Negação sentencial e o sistema CP (parte 1)

July 28, 2017 | Autor: R. Cavalcante de ... | Categoria: Syntax, Negation
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Negação sentencial, partículas assertivas e periferia esquerda da sentença1 Rerisson Cavalcante (USP, FAPESP, CAPES) Curso: Negação sentencial e o sistema CP. PPGLL-UFBA, 15 de dezembro de 2011 1. Introdução 1.1. Pressupostos teóricos Negação sentencial na Gramática Gerativa: I. Negação sentencial como um adjunto da categoria que nega. P. ex.: adjunto de VP. (1)

a. John did not kiss the girl.

b. [IP/S John [I’/Aux did [VP not [VP kiss the girl ] ] ] ]

II. Negação sentencial como uma projeção funcional (NegP) relacionada ao IP. (cf. Pollock 1989). (2)

a. John did not kiss the girl.

[TP John [T’ did [NegP not [AgrP [VP kiss the girl ] ] ] ] ]

Tipos de núcleos lexicais/funcionais na estrutura sentencial: I. Núcleos ligados ao licenciamento de argumentos: Vº, vº, voiceº. Sistema VP. II. Núcleos ligados à informação flexional: Tº, Agrº, Aspº etc. Sistema CP. III. Núcleos ligados às relações inter-sentenciais e discursivas: Finº, Forceº, Topº, Focoº. Sistema CP. Questão: se há elementos negativos relacionados ao sistema VP e ao sistema IP, haverá elementos ou marcadores negativos relacionados ao sistema CP? Proposta: há uma classe de marcadores negativos nas línguas que é gerada no sistema CP e tem propriedades sintáticas e semânticas específicas. Objetivo: descrever construções de negação sentencial e de constituinte no PB em que o marcador negativo ocorre à direita do elemento negado, na configuração em [XP Neg]. Por hipótese, Neg não c-comanda XP. 1.2. O fenômeno Negação sentencial no PB: duas partículas distintas, três estruturas. (3)

a. Num assisti esse filme (ainda).

[Neg VP]

(forma default)

b. Num assisti esse filme (ainda) não.

[Neg VP Neg]

c. Assisti esse filme (ainda) não.

[VP Neg]

Na literatura: não pós-VP (i) como um advérbio adjungido ao VP ou (ii) como núcleo codificador da polaridade sentencial, relacionado ao IP. Previsões incorretas: (a) sobre as propriedades distribucionais do marcador negativo 1

Este handout corresponde a uma versão resumida do contéudo do capítulo 1 da minha tese de doutorado, intitulada Derivação de construções negativas pós-XP no português brasileiro, desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em Semiótica e Lingüística Geral da USP, com financiamento da FAPESP (processo número 2008/00073-0).

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pós-VP e (b) sobre a relação entre a polaridade da sentença e a polaridade do marcador. Marcadores negativos quanto à posição: i) Pré-verbal = pré-Iº: num do português; no do espanhol; non do italiano; ne do francês. ii) Pós-Iº (mas pré-VP): pas do francês; not do inglês. iii) Pós-VP: o segundo não do PB. 2. Os marcadores negativos do PB: função e distribuição Partícula não/num: ocorre em todos os tipos de sentenças. (4)

a. Eu acho que Pedro num trabalhou ontem.

(subordinada)

b. Pedro achou melhor num trabalhar hoje.

(infinita)

c. Ele num tinha saído ainda.

(pré-auxiliar)

d. Você num saiu ainda?

(interrogativa polar)

e. Quem/Quantos alunos você num aprovou?

(interrogativa QU)

f. Você num aprovou quem/quantos alunos?

(interrogativa QU in situ)

g. Num faça isso!

(imperativa)

O não pós-verbal: Furtado da Cunha (1996, 2001); Roncarati (1996) leitura de quebra de expectativas ou quebra de pressuposições, como respostas (cf.) e ordens negativas (cf. E. Martins, 1997: 42). (5)

a. A: Você convidou João para a festa? B: (Num) convidei ele não.

[Neg VP Neg] ou [VP Neg]

b. A: Acho que vou convidar João para a festa. B: (Num) convide ele não!

[Neg VP Neg] ou [VP Neg]

Furtado da Cunha (1996, 2001); Roncarati (1996); Cavalcante (2007): não/num: negação neutra; não final: negação não-neutra, “pressuposicional”; negação de pressuposições. Problema: Definir “pressuposicional”: 1) Qual o conceito de “pressuposição” usado? Pressuposição semântica? 2) Parte da literatura em lógica considera que toda negação pressupõe a afirmativa corresponde (cf. Horn 1989:63). Schwenter (2005: 1443) mostra que o não pós-VP do PB não tem função de negar pressuposição (semântica): (6)

A: O João já deixou de fumar.

(Pressuposição: “João fumava”)

B: Ele não deixou de fumar (não), ele ainda fuma.

(Pressuposição intacta)

B’: Ele não deixou de fumar (# não), ele nunca fumou.

(Pressuposição negada)

Cavalcante (2007: 52): negação de “pressuposicoes ativadas no discurso anterior dos interlocutores”. Pressuposição como informação velha, dada, pressuposta. Schwenter (2005): conceito de ativacão no discurso. (7)

A: Os contemporâneos de Colombo não acreditavam que a Terra era chata.

2

(8)

a. B: (Não,) os contemporâneos de Colombo não acreditavam que a Terra era chata não. b. B’: (Não,) os contemporâneos de Colombo não acreditavam nisso não.

[Neg VP]: (7) não é negação de uma proposição/pressuposição anterior. Possível em contextos out of the blue. (9)

(Contexto possível: aula de história sobre a Idade Média) A modernidade inventou vários mitos pejorativos sobre a Idade Média, que até hoje são tidos como verdadeiros e até ensinados regularmente em escolas. Por exemplo: os contemporâneos de Colombo não acreditavam que a Terra era chata, mas até hoje muitas pessoas, inclusive intelectuais, citam esse mito como exemplo do suposto obscurantismo que teria dominado a Europa medieval cristã.

[Neg VP Neg]: (8) tem mesmo significado de (7), mas (8) requer que a proposição seja ativada previamente . (10) A: Todo mundo sabe que os contemporâneos de Colombo acreditavam que a Terra era chata. A’: Colombo desafiou a visão de seus contemporâneos de que a Terra era chata. B: Os contemporâneos de Colombo num acreditavam nisso (não)! (11) A: Poucas pessoas têm a mesma coragem para desafiar consensos que Colombo teve. B: (Olha, isso é um mito.) Os contemporâneos de Colombo num acreditavam que a Terra era chata (não)! Ele não desafiou consenso nenhum... Note-se: [VP Neg] continua possível nos contextos em que [Neg VP Neg] pode ocorrer. Vide o não entre parênteses em (8)-(10). Mas [Neg VP Neg] não ocorre em contextos out of the blue. (12) A modernidade inventou vários mitos pejorativos sobre a Idade Média, que até hoje são tidos como verdadeiros e até mesmo ensinados em escolas. Por exemplo: os medievais e os contemporâneos de Colombo não acreditavam que a Terra era chata (*não), mas... O não final é anafórico. Vide: uso de pronomes (realizados e nulos) favore o não final (Cavalcante 2007:56-59) (13)

Eles não acreditavam nisso não.

(14) a. Quero não.

b. Vou não.

c. Sei não.

d. Tenho não.

2.1. Negação anafórica em sentenças imperativas Pergunta: mas qual a contribuição do não final a uma sentença imperativa? Imperativo negativo (“Num abra a porta!”) não é ordem/conselho para praticar uma ação, mas para se abster de praticá-la. Possibilidade para uma função pressuposicional ou anafórica. (15) A: Acho que vou convidar João para a festa. B: (Num) convide (ele) não! (16) A: Tô pensando em assistir o novo filme de Xuxa. B: (Num) assista não! Eu já vi, é muito ruim. (17) Contexto: o interlocutor pega o celular e começa a discar. — (Num) ligue (pra ele) agora não!

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(18) Contexto: uma criança ameaçando outra. — Ei, (num) bata nele não! Proibição de uma ação cuja intenção de realização foi expressa anteriormente no discurso ou inferida a partir do contexto. Inadequado em ordens, intruções e proibições que podemos chamar de neutras. (19) a. Não fale com o motorista!

b. Não fume!

c. Não ponha os pés no capô!

2.2. Negação anafórica em perguntas polares Pergunta: como o não final pode marcar negação de proposições prévias... em sentenças interrogativas? Nas perguntas polares: polaridade não é neutra, mas depende dos objetivos do falante (cf. Rooy & Šafářová 2003). Semântica de uma interrogativa Q (polar ou QU): é o conjunto de respostas adequadas para Q. Conjunto de respostas adequadas a uma interrogativa polar: {p, ¬p}). Ladd (1981), Rooy & Šafářová (2003): perguntas polares apresentem um viés com relação à resposta esperada. PB em perguntas polares: o não final não nega uma proposição prévia, mas marca a expectativa de uma resposta negativa por parte do interlocutor. Confirmação da negativa da proposição objeto da pergunta. (20) Contexto: A chega em casa e vê B sentado no sofá. a. — (Num) foi pra aula hoje não?

b. — (Num) teve aula hoje não?

Contexto: A avisa a B que o carro ainda está na oficina. c. — O mecânico num consertou ainda não?

d. — Consertou ainda não?

[Neg VP]: parecem não ser restritas ao tipo de expectativa com relação à resposta, podendo ocorrer em contextos de expectativa neutra e de expectativa de resposta positiva ou negativa. (21) a. A: João ainda num chegou? b. B: Ele sempre se atrasa. Num lembra da última vez? A gente esperou ele por 1 h. c. A: Foi? [com expressão de dúvida] d. B: Foi. (Num) lembra não? Em resumo: tanto em declarativas quanto em imperativas e perguntas polares, uma proposição prévia licencia o uso do marcador negativo pós-VP nas sentenças. 2.3. Contextos agramaticais para [Neg VP Neg] e [VP Neg] Seções anteriores: relações entre a negação final e relações discursivas ou anafóricas entre sentenças. Esta seção: relações entre a negação final e a periferia esquerda da sentença (i.e. o sistema CP), local prototípico de codificação de relações (inter-)discursivas e inter-sentenciais. Cavalcante (2007, 2008): o não final é sensível a construções que envolvem a periferia esquerda. (22) [Neg V Neg] em interrogativas QU a. O que (que) ele num fez (*não)?

b. Por que (que) ele num saiu de casa (*não)?

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c. Que horas (que) você num está ocupado (*não)? d. Ele num fez o quê (*não)?

e. Ele num saiu de casa por quê (*não)?

(23) [VP Neg] em interrogativas QU a. O que (foi que) ele fez (*não)?

b. Por que ele saiu de casa (*não)?

c. Que horas você está ocupado (*não)

d. Fez o quê (*não)?

e. Saiu de casa por quê (*não)? (24) [VP Neg] em encaixadas a. * Ele disse que conseguiu não.

(completiva)

b. * Eles lembram que você viajou não.

(completiva)

c. ?? Ele já foi buscar o livro que Maria trouxe não.

(relativa)

d. ?? Um suplente é um senador que recebeu nenhum voto não. (relativa) e. * É bom para a saúde comer gordura não.

(subjetiva)

f. * Comer gordura não, é bom para a saúde.

(subjetiva)

g. * Se a banda tocar não, o show vai ser cancelado.

(adverbial)

h. * Quando ela voltou pra casa não, fiquei preocupado.

(adverbial)

(25) [Neg V Neg] a. Ele disse que num conseguiu não.

(completiva)

b. Eles lembram que você num viajou não.

(completiva)

c. ? Ele já foi buscar o livro que Maria num trouxe não.

(relativa)

d. ? Um suplente é um senador que num recebeu nenhum voto não.

(relativa)

e. * É bom para a saúde num comer gordura não.

(subjetiva)

f. * Num comer gordura não, é bom para a saúde.

(subjetiva)

g. * Se a banda num tocar não, o show vai ser cancelado.

(adverbial)

h. * Quando ela num voltou pra casa não, fiquei preocupado.

(adverbial)

(26) Generalização sobre a negação final no PB O marcador negativo final é incompatível (ou tem sérias restrições de co-ocorrência) com elementos associados ao sistema CP, como complementizadores e elementos QU. 3. Análises prévias da negação pós-VP no PB 3.1. O não pós-VP como adjunto ao VP Afonso (2003): o não final adjungido à direita do VP, tanto em [Neg VP Neg] quanto em [VP Neg]: (27)

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E. Martins (1997): adotando a hipótese do VP shell... (28)

Análise semelhante em Dieck (2000) sobre o palenquero, que também tem [Neg VP], [Neg VP Neg] e [VP Neg]. Dieck (2000): nu pré-verbal em Negº, entre TP e VP; nu final em adjunção à direita do VP. (29) [CP C [IP I [NegP nu [VP [VP sujeito [V' V objeto] ] [AdvP nu ] ] ] ] ]2 [VP Neg] também sofre restrições em contextos que envolvem a ativação do CP, como ocorre no PB: (i) em sentenças encaixadas introduzidas pelos complementizadores pa, si, kumo e pelo complementizador relativo lo ke. De modo mais específico, pa e lo ke exigem [Neg VP]; si e kumo exigem [Neg VP Neg]. (30) Adverbiais (finais) exisgem [Neg VP] a. P’í

nu tem má monasito. (Dieck, 2000: 46)

COMP 1sg NEG ter mais criança

(‘Para eu não ter mais filhos’)

b. Pa suto nu tra água akí má. (Dieck, 2000: 46) COMP 1pl NEG trazer água aqui mais

(‘Para nós não trazermos mais água para cá’)

(31) Adverbiais (condicionais) exigem [Neg VP Neg] a. Á ten ke tá rregando, i si nu

tené água pa rregá nu, á sé morí. (Dieck, 2000: 43)

M tem que estar regando, e COMPL NEG tem água para regar NEG, M HAB morrer ‘Tem que estar regando, e se não tiver água para regar, morre’ b. Kumo água nu tá yobé nu, sino e puro só, á sé mori ese aló. (Dieck, 2000: 43) COMP água NEG está chover NEG, mas é puro sol, FUT REFL morrer esse arroz ‘Como não está chovendo, mas fazendo sol, o arroz vai morrer’ (32) Relativas exigem [Neg VP] Jende lo ke nu siribí. (Dieck, 2000: 56) gente REL NEG servir 2

(‘Gente que não presta’)

Por razões expositivas, sujeito, verbo e objeto estão representados em suas posições originais, antes dos movimentos.

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(ii) em perguntas retóricas, que exigem especificamente a ocorrência de [Neg VP]. (33) Suto nu ta trabaja? 1pl NEG estar trabalhar

(‘Nós não estamos trabalhando?’)

(iii) em sentenças imperativas, que exigem [Neg VP Neg]. (34) Aora nu ba arí nu! Agora NEG ir rir NEG

(‘Agora não ria não’)

Também no palenquero, [(Neg) VP Neg] têm aceitabilidade definida por: (i) tipo de sentença encaixada ou de conjunção subordinativa; (ii) tipo de força ilocucionária (como em sentenças interrogativas e imperativas). 3.2. O não pós-VP como categoria de polaridade sentencial E. Martins (1997): em [VP Neg], o não final é gerado diretamente em ΣP, acima de AgrP. (35) [Σ' não [AgrP sujeito [Agr' verbo [TP tsuj [T' tverbo [VP (...) ] ] ] ] ] ] Topicalização da sentença: (36) a. [TopP [AgrP sujeito verbo (...) ] [Top' [CP [ΣP não [AgrP sujeito verbo (...) ] ] ] ] ] b. Vai não. c. [TopP [AgrP vai ] [Top' [CP [ΣP não [AgrP vai ] ] ] ] ] Fonseca (2004): em [Neg VP Neg], o não pré-verbal está em Negº e se move para Tº; não final em Polº. Em [VP Neg], há apagamento fonético do não pré-verbal. (37) a. Eu num vi não. b. [Polº não ] [TP eu num vi (...)] ] c. [PolP [TP eu num vi (...)] [Polº não ] [TP eu num vi (...)] ] Diferenças entre E. Martins (1997) e Fonseca (2004): (i) como a polaridade é codificada; (ii) posição para a qual a sentença (IP = AgrP ou TP) se move e (iii) status da construção [Neg VP Neg] em oposição a [VP Neg]. Análise semelhante em Hagemeijer (2007) sobre o são-tomense: duas caegorais negativas: NegP-1 (acima de TP) e NegP-2 (entre TP e Asp(ectual)P); movimento de AspP para o Spec,NegP-2. Não correspondem a PolP/ΣP . (38) [NegP-1 na [TP [NegP-2 [AspP VP ]i [NegP-2 fa [AspP VP ]i ] ] ] [Neg VP Neg] é default no são-tomense, mas é bloqueada em vários contextos sintáticos relacionados a propriedades do CP, que permitem apenas [Neg VP]. (i) Encaixadas adverbiais finais introduzidas pelo complementador pa e sentenças de advertência encabeçadas

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pelos termos milhon e kwidadu (que selecionam pa) requerem [Neg VP] (cf. Hagemeijer, 2007: 186). (39) Encaixada com complementador pa N fuji fala pa fala na lêlê mu. 1ag fugir rumor C rumor NEG seguir 1sg

(‘Eu fugi dos rumores para eles não me seguirem’)

(40) Sentencas de advertência a. Milhon pa bô na b’êlê. melhor C 2sg NEG ver 3sg. (‘Melhor que você não veja ele’) b. Kwidadu pa manjinga se ku n sa ku ê na subli mu. cuidado C agressor

SP REL 1sg ser com 3sg NEG ir 1sg

‘Be careful that the aggressive person in me doesn’t take over.’ ii) Interrogativas polares, quando exibem o marcador interrogativo an3 exigem [Neg VP] (Hagemeijer 2007: 186). (41) Interrogativas com marcador AN Kloson na ka dwê sun an (*fa)? Coração NEG ASP doer 2sg INT / NEG

(‘Seu coração não dói?’)

(iii) Sentenças negativas enfáticas também requerem [Neg VP] (cf. Hagemeijer, 2007: 188). (42) a. Jina n sen, n naxi b’êlê! Desde-que1sg existir, 1sg NEG ver 3sg

(‘Desde que eu existo, eu nunca vi ele!’)

b. Inen na sêbê mo inen nganha ke!? 3pl NEG saber como 3pl chegar casa (‘Eles não sabem como chegar em casa!?’) 4. Entre o IP e o CP 4.1. A negação final e as partículas assertivas Oliveira (1996): O não final corresponde ao não inicial. (43) A: Você fez o trabalho? B: Não, (eu num fiz). B: (Num) fiz não. Problema: a partícula inicial/final não é relacioanda à projeção responsável pela polaridade sentencial. (44) A: Você (ainda) num fez o trabalho? a. B: É /? sim, eu num fiz.

/

Você num fez o trabalho!

b. B’: Não, eu fiz!

Também em outras línguas: em inglês, no ≠ not. (45) A: Is it true that Michael won’t sing anymore? 3

Na ausência do marcador interrogativo AN, o marcador negativo final é permitido. (i) Bô na bê nadaxi di bisu ni kabêsa mu fa? 2sg neg ver nada de animal em cabeça POSS NEG (= ‘Você vê algum animal na minha cabeça?’)

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B: Yes, he won’t sing anymore.

(Laka 1990: 155)

(47) A: You haven’t done the work yet, right? a. B: Yes, I didn’t.

b. B’: No, I did!

Concordância de polaridade é obrigatória apenas com a partícula em posição final. (48) a. # — Num fiz sim.

b. — Sim, eu num fiz.

c. — É, eu num fiz.

Problema para análises prévias (I): A independência entre a polaridade da partícula assertiva inicial e a polaridade da sentença é inesperada se essas partículas estão em ΣP ou PolP. (Com ou sem movimento (do IP) obrigatório).. Partículas sim, não e é: função de confirmar ou negar uma proposição anterior; apenas quando há o fronteamento que a sentença concorda obrigatoriamente com a polaridade dessas partículas assertivas. Problema para análises prévias (II): previsão incorreta: o não final estar disponível em todos os tipos de sentença. Sensibilidades de marcadores negativos (não-anafóricos) a tempo, modo e aspecto, i.e. ao sistema IP (cf. Zanuttini, 1995: 141-142). No PB, a restrição é com propriedades do CP. Proposta: propriedades do não final decorrem de ele ser gerado no sistema CP (a definir). (49) a. Não, Pedro num viajou. b. [X não [Z Pedro num viajou ] ] (50) a. Pedro num viajou não. b. [Y [ Pedro num viajou ] [X não [Z Pedro num viajou ]] 4.2. Partículas assertivas e a estrutura do CP Farkas (2010): dois tipos de polaridade, inner polarity e outer polarity. PolP e ΣP. (51) [ Pol [ ... ΣP ] ] Traços de PolP podem permanecer semanticamente inativos e apenas concordar com operadores em ΣP. (52) a. [ Pol [+] [ ... ΣP[aff] ... ]]

b. [ Pol [–] [ ... ΣP[neg] ... ]]

PolP pode ser ativo e codificar valores independentes dos presentes em ΣP: [same] e [reverse] (que equivalem à confirmação ou refutação). Laka (1990): o yes e no do inglês e o bai e ez do basco, como sendo gerados em Cº e não em ΣP. (51) a. Bai, badakit.

(basco)

b. Yes, I (do) know it.

(inglês)

(= ‘Sim, eu sei’)

(52) a. Ez, ez dakit.

(basco)

b. No, I don’t know it.

(inglês)

(= ‘Não, eu não sei’)

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CP como uma categoria unitária versus estrutura fina do CP. Onde ficam as partículas assertivas? Categoria específica para marcar confirmação ou negação de proposição anterior: AstP (acima de CP). (53) [Ast’ não [CP/FinP C/Fin [TP ... ] ] Argumento para AstP acima de CP/FinP: dados de Poletto (2009: 181-182) sobre dialetos italianos: (54) a. NO che non ci vado

(Italian regional)

NEG que NEG PRT ir b. NO che non ghe vado

(Italiano, dialeto de Veneto)

NEG que NEG PRT ir ‘Não, eu não vou lá (mesmo)!’ c. Si che ci vado

(Italiano regional)

Sim que PRT ir ‘Sim, eu vou (mesmo)!’ Holmberg (2001): operador de “polarity focus” toma dois argumentos: uma pressuposicão (proposição com a polaridade em aberto) e uma assercão (proposição com um valor polar definido). Assumindo isso para o PB: o não final é núcleo como dois argumentos. (55) a. A: Você (num) fez o trabalho? b. B: Não, eu num fiz!

c. [AstP ∅ [Ast’ não [CP [TP eu num fiz ] ]

(56)

Proposta: derivação de [Neg VP Neg] e [VP Neg]: (57) a. Eu num quero ir não. b. [AstP [XP eu num fiz ] [Ast’ não [CP [TP quero ir ] ] (58) a. Quero ir não. b. [AstP [XP quero ir ] [Ast’ não [CP [TP quero ir ] ] AstP semelhante a TopP e FocP de Rizzi (1997). (59) a.

b.

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(Rizzi, 1997: 286-287) Propostas recentes (posteriores a Cavalcante (2007)) que relacionam o não final com o sistema CP: Teixeira de Sousa (2008); Hansen (2009) e Biberauer & Cyrino (2009). 5. Derivando as restrições de gramaticalidade Dois fatores importantes: (i) tipo ilocucionário da sentença e (ii) tipo de encaixamento. 5.1. Negação final e força ilocucionária Marcador negativo final em três contextos principais: (i) em sentenças declarativas; (ii) em sentenças imperativas; (iii) e em interrogativas polares. Bloqueado em interrogativas QU. (60) a. (Num) assisti esse filme não.

(declarativa)

b. Num assista esse filme não!

(imperativa)

c. (Num) assistiu esse filme não?

(interrogativa polar)

d. * O que você (num) assistiu não?

(interrogativa QU)

Hipótese inicial (incorreta): Cavalcante (2007; 2008d): agramaticalidade de [(Neg) VP Neg] com perguntas QU decorre do traço focal no pronome interrogativo. (61) a. O que ele num fez (*não)?

b. Ele num fez o quê (*não)?

Problema dessa hipótese: previsão de inaceitabilidade com outros elementos lexicais possuidores de traços de foco. (62) Eu num fui só pra cinema não. (Eu também fui à biblioteca) (63) a. *Alguém, João me disse que está doente. b. * Ninguém, João me disse que está doente. c. * Ninguém, eu vi. (64) a. Ninguém saiu não. b. Num vi ninguém não. (65) A: Acho que João num vai entregar a tese a tempo. B: Ele que num entregue não, pra ele ver! (66) A: Nem João nem Paulo vieram pra cerimônia. B. Não! Foi João que num veio não. Teixeira de Sousa (2008a, 2008b): não final em Focº. Agramaticalidade com perguntas QU vem da co-ocorrência

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de dois focos (um na negação e outro no QU). Problema: um marcador de foco atribui foco a outro elemento. (67) [FocP [TP sentença ] [Foc' não [ (...) tTP ] ] ] Proposta de Hansen (2009): o não final em Topº. Conjunto de traços [+neg], [+top]. Incompatibilidade com o traço de foco no QU. A proposta tem os mesmos problemas com os fatos em (62)-(66). (68) a. Gosto dele não. b. [CP [TopP [TP gosto dele] [Top’ não [TP gosto dele ]] Farkas (2010): yes/no do inglês e da/nu do romeno ocorrem em réplicas a (I) sentenças declarativas; (ii) a sentenças imperativas; (iii) e a sentenças interrogativas polares. (69) — Alice has just arrived. a. — Yes, I know.

b. — No, she didn’t / hasn’t.

(70) Has Alice just arrived? a. — Yes, I know.

b. — No, she didn’t / hasn’t.

(71) — Go clean your room, Johnny! a. — Yes, go clean your room! b. — No, don’t clean your room! (72) Who brought these cookies? a. # Yes, Sylvia.

b. # No, Sylvia.

Mesma distribuição em PB com sim, é e não iniciais: (73) — Alice acabou de chegar. a. — Sim, eu sei.

b. — É / Não, num chegou.

(74) Alice já chegou? a. — Sim, já chegou.

b. — Não, num chegou.

(75) — Vá limpar seu quarto! a. — Sim / É, vá limpar seu quarto!

b. — Não, num vá limpar (agora)!

(76) Quem comprou esse bolo? a. # Sim / É, Sílvia.

b. # Não, Sílvia.

Farkas (2010): yes/no como responses a proposições presentes na Table da conversação. Declarativas, imperativas e perguntas polares fornecem uma proposição, mas as interrogativas QU não. Perguntas polares: {p, ¬ p}. 5.2. Negação pós-VP: assimetria nas sentenças encaixadas Assimetria em encaixadas: Cavalcante (2007): [VP Neg]: inaceitável em encaixadas; [Neg VP Neg]: aceitável só em completivas. (76) a. *Se a banda tocar não, o show vai ser cancelado. b. *Tenho vários alunos que gostam de sintaxe não. c. *Ele disse que conseguiu não. (77) a. *Se a banda num tocar não, o show vai ser cancelado.

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b. ?Tenho vários alunos que num gostam de sintaxe não. (78) a. Ele disse que num viajou não. b. Eu sei que ele num conseguiu não. Proposta: Cavalcante (2007): AstP seria restrita a contextos matrizes. Exame mais detalhado:[VP Neg]: inaceitável em encaixadas; [Neg VP Neg]: aceitável só em completivas, marginal em relativas. (79) a. *Eu encontrei a carta [ que você tava achando não ]. b. ?Eu encontrei a carta [ que você num tava achando não ]. (80) a. *Ele já foi buscar o livro [ que Maria trouxe não ]. b. ?Ele já foi buscar o livro [ que Maria num trouxe não ]. Hansen (2009): [Neg VP Neg] é aceitável em relativas de objeto no final da sentença, mas inaceitável em relativas de objeto em posição medial e em relativas de sujeito. (81) a. João ajudou o menino que não usa óculos não.

(relativa de objeto/final)

b. * João deu pro menino [ que não usa óculos não ] o livro. (relativa de objeto/medial) c. * O menino [que não usa óculos não] ajudou o João. (relativa de sujeito) Questão: aceitabilidade de [Neg VP Neg] em relativas depende (i) da função sintática do DP (ii) ou da posição da relativa na sentença? Esmeralda Negrão (comunicação pessoal): aceitabilidade em relativas não-restritivas. Se relativas explicativas são coordenadas, não há problemas com (82). (82) Os japoneses, que num são bestas não, investem muito mais em educação. Para explicar o comportamento em encaixadas, é preciso compreender a diferença entre [Neg VP Neg] e [VP Neg]. 5.3. [Neg VP Neg] versus [VP Neg] Questões: (83) (a) O não pós-VP que ocorre nessas duas estruturas tem as mesmas propriedades? (b) Qual é o status da presença/ausência do marcador negativa pré-verbal? (84) O marcador pós-VP em Martins (1997) a. Em [Neg VP Neg]: adjunto de VP.

b. Em [VP Neg]: núcleo de ΣP.

Em Fonseca (2004) c. Sempre é núcleo de PolP. Em Teixeira de Sousa (2008a, 2008b)

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d. Sempre é núcleo de FocP. Em Hansen (2009) e. Sempre é núcleo de TopP. Proposta: não final é o mesmo elemento em [Neg VP Neg] e [VP Neg]; diferenças sintáticas decorrem da presença/ausência de NegP. Em [VP Neg], antes da entrada de Astº na derivação, o sistema computacional realiza uma derivação em tudo semelhante à de uma sentença afirmativa (cf. Cavalcante 2007). Minha proposta de ausência de NegP em [VP Neg] prevê que (85a) seja interpretada como afirmativa na ausência do movimento: (85) a. Não, (eu) fiz!

b. [Ast não [CP/TP (eu) fiz ] ]

A proposta de apagamento do não/num pré-verbal prevê que que (85a) seja interpretada como negativa. (86) a. Não, eu num fiz!

b. [Ast não [CP/TP eu num fiz ]]

Biberauer & Cyrino (2009): três tipos de não no PB. (87) (i) o não1 é o não pré-verbal gerado em NegP. (ii) o não2 é um elemento de concordância negativa que ocorre em [Neg VP Neg], gerado como núcleo de polaridade Polº, acima de TP (semelhante às propostas de Martins (1997) e Fonseca (2004)). (iii) e o não3, por outro lado, equivale à pro-forma usada em respostas diretas (i.e. ao não inicial), que é menos integrada à estrutura. Argumentos: (A) O não2 de [Neg VP Neg] ocorre em matrizes e subordinadas; o não3 de [VP Neg] é excluído em encaixadas. (88) a. Ele disse que ele num/não comprou a casa não. b. * Ele disse que ele comprou a casa não. (B) O não2 ocorre em interrogativas polares; não3 é excluído nesse contexto. (89) a. Você num/não comprou a casa não? b. % Você comprou a casa não?

[Neg VP Neg] [VP Neg]

(C) o não2 pode ocorrer em perguntas polidas; o não3 não pode. (90) a. Você não/num quer tomar um cafezinho (não)? b. * Você quer tomar um cafezinho não?

[Neg VP Neg] [VP Neg]

(D) o não2 é compatível com o uso de expressões idiomáticas que funcionam como NPIs; o não3 é incompatível. (91) A: O João é rico! a. B: O que? Ele num/não tem um tostão furado!

[Neg VP]

b: B’: O que? Ele num/não tem um tostão furado não!

[Neg VP Neg]

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c. B’’: * O que? Ele tem um tostão furado não!

[VP Neg]

‘Ele não tem nenhum dinheiro’ (92) Ele tem um tostão furado não; ele tem um inteiro!

[VP Neg]

Biberauer & Cyrino (2009): fatos em (A)-(D) são problema para Cavalcante (2007). Proposta delas: o não3 é uma partícula assertiva, não inteiramente integrada à estrutura da sentença; o não2 é elemento de concordância negativa. (93) ForceP > TopicP > FocP > FinP > PolP > TP Em [Neg VP], o núcleo Polº não possui traços enfático e se realiza como ø: (94) Ele disse que [PolP ø [TP num/não1 comprou ] ] Em [Neg VP Neg], Polº tem traço enfático, que dispara o movimento do TP e realização fonética. (95) Ele disse que [PolP [TP num/não1 comprou ] não2 ] (96) a. Em [Neg VP]: presença de NegP e de um PolP com núcleo nulo, sem traço enfático. b. Em [Neg VP Neg]: presença de NegP e de um PolP com traço enfático. c. Em [VP Neg]: ausência de NegP e PolP. Presença da negação anafórica. Respostas a Biberauer & Cyrino (2009): Sobre (A): não há oposição absoluta entre [Neg VP Neg] e [VP Neg] em encaixadas. Sobre (B) e (C): inaceitabilidade decorre do sujeito preenchido. (97) a. Comprou a casa (ainda) não?

[VP Neg]

b. Quer tomar um cafezinho não?

[VP Neg]

(98) a. E o rapaz tamém é noivo não?

(português baiano rural)

b. Tu já foi não? c. Tu faz jarro dento de casa não? d. Tu viu na televisão não? (Cavalcante 2007: 31,34) Sobre (D): assimetria entre [Neg VP Neg] e [VP Neg] compatível com licenciamento de NPIs por NegP. 5.4. De volta à derivação da inaceitabilidade em encaixadas Proposta: o não final é sempre gerado no CP matriz mesmo nos casos de [Neg VP Neg] em encaixadas. (99) [Neg VP Neg] em sentença matriz a. Pedro num viajou não. b. [Ast não [CP/TP Pedro num viajou ] ] c. [Ast [CP/TP Pedro num viajou] [Ast não [CP/TP Pedro num viajou ] ] ]

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(100) [Neg VP Neg] em sentença encaixada (completiva) a. João disse que Pedro num viajou não. b. [Ast não [CP-1 João disse [CP-2 que Pedro num viajou] ] ] c. [Ast [CP-1 João disse [CP-2 que Pedro num viajou] ] [Ast não [CP-1 João disse [CP-2 que ...] ] ]

Argumento: impossibilidade de duas instâncias do não pós-VP (uma na matriz e outra na encaixada) (101) a. João num disse [ que Pedro viajou] não. b. João disse [ que Pedro num viajou não ]. c. * João num disse [ que Pedro num viajou não ] não. Como é derivada a intepretação semântica da negação na encaixada? Um processo de concordância negativa entre o não final e o não/num pré-verbal. Neg Raising: (102) a. John doesn’t think Bill likes Harriet.

b. John thinks Bill doesn’t like Harriet.

(103) a. He doesn’t expect you to leave.

b. He expects you not to leave.

[Neg VP Neg] só é aceitável em completivas selecionadas por alguns tipos de verbos. (104) Lamento que ele não tenha vencido a corrida não. Interpretação pretendida: ‘Eu lamento que ele não tenha vencido a corrida’ (RUIM) Interpretação pretendida: ‘Eu não lamento que ele não tenha vencido a corrida’ (BOA) [VP Neg] aparentemente na encaixada é interpretado como na matriz. (105) a. ? (Ele) disse que Pedro saiu não. b. ≈ ‘Ele não disse que Pedro saiu’

c. ≠ ‘Ele disse que Pedro não saiu’

Mas e quanto às sentenças relativas? (106) [Neg VP Neg] em relativas a. João ajudou o menino que num usa óculos não b. [Ast não [CP-1 João ajudou [DP o menino [CP-2 que num usa óculos ] ] ] c. [Ast [CP-1 João ajudou [DP o menino [CP-2 que num usa óculos ] ] ] [Ast não [CP-1 (...) ] ] ] (107) [Neg VP Neg] em relativa João ajudou o menino que num usa óculos não. Negação da encaixada: ‘João ajudou o menino que não usa óculos’.

(OK)

Negação da matriz: ‘João não ajudou o menino que usa óculos’. (RUIM)

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(108) [VP Neg] em relativa João ajudou o menino que usa óculos não. Negação da encaixada: ‘João ajudou o menino que não usa óculos’.

(RUIM)

Negação da matriz: ‘João não ajudou o menino que usa óculos’. (OK)

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