NEOLIBERALISMO E A REFORMA TRABALHISTA NO BRASIL

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Universidade São Judas Tadeu

Filipe do Nascimento

NEOLIBERALISMO E A REFORMA TRABALHISTA NO BRASIL

São Paulo 2014

Filipe do Nascimento

NEOLIBERALISMO E A REFORMA TRABALHISTA NO BRASIL

Monografia apresentada à banca examinadora da Faculdade de Direito da Universidade São Judas Tadeu, como exigência parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito, sob orientação do Professor Silvio Luiz de Almeida.

São Paulo 2014

AUTOR: Filipe do Nascimento TÍTULO DA MONOGRAFIA: Neoliberalismo e a Reforma Trabalhista no Brasil Monografia apresentada à banca examinadora da Faculdade de Direito da Universidade São Judas Tadeu, como exigência parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito, sob orientação do Professor Silvio Luiz de Almeida. BANCA EXAMINADORA: Professor: Silvio Luiz de Almeida Professor: AVALIAÇÃO:

Data da apresentação: NOTA DO 1º EXAMINADOR: ________________ MÉDIA: ________________ NOTA DO 2º EXAMINADOR: ________________

AGRADECIMENTOS Primeiramente agradeço a Deus por ter me dado saúde e força para superar as dificuldades. Ao longo da minha vida, diversas pessoas se mostraram fundamentais para edificação do meu caráter; meu pai, pelo esforço e dedicação ao trabalho do qual nunca teve férias para prover o sustento da família. Minha mãe, por ser a melhor mãe que poderia ter, sendo sinônimo de carinho e prestação, te amo. Agradeço ao meu irmão André, por ser a minha base, meu exemplo, a pessoa que sempre me aconselhou, sem ele, eu não seria nem metade do que sou e muito menos do que poderei ser, a ti, meu irmão serei grato por toda minha vida, não consigo me imaginar longe de você, nunca descartei nada que você já me disse; meu anjo da guarda na terra; lembro em um de seus aniversários que eu disse: “Se você viver mil anos, eu quero viver mil anos e um milésimo de segundo”, eu era apenas uma criança, mas já sabia que nunca irei conseguir viver ao menos um segundo sem a sua presença, te amo. Agradeço a Ana por ser minha segunda mãe, e um exemplo a ser seguido por qualquer mulher, sua obstinação e força de vontade são ímpares, certamente, foi Deus quem colocou você na vida do meu irmão e consequentemente na minha. Agradeço a todos os meus amigos, que nunca duvidaram do meu potencial e souberam compreender todas as vezes que cancelei um encontro por estar ocupado estudando, a vocês, Wellington, Pércio, Rodrigo, Guto, Tom e Tamara, muito obrigado por serem mais do que amigos para mim. Neste caminho acadêmico, por mais árduo que seja, existem pessoas que aparecem em nossas vidas para tornar tudo mais fácil, dentre essas pessoas, esta Letícia Zanetti, pois, grande parte da minha graduação deve-se a ela, Letícia, muito obrigado por tudo, por ser uma grande amiga, pelas horas de estudo na sua companhia e pelas diversas histórias que temos das quais tenho muito orgulho.

Agradeço aos meus amigos Elcio e Juliana Saueia - o que seria a volta da universidade sem vocês? As conspirações e teorias criadas por nós, eu guardo todas em minha mente com o maior carinho. Agradeço a pessoa que me fez acreditar no amor, minha namorada Juliana, aproveito para pedir desculpas pelos momentos em que não pude te dar a devida atenção, mas saiba que foi pensando num bem-maior em que você se incluiu. Obrigado pela paciência e te amo. Por fim, agradeço ao meu orientador Silvio Luiz de Almeida, por acender o amor pela filosofia, pelo saber, não sou uma pessoa daquelas que têm muitas influências, mas tenha certeza que o senhor é uma das mais fortes influências na minha vida, portanto, ser orientado por você foi uma honra imensurável.

OBRIGADO A TODOS

A

todos

que

conhecimento,

tenham e

sede

oportunamente

de a

primeira imagem de advogado que tive na vida Sidnei Soares de Carvalho que Deus o tenha.

RESUMO

O presente trabalho faz uma análise dos fatos históricos mundiais que ensejaram a proposta de flexibilização do Direito do Trabalho contemporânea, propuseram uma verdadeira reforma trabalhista, tanto no âmbito internacional quanto nacional, fazendo um paralelo entre Trabalho e Direito, expondo a ligação destes dois institutos com o Estado que tem como um de seus fins a reprodução capitalista. Expondo a evolução dos meios de regulação, primeiramente, pelo fordismo que marcou o período moderno e contribuiu para a implementação das leis trabalhistas garantindo aos trabalhadores direitos e garantias fundamentais, bem como, a evolução do sindicalismo de caráter combativo, que no Brasil teve seu auge com a criação da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) na “Era Vargas” e inserção do Direito do Trabalho no corpo da Constituição Federal de 1988 no ramo que trata de “Direitos Sociais”. E, posteriormente, o toyotismo que surgiu após diversas crises sofridas no período fordista, propondo contratos laborais mais flexíveis, maior especialização dos trabalhadores, a produção sob demanda (“just in time”), e a adoção de métodos por parte das empresas que vinculavam subjetivamente o trabalhador ao ambiente das fábricas, intensificando cada vez mais a alienação do trabalhador, juntamente, com o aparato das ideologias neoliberais que de forma conjunta com o Estado concede a “permissão” para que o modelo toyotista prospere sob o argumento de fim do desemprego e adaptação à globalização como quesito necessário para a sobrevivência

das

empresas

no

campo

concorrencial.

Destacam-se

as

consequências do neoliberalismo no meio social, principalmente, nos movimentos sindicais em que é evidenciada uma mudança do caráter em que operam, mudando sua forma combativa, outrora, existente para uma forma participava, e, que esta mudança foi ponto-chave para a implantação do neoliberalismo e do toyotismo como modelo econômico/produção. Quanto ao plano nacional é exposto demonstrando os fatos políticos e econômicos de como o governo de Fernando Henrique Cardoso (FHC) tornou o neoliberalismo hegemonia no país e as medidas caracterizadoras desse feito. E por fim, destaca-se as polêmicas

envolvidas quanto ao tema reforma trabalhista, principalmente à respeito da flexibilização das normas trabalhistas e as possíveis consequências, como a precarização do trabalho, cerceamento dos direitos e garantias fundamentais do trabalhador em função do capital, dignidade da pessoa humana, os efeitos sociais da proposta de flexibilização, por exemplo.

SUMÁRIO 1

INTRODUÇÃO ............................................................................................... 10

2

TRABALHO E CAPITALISMO ........................................................................ 12

3

CRISE DO CAPITALISMO E REFORMULAÇÃO PRODUTIVA ..................... 18 3.1

Fordismo e Acumulação Flexível ............................................................ 19

3.2

Toyotismo ............................................................................................... 22

4

ALIENAÇÃO E CAPTURA DA SUBJETIVIDADE DO TRABALHADOR ......... 26

5

NEOLIBERALISMO

E

SUAS

CONSEQUÊNCIAS

NOS

MOVIMENTOS

SOCIAIS......................................................................................................... 28 6

FLEXIBILIZAÇÃO DAS LEIS TRABALHISTAS .............................................. 34

7

CONCLUSÃO ................................................................................................ 38

BIBLIOGRAFIA ........................................................................................................ 40

10

1

INTRODUÇÃO Tomando como base os fundamentos do Direito Laboral, especificamente,

a proteção à classe trabalhadora, notadamente, hipossuficiente na relação empregatícia, o presente trabalho tem como escopo demonstrar de forma analítica a trajetória dos motivos sócio-econômicos que resultaram na proposta de flexibilização do Direito do Trabalho Brasileiro, contextualizando com o embate criado entre direito sociais e direito econômico, questionando sobre os benefícios e malefícios da flexibilização das normas trabalhistas, alentando a eterna luta do trabalho e o capitalismo. A contrariedade existente no fenômeno da flexibilização se encontra na rigidez das leis trabalhistas quanto à proteção do trabalhador e a evolução da economia quanto à competitividade empresarial. Desta forma, a temática da flexibilização e assuntos correlatos são de suma importância para o futuro do Direito do Trabalho, tanto no aspecto internacional quanto no nacional, uma vez que não é mais estranho ao nosso ordenamento essas normas que de certa forma flexibilizam institutos já consolidados. Em uma via, circulam os argumentos políticos-liberais à favor da flexibilização que são: evolução do modo de produção capitalista, globalização do sistema econômico, diminuição do desemprego, restruturação do mercado de trabalho através da desregulamentação das normas laborais com o intuito de obtenção de maiores lucros, aumento de competitividade frente ao mercado internacional. E, na contramão desta via, encontram-se os argumentos contrários à flexibilização, fundamentalmente baseados na proteção do trabalhador, que de forma inequívoca é a própria raiz do Direito do Trabalho, haja vista, que muitas das garantias adquiridas pelos trabalhadores foram consequências de lutas que a classe travou durante anos pleiteando melhores condições de trabalho e equilíbrio jurídico frente aos empregadores, claramente, superiores nos contratos

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trabalhistas. Assim sendo, é evidente o caráter protecionista do Direito do Trabalho que redundam na tutela do trabalhador. A presente dissertação não visa o esgotamento do tema, visto sua complexidade, mas visa refletir sobre a relação entre direito legislado e direito convencionado, os aspectos históricos mundiais que ensejaram reforma trabalhista no Brasil, o sentido da flexibilização das normas trabalhistas e o potencial danoso aos direitos sociais e garantias individuais do trabalhador.

12

2

TRABALHO E CAPITALISMO A concepção de trabalho como conhecida hoje, teve sua origem na

Revolução Industrial do século XVIII, com a criação de do sistema fabril1, que propiciou a reformulação do modo de produção mercantilista corporativo e a política. A velha ideia de que a terra era importante em relação ao total de trabalho sobre ela executado desapareceu. O desenvolvimento do comércio e indústria, e a revolução dos preços, tornaram o dinheiro mais importante do que os homens, e a terra passou a ser considerada como fonte de renda. As pessoas haviam aprendido a tratá-la como tratam a propriedade em geral - tornou se um brinquedo de especuladores que compravam e vendiam pela oportunidade de fazer dinheiro. O movimento de fechamento das terras provocou muito sofrimento, mas ampliou as possibilidades de melhorar a agricultura. E quando a indústria capitalista teve necessidade de trabalhadores, encontrou parte da mão-de-obra entre esses infelizes desprovidos de terra, que haviam passado a ter apenas a sua capacidade de trabalho para ganhar a vida 2.

Substituído trabalho artesanal pelo industrial, surge o trabalho assalariado, como necessidade para operacionalizar a produção mercantil, porém, mesmo sob o pressuposto da igualdade e liberdade, os trabalhadores eram tratados como escravos pelos seus patrões. E, a crescente mão-de-obra, decorrente do êxodo dos camponeses para as regiões fabris e o liberalismo nas relações contratuais de emprego, só fez crescer a disparidade entre empregado e empregador e o capital ditou a valoração do trabalho sem influência alguma do Estado.

1

(...) 4. Sistema fabril: produção para um mercado cada vez maior e oscilante, realizada fora de casa, nos edifícios do empregador e sob rigorosa supervisão. Os trabalhadores perderam completamente sua independência. Não possuem a matéria-prima, como ocorria no sistema de corporações, nem os instrumentos, tal como no sistema doméstico. A habilidade deixou de ser tão importante como antes, devido ao maior uso da máquina. O capital tornou-se mais necessário do que nunca. HUBERMAN, LEO, História da Riqueza do Homem. 16ª ed. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1983, p. 125. 2 HUBERMAN, LEO, História da Riqueza do Homem. 16ª ed. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1983, p. 118.

13

Ficando caracterizado durante esse período a precarização da classe trabalhadores devido a situações humilhantes impostas à eles, jornadas de trabalhos prolongadas em demasia, condições de trabalho desumanas em troca de quantias insignificantes visto o esforço prestado. No mesmo período os trabalhadores evidenciaram que as máquinas que propiciavam o emprego de alguns e auxiliavam a produção, deixavam outros desempregados, e, o liberalismo era um campo fértil para o florescimento da desigualdade social e só dava frutos para o dono do capital no mesmo compasso que desguarnecia o trabalhador, enquanto, o Estado só protegia a economia e não o motor dela – o trabalhador. Esses motivos foram precursores dos movimentos sociais e lutas dos trabalhadores vislumbrando uma proteção estatal e uma efetiva justiça social, que determinaram a institucionalização do trabalho e a intervenção do Estado com a criação de leis trabalhistas. O Direito do Trabalho como ciência jurídica se tornou fundamental para regular as desigualdade nos contratos de trabalho, visto, a inaplicabilidade do Direito Civil nas relações empregatícias, uma vez que a ótica desse direito se resume a uma bilateralidade entre os sujeitos da relação e os contratos laborais vão muito além, pois, englobam questões sociais e garantias fundamentais inerentes ao ser humano. Quanto à institucionalização do Direito do Trabalho, o jurista trabalhista Maurício Godinho Delgado diz: (...) Tal fase conheceria seu clímax nas décadas seguintes à Segunda Guerra Mundial, com o aprofundamento do processo de constitucionalização do Direito do Trabalho e hegemonia do chamado Estado de Bem-Estar Social. As Constituições democráticas pós-1945, da França, da Itália e da Alemanha em primeiro momento [...], e depois, de Portugal e da Espanha [...], não só incorporariam normas justrabalhistas, mas principalmente diretrizes gerais de valorização do trabalho e do ser humano que labora empregaticiamente para outrem. Mais: incorporariam princípios, constitucionalizando-os, além de fixar princípios gerais de clara influência na área laborativa (como da dignidade humana e da justiça social, por exemplo)3.

3

DELGADO, M. G. Curso de Direito do Trabalho. 12ª. ed. São Paulo: LTr, 2013. p. 94.

14

No Brasil, como em diversos lugares, o Direito do Trabalho surgiu oriundo dos movimentos sociais e lutas dos sindicatos do operariado europeu, contudo, é nítido o caráter concessório no Direito do Trabalho, visto que os operários não possuem condições em muitas vezes de reivindicar direitos com segurança, fato que demanda um esforço estatal para sua efetivação. Assim expõe Sergio Pinto Martins. As transformações que vinham ocorrendo na Europa, em decorrência da Primeira Guerra Mundial e o aparecimento da OIT, em 1919, incentivaram a criação de normas trabalhistas em nosso país. Existiam muitos imigrantes no Brasil que deram origem a movimentos operários reivindicando melhores condições de trabalho e salários. Começa a surgir uma política trabalhista 4 idealizada por Getúlio Vargas em 1930 .

O também jurista Professor Octavio Bueno Magano descreve em quatro períodos da formação do Direito do Trabalho Brasileiro quais são: 1º liberalismo monárquico

(1822-1888);



liberalismo

republicano

(1989-1930);



intervencionismo (1930-final de 1989); e 4º neoliberalismo (iniciado em 1990)5. Na década de 30 houve um rompimento com o individualismo e o início da formação do Direito do Trabalho brasileiro com a criação de diversas normas trabalhistas, o Estado tornou-se interventor, não se pode negar a relação entre a postura do Estado brasileiro com a crise de 1929. A Constituição de 1934 influenciada pelo constitucionalismo social foi a primeira a tratar do Direito do Trabalho, assegurando diversas garantias à classe que trabalha, por exemplo, jornada mínima de trabalho, isonomia salarial, repouso semanal, férias anuais e demais existentes até hoje. Até o ano de 1943 existiam em nosso ordenamento jurídico diversas leis que tratavam de variados assuntos decorrentes das relações de trabalho de maneira esparsas, ocorre que no referido ano foi editado o Decreto-lei n.º 5.452, de 1º de maio de 1953 que criou a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que agrupou todas as leis em um único documento, difere de um código propriamente dito, nas de Sergio Pinto Martins, haja vista que, “(...) pois este pressupõe um 4 5

MARTINS, SERGIO PINTO. Direito do Trabalho. 13ª. São Paulo: Atlas, 2001. p. 39. MAGANO, OCTAVIO BUENO. Manual de Direito do Trabalho: Parte Geral. Vol. I. São Paulo: LTr, 1991. p. 23.

15

Direito novo (...) a CLT apenas reuniu a legislação existente na época, consolidando-a”6. Com o advento da atual Constituição aprovada em 5 de outubro de 1988, o Direito do Trabalho finalmente alcançou o patamar de Direito Social, uma vez que nas Constituições anteriores era inserido no campo da ordem econômica e social7 e na atual Carta Magna esta elencado no Capítulo II que trata dos “Dos Direitos Sociais” do Título II “Dos Direitos e Garantias Fundamentais” correspondendo aos artigos 7º ao 11º. Caracterizado o intervencionismo do Estado, rompe-se o a supremacia do liberalismo, e a troca do interesse particular pelo interesse coletivo. Com essa ruptura torna-se fértil o campo para a reprodução do sistema capitalista, haja vista, que a existência de um Estado interventor é pressuposto de existência para o capitalismo, Alysson Leandro Mascaro sobre essa relação entre Estado e sistema capitalista ensina que: (...) No capitalismo a apreensão do produto da força do trabalho e dos bens não é mais feita a partir de uma posse bruta ou da violência física. Há uma intermediação universal das mercadorias, garantida não por cada burguês, mas por uma instância apartada de todos eles. O Estado, assim, se revela como um aparato necessário à reprodução capitalista, assegurando a troca das mercadorias e a própria exploração da força de trabalho de forma assalariada8.

Portanto, inegável o suporte estatal, fazendo que o capitalismo englobe a estrutura política, social, econômica, jurídica e filosófica que formando uma relação petrificada, na qual ele – o Estado - normatiza para que o sistema prospere consubstanciado no modo de exploração da mais-valia, o valor de uso, valor de troca. Historicamente, o capitalismo teve sua origem com o anseio da burguesia europeia por expansão e ascensão social, baseado no mercantilismo, ainda longe da concepção moderna de capitalismo devido à ausência de um Estado.

6 7 8

MARTINS, SERGIO PINTO. Direito do Trabalho. 13ª. São Paulo: Atlas, 2001. p. 40. MARTINS, SERGIO PINTO. loc.cit.. MASCARO, ALYSSON LEANDRO, Estado e Forma Política. 1. Ed.: Boitempo, 2013, p. 18.

16

Assim, notadamente o regime capitalista insurge como um complexo de instrumentos que estratificam e justificam a cumulação, conforme expõe o filósofo Alysson Leandro Mascaro em sua obra “Estado e Forma Política”, vejamos. (...) tal regime de acumulação não se constitui, apenas, numa dinâmica do nível econômico, embora este lhe seja seu primeiro motor. Para que haja a possibilidade de apropriação do resultado do trabalho de terceiros, recrutados mediante contrato, há formas sociais e uma série de mecanismo políticos e jurídicos que consolidam um núcleo institucional suficiente e próprio à acumulação. Além de serem constituídas objetivamente por tais formas sociais, as classes trabalhadoras agem no contexto dessas instituições, incorporando no mais das vezes seus valores médios – respeito à ordem, aos contratos, à propriedade privada, ao Estado9.

O trabalho e o capitalismo são pares simbióticos, pois, a existência de ambos se comunica; o trabalho assalariado e a liberdade dos indivíduos foram os pretextos motivadores para cooptação dos frutos do trabalho de terceiros pelo capital. Com o próprio funcionamento, o processo capitalista de produção reproduz, portanto, a separação entre a força de trabalho e as condições de trabalho, perpetuando, assim, as condições de exploração do trabalhador. Compele sempre o trabalhador a vender sua força de trabalho para viver, e capacita sempre o capitalista a comprá-la para enriquecer-se. Não é mais o acaso que leva o trabalhador e o capitalista a se encontrarem no mercado, como vendedor e comprador. É o próprio processo que, continuamente, lança primeiro como vendedor de sua força de trabalho no mercado e transforma seu produto em meio que o segundo utiliza para comprá-lo. Na realidade, o trabalhador pertence ao capital antes de vender-se ao capitalista. Sua servidão econômica se concretiza e se dissimula, ao mesmo tempo, pela venda periódica de si mesmo, pela sua troca de patrões e pelas oscilações do preço do trabalho no mercado, A produção capitalista, encarada em seu conjunto, ou como processo de reprodução, produz não só mercadoria, não só maisvalia; produz e reproduz a relação capitalista: de um lado, o capitalista e do outro, o assalariado10.

Assim exposto, podemos evidenciar que o intervencionismo estatal na relação de trabalho, é essencial para a finalidade do sistema capitalista que é o 9 10

MASCARO, ALYSSON LEANDRO, Estado e Forma Política. 1. Ed.: Boitempo, 2013, p. 113. MARX, K. O Capital: Crítica da Economia Política. 9ª. ed. São Paulo: Difel, v. II, 1984. p. 672673.

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acúmulo e a reprodução do capital, pois, “sem ele, o domínio do capital sobre o trabalho assalariado seria domínio direito – portanto, escravidão ou servidão. A reprodução da exploração assalariada e mercantil fortalece necessariamente uma instituição política apartada dos indivíduos”11, que no caso é o próprio Estado, o legitimador de todo o aparato capitalista.

11

MASCARO, ALYSSON LEANDRO, Estado e Forma Política. 1. Ed.: Boitempo, 2013, p. 18.

18

3

CRISE

DO

CAPITALISMO

E

REFORMULAÇÃO

PRODUTIVA A história do capitalismo é carreada de crises estruturais em consequência do seu modo de produção baseado na contradição das classes e nos diversos interesses de exploração - o que gera diversas instabilidades sociais e econômicas. Contudo, a superação dessas crises – que só é possível graças à intervenção estatal - toma como partido a própria estrutura político-jurídica do capital, notadamente, por novas interpretações, reconstituições da forma estrutural. Em suma, segundo Alysson L. Mascaro sobre o assunto: (...) os regimes de acumulação e os modos de regulação não variam no que tange à manutenção da forma de circulação, da forma de sujeito de direito e da apropriação privada garantida por meio estatal. As variações acumulatórios e regulatórias, portanto, estão no modo, nos fins e na quantidade de direitos e propriedades, nos arranjos da exploração do trabalho assalariado e nos meios de circulação 12.

O modo de produção capitalista sofreu diversas mudanças ao longo dos anos, num primeiro momento superou o modo de produção agropecuária para o de produção de bens, com o desenvolvimento das tecnologias, as invenções das máquinas, o trabalho manual foi sendo substituído pelo maquinário, fato que, como já mencionado, gerou uma reestruturação da sociedade, sobretudo, quanto à urbanização das cidades, trabalho assalariado e menor autonomia do trabalhador quanto à produção da mercadoria. Portanto, do trabalho exploratório servil, no qual, a produção de mercadoria não tinha objetivo mercantil, e sim, de subsistência, limitando-se a um sistema produtivo familiar13 à emergência do artesanato onde uma mesma pessoa 12 13

MASCARO, ALYSSON LEANDRO, Estado e Forma Política. 1. Ed.: Boitempo, 2013, p. 118. (...) 1. Sistema familiar: os membros de uma família produzem artigos para seu consumo, e não para a venda. O trabalho não se fazia com o objetivo de atender ao mercado. Princípio da Idade Média. HUBERMAN, LEO, História da Riqueza do Homem. 16ª ed. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1983, p. 125.

19

possuía a matéria-prima e executava a produção da mercadoria. Às evoluções tecnológicas que propiciaram a criação do sistema de fabril de produção, à venda da força de trabalho e mais recentemente o capitalismo concorrencial, que por sua vez, necessita de meios de produção mais eficazes que faz nascerem os modos de regulação conhecidos como taylorismo, fordismo e toyotismo, são frutos da própria essência do capitalismo, pois, todas essas mudanças tiveram reflexos nas relações de trabalho e suas respectivas crises propuseram ao capital, sua reformulação para a mantença de sua reprodução econômico-social. O capitalismo reformulou o modo de acumulação dos resultados do trabalho de terceiros ao longo dos anos para suprir os ditames da “globalização”, pretexto para a propagação do sistema, analisando a história do capitalismo e do trabalho, os entreveros entre a classe dominadora e a dominada não são fatos inesperados, são nada mais que a característica expoente desse sistema - o capitalismo é autofágico ele se alimenta de sua própria estrutura para se manter, crescer e evoluir.

3.1 Fordismo e Acumulação Flexível As formas sociais fizeram o capitalismo adotar diversos modos de produção ao longo de sua existência, um deles caracterizado pela setorização do trabalho, produção em larga escala contagem do tempo de produção, é o fordismo, implementado pelo empresário americano Henry Ford no ano de 1914. Implementado e não criado, pois, essas ideias de organização e tecnológicas de Henry Ford já existiam, conforme explica David Harvey na obra “Condição Pós-Moderna” – (...) “Ford também fez pouco mais do que racionalizar velhas tecnologias e uma detalhada divisão do trabalho preexistente, embora, ao fazer o trabalho chegar ao trabalhador num posição fixa, ele tenha conseguido dramáticos ganhos de produtividade”14. As velhas tecnologias que Harvey se refere, são as oriundas do pensamento de Frederick W. Taylor, mas precisamente, no livro “Os Princípios da 14

HARVEY, D. Condição Pós-Moderna. 16ª. ed. São Paulo: Edições Loyola, 2007. p. 121.

20

Administração Científica”15, nesta obra Taylor concebia um método científico na administração da produção visando o melhor custo/benefício. A diferença substancial entre Taylor e Ford é que este tinha uma abordagem diferente daquele; “(...) seu reconhecimento explícito de que produção em massa significava consumo em massa, um novo sistema de reprodução da força de trabalho, uma nova política de controle e gerência do trabalho, uma nova estética e uma nova psicologia, em suma, um novo tipo de sociedade democrática, racionalizada, modernista e populista”16. Tanto o taylorismo quanto o fordismo propuseram e estabeleceram algo que o capitalismo necessitava à época - destruir o conhecimento, o “saber” do operário americano – único instrumento de resistência da classe, ao se apoderar disso o capital estabelece a expropriação do trabalho, talvez, o sinônimo do capitalismo. O período pós-guerra foi o período de maior expansão do modelo fordista fomentado pelo corporativismo17 estatal que estabelecera o fordismo como padrão de reprodução capitalista. O regime fordista se assenta numa ampla coesão social e política interna, forjando mecanismos de negociação coletivos. Sindicatos, entidades empresariais, organizações de seguridade social e, em especial, o Estado são os agentes principais dessa dinâmica política e econômica. Além disso, o fordismo se implanta como uma nova estrutura da própria vida social. Formas costumeiras de vida são rapidamente transformadas, nichos sociais e econômicos pré-capitalistas ou na borda do sistema são alterados e inseridos no mercado de trabalho assalariado e de consumo18.

O fordismo aumentou o papel do Estado, que passou à regular diversos aspectos da vida econômico-político-social do trabalhador a fim de propagar a política do “bem-estar social” inicialmente difundida após a Grande Depressão e após o fim de regimes totalitários na Segunda Guerra Mundial. 15 16 17

18

HARVEY, D. Condição Pós-Moderna. 16ª. ed. São Paulo: Edições Loyola, 2007. p. 121. HARVEY, D. Condição Pós-Moderna. 16ª. ed. São Paulo: Edições Loyola, 2007. p. 122. (...) O corporativismo compreende um conjunto de práticas e arranjos institucionais destinadas a vincular os interesses da “sociedade civil” – organizados em associações ou grupos de pressão – com as estruturas de decisão do Estado (burocracia e parlamento). Nesse sentido, possui uma dupla dimensão; trata-se de um modo de intermediação de interesses e de um mecanismo de elaboração e implementação de políticas públicas. GALVÃO, A. Neoliberalismo e Reforma Trabalhista no Brasil. São Paulo: Reevan, 2007. p. 61. MASCARO, ALYSSON LEANDRO, Estado e Forma Política. 1. Ed.: Boitempo, 2013, p. 119.

21

“(...) o fordismo como o processo de trabalho que, junto com o taylorismo, predominou na grande indústria capitalista ao longo deste século” 19. Contudo, a exemplo do capitalismo a derrocado do fordismo se encontra em sua própria existência, melhor dizendo, em sua própria rigidez e a incapacidade de se alocar nas mudanças capitalistas e na década de 70 o modelo iniciou um processo de diminuição acarretado por uma crise estrutural devido à queda da taxa de lucro decorrente do excesso de produção esgotamento do padrão de acumulação taylorista/fordista de produção, a massiva intensificação das greves, manifestações que colocaram em xeque o “bem-estar social”, e, diversas outras crises relacionadas ao modo de regulação, como a crise do dólar e do petróleo, por exemplo. Segundo Harvey sobre o assunto: Rigidez dos investimentos de capital fixo de larga escala e de longo prazo em sistemas de produção em massa, que impediam a flexibilidade do planejamento […]. Rigidez nos mercados, na alocação e nos contratos de trabalho”. Qualquer tentativa de superar esses problemas de rigidez esbarrava nas manifestações da classe trabalhadora. Por conseguinte, esta acabava perpassando os compromissos assumidos pelo Estado que, para manter a legitimidade do sistema, sob pressão intensificava os investimentos em programas de assistência social 20.

O neoliberalismo21 surge com resposta à crise do modo de regulação fordista, sendo que o resultado da reestruturação econômico bem como político-social é um modo de regulação totalmente distinto do fordismo, Chamada por Harvey de “acumulação flexível”22, em suas palavras: “(...) Ela se apoia na flexibilidade dos processos de trabalho dos mercados de trabalho, dos produtos e padrões de consumo”. A acumulação flexível decorreu de diversas mudanças ocorridas na sociedade da época, como a velocidade de cognição pública das decisões tomadas pelos capitalistas, o “encurtamento das distâncias”, por exemplo. Fazendo aumentar o poder dos empregadores que passaram a exercer pressões nas formas de

19 20 21

22

ANTUNES, R. Adeus ao Trabalho?: Ensaio Sobre as Metamorfoses e a Centralidade do Mundo do Trabalho. 8ª. ed. São Paulo: Editora da Universidade Estadual de Campinas, 2002. p. 24. HARVEY, D. Condição Pós-Moderna. 16ª. ed. São Paulo: Edições Loyola, 2007. p. 135. “O neoliberalismo é a manifestação de um modo de regulação que, a partir da década de 1980, começa a tomar forma, acompanhando também um específico regime de acumulação, massivamente de capitais financeiros internacionalizados”. MASCARO, ALYSSON LEANDRO, Estado e Forma Política. 1. Ed.: Boitempo, 2013, p. 122. HARVEY, D. Condição Pós-Moderna. 16ª. ed. São Paulo: Edições Loyola, 2007. p. 140.

22

controle da atividade laboral, ora, enfraquecida devido às altas taxas de desempregos e o retrocesso do poder sindical, característico do fordismo 23. A perseguição pelo lucro ficara cada vez mais acirrada devido ao estreitamento das margens a serem obtidas, a competitividade e a grande mão-deobra excedente, notadamente, pelos desempregados dispostos, estes, a aceitarem imposições de contratos de trabalho flexíveis. A flexibilização

trabalhista durante o período pós-fordismo e atual

neoliberalismo seguiu como “(...) tendência dos mercados de trabalho é (em) reduzir o número de trabalhadores “centrais” e empregar cada vez mais uma força de trabalho que entra facilmente e é demitida sem custos quando as coisas ficam ruins24”.

3.2 Toyotismo A globalização25 tornou-se o instrumento para a inserção do neoliberalismo como padrão econômico, que pregava o distanciamento do Estado das relações de mercado. A figura estatal, ora restrita, à nação passou a figurar globalmente houve a passagem de Estado-Nação para Estado-Globalizado devido aos avanços tecnológicos que aproximaram virtualmente as nações e de certa forma rompendo com as fronteiras. Os reflexos da globalização e do neoliberalismo nas relações de trabalho são enormes e evidenciam uma crise contemporânea no mundo do trabalho, o modo de produção/regulação que sincretizou os anseios do neoliberalismo e melhor 23 24

25

HARVEY, D. Condição Pós-Moderna. 16ª. ed. São Paulo: Edições Loyola, 2007. p. 141. HARVEY, D. Condição Pós-Moderna. 16ª. ed. São Paulo: Edições Loyola, 2007. p. 144.

“(...) A globalização expressa um movimento complexo de abertura de fronteiras e de desregulamentação que permite as atividades econômicas capitalistas estenderam seu campo de ação na esfera mundial”. DIAS, EVANDER. A Flexibilização Das Normas Trabalhitas Como Uma Tendência da Globalização E Seus Reflexos No Direito do Trabalho Brasileiro, 2009. Disponível em: https://www.univem.edu.br/servico/aplicativos/mestrado_dir/dissertacoes/A_FLEXIBILIZA%C3%8 7%C3%83O_DAS_NORMAS_TRABALHISTAS_COMO_UMA_TEND%C3%8ANCI_1146_pt.pdf. Acesso em 20 de maio 2014.

23

coadunou com a dita acumulação flexível foi - o toyotismo. Surgido nas fábricas da Toyota no Japão que teve como seu precursor o engenheiro Taiichi Ohno e foi tido como superação da crise fordista, primeiramente, no âmbito industrial e que posteriormente, devido ao corporativismo estatal permeou-se por toda a sociedade capitalista. Ricardo Antunes, citando Gounet em sua principal obra “Adeus ao Trabalho?”, explica sinteticamente o surgimento do toyotismo: (...) Com o que Gounet sintetiza: "O toyotismo é uma resposta à crise do fordismo dos anos 70. Ao invés do trabalho desqualificado, o operário tornase polivalente. Ao invés da linha individualizada, ele se integra em uma equipe. Ao invés de produzir veículos em massa para pessoas que não conhece, ele fabrica um elemento para a "satisfação da equipe que está na sequência da sua linha". E conclui, não sem um toque de ironia: “Em síntese, com o toyotismo, parece desaparecer o trabalho repetitivo, ultrasimples, desmotivante e embrutecedor. Finalmente, estamos na fase do enriquecimento das tarefas, da satisfação do consumidor, do controle de qualidade"26.

Ainda o mesmo autor, em linhas gerais, traça um paralelo das características básicas do toyotismo em contraposição ao fordismo, vejamos: (...) 1) Sua produção muito vinculada à demanda. 2) Ela é variada e bastante heterogênea. 3) Fundamenta-se no trabalho operário em equipe, com multivariedade de funções. 4) Tem como princípio o just in time, o melhor aproveitamento possível do tempo de produção e funciona segundo o sistema de kanban, placas ou senhas de comando para reposição de peças e de estoque que, no toyotismo, devem ser mínimos. Enquanto na fábrica fordista cerca de 75% era produzido no seu interior, na fábrica toyotista somente cerca de 25% é produzido no seu interior. Ela horizontaliza o processo produtivo e transfere a "terceiros" grande parte do que anteriormente era produzido dentro dela27.

Tal qual o fordismo o período pós-fordista caracterizado pelo toyotismo necessitou uma reestruturação das condições socioeconômicas do capitalismo, por exemplo, a mudança que ocorreu no movimento sindical - este característico do sistema fordista - se fez o grande entrave para superação do sistema, uma vez que

26 27

ANTUNES, R. Adeus ao Trabalho?: Ensaio Sobre as Metamorfoses e a Centralidade do Mundo do Trabalho. 8ª. ed. São Paulo: Editora da Universidade Estadual de Campinas, 2002. p. 36. ANTUNES, R. Adeus ao Trabalho?: Ensaio Sobre as Metamorfoses e a Centralidade do Mundo do Trabalho. 8ª. ed. São Paulo: Editora da Universidade Estadual de Campinas, 2002. p. 118.

24

o Estado tinha que atender os anseios em busca do lucro e garantir as reivindicações da classe que trabalha. Vagarosamente o sindicalismo foi perdendo a força diante das práticas adotadas pelas empresas neoliberais que distanciava cada vez mais o trabalhador do seu próprio trabalho “(...) É nesta contextualidade adversa que se desenvolve o sindicalismo de participação em substituição ao sindicalismo de classe”28 Com o enfraquecimento dos sindicatos, perdida a força combatente deles foi criado o sindicalismo japonês da era toyotista, o “sindicalismo de empresa”29, na medida que estreitavam a relação entre trabalhador e empresa com propostas de empregos vitalícios, ganhos salariais em decorrência de maior produtividade vinculando o trabalhador ao âmbito empresarial. A “sindicalização empresarial” é uma característica historicamente importante para o sucesso do toyotismo que possibilitou outras essencialidades para o modo de regulação/produção japonês: Outro ponto essencial do toyotismo é que, para a efetiva flexibilização do aparato produtivo, é também imprescindível a flexibilização dos trabalhadores. Direitos flexíveis, de modo a dispor desta força de trabalho em função direta das necessidades do mercado consumidor. O toyotismo estrutura-se a partir de um número mínimo de trabalhadores, ampliando-os, através de horas extras, trabalhadores temporários ou subcontratação, dependendo das condições de mercado 30.

O aparato produtivo qual se refere Antunes se põe contrário ao fordismo, pois, no toyotismo a produção é baseada no consumo, ou seja, na demanda, que ora, determina a produção, e não, na produção em série e de massa do modelo fordista, este modelo adotado pelos japoneses é denominado de “just-in-time”, ou seja, o produto só estará disponível no local de consumo no momento necessário, portanto, torna-se necessário uma cadeia treinada de fornecedores para suprir as matérias-primas rapidamente e pequenas quantidades de fornecimento sem que haja interrupção da produção. 28

29

30

ANTUNES, R. Adeus ao Trabalho?: Ensaio Mundo do Trabalho. 8ª. ed. São Paulo: Editora p. 150. ANTUNES, R. Adeus ao Trabalho?: Ensaio Mundo do Trabalho. 8ª. ed. São Paulo: Editora p. 33. ANTUNES, R. Adeus ao Trabalho?: Ensaio Mundo do Trabalho. 8ª. ed. São Paulo: Editora p. 36.

Sobre as Metamorfoses e a Centralidade do da Universidade Estadual de Campinas, 2002. Sobre as Metamorfoses e a Centralidade do da Universidade Estadual de Campinas, 2002. Sobre as Metamorfoses e a Centralidade do da Universidade Estadual de Campinas, 2002.

25

O toyotismo estabelece um novo patamar de especialização do trabalho rompendo com o estabelecido pelo fordismo, “Em síntese, com o toyotismo, parece desaparecer o trabalho repetitivo, ultra-simples, desmotivante e embrutecedor. Finalmente, estamos na fase do enriquecimento das tarefas, da satisfação do consumidor, do controle de qualidade”31,

31

ANTUNES, R. Adeus ao Trabalho?: Ensaio Sobre as Metamorfoses e a Centralidade do Mundo do Trabalho. 8ª. ed. São Paulo: Editora da Universidade Estadual de Campinas, 2002. p. 37

26

4

ALIENAÇÃO E CAPTURA DA SUBJETIVIDADE DO

TRABALHADOR A condição que o direito e o capitalismo criam para o homem inserte no seu sistema é a alienação, que é o estado que o homem se encontra apartado de si próprio pela estrutura das relações de produção capitalista 32. Para Marx a alienação inicia-se com a fragmentação da produção do trabalho, na qual, o trabalhador perde a relação com o produto final de seu labor decorrente das relações de trabalho serve de estrutura para todas as demais em variados âmbitos da vida social33. O toyotismo fundamentou a política de expropriação do tempo livre do trabalhador, artificie primordial para a efetivação da captura da subjetividade do trabalhador. Segundo, Ricardo Antunes o toyotismo aparta o trabalhador do resultado do seu próprio trabalho realizando o verdadeiro “estranhamento”34 proposto por Marx, vejamos: (...) O estranhamento próprio do toyotismo é aquele dado pelo “envolvimento cooptado”, que possibilita ao capital apropriar-se do saber e do fazer do trabalho. Este, na lógica de integração toyotista, deve pensar e agir para o capital, para a produtividade, sob a aparência da eliminação efetiva do fosso existente entre elaboração e execução no processo de trabalho. Aparência porque a concepção efetiva dos produtos, a decisão do que e de como produzir não pertence aos trabalhadores. O resultado do processo de trabalho corporificado no produto permanece alheio e estranho ao produtor, preservando, sob todos os aspectos, o fetichismo sobre a mercadoria35.

32 33 34

35

MASCARO, A. L. Filosofia do Direito. 2ª. ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 280. MARX, KARL. Manuscritos Econômicos-Filosóficos. 1ª. São Paulo: Boitempo, 2004, p. 79. (...) O trabalhador se torna tanto mais pobre quanto mais riqueza ele produz, quanto mais a sua produção aumenta em poder e extensão. O trabalhador se torna uma mercadoria tão mais barata quanto mais mercadorias cria. Com a valorização do mundo das coisas [...] aumenta em proporção direta a desvalorização do mundo dos homens [...]. O trabalho não produz somente mercadorias; ele produz a si mesmo e ao trabalhador como uma mercadoria, e isto na medida em que produz, de fato, mercadorias em geral. MARX, KARL. Manuscritos Econômicos-Filosóficos. 1ª. São Paulo: Boitempo, 2004, p. 80. ANTUNES, R. Adeus ao Trabalho?: Ensaio Sobre as Metamorfoses e a Centralidade do Mundo do Trabalho. 8ª. ed. São Paulo: Editora da Universidade Estadual de Campinas, 2002. p. 42.

27

Por subjetividade do trabalhador entende-se como aspectos intrínsecos e intimistas do trabalhador que atuam nas suas relações laborais, sejam elas, individuais, grupal ou institucional. Não se limita somente ao campo da razão, uma vez que está repleta de acepções de diversas categorias que não podem ser percebidas pelo próprio individuo ou para organização qual ele esta inserido. Nota-se que a subjetividade é antagônica a alienação, pois, seria impossível a um sujeito ter absoluta compreensão de suas manifestações, sejam elas, racionais ou emocionais, fato contrário à alienação onde o sujeito inserte “tem” ou deveria “ter” noção dos fatos que o circundam sejam eles benéficos ou não. A captura da subjetividade é um fenômeno envolto de ideologias e políticas que reafirmam os termos “exploração” e “apropriação do trabalho alheio”, ora mascarada pelo neoliberalismo, a fim de comungar com o novo modelo social, o que torna necessário ao trabalhador adequar-se. O sociólogo Giovanni Alves conceitua a captura da subjetividade como: A “captura” da subjetividade é a “captura” da intersubjetividade e das relações sociais constitutivas do ser genérico do homem. É ela que explica o movimento de dissolução de coletivos de trabalho e reconstrução de novos coletivos/equipes ditas “colaborativas” com as ideias da empresa. Ao desconstruir/reconstituir “coletivos de trabalho”, o capital opera um movimento de “captura” da subjetividade. Neste movimento, reencontramos o homem social, o trabalhador coletivo como criação do capital36.

36

ALVES, G. Trabalho, Subjetividade e Capitalismo Manipulatório - O novo metabolismo social do trabalho e a precarização do homem que trabalha. Revista Estudos do Trabalho, São Paulo, Ano, v. 5, 2010. p. 13. Disponível em: http://www.giovannialves.org/Artigo_GIOVANNI%20ALVES_2010.pdf. Acesso em 26 maio 2014.

28

5

NEOLIBERALISMO E SUAS CONSEQUÊNCIAS NOS

MOVIMENTOS SOCIAIS Na década de 90 ascende a ideologia neoliberal em razão da ocorrência de fatos que o estratificaram como padrão socioeconômico, como, o capitalismo concorrencial, crise do fordismo, a acumulação flexível, surgimento do toyotismo e não intervenção estatal, por exemplo. Enquanto ideologia, movimento intelectual e politica, o neoliberalismo caracteriza-se por dois postulados fundamentais: a apologia do livre mercado e as críticas à intervenção estatal, oferecendo à burguesia novas frentes de acumulação de capital. Essas novas frentes se abrem mediante a adoção de medidas como privatização de empresas estatais, a desregulamentação dos mercados (especialmente do mercado de trabalho e o financeiro), e a transferência de parcelas crescentes da prestação de serviços sociais – tais como saúde, educação e previdência social – para o setor privado37.

O movimento neoliberal reformulou as relações sociais contemporâneas, haja vista, o esforço estatal na persecução de seus objetivos capitalistas que impõe a sociedade padrões sociais. No tocante aos movimentos sociais, o neoliberalismo modificou a forma como os quais lutavam por seus direitos, os trabalhadores cindiram com seus pares em busca de seus direitos de maneira combativa e iniciaram um processo de participação com as políticas do Estado, afastando-se das críticas as estruturas de exploração/dominação do capitalismo e adotando as ideias neoliberais. Historicamente os trabalhadores sempre foram os propulsores dos movimentos sociais, e as mudanças ocorridas sob a nova forma política neoliberal acarretou diversas mudanças institucionais que alteraram as relações sociais entre as classes dominante e dominada. Ocorre que, o Estado neoliberal para manter o sucesso do novo padrão econômico-social cria e gera novas políticas sociais, a fim reproduzir o capital.

37

GALVÃO, A. Neoliberalismo e Reforma Trabalhista no Brasil. São Paulo: Reevan, 2007. p. 80.

29

Sobre a forma politica do Estado no neoliberalismo Alysson Mascaro é enfático ao dizer que: (...) O neoliberalismo não é abolição da forma política estatal, mas, antes, a sua exponenciação. A mercadoria atinge, no modo de desenvolvimento pós-fordista, instâncias maiores que aquelas nas quais atuava no modelo fordista. A natureza é capturada como mercadorias em limites ainda mais amplos, por meio da exploração de novas tecnologias, desde a eletrônica até a biologia e a genética38.

No Brasil, o neoliberalismo surgiu efetivamente, na década de 90, período em que se tornou hegemonia sob o governo de Fernando Henrique Cardoso sustentado pela criação do Plano Real 39, que proporcionou uma melhora na vida da classe dominada, mesmo que, não em sua totalidade, pois, há diversos níveis dentre uma classe, mas foram evidentes os efeitos positivos da estabilizavam da moeda na vida desses. Quanto à classe dominante, a paridade cambial com o dólar e a decorrente disponibilidade para aquisição de bens importados aumentada, fez com que o neoliberalismo tornasse hegemonia devida aceitação de ambas as classes. O Plano Real, em segundo momento, não conseguiu manter a estabilidade gerada em sua criação, causando diversos problemas de ordem econômicosocial,

como,

balança

comercial

desfavorável,

aumento

substancial

do

desemprego, precarização do trabalho, diminuição da renda do trabalhador brasileiro e concentração de renda. Mesmo diante desses problemas FHC foi reeleito e plano neoliberal brasileiro continuou sob sua governança. Outras características marcantes do governo FHC que denotam o caráter neoliberal de sua governança foram: as privatizações de empresas estatais, altas taxas de juros e abertura de capital financeiro internacional, aumento das medidas provisórias, enfraquecimento de medidas protetivas do mercado interno e o fomento de estudos elaborados pelo Ministério do Trabalho que visavam a desregulamentação do trabalho. 38 39

MASCARO, ALYSSON LEANDRO, Estado e Forma Política. 1. Ed.: Boitempo, 2013, p. 125. “(...) O Plano Real permitiu a continuidade e a consolidação do projeto neoliberal inaugurado por Collor, assegurando a vitória – com ampla maioria de votos – de Fernando Henrique Cardoso – no primeiro turno das eleições de 1994.” GALVÃO, A. Neoliberalismo e Reforma Trabalhista no Brasil. São Paulo: Reevan, 2007. p. 92.

30

A desregulamentação notada no período neoliberal proporcionou dois fatos: (1) a expansão global dos limites das atividades capitalistas; e, (2) a precarização do trabalho. A sobrevivência do capital na globalização foi o preceito – como já visto – para autorizar a supressão de direitos trabalhistas no neoliberalismo, no Brasil o período neoliberal destaca-se pela oposição à “Era Vargas”, período em que, os direitos trabalhistas tiveram seu auge regulatório em termos estatais. Andréia Galvão expõe quais foram as principais supressões dos direitos trabalhistas ocorridas no governo neoliberal de FHC: (...) As modificações mais importantes destinadas a reduzir direitos trabalhistas se deram em âmbito da fiscalização, com a proibição de que os fiscais do Ministério do Trabalho autuassem empresas que descumprissem cláusulas acordadas coletivamente e que denunciassem acordos firmados em flagrante contradição com a lei (Portaria 865/95); e da remuneração, com a desindexação salarial (MP 1.079/95) e a desvinculação do reajuste do mínimo dos índices de inflação (MP 1.906/97)40.

Do fenômeno da precarização entende-se que devido a não intervenção do Estado e o desemprego estrutural causado pelo período pós-fordista, fez surgir a terceirização, a prestação de serviços, empregos temporários, bem como, a supressão de direitos trabalhistas que proporcionaram a flexibilização das normas trabalhistas, ou seja, uma verdadeira reforma nas relações justrabalhistas contemporâneas. Evander Dias em sua tese discute a origem da tendência flexibilizadora dos direitos trabalhistas contemporâneos: A tendência da flexibilização é proveniente do aparecimento das novas tecnologias, da informática, que mostra a passagem da era industrial para a pós-industrial, ensejando a expansão do setor terciário da economia. Começam a surgir no âmbito laboral novos tipos de contrato de trabalho (temporário, a tempo parcial, de estágio) em virtude da modificação dos modos de produção (toyotismo), a política neoliberal fundamenta a globalização econômica expandindo o capitalismo, o desemprego estrutural

40

GALVÃO, A. Neoliberalismo e Reforma Trabalhista no Brasil. São Paulo: Reevan, 2007. p. 232.

31

assombra o mundo e o trabalhador sofre as consequências destes acontecimentos41.

A celeuma do debate encontra-se na contraposição da rigidez jurídica quanto à proteção ao trabalhador e a busca das empresas pelo lucro e a sobrevivência destas no capitalismo contemporâneo, especificamente, no campo concorrencial, pois, a flexibilização das normas trabalhistas aparece como o resultado de todas as mudanças ocorridas no período em discussão e o principal debate a ser sustentado na nova forma política denominada de neoliberalismo. No Brasil, devido à maximização das atividades capitalistas no período neoliberal e os altos índices de desemprego, muitos empresários e lideranças sindicais, reivindicaram alterações nas normas trabalhistas por entenderem que elas não acompanhavam o processo evolutivo do mercado de capital/trabalho e constituía um entrave para competividade econômica do país. O caminho da “modernidade” passava pelas agressivas reformas no âmbito das privatizações, da previdência, da desregulamentação dos mercados econômicos e de trabalho. Neste último, a saída, então, era flexibilizar os estatutos que, segundo eles, oneravam o custo do trabalho e inviabilizavam a geração de empregos. Foi, portanto, com esse propósito que, no segundo governo de Fernando Henrique Cardoso, editou-se um pacote de medidas legislativas que alterava regras trabalhistas básicas, como o vínculo contratual, a jornada e o salário 42.

No final do governo FHC surge na pauta do legislativo o Projeto de Lei 5.843/01, propondo alteração do artigo 618 da CLT, que resultaria em uma prevalência dos acordos coletivos privados em face da legislação trabalhista, contudo, no governo Lula foi tirado da pauta do legislativo; teoricamente, pois, o mercado de trabalho brasileiro seguiu a tendência mundial flexibilizadora.

41

42

DIAS, E. A Flexibilização Das Normas Trabalhistas Como Uma Tendência da Globalização E Seus Reflexos No Direito do Trabalho Brasileiro, 2009. p. 60. Disponível em:https://www.univem.edu.br/servico/aplicativos/mestrado_dir/dissertacoes/A_FLEXIBILIZA %C3%87%C3%83O_DAS_NORMAS_TRABALHISTAS_COMO_UMA_TEND%C3%8ANCI_11 46_pt.pdf. Acesso em 20 de maio 2014. COSTA, M. D. S. O Sistema de Relações de Trabalho no Brasil: Alguns Traços Históricos e sua Precarização Atual. Revista Brasileira De Ciências Sociais, v. 20, n. 59, 2005. p. 121.. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rbcsoc/v20n59/a08v2059.pdf. Acesso em 26 maio 2014.

32

Os reflexos do neoliberalismo nos movimentos sociais apontam, precipuamente, ao sindicalismo, ora vista como o arcabouço de defesa dos direitos do trabalhador, que no período em discussão, perde sua força combativa e toma para si um caráter cooperativo. Os sindicatos operaram um intenso caminho de institucionalização e de crescente distanciamento dos movimentos autônomos de classe. Distanciam-se da ação, desenvolvida pelo sindicalismo classista e pelos movimentos sociais anticapitalistas, que visavam o controle social da reprodução, ação esta tão intensa em décadas anteriores, e subordinam-se à participação dentro da ordem43.

A constatação dessa mudança no plano nacional foi a criação da Força Sindical que defendia: “(...) um sindicalismo de resultados, assente à racionalidade cega do livre mercado, e desideologizado, no sentido de que circunscrito aos interesses econômicos imediatos dos trabalhadores. Embora moderadamente reivindicativa no plano econômico, sua atuação pautava-se na cooperação e na parceria com o capital, numa negação explícita ao sindicalismo de confronto, ideologizado”44. A

Força

Sindical

surgiu

como

um

mediador

confiável

para

os

empregadores em busca do diálogo com os empregados. Este fenômeno é chamado de “sindicalismo propositivo” que Andréia Galvão conceitua como: O sindicalismo propositivo caracteriza-se por priorizar a ação institucional, em detrimento do trabalho de organização e mobilização das bases, e por negociar de maneira “realista”, sem se confrontar com os elementos das propostas apresentadas pelo governo e pelo patronato. As críticas que lhes são dirigidas são pontuais e não requerem a mudança da política dominante, nem a reversão das formas de gestão da força de trabalho. 45

Essa cooperação sindical se torna essencial para a realização da flexibilização das normas trabalhistas pelo Estado impulsionado pelos desejos 43

44

45

ANTUNES, R. Adeus ao Trabalho?: Ensaio Sobre as Metamorfoses e a Centralidade do Mundo do Trabalho. 8ª. ed. São Paulo: Editora da Universidade Estadual de Campinas, 2002. p. 43. COSTA, M. D. S. O Sistema de Relações de Trabalho no Brasil: Alguns Traços Históricos e sua Precarização Atual. Revista Brasileira De Ciências Sociais, v. 20, n. 59, 2005. p. 121. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rbcsoc/v20n59/a08v2059.pdf. Acesso em 26 maio 2014. GALVÃO, A. Neoliberalismo e Reforma Trabalhista no Brasil. São Paulo: Reevan, 2007. p. 127.

33

neoliberais, gerando um verdadeiro retrocesso nos direitos e garantias fundamentais do trabalhador em nome da reprodução do capital.

34

6

FLEXIBILIZAÇÃO DAS LEIS TRABALHISTAS A “proposta” de flexibilização gera diversos pontos de debates, sobretudo,

a respeito dos prós e contras que depreendem da situação, pois, qualquer que seja a modificação no campo do trabalho é seguida de expressivos resultados no campo social devido a magnitude da influência do trabalho na vida das pessoas. É óbvio, que a tendência flexibilizadora foi impulsionada pelas mudanças econômicas, sociais e politicas desde o período pós-fordismo tendo como causa – como já visto – a globalização, surgimento de novas tecnologias e o aumento do desemprego, este último, de suma importância, pois, elevou o setor de prestação de serviços que é a camada da relação laboral onde é mais perceptível a flexibilização do trabalho. O caráter transitório do Direito do Trabalho suscita cada vez mais os debates de novas formas de trabalho, sendo, praticamente todas basicamente fundamentadas no afrouxamento das normas legais trabalhista, tendo em vista, a reprodução capitalista. Amauri Mascaro Nascimento expõe em sua obra “Curso de Direito do Trabalho”, três fontes diferentes sobre o assunto da flexibilização das normas, que são: a flexibilista, antiflexibilista e a semiflexibilista46. A flexibilista decorre da adaptação do Direito do Trabalho às condições de cada época expondo o caráter mutatório da realidade econômica e como a norma pode ser socialmente aceita, esta teoria é entendida mediante análise de suas fases como explica Evander Dias citando o doutrinador Sergio Pinto Martins. “(...) entende que o Direito do Trabalho passa por fases distintas, sendo a primeira o fato de assegurar direitos trabalhistas, a segunda diz respeito a fase promocional do Direito do Trabalho, e a terceira concerne a adaptação à realidade dos fatos.47

46 47

NASCIMENTO, A. M. Curso de Direito do Trabalho. 26. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 271. DIAS, E. A Flexibilização Das Normas Trabalhistas Como Uma Tendência da Globalização E Seus Reflexos No Direito do Trabalho Brasileiro, 2009. p. 67. Disponível em:https://www.univem.edu.br/servico/aplicativos/mestrado_dir/dissertacoes/A_FLEXIBILIZA %C3%87%C3%83O_DAS_NORMAS_TRABALHISTAS_COMO_UMA_TEND%C3%8ANCI_11 46_pt.pdf. Acesso em 20 de maio 2014.

35

A antiflexibilista argumenta se adequação das normas trabalhista a sociedade contemporânea é uma verdadeira adequação a realidade ou apenas um engodo para a redução dos direitos dos trabalhadores visando obtenção de lucros mais expressivos. Já a semiflexibilista, propõe que a flexibilização deve iniciar-se pela autonomia coletiva, respeitando normas legais mínimas com o intuito de evitar riscos e valorização plena das negociações coletivas48. Diversas são as fontes e formas de interpretação que pode se extrair do tema, bem como suas problemáticas, Amauri Mascaro Nascimento atenta pelo fato

da

diferença

existente

entre

os

vocábulos

“flexibilização”

e

“desregulamentação”, que são passíveis de confusões, vejamos. (...) Desregulamentação é vocábulo que deve ser restrito ao direito coletivo do trabalho, e não aplicado, portanto, ao direito individual do trabalho, para o qual existe a palavra flexibilização. Distinguese quanto ao âmbito a que se refere, uma vez que se desregulamenta o direito coletivo e se flexibiliza o direito individual. Portanto, desregulamentação é a política legislativa de redução da interferência da lei nas relações coletivas de trabalho para que se desenvolvam segundo o princípio da liberdade sindical e da ausência de leis do Estado que dificultem o exercício dessa liberdade49.

Diante disso, é válido traçar um paralelo a respeito dos argumentos positivos e negativos quanto a flexibilização das normas trabalhistas e as consequências advindas da adoção ou não das propostas flexibilizadoras existentes. As grandes polêmicas que pairam sobre o assunto surgem quanto a “contenda” entre “direito legislado X direito negociado”, e sobre a questão – “quais são os limites da flexibilização?”.

48

49

DIAS, E. A Flexibilização Das Normas Trabalhistas Como Uma Tendência da Globalização E Seus Reflexos No Direito do Trabalho Brasileiro, 2009. p. 67. Disponível em:https://www.univem.edu.br/servico/aplicativos/mestrado_dir/dissertacoes/A_FLEXIBILIZA %C3%87%C3%83O_DAS_NORMAS_TRABALHISTAS_COMO_UMA_TEND%C3%8ANCI_11 46_pt.pdf. Acesso em 20 de maio 2014. NASCIMENTO, A. M. Curso de Direito do Trabalho. 26. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 278.

36

Os argumentos favoráveis à flexibilização são dotados de uma ideologia neoliberal, propondo a reformulação das relações laborais sob o argumento de acompanhamento do processo evolutivo econômico, meio viável para a sobrevivência das empresas no campo concorrencial desonerando-as dos altos encargos trabalhistas e fim do desemprego. Defendem também, “a substituição do sistema atual, como o objetivo de permitir a prevalência do processo negocial sobre o processo estatal de formação das normas jurídicas, ou seja, o negociado prevalecendo sobre o legislado”50. No Brasil um dos maiores defensores da implantação da flexibilização é o doutrinador José Pastore, que cita a tese do “garantismo legal” 51 com óbice para uma maior oferta de emprego e fomenta a flexibilização como via de a ser seguida no Direito do Trabalho nacional: O Brasil, que nasceu do sistema europeu, continua muito regulamentado. Os brasileiros acreditam que se colocando mais e mais direitos na Constituição e na CLT os trabalhadores estarão melhor protegidos. É a ideologia do "garantismo legal". A realidade, porém, mostra o inverso. Antes da Constituição de 1988, o Brasil já tinha uma parcela imensa da sua força de trabalho no mercado informal: cerca de 45%. Depois disso, quando se criou uma série de novos direitos no campo da Constituição, o mercado informal saltou para 55%52.

Já os argumentos desfavoráveis, são fundamentados na própria rejeição de grande parte da classe trabalhadora mediante as experiências flexibilizadoras e a supressão de direitos tidos como fundamentais ao trabalhador. Entende-se que a flexibilização somente seja uma prioridade para as empresas, que por sua natureza capitalista buscam unicamente o melhor 50

51

52

DIAS, E. A Flexibilização Das Normas Trabalhistas Como Uma Tendência da Globalização E Seus Reflexos No Direito do Trabalho Brasileiro, 2009. p. 70. Disponível em:https://www.univem.edu.br/servico/aplicativos/mestrado_dir/dissertacoes/A_FLEXIBILIZA %C3%87%C3%83O_DAS_NORMAS_TRABALHISTAS_COMO_UMA_TEND%C3%8ANCI_11 46_pt.pdf. Acesso em 20 de maio 2014. Refere-se às técnicas de tutela dos direitos fundamentais, subjetivos, teve seu início no Direito Penal hoje se estende as relações trabalhistas. SILVA, S. G. C. L. D. Direitos fundamentais, garantismo e direito do trabalho. Revista OABRJ, Rio de Janeiro, v. 27, n. 2, p. 115-140, 2011. Disponível em: http://revista.oabrj.org.br/wpcontent/uploads/2012/12/Revista_OABRJ_v27n2.pdf. Acesso em 10 junho 2014. PASTORE, J. O Futuro do Trabalho no Brasil e no Mundo. aberto: educação, trabalho e desenvolvimento, Brasília, p. 31-38, 1995. Disponível em: http://rbep.inep.gov.br/index.php/emaberto/article/viewFile/978/882. Acesso em 10 junho 2014.

37

desempenho econômico, assim sendo, viola o Direito do Trabalho e acentua a desigualdade na relação laboral ao negar vigência de normas protecionistas voltadas ao trabalhador.

38

7

CONCLUSÃO A evolução do trabalho e do capitalismo está atrelada, bem como suas

crises, e, conseguintes superações. Contemporaneamente a reforma trabalhista em que desponta a flexibilização do direito do trabalho é o resultado das novas perspectivas do mundo contemporâneo, denotando um rompimento com o moderno dominado pelo fordismo, a proteção ao trabalho, rigidez normativa, que no Brasil teve na Era Vargas seu auge. A ideologia de “fim do trabalho” surgida no neoliberalismo propiciou de forma ainda mais ferrenha a apropriação dos resultados do trabalho pelas mãos dos capitalistas, uma vez que a classe-que-vive-do-trabalho não se reconhece como

classe,

uma

verdadeira

alienação

social,

a

concretização

do

“estranhamento do trabalho” proposto por Marx, consubstanciado, no modo de regulação toyotista. Como resultado de todas essas investidas do capitalismo, surge a falência paulatina dos direitos e garantias fundamentais do trabalhador, direitos esses, conquistados durante anos de lutas sociais da classe. Fazendo uma singela análise do ponto de vista neoliberal sobre a flexibilização conclui-se que este fenômeno é a inversão do princípio da hipossuficiência do empregado - de certo modo - pois, sacrifica o trabalhador que sem dúvida alguma é a parte mais frágil na relação de trabalho em razão dos objetivos empresariais, denotando que o direito do trabalho em sua forma clássica é um entrave para a evolução do capital, em outras palavras, o país que não adotar a flexibilização em sua legislação trabalhista falhará economicamente. Mas, partindo do ponto de vista garantidor, o Direito do Trabalho é a única fonte de defesa do trabalhador dos mandos do empregador, assim sendo, relativizar este direito é uma atitude extremamente temerária a sociedade, pois, a justiça - no que tange ao ordenamento jurídico - mesmo sendo um instrumento de controle de que o Estado faz uso para atingir seus fins, ainda é baseado na equidade e na proteção do mais fraco, assim sendo, tornando o direito convencionado superior ao legislado será claro o distanciamento desses preceitos

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edificadores da justiça, haja vista, que o empregador em busca do seu sucesso, caracterizado pelo lucro, acúmulo de dinheiro, como já notado em nossa sociedade, não leva em conta o bem-estar social do trabalhador. A tendência global do tema em discussão, inevitavelmente, atinge o Brasil que deve observar as propostas e consequências da reforma no ordenamento jurídico apontando “os olhos” para os trabalhadores e seus direitos e garantias fundamentais, pois, são eles a base da relação laboral. No Brasil a reforma trabalhista flexibilizadora desponta em nossos Tribunais Superiores, sobretudo, quanto aos seus limites, desde a modificação do artigo 7º, incisos VI, VIII e XIV da Constituição Federal que propiciou diversas mudanças de caráter flexibilizador como a negociação da jornada de trabalho e redução do salário, exemplificando. Assim, fica claro, a cautela a ser tomada ao tratar do assunto e quão temerária pode ser as consequências da reforma trabalhista no Brasil, pois, há de se compatibilizar a reforma no ordenamento jurídico laboral com os seus princípios, vistos como obstáculos para implantação, porém, asseguradores dos direitos do trabalhador, da sua condição e dignidade, bem como do trabalho, enquanto, valor social.

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