assassinato do primeiro-ministro espanhol em 1973, pela ETA. Contudo, a terceira onda diferencia-se da primeira pela introdução do método de sequestro de aviões (mais de 700 aviões sequestrados nesta onda) e de indivíduos como uma poderosa arma de manter reféns e pressionar os Estados a fazerem concessões políticas.

2.1.4. A Quarta Onda ou a Onda Religiosa A Quarta e última Onda iniciou nos anos 1980 e é caracterizada pelo forte extremismo religioso. Nesta onda, o terror é motivado por questões religiosas, razão pela qual teve e continua tendo vários grupos religiosos cometendo terror pelo mundo. A título de exemplo, pode-se tomar o caso do assassinato de 29 muçulmanos por um judeu no túmulo de Abraão, em Hebron, no ano de 1994; o caso da libertação de um gás nervoso no metro de Tóquio matando cerca de 12 pessoas e ferindo outras 3 000 em 1995 pelo Aum Shirinkyo, um grupo que combina budismo, hinduísmo e cristianismo.

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Também conhecida como a Segunda Guerra da Indochina, durou de 1959 a 1975, envolvendo os Nortevietnamitas e a Frente de Libertação Nacional (FLN) em confronto com as Forças Americanas e do Sul do Vietname.

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Na quarta onda, apesar da existência de vários grupos extremistas religiosos, o islão é o centro das atenções, pois os grupos islâmicos conseguiram perpetrar os ataques internacionais mais significantes, mais mortíferos e mais profundos da história do terrorismo. O seu sucesso influenciou outros grupos terroristas religiosos em outras partes do mundo como é, por exemplo, o caso do Movimento da Identidade Cristã Americana que tinha interpretações racistas da bíblia. Apesar da quarta onda ter sido a mais mortífera, nela verifica-se uma redução substancial do número de movimentos terroristas, saindo dos mais de 200 movimentos activos nos anos 1980, para os 40 movimentos activos na década seguinte. O destaque vai para o surgimento da AlQaeda, que tinha mais de 5 000 membros com várias células a operar em cerca de 72 países. A razão por detrás desta onda foi a Revolução Iraniana13 que inspirou e assistiu movimentos de terror Shiitas no Iraque, na Arábia Saudita, no Kuwait e no Líbano com a introdução do método de ataque-suicida, que se revelou uma grande surpresa ao Ocidente, sobretudo para a missão de paz que operou no Líbano14, em 1982 depois da invasão Israelita.

2.2. Origem e Evolução do Terrorismo em África Quando aborda-se a questão da ameaça do terrorismo em África, confronta-se um reducionismo histórico por parte de alguns autores, como é o caso de Bolaji (2010: 208). Este autor reduz a existência desta ameaça no continente como algo que remota ao ano de 1993 com a morte de 18 soldados americanos em Mogadíscio, na Somália, durante um ataque levado a cabo contra a missão de paz da ONU na Somália (UNISOM). Entretanto, pode-se constatar em outros autores que a questão do terrorismo no continente é um fenómeno que remota aos anos 1400 com as tentativas de colonização e endoutrinamento dos povos africanos por parte das potências europeias. Neste contexto, os colonos intimidaram os africanos, criaram uma desordem no seu estado de existência e forçaram as comunidades a viver em constante estado de medo através de penas duras que eram impingidas contra os povos locais (Adhengo, 2010: 56). Deste modo, pode-se ainda aferir que técnicas de terror foram usadas pelos colonos não só durante as tentativas de colonização, mas também durante a sua estadia ou colonização aos povos africanos. 13

Revolução que tomou espaço nos anos 1978 e 1979, na qual fundamentalistas islamicos e seus apoiantes conseguiram tirar do poder o Xá do Irão e estabeleceram a República Islâmica do Irão que rejeitava influências estrangeiras e era guiada pela lei da sharia. 14 Força Interina das Nações Unidas no Líbano ou United Nations Interim Force in Lebanon (UNIFIL) em Inglês.

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Durante o período das lutas de libertação colonial, o terrorismo foi uma táctica ou estratégia de luta usada pelos movimentos nacionalistas africanos para se ver livre da administração colonial. Como exemplo, pode-se apontar o movimento Mau-Mau que sem o uso do terrorismo não teria conseguido tirar o Quénia da opressão colonial, pois este movimento nacionalista usou tácticas de terror e juramentos obscenos que comprometiam os seus membros a morrerem pela causa da libertação, associado às atrocidades cometidas contra os leais aos brancos ocupadores como métodos combinados que conseguiram revoltar o público britânico contra a presença colonial no Quénia (Adhengo, 2010: 41).

À excepção de movimentos como o Mau Mau, da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO), em Moçambique, o Movimento para a Libertação de Angola (MPLA), em Angola, que usaram de técnicas terroristas para conseguir a libertação dos seus povos ou Estados, teve grupos que levaram a cabo insurgências contra os grupos libertadores e que depois foram denominados terroristas pelos governos contra os quais lutavam. Destes grupos pode-se apontar como exemplo a União Nacional para a Independência Total da Angola (UNITA) em Angola, a Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO) em Moçambique e o Lord’s Resistance Army (LRA) no Uganda (Cilliers, 2003: 93).

Nos anos 1990, pode-se destacar o carácter transfronteiriço e religioso do terrorismo em África. A prova disto foram os ataques-bomba levados a cabo por movimentos fundamentalistas islâmicos contra as embaixadas Americanas no ano de 1998, em Nairobi, Quénia e em Dar-EsSalaam, na Tanzania, matando cerca de 200 pessoas e ferindo mais de 4 000 (Bolaji, 2010: 208). Nos anos 2000, o terrorismo em África é caracterizado ainda por essa componente religiosa e transnacional, sobretudo através do surgimento de movimentos fundamentalistas islâmicos como o Boko Haram, o Al-Shabaab, o AQIM e outros com ligações à Al-Qaeda.

2.2.1. Tipos de Movimentos Terroristas em África No que diz respeito a tipologia de movimentos terroristas em África, Bolaji (Ibid.) trata antes de esclarecer que “a história colonial e pós-colonial do continente é sinónimo da emergência e desenvolvimento de vários grupos violentos que foram rotulados terroristas”. Neste sentido, pode-se constatar que o terrorismo em África passou por algumas mudanças, definidas por 19

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dinâmicas inerentes à política global, à política doméstica, ao ambiente social e ao ambiente económico. O que faz com que os movimentos terroristas em África tenham emergido ao longo do tempo com diferentes orientações e missões. Com isso, pode-se classificar os movimentos terroristas em Revolucionários, Económicos, Religiosos e Criminosos Transnacionais.

2.2.2. Movimentos Revolucionários Wilkinson (1977: 56)15 citado por Bolaji (2010: 211) diz que estes são os que procuram a revolução ou o alcance de objectivos tácticos revolucionários. As suas características são: a) é sempre um fenómeno de grupo, contudo, com uma liderança, uma ideologia ou um programa bem definido; b) desenvolve estruturas institucionais alternativas; c) a organização da violência e do terrorismo é tipicamente levada a cabo por órgãos paramilitares e conspiracionais especialistas dentro do movimento revolucionário. Estes movimentos têm como fim último o alcance do poder político e procuram reestruturar tanto a sub-estrutura assim como a superestrutura da sociedade. Como exemplos pode-se apontar o ANC, o Movimento Mau Mau, a Frelimo, o Zimbabwe African National Union-Patriotic Front (ZANU-PF) e o MPLA, pois estes grupos recorreram a meios violentos de tal forma que, através da força capturassem o poder dos colonizadores ou obrigá-los a sentarem-se na mesa de negociação (Bolaji, 2010: 211).

2.2.3. Movimentos Religiosos No concernente a estes movimentos, pode-se dizer que são os movimentos que cometem terror sob argumento da religião. Bolaji faz referência ao facto de muitos movimentos islâmicos em África não serem terroristas, mas alguns fazerem do islão um escudo para cometer terrorismo. E os que usam do islão para cometer terrorismo têm agentes no Norte, Este e Centro de África e tem reclamado responsabilidade pelos passados ataques no Quénia, Tanzania e Algéria. A título de exemplo pode-se apontar o Boko Haram, o Al-Shabaab e o AQIM (Ibid.).

2.2.4. Criminosos Transnacionais/ Económicos O mesmo autor diz que as actividades desta categoria de terroristas ganharam proeminência como resultado de pobreza e negligência das pessoas no mundo Em Desenvolvimento. Seu

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Wilkinson, Paul (1977) Terrorism and the Liberal State. Lowe and Macmillan. Norfolk.

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âmbito de actividade vai desde roubos, tráfico humano, de drogas e de pequenas armas, armazenamento ilegal de petróleo, lavagem de dinheiro, contrabando, etc. Esta categoria de terroristas não tem objectivos políticos bem definidos, a razão por detrás de suas actividades é fazer lucro. Entretanto, alguns objectivos podem ser adoptados para o propósito de legitimar as suas actividades (Bolaji, 2010: 211 e 212).

2.2.5. Alvos do Terrorismo em África Os alvos do terrorismo em África têm evoluído ou mudado atendendo a mudanças na política global e local da história Africana, ou seja, a medida que a história vai decorrendo os alvos também vão mudando. Neste sentido, pode-se dizer que no princípio, o uso das técnicas de terror no continente tinham como alvos os povos africanos, mas depois, durante as lutas de libertação os principais alvos foram se tornando os colonos europeus. E, com as independências, no período das guerras civis, grupos subversivos e, em certos casos, governos, levaram a cabo actos de terrorismo, o chamado terrorismo não-estatal e o terrorismo de Estado, contra a população civil. Como exemplo, de terrorismo não estatal e de Estado pode-se apontar para os mais de 300 000 civis que morreram e cerca de 100 000 outros que foram obrigados a abandonar suas residências durante os confrontos entre as milícias Hutu e o governo no Burundi (Cilliers, 2003: 97).

Actualmente, pode-se dizer que os alvos do terrorismo no continente variam dependendo dos objectivos do movimento que o pratica. Podendo assim, ser apontados alvos que variam desde Organizações Internacionais (OI’s) como a ONU e a UA na Somália, para população civil, forças governamentais e investimentos estrangeiros na Nigéria (Adhengo, 2010: 62; Adenrele, 2012: 24).

2.2.6. Métodos de Terrorismo em África Os métodos de terror em África também têm evoluído atendendo às dinâmicas globais e locais da política Africana. Neste sentido, constata-se que durante o período colonial o terror era cometido contra os Africanos através do uso de chicotes, através da escravidão, através de trabalhos forçados e formas de repressão que chegaram até a incluir massacres. Mas no período da luta pela auto-determinação ou de independência dos povos africanos, o terror foi uma arma ao serviço dos movimentos de libertação através do uso de assassinatos, por vezes, com recurso a 21

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bombas, contra os colonos e os seus leais negros, como aconteceu na Argélia (Silva, 2005: 167). Durante as guerras civis, pode-se destacar o terror cometido pelos grupos de insurgência através de assassinatos, mutilações, massacres e outras formas de violência que visavam desacreditar as autoridades governamentais, tal como fez o LRA no Uganda.

Actualmente, alguns autores como Cilliers (2003: 100) apontam para os tiroteios como o modus operandi de movimentos terroristas africanos. Contudo, constata-se que com as influências globais, assiste-se em África uma importação de métodos terroristas com o início do uso de Dispositivos Explosivos Improvisados (DEI’s), ataques-suicida e carros armadilhados (Pham, 2012: 6).

2.2.7. Objectivos do Terrorismo em África Os objectivos do terrorismo em África são de exclusividade dos grupos que o praticam. Não obstante, não deixam também de obedecer às dinâmicas da política global e local Africana. É neste sentido que, Adhengo (2010: 34-35) classifica os objectivos em nacionalistas e ideológicos. Os nacionalistas são os que tem como finalidade a auto-determinação de um determinado grupo e habitualmente estão relacionados com questões de origens (exemplo do movimento Mau-Mau que lutava pela independência Queniana). E os ideológicos são os que procuram a mudança total do sistema político, económico e social (a título de exemplo pode-se apontar movimentos como a Al-Jihad que foi responsável pelo assassinato do presidente Sadat em 1981 no Egipto).

2.2.8. Principais Movimentos Terroristas em África Ao longo do continente podem ser encontrados vários movimentos terroristas de diferente orientação e expressão, como são os casos: do Al-jihad no Egipto; da Islamic Salvation Front, do Group Islamic Armé e do Salafi Group for Jihad na Algéria; do AQIM na Tunísia; da Frente Revolucionária Unida (FRU) na Serra Leoa; do Boko Haram na Nigéria; do LRA no Uganda; do Al-Shabaab na Somália; do Mujahideen Rovers na Tanzania; do Islamic Army for the Liberation of the Holy Places no Quénia; do People Against Gangsterism and Drugs (PAGAD) e o RightWing Extremism na África do Sul (Harbeson, 2007). Entretanto, dentre estes movimentos terroristas os mais expressivos são o Boko Haram, o Al-Shabaab e o AQIM. Para efeitos da pesquisa, o nosso foco de análise será o Boko Haram e o Al-Shabaab. 22

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CAPÍTULO – 3. O BOKO HARAM E O AL-SHABAAB

Este capítulo apresenta os movimentos terroristas Boko Haram e Al-Shabaab. Nesta apresentação está contemplada a origem, o surgimento, o argumento ou a causa que sustenta a sua radicalização, as fontes de financiamento e as ligações externas de cada um dos movimentos.

3.1 O Boko Haram Boko Haram é uma terminologia hausa-arabizada que significa “educação Ocidental é pecado”. Esta terminologia foi propagandeada pela seita jama‟atul Alhul Sunnah Lidda‟ wati wal Jihad que acreditava estar cometida com a Hadith16, os e a jihad17 islâmica (Adenrele, 2012: 21). Este é um movimento que está enraizado numa forte resistência do Norte Nigeriano contra a educação Ocidental e, sobretudo, contra as elites educadas no Ocidente, o que tem boa ressonância entre os muçulmanos marginalizados do Norte (Marchal, 2012: 1).

3.1.1. Origem do Boko Haram A origem ou a história do Boko Haram está ligada à história do islão na Nigéria. Segundo Cook (2011: 3-4), o islão na Nigéria é uma religião que até os séculos X e XI já se encontrava estabelecida, ou tinha uma presença muito significante em grandes cidades do Norte da Nigéria, como por exemplo, Kano e Kaduna, onde a etnia predominante é até hoje hausa. Com o passar do tempo, os hausa enfrentaram uma jihad que obrigou-os a submeterem-se às regras de Dan Fodio18, o homem que conduziu a jihad.

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Hadith é um conjunto de tradições relativas aos actos ou palavras de Maomé. (Para os islamitas, os hadiths constituem a maior autoridade após o Corão.) (http://www.dicio.com.br/hadith/ consultado no dia 10 de Outubro de 2013 pelas 13h30min). 17 O significado de Jihad, em árabe, é o de Guerra Santa ou Guerra Legal. O termo teve a sua origem quando Maomé deu início às suas campanhas contra o povo de Meca tendo como base algumas passagens do Alcorão http://www.infopedia.pt/$jihad;jsessionid=jTDy35nLNgaQ9BdPWWHoyg__ consultado no dia 9 de Outubro de 2013 pelas 16h40min. 18 A carreira de Dan Fodio consistiu numa fase de ensinamento e noutra fase activa. A fase de ensinamento baseavase na oratória e na supressão de inovações, enquanto a fase activa baseava-se nos ataques contra os hausa em forma de jihad, criando assim, a cultura islâmica do Norte e Sul da Nigéria, bem como de algumas partes do Oeste de Chad, mas com a particularidade de Dan Fodio nunca ter atacado não-muçulmanos (Cook, 2011: 4).

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A seita de Dan Fodio, que era o califado de sokoto, perdeu poder para os britânicos, em 1904. Nesta altura o sistema britânico colonial indirecto que conferia autonomia de governação as comunidades locais, o que permitiu a sobrevivência de interesse na implantação da Sharia, mas sem desafiar a autoridade da metrópole.

Com a independência da Nigéria, em 1960, o movimento “puritano” de Dan Fodio voltou a tornar-se estimado. Esta situação revelou-se na vontade dos muçulmanos do Norte da Nigéria, sob liderança do carismático Ahmadu Bello, de ver a sociedade Nigeriana sendo guiada sob a lei islâmica da Sharia. Contudo, essa vontade de ter a Sharia na base de sua governação não se reflectia na realidade Nigeriana dos anos 1960, pois com a colonização britânica observou-se um aumento significativo da população cristã, sobretudo no Sul da Nigéria (Cook, 2011: 5).

Embora o Norte da Nigéria fosse maioritariamente muçulmano, esta mesma população encontrava-se dividida em três partes, a elite Sufi tradicional que se encontrava na capital califal conservadora de Sokoto, os mais modernizados Tijaniyya que se encontravam em Kano e os mais novos e radicais grupos islâmicos localizados em Kaduna. Estes últimos grupos, assim como Dan Fodio, dedicaram-se à supressão de inovações e esta situação gerou uma onda de disputas dogmáticas muçulmanas pelos anos 1970 e 1980.

As disputas dogmáticas que decorreram em 1970 e 1980 foram acompanhadas por uma série de rebeliões religiosas pelos anos 80 e 90, que foram trazidas pelos cruzados evangelistas, das quais não se sabe de facto as reais causas. No entanto, aponta-se para as divisões étnicas e religiosas que amaldiçoavam o país. Adenrele (2012: 21) citando Johnson (2011)19, aponta para a origem Boko Haram como resultado de uma destas rebeliões, a rebelião de Maitatsine dos anos 1980 e as tensões étnico-religiosas que se seguiram nos anos 1990. Segundo Thomson (2012: 51) citando Adesoji (2011)20, a rebelião Maitatsine juntamente com estas primeiras manifestações de fundamentalismo islâmico visava a purificação do Islão na Nigéria.

19

Johnson, T. (2011) Boko Haram – council on foreign relations, Retrieved on 25th April, 2012 from www.cfr.org/africal/boko-haram/p25739 . 20 Adesoji, Abimbola O. (2010) Between Maitatsine and Boko Haram, Africa Today, 99-118.

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3.1.2. O Surgimento e a Radicalização do Boko Haram O Boko Haram surgiu no ano de 2002 sob liderança de Mohammed Yusuf. Este líder estabeleceu as bases do Boko Haram através da criação de um complexo religioso em Maiduguri, no Estado de Borno, no Norte da Nigéria. Esta acção foi simbolicamente confirmada com a ocupação de uma mesquita e uma Escola islâmica, onde muitos pais e encarregados de educação mandavam as suas crianças para ter uma educação baseada na moral. Depois do surgimento e implantação subtil do movimento pelas terras do Norte muçulmano nigeriano e dos estados vizinhos. Em seguida, assistiu-se a um período de expressão aberta e radical do Boko Haram que é explicado tendo em conta as seguintes teorias: o Factor Almajiri, a Teoria da Pobreza, a Teoria da Corrupção e a Teoria da Alienação política.

3.1.2.1. O Factor Almajiri O Almajiri é um sistema de educação que combina ensinamentos do Corão com súplica de almas por rapazes dos 7-15 anos de idade. Este é um sistema de educação não integrado no sistema normal de educação Nigeriano e que é composto maioritariamente por estudantes imigrantes dos Estados vizinhos do Chade e do Níger vivendo em condições de extrema pobreza e imundície. Estas crianças que crescem como uma parte negligenciada do já negligenciado Norte Nigeriano são preparadas desde cedo para as práticas terroristas, sobretudo em termos de ataques suicidas, oferecendo assim, uma forte base de recrutamento para o Boko Haram (Adenrele, 2012: 23).

A explicação do terrorismo do Boko Haram com base no factor Almajiri não é completa, mas é válida. Isto porque o Almajiri constitui um trabalho de base muito forte de forma a garantir efectivo suficiente para levar à cabo os ataques-suicida. Contudo, os mesmos são uma motivação alegada e não uma motivação real para se cometer terror, dado que os Almajiris são gerados, encabeçados e manipulados por alguém que retêm as verdadeiras motivações ao radicalismo na Nigéria.

3.1.2.2. A Teoria da Pobreza A teoria da pobreza faz menção ao facto da radicalização ter sido agravada pelas crescentes péssimas condições de vida a que os Nigerianos, sobretudo os do Norte, têm sido submetidos (Adenrele, 2012: 23). Harbeson (2007: 20) constata que estas péssimas condições de vida foram 25

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causadas por um processo de desindustrialização que foi levado a cabo no Norte em regiões como Kano e Kaduna, em que, a título de exemplo, viu-se uma grande empresa produtora de têxteis efectuar despedimentos de um efectivo de 22 000 funcionários para 7 000 funcionários, o que associado à baixa capacidade produtiva das outras áreas de produção e a má distribuição dos rendimentos vindos do petróleo, agravou as condições de vida dos Nigerianos do Norte.

Ademais, a questão da pobreza no Norte da Nigéria associada ao desemprego e à fraca presença do governo para prover segurança, são factores que quando combinados levam as pessoas ao desespero e, como consequência, estas pessoas vêm a união a grupos criminosos e terroristas como único meio de sobrevivência, o que tem resultados drásticos a médio e longo prazo (Udama, 2013: 101). Teoricamente, isto significa que a frustração das populações serviu de base de instrumentalização para o recrutamento de indivíduos para actuarem ao lado do Boko Haram.

Todavia, o posicionamento que aponta para a pobreza como móbil para o terrorismo é fortemente contestado. A título de exemplo Conning (2004: 20) aponta para um estudo que conclui que seis biliões de pessoas do nosso planeta vive sob o flagelo da pobreza, mas só uma ínfima parte se torna terrorista, daí que associar a pobreza ao terrorismo é dá-lo um argumento que não merece. Além de mais, Ploch (2010: 15) adiciona que a retórica por trás dos movimentos terroristas não faz menção à pobreza ou outras questões, mas dá ênfase a questões como identidade, ameaça existencial, humilhação percebida, dominação cultural e opressão. No caso do Boko Haram, a retórica por detrás do movimento tem sido restaurar os valores puros do islão e impô-los à sociedade Nigeriana.

3.1.2.3. A Teoria da Corrupção A Teoria da corrupção defende que os recursos do Estado nigeriano terminam sempre na mão de uma pequena percentagem da população que se encontra nos círculos de governação. Este argumento, com relação directa com a pobreza, agastou os Nigerianos do Norte que chegaram a ver a sharia como a panaceia para tirar o Estado da condição caótica [de corrupção] em que se encontrava (Adenrele, 2012: 23). Desta forma, o Boko Haram aparece como um movimento que se prontifica a combater a corrupção que se enraizou na sociedade Nigeriana. Isto através da

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imposição da sharia em todo o Estado e através de assassinatos à figuras vistas como um mal público.

O posicionamento que defende a alta corrupção como factor que leva os grupos a enveredar pelo terror não pode ser ignorado, mas também não se pode dar credibilidade absoluta ao mesmo. Isto porque verifica-se em África e no mundo vários Estados com altos níveis de corrupção, alguns acima da Nigéria, mas poucos grupos enveredam pelo terrorismo para resolver os problemas de corrupção existentes nos seus Estados. Além disso, constata-se que com os ataques a alvos indiscriminados que o Boko Haram tem efectuado, o argumento da corrupção não é mais válido, pois, ninguém combate a corrupção atacando escolas e igrejas. Ainda assim, teoricamente, a corrupção serve de base para sustentar a retórica de mobilização e de instrumentalização para o recrutamento de indivíduos para actuam ao lado do Boko Haram.

3.1.2.4. A Teoria da Cultura A teoria da cultura diz que a exposição de alguns Estados africanos às ideologias religiosas extremistas e ao conceito de que o islão está sob ataque do Ocidente tem sido um factor proeminente em direcção ao extremismo. Isto tem sido conseguido através da alusão que se faz às intervenções de Estados Ocidentais em Estados maioritariamente muçulmanos como a Somália e o Iraque, que são vistas por movimentos extremistas como uma campanha militar dos cruzados cristãos contra os muçulmanos (Ploch, 2010: 16). Autores como Botha (2007: 5) reconhecem, igualmente, o papel da religião e sua particularidade de sempre transcender as fronteiras nacionais como um grande instrumento político para justificar, disseminar e granjear apoio para actos de violência, mas só combinada com péssimas condições sócio-económicas, marginalização e, acima de tudo, uma instrumentalização destes elementos por ideologias políticas.

O argumento da cultura que, normalmente, vai além da religião e aborda a questão da etnia, é um argumento fortemente válido para explicar a questão do terrorismo na Nigéria, tendo, sobretudo, em conta que a distribuição dos recursos do Estado na Nigéria é desequilibrada. A parte que menos tem se beneficiado desta distribuição pertence ao mesmo grupo étnico e professa a mesma religião (os hausa-fulani) que são maioritariamente muçulmanos do Norte. No entanto, isso só se 27

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torna condição suficiente para se enveredar pelo terrorismo quando é politizado ou instrumentalizado por ideologias extremistas.

3.1.2.5. A Teoria da Alienação Política A teoria da alienação política é justificada pelo facto de depois da morte do presidente Umar Musa Yara‟dua em 2010, muitas elites do Norte da Nigéria terem visto a ascensão ao poder de Goodluck Jonathan, um cristão, como ilegítima, tendo em conta que ignorou-se a rotação informal de poder que manteria um presidente muçulmano do Norte até 2015 (ibid.). Isto fez crer que o Norte estava a perder influência militar e política na Nigéria (Harbeson, 2007: 20). Para Marchal (2012: 2), o Boko Haram é um instrumento usado pelas elites do Norte para demonstrar o sofrimento gerado pela negligência do governo federal. Este sentimento é alimentado por alguns eventos, incluindo o acordo feito pelo governo federal com o grupo rebelde Movimento para a Independência do Delta do Níger (MIDN)21, que tinha uma componente política significante, que era a reeleição para um segundo mandato de Goodluck Jonathan.

Em suma, pode-se dizer que teorias aqui apresentadas não podem isoladamente ser vistas como factor que motiva a radicalização no Estado Nigeriano, ou radicalização do Boko Haram, mas apenas combinados. Isto porque a questão do terrorismo na Nigéria deve ser vista como a combinação da pobreza endémica com os altos níveis de corrupção, alienação política, factor almajiri, cultura e, sobretudo, a recorrência de radicalismo na Nigéria gerada por diferenças etno-religiosas. Tanto que, autores como Marchal (2012: 2) preferem ver o Boko Haram como um movimento de restauração ou continuidade daquilo que Dan Fodio já tentava implementar anteriormente na Nigéria há dois séculos atrás.

3.1.3. As Ligações Externas do Boko Haram O Boko Haram revelou, a partir do ano de 2009, estar relacionado com alguns movimentos terroristas que operam no continente, tais são os casos do AQIM e do Al-Shabaab. Para Pham (2012: 6), esta relação ou influência é constatada através da inovação nas suas tácticas,

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Movimento que constitui união de vários grupos que isoladamente iam lutando contra o governo na questão da expropriação e exploração das suas terras, região do Delta do Níger, sem quaisquer ganhos para os mesmos. Movimento que chegou inclusive a declarar uma República Independente do Delta do Níger (Forest, 2012: 46-48).

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designadamente o início do uso de Dispositivos Explosivos Improvisados (DEI’s) colocados em veículos e utilizados em sucessivos atentados contra alvos em locais públicos. Este autor acrescenta que, a simples ocorrência de ataques-suicida indica a presença de alguma influência estrangeira, uma vez que acções deste tipo eram praticamente desconhecidas em África até quando se tornaram parte do repertório da AQIM. Marchal (2012: 5 e 6) adiciona que através do discurso do Boko Haram, no qual muda a retórica de constituir um Estado islâmico baseado na lei islâmica da Sharia, para um novo discurso característico das outras afiliadas da Al-Qaeda em África, que é de um envolvimento numa jihad global, pode-se comprovar este relacionamento.

3.1.4. As Fontes de Financiamento do Boko Haram As fontes de financiamento do Boko Haram são de fundos diferentes. O autor Zenn (2012: 6) afirma que há uma tradição por parte dos políticos Nigerianos de contratar Gangs para apoiá-los durante o período das eleições e o Boko Haram é, possivelmente, sustentado numa dessas formas. Zenn adiciona que há relatórios de organizações de caridade baseadas no Reino Unido e na Arábia Saudita financiando o Boko Haram na forma de doações de membros. Para além destas formas, o Boko Haram tem conseguido financiamento através de assaltos aos bancos, através de sequestros, bem como, através do apoio concedido pela AQIM22.

Forest (2012: 70-71) diz que algumas investigações mostram que o Boko Haram também tem recebido financiamento através de sua diáspora no Paquistão, na Europa e nos EUA, assim como, de alguns indivíduos com acesso a recursos no Estado Nigeriano. Ajayi (2012: 105) aponta para uma organização terrorista Argelina que transferiu cerca de 40 milhões de Nairas23 ao Boko Haram de modo a levar a cabo as suas actividades. Isto tudo demonstra que o Boko Haram é um movimento que conta com várias formas de financiamento, próprio e de terceiros.

3.2. O Al-Shabaab O Al-Shabaab, Harakat al‐Shabaab al‐Mujahedeen, Mujahedeen Youth Movement ou “A juventude”, em português, é um movimento árabe afiliado ao Al-Qaeda enraizado na Somália e 22

Pham (2012: 5) diz que o AQIM fornece armas, treinamento e todo tipo de apoio ao Boko Haram com o objectivo de expandir a influência da Al Qaeda até a África sub-sahariana para conseguir o posicionamento estratégico de defender muçulmanos da Nigéria e deter o avanço dos cruzados cristãos. 23 Moeda Nacional Nigeriana.

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que foi denominado terrorista pelo Departamento de Estado dos EUA em 2008 (Navanti Group, 2013: 1; Blanchard, 2013: 2).

3.2.1 A Origem do Al-Shabaab A origem do Al-Shabaab remota aos anos 1970, quando um grupo chamado Al Salafiya al Jadiid foi estabelecido para opor o regime do líder autoritário General Mohamed Siad Barre, mas até ao fim dos anos 1970 a ameaça já havia sido eliminada. Com a contínua governação ditatorial de Siad Barre, foi formado mais um grupo islamita chamado Al Itihaad al Islamiya (AIAI) ou União Islâmica (UI) nos princípios dos anos 1980. O grupo que era formado primariamente por jovens que haviam estudado ou vivido no Médio Oriente, pretendia derrubar a ditadura de Siad Barre e formar um Estado islâmico que incorporaria todo Corno de África. Apesar de não ter alcançado o seu objectivo, conseguiu manter-se intacto até aos anos 2000 (Harnisch, 2010: 10).

Com a queda de Siad Barre, em 1991, a Somália entrou por definitivo num estado de completa anarquia, em que senhores de guerra em competição e conflitos armados duradoiros entre clãs impediram qualquer facção de tomar controlo suficiente para manter alguma estabilidade no país. Esta situação mergulhou a Somália num estado de endémica pobreza, destruição de infraestruturas e emergência de regiões semi-autónomas (Wise, 2011: 2). Para fazer face a este cenário de caos, surgiu uma rede de tribunais islâmicos que conseguiu estabelecer algum nível de lei e ordem em certas partes do país e que acabou recebendo apoio por boa parte dos Somalis a nível doméstico, assim como, ao nível da diáspora (Ploch, 2010: 6).

Os tribunais islâmicos diferiam em suas abordagens ideológicas, representando entre si diversas visões islâmicas de política, nacionalismo somali e identidade de clã (ibid.). Por este factor, encontrava-se entre os mesmos moderados como Sheik Sharif Ahmed e severos como Sheik Hassan Dahir Aweys. Este cenário traduziu-se em cada tribunal representar por si só um centro de poder, recrutando milícias para levar a cabo seus julgamentos (Wise, 2011: 3).

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Nos meados de 2004, 11 dos tribunais fundiram-se formando a União dos Tribunais Islâmicos (UTI)24 sob liderança do Sheik Ahmed e combinando assim, forças para fazer face aos senhores de guerra que já vinham controlando Mogadíscio pelos últimos 10 anos. Até 2006, a UTI havia conseguido derrubar os senhores de guerra, alcançado o controlo de Mogadíscio e procurado, em seguida, expandir-se pelo interior do país. Isto foi visto por parte de alguns membros como oportunidade para impor uma visão estrita da lei islâmica nas regiões sob seu controlo. Razão pela qual, em algumas regiões mulheres eram obrigadas a cobrir-se totalmente, ver futebol era proibido e os que não seguiam o islão eram brutalmente punidos (Wise, 2011: 3).

3.2.2. O Surgimento e a Radicalização do Al-Shabaab O Al-Shabaab surgiu como um braço miliciano dos tribunais islâmicos que foi formado nos anos 2003-2004 sob comando dos antigos AIAI que tinham lutado no Afeganistão. Diferentemente da tendência das outras milícias dos tribunais, que era baseada em clãs e suas agendas nacionalistas, o Al-Shabaab consistiu numa vontade única “irredentista” de unir as áreas inabitadas somalis num único califado islâmico (Ploch, 2010: 6).

Os projectos do Al-Shabaab para a Somália foram frustrados com as tentativas de estabelecer um Governo Federal de Transição (GFT)25. Este governo iria governar a Somália pelos 5 anos seguintes até as eleições, mas encontrou oposição por parte dos clãs, milícias, líderes islâmicos, bem como lutas internas que tornaram impossível estabelecer-se em Mogadíscio, movendo-se assim, para a cidade de Baidoa (Ploch, 2010: 7).

Assim, o surgimento do Al-Shabaab é justificado pela ausência de um governo central ou uma autoridade que impusesse ordem no cenário de caos e anarquia em que a Somália se encontra desde a queda de Siad Barre, em 1991. Contudo, o carácter jihad ou radicalista do Al-Shabaab é 24

A UTI foi o único organismo que conseguiu manter algum nível de estabilidade na Somália do Sul e Central. Isto através da sua governação que conseguiu transcender a identidade de clã se projectando como um governo muçulmano que atenuava os receios dos clãs governando com base na Shura ou um Concelho com representantes de todos clãs (International Crisis Group, 2012: 3). 25 O GFT foi criado no ano de 2004 em Nairobi depois de dois anos de negociações patrocinadas internacionalmente entre as facções em guerra na Somália. O GFT é o único interlocutor internacionalmente reconhecido, mas que lhe falta capacidade operacional e legitimidade interna. Isto porque o GFT é internamente visto como uma proxy da Etiópia que acoberta interesses Ocidentais na Somália (Africa Briefing Report, 2010: 6).

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justificado pela invasão Etíope em 2006-2009. Esta invasão ocorreu movida pelo receio de ver a Somália governada por um regime islâmico radical com pretensões nacionalistas que punham em causa parte do território Etíope (Navanti Group, 2013: 1 e 4).

Com a invasão Etíope, o Al-Shabaab apareceu como um símbolo nacional islâmico que se predispôs a fazer face à invasão estrangeira. Por esta razão, a liderança da Al-Qaeda não hesitou em apelar aos muçulmanos em todo mundo a responder a jihad na Somália e resistir contra a invasão dos cruzados estrangeiros. Este apelo foi renovado meses depois através do apoio moral ao Al-Shabaab para expulsar os estrangeiros e estabelecer um Estado islâmico na Somália (Healy and Hill, 2010: 5).

A invasão por tropas estrangeiras de alianças Ocidentais, foi instrumentalizada pelo Al-Shabaab para legitimar a sua causa e manter o recrutamento compulsivo de crianças para preencherem as suas fileiras. Este recrutamento é efectuado através de sequestros nas escolas e nas mesquitas. As crianças sequestradas são depois obrigadas a servir na linha da frente do campo de batalha sob ameaças de punição e morte (Human Rights Watch: 2012). Para além disto, o Al-Shabaab aproveita-se da condição de extrema pobreza ou de crise humanitária em que a Somália se encontra para aliciar novos recrutas com celulares e um salário mensal de 30 dólares26.

O Al-Shabaab recorre também aos meios modernos para mobilizar e gerar apoios para a sua luta. Um exemplo destes meios é o uso da mídia online para atrair, inspirar e radicalizar a juventude muçulmana somali na diáspora. Mas isto tudo através de apelos nacionalistas e de zelo islâmico manipulados de modo a inspirar as pessoas a pensar que o Al-Shabaab é sinónimo da independência somali e é a vanguarda jihadi de um verdadeiro islão em África. Deste modo, é instrumentalizando o nacionalismo somali e a preservação de uma identidade islâmica ameaçada por forças Ocidentais que o Al-Shabaab consegue o apoio necessário manter a legitimidade de continuar a cometer terror em nome da Somália e da preservação da sua identidade.

26

http://www.telegraph.co.uk/news/worldnews/africaandindianocean/somalia/9185534/Teenage-girl-suicidebomber-blows-up-Somalia-theatre.html. consultado no dia 09 de Janeiro de 2014 pelas 22h34min.

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3.2.3. As Ligações Externas do Al-Shabaab O Al-Shabaab encontra-se ligado à Al-Qaeda desde o ano de 2008. A prova disto foram os comunicados públicos no portal de internet do Al-Shabaab, nos quais demonstrou apoio a jihad levada a cabo pela Al-Qaeda contra o Ocidente, em especial os EUA. Isto lhe conferiu reconhecimento pela Al-Qaeda como parte da sua jihad em forma de comunicados de apreciação da sua luta na Somália. Esta relação com a Al-Qaeda teve impacto sob ponto de vista de métodos ou tácticas usadas pelo Al-Shabaab (através do início do emprego de DEI’s e ataques-suicida), mas também sob ponto de vista ideológico, pois verifica-se que o Al-Shabaab começou a evitar slogans nacionalistas e a bandeira nacional somali em favor de uma bandeira preta que ostenta a Shahaada ou declaração de fé num texto branco (Shinn, 2011: 207 e 208).

Fig.1: Combatentes do Al-Shabaab com a Shahaada ou declaração de fé no lugar da bandeira somali, na primeira fotografia e, na segunda fotografia, combatentes do Al-Shabaab em treinamento erguendo uma bandeira de batalha islâmica.

Fonte: Navanti Group (2013: 1) retirado de Barigaafrika.net e do Africanarguments.org

Nestas imagens há uma demonstração clara das mudanças sofridas devido à alianças com a AlQaeda. Isto porque em ambas, ao invés de ostentar a bandeira somali, como era suposto, os combatentes do Al-Shabaab começaram a ostentar símbolos de jihadis islâmicos.

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Os outros grupos com quem o Al-Shabaab tem ligações são: o Grupo da Juventude Muçulmana (GJM)27 no Quénia e o Centro Juvenil Muçulmano de Ansar (CJMA)28 em Tanzânia. Através dos quais materializa a sua ambição de expandir estrategicamente no Oriente Africano, bem como, mantém também contacto com o Boko Haram da Nigéria, na África ocidental, ao qual oferece treinamento (Navanti Group, 2013: 9).

3.2.4. As Fontes de Financiamento do Al-Shabaab No que diz respeito às fontes de financiamento, Foster-Bowser e Sanders (2012: 7) dizem que segundo o Relatório do Grupo de Monitoria do Conselho de Segurança das Nações Unidas na Somália e Eritreia, constata-se que o grupo anualmente conta com cerca de 70 a 100 milhões de dólares colectados através de operações de taxa e extorsão nas regiões sob seu controlo, sobretudo, da exportação de carvão vegetal e do contrabando na fronteira com o Quénia. Este relatório fala também de comércio, contrabando, apoio da diáspora e assistência externa do AlQaeda.

O Al-Shabaab financia-se também através de operações no East Leigh, uma zona localizada na região central de Nairobi. Esta é uma zona económica e comunitária muito conhecida para os somalis desalojados, sobretudo os que vêem do campo de refugiados de Dadaab no Quénia. Nesta zona, o Al-Shabaab mantém operações e tem um envolvimento financeiro directo com muitos empresários, de tal modo que, a maioria das lojas, cafés e negócios de construção de mesquitas são de pertença ou se encontram afiliados ao Al-Shabaab (Sipus, 2010: 29). Para além destas formas de financiamento, Navanti Group (2013; 9) aponta para apoio logístico em forma de contentores de armamento e treinamento concedidos pela sucursal da Al-Qaeda no Iémen, AlQaeda na Península Arábica (AQAP)29, ao Al-Shabaab.

27

Muslim Youth Group (MYC) em inglês. AnsarMuslim Youth Center (AMYC) em inglês. 29 Al-Qaeda Arabian Península (AQAP) em inglês. 28

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CAPÍTULO – 4. BOKO HARAM E AL-SHABAAB COMO AMEAÇA À SEGURANCA E ESTABILIDADE POLÍTICA DA NIGÉRIA E DA SOMÁLIA.

As ameaças à segurança de um Estado podem ser vistas numa visão restrita e noutra alargada. A visão restrita diz que as ameaças à segurança do Estado são de carácter militar e vindas dos outros Estados, enquanto a visão alargada olha para as ameaças sob um ponto de vista mais extenso, ou seja, as ameaças à segurança de um Estado podem vir de actores não estatais e, inclusive, a nível interno do Estado, como é o caso de cartéis de narcotráfico, corporações multinacionais, Organizações Não Governamentais (ONG’s) e movimentos terroristas, como é o caso do Boko Haram e do Al-Shabaab (Anyedike, 2013: 13).

Para Estados como a Nigéria, manter a segurança nacional implica proteger as vidas e as propriedades dos Nigerianos, preservar a sua soberania, a sua integridade territorial e a sua economia, fortificando, deste modo, a harmonia sócio-cultural e política. Para o efeito, a Nigéria adoptou o conceito de segurança total, que abarca a defesa total, a diplomacia e a segurança interna (Ogbonnaya, 2013: 6).

Este capítulo aborda os movimentos terroristas Boko Haram e Al-Shabaab como ameaça à segurança e estabilidade política da Nigéria e da Somália em dois subcapítulos. O primeiro aborda o Boko Haram como ameaça à segurança e estabilidade política da Nigéria. Neste subcapítulo, são demonstrados os alvos, métodos e objectivos que fazem do Boko Haram uma ameaça à Nigéria. Em seguida, são apresentadas as implicações das suas acções para a segurança e estabilidade política nigeriana, a luta contra o Boko Haram e, por fim, as perspectivas sobre o futuro do Boko Haram.

O segundo subcapítulo aborda o Al-Shabaab como ameaça à segurança e estabilidade política da Somália. Neste subcapítulo, são demonstrados os alvos, os métodos e os objectivos que fazem do Al-Shabaab uma ameaça à Somália. Em seguida, são apresentadas as implicações das suas acções para a Somália, a luta contra o Al-Shabaab e, por fim, as perspectivas sobre o futuro do Al-Shabaab.

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4.1. Boko Haram como Ameaça à Segurança e Estabilidade Política da Nigéria O Boko Haram é uma séria ameaça à segurança e estabilidade política da Nigéria. Esta situação observa-se através da frequência e magnitude das acções de terrorismo contra alvos públicos e privados que resultam em danos graves à estrutura política, económica e social Nigeriana, sobretudo depois de 2009 quando houve o retorno ao radicalismo. O Boko Haram é considerado na actualidade política nigeriana a maior ameaça à segurança e estabilidade política quando comparado com as acções dos outros grupos violentos e criminosos que actuam na Nigéria, como é, por exemplo, o caso do MIDN, os grupos de crime organizado que operam no Sul da Nigéria e os casos de violência etno-religiosa concentrada no Norte. As evidências disto estão representadas no gráfico abaixo.

Gráfico 1: Proporção de ataques atribuídos ao Boko Haram em relação aos outros grupos violentos de 2008 para 2011.

Fonte: Instituto para o Estudo de Grupos Violentos (Forest, 2012: 66).

No gráfico, a linha contínua ilustra a tendência crescente das actividades terroristas violentas do Boko Haram em relação aos outros grupos violentos, representados pela linha tracejada, cuja expressão violenta baixou a partir de 2008. O aumento explosivo das acções violentas do Boko Haram em 2010 resulta do incremento nas suas actividades em 2009. Neste incremento, o Boko Haram começou a fazer ataques violentos numa base quase diária, com recurso a métodos mais mortíferos. Isto tornou-se mais preocupante porque a abrangência geográfica dos seus ataques evoluiu de uma situação em que os alvos estavam circunscritos às cidades do Nordeste da Nigéria, como Bauchi, Borno, Yobe, Plateau e Kaduna, mas com maior frequência para Maiduguri, Damaturu, Bama e Potiskum, para cidades das regiões Oeste e Sul da Nigéria, como Kano, Jos, Gombe e a capital Abuja (Forest, 2012: 67). Nessa altura, o alargamento da acção 36

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terrorista fez com que o Boko Haram deixasse de ser um problema de violência localizada e tratado como problema de segurança pública, passando a ser considerado violência política e ameaça à Segurança Nacional.

Fig.2: Mapa da Nigéria com representação das áreas de abrangência dos ataques do Boko Haram

- Áreas anteriormente abrangidas pelos ataques do Boko Haram - Novas áreas abrangidas pelos ataques do Boko Haram

O mapa apresenta o alargamento geográfico das acções terroristas e violentas do Boko Haram. As áreas representadas pela Estrela representam as áreas anteriormente abrangidas pelos ataques do Boko Haram e as áreas marcadas pelo Sol, representam as novas áreas às quais o Boko Haram actualmente consegue atingir com os seus ataques.

4.1.1. Acções Terroristas do Boko Haram As acções terroristas do Boko Haram podem ser vistas em duas fases importantes da história do movimento, a primeira fase entre 2002 - 2009 e, a segunda fase, a partir de 2009 em diante.

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4.1.1.1. A Primeira Fase (2002 - 2009) A primeira fase teve início em 2002 com a criação do movimento. Contudo, o primeiro ataque foi efectuado em Dezembro de 2003 na aldeia de Kanama, perto das instalações do Boko Haram no Estado de Yobe. Este ataque foi, alegadamente, motivado por uma disputa por direitos de pesca numa lagoa local, resultando num conflito com a polícia que teria culminado em cerca de 30 mortes. Junto disto, aponta-se sequestros de aldeões forçando-os a juntarem-se ao grupo (Cook, 2009: 9). Neste período de actividades, constata-se que a concentração dos ataques efectuados pelo Boko Haram verifica-se na região de Maiduguri (Sul, Este ou Norte) e na região próxima da fronteira do Níger (Cook, 2009: 10).

4.1.1.1.1. Os Alvos Os Alvos do Boko Haram nesta fase são basicamente instalações governamentais como esquadras de polícia e cadeias com a finalidade de obter armamentos e de libertar os membros do grupo que tivessem sido presos pela polícia. Mas também, o Boko Haram atacava a população forçando-a a juntar-se ao movimento (Cook, 2009: 10). Esta forma de agir já representava uma postura clara de confrontação da autoridade do Estado nigeriano na região Norte e conferiu uma melhoria nas capacidades militares do Boko Haram sempre que conseguiam assaltar os paióis das Forças de Defesa e Segurança.

4.1.1.1.2. Os Métodos Os métodos usados pelo movimento na primeira fase são de um repertório limitado. Destes podese destacar raids contra esquadras de polícia com recurso a AK 47’s e execuções, tal como aconteceu no ataque à uma escolta policial de 60 homens em Kala-Balge, no Lago Chade, que resultou em 12 polícias levados como reféns e posteriormente executados (Ibid.: 11). Esta forma de proceder garantiu uma melhoria substancial no armamento do Boko Haram, mas também hostilizou demasiado as relações entre o movimento e as autoridades governamentais, traduzindo-se assim numa interacção do tipo soma-zero que resultava sempre no uso acrescido de violência entre as partes. Aqui, os ataques do Boko Haram conseguiam induzir medo, tanto nas Forças de Defesa e Segurança, assim como na população, que ia sentindo-se cada vez mais vulnerável ao recrutamento forçado do Boko Haram.

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4.1.1.1.3. Os Objectivos Os objectivos do Boko Haram na primeira fase eram de formar uma comunidade separatista guiada por princípios islâmicos radicais e que não sofresse interferência do Estado. Para o efeito, o grupo iniciou uma hijra (algo semelhante à mudança do profeta Mohamed de Meca para Medina) se mudando de Maiduguri para a aldeia de Kanama, no Estado de Yobe, onde posteriormente o seu líder começou a expor uma ideologia anti-estatal apelando aos restantes muçulmanos a juntar-se a ele e a viver sob as leis do verdadeiro islão, com a finalidade de formar uma sociedade mais “perfeita” e distante da corrupção (Walker, 2012: 3). Em termos declaratórios, este objectivo parece expressar uma simples vontade de instalação de valores do islamismo na sociedade nigeriana, mas em termos operacionais, sob os preceitos de violência política, este objectivo não passa do início da concretização do objectivo maior, que é a alteração da ordem constitucional por via da instalação de um Estado islâmico guiado pela sharia.

4.1.1.2. A Segunda Fase (2009 em diante) A segunda fase operacional do Boko Haram teve início em 2009 em sucessão de uma trégua informal com as autoridades governamentais Nigerianas. Esta fase eclodiu após um assalto surpresa das Forças de Defesa e Segurança a um esconderijo do Boko Haram no Estado de Bauchi, que suscitou nos cinco dias seguintes, ataques de represália contra a polícia e motins que se alastraram a Bauchi, Kano, Yobe e Borno. As Forças de Defesa e Segurança reagiram, cercando e atacando a mesquita do grupo em Maiduguri e a violência só terminou após Mohammed Yusuf, até então líder do Boko Haram, ser capturado, espancado, interrogado e, por fim, morto a tiro, alegadamente ao tentar fugir. Esta situação terminou com um balanço de mais de 700 mortes e destruição de diversos edifícios públicos, nomeadamente: instalações governamentais, esquadras de polícia, escolas, mesquitas e igrejas (Pham, 2012: 3).

Depois do ataque, com a perda da maioria dos seus líderes e principais apoios financeiros, incluindo Alhaji Buji Foi, antigo comissário para os assuntos religiosos no estado de Borno, o movimento desapareceu das notícias e diversos analistas deram-no por completamente derrotado, ou mesmo extinto. Porém, este período de suposta vitória das autoridades governamentais conheceu fim no ano seguinte com a escalada da violência (Ibid.). Esta escalada manifestou-se com a invasão que o Boko Haram fez à uma prisão no Estado de Bauchi e que teria resultado na 39

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libertação de 750 presos, dos quais mais de 100 eram membros do Boko Haram (Marchal, 2012: 5).

A nova fase do Boko Haram é caracterizada por alianças do movimento com a AQIM e o AlShabaab através de treinamentos. Para além disso, observa-se uma mudança no discurso do Boko Haram, pois no novo discurso o movimento fala de cometer terror contra todos “símbolos da cultura ocidental”, chegando a associar a sua luta ao combate jihad no mundo (Pham, 2012: 4).

4.1.1.2.1. Os Alvos No que diz respeito aos alvos, verifica-se uma espécie de continuidade e inovação. O elemento de continuidade reside nos ataques a edifícios públicos (como esquadras, cadeias e serviços de migração), cidadãos de forma isolada, sobretudo políticos e oficiais do Estado, tal como aconteceu com o assassinato do candidato a governador do Estado de Borno em Janeiro de 2011 e com a tentativa de assassinato ao Inspector-geral da FPN.

O Boko Haram também aumenta a violência sectária através dos ataques aos cristãos e às igrejas, com destaque ao seu maior ataque em Julho de 2009 em Maiduguri contra clérigos e elites ocidentalizadas, o que gerou cerca de 700 mortes e 5000 deslocados (Pothuraju, 2012: 4). Para além disto, o Boko Haram ataca também crianças, o que amplia a repercussão das suas acções na sociedade (através do terrorismo psicológico) e, mais importante, no poder político.

O elemento de inovação diz respeito aos ataques a escolas, edifícios de OI’s, como os escritórios da ONU em Abuja, infra-estruturas de comunicação, bares, líderes tradicionais e a mídia nigeriana (Mahmood, 2013: 2). Estes ataques todos representam um aumento indiscriminado na quantidade e qualidade dos alvos do movimento. Deste modo, a luta do Boko Haram é feita contra qualquer um que aos seus olhos esteja a ferir os princípios islâmicos da sharia.

4.1.1.2.2. Os Métodos No concernente aos métodos, o Boko Haram mostra na segunda fase uma inovação, sobretudo com as influências dos outros movimentos terroristas como a AQIM e o Al-Shabaab. Esta inovação pôde ser vista com o início do emprego de carros armadilhados (táctica usada no ataque 40

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às instalações da ONU em Abuja e que continua sendo usada em ataques contra igrejas), assaltos altamente coordenados e com homens fortemente armados em motorizadas e triciclos para intimidação de cidades (Damatum e Potiskum em 2011), DEI’s feitos com base em latas de refrigerantes e o recurso às Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC’s) para ampliar o efeito das suas acções e aumentar o número de adeptos à sua causa (Mahmood, 2013: 3).

Outro dado adicional é o aumento no uso dos ataques-suicida. O Instituto para o Estudo de Grupos Violentos e o Nigerian Media Report registaram, só no dia 14 de Maio de 2013, cerca de dezasseis ataques-suicida diferentes com envolvimento do Boko Haram (U.S. House of Representatives Committee on Homeland Security, 2013: 18). Isto fora a estratégia do Hit and Run contra postos de controlo de polícia em Borno e Yobe, explosões de mercados (tal como aconteceu no natal de 2010 em Jos, no Estado de Plateau), roubos a bancos, assaltos a carrosforte e a empresários (Walker, 2012: 5).

O U.S. House of Representatives Committee on Homeland Security (2013: 19) aponta que com a queda do regime de Qadhafi, durante a Primavera Árabe na Líbia, o Boko Haram possivelmente tenha conseguido adquirir armamento sofisticado, tal como é o caso dos mísseis terra-ar disparados do ombro SA-7 e SA-24 com capacidade de derrubar aviões durante a sua descolada e a sua aterragem. Este avanço em capacidades também foi demonstrado em avanços na sua área de actuação, pois, começando com o canto Noroeste da Nigéria, o Boko Haram começou a lançar ataques no Estado de Sokoto, no Estado de Kogi, enquanto aumentava os seus ataques nas regiões centrais de Kano, Kaduna, Bauchi e Plateau (Mahmood, 2013: 4).

4.1.1.2.3. Os Objectivos No que diz respeito aos objectivos do Boko Haram, o autor Suleiman (2011)30 citado por Adenrele (2012: 22), faz menção a uma declaração feita pelo movimento em Abril de 2011, na qual fica claro que o seu objectivo é abolir a Democracia e instituir a lei da Sharia na Nigéria. Nestes termos, o Boko Haram continuaria a “lutar até que o islão estivesse bem estabelecido e os muçulmanos reconquistassem sua liberdade por toda a Nigéria, sem vontade nenhuma de

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Suleiman, T. (2011) Living in the shadows of Boko Haram. Tell magazine. November 21st, 2011. 45.

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compromisso e nenhuma necessidade de amnistia, pois a única solução para o que está a acontecer é o governo desistir, abandonar a democracia, queimar a constituição e adoptar leis do sagrado Corão”. Para alcançar este objectivo, Forest (2012: 83) diz que o Boko Haram procura provocar um conflito no Middle Belt31, que é onde as diferenças Norte-Sul são mais acentuadas e onde o poder político se encontra situado, a fim de criar uma desestabilização total no Estado Nigeriano. Isto explica a expansão dos seus ataques para Abuja, a capital da Nigéria, pois é atacando a capital que o Boko Haram consegue ganhar a dimensão política que precisa para fazer ecoar a sua causa, que é mais política do que religiosa.

4.1.2. Implicações das Acções do Boko Haram para a Segurança e Estabilidade política da Nigéria O Boko Haram é a maior ameaça à segurança e estabilidade política da Nigéria. Isto deve-se à frequência (diários), a letalidade e a abrangência geográfica dos seus ataques. As acções de terrorismo do Boko Haram têm implicações no nível social, económico e político. No nível social, Gaspar32 destaca a condição de constante medo e incerteza a que as populações são submetidas através do receio que têm dos ataques que o Boko Haram tem efectuado. Udama (2013: 112) acrescenta o número de óbitos resultante dos ataques diários que o Boko Haram efectua em espaços públicos e privados (até o ano de 2012 mais de 50 000 pessoas morreram vítimas dos ataques terroristas do Boko Haram), o número de deslocados que por temerem ser vítimas das acções do Boko Haram abandonam as suas casas, e a perpetuação do ciclo de violência etno-religiosa através dos ataques que efectua contra igrejas e cristãos. Ainda, os ataques do Boko Haram criam desestruturação, desgraça e intranquilidade no seio das famílias nigerianas. No nível económico, Tochukwu (2013)33 diz que os sequestros, assassinatos e destruição de infra-estruturas efectuados pelo Boko Haram geram uma retracção de investimentos e de 31

O Middle Belt corresponde à região central da Nigéria, representa a fronteira entre o Norte Muçulmano e o Sul Cristão, o que faz do middle belt uma região fortemente miscigenada e onde as diferenças entre as duas regiões podem melhor ser manipuladas de modo a gerar um conflito sem precedentes. 32 Director do Centro de Estudos Estratégicos Internacionais (CEEI) e Docente da Cadeira de Estudos de Paz e Conflitos no ISRI, entrevistado aos 26 de Fevereiro de 2014, em Maputo. 33 http://www.fairobserver.com/article/boko-haram-and-its-economic-consequences consultado no dia 13 de Fevereiro de 2014 pelas 12h03 min.

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investidores. Isto reflectiu-se na redução do Investimento Directo Estrangeiro (IDE) em cerca de 21.3% de 2011 para 2012, o que pode ser quantificado numa descida de 8.9 biliões de dólares em 2011 para 7 biliões de dólares em 2012. Esta situação perspectiva-se que piore, tendo em conta a expansão das acções do Boko Haram e o facto de que as áreas de investimento afectadas pelas acções terroristas são as áreas do petróleo e do gás, áreas fulcrais para a sobrevivência económica Nigeriana. Ademais, a constatação que também se faz é de que o Boko Haram mina as possibilidades de se melhorar o desenvolvimento da região Norte da Nigéria. Isto porque dificulta, não apenas o investimento, que iria reduzir o desemprego e a condição de extrema carência da região, como também a presença do governo, o que se reflectiria na implementação de vários projectos de desenvolvimento que possivelmente reduziriam a propensão ao radicalismo motivado ou instrumentalizado com base em questões de extrema carência (Udama, 2013: 112 e 113).

No que diz respeito ao nível político, teme-se que com a incapacidade das forças de defesa e segurança lidarem com o Boko Haram o poder político possa perder por definitivo o controle da região Norte da Nigéria. Esta incapacidade é manifestada em excesso de violência por parte das autoridades sempre que reagem a uma acção terrorista do Boko Haram, pois muitas vezes reagem contra a população, o que conduz a uma perda de legitimidade por parte das autoridades perante o povo da região (Udama, 2013: 113). Igualmente, constata-se que com a frequência de roubos, assaltos e assassinatos (mais de 15 000 mortes de Homens da defesa e segurança até 2013) efectuados contra as forças de defesa e segurança, o Boko Haram está a danificar a capacidade de resposta do Estado e a aumentar a sua vulnerabilidade face a outro tipo de ameaças.

Para além da fragilização das instituições de soberania, tanto as civis, assim como as militares, Jamal34 aponta que o Boko Haram põe em causa a coesão nacional nigeriana. Isto através da fomentação da violência sectária e do espírito secessionista no seio da sociedade Nigeriana. Aqui, é importante ressalvar que a Nigéria vive até hoje o trauma da tentativa violenta

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Chefe do Departamento de Relações Internacionais e Docente das cadeiras de Teoria de Relações Internacionais e Negociação no ISRI, entrevistado aos 04 de Março de 2014 em Maputo.

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secessionista de 1967-1970, em Biafra.

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Sobretudo, porque ainda prevalece muita

instrumentalização das identidades étnicas na Nigéria.

Em suma, as acções do Boko Haram ameaçam a segurança dos indivíduos, a segurança pública, a segurança económica, a segurança política e, como consequência, a segurança e estabilidade política da Nigéria. Isto porque põe em causa a vida das pessoas, o ambiente de governabilidade, o sentido de Estado e o desenvolvimento económico necessário para fortalecer a Nigéria, tornando a região Norte uma região onde a presença do Estado tende a se tornar cada vez mais fracassada. Neste sentido, a probabilidade de existência de focos geográficos sob Estado de medo e de emergência pode se alargar, levando ao retorno ao intervencionismo abusivo militar que é mau para os processos democráticos de qualquer Estado.

4.1.3. A Luta contra o Boko Haram A luta contra o Boko Haram é chave para dar fim ao terrorismo na Nigéria e aumentar a segurança e estabilidade política do Estado. Contudo, o Estado nigeriano tem se mostrado pouco efectivo, pois, traduz o seu modus operandi sempre em excesso de violência contra qualquer suspeito de fazer parte do movimento. Isto tem resultado numa perda de legitimidade e confiança perante a população do Norte, que é quase sempre vitimada pelas retaliações das Forças de Defesa e Segurança.

Para Adenrele (2012: 25), um combate efectivo contra o Boko Haram exigiria que o governo investisse num programa de alívio de pobreza bem estruturado e integrar as escolas Almajiris no sistema nacional de educação, bem como os próprios professores. Isto se traduziria na redução do sofrimento do grupo, ao invés de usar a mão dura que já foi causa do retorno do radicalismo em 2009, como o governo tem feito nos últimos tempos através de ataques constantes ao movimento, o que é sempre respondido com um nível acrescido de violência (Thomson 2012: 56).

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Entretanto, para Cook (2011: 24) e para Jamal35 uma resposta efectiva contra o Boko Haram seria traduzida no uso da força. Para Cook, é preciso, antes de mais, reconhecer que a primeira tentativa de uso da força agravou o comportamento do movimento em 2009. Neste sentido, Cook vê a necessidade do uso da força em termos judiciais com possibilidade de amnistia, algo que funcionou na situação do Delta do Níger em 2009, pois o crescimento do movimento tem se verificado na instabilidade e no caos que o mesmo promove tornando certas regiões ingovernáveis e favoráveis ao planeamento das suas actividades. Para Jamal, o uso da força deveria ser acompanhado de estudos concretos do movimento, para depois combinar um conjunto de acções que envolveriam a criação de uma propaganda anti-Boko Haram e, se necessário, abrir-se portas para a via negocial.

Marchal (2012: 5) diz que uma campanha efectiva seria conseguida através da conquista dos corações e das mentes dos povos do Norte da Nigéria por parte das Forças de Defesa e Segurança, pois, a despeito da insegurança criada pelo Boko Haram através dos assassinatos levados a cabo, as forças de segurança e defesa tem fracassado em fazer progressos na questão, pois atacam com brutalidade e indiscriminação tal que geram revolta nos Nigerianos do Norte. Por consequência, o Boko Haram consegue levantar o sentido de injustiça que precisa ser tido em conta se as forças de segurança pretendem angariar apoio local para combater o movimento. O posicionamento de Marchal é também defendido por Gaspar36. Porém, para Gaspar a conquista de mentes e corações das populações seria feita através de uma combinação de estratégias ao nível das forças de defesa e segurança numa frente militar, junto de políticas de desenvolvimento no Norte de modo a reduzir as assimetrias económicas, que são um forte factor de mobilização. Neste sentido, pode-se aferir que uma resposta efectiva contra o Boko Haram deveria ser resultado de um conhecimento profundo do movimento, através do qual, estratégias no campo militar, económico e político seriam desenvolvidas de forma a destruir o movimento militarmente, ao mesmo tempo que destrói-se as condições ou o ambiente social que favoreceu

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Chefe do Departamento de Relações Internacionais e docente das cadeiras de Teoria de Relações Internacionais e Negociação no ISRI, entrevistado aos 04 de Março de 2014 em Maputo 36 Director do CEEI e docente da cadeira de Estudos de Paz e Conflitos no ISRI, entrevistado aos 26 de Fevereiro de 2014, em Maputo.

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ao seu surgimento. Em seguida, abrir-se-ia um espaço de negociação ou de amnistia para os membros do movimento que estivessem dispostos a abandonar o terror.

4.1.4. Perspectivas para o Boko Haram O Boko Haram tem revelado ser um movimento terrorista com amplas capacidades de desestabilizar a Nigéria sem sofrer consequências profundas das suas acções. Isto associado ao aumento na sua cobertura geográfica e na qualidade dos seus métodos, sem perspectivas de contenção por parte das autoridades, faz do Boko Haram um movimento que constitui uma ameaça crescente à segurança e estabilidade política da Nigéria.

Para além do nível doméstico, o Boko Haram é um movimento com amplas possibilidades de crescimento pela região, sobretudo tomando em consideração as relações geográficas, culturais e étnicas que o Boko Haram partilha com os Estados vizinhos da Nigéria (Níger, Chade e Camarões), que sob ponto de vista de ambiente político-social podem acabar fornecendo o mesmo ambiente fornecido pela Nigéria para o surgimento de movimentos islâmicos radicais nestes Estados. Porém, estudiosos de Paz e Conflitos como Gaspar37 defendem que tomando em conta os outros casos de movimentos com praticamente mesmas finalidades na Europa (ETA e IRA), o Boko Haram poderá à longo prazo desaparecer ou mudar as suas formas de actuação. Dado que o contexto em que o mesmo desenvolveu a sua ideologia pode mudar (tanto ao nível da liderança, da economia e da sociedade nigeriana) e descobrir, por exemplo, que a melhor forma é a coexistência, uma vez que, do mesmo jeito que os homens mudam, as organizações também mudam. Para o efeito, é preciso que as condições sócio-económias e políticas nigerianas melhorem de modo a retirar o factor de descontentamento e mobilização, pois, se a situação prevalecer, é provável que o Boko Haram morra como movimento político, mas nada garante que não irão surgir outros movimentos iguais ou piores que o Boko Haram.

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Director do CEEI e docente da cadeira de Estudos de Paz e Conflitos no ISRI, entrevistado aos 26 de Fevereiro de 2014, em Maputo.

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4.2. Al-Shabaab como Ameaça à Segurança e Estabilidade Política da Somália O Al-Shabaab é um movimento que foi criado e se afirmou num contexto de Estado falhado, ou de ausência de uma autoridade governamental na Somália. Por isso, não se pode afirmar que é uma ameaça à segurança e estabilidade política da Somália, mas sim, é uma ameaça à possibilidade de segurança e estabilização política somali. Isto porque vários esforços na tentativa de estabelecer um governo efectivo foram empreendidos na Somália e, apesar da existência de vários grupos violentos, a maior adversidade encontrada foi o Al-Shabaab. Neste contexto, o Al-Shabaab constitui um obstáculo à possibilidade de segurança e estabilidade política na Somália de duas formas. Primeiro, como a principal força de resistência ao estabelecimento do GFT e, segundo, devido às suas pretensões “irredentistas” associadas às alianças que o mesmo mantém com movimentos jihadis globais como por exemplo, a Al-Qaeda.

Como a principal força de resistência às tentativas de implementação de um governo Central que pudesse impor algum nível de lei, ordem e organização na sociedade somali, o Al-Shabaab não tem cessado ataques contra oficiais do GFT, contra as tropas da AMISOM e todas as milícias que procuram reforçar a presença do GFT na Somália. Nestes ataques, o Al-Shabaab chega a cometer atentados contra o presidente do GFT, Hassan Sheik Mohamud.

Como movimento parte da grande jihad global com pretensões irredentistas de unir os territórios dos Estados vizinhos do Quénia, da Etiópia e do Djibuti habitados por somalis, o Al-Shabaab tem levantado receios de ver o espectro do terrorismo e da radicalização se desenvolver nos territórios dos Estados vizinhos. Deste modo, para preservar os seus interesses nacionais, estes Estados sempre irão intervir na Somália para garantir que o radicalismo não se expanda e nem tome parte das suas terras. Esta situação agrava as condições de segurança existentes na região e resulta na tentativa dos Estados vizinhos procurarem impor suas soluções ao problema somali, o que o torna mais difícil de ser resolvido.

A posição que defende que o Al-Shabaab é a principal ameaça à possibilidade de segurança e estabilidade política na Somália, não é igualmente defendida por International Crisis Group (2012: 1). Para este autor, o surgimento de competições entre clãs e de Senhores de Guerra é igualmente um problema sério. Isto porque a tentativa de fortalecer o GFT e o aparato de 47

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segurança na Somália não é uma iniciativa recente. Porém, estas iniciativas, anteriores e actuais, falharam em trazer a estabilidade devido ao facto de muitos clãs não apoiarem o restabelecimento de um governo central forte.

A posição do International Crisis Group é factual. No entanto, as acções dos outros grupos não assumem as mesmas nuances que as acções do Al-Shabaab assumem. Isto porque não conseguem ter o mesmo nível de organização, forças, apoio e controle territorial que o AlShabaab conseguiu ter e nem conseguem protagonizar atentados na escala que o Al-Shabaab protagoniza. Neste sentido, o Al-Shabaab ainda é a maior facção armada que resiste ao estabelecimento do GFT, sobretudo, tomando em conta as suas acções terroristas.

4.2.1. Acções Terroristas do Al-Shabaab O Al-Shabaab, apesar de ter sido formado nos anos 2003-2004 e ter iniciado as suas actividades na mesma época sob autoridade da UTI, é visto como um movimento terrorista com actividades registadas a partir de 2006, ano em que começou a agir de forma independente. Com isto, as acções terroristas do Al-Shabaab são vistas em dois momentos ou fases essenciais, a primeira fase entre 2006-2008 e, a segunda fase, de 2009 em diante.

4.2.1.1. A Primeira Fase (2006-2008) Na primeira fase o Al-Shabaab transforma-se na maior força de resistência e de apoio à UTI devido a factores de ordem doméstica e externa. Nos factores de ordem doméstica, aponta-se para a falta ou ausência de um governo dominante que impusesse a sua autoridade sobre o Estado somali. Isto permitiu que o Al-Shabaab explorasse a geografia da Somália para construir uma rede de campos de treinamento e estabelecer um sistema de taxas e extorsão para gerar fundos, bem como, para prestar serviços do Estado à comunidade, o que conferiu um alto grau de legitimidade popular até para recrutar membros para as suas fileiras (Wise, 2011: 4).

Nos factores de ordem externa, aponta-se para a intervenção Etíope em 2006, que conduziu a uma maior militarização, radicalização, bem como ao desenvolvimento da ideologia, do recrutamento, da estratégia operacional e de parcerias que transformaram o grupo de movimento islâmico de pequena expressão para a maior facção radical armada do país (Wise, 2011: 4). 48

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4.2.1.1.1. Os Alvos Os alvos do Al-Shabaab na primeira fase são as forças invasoras da Etiópia, que combatiam as forças da UTI e ajudaram a estabelecer o GFT e, o próprio GFT, através de assassinatos aos seus oficiais civis que, para a narrativa do Al-Shabaab, representam os interesses Ocidentais na Somália (Downie, 2013: 2). Este tipo de forma de agir permitiu uma fragilização do GFT e serviu para deixar clara a mensagem do Al-Shabaab, que é a não tolerância à nenhuma outra autoridade na Somália para além da sua.

4.2.1.1.2. Os Métodos Os métodos terroristas do Al-Shabaab nesta fase são muito limitados. Isto porque durante parte deste período o Al-Shabaab existia como um grupo subordinado à UTI. No entanto, para fazer face às forças etíopes em 2007 e 2008, o Al-Shabaab recorria à estratégias do hit and run, ao uso de DEI’s, aos assassinatos e aos bombardeios (Wise, 2011: 3).

Quando iniciou a sua luta como parte da jihad global, em meados de 2007, as tácticas de terror foram posteriormente inovadas. Desta inovação, pode-se destacar raids, emboscadas, minas terrestres, ataques-suicida e carros-armadilhados contra as forças etíopes, oficiais do GFT e seus aliados somalis (Healy and Hill, 2010: 5 e 6). Este tipo de tácticas deu um grande impulso à imagem e autoridade do Al-Shabaab na Somália, pois o movimento conseguia fazer face às forças estrangeiras numa dimensão que as vezes envolvia engajamentos directos.

4.2.1.1.3. Os Objectivos O principal objectivo do Al-Shabaab nesta fase, era de unir a Somália e formar um único Estado islâmico governado de acordo com a lei islâmica da Sharia, sob o pretexto do Nacionalismo Somali (Dagne, 2011: 6). Para o efeito, o Al-Shabaab procurou combater ou mitigar os conflitos existentes entre os diferentes clãs e unir a Somália sob sua liderança. Porém, este objectivo tornou-se inalcançável devido à postura do Al-Shabaab face aos clãs, isto é, através de alianças militares e Económicas baseadas em identidade de clã, bem como, pela intervenção de actores externos na Somália, em particular a invasão Etíope que conseguiu, temporariamente, fortalecer a presença do GFT ao combater o Al-Shabaab (Navanti group, 2013: 5).

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4.2.1.2. A Segunda Fase (2009 em diante) A segunda fase caracteriza-se pela existência de alianças com a Al-Qaeda e consequente declaração de cometer terror contra alvos ocidentais como a AMISON e o GFT, que tinham o apoio dos EUA. Esta fase é também caracterizada pelo forte uso das TIC’s, em particular a internet, que foi e tem sido um instrumento muito favorável para conseguir doações da diáspora e também para conseguir recrutar operativos no estrangeiro através da promoção da causa e das acções do movimento em vídeos. Para além disso, foi nesta fase que o Al-Shabaab conseguiu tomar controlo das regiões Sul e Central da Somália, concretamente em 2010, estabelecendo um governo central e instituindo uma cadeia de comando que controlava centenas de lutadores e geria o território num nível local e nacional (Wise, 2011: 4; Navanti Group 2013: 7).

4.2.1.2.1. Os Alvos Na segunda fase, os alvos do Al-Shabaab combinam finalidades que o definem como movimento nacionalista, com finalidades que o definem como parte da jihad global da Al-Qaeda. Como movimento nacionalista, o Al-Shabaab ataca o GFT, as forças da AMISOM, as forças Quenianas e Etíopes que procuram retirar o Al-Shabaab do cenário político somali. Como movimento que faz parte da jihad global, o Al-Shabaab declarou luta contra toda representação Ocidental na Somália, na região e no mundo (International Crisis Group, 2012: 1 e 2). A título de exemplo, pode-se apontar os ataques contra civis em Kampala, capital do Uganda em 2010 e no Westgate Mall, no Quénia em 2013, como uma forma de materializar as suas pretensões internacionalistas.

4.2.1.2.2. Os Métodos Os métodos de terror usados pelo Al-Shabaab são de um repertório fortemente influenciado pelas relações que o movimento começou a manter com outras redes terroristas globais, sobretudo resultantes da associação ao Al-Qaeda e aos talibãs. A prova disto foi o início do emprego de ataques-suicida, que até o momento eram uma novidade em África (Shinn, 2011: 208). Para além da influência estrangeira que o Al-Shabaab foi sofrendo e que implicou uma inovação nas suas tácticas, o Al-Shabaab tem mudado os seus métodos tendo em conta o ambiente estratégico em que se encontra face ao GFT, às tropas quenianas, etíopes e da AMISOM. Por exemplo, com a queda da UTI e partida das forças etíopes em 2009, o Al-Shabaab iniciou uma guerra de guerrilha com a finalidade de retirar o GFT e estabelecer um Estado islâmico na Somália. Para 50

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fortalecer esta forma de luta, o Al-Shabaab constituiu alianças locais e começou também a usar emboscadas armadas e ataques-suicida. Quando sentiu que já tinha força suficiente, mudou de tácticas e começou a empregar assaltos militares convencionais e engajamentos directos contra o GFT e as forças da AMISOM (Joscelyn e Bill, 2012: 438 citado por Navanti Group, 2013: 9).

Contudo, quando o Al-Shabaab sofreu pressão das forças Quenianas, das milícias anti-AlShabaab e das tropas Etíopes ficou enfraquecido e teve que se retirar de Mogadíscio em 2011. Esta situação fez o Al-Shabaab retornar à guerra de guerrilha e a socorrer-se de emboscadas irregulares contra comboios militares, contra o governo e a conduzir explosões com recurso a minas terrestres, DEI’s e granadas, de modo que pudesse fazer face às diferentes frentes de combate (Navanti group, 2013: 10). Isto tudo mostra uma capacidade exímia de adaptação do AlShabaab, o que faz com que o movimento terrorista somali navegue entre formas de agir que podem confundi-lo com um movimento revolucionário, ou que alarguem as fronteiras conceptuais tradicionais do modus operandi dos movimentos terroristas.

4.2.1.2.3. Os Objectivos Os objectivos do Al-Shabaab nesta fase podem ser vistos a dois níveis, primeiro, como movimento terrorista com pretensões nacionalistas e, segundo, como uma proxy da Jihad global. Como movimento terrorista com pretensões nacionalistas, o maior objectivo do Al-Shabaab continua sendo a unificação da Somália e formação de um Estado islâmico, mas com adição de reincorporar as zonas inabitadas somalis da Etiópia e do Quénia (Shinn, 2011: 203-204). Para tal, o Al-Shabaab não cessa a sua luta contra o GFT, as milícias locais e as forças da AMISOM que o tentam destruir.

Como movimento militante ou Proxy da Jihad Global liderada pela Al-Qaeda, o Al-Shabaab tem como objectivo combater todo símbolo de cultura Ocidental. Primeiro, a nível doméstico contra o GFT e a AMISOM e, segundo, a nível internacional contra os EUA, a UA e qualquer outro que apoie o inimigo doméstico que é o GFT (Wise, 2011: 7). Para o alcance destes 38

Joscelyn, Thomas and Roggio, Bill (2012) Shabaab Formally Joins Al‐Qaeda. The Long War Journal. 1‐4. In WaTs, Clint and Lebovich, Andrew (2012) Hammami’s Plight Amidst Al--Shabaab and Al‐Qaeda’s Game of Thrones. Homeland Security Policy Ins/tute. 4.

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objectivos, o Al-Shabaab enveredou pela radicalização de jovens somalis a nível doméstico e estrangeiro através da narrativa de vitimização e nacionalismo somali (International Crisis Group, 2012: 1). Para além disto, começou a oferecer apoio e treinamento aos outros movimentos terroristas africanos como forma de aumentar a cobertura da jihad nos outros Estados Africanos, o que ressalva a ideia de que o Al-Shabaab é uma preocupação de dimensão internacional.

4.2.2. Implicações das Acções Terroristas do Al-Shabaab para a Segurança e Estabilidade Política da Somália O Al-Shabaab tem sido por muito tempo a principal ameaça à possibilidade de segurança e estabilidade política na Somália. As implicações das suas acções terroristas são difíceis de sistematizar, sobretudo no nível económico. Isto pelo facto de não haver uma estrutura económica formal estabelecida e que possa se inteirar das oscilações do mercado geradas pelas actividades, não só do Al-Shabaab, como de todos grupos violentos que operam de forma independente e que também geram danos à Somália. No entanto, isto não impede que se possam tirar, ainda que de forma inferida, as implicações geradas pelas actividades terroristas do AlShabaab. Neste sentido, pode-se destacar as implicações no nível social, económico e político.

No nível social, as acções do Al-Shabaab perpetuam os problemas humanitários, a fome e a condição dos refugiados, decorrentes da falta de uma autoridade central que pudesse estabelecer alguma organização e permitir a entrada de apoios suficientes para melhorar a condição de vida dos somalis. Esta situação reflecte-se, segundo Dagne (2011: 14), em mais de 3.7 milhões de pessoas em necessidades imediatas de assistência humanitária (só em Maio e Agosto de 2011 30 mil crianças morreram) e mais de 792 544 refugiados somalis, só no Quénia. Ainda no nível social, o combate ao Al-Shabaab tem condicionado o povo somali, sobretudo das regiões Sul e Central, a viver em constante estado de pânico, temor e incerteza decorrente da presença de várias tropas que lutam incessantemente em campos de batalha urbanos para conquistar espaço e promover os seus interesses políticos. Para além disto, o Al-Shabaab gera várias mortes e mutilados resultantes dos seus ataques, bem como, limita as alternativas de vida do povo somali, que acaba vendo a associação à piratas e senhores de guerra como único meio de sobrevivência.

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No nível económico, o Al-Shabaab impede a construção de uma economia formal que pudesse reger o Estado somali. Isto através das suas acções terroristas contra o estabelecimento de uma autoridade governamental e através da colecta de impostos que, em condições normais, iriam para os cofres do Estado, mas que acaba financiando as actividades terroristas do Al-Shabaab. Para além disso, com a anarquia promovida pelo Al-Shabaab, são removidas as chances da Somália sair da condição de miséria em que se encontra através da entrada de investimentos e investidores que operam numa base formal. Esta situação reflecte-se na contínua existência de casos de malnutrição crónica, altos níveis de pobreza, baixo empreendimento, poucas infraestruturas, etc (Department for International Development, 2012).

No nível político, as acções do Al-Shabaab implicam a perpetuação da ausência de uma autoridade central para impor ordem na Somália (Estado falhado). Deste modo, permanece o caos e a anarquia que tomam forma em cada clã representar por si só uma autoridade regida por leis próprias. Este cenário favorece o Al-Shabaab e os restantes grupos criminosos que ganham com a existência da anarquia na Somália. Porém, é um percalço à segurança dos Estados vizinhos que têm de lidar com a questão dos refugiados somalis que depois misturam-se nos seus territórios e desenvolvem formas criminosas de existência através de negócios ilegais que as vezes financiam as actividades dos movimentos terroristas.

4.2.3. Luta contra o Al-Shabaab A luta contra o Al-Shabaab tem sido conduzida pelas forças da AMISOM junto das forças etíopes, quenianas e de aliados somalis. Esta luta tem resultado no controle progressivo de áreas que anteriormente eram do domínio do Al-Shabaab. Contudo, tem sido uma luta muito demorada e desgastante, uma vez que dura por mais de 8 anos. Para além disso, o Al-Shabaab tem continuado a efectuar os seus ataques em Mogadíscio, que é uma região que está sob controle das tropas da AMISOM. Para Gaspar39, isto deve-se ao relaxamento das Forças da AMISOM e das autoridades do GFT para manter as regiões conquistadas.

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Director do CEEI e docente da cadeira de Estudos de Paz e Conflitos no ISRI, entrevistado aos 26 de Fevereiro de 2014, em Maputo.

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Fig.3: Áreas sob controlo do Al-Shabaab nas regiões Sul e Central da Somália.

Fonte: Navanti group (2013: 2)

O Mapa representa a progressão das Forças da AMISOM, do Quénia, da Etiópia e dos aliados somalis da AMISOM nas regiões Sul e Central da Somália, no período compreendido entre 2009 e 2013. A área amarelada representa o Al-Shabaab, a área encarnada representa as forças da AMISOM e seus aliados somalis, a área verde representa as forças quenianas, a área azul representa as forças etíopes e área alaranjada representa as milícias anti-Al-Shabaab. Nos mapas constata-se que o Al-Shabaab ainda controla grande parte do território somali. Contudo, perdeu as áreas estratégicas para as forças que o combatem e que tem progressivamente aumentado a sua cobertura geográfica. Uma luta definitiva contra o Al-Shabaab, para Gaspar40 deveria traduzir-se numa combinação de Hard Power41 com medidas económicas e sociais. O Hard Power seria para manter o status quo, 40

Director do CEEI e Docente da Cadeira de Estudos de Paz e Conflitos no ISRI, entrevistado aos 26 de Fevereiro de 2014, em Maputo. 41 Hard Power é uma expressão que corresponde ao uso da força militar.

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mas também poderia servir para eliminar a liderança do Al-Shabaab, e as medidas económicas e sociais para mudá-lo em favor do GFT.

O International Crisis Group (2012: 2 e 3) diz que uma vitória contra o Al-Shabaab seria conseguida através da fortificação e provisão de recursos às forças da AMISOM para manter e consolidar os ganhos territoriais. Este autor adiciona que a AMISOM deveria assumir comando das missões da UA, da Etiópia, do Quénia e coordenar com maior aproximação com os aliados somalis. Isto tudo junto de uma grande estratégia política para ganhar o apoio dos clãs e dos grupos sociais de modo a estabilizar as áreas que estão conquistadas e endossar a formação de um corpo deliberativo verdadeiramente inclusivo que represente todos os clãs e todas as regiões da Somália que, se necessário, possa substituir o GFT. Mas, também encorajar as autoridades somalis a demonstrar uma vontade contínua de negociar uma acomodação política com/ou incorporar os comandantes e os combatentes do Al-Shabaab nas forças nacionais de modo a renunciar ao terrorismo e seguir em direcção à paz.

Downie (2013: 6) aponta que uma estratégia de luta anti-terrorismo efectiva contra o Al-Shabaab não deveria ser conduzida apenas numa frente militar, mas sim, deveria ser conduzida também de modo a localizar a fonte que financia as operações do grupo e cortá-la. Além desta estratégia, Downie aponta para a necessidade do GFT negociar com o Al-Shabaab numa base negocial que contemple ameaças e induções de modo a dissuadir o Al-Shabaab a abraçar a ideia de ser um movimento militante jihad e persuadi-lo a abraçar o processo de paz e reconstrução somali.

À necessidade de cortar as fontes de financiamento do Al-Shabaab, Vilkko (2011: ii e iii) aponta que deveriam ser apoiadas iniciativas do governo queniano para estancar a lavagem de dinheiro através de um apoio a uma maior transparência e fortificação dos mecanismos de vigilância financeira, bem como, a comunidade internacional deveria harmonizar os seus esforços de ajuda e criar estratégias para conter a infiltração de empreiteiros associados ao Al-Shabaab.

As propostas de estratégias apresentadas são muito plausíveis e válidas, pois demonstram um claro reconhecimento de que uma reconstrução efectiva do Estado somali e alcance da sua segurança e estabilidade política passaria pela derrota do Al-Shabaab. No entanto, é preciso 55

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também reconhecer que não há nenhum automatismo entre a derrota do Al-Shabaab e o alcance da segurança e estabilidade política na Somália. Isto porque há outros grupos violentos baseados em identidade de clã que buscam sua influência e dominação através do uso da força. Com isto, pretende-se dizer que seria necessário, depois da derrota do Al-Shabaab, um trabalho sobre a questão dos clãs e dos outros problemas que afectam a Somália, como a crise humanitária, de modo a eliminar a fonte da anarquia e garantir prosperidade aos processos democráticos que o GFT tenta implementar no país.

4.2.4. Perspectivas para o Al-Shabaab O Al-Shabaab tem estado a sofrer uma grande pressão e fragmentação (Downie, 2013: 4). Isto apesar de ter conduzido recentemente um forte ataque ao Westagte Mall, sob argumento de estar a responder a presença de tropas quenianas no território somali em 2011 e, também, ter levado a cabo um atentado no palácio presidencial42.

A pressão sofrida deve-se às acções da AMISOM e das forças aliadas. Estas acções tem conseguido, progressivamente, tirar o Al-Shabaab de Mogadíscio através das suas alianças com as milícias e com os líderes distritais, bem como, tem conseguido tomar controlo das áreas fronteiriças junto da Etiópia e do Quénia (International Crisis Group, 2012: 4). Para além disto, a AMISOM, conseguiu, em 2012, tomar controlo de Merka, um porto ao Sul da capital Mogadíscio e, um mês depois, conseguiu tomar controlo de todas áreas-chave de Kismayu, uma cidade do Sul considerada o baluarte do Al-Shabaab (Back, 2013: 1). Estas progressões têm representado um enfraquecimento do Al-Shabaab no campo militar e nas suas fontes de financiamento. O factor fragmentação é para Roble (2012: 1)43 citado por Navanti Group (2013: 12), devido à existência de conflitos ao nível da liderança do Al-Shabaab acerca dos objectivos, principalmente, no que concerne a questão da dicotomia nacional versus global, estratégias e tácticas do movimento. Estas divergências manifestam-se em parte da liderança, representada 42

http://www.france24.com/en/category/tags-thematiques/al-shabaab/ consultado no dia 4 de Março de 2014 pelas 11h02 min. 43 Roble, Muhyadin Ahmed (2012) Al--‐Shabaab Split Threatens to Open New Conflict Between Somalia’s Islamists. Terrorism Monitor. Vol. 10 Issue 9. 1.

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por Ahmed Godane, preferir ver o Al-Shabaab cometido com a jihad global, enquanto que a outra parte, representada por Abu Mansoor e Hassan Dahir Aweys, defende uma abordagem mais nacionalista e local, marcada pelo receio em relação a influência estrangeira do Al-Qaeda na Somália.

No que diz respeito as tácticas, a discordância reside no facto de parte da liderança discordar dos ataques indiscriminados a civis somalis e do seu controlo monolítico sobre outras organizações islamistas somalis. Para além disto, há contestações em relação a liderança tirânica de Godane marcada pelo mau tratamento aos combatentes estrangeiros e execuções aos que constituem ameaça à sua autoridade, o que tem resultado muitas vezes em deserções e depreciação da legitimidade do grupo (Navanti Group, 2013: 13).

Os elementos pressão e divergências internas no seio do movimento não oferecem boas perspectivas ao Al-Shabaab. Contudo, ainda é muito cedo para falar num possível desaparecimento total do movimento e, muito menos, na paralisação das suas actividades. Dado que apesar das tropas da AMISOM terem tomado controlo de Mogadíscio, os bombardeamentos e atentados não param de ser executados na capital somali. Exemplo disto foi o atentado no palácio presidencial em Mogadíscio com recurso a um carro bomba embatido contra o portão e de seguida tiroteios contra a guarda, resultando em pelo menos 11 mortos, com a finalidade de capturar vivo ou morto o presidente Hassan Sheikh Mohamud44.

44

http://www.reuters.com/article/2014/02/22/us-somalia-attack-idUSBREA1L0F420140222 Consultado no dia 4 de Março de 2014 pelas 11h10min.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

O terrorismo é um fenómeno de longos anos de existência. Ao longo do seu percurso na época moderna observou várias mudanças que traduziram-se na existência de quatro ondas principais de terrorismo: a onda dos anarquistas, a onda anti-colonial, a onda da nova esquerda e a onda religiosa. Neste tempo de existência, vários grupos ao nível global foram surgindo, em sua maioria visando reivindicações políticas como autonomia, independência ou, em outros casos, secessão, tal como aconteceu com a ETA.

Como fenómeno, é importante notar que o terrorismo é, acima de tudo, uma luta política, sobretudo, para os que não tem força suficiente para alcançar o seu objectivo por meios convencionais ou por via de um confronto armado aberto. Esta situação traduziu-se na confusão ou na ausência de um limite claro entre os movimentos revolucionários e os movimentos terroristas. Por esta razão, vários movimentos revolucionários foram denominados terroristas em África e no mundo, como é o caso do ANC e da OLP. A explicação para isto reside no valor político do terrorismo, pois alguns governos atribuem esta expressão a movimentos contra os quais lutam com a finalidade de ilegitimar a sua causa a nível doméstico e a nível internacional, como foi o caso do regime do Apartheid que denominou o ANC movimento terrorista com vista a torná-lo ilegítimo.

Em África, o terrorismo surgiu durante as tentativas de colonização por parte dos europeus. Desde então, não mais se dissociou da história africana. Isto porque acabou se tornando num instrumento de luta usado pelos movimentos revolucionários africanos para combater a dominação colonial e alcançar as suas independências, tal como foi com o Mau Mau e a FRELIMO. Para além dos movimentos que usaram o terrorismo para alcançar a sua autodeterminação, houve movimentos que lutaram contra os grupos revolucionários e que também recorreram ao terror para o alcance dos seus objectivos. Destes, pode-se destacar a RENAMO, a UNITA e o LRA.

Nos princípios do ano 2000 o terrorismo assumiu uma outra faceta no continente, isto através do surgimento de vários movimentos terroristas de orientação islâmica que tem constituído ameaça 58

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à segurança e estabilidade política dos Estados Africanos. Destes movimentos, Jamal45 e Gaspar46 enfatizam o Boko Haram, o Al-Shabaab e o AQIM. No entanto, esta pesquisa focalizou-se no Boko Haram e no Al-Shabaab como factores de ameaça à segurança e estabilidade política da Nigéria e da Somália, respectivamente.

O Boko Haram e o Al-Shabaab são movimentos que durante a sua abordagem apresentaram similaridades e diferenças. Dentre as similaridades, pode-se destacar o facto de ambos serem movimentos radicais islâmicos que procuram, pela via do terror, impor a sharia na base de governação dos seus Estados e o facto de ambos recorrerem à métodos inspirados na Al-Qaeda para cometer terror (DEI’s, ataques suicida e carros armadilhados). No que diz respeito à primeira similaridade, pode-se notar que ambos não procuram a simples regência dos seus Estados pela sharia, mas sim, a regência pela sharia num cenário político claramente liderado por eles. E no que diz respeito à segunda similaridade, nota-se que estes têm usado a associação à Al-Qaeda para fortificar a sua imagem e o peso das suas acções. Entretanto, na Somália isso acabou se tornando um factor de cisão ao nível da liderança do Al-Shabaab.

Dentre as diferenças, pode-se destacar o ambiente político no qual cada um deles opera, a forma como cada um deles consegue apoio para manter as suas actividades e o alcance geográfico das suas acções. No que diz respeito ao ambiente político, enquanto o Boko Haram opera num ambiente onde há uma autoridade estatal, embora fraca, o Al-Shabaab opera num ambiente em que não há nenhuma autoridade estatal. Assim, o Al-Shabaab esteve livre até para assumir as funções do Estado (prover bens básicos à população e colectar impostos).

No que concerne à forma como cada um deles garante o apoio para as suas acções, enquanto o Boko Haram instrumentaliza questões como pobreza e corrupção para dar justificativa a sua existência e manter operativos nas suas fileiras, o Al-Shabaab instrumentaliza a questão da ameaça à identidade muçulmana e autonomia política e religiosa da Somália para se autolegitimar perante a comunidade somali interna e na diáspora, de modo a manter as suas 45

Chefe do Departamento de Relações Internacionais e Docente das cadeiras de Teoria de Relações Internacionais e Negociação no ISRI, entrevistado aos 04 de Março de 2014 em Maputo. 46 Director do CEEI e docente da cadeira de Estudos de Paz e Conflitos no ISRI, entrevistado aos 26 de Fevereiro de 2014, em Maputo.

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actividades e os apoios para as mesmas. E, por fim, a última diferença a mencionar existente entre estes dois movimentos reside no alcance geográfico das suas acções terroristas. Enquanto o Al-Shabaab consegue atacar além fronteiras (no Quénia e no Uganda), as acções terroristas do Boko Haram encontram-se limitadas no território Nigeriano. Isto faz dos dois movimentos diferentes em capacidade e peso regional.

O principal aspecto a abordar sobre o Boko Haram e o Al-Shabaab, residia na forma como ameaçam a segurança e estabilidade política da Nigéria e da Somália e nas implicações que as suas acções têm para os seus Estados. Enquanto o Boko Haram, por um lado, ameaça a segurança e estabilidade política da Nigéria através dos seus actos terroristas diários com recurso a métodos mais mortíferos e com uma abrangência geográfica crescente pondo em causa a coesão nacional, a autoridade do Estado e a economia nigeriana, o Al-Shabaab, por outro lado, luta de forma incessante contra o GFT e todas forças que tentam fortalecer a presença do GFT na Somália perpetuando a anarquia e os problemas sócio-económicos existentes na Somália.

Quando se abordava sobre a luta contra o Boko Haram e o Al-Shabaab, foi possível constatar que enquanto na Nigéria o Boko Haram tem estado a ganhar cada vez mais território, na Somália, o Al-Shabaab tem Estado a perder território para as forças que o combatem. E quando se abordava a respeito das perspectivas, em ambos os casos foi possível notar que mesmo em caso de eliminação destes movimentos, não há garantia de que os factores que levaram ao seu surgimento e radicalização serão eliminados.

Por fim, pode-se dizer que quando um agente destrói ou mina o ambiente ou a possibilidade de existência de um ambiente de governabilidade, dificultando a transição pacífica do poder, a capacidade das instituições e órgãos do Estado de exercer as suas actividades de forma natural, ao mesmo tempo que coloca em causa a segurança dos cidadãos, a base económica ou de sobrevivência do Estado, a coesão nacional e a integridade territorial, é uma ameaça à segurança e estabilidade política de um Estado. Esta situação pode-se verificar nos dois casos de estudo, tanto no caso do Boko Haram, através das suas actividades na Nigéria, assim como, no caso do Al-Shabaab, através das suas actividades na Somália.

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