Narrador e melancolia em Machado de Assis.pdf

May 25, 2017 | Autor: Jaime Ginzburg | Categoria: Machado de Assis, Melancolia
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. Notas sobre o narrador e a melancolia em alguns textos de Machado de Assis. Nonada Letras Em Revista, Faculdades Ritter dos Reis-RS, v. 2, p. 11-45, 1999. Jaime Ginzburg Universidade Federal de Santa Maria Nota introdutória Este estudo parte da necessidade de pensar dois problemas de compreensão da ficção de Machado de Assis (1). Tratam-se de problemas amplos, interligados entre si. O primeiro consiste em saber se existe uma unidade no conjunto da ficção machadiana, isto é, se é possível falar de características que estejam presentes ao longo de toda a produção do autor. O segundo consiste em tentar explicar o que significa a fragmentação da estrutura narrativa em Machado, sobretudo em Memórias póstumas de Brás Cubas. A enorme complexidade dos problemas exige a definição de um campo mais restrito de reflexão, que sirva de base para o desenvolvimento posterior, com maior prazo, de um trabalho mais extenso e coeso. Especificamente, o que se pretende aqui é dar atenção a um dos aspectos da composição do romance em Machado de Assis: o narrador. Foram escolhidas três obras para estudo - o primeiro romance, Ressurreição (2); aquele que é considerado marco de início da chamada segunda fase da produção, Memórias póstumas de Brás Cubas (3); e o último, Memorial de Aires (4). Não se pretende fazer um exame exaustivo da composição do narrador. O ponto nuclear do trabalho é a situação de comunicação que cada um desses romances encena. Isto é, em cada caso, cabe avaliar a quem o narrador se dirige, e de que maneira. O enfoque dado à análise é o seguinte. Pretende-se propor, como hipótese de leitura, a idéia de que uma categoria produtiva para compreensão do narrador em Brás Cubas e em Memorial de Aires é a melancolia. Essa categoria permitiria avaliar os romances de modo a trazer mais clareza a respeito das questões inicialmente colocadas - o problema da unidade da obra de Machado e a fragmentação da narrativa. Além de utilizar referenciais teóricos a respeito da composição do narrador no romance moderno e da melancolia, o estudo pretende envolver alguns elementos da fortuna crítica machadiana que dizem respeito direta ou indiretamente aos problemas de análise levantados. Ressurreição

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Trabalho apresentado ao Prof.Dr. Flávio Loureiro Chaves, para a disciplina “A ficção de Machado de Assis”, no CPG-Letras da UFRGS, em 1993. 2 ASSIS, Joaquim M. Machado de. Ressurreição. São Paulo: Ática, 1977. 5 ed. 3 ASSIS, Joaquim M. Machado de. Memórias póstumas de Brás Cubas. São Paulo: Ática, 1984. 10 ed. 4 ASSIS, Joaquim M. Machado de. Memorial de Aires. São Paulo: Ática, 1976. 3 ed.

2 A obra de Machado de Assis em geral é segmentada em duas grandes fases, uma freqüentemente qualificada como romântica e outra como realista. De acordo com essa perspectiva crítica, a segunda fase é considerada superior à primeira. Entre os que apresentam essa segmentação, estão José Guilherme Merquior (5), Alfredo Bosi (6), Barreto Filho (7), Wilton Cardoso (8) e Massaud Moisés (9). O livro Ressurreição, primeiro romance do autor, abre a produção da chamada primeira fase. Foi publicado em 1872, mesmo ano em que José de Alencar lança Sonhos d'ouro. Lucia Miguel Pereira considera o romance "quase inteiramente mau" (10). Cabe examinar os argumentos que reúne para chegar a esse juízo. Um dos problemas levantados por L.M.P. envolve o modo de narração: "O autor intervém a miúdo, mas não é Machado de Assis, é o autor romântico, figura convencional. (...) procurou enquadrar-se dentro do romantismo" (11). A autora entende que, nesse livro, Machado está apenas aderindo a um cânone, ao invés de pautar sua criação a partir da expressão da sua constituição interna; desvaloriza o primeiro romance, diferenciando-o de outros posteriores, por não encontrar nele a interioridade do autor. "Escreveu sobre figuras que conhecia de vista, desprezando a fonte imensa de observação que lhe era a própria alma ambiciosa e sensível. Olhou para fora, quando devia olhar para dentro" (12). Para L.M.P., a alma deve ser fonte de observação, base da criação. O olhar deve-se voltar para "dentro", para a interioridade do sujeito criador. A autora leva a pensar que o valor da obra depende efetivamente da capacidade de o autor se manifestar na sua produção, trazendo à tona registros plasmados por sua constituição interna. É provável que o pensamento de L.M.P. tenha como uma de suas bases a concepção romântica de literatura. Para o romantismo alemão, a obra sempre deve expressar a alma do artista (13). É possível encontrar em outros leitores de Machado de Assis uma argumentação crítica voltada para a noção de uma expressão da interioridade do autor através da arte. Augusto Meyer, em linha afim, defende: "Caso normativo dos escritores de ficção; eles se confessam através das encarnações imaginárias, indiretamente, com uma sinceridade mais honesta do que na correspondência ou nos cadernos íntimos" (14). O

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MERQUIOR, José Guilherme. De Anchieta a Euclides. Rio de Janeiro, José Olympio, 1979. p.162. BOSI, Alfredo. Machado de Assis. In: _____. História concisa da literatura brasileira. São Paulo, Cultrix, 1987. 3 ed. p. 196. 7 BARRETO FILHO. Machado de Assis. In: COUTINHO, Afrânio, org. A literatura no Brasil. Rio de Janeiro, José Olympio; Niterói, UFF, 1986. 3. ed. p.154. 8 CARDOSO, Wilton. Tempo e memória em Machado de Assis. Belo Horizonte, 1958. Cf.p.67, 101 e 131. 9 MOISÉS, Massaud. Machado de Assis. In: ____ & PAES, José Paulo, org. Pequeno dicionário de literatura brasileira. São Paulo, Cultrix, 1987. p.59. 10 PEREIRA, Lúcia Miguel. Machado de Assis (estudo crítico e biográfico). Belo Horizonte:Itatiaia; São Paulo:EDUSP, 1988. p.133. 11 Idem. 12 Op.cit. p.142. 13 Encontramos essa idéia em Schelling. Cabe registrar a seguinte passagem: "(...) a obra de arte (...) começa pela determinação e precisão de suas formas (...) e alcança finalmente a expressão da alma." SCHELLING, Friedrich. La relación de las artes figurativas con la naturaleza. Buenos Aires, Aguilar, 1959. p.72-3. O original é de 1807. 14 MEYER, Augusto. Machado de Assis. Rio de Janeiro, São José, 1958. p.18. 6

3 crítico Wilton Cardoso desenvolveu uma reflexão em sentido semelhante, defendendo que Machado de Assis "equacionou (...) seu problema ascensional" através da construção das suas personagens ( 15). Todo o livro de L.M.P. procura vincular, de modo articulado, a vida e a produção literária de Machado de Assis. O projeto crítico da autora se baseia em elos temporais e causais entre ocorrências biográficas e características estéticas. Voltando à penúltima citação de L.M.P., é possível perceber que a pensadora, quando usa o termo "o autor", pretende referir-se ao aparecimento de manifestações do narrador do romance. Não há aqui um corte rigoroso, em termos teóricos, que permita separar o autor, pessoa real, do narrador, entidade ficcional incorporada à estrutura. A ausência desse corte pode ser explicada talvez pelas condições de produção do trabalho de L.M.P., pois o livro foi escrito antes de se desenvolverem no Brasil reflexões em teoria da literatura que explorassem a importância analítica desse corte (16). Outro elemento que ajuda a explicar essa identificação entre autor e narrador é que o próprio texto de Machado parece apontar para ela. Cabe examinar aqui uma passagem do romance. "Uma das razões que desviavam da gentil menina os olhos de Meneses era que este os trazia namorados da viúva. De admiração ou de amor? Foi de admiração primeiro, e depois de amor; coisa de que nem ele, nem o autor do livro temos culpa. Que quer?" (Cap. XII, p.64) Nessa passagem, a voz que se diz "o autor do livro", usando primeira pessoa (no caso, do plural), se exime da culpa quanto ao desenrolar dos acontecimentos. Essa construção coloca um problema instigante de leitura. O que o "autor" sugere é que ele não controla o desenrolar dos acontecimentos, não é ele que dá forma à narrativa. A proposição exige análise. O autor real é sem dúvida responsável pela forma da narrativa. A isenção supostamente alegada seria, no plano da realidade exterior à construção ficcional, objetivamente insustentável. O que ocorre é uma provocação, acentuada pelo "Que quer?". Essa provocação só pode ser percebida claramente se o leitor fizer a distinção entre o autor real e o narrador, que se apresenta aqui, para ganho da ambigüidade ficcional, como "o autor do livro", fazendo nesse ponto e em vários outros com que o leitor seja perturbado, tendo sua percepção desviada: o leitor tem de acompanhar não apenas o destino de Lívia e Félix, mas também os movimentos da complexa consciência do narrador. Esses movimentos, observados em detalhe, revelam ter função dentro da estrutura narrativa, por estarem vinculados ao conflito central da obra. Um dos interesses do livro é a oposição entre os protagonistas Félix e Lívia, que consiste em um antagonismo de uma tendência à inconstância e à instabilidade, representada por Félix, e uma tendência à estabilidade serena, representada por Lívia. Essa dualidade é incorporada pelo próprio ponto de vista de narração. De modo geral, ao longo do andamento da narração, o narrador parece estar cumprindo o mandamento de objetividade esperado dos narradores realistas de terceira pessoa. Porém, em diversas passagens, o narrador cai em uma espécie de indeterminação, de tal modo que, para o leitor, é criado um 15 16

CARDOSO, Wilton. Op.cit. p.102. Esse assunto foi discutido no estruturalismo francês, sobretudo por Gerard Genette.

4 problema de compreensão do sentido dos acontecimentos narrados. O efeito global é de mimetização, no nível do ponto de vista, no fio da narração, do dualismo instabilidade/estabilidade proposto como núcleo temático na relação entre os protagonistas. Cabe examinar o modo como o narrador cai em indeterminação, e subverte a expectativa de objetividade estável. Leia-se as seguintes passagens: "O sucessor de Félix, pouco depois que este chegou, não deixou de lhe ir participar a sua boa fortuna, não sei se por fatuidade, se por despicar a dama." (Cap. IV, p.30) "O médico assistente dera à moléstia um nome tirado não sei se do grego, se do latim." (Cap. X, p.54) "Tal era o contraste entre esses dois caracteres, que a estrela da viúva, não sei se boa ou má estrela, reuniu a seus pés." (Cap. XII, p.64) Nas três passagens, o narrador manifesta não saber algo, abrindo duas possibilidades de escolha que são oferecidas ao leitor. È primeira vista, o que se tem aqui poderia ser lido como esquecimento, ou confusão acidental. Porém, trata-se de uma construção deliberadamente incluída no andamento da fala do narrador. As passagens provocam abalos na expectativa de continuidade linear de leitura. A situação de comunicação elaborada, nesse sentido, transcende o nível do mero relato, colocando elementos compositivos que afastam a objetividade e a clareza e inserem na relação narrador-leitor níveis de envolvimento incomuns, irregulares para o padrão estético vigente. O que se pretende não é apenas apresentar uma estória, mas também instituir um modo não convencional de apresentá-la. Na passagem seguinte, o narrador formula claramente "Eu por mim não sei decidir", expondo limitações reflexivas que condicionam seu modo de compreender a estória que apresenta. "Decidam lá os doutores da escritura qual destes dois amores é melhor, se o que vem de golpe, se o que invade a passo lento o coração. Eu por mim não sei decidir, ambos são amores, ambos têm suas energias." (Cap. VIII, p.45) Nos quatro casos, os procedimentos ficcionais utilizados se destinam a abrir uma margem de incerteza que cria uma espécie de imponderabilidade no teor da narrativa. Precedentes foram abertos: se o narrador está incerto em certos pontos, tudo está sujeito à dúvida. É aberta uma margem de inquietação na relação entre quem conta a estória e quem a acompanha. Procedimento semelhante está presente no conto Desenredo, de Guimarães Rosa. "Chamando-se Livíria, Rivília ou Irlívia, a que, nesta observação, a Jó Joaquim apareceu." "Azarado fugitivo, e como à Providência praz, o marido faleceu, afogado ou de tifo." (17) Também nesse texto, o narrador abre hipotéticas possibilidades de compreensão do teor da narrativa, oferecendo ao leitor um universo ficcional aberto.

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ROSA, João Guimarães. Tutaméia. Rio de Janeiro, José Olympio, 1969. p.38 e 39.

5 A argumentação de Lucia Miguel Pereira propõe que o narrador de Ressurreição seja um narrador característico de escola romântica (conforme a citação à pág. 2). A leitura de romances de José de Alencar mostra que, pelo menos no que diz respeito a esse procedimento, a generalização não tem a fundamentação esperada. Nos livros Cinco minutos e Lucíola, por exemplo, não existe qualquer situação em que o comportamento do narrador seja pautado pela indeterminação. Cabe examinar o seguinte. Em Cinco minutos, a situação de comunicação é simples. O narrador em primeira pessoa conta sua estória a uma prima, e a estória é estruturalmente simples, perfeitamente encorpada, organizada no tempo e no espaço (18). Já em Lucíola (19), a complexidade é maior. A interlocutora é definida como uma senhora que tem uma neta, e o narrador preocupa-se, em certas passagens, em prevenir sua leitora da carga de erotismo e inadequação à moral vigente daquilo que apresenta. Chega, num extremo, a propor que o texto seja queimado. "Desculpe, se alguma vez a fizer corar sob os seus cabelos brancos, pura e santa coroa de uma virtude que eu respeito." (cap. I, p.8) "Entretanto, se a senhora não conhece as odes de Horácio e os amores de Ovídio (...) se ignora tudo isto, rasgue estas folhas, ou antes queime-as, para que sua neta, achando as tiras que ficarem sobre a mesa, não se lembre de fazer delas papelotes." (cap.VI, p.45-6) A composição do narrador de Ressurreição não é afim à simplicidade estrutural de Cinco minutos, nem ao dilema moral do narrador de Lucíola. E em nenhum desses dois livros encontramos uma sucessão de registros na forma do "não sei", com a abertura à indeterminação do sentido. Por esses critérios, pode-se entender que se encontra em Machado, já em Ressurreição, uma atitude nova, diferenciada com relação à composição da narrativa, que o faz romper com a escola romântica. Não se reduz a esse procedimento o trabalho de Machado de Assis de elaborar um narrador complexo. Leia-se o trecho abaixo: "Aqui podia acabar o romance muito natural e sacramentalmente, casando-se estes dois pares de corações e indo desfrutar a sua lua-de-mel em algum canto ignorado dos homens. Mas para isso, leitor impaciente, era necessário que a filha do coronel e o Doutor Meneses se amassem, e eles não se amavam, nem se dispunham a isso." (Cap. XII, p.64)

Dois pontos aqui são essenciais. Primeiro, o aparecimento da figura do leitor, incorporada ao texto. O leitor não apenas está presente como é ofendido, chamado de impaciente (ao contrário de Lucíola, em que o respeito à leitora é constantemente enfatizado). Trata-se de um grau de provocação muito forte, que ataca os horizontes de expectativas serenos do padrão de consumo da época. Esse recurso foi utilizado em numerosas obras de Machado de Assis. Em segundo lugar, é importante o componente de explicitação de regras de jogo de composição. Nesse ponto, explica o narrador, o romance poderia acabar, desde que certas condições fossem satisfeitas. A atenção

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ALENCAR, José de. Cinco minutos / A viuvinha. São Paulo, Melhoramentos, s.d. 7 ed. ALENCAR, José de. Lucíola. São Paulo, Melhoramentos, s.d. 6 ed.

6 do leitor é desviada: não se fala propriamente da estória de Lívia e Félix, mas das condições em que se conta a estória. O próprio ato de narrar é, nesse ponto, centro da atenção. Em outras passagens ocorrem também registros da relação do narrador com o processo e o andamento do ato de narrar: "Do seu caráter e espírito melhor se conhecerá lendo estas páginas, e acompanhando o herói por entre as peripécias da singelíssima ação que empreendo narrar." (Cap.I, p.14) "Sentaram-se ambos, e Meneses referiu ao médico os acontecimentos que deixo narrados no capítulo anterior." (Cap. XXII, p.99) Embora considerasse o romance mau, Lúcia Miguel Pereira defendeu que Ressurreição representa uma espécie de base para toda a produção posterior. Ela entende que Machado "Sempre se manteve fiel a esse romance essencial (...) De Ressurreição a Memorial de Aires todos os seus romances são determinados pelos conflitos das paixões e dos temperamentos das personagens" (20). "O autor de Memórias póstumas de Brás Cubas existia no de Ressurreição como a Capitu da Glória estava na de Matacavalos - em germe; de vez em quando, por uma frase, por uma indicação, por uma idéia apenas esboçada e que mais tarde seria desenvolvida, parece aflorar, querer surgir das profundezas em que mergulhava" (21). Cabe pensar, a partir das idéias da autora, em que medida um aspecto importante de Ressurreição - a composição do narrador - constitui uma espécie de núcleo que contém, num nível mais simples, elementos formais que reaparecerão em obras consagradas como Memórias póstumas de Brás Cubas e Memorial de Aires. Memórias póstumas de Brás Cubas Dois dos principais comentadores de Machado de Assis - Lucia Miguel Pereira e Wilton Cardoso incluíram em seus comentários sobre Memórias póstumas de Brás Cubas afirmações que fazem crer que o interesse desse livro não reside propriamente na estória que é contada, mas em outros níveis de elaboração ficcional. Cabe lembrar uma observação curiosa de Lucia Miguel Pereira: "Os sucessos do livro vão-se arrastando, vêm e passam sem significar coisa alguma. São casos fortuitos, meros episódios." (22). A posição da autora leva a pensar que o que interessa sobretudo não é o sentido dos episódios relatados, mas o modo de contá-los, "o prazer satânico de sentir a inanidade de tudo" (23). Nesse ponto, cabe lembrar Wilton Cardoso, que elabora argumento afim: "Com efeito, à parte o tom insólito para o meio e para a época, releva notar que a intriga romanesca é aí a tal ponto reduzida, os sucessos de tal modo carecem de relevo e as peripécias da ação se mostram de tal forma pobres, que é insignificante o choque de situações ou o encontro dos caracteres." (24). Se eles têm razão, se a sucessão dos acontecimentos não é em si mesma suficiente para dar interesse e valor ao livro, a crítica tem de se adequar metodologicamente a essa especificidade. Categorias como "prazer 20

PEREIRA, Lúcia Miguel. Machado de Assis (estudo crítico e biográfico). Op.cit. p. 141. PEREIRA, Lucia Miguel. Machado de Assis. In: ____. Prosa de ficção (de 1870 a 1920). Rio de Janeiro, José Olympio, 1950. p.60. 22 PEREIRA, Lúcia Miguel. Machado de Assis (estudo crítico e biográfico). Op.cit. p.197. 23 Idem. 24 CARDOSO, Wilton. Op.cit. p.139. 21

7 satânico" e "tom insólito" apontam para a necessidade de avaliar a postura do narrador. Esse narrador guarda especificidades, que exigem uma atitude de leitura diferenciada da que exigem outras obras do período. Um dos pontos de maior interesse para a discussão da obra de Machado de Assis consiste na diferença entre Brás Cubas e as obras anteriores, diferença qualificada como ruptura estética radical pela crítica, que localiza aí a passagem da primeira fase para a segunda fase. Vários críticos têm estado de acordo quanto à existência e a importância dessa ruptura, mas não quanto à motivação que lhe deu origem. Wilton Cardoso, em um trabalho de 1958, faz um levantamento de explicações para esta motivação propostas pela crítica. De acordo com esse levantamento (25), os críticos Mário de Alencar, Alfredo Pujol e Lúcia Miguel Pereira viram a motivação da mudança no mal fisiológico, na doença de Machado de Assis. Outros fatores apresentados são o êxito do Naturalismo (para Mário de Alencar) e o desacordo entre o gênio de Machado e a sociedade (para Pujol). A estes Cardoso opõe José Veríssimo e Mário Casasanta, que defendem uma leitura integradora da produção de Machado, considerando sua obra de maneira unificada. Em seu livro biográfico, Lucia Miguel Pereira expõe que Machado passou a escrever de maneira diferente porque perdeu todas as ilusões sobre os homens, e descobriu que a vida não tinha sentido. Trata-se, de acordo com a autora, de um vínculo entre crise pessoal e alteração estética (26). Alguns nomes da crítica de Machado de Assis tem buscado maneiras conceitualmente mais fundamentadas para investigar o problema. O componente biográfico é lateralizado, em nome de categorias estéticosociológicas de aplicação fecunda. Uma hipótese de explicação importante foi proposta por Flora Sussekind. A pesquisadora aborda, no artigo Brás Cubas e a literatura como errata (27), um aspecto da história das idéias do período de Machado. De acordo com o artigo, enquanto Machado publica as Memórias póstumas, as memórias propriamente ditas constituem um gênero relevante de conhecimento de História. Sussekind cita o exemplo das Memórias para servir à história do reino do Brasil, do Pe. Luís Gonçalves dos Santos. A intenção desse livro era integrar fatos e documentos em uma totalidade orgânica, encorpada, que tivesse valor historiográfico. Machado, ao contrário de Santos, não respeita a linearidade cronológica rigorosa nem procura o efeito de coesão integradora da totalidade. Em outras palavras, o narrador Brás Cubas é avesso do narrador de memórias históricas; a alusão ao gênero memórias é provocadora, e teria como efeito principal a crítica das bases de sustentação da historiografia. Outro caminho produtivo da crítica tem levado a situar Memórias póstumas em uma posição decisiva na história da literatura: o início da produção narrativa propriamente moderna no Brasil. Em um ensaio em que discute panoramicamente modernidade e ficção no Brasil, João Alexandre Barbosa propõe, como critério de ordenação historiográfica, que Memórias póstumas de Brás Cubas seja considerado o primeiro romance brasileiro propriamente moderno (28). 25

CARDOSO, Wilton. Op.cit. p.131 e seguintes. PEREIRA, Lucia Miguel. Machado de Assis (estudo crítico e biográfico). Op.cit. p.192 e 194. 27 Tempo Brasileiro. Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro, 1985. n.81. 28 BARBOSA, João Alexandre. A modernidade no romance. In: PROENÇA FILHO, D., org. O livro do seminário: ensaios. São Paulo, L.R.Editores, 1983. p.24. 26

8 Com base nas conclusões de Barbosa, cabe recuperar alguns pressupostos teóricos, que permitam observar com clareza em que sentido a composição de Brás Cubas é propriamente moderna. Para comentar a condição dos narradores na ficção moderna, cabe tomar considerações de Theodor Adorno. Adorno ensina que o realismo era imanente ao romance, até o século XIX. "Este procedimento tornou-se problemático no curso de uma evolução que remonta ao século XIX e hoje se vê acelerada ao máximo" (29). Adorno afirma que os romances recentes que examina "se assemelham a epopéias negativas. São testemunhas de um estado de coisas em que o indivíduo liquida a si mesmo e se encontra com o préindividual" (30). Essa caracterização parece congruente com a composição de Brás Cubas. Referindo-se a Proust, Adorno diz que "o comentário está de tal modo entrelaçado na ação que a distinção entre ambos desaparece, então isso quer dizer que o narrador ataca um elemento fundamental na sua relação com o leitor: a distância estética. Esta era inamovível no romance tradicional. Agora ela varia como as posições da câmara no cinema: ora o leitor é deixado fora, ora guiado, através do comentário, até o palco, para trás dos bastidores, para a casa das máquinas" (31). Brás Cubas é pautado por um vínculo forte entre ação e comentário. Nos termos precisos de Augusto Meyer: trata-se do "(...) fato de não poder criar uma personagem que nos dê a ilusão da vida individual, sem cordas de fantoche (...) As personagens dele se movem como fantasmas num ambiente irrespirável de pura análise" (32). É implausível pensar em um enredo do livro isolando-o dos comentários do narrador sobre o que se passa. O interesse não está tanto nas ações em si mesmas, mas sobretudo no modo como são expostas. A variação da distância estética é fundamental na constituição do ponto de vista. E ela não aparece apenas nesse romance; como se pretendeu mostrar, já em Ressurreição (e num nível bem mais simples em Lucíola) existe a tentativa de conduzir a atenção do leitor para outros níveis da representação literária, além da estória propriamente dita, sobretudo para as condições do ato de narrar. Cabe agora, após situar teoricamente o problema, examinar algumas passagens do romance, procurando sobretudo avaliar especificidades da figura do narrador. Como as passagens são numerosas, considerou-se conveniente identificá-las com letras, para dar clareza aos comentários. Em primeiro lugar, é preciso observar que o romance propõe internamente um modo específico de entender os termos narrativa e narração. Leia-se as seguintes passagens: (a) "Se o leitor não é dado à contemplação destes fenômenos mentais, pode saltar o capítulo; vá direto à narração." (Cap. VII, O delírio, p.19) O termo narração exclui, considerando o contexto, todo o delírio de Brás Cubas. É feita uma distinção entre os acontecimentos sucessivos da vida de Brás Cubas ("a narração") e a instância onírica do delírio. Se tomássemos a proposição de Brás Cubas como rigorosa, teríamos de dar ao conceito de narração, enquanto 29

ADORNO, Theodor W. Posição do narrador no romance contemporâneo. In: VÁRIOS. Textos escolhidos. São Paulo, Abril Cultural, 1983. 2 ed. (Os Pensadores) p.269. O artigo é de 1958. 30 ADORNO, Theodor W. op.cit. p.273. 31 Idem. p.272. 32 MEYER, Augusto. Machado de Assis. Op.cit. p.82.

9 categoria para examinar o próprio romance, um valor descritivo restrito, uma vez que a seqüência de acontecimentos biográficos em si mesma não é o principal sustentáculo estético do livro. A narração, na acepção proposta, não é o que mais interessa no livro. (b) "Era fixa a minha idéia, fixa como... Não me ocorre nada que seja assaz fixo nesse mundo: talvez a lua, talvez as pirâmides do Egito, talvez a finada dieta germânica. Veja o leitor a comparação que melhor lhe quadrar, veja-a e não esteja daí a torcer-me o nariz, só porque ainda não chegamos à parte narrativa destas memórias. Lá iremos. Creio que prefere a anedota à reflexão, como os outros leitores, seus confrades, e acho que faz muito bem. Pois lá iremos. Todavia, importa dizer que este livro é escrito com pachorra, com a pachorra de um homem já desafrontado da brevidade do século, obra supinamente filosófica, de uma filosofia desigual, agora austera, logo brincalhona, coisa que não edifica nem destrói, não inflama nem regela, e é todavia mais do que passatempo e menos do que apostolado." (Cap. IV, A idéia fixa, p.16) Assim como em (a) e em numerosas outras passagens do livro, em (b) a figura do leitor aparece dentro do texto. Neste caso, o narrador encena uma situação de comunicação em que supostamente percebe uma reação do leitor ao que conta, e rejeita essa reação ("não esteja daí a torcer-me o nariz"). A idéia de incluir no texto supostas reações do interlocutor também foi trabalhada por Guimarães Rosa em Grande sertão: veredas, onde se lê logo no início: "O senhor ri certas risadas..." (33). Depois de comentar a reação do leitor, Brás Cubas diz: "ainda não chegamos à parte narrativa destas memórias". Essa frase faz supor que o livro, em seu conjunto, não é uma narrativa, mas contém uma. Pelo contexto, é possível depreender que a `parte narrativa' consiste na seqüência de acontecimentos biográficos, que inicia mais adiante. O narrador demonstra, nesse sentido, consciência de estar operando um discurso que não tem um único fio de andamento, um único nível de constituição. Trata-se de uma explicitação da complexidade do livro, que ganha detalhamento nas afirmações seguintes, referentes à caracterização do livro. Não por acaso, a caracterização é apresentada com pares de termos - "agora austera, logo brincalhona, coisa que não edifica nem destrói, não inflama nem regela, e é todavia mais do que passatempo e menos do que apostolado.". Brás Cubas oferece registros de dualidade para que possamos compreender a obra. O próprio conjunto gera efeito de dualidade, pois há aí dois pares de termos em tom afirmativo e dois pares de termos em tom negativo, constituindo o jogo afirmação/negação mais um recurso formal expressivo da dualidade. O tema do duplo, recorrente e fundamental em Machado de Assis, evoca uma afirmação de Augusto Meyer: a ambigüidade é o tema essencial do escritor (34). No caso, o mais importante talvez seja o primeiro par de termos: austera e brincalhona. A fusão de sério e cômico cria uma série de determinações literárias complexas - definição de gênero, método de composição, expectativa de público - que fogem aos padrões recorrentes no período. Incorporada de maneira consciente e explicitada no texto, essa fusão exige ponderação na análise. Cabe procurar, no próprio texto, registros para compreendê-la melhor. Leia-se o seguinte trecho:

33

ROSA, Guimarães. Grande sertão: veredas. Rio de Janeiro, José Olympio, 1978. 12 ed. p.9. MEYER, Augusto. O romance machadiano: o homem subterrâneo. In: BOSI, Alfredo et alii. Machado de Assis. São Paulo, Ática, 1982. (Coleção Escritores Brasileiros) p.363. Essa afirmação de algum modo se vincula ao estudo que Meyer fez da personagem Flora de Esaú e Jacó (em Machado de Assis. Op.cit. p.37-42). Meyer afirma que "todo o pensamento de Machado de Assis se corporifica nessa figura" (p.41), Flora, marcada pela dualidade. 34

10 (c) "Obra de finado. Escrevi-a com a pena da galhofa e a tinta da melancolia (...)" (Ao leitor, p.12) O par galhofa-melancolia, semanticamente, prenuncia na abertura o par brincalhona-austera. Nos dois casos, trata-se da fusão do cômico e do sério. Essa fusão é um dos fundamentos da constituição pautada na inconstância e na ambigüidade do Eu narrador. É o próprio sujeito, núcleo gerador e centro de gravitação da matéria narrativa, que se desestabiliza. Anatol Rosenfeld observa nos romances modernos um fenômeno dessa ordem, a dissolução da personagem de contornos bem definidos e do encadeamento lógico de motivos e situações do enredo, sustentado pela lei da causalidade. "Devido à focalização ampliada de certos mecanismos psíquicos, perde-se a noção de personalidade total e do seu `caráter', que já não pode ser elaborado em seqüência causal, através de um tempo de cronologia coerente" (35). Referindo-se a Nathalie Serraute, ele analisa: "Já não existe um Eu narrador fixo face a um Eu narrado em transformação; o próprio Eu narrador se transforma constantemente" (36). Os termos de Rosenfeld são perfeitamente apropriados para descrever a constituição ambígua e descontínua de Brás Cubas, como personagem e sobretudo como instância definidora do ponto de vista. A instabilidade de Brás Cubas foi estudada por diversos críticos, que a qualificaram de diferentes modos, como por exemplo "perpétuo tartamudear" (Silvio Romero, 37) e "volubilidade" (Roberto Schwarz, 38). Este último termo, salvo engano, se deve a Augusto Meyer, que fala em seu estudo machadiano de "caprichos volúveis do eu que se forma e se deforma, afirma e tropeça logo num desmentido cômico (...) cancha de contradições" (39). Wilton Cardoso chamou o livro de "obra difusa" (40). Uma das passagens mais ricas da obra é o capítulo LXXI, no qual Brás Cubas faz uma avaliação do próprio livro que se vincula diretamente aos comentários críticos mencionados. (d) "Começo a arrepender-me deste livro. Não que ele me canse; eu não tenho que fazer; e, realmente, expedir alguns magros capítulos para esse mundo sempre é tarefa que distrai um pouco da eternidade. Mas o livro é enfadonho, cheira a sepulcro, traz certa conotação cadavérica; vício grave, e aliás ínfimo, porque o maior defeito deste livro és tu, leitor. Tu tens pressa de envelhecer, e o livro anda devagar; tu amas a narração direita e nutrida, o estilo regular e fluente, e este livro e o meu estilo são como os ébrios, guinam à direita e à esquerda, andam e param, resmungam, urram, gargalham, ameaçam o céu, escorregam e caem..." (Cap. LXXI, O senão do livro, p.85) Cabe lembrar que em Ressurreição a provocação mais forte do narrador para com o leitor é chamá-lo de impaciente (conforme citação à p. 5). Aqui, o grau de provocação é bem maior: o leitor é nada menos do que o maior defeito do livro.

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ROSENFELD, Anatol. Reflexões sobre o romance moderno. In: ___. Texto/contexto. São Paulo, Perspectiva, 1985. 4 ed. p.85. Idem.p.93. 37 ROMERO, Silvio apud SUSSEKIND, Flora. Brás Cubas e a literatura como errata. Tempo Brasileiro. Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro, 1985. n.81. p.19. 38 SCHWARZ, Roberto. Complexo, moderno, nacional e negativo. In: _____. Que horas são? São Paulo, Companhia das Letras, 1987. p.118. 39 MEYER, Augusto. Machado de Assis. Op.cit. p.88. O comentário, dirigido ao estudo do romance de Machado de Assis, não se refere especificamente a Memórias póstumas de Brás Cubas. 40 CARDOSO, Wilton. Op.cit. p.140. 36

11 O problema se localiza justamente na especificidade do método de composição do livro, que o narrador avalia como incompatível com as expectativas do leitor. Essas expectativas consistem em "narração direita e nutrida" e "estilo regular e fluente", isto é, em uma forma literária ordenada, orgânica, com encadeamento linear. Brás Cubas expõe aí sua opção estética, que o distancia conscientemente das expectativas padronizadas do público. O livro e o estilo "são como os ébrios". Ora, a embriaguez consiste precisamente em uma situação de suspensão das normas de funcionamento regular da consciência. Na embriaguez, é elaborada uma lógica outra, uma lógica da alteridade, que suspende os critérios convencionais de percepção e enunciação. A sujeição da consciência à desordenação de seus suportes mais básicos, como a transgressão da convencional linearidade temporal, é um dos pilares de Brás Cubas, que o filiaria à categoria de romance moderno. A imagem de Machado do "livro ébrio" remete às formulações teóricas de Anatol Rosenfeld, que vê na consciência desordenada um dos eixos principais da ficção moderna. Rosenfeld, explicando a estrutura do romance moderno, afirma: "espaço e tempo, formas relativas da nossa consciência, mas sempre manipuladas como se fossem absolutas, são por assim dizer denunciadas como relativas e subjetivas. A consciência como que põe em dúvida o seu direito de impor às coisas - e à própria vida psíquica - uma ordem que já não parece corresponder à realidade verdadeira (...) Trata-se, antes de tudo, de um processo de desmascaramento do mundo epidérmico do senso comum (...) A visão de uma realidade mais profunda, mais real, do que a do senso comum é incorporada à forma total da obra" (41). A noção de construções "relativas e subjetivas" apresentada por Rosenfeld leva à idéia fundamental de Lucia Miguel Pereira de que o interesse da representação da natureza de Machado de Assis reside em que ela "se prende a toda uma visão relativista do mundo. Nem o bem, nem o mal, nem o tempo, nem a natureza representam valores fixos e inalteráveis; tudo é apreciado em relação ao homem" (42). A perspectiva embriagada de Brás Cubas parece remeter à noção de poética da destruição, atribuída por Davi Arrigucci Jr. à obra de Julio Cortázar. Da descrição estrutural dessa forma de composição, cabe resgatar o seguinte: "Fragmenta-se a sintaxe (...) do texto inteiro, exigindo uma leitura-montagem dos segmentos justapostos, que ele deve conciliar dentro do leque ambíguo das múltiplas possibilidades combinatórias." (43). Essa poética, "oscilante entre o convite do caos e a necessidade da forma" (44), envolve uma tendência ao encontro com o limite da palavra, uma tentativa de expressar o que não se presta à verbalização imediata. Na passagem abaixo, é exposto esse encontro com o limite da palavra: (e) "Quanto a mim, se vos disser que li o bilhete três ou quatro vezes, naquele dia, acreditai-o, que é verdade; se vos disser mais que o reli no dia seguinte, antes e depois do almoço, podes crê-lo, é a realidade pura. Mas se vos disser a comoção que tive, duvidai um pouco da asserção, e não a aceiteis sem provas. Nem então, nem ainda cheguei a discernir o que experimentei. Era medo, e não era 41

ROSENFELD, Anatol. Reflexões sobre o romance moderno. op.cit. p.81. PEREIRA, Lucia Miguel. Machado de Assis. In: ____. Prosa de ficção (de 1870 a 1920). Rio de Janeiro, José Olympio, 1950. p.83. ARRIGUCCI JR., Davi. Tema e voltas. In: ___. O escorpião encalacrado. São Paulo: Perspectiva, l973. p.22-3. 44 ARRIGUCCI JR., Davi. Tema e voltas. In: ___. O escorpião encalacrado. São Paulo: Perspectiva, l973. p.27. 42 43

12 medo; era dó e não era dó; era vaidade e não era vaidade; enfim, era amor sem amor, isto é, sem delírio; e tudo isso dava uma combinação assaz complexa e vaga, uma coisa que não podereis entender, como eu não entendi. Suponhamos que não disse nada." (Cap. CVIII, Que se não entende, p.112) A sucessão de paradoxos - "tudo é e não é", para lembrar Grande sertão: veredas - e a manifestação franca da incapacidade de compreender e verbalizar emoções podem ser lidas pelo registro do humor, mas não apenas assim; trata-se de mais um modo de indiciar a necessidade de problematizar a eficácia da representação, e de mostrar a impossibilidade de uma representação totalizante, com sentido inteiramente compreensível. Os paradoxos contrariam a expectativa de coerência lógica do discurso. A garantia de coerência lógica ao longo de toda a narração seria necessária para compreender a articulação de elementos da estrutura narrativa. Outro trecho em que se põe em xeque essa garantia é o seguinte: (f) "E vejam com que destreza, com que arte faço eu a maior transição deste livro. Vejam: o meu delírio começou em presença de Virgília; Virgília foi o meu grão-pecado da juventude; não há juventude sem meninice; meninice supõe nascimento; e eis aqui como chegamos nós, sem esforço, ao dia 20 de outubro de 1805, em que nasci. Viram?" (Cap. IX, Transição, p.24) Apresentando-se como estrutura ordenada causal e construindo-se como livre associação humorística, esse trecho propõe ao leitor a questão ("Viram?") a respeito do critério que permite avaliar a sustentação lógica de um discurso. A passagem aponta para a suspensão da lógica rigorosa em favor de um jogo cujas regras são ditadas pela perspectiva ébria. Retomando a leitura de (e), cabe observar o seguinte. A manifestação de insuficiência de condições para verbalizar o que se passou abre uma margem de imponderabilidade no teor da narrativa: o narrador não pode controlar tudo que deveria, ele revela limitações. "Muita coisa importante falta nome." (45) "Neste ponto estou tentando expressar algo que não se pode expressar" (46). O problema da duplicidade sério-cômico em (b) e (c) e a incompatibilização entre o livro e o leitor em (d) somam-se aos paradoxos e à insuficiência expressiva, resultando em um conjunto de elementos que, como os "não sei" de Ressurreição, fogem à expectativa de funcionamento da narração tradicional, criando uma margem de indeterminação do sentido. Essa margem de indeterminação, em (e), ganha um caráter propriamente imperativo: "duvidai". A atitude de provocação forte ao leitor em (d) ganha aqui o seu contraponto: o narrador, expondo suas limitações, destitui sua própria credibilidade. A atitude negativa do narrador com relação a si próprio se desenvolve de várias maneiras. Nas passagens abaixo, o narrador provoca o leitor ao relativizar o valor daquilo que havia exposto anteriormente. Cabe registrar que em (h) está transcrito todo o Cap. CXXXVI, que se reduz insolitamente apenas a uma frase.

45 46

ROSA, João Guimarães. Grande sertão: veredas. Rio de Janeiro: José Olympio, 1978. 12 ed.p.86. WITTGENSTEIN, apud ARRIGUCCI JR., Davi. op.cit. p.27.

13 (g) "Mas este capítulo não é sério." (Cap. CXXXII, Que não é sério, p.128) (h) "Mas, ou muito me engano, ou acabo de escrever um capítulo inútil." (Cap. CXXXVI, Inutilidade, p.130) Em (i), Brás Cubas relativiza sua própria produção sugerindo descontentamento com o que havia escrito, chegando a qualificar uma frase sua como "muito parecida com despropósito". O trecho contém uma provocação ao trabalho dos críticos. (i) "Talvez suprima o capítulo anterior; entre outros motivos, há aí, nas últimas linhas, uma frase muito parecida com despropósito, e eu não quero dar pasto à crítica do futuro." (Cap. LXXII, O bibliômano, p.85) Outra atitude negativa do narrador com relação a si próprio é a manifestação de limitações de conhecimento, no que se refere aos acontecimentos que apresenta. (j) "Digo essas coisas por alto, segundo as ouvi narrar anos depois; ignoro a mor parte dos pormenores daquele famoso dia." (Cap. X, Naquele dia, p.25)

Os elementos de comportamento do narrador presentes em (e), (g), (h), (i) e (j) caracterizados pela atitude negativa deste em relação a si próprio levam a formar uma imagem inquietante e indigna de credibilidade dessa figura. Ele mesmo, em uma passagem, parece mostrar consciência disso, ao fazer um julgamento de si mesmo. (k) "Talvez espante ao leitor a franqueza com que lhe exponho e realço a minha mediocridade; advirta que a franqueza é a primeira virtude de um defunto." (Cap. XXIV, Curto, mas alegre, p. 45) A conciliação da virtude positiva - `franqueza' - com a negatividade de `mediocridade' é proposta de modo congruente com os pares de opostos examinados à p. 9; a obra é austera e brincalhona, funde o sério e o cômico (47). O fato de o narrador-protagonista definir a si mesmo desse modo, envolvido em ambigüidades e salientando sua mediocridade, pode servir para qualificá-lo de herói problemático. Na epopéia clássica, o narrador tem um vínculo com a ordem do sagrado; sua capacidade de transmitir o relato é atribuída à vontade das Musas. O herói épico tem o sentido de suas ações determinado por desígnios divinos e por interesses da nação na qual nasceu. Os heróis épicos em si mesmos representariam elementos do caráter nacional (48). É essencial para a existência heróica que os valores sociais fundamentais não tenham

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Cabe lembrar aqui Alfredo Bosi que, a partir do conto `O espelho', enuncia como "certeza machadiana" que "aquém da cena pública a alma humana é dúbia e veleitária" BOSI, Alfredo. A máscara e a fenda. In: _____ et alii. Machado de Assis. São Paulo, Ática, 1982. (Coleção Escritores Brasileiros) p.448. 48 HEGEL. Estética - poesia. Lisboa, Guimarães, 1980. p.161.

14 adquirido "objetividade separada da subjetividade individual"(49). Quando essa separação existe, como no caso de Brás Cubas, trata-se de uma existência prosaica, não heróica. A situação de Brás Cubas corresponderia precisamente ao problema do desenraizamento transcendental. O sentido da experiência não é algo dado, com base em uma relação entre o divino e o humano da ordem da totalidade, como no mundo da epopéia grega, mas algo buscado, dentro dos limites da precariedade humana. A épica, de acordo com Lukács, envolve "uma totalidade de vida acabada por ela mesma, o romance procura edificar a totalidade secreta da vida" (50). O problema é explicado por Alfredo Bosi: "O romance, estrutura formada em uma sociedade heterogênea, contraditória e descontínua, procede sem modelos prévios, como toda busca ou arriscada travessia: o seu herói é problemático, pois deve construir para si mesmo - em meio aos acasos e às rupturas da existência - um sentido que, contrariamente ao que ocorre na antiga epopéia, não lhe é dado jamais e poderá fugir-lhe para sempre." (51) O problema da indeterminação de sentido e a atitude negativa do narrador-protagonista com relação a si mesmo estariam vinculadas à ausência de um suporte transcendental para a definição do sentido de cada ato. Para a crítica literária, se impõe a dificuldade de pensar o sentido daquilo que parece, por suas leis internas, querer sempre recair na abertura e na ambigüidade e desautorizar a atribuição de um sentido fechado e totalizante. Cabe lembrar aqui a teoria da lírica moderna de Hugo Friedrich, pois ela ajudou a possibilitar à crítica literária a atribuição de sentido a fenômenos poéticos aparentemente destituídos de sentido. Recuperando alguns pontos de seu trabalho, cabe lembrar que Friedrich deu um estatuto importante à obscuridade poética. A poesia moderna não quer ser clara: quer nos conduzir ao âmbito do estranho, quer nos propor uma "união irreal daquilo que real e logicamente é inconciliável" (52). O poema não encerra um significado que corresponda às expectativas habituais do leitor. Este é lançado na impressão de anormalidade, pois a difícil compreensibilidade é uma característica da "vontade estilística" (53) do fazer poético. A partir daí, Friedrich elabora a idéia de que, para pensar a poesia moderna, é necessário usar categorias negativas. Algumas das citadas: desorientação, ordem sacrificada, incoerência, lampejos destrutivos, imagens cortantes, estranhamento (54). Depois, Friedrich postula a hipótese de que a "não assimilabilidade definitiva (...) seria uma característica essencial do poetar moderno" (55). Colocando Memórias póstumas de Brás Cubas em diálogo com a poesia moderna, podemos afirmar que, guardadas as diferenças e as proporções, as categorias de Friedrich poderiam ser aplicadas à análise de Machado de Assis. A fragmentação da estrutura narrativa nesse romance está diretamente associada, assim, à idéia de Machado de uma abertura para a indeterminação de sentido no discurso do romance. Podemos falar

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ROSENFELD, Anatol. Heróis e coringas. In: Teoria e prática. São Paulo: (2):41-3, out.s.a. LUKÁCS, Georg. Teoria do romance. Lisboa, Presença, s.d. p.66. BOSI, Alfredo. Reflexões sobre a arte. São Paulo: Ática, l985. p.46. 52 FRIEDRICH, Hugo. Estrutura da lírica moderna. São Paulo, Duas Cidades, 1978. p.18. 53 Idem, p.19. 54 Idem, p.22. 55 Idem, p.23. 50 51

15 com segurança em desorientação, ordem sacrificada, incoerência, lampejos destrutivos e estranhamento ao avaliar a composição de Brás Cubas, sobretudo passagens como as citadas anteriormente. A partir das reflexões de Friedrich, em suma, é possível dizer que a obra de Machado é propriamente moderna justamente por lidar com a idéia de uma indeterminação do sentido e por exigir, para sua compreensão, categorias negativas. Na construção de sua argumentação, Friedrich se vale de um recuo ao romantismo francês, no qual detecta elementos que estão relacionados às categorias negativas da poesia moderna: amargura, gosto das cinzas, melancolia, dor cósmica, lamento (56). E considerando Victor Hugo pensa a noção de que a idéia de `todo' é uma transcendência vazia (57). Essa parte da reflexão de Friedrich conduz a outro problema de leitura de Machado: a articulação entre os registros modernos - indeterminação do sentido e negatividade - e a melancolia. Como aparece em (c), à p. 10, o narrador afirma ter construído sua obra com "a pena da galhofa e a tinta da melancolia". Essa dualidade vai levar, na passagem (l), à resistência interna à própria melancolia: (l) "Fiquei tão triste com o fim do último capítulo que estava capaz de não escrever este, descansar um pouco, purgar o espírito da melancolia que o empacha, e continuar depois. Mas não, não quero perder tempo." (Cap. CXVI, Filosofia das folhas velhas, p.117) Brás Cubas em certo ponto se aproxima de Hamlet que, para Walter Benjamin, é uma espécie de paradigma do melancólico (58). Mas a aproximação resulta em distinção. (m) "(...) foi assim que me encaminhei para o undiscovered country de Hamlet, sem as ânsias nem as dúvidas do moço príncipe, mas pausado e trôpego, como quem se retira tarde do espetáculo. Tarde e aborrecido." (Cap. I, Óbito do autor, p.13) O termo "trôpego" está vinculado ao "ébrio" que define o estilo do livro em (d). O crivo de aproximação é o defrontamento com a morte; o de afastamento, a atitude com relação a ela. Com efeito, em Brás Cubas não se desenvolve uma especulação com a gravidade da elaborada por Hamlet 59

( ). De todo modo, ainda que em graus e modos diferentes, tanto o texto de Shakespeare como o de Machado de Assis envolvem um componente de melancolia. Em Hamlet, o protagonista busca restabelecer a ordem em uma sociedade desordenada, com a identificação e extirpação de um criminoso. Neste caso, para eliminar o Rei impuro, Claudius, seu tio, Hamlet será obrigado a igualar-se a ele. Para punir um assassino, é preciso assassiná-lo. Para vingar a morte de um Rei, é preciso matar também um Rei. O resultado dessa vingança seria lamentável para Hamlet: ele seria um Rei, ao lado de sua mãe como Rainha (à beira do incesto), colocado no poder às custas da matança, tal como seu tio. Esse igualamento do criminoso e do punidor dissolveria todo princípio de distinção ética. A melancolia hamletiana se deve, em parte, ao fato de que no caso a justiça, colocada em mãos humanas, é idêntica ao crime. Para ser justo, é preciso se igualar ao impuro. Essa situação é afastada ao máximo, e o ato 56

Idem, p.30-1. Idem, p.33. BENJAMIN, Walter. Origem do drama barroco alemão. São Paulo, Brasiliense, 1984. p.180. 59 SHAKESPEARE, William. Hamlet. Rio de Janeiro, Tecnoprint, s.d. 57 58

16 de vingança demora a acontecer. Ele mata Claudius apenas depois de ser atingido mortalmente - liberando-se, portanto, da possibilidade de ganhar o trono, e de se igualar ao criminoso. Definindo o homem como "um simples bruto", Hamlet reflete sobre a naturalidade com que os membros de um exército defrontam a morte. Sentindo ele mesmo necessidade de encarar de forma incisiva o plano de matar o tio, ao comentar o empenho dos militares, diz: "Vejo, envergonhado, vinte mil homens próximos da morte, que por simples capricho de vaidade caminham para o túmulo tal como se fossem para o leito (...) Doravante terei só pensamentos de sangue ou sem valor, soltos aos ventos." (60) A afirmação de uma necessidade de se entregar a "pensamentos de sangue" para poder fazer justiça é uma das expressões da inadaptação

melancólica de Hamlet ao seu projeto de vingança. Diferentemente da

situação de Édipo Rei de Sófocles, em que a verdade oracular sobre o destino se apresenta como certeza, Hamlet lida com noções humanas. Disso resulta uma diferença essencial. Em Édipo, o próprio Rei impuro se pune. Em Hamlet, não; é preciso que outro o faça. Hamlet está beirando o tempo todo a condição de ambigüidade trágica, tal como descrita por Vernant - o sujeito que é ao mesmo tempo Rei, acima dos outros humanos, e criminoso, idêntico ao mais condenável transgressor (61). Um dilema que concerne a essas obras consiste na possibilidade de a condição humana abarcar formas diametralmente opostas do ponto de vista moral, que vão do Rei sábio e vigoroso ao criminoso mais condenável. Édipo reúne em si, ambiguamente, essas duas faces. Hamlet, Príncipe, tem de igualar-se ao criminoso abominável que se tornou Rei para fazer justiça. O efeito global dessa indistinção é a suspensão das distinções básicas que dão ordem hierárquica ao real. É aberta uma margem de indeterminação na fronteira entre o moral e o imoral, o justo e o injusto, o bem e o mal. "As coisas, em si mesmas, não são nem boas nem más; é o pensamento que as torna desse ou daquele jeito." (62). Esta afirmação de Hamlet, examinada por Anatol Rosenfeld como manifestação de "relativismo moral" (63), corresponde à descrição que Lucia Miguel Pereira faz, em passagem citada à p. 11, da visão relativista em Machado de Assis. Bem, mal tempo e natureza não tem valores absolutos, são elementos relativos ao homem. O comportamento de Brás Cubas parece estar permanentemente não acomodado com relação aos códigos simbólicos de sustentação da moral da vida social. Sua relação com as leis sociais referentes à fidelidade e ao adultério não envolve gravidade ou culpabilidade séria. No capítulo XI, é capaz de manifestar interesse em compreender a injustiça humana, e expressar seu prazer em maltratar escravos. Relata que na infância rezava de manhã e de noite pedindo perdão, e entre esses momentos "fazia uma grande maldade" (p.26). Os exemplos de indeterminação dos limites entre o moral e o imoral, entre o justo e o injusto para Brás Cubas são numerosos, e mereceriam uma atenção mais detalhada. O que cabe enfatizar é que, mesmo estando presente 60

Idem. p.136-7. VERNANT, Jean-Pierre. Ambigüidade e reviravolta. Sobre a estrutura enigmática de "Édipo Rei". In: ___ & VIDAL-NAQUET, Pierre. Mito e tragédia na Grécia Antiga. São Paulo: Brasiliense, 1988. 62 SHAKESPEARE, William. Hamlet. Rio de Janeiro, Tecnoprint, s.d. p.72. 63 ROSENFELD, Anatol. Texto/contexto. op.cit. p.134. 61

17 um registro humorístico, encontra-se aqui algo que, filosoficamente, pode ser considerado base para a melancolia. O homem é descrito por Hamlet como "quintessência do pó" (64). A caracterização lembra a errata pensante de Machado de Assis, por associar a condição humana e a finitude. (n) "Deixa lá dizer Pascal que o homem é um caniço pensante. Não; é uma errata pensante, isso sim. Cada estação da vida é uma edição, que corrige a anterior, e que será corrigida também, até a edição definitiva, que o editor dá de graça aos vermes." (Cap. XXVII, Virgília?, p.49) Um dos pontos essenciais da melancolia de Hamlet é a imponderabilidade da morte. Caracterizada como undiscovered country, a morte é encarada como enigma. A ignorância do que seja a morte leva o homem, de acordo com Hamlet, a aceitar os males conhecidos, evitando os ignorados (65). O estado melancólico, pelo menos em Hamlet, teria então como base a suspensão das distinções básicas da ordem hierárquica da real e a imponderabilidade da morte. Os dois elementos são ligados por um componente comum: a indeterminação de um sentido, onde se esperava encontrar um sentido claro. Esse componente, examinado no domínio da teoria do romance, corresponde ao cerne do desenraizamento transcendental, fundamento da constituição do herói problemático. O mesmo componente, examinado pelo ângulo da teoria da melancolia, corresponde ao problema da articulação entre transcendência e finitude: a inacessibilidade da plenitude leva à "insatisfação especialmente viva causada pelo finito" (66). A aspiração pelo absoluto é simultânea à certeza de que a própria aspiração é vã. Onde deveria haver uma transcendência, há um vazio, em que o sujeito humano é abandonado. Daí deriva a "impossível tentativa de conciliação de opostos" (67), plenitude e vazio, aspiração e abandono, que marca a melancolia. Sendo a melancolia algo associado à necessidade de conciliar opostos, é notável que a expressão do melancólico seja, formalmente, um processo estilístico que envolve aproximação de opostos. Erich Auerbach faz a análise das falas de Hamlet elaborando precisamente esse ponto. Ele explica: "A loucura, meio verdadeira, meio fingida, de Hamlet delira, às vezes, até dentro de uma mesma cena, ou até de uma mesma fala, através de todos os níveis estilísticos; ele pula, por exemplo, do gracejo indecente para o lírico ou para o sublime, da ironia absurda para a obscura e profunda meditação, do humilhante escarnecimento dos outros e de si mesmo para a patética função judiciária e a orgulhosa auto-afirmação" (68). E mais adiante diz: "Shakespeare mistura o sublime e o baixo, o trágico e o cômico, numa inesgotável plenitude de modulações" (69). É possível estabelecer uma analogia formal entre o discurso melancólico de Hamlet, de acordo com a leitura de Auerbach, e o discurso de Brás Cubas, conforme ele define em (b), (c) e (d). Trata-se da fusão de registros opostos, qualificada como semelhante ao estado ébrio.

64

SHAKESPEARE, William. Hamlet. p.74. Idem. p.91. 66 GUARDINI, apud STEIN, Ernildo. Melancolia. Porto Alegre, Movimento, 1976. p.14. 67 STEIN, Ernildo. op.cit. Conforme cap.2. 68 AUERBACH, Erich. Mimesis - a representação da realidade na literatura ocidental. São Paulo, Perspectiva, 1976. 2 ed. p.281. 69 Idem. p.282. 65

18 O fato de que em (m) Brás Cubas se compara a Hamlet e salienta sua diferença com relação ao herói trágico suscita uma questão a respeito da especificidade de Brás Cubas. Segundo ele próprio, ele não carrega as "as ânsias nem as dúvidas" do personagem de Shakespeare. Isto é, enquanto Hamlet se vê envolvido com uma questão da maior gravidade que o leva ao final à própria destruição, Brás Cubas se vê lançado na ociosidade. Augusto Meyer observou que Brás Cubas, assim como outros personagens (inclusive o Conselheiro Aires), vive em clima de ociosidade, "resvalando da inércia para a veleidade (...) do sorriso para o bocejo" (70). A melancolia surge com a atitude de auto-absorção (71). No caso de Hamlet, esta atitude está ligada à gravidade do problema a enfrentar. Em Brás Cubas, à ociosidade.

Memorial de Aires Em Memorial de Aires, texto escrito em forma de diário íntimo, a situação de comunicação é diferente das apresentadas em Ressurreição e Memórias póstumas de Brás Cubas. Ao invés de apresentar um leitor como interlocutor, o último romance de Machado de Assis coloca nessa posição o papel em que Aires escreve. "Papel, amigo papel, não recolhas tudo o que escrever esta pena vadia. Querendo servir-me, acabarás desservindo-me, porque se acontecer que eu me vá desta vida, sem tempo de te reduzir a cinzas, os que me lerem depois da missa de sétimo dia, ou antes, ou ainda antes do enterro, podem cuidar que te confio cuidados de amor. Não, papel. Quando sentires que insisto nessa nota, esquiva-te da minha mesa, e foge. A janela aberta te mostrará um pouco de telhado, entre a rua e o céu, e ali ou acolá acharás descanso." (8 de abril, p.33-4) O papel é tratado como entidade humanizada - `amigo papel' - à qual se atribui uma espécie de autonomia, de capacidade de ação. A ele são dirigidas expressões no imperativo ("não recolhas", "esquiva-te"). No contexto do livro, esse elemento é funcional na constituição do discurso melancólico. Trata-se de propor uma presença na pura ausência, uma plenitude onde há vazio. Introduzir uma representação de vitalidade onde sabidamente ela não pode estar leva a esvaziar o sentido efetivo da própria vitalidade, o que corresponde à relação emocional de Aires consigo mesmo. Ao confiar "cuidados de amor" ao papel, Aires demonstra afetividade pelo próprio ato de escrever. A escrita ocupa um lugar importante em sua vida, e a ação propriamente dita é para ele escassa. Há referências ao papel em muitas partes do livro. Cabe destacar pelo menos mais uma, por sua complexidade.

70

MEYER, Augusto. O romance machadiano: o homem subterrâneo. In: BOSI, Alfredo et alii. Machado de Assis. São Paulo, Ática, 1982. (Coleção Escritores Brasileiros) p.362. 71 BENJAMIN, Walter. Origem do drama barroco alemão. São Paulo, Brasiliense, 1984. p.165.

19 "Fique isto confiado a ti somente, papel amigo, a quem digo tudo o que penso e tudo o que não penso" (16 de junho, p.47) Eleito como confidente, o papel recebe tudo que Aires pensa e tudo que não pensa. É difícil interpretar essa proposição. Ela surge como paradoxo, lembrando o "Era medo, e não era medo; era dó e não era dó" de Brás Cubas, e colocando em suspenso a diferença entre o pensável e o não pensável: tudo é matéria de escrita. Cabe examinar, em algumas passagens, como se coloca para Aires a motivação do ato de escrever. "Talvez seja melhor parar. Velhice quer descanso. (...) Qual! não posso interromper o Memorial; aqui me tenho outra vez com a pena na mão. Em verdade, dá certo gosto deitar ao papel coisas que querem sair da cabeça, por via da memória ou da reflexão. (...) Desta vez o que me põe a pena na mão é a sombra da sombra de uma lágrima..." (21 de agosto e 24 de agosto, p.63) Após demonstrar na carta de 21 de agosto, de modo hesitante, um desejo de interromper a continuidade da escrita, em 24 de agosto Aires manifesta claramente seu "gosto" em escrever. O gosto está associado, contudo, à lágrima: não se trata de manifestar apenas sentimentos eufóricos, mas de expressar tristeza. Esse tipo de confissão lírica, amarga e séria a respeito da dor pessoal não aparece nas Memórias póstumas de Brás Cubas. "Escrevo isto só para não perder longamente o costume." (13 de julho, p.53) Esta frase parece confirmar a idéia de Augusto Meyer, citada à p. 18, de que a inércia é um dos componentes da existência do Conselheiro Aires. Ela ganha ressonância em outra passagem: "(...) ainda não me cansei de o escrever nestas páginas de vadiação. Chamo-lhes assim para divergir de mim mesmo. Já chamei a este Memorial um bom costume. Ao cabo ambas as opiniões se podem defender, e, bem pensado, dão a mesma coisa. Vadiação é bom costume." (2 de agosto, p.56-7) A riqueza desta passagem consiste em que se formula o caráter paradoxal do pensamento de Aires. Ao dizer que chama a escrita de vadiação o faz "para divergir de mim mesmo", supõe entender como oposição a relação entre os termos `vadiação' e `bom costume'. Mas, após o "bem pensado", chega à conclusão que dissolve a oposição: "Vadiação é bom costume." Em um espaço de cinco linhas, uma relação entre conceitos é proposta e imediatamente negada. Guardadas as diferenças, esse andamento de raciocínio lembra o "perpétuo tartamudear" de Brás Cubas, examinado à p. 10. Trata-se de uma instabilidade na sustentação lógica do discurso, que cria um problema de delimitação do sentido do que é dito. Podemos considerar a suspensão do pensamento lógico convencional um registro afim à melancolia, uma vez que Benjamin vê como uma de suas manifestações um vínculo entre inteligência e loucura (72). Aires, assim como Brás Cubas, demonstra ter erudição e habilidades intelectuais, mas o modo de constituição de seu discurso, que chega,

72

Idem. p.170.

20 como nesse exemplo, ao paradoxo, expõe uma relação irregular com o trabalho intelectual, em que o próprio respeito à verdade objetiva se sujeita ao "tartamudear".

"Foi o que me pareceu e deixo aqui escrito." (23 de junho, p.49) O verbo parecer introduz na ordem do relato um componente abertamente subjetivo; parecer revela que o que é apresentado consiste em uma impressão ou interpretação, não um fato objetivo. "Isto não foi ele quem me disse nem ninguém; eu é que o adivinho e escrevo aqui para mostrar a mim mesmo o que é fácil de ver." (1 de julho, p.52) Aqui se abandona inteiramente a expectativa de que o relato contenha fatos objetivos. O que a escrita de Aires traz é sua adivinhação, sua suposição. O valor de uma adivinhação é definido: trata-se de mostrar algo a si mesmo. O conteúdo interessa não enquanto algo a ser mostrado para outro, mas para o próprio Aires. Existe aqui algo que não se põe igualmente nos dois outros romances: uma atitude de centrar-se em si mesmo. Aires está voltado sobre si mesmo. O abandono da figura do `leitor' e o surgimento da figura `papel' é um dos registros desse centrar-se em si mesmo. Outro é o fato de que, por vezes, Aires dirige-se a si próprio, e o narrador coincide com o interlocutor, formando-se um misto incomum de monólogo e diálogo. "Meu velho Aires, trapalhão da minha alma, como é que tu comemoraste no dia 3 o ministério Ferraz, que é de 10? Hoje é que ele faria anos, meu velho Aires." (10 de agosto, p.60) "Aires amigo, confessa que ouvindo ao moço Tristão a dor de não ser amado, sentiste tal ou qual prazer, que aliás não foi longo nem se repetiu." (3 de dezembro, p.99) Centrado em si próprio, Aires tem sua percepção do mundo pautada na idéia de transitoriedade das coisas, que se vincula fortemente à sua própria velhice. "Tudo serão modas neste mundo, exceto as estrelas e eu (...)" (11 de fevereiro, p.31) "Costumes e instituições, tudo perece." (28 de julho, p.55) "Tudo é fugaz neste mundo." (24 de agosto, p.63) Além da transitoriedade, Aires vê o mundo marcado pela contradição. "Tudo é assim contraditório e vago também" (24 de agosto, p.64)

21 Tanto a transitoriedade como a contradição são registros referentes à impossibilidade de uma definição estável do modo de ser das coisas. Trata-se de uma abertura à indeterminação de sentido. A palavra melancolia aparece diversas vezes ao longo do romance e, retomando um ponto anterior, como se tentou explicar à p. 17, precisamente a abertura à indeterminação de sentido, por causa da suspensão das distinções básicas da ordem hierárquica da real e da imponderabilidade da morte, é que está na base da melancolia em Hamlet. Abandonado à solidão em um mundo marcado pela transitoriedade e pela contradição, Aires tem de enfrentar a possibilidade da morte. Nas linhas que escreve em 18 de setembro (p.74), Aires relata uma conversa com D. Carmo sobre a morte, na qual diz ter tentado atenuar "a nota melancólica" que a mulher trouxe ao diálogo. O ponto central da conversa consiste no problema da finitude, que se coloca dramaticamente ao se pensar o afastamento entre os mais velhos e os mais jovens. Diz Aires nessa conversa que o melhor é "não pensar" na morte. Cabe registrar uma passagem importante a esse respeito: "Estou só, totalmente só. Os rumores de fora, carros, bestas, gentes, campainhas e assobios, nada disto vive para mim. Quando muito o meu relógio de parede, batendo as horas, parece falar alguma coisa, - mas fala tardo, pouco e fúnebre. Eu mesmo, relendo estas últimas linhas, pareço-me um coveiro." (30 de setembro, p.79) Quatro pontos a assinalar. (1) A afirmação de solidão total, que corresponde à atitude de auto-absorção do melancólico, já citada no caso de Hamlet. (2) A radicalidade de que nada no mundo de fora "vive" para Aires; o mundo se converte em indiferente mundo dos mortos. (3) O relógio, referência à passagem do tempo e à transitoriedade, que se apresenta expressamente como fúnebre, ritualizando a proximidade da morte. (4) A compreensão de si mesmo como coveiro, agenciador da própria morte. Todos esses pontos convergem para a composição melancólica. A auto-absorção leva a uma espécie de abismo sem fundo (73). Existe um texto de Machado de Assis que faz uma espécie de conceituação metafórica da melancolia. Trata-se do conto Lágrimas de Xerxes (74). Nesse conto, Machado toma dois personagens de Shakespeare, Romeu e Julieta, e cria uma situação ficcional em que ambos discutem com um personagem chamado Frei Lourenço a possibilidade do amor eterno. A conversa se dirige para uma reflexão sobre o tempo e a finitude. Dentro dessa conversa, Frei Lourenço apresenta uma passagem de um relato contido na História de Heródoto. Trata-se de um núcleo narrativo da Polímnia, o livro VII da obra de Heródoto. Conhecido como guerreiro cruel, Xerxes tem a certo ponto um momento humanamente doloroso. De acordo com o texto de Heródoto (partes XLV e XLVI da Polímnia), Xerxes, depois de olhar para seu exército, "inexplicavelmente pôs-se a chorar". Seu tio Artábano expõe a Xerxes seu espanto em vê-lo chorar, e ele então diz: "Quando

73 74

Idem. p.165. ASSIS, Joaquim M. Machado de. Páginas recolhidas. Rio de Janeiro, Garnier, 1990.

22 refleti sobre a brevidade humana e ao pensar que de tantos milhões de homens não restará um só dentro de cem anos, senti-me tomado de compaixão" (75). Após expor o relato de Heródoto, Frei Lourenço apresenta uma elaboração poética das possibilidades de destino das lágrimas de Xerxes. Os ventos teriam perguntado à lua que fazer dessas lágrimas, e ela teria aconselhado a fazer dela "uma estrela que brilhe por todos os séculos, com a claridade da compaixão, e onde vão residir todos aqueles que deixarem a terra, para achar ali a perpetuidade que lhes escapou" (p.75). Assim, a orientação da lua consiste em associar simbolicamente a finitude e a compaixão, oferecendo aos seres finitos uma imagem da perenidade. Após a consulta à lua, os ventos, de acordo com Frei Lourenço, consultaram o sol. É nesse ponto que se formula a problemática da melancolia: "O sol ouviu e redargüiu que sim, que cristalizassem as lágrimas e fizessem delas uma estrela; mas nem tal como o pedia a lua, nem para igual fim. Há de ser eterna e brilhante, disse ele, mas para a compaixão basta a mesma lua com a sua enjoada e dulcíssima poesia. Não; essa estrela feita das lágrimas que a brevidade da vida arrancou um dia ao orgulho humano ficará pendente do céu como o astro da ironia, luzirá cá de cima sobre todas as multidões que passam, cuidando não acabar mais e sobre todas as cousas construídas em desafio dos tempos. Onde as bodas cantarem a eternidade, ela fará descer um dos seus raios, lágrima de Xerxes, para escrever a palavra da extinção, breve, total, irremissível. Toda epifania receberá esta nota de sarcasmo. Não quero melancolias, que são as rosas pálidas da lua e suas congêneres; - ironia, sim, uma dura boca, gelada e sardônica." (p.75) A articulação dos elementos internos do conto cria uma oposição entre dois campos de referência simbólica. O primeiro envolve o sol, a ironia, o sarcasmo, o raio. O segundo envolve a lua, a melancolia, a compaixão, a rosa pálida. Pela composição do relato, é possível entender que tanto a ironia como a melancolia vêm da mesma origem: o reconhecimento da finitude. A ironia, de acordo com o texto, consiste em um registro incisivo, agressivo (como um raio) da finitude, enquanto a melancolia consiste em um registro associado à compaixão e à brandura. O problema da finitude, que Ernildo Stein caracterizou como núcleo da melancolia (76), está presente em muitos textos de Machado de Assis. Augusto Meyer observou "a presença inefável da morte em quase toda a sua obra" (77). Talvez esta presença esteja relacionada com aquilo que Meyer, observando a continuidade entre os dois romances, chamou de "nota monocórdia", um "tom" que está presente em Brás Cubas e "ainda será reconhecível na obra derradeira" (78). Tanto Memórias póstumas de Brás Cubas como Memorial de Aires são obras que incidem fortemente sobre o problema da morte. A finitude está presente ali. Dirce Cortes Riedel examinou em detalhe nesses dois livros o problema do aspecto destruidor do tempo, que inevitavelmente conduz à morte (79). Brás Cubas se constrói a partir "da perspectiva da morte" (80), do defunto autor. Aires vê a realidade marcada pela transitoriedade e chega a ver a si mesmo como coveiro. 75

HERÓDOTO. História. São Paulo, Jackson, 1953. v. 2. Livro VII. p.155. STEIN, Ernildo. Melancolia. op.cit. p.13-4. 77 MEYER, Augusto. Machado de Assis. op.cit. p.90. 78 MEYER, Augusto. O romance machadiano: o homem subterrâneo. op.cit. p.359. 79 RIEDEL, Dirce Cortes. O tempo no romance machadiano. Rio de Janeiro, São José, 1959. p.183 e seguintes. 80 CARDOSO, Wilton. op.cit. p.142. 76

23 A melancolia está presente nas duas obras, mas não do mesmo modo. A diferença entre elas, no que se refere a esse ponto, é uma diferença de ênfase. Em Memórias póstumas de Brás Cubas, a escrita surge "com a pena da galhofa e a tinta da melancolia", com uma combinação entre o sério e o cômico, entre a austeridade e a brincadeira. O componente do sarcasmo, decisivo no discurso de Cubas, é incluído pelo sol no registro da ironia. A relação com o leitor envolve provocação intensa, e o narrador trata a si mesmo de modo negativo. Esses aspectos incisivos são expressões talvez do raio da ironia. A composição de Memórias póstumas, em suma, tem um acento na ironia. Diferentemente, Memorial de Aires tem acento na melancolia. Augusto Meyer expõe claramente que, com relação à produção anterior, "Não há realmente no Memorial de Aires a mesma petulância irônica, certa indulgência crepuscular esfuma a ironia (...)." (81) O tom resignado de Aires, a compaixão por D. Carmo, a ausência de qualquer provocação sarcástica ao leitor, a substituição do leitor pelo papel, o lamento sério (mas não agressivo) pela transitoriedade são elementos expressivos de uma postura mais branda, propriamente melancólica e não tanto irônica. Conforme Lucia Miguel Pereira, "a cruel lucidez de Brás Cubas abrandou-se na lucidez de espectador do Conselheiro Aires" (82). Semelhantes na lucidez, diferem pela crueldade de um e brandura de outro. Cabe, ao final, fazer um resumo do que este trabalho pretendeu expor, e registrar que se tratam aqui apenas de notas iniciais para um estudo mais demorado. Ressurreição consiste num livro em que já se elabora o problema da indeterminação de sentido, que virá a ser base da melancolia posteriormente, nos textos mais complexos. Nesse ponto consiste um eixo de continuidade importante entre as obras posteriores e o primeiro romance. Trata-se de uma obra cujo narrador rompe com os padrões aceitáveis no cânone romântico brasileiro e antecipa de modo incipiente formas modernas. Memórias póstumas de Brás Cubas reúne ironia e melancolia em seu narrador, tendo acento irônico. E em Memorial de Aires o acento irônico dá lugar ao acento propriamente melancólico. Nos dois últimos livros citados, Machado trabalha de maneira muito mais complexa do que no primeiro o problema da indeterminação de sentido, em termos formais e temáticos, ao associar nos discursos de seus narradores a problematização da sustentação lógica do discurso, a suspensão dos referenciais claros de ordenação da realidade e a imponderabilidade da morte.

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MEYER, Augusto. Machado de Assis. op.cit. p.50. PEREIRA, Lucia Miguel. Machado de Assis (estudo crítico e biográfico). Op.cit. p.267.

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