Ninho dos Pequenitos: 8 décadas a fazer sorrir as crianças da nossa terra

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Descrição do Produto

João Pinho

O Ninho dos Pequenitos 8 décadas a fazer sorrir as crianças da nossa terra

2010

O Ninho dos Pequenitos 8 décadas a fazer sorrir as crianças da nossa terra

FICHA TÉCNICA autor 

João Carlos Santos Pinho

editor 

Associação dos Amigos do Ninho dos Pequenitos (Sorriso)

motivo da capa 

O Ninho visto pela criança “Alexandre” de 5 anos do interior de parede de uma sala de actividades do Ninho dos Pequenitos, da autoria do artista João de Assunção Dinis (anos 60) paginação  Nuno Beirão impressão  Tipografia Lousanense, Lda. motivo da contracapa Desenho

tiragem 

1000 exemplares

isbn 978-989-96626-0-5 depósito legal 

© 2010 - reservados todos os direitos de acordo com a legislação em vigor.

Vai recomeçar a sua vida, em Coimbra o Ninho dos Pequenitos, insta‑ lado há anos, e durante anos, na área hoje ocupada pelos edifícios da Associação Académica, na Rua Oliveira Matos e vizinhanças, à qual cedeu os terrenos que lhe pertenciam. Dali seguiu para o conjunto assistencial infantil de Castanheira de Pera donde agora vem para ocupar instalações próprias e apropriadas, erguidas de propósito onde, espero, continuará a sua missão, mais actualizada, pois são passados anos e, neste prazo, muito se tem ensinado, muito se tem aprendido sobre a Criança, desde a sua vinda ao Mundo até à entrada no Mundo da Escola e da Vida… Não há exagero, nem imodéstia se disser que o Ninho dos Pequenitos teve uma acção notável e marcante do movimento Pró‑Criança no nosso País, pelo interesse que despertou, pelas iniciativas que provocou, pelas limitações que determinou, mas sobretudo porque trouxe para Portugal as Missionárias de Maria com as suas puericultoras, assistentes sociais, educadoras de infância, diplomadas em Pediatria e mais pessoal em que agora se fala constantemente, mas que, trinta anos atrás, quando começámos ninguém sabia o que eram e para que eram…

[Bissaya‑Barreto, discursando na inauguração das novas instalações do Ninho dos Pequenitos In Diário de Coimbra, 29 de Abril de 1969, P.5]

SUMÁRIO

Prefácio...................................................................................... 7 Abreviaturas utilizadas na obra................................................. 10 Créditos fotográficos.................................................................. 10 Breve cronologia........................................................................ 11 Introdução.................................................................................. 15 A. O Homem e a Obra por detràs do Ninho............................ 17 1. Bissaya‑Barreto...................................................................... 17 2. A Obra Social........................................................................ 24 B. O Ninho dos Pequenitos: pilar da Luta Antituberculosa e da Obra de Protecção à Grávida e Defesa da Criança (OPGDC)............................................................................... 37 1. Origens, enquadramento e organização................................ 37 2. A importância do Ninho dos Pequenitos no contexto assistencial: experiências, originalidades e pioneirimos......... 51 3. Constance Davon, O Ninho dos Pequenitos e a Escola Normal Social de Coimbra................................... 53 4. A ampliação do Ninho dos Pequenitos: cozinha, refeitório, parque infantil e jardim‑de‑infância....... 56 5. Breve súmula de alguns estabelecimentos da OPGDC......... 65 C. A transferência do Ninho dos Pequenitos para o Complexo Materno‑Infantil da Quinta da Rainha................................ 71 D. O Ninho dos Pequenitos: do Centro de Saúde e assistência Materno‑Infantil do Dr. Bissaya‑Barreto à Integração no Centro Hospitalar de Coimbra........................................ 89

E. O Ninho dos Pequenitos depois de Abril de 74..................... 91 1. A criação da Unidade de Intervenção Precoce...................... 91 2. A cooperação entre o Centro Regional de Segurança Social de Coimbra e a Fundação Bissaya‑Barreto .......................... 97 3. A criação e acção da SORRISO (Associação dos Amigos do Ninho dos Pequenitos)...................................................... 100 APÊNDICE I............................................................................. 111 O Ninho / Unidade de Intervenção Precoce............................ 113 Das Fraquezas se fez Forças ‑ uma cooperação frutuosa........... 117 O recomeço nas novas instalações............................................. 121 Uma visão sobre o Ninho…...................................................... 124 APÊNDICE II........................................................................... 127 Inventário de Mobiliário ‑ Utensílios e Rouparia da Obra de Protecção à Grávida e Criança”, Coimbra, Janeiro 1936.... 128 BIBLIOGRAFIA ...................................................................... 143 FONTES MANUSCRITAS..................................................... 148 NOTAS...................................................................................... 151

Prefácio

PREFÁCIO * Dr. Vicente Souto

Várias décadas passaram desde a criação do Ninho dos Pequenitos, pelo Professor Bissaya‑Barreto, no local hoje ocupado pela Associação Académica de Coimbra, na Praça da República. Bissaya‑Barreto ficou indiscutivelmente ligado às questões sociais, partilhando essas preocupações com outras personalidades da altura, em Portugal. Contudo, não devem restar dúvidas de que foi o primeiro a passar das preocupações às iniciativas no terreno, tais como a protecção de crianças mais desfavorecidas, aos idosos e na área da saúde, ao combate às doenças que, na altura, abrangiam grandes manchas da nossa população. De então para cá muitas coisas mudaram, umas para melhor mas, infelizmente, outras para pior. Houve doenças que praticamente desapareceram, mas outras surgiram, como a SIDA e outras aumentaram a sua incidência. Se é verdade que houve inegáveis e importantes avanços nos cuidados de saúde, como melhor organização, mais soluções terapêuticas e novas tecnologias, melhoria do nível de vida, e outros, sobretudo nos países mais desenvolvidos, também é indesmentível que a sociedade actual vive uma fase altamente problemática, em que o Poder, nas suas diferentes formas, se transformou no objectivo principal, senão único, calcando muitas vezes os valores tradicionais e éticos que constituíram, e que julgo, terão de continuar a constituir, a base da nossa sociedade. Com estas alterações de valores e padrões surge naturalmente a marginalização dos mais pobres e desfavorecidos, o problema da droga, o aumento da criminalidade, etc. Mas voltemos ao Ninho dos Pequenitos que ao longo destes anos, também mudou… Começou até por mudar de lugar pois em 1963 reabriu no terreno da actual Maternidade Bissaya‑Barreto, inaugurada alguns anos antes.

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Muito mais importante que a mudança de local foi a necessária e obrigatória adaptação aos desafios dos novos tempos, no sentido de respostas mais específicas e eficazes. Julgo que dois factores tiveram um papel relevante nessa necessária e obrigatória reestruturação: a criação na Maternidade Bissaya‑Barreto da chamada Unidade De Intervenção Precoce (U.I.P.) e a constituição de uma Associação dos Amigos do Ninho dos Pequenitos, a “Sorriso”. A U.I.P., instalada em edifício contíguo ao Ninho dos Pequenitos, constituía uma antiga aspiração da Maternidade Bissaya Barreto, em consonância com a filosofia sempre aí presente da valorização das questões sociais e da humanização dos cuidados às grávidas e crianças, que em alguns aspectos, foi pioneira no País. Assim, foi constituída uma equipa multidisciplinar integrando assistentes sociais, psicólogos, enfermeiros, pediatras, obstetras e ginecologistas que garantiram as consultas de risco aí criadas para adolescentes, grávidas em situação de risco e respectivas crianças. Compreende‑se, facilmente, a natural simbiose que se estabeleceu entre essa unidade e o Ninho dos Pequenitos e os consequentes benefícios daí resultantes. Quanto ao segundo facto, a criação da “Sorriso – Associação dos Amigos do Ninho dos Pequenitos”, teve como finalidade, bem expressa nos seus estatutos de, para além do natural apoio financeiro e material, a sensibilização sobretudo da sociedade civil para os problemas relacionados com as crianças em risco, organizando periodicamente encontros e jornadas, abordando temas diversos como “Violência e abuso sobre as crianças”, “Criança institucionalizada”, “Projectos de vida para as crianças em risco”, “Feira de projectos”, etc etc. Recentemente, e por imperativo legal esta Associação teve de ser estruturada como uma IPSS – Instituição Particular de Solidariedade Social. As necessárias e obrigatórias modificações dos seus estatutos, mais na forma do que no conteúdo, não alteraram os princípios fundamentais que presidiram à sua criação, embora obrigando a maiores responsabilidades e esforços.

Prefácio

O lançamento deste livro insere‑se, assim, na filosofia desta Associação, já que, dando a conhecer o seu trabalho ao longo dos anos, procura envolver cada vez mais a população em geral, num apoio e esforço que deverá ser cada vez mais partilhado. Com este livro, pretende‑se pois dar a conhecer a história do Ninho dos Pequenitos. Não nos podemos contudo esquecer que dentro dessa já longa história, cabem muitas pequenas histórias de vida das crianças que aqui passaram e passam, histórias diversas, mas muitas delas dramáticas e extremamente dolorosas. Algumas com finais felizes; outras nem tanto… Histórias que talvez merecessem ser contadas… Quem sabe, um dia!.. * Ex‑Director da Maternidade Bissaya‑Barreto, Presidente da Direcção da Associação dos Amigos do Ninho dos Pequenitos

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ABREVIATURAS UTILIZADAS NA OBRA A.A.S. – Arquivo da Associação Sorriso A.H.M.C. – Arquivo Histórico Municipal de Coimbra A.U.C. – Arquivo da Universidade de Coimbra B.G.U.C. – Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra C.H.C. – Centro Hospitalar de Coimbra F.B.B. – Fundação Bissaya‑Barreto I.P.S.S. – Instituição Particular de Solidariedade Social M.B.B. – Maternidade Bissaya‑Barreto O.P.G.D.C. – Obra de Protecção à Grávida e Defesa da Criança U.I.P. – Unidade de Intervenção Precoce

CRÉDITOS FOTOGRÁFICOS Marques da Costa: fotos páginas 21, 31, 86 e 87. Armando Gonsalves: fotos páginas 40 e 41. Graça Araújo: fotos páginas 93 e 94. João Pinho: fotos páginas 101, 102, 103, 104, 109 e 110. Arquivo da Universidade de Coimbra: fotos páginas 48 e 49.

Breve Cronologia

BREVE CRONOLOGIA Data 29 Outubro 1886

Acontecimento

Nasce pelas oito horas da noite, no lugar de Castanheira de Pêra, Concelho de Pedrógão Grande, Fernando Baeta Bissaya Barreto Rosa. 14 Julho 1897 Bissaya‑Barreto realiza exame e é admitido à 2ª classe no Liceu Central de Coimbra. 30 Outubro 1899 Bissaya‑Barreto matricula‑se na Escola Industrial Brotero no primeiro ano de Física e Mecânica Industrial. 1903 Bissaya‑Barreto, então com 17 anos, é admitido na Universidade de Coimbra. 21 Julho 1911 Bissaya‑Barreto conclui o Bacharelato em Medicina com a classificação de Muito Bom, com 19 valores. 25 Novembro 1911 Nomeação de Bissaya‑Barreto como 2º Assistente Provisório da 5ª Classe da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra. 1915 Bissaya‑Barreto apresenta a dissertação O Sol: em Cirurgia, no âmbito das provas de concurso a um lugar de 1º Assistente da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, as quais tiveram lugar entre 14 e 30 de Abril. 7 Agosto 1915 Nomeação definitiva de Bissaya‑Barreto como Assistente da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra. 2 Janeiro 1918 Na qualidade de procurador à Junta Geral do Distrito de Coimbra por Penacova, Bissaya‑Barreto foi eleito Presidente da Mesa da Junta Geral. 14 Agosto 1919 Bissaya-Barreto é eleito Vice‑Presidente da Mesa da Junta Geral do Distrito de Coimbra, sendo Presidente o Prof. Ângelo da Fonseca. 28 Abril 1923 Pelo Decreto Nº 8.785 determina‑se a troca do edifício onde estava o Hospício do Distrito, da Faculdade de Medicina (actual escola secundária Jaime Cortesão), pelo edifício e terrenos anexos onde se encontravam instalados o Instituto Comercial e Industrial de Coimbra (à Praça da República).

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Data 1923‑1926

Acontecimento

Bissaya‑Barreto desempenha o cargo de Presidente da Câmara Municipal de Coimbra. A tomada de posse ocorre na sessão de Câmara do dia 02‑01‑1923. 7 Março 1927 Bissaya‑Barreto é eleito, por aclamação, como Presidente da Comissão Administrativa da Junta Geral do Distrito de Coimbra. Inícios 1931 O Ninho dos Pequenitos, integrando o Centro de Protecção e Defesa da Criança, inicia o seu funcionamento sob a direcção clínica do Prof. Luís Raposo. 21 Junho 1931 Inauguração oficial da Obra de Defesa e Protecção da Criança, incluindo o Ninho dos Pequenitos, no âmbito do programa “Os Dias da Tuberculose”. Dezembro 1931 Entra em funcionamento o Dispensário da Obra de Protecção à Grávida e à Criança na Praça de República em Coimbra. 7 Janeiro 1934 Inauguração da ampliação das instalações do Ninho dos Pequenitos. 2 e 3 Março 1936 Festas Comemorativas da Inauguração do primeiro Parque Infantil da Obra Social: Parque Infantil Dr. Oliveira Salazar (integrado no Ninho dos Pequenitos). Janeiro 1937 Criada a Escola Normal Social na Obra de Protecção à Grávida e Defesa da Criança em Coimbra. 17 Abril 1943 Nomeação de Bissaya‑Barreto como Vogal da Comissão Instaladora do Instituto Maternal. Manteve‑se no cargo até à dissolução da mesma em 08/05/1945. 15 de Maio de 1946 Bissaya‑Barreto é nomeado Director da Delegação do Instituto Maternal de Coimbra em «comissão gratuita». 18 Maio 1946 O Diário do Governo decretava a criação da Delegação do Instituto Maternal em Coimbra, nomeando como seu director o Prof. Bissaya Barreto. 29 Outubro 1956 Jubilação de Bissaya‑Barreto como Professor Catedrático da Universidade de Coimbra. 29 Outubro 1956 Bissaya‑Barreto é agraciado com o grau de Grande Cruz da Ordem da Benemerência.

Breve Cronologia

Data 2 Dezembro 1956

Acontecimento

Homenagem ao Prof. Bissaya Barreto por ocasião da sua jubilação. A homenagem iniciou com uma sessão solene no salão nobre da Câmara Municipal de Coimbra e terminou com um banquete no ginásio do Liceu D. João III em Coimbra. 28 Abril 1963 Inauguração da Delegação do Instituto Maternal na Quinta da Rainha em Coimbra. 3 Março 1964 Pelo Decreto‑Lei nº 45.591 é criado, na dependência do Instituto Maternal, o Centro de Saúde e Assistência Materno‑Infantil do Dr. Bissaya Barreto. 28 Abril 1969 Inauguração das novas instalações do Ninho dos Pequenitos integradas no Complexo do Instituto Maternal. 22 Março 1971 Criação do Centro Hospitalar de Coimbra pelo Decreto‑Lei n.º 93/71. 16 Setembro 1974 Data do falecimento do Prof. Bissaya Barreto, em Lisboa, no Hotel Metrópole (ao Rossio). Maio 1986 Apresentação pública à Fundação Bissaya‑Barreto do projecto da Unidade de Intervenção Precoce. 26 Outubro 1990 Inaugurado pelo Sr. Vice‑Primeiro Ministro, Dr. Fernando Nogueira e pelo Ministro da Saúde, Dr. Arlindo de Carvalho, o novo edifício da Unidade de Intervenção Precoce (UIP) na relação mãe/filho, e do Ninho já renovado. 20 Junho 1991 A Unidade de Intervenção Precoce foi integrada no Centro Hospitalar de Coimbra (Maternidade Bissaya‑Barreto) através da Portaria nº 532/91. 1990 Assinatura de protocolo entre o Centro Hospitalar de Coimbra, a Fundação Bissaya‑Barreto e a Segurança Social para apoio ao Ninho. 16 Novembro 1998 Constituição da SORRISO ‑ ASSOCIAÇÃO DOS AMIGOS DO NINHO DOS PEQUENITOS. Maio 2004 A Fundação Bissaya‑Barreto denunciou unilateralmente os acordos de cooperação celebrados com o Centro Distrital de Segurança Social. 20 Setembro 2004 Celebra‑se protocolo entre o C.H.C. e a SORRISO; esta associação assume‑se como suporte jurídico do Ninho dos Pequenitos

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Símbolo e lema do Ninho dos Pequenitos no tempo de Bissaya Barreto

Introdução

INTRODUÇÃO Deixem que vos conte uma estória num livro de natureza histórica. Era uma vez uma Associação que fazia sorrir as crianças. Por isso foi‑lhe dado o nome de Sorriso. Uma instituição recente, dos nossos tempos, que nascera para que um passado não morresse. Um passado designado por Ninho dos Pequenitos ou, para os mais envolvidos, afectiva ou profissionalmente – simplesmente O Ninho. Uma antiga instituição, feita de muitos espaços e tempos: instalações diversas e nem sempre bem apropriadas, pessoas diferentes na formação e personalidade, quantas vezes esforçadas e empenhadas até à falência das suas forças. Pelo meio o Ninho sofreria alguns apertos pela falta de local apropriado para existir, factor que oprimia o seu crescimento, conduzindo a “peregrinações” provocadas pelo progresso. Até que um dia encontrou poiso fixo – O Instituto Maternal. Apesar das dificuldades, incompreensões e alterações trazidas pelo eterno confronto entre passado, presente e futuro, o Ninho nunca perdeu a função base, a sua razão de ser, o sentido que lhe dava vida e fazia sorrir: acolher recém‑nascidos e crianças, proteger mães, ser a asinha protectora de doenças e flagelos. Uma realidade tornada possível pelo homem que tudo idealizou. Bissaya‑Barreto lutou acerrimamente pela criação do Ninho na Cidade de Coimbra, pólo principal de uma imensa Obra Social por si gizada e estimulada. Mais tarde, pugnaria pela transformação e adaptação do Ninho às funções trazidas pelo progresso ao nível da ciência. Assim e durante décadas, o Ninho cumpriu os seus desígnios, tornando possível que o lema da conhecida luta de Bissaya‑Barreto sobre a Obra de Protecção à Grávida e Defesa da Criança fosse uma realidade: “Façamos felizes as crianças da nossa terra”. Bissaya‑Barreto deixou‑nos em 1974, numa altura em que o país vivia as transformações e convulsões trazidas pela Revolução de Abril. Momento crítico para o Ninho que revitalizaria com a criação da Unidade de Intervenção Precoce no princípio da década de 90. Já no século XXI e quando se previa o fim do Ninho, a instituição reagiu como só as grandes

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instituições o conseguem fazer: honrando a sua história e memória, erguendo e recuperando os valores que a nortearam desde a fundação. Renovando‑se interna e externamente, definindo novos rumos e objectivos. Foi com esta consciência que em Maio do ano 2008 fui abordado pela Dra. Albertina Costa, ilustre dirigente da Associação Sorriso. Um contacto estimulado pela edição no semanário Campeão das Províncias, alguns dias antes, de uma revista por mim redigida e orientada que pretendia dar a conhecer Bissaya‑Barreto. Partindo das breves palavras que ali dirigi acerca do Ninho, inseridas no capítulo mais vasto da Obra Social de Bissaya‑Barreto, desejava a Sorriso que eu escrevesse um livro. Uma obra de marcado cunho histórico, que desse a conhecer ao público o que foi e o que é o Ninho dos Pequenitos. Confesso que facilmente me deixei adoptar pela ideia, acedendo quase de imediato ao convite. Na realidade, sabia de antemão que tal tarefa era possível dada a imensa informação disponível. Aproximadamente dois anos depois temos “o tal” livro, abordando oito décadas da História do Ninho dos Pequenitos. Um considerável período cronológico onde avultam factos vários, muitos nomes, algumas fotografias, documentos, testemunhos pessoais. Como crítico feroz daquilo que faço sou o primeiro a afirmar que, apesar de tanto esforço e empenho, o leitor não encontrará aqui todos os elementos acerca do Ninho, tão‑somente os momentos principais da sua existência. No entanto, ficam abertas algumas janelas, acessíveis aos interessados e curiosos. É isto a ciência histórica! Parte das dificuldades financeiras trazidas por este tipo de trabalho foram facilmente superadas. Tanto eu, na qualidade de autor do texto, como o técnico gráfico/paginador Nuno Beirão assumimos a nossa quota‑parte de responsabilidade no projecto solidário desenvolvido pela Sorriso, abdicando de proveitos ou ganhos. Para ambos a recompensa está em sabermos que do esforço conjunto contribuímos para a melhoria da qualidade de vida das crianças que têm o Ninho como seu lar. A todos quanto tornaram este livro possível a homenagem do seu autor! Com amizade e solidariedade, João Carlos Santos Pinho

A. O Homem e a Obra por detràs do Ninho

A. O Homem e a Obra por detràs do Ninho

1. Bissaya‑Barreto Bissaya Barreto, baptizado à época com o simples nome Fernando, nasceu a 29 de Outubro de 1886, no pequeno lugar de Castanheira, freguesia de Castanheira de Pêra, às 8 horas da noite. Seria o único filho varão de 4 irmãos que nasceram do casamento entre Albino Inácio Rosa e Joaquina da Conceição. O pai, farmacêutico de profissão, era natural do lugar da Rapoula, Freguesia do Avelar, Concelho de Ansião, onde nasceu a 11 de Dezembro de 1853. De fortes convicções republicanas, seria eleito Presidente da Câmara de Pedrógão Grande nos finais do Séc. XIX envolvendo‑se, posteriormente, no processo de autonomia municipal de Castanheira de Pêra, que viria a culminar, em 1914, com a fundação do concelho. A mãe era natural da Freguesia de Castanheira, onde nasceu a 18 de Abril de 1863, sendo filha de Jacinto Baeta das Neves, natural de Castanheira de Pêra, e de Maria Justina da Conceição, da Freguesia do Coentral. Toda a sua vida ocupará um lugar discreto e reservado, cuidando do governo da casa. Do ambiente familiar, Bissaya‑Barreto herdará quer a aproximação à Medicina, quer o sentimento Republicano. O primeiro, absorveu‑o na frequência da Botica gerida por seu pai, em Castanheira de Pêra, mas também pela proximidade ao padrinho Abílio Baeta das Neves Barreto, que foi cirurgião ajudante do Exército. No segundo caso, através da circulação dos ideais republicanos na família, que contagiava, em especial o tio Augusto Barreto. Bissaya‑Barreto foi um aluno excepcional, em todas as etapas da vida escolar. Principiou os estudos na Escola Primária do Avelar, freguesia do Coentral, Concelho de Castanheira de Pêra. Para prosseguir a sua vida académica, muda‑se para Coimbra com apenas oito anitos, ingressando no Colégio S. Pedro. Entre 1897 e 1901 frequenta o Curso Geral, no Liceu Central de Coimbra, com dispensa das provas orais

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e classificação final de Bom1. Mais tarde, em Julho de 1903, concluirá os seus estudos liceais com classificação final de Muito Bom com distinção, obtida no Curso Complementar2. Coimbra atraiu‑o para os estudos e por Coimbra ficará residindo durante 80 dos 87 anos da existência. Nesta cidade, e junto aos Arcos do Jardim, edificará uma moradia ao estilo da época, em terreno comprado em Julho de 1923. Os desenhos e plantas foram da responsabilidade do Gabinete de Arquitectura Fiel Viterbo Lda., de Lisboa, cabendo a sua edificação ao construtor civil António Maia. Depois do brilhante trajecto liceal, Bissaya‑Barreto matricula‑se em 1903 na Universidade de Coimbra. Na prestigiada e secular instituição de ensino superior, o jovem estudante frequentará não só o Curso de Medicina, mas também o de Filosofia e Matemática. Em 1908 obtém o Grau de Bacharel em Filosofia, com a classificação Final de Muito Bom com 18 valores e, a 21 de Julho de 1911, atinge o ponto mais alto dos seus 8 anos de estudos ao mais alto nível com o Bacharelato em Medicina com a classificação final de Muito Bom com 19 valores. O seu percurso genial ficaria assinalado pelos vários prémios que arrecadou dentro da tradição universitária de agraciar os melhores alunos de cada cadeira. De facto, constata‑se que entre 1903 e 1911, o estudante acumula distinções meritórias, sendo distinguido com 24 prémios em 36 cadeiras frequentadas. Sobre o facto de se ter matriculado em três faculdades simultaneamente, disse certo dia ao seu biógrafo: «É muito simples. Estudava medicina para satisfazer as tradições de minha família, a filosofia para me satisfazer a mim próprio, e as matemáticas porque estava persuadido que era a engenharia a carreira que me esperava»3. Uma breve análise à estrutura curricular que frequentou constata‑se que Bissaya‑Barreto teve grandes mestres ao nível formativo; Ângelo da Fonseca, Daniel de Matos, Sidónio Pais, António Augusto Gonçalves, eminentes figuras de quem foi colhendo saberes e experiências. O momento mais especial do seu percurso académico aconteceria a 30 de Junho de 1915. Fernando Baeta Bissaya‑Barreto Rosa via aprovada a sua dissertação de doutoramento com a classificação máxima de 20 valores. A tese, intitulada O Sol em cirurgia, provocou

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grande curiosidade e interesse cientifico, na medida em que explorava as vantagens benéficas do Sol no tratamento de diversas doenças. Certamente por influência dos tios maternos, Augusto e Abílio Barreto, Bissaya Barreto cedo aderiu aos ideais republicanos, estando amplamente documentado o seu envolvimento na Greve Académica de 1907 onde foi um dos Intransigentes. Porém, a mais conhecida e audaz posição republicana que assumiu, data de 20 de Novembro de 1908. Neste ano e seguindo a tradição, o Rei D. Manuel II, na qualidade de Protector da Universidade deslocou‑se a Coimbra para entregar os prémios aos alunos laureados, entre os quais se encontrava Bissaya‑Barreto, aluno laureado pelas Faculdades de Filosofia, Matemática e Medicina. Nesse dia e segundo o velho costume, assim que o Secretário da Universidade proclamasse o nome do premiado este deveria deixar o seu lugar e avançar para receber o merecido reconhecimento. Contudo, Bissaya‑Barreto quebrará naquele instante 6 séculos de tradição académica, não respondendo às sucessivas chamadas perante o espanto da sala repleta de gente: «Procuraram‑no dezenas de olhos. Dar‑se‑ia o caso de não estar presente? Mas estava: exactamente por detrás do Governador Civil, num banco, ao lado da filha desta autoridade…Então não tinha ouvido, com certeza! E voltado para êle, o Governador Civil esforçava‑se por lhe fazer compreender, por gestos, que se devia levantar e ir até junto do estrado onde S. Magestade – o Rei D. Manuel II – o esperava, com o diploma na mão, num silêncio que se ia tornando cada vez mais embaraçoso e intolerável (…) A filha do Governador Civil a quem o pai fazia sinais desesperados, suplica em voz baixa e nervosa: ‑ Então, Fernando, levante‑se! Peço‑lhe em nome da nossa amizade, em nome do seu futuro (…) Mas o Fernando imóvel como uma estátua, o olhar vazio, apenas lhe responde, quási num murmúrio: ‑ Não conheço o Rei»4. Em obediência ao ritual universitário mais quatro vezes o nome de Bissaya‑Barreto será repetido, mas em nenhuma das ocasiões o comportamento rebelde será alterado.

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Bissaya‑Barreto dedicou‑se a operar ao nível da grande cirurgia, área onde executou as mais variadas, simples ou complexas, operações. Os números da sua actividade enquanto cirurgião calculam‑se entre 2500 e 3000 intervenções anuais, ou seja; rondando as 8 por dia, o que não deixa de ser facto extraordinário. Tal como a sua Obra Social, também a actividade profissional se desenhou no quadro regional, abarcando aquilo que designamos por Região Centro. De facto foi imenso o trilho que percorreu, de Norte para Sul e de Oeste para Leste. A sua presença regular, detecta‑se nos seguintes estabelecimentos de cariz hospitalar: ‑ Em Coimbra: Sanatório Quinta dos Vales, Hospitais da Universidade, Instituto Maternal, Sobral Cid. ‑ No Distrito de Coimbra: hospitais da Figueira da Foz, da Tocha e da Lousã. ‑ No Distrito de Aveiro: Mealhada, Anadia, Ílhavo, Salreu e Espinho. ‑ Na Beira Alta e Beira Interior: tendo a serra como epicentro ei‑lo pelas salas de operações de Santa Comba Dão, Mangualde, Viseu, Caramulo, Seia, Guarda e Covilhã. Viajando de noite para operar de dia, confiando no comboio ou no seu motorista, as solicitações davam muitas vezes em canseiras. A sua acção benéfica e tenaz resultou em pequenas homenagens feitas pelos responsáveis desses estabelecimentos. Melo de Campos, em 1953, publicará no Diário de Coimbra um artigo dedicado aos médicos Bissaya‑Barreto e Alberto Diniz da Fonseca. Indignado com o facto da cidade não lhe ter prestado até então qualquer homenagem, o jornalista traçará um dos mais vivos e bem conseguidos retratos do médico, então na plenitude das suas capacidades: «O primeiro tem realizado no Hospital da Misericórdia da Guarda, uma obra tão grande que traduzida em vil metal atingiria cifras incalculáveis. Para ali caminha todas as quinzenas, ferramenta debaixo do braço, braço firme e generoso, realizando centenas de operações, salvando centenas de infelizes, minorando o mal eu sei lá a quantos, e nada recebendo, ou recebendo apenas o magro estipêndio que a Santa Casa arbitra.

A. O Homem e a Obra por detràs do Ninho

BISSAYA-BARRETO Fo t o M e m ó r i a

Em cima, da esquerda para a direita, Bissaya-Barreto enquanto estudante universitário, quando contava 40 anos e no seu consultório.

Bissaya-Barreto com os médicos dos HUC que lhe prestaram homenagem por ocasião da sua jubilação em 1956.

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Em que condições vem o Doutor Bissaya à Guarda, operar no Hospital da Santa Casa? Que responda a Mesa, que respondam os doentes, que respondam aqueles que o vêem chegar no comboio da noite e sabem que leva horas e horas a operar e, repousa curtas horas num catre do Hospital, quantas vezes em condições menos que modestas. Este homem tem feito uma obra de apostolado médico sem igual, uma obra de bem‑fazer incomparável, com o maior desinteresse, com a mais generosa abnegação»5. A rematar o artigo, já toldado pela emoção o articulista levanta a questão tão inevitável quanto justa: «E, independentemente, do louvor que as estâncias governamentais venham a prestar (…) justo é que o Hospital dê a um dos seus pavilhões ou pelo menos à sua sala de operações o nome do Doutor Bissaya Barreto, que a Câmara lhe ofereça a medalha de ouro da cidade e que a população da cidade saúde e vitorie o seu nome numa sessão pública na qual há‑de comparecer a legião de doentes operados, observados e medicados pelo ilustre professor»6. Para lá desta geografia central, detecta‑se também a sua presença em Vila Real, Pedrógão Grande, Figueiró dos Vinhos, Alcobaça e Almeirim. A relação que estabelecia com os doentes é bem conhecida. Consciente da época difícil em que se vivia, foram muitas as situações em que prescindia dos seus honorários, nas consultas e nas operações, como forma de atenuar os sacrifícios do povo. Bissaya‑Barreto acumularia, de forma natural, a sua actividade de médico‑cirurgião com a de professor universitário. As primeiras experiências de ensino ocorreram no Colégio S. Pedro, em Coimbra. Embora fosse ainda aluno do terceiro ano de Medicina, ali deu aulas de ciências físicas e biológicas. Ao nível universitário o seu percurso começa com aulas de substituição relativas ao 5º ano, em 1908, de que era titular o médico Nogueira Lobo. Alguns anos depois, em Novembro de 1911 será nomeado Assistente Provisório da 5ª Classe da Faculdade de Medicina, tomando posse a 16 de Dezembro e mantendo‑se no seu desempenho até Janeiro de 1912. Neste mês será nomeado 1º

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Assistente Provisório da 7ª Classe ali se mantendo até 1916, para ser nomeado Professor Extraordinário, em Fevereiro de 1916 onde se manteve até à nomeação como Professor Ordinário em Julho de 1918. Primeiros passos de um longo percurso de ensino e formação, onde terá como colegas os antigos mestres Daniel de Matos e Ângelo da Fonseca. Ao nível universitário desempenhará também relevantes funções de direcção e gestão de serviços. Quando contava 15 anos de casa, a 10 de Novembro de 1926, seria nomeado Director do Serviço Clínico de Patologia e Terapêutica Cirúrgica. Posteriormente desempenhará as funções de Director Interino dos Serviços Clínicos de Técnica Operatória e Terapêutica Cirúrgica (1927‑1930); Director de Clínica dos Hospitais da Universidade de Coimbra (1936), Director de Clínica da Medicina Operatória dos HUC (1941). Foi ainda Membro do Conselho da Faculdade de Medicina. Do envolvimento em todo o processo que levou à implantação da República, Bissaya‑Barreto seria eleito, pelo círculo eleitoral da Figueira da Foz, deputado à Assembleia Nacional Constituinte, onde se manteve até 1914. O objectivo fundamental dos trabalhos foi o da preparação da constituição. A participação do deputado Barreto regista‑se em temas muito relevantes: desde a sua posição anti‑extinção da Universidade de Coimbra, passando por matérias que lhe eram muito queridas como a assistência pública. Foi autor do projecto de lei que autorizava o Governo a criar nos hospitais escolares de Coimbra, Porto e Lisboa, clínicas de doenças de boca e dentes, com o fim de ministrar aos estudantes finalistas instrução prática e teórica daquelas especialidades. Em termos políticos foi procurador por Penacova à Junta Geral do Distrito de Coimbra, eleito para o triénio 1918-1920. Entre 1923 e 1926, Bissaya‑Barreto presidiria aos destinos da Câmara Municipal de Coimbra, corolário do triunfo nas eleições autárquicas de 1922. Apesar da experiência autárquica manteve-se na Junta Geral onde foi vice-presidente entre 1919 e 1922. Posteriormente, em Março de 1927, como adiante se verá, foi eleito presidente da Junta Geral do Distrito, cargo que desempenharia até 1974 mesmo depois das mudanças na desigação do órgão.

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Entre 1961 e 1969 Bissaya‑Barreto volta a assumir um cargo político de âmbito nacional. Contava então 75 anos e o desafio levava‑o a Procurador à Câmara Corporativa. No seio da Câmara Corporativa integrará a Secção I (Interesses de Ordem Moral e Espiritual), primeiro passo da sua característica fundamental enquanto procurador – o labor no campo da assistência. Assim, subscreverá os seguintes pareceres: ‑ Ano de 1962: Escola Nacional de Saúde Pública e Valorização do Património Imobiliário das Misericórdias. Neste ano será também Relator da Lei sobre Saúde Mental; ‑ Ano 1963: Lei sobre a Propriedade de Farmácia e Lei sobre a Colheita de Órgãos e Tecidos em cadáveres. Neste ano subscreverá ainda o parecer sobre a Saúde (Capitulo IX), do projecto do Plano Intercalar de Fomento (1965‑1967). ‑ Na IX Legislatura (1965‑1969), subscreverá 3 pareceres de diferentes matérias: sobre a desafectação dos anexos das concessões mineiras e das águas minerais; colheita de produtos biológicos humanos para liofilização e parecer sobre a Saúde (Capitulo XII) do projecto do III Plano de Fomento para 1968‑1973. Do seu envolvimento no campo legislativo merece especial destaque a actividade de relator da Lei sobre Saúde Mental, onde acusa um notável sentido de modernidade. Bissaya‑Barreto foi um homem de múltiplos interesses e actividades; foi um gestor empresarial de grande capacidade, Provedor da Santa Casa da Misericórdia de Coimbra (1963‑1974) um regionalista convicto que se revela em toda a polémica questão da criação de um aeródromo em Coimbra, 2. A Obra Social A vida de Bissaya‑Barreto foi, no essencial, lutar por aquilo em que acreditava. Convicções, princípios e orientações que lhe foram ditados pela realidade do país de então; débil estruturalmente, sem rumo no campo da assistência pública, de inferior capacidade de resposta a doenças que dizimavam vidas, como a tuberculose ou a lepra.

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Cedo Bissaya‑Barreto percebeu, certamente devido à crença no progresso e no conhecimento, que a melhoria de vida das populações e diminuição da mortalidade, passava sobretudo por uma revolução no campo da assistência médico‑social e no combate aos grandes flagelos da época: Protecção à Grávida e à Criança, Luta Antituberculosa, Anti‑Lepra, Assistência Psiquiátrica, Assistência Hospitalar, Anti‑sezonática, Antivenérea. Apenas lhe faltou tempo, porque a morte o não permitiu, para empreender medidas de fundo na luta contra o Cancro. Os primeiros tempos de contacto com a realidade social do país terão sido decisivos: «A verdade é que, durante estes anos em que esteve debruçado sôbre a grande miséria humana, e em que estabeleceu contacto com as classes pobres do País – êsse humilde proletariado português que sofre por cem chagas abertas – o seu coração apertou‑se, comoveu‑se a sua consciência e exaltou‑se aquele seu instinto de dedicação pela colectividade nacional (…) ei‑lo a bradar: Non ignara malis, miseris suc‑ curere disco, ‑ porque conheço a desgraça, sei socorrer os desgraçados. É assim que a obra começa»7. Sobre Bissaya‑Barreto e como Vicente Souto nos recorda na abertura deste livro «…não devem restar dúvidas de que foi o primeiro a passar das preocupações às iniciativas no terreno, tais como a protecção de crianças mais desfavorecidas, aos idosos e na área da saúde, ao combate às doenças que, na altura, abrangia grandes manchas da nossa população». Obra que será o programa de uma vida de dedicação e que mereceu ao longo dos tempos diversas designações: Obra Social, Obra Médico‑Social, Obra do Professor Bissaya‑Barreto, ou simplesmente Obra. Acepções que, na realidade traduzem o processo multifacetado de luta contra as chagas do seu povo, que enfrentou de modo corajoso e decidido: a Tuberculose, a Lepra, a Sífilis, o Paludismo, a falta de Assistência à Mãe e à Criança, a carência de Assistência Psiquiátrica, a deficiente Assistência Hospitalar. A Região Centro de Portugal será o campo de eleição da sua actuação, geografia ditada pela área de influência da Junta Geral do Distrito, depois Junta de Província da Beira Litoral, órgão do qual foi Presidente durante décadas, base administrativa e política da qual irradiou quase toda a actuação ao nível assistencial.

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De facto, a 07 de Março de 1927, Bissaya Barreto fora eleito como Presidente da Comissão Administrativa da Junta Geral do Distrito de Coimbra, lançando‑se na materialização do seu sonho. Como as Juntas Gerais tinham competências alargadas no campo da realização de obras de natureza assistencial o professor «… assumiu as responsabilidades políticas de criar e implantar um conjunto vasto de equipamentos no campo da assistência»8. Importa reter com atenção que para o sucesso do seu programa foi fundamental a permanência no desempenho das funções de Presidente da Junta Geral do Distrito (depois Junta de Província da Beira Litoral) durante aproximadamente meio século. Com o fortíssimo apoio das estruturas políticas do Estado Novo e de Salazar em especial, Bissaya Barreto reunirá um conjunto de recursos inigualável na época, financeiros e humanos, que lhe permitiu criar núcleos de combate aos flagelos sociais da época. A toda essa rede assistencial designamos hoje por Obra Social de Bissaya‑Barreto. Entre 1928 e 1931 estrutura‑se o núcleo primitivo da Obra Assistencial, ou seja; as bases da Obra Antituberculosa e a Obra de Protecção à Grávida e Defesa da Criança. Eixos fundamentais de uma actuação em muito ditada pela frieza dos números: «…em 1931, e no caso da tuberculose, as estatísticas apontavam para a existência de mais de 150 mil tuberculosos, dos quais cerca de 90 mil espalhavam a doença e a morte. Quanto à taxa de mortalidade infantil (…) os primeiros 4 anos de vida, em Portugal, representavam cerca de 45% do número de óbitos no decurso de um ano»9. Através da prática da Medicina Social Bissaya Barreto perseguiu 3 grandes objectivos: educar o povo dentro dos princípios e leis da Higiene; promover a acção da mulher nas organizações de Medicina Preventiva, como os Dispensários ou Hospitais; e alertar os médicos para os grandes problemas da Medicina Social, fazendo‑os pensar socialmente o doente, em função do meio em que vive. Na sua obra e, em especial, na Obra de Protecção à Grávida e Defesa da Criança, nota‑se a influência da escola e do serviço social francês, tanto ao nível da organização como funcionamento. E um nome avulta acima dos outros – Constance Davon, formada pela

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Escola de Puericultura da Faculdade de Medicina de Paris, pertencente à Congregação das Franciscanas Missionárias de Maria. A fama da Obra que empreendeu estendeu‑se a todo o território nacional. Salazar, sabedor das suas qualidades, por diversas ocasiões o desafiou para Ministro, cargo que nunca aceitou, pensamos nós, porque para ele a Obra Social tudo representava. O esforço para erguer a Obra Social foi colossal, tornando a Região Centro um caso especial dentro do país e recolhendo grande admiração e simpatia a nível internacional. Com Bissaya‑Barreto nada será como dantes… A criação da Escola Profissional de Semide foi o primeiro passo, a primeira medida de Bissaya Barreto no âmbito da sua Obra. Destinava‑se a rapazes em situação de risco. Alienado o velho Convento de Semide em favor da Junta Geral em 1927 partiu‑se rapidamente para as obras de adaptação do imóvel. A 7 de Novembro de 1929, pela tardinha, deram entrada os menores indicados pelos Presidentes das Câmaras. Sem pompa nem circunstância abria as suas portas o primeiro estabelecimento da Obra Social de Bissaya‑Barreto. Muitos ainda se recordam do jornal A Saúde que tinha como subtítulo «Vale mais prevenir que remediar». A ideia, a concepção e organização do periódico pertencem por inteiro a Bissaya‑Barreto que o classificou como «o grande instrumento de que a Junta lançou mão para preparar o terreno onde germinou a grande Obra Assistencial que Coimbra hoje possui»10. Como o objectivo principal era chegar a todas as classes sociais da forma mais eficaz o jornal era distribuído gratuitamente. Utilizava uma linguagem pensada para o povo, abordando de forma simples mas séria assuntos que giravam em torno das principais doenças sociais. Ao fim do primeiro ano de publicação (1931) contabilizavam‑se 24 números correspondentes a uma tiragem de meio milhão de exemplares. Como as temáticas ligadas à Saúde Infantil e à Mortalidade Infantil começaram a assumir grande destaque no contexto editorial, o jornal passou a incluir, a partir do 2º ano de publicação, um suplemento especial dedicado às crianças que carinhosamente se apelidava A Saudinha.

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Há quem diga que os números, apresentados de forma fria, matemática ou racional, pouco dizem. Não será o caso dos números que dão expressão à Obra Social do Professor Bissaya‑Barreto: 24 Casas da Criança, 4 Casas de Educação e Trabalho, 4 Maternidades, o Portugal dos Pequenitos, 1 Escola Profissional, 3 Colónias de Férias, 1 Preventório, 4 Hospitais, 3 Sanatórios, 1 Escola Superior, um Complexo Materno‑Infantil, 1 Centro Hospitalar, vários dispensários, 2 Institutos, 1 Centro de Neurocirurgia, 1 Fundação... Com algum acerto se poderá dizer que o professor e médico‑cirurgião gozava da estima e amizade pessoal dos governantes do Estado Novo e, em especial, de Salazar. Também é verdade que muitas vezes bastara ir a Lisboa falar com os homens certos, que detinham o poder de decisão, para naquele instante se desbloquear o que parecia inamovível. Sim, também é verdade que para Coimbra e Região Centro se canalizaram recursos financeiros de grande envergadura para a época. Tudo isto é verdade, como também o é a utilização exclusiva destes recursos para o bem público. Analisada a obra em termos qualitativos e quantitativos, colocando no outro prato da balança os números que apresentamos alguém ficará com dúvidas acerca da importância e mérito de Bissaya‑Barreto no contexto da Assistência Médico Social do país? Obviamente que Coimbra e sua Região foram os grandes beneficiados da sua actuação: «…semelhante poder de iniciativa e de realização no campo assistencial, colocaram a cidade e a região de Coimbra numa situação de destaque no plano nacional, na luta contra a mortalidade infantil e na prestação da assistência pública»11. O momento chave ‑ já o dissemos ‑ foi a eleição de Bissaya‑Barreto como Presidente da Junta Geral do Distrito em Março de 1927, dando‑lhe os poderes necessários para iniciar uma luta sem quartel pelos mais desfavorecidos. Estruturado o núcleo central da Obra Social entre 1928‑1931, com o lançamento da Obra de Protecção à Grávida e Defesa da Criança e Luta Anti‑Tuberculosa, o seu campo de actuação foi‑se alargando atacando no âmago e com sucesso, em alguns casos pela primeira vez na História da Medicina, graves males sociais do país. Para Bissaya‑Barreto a chave do sucesso fora

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a disciplina e coerência da Junta do Distrito, organismo que dirigira durante décadas: «…pensou sempre em utilizar as Obras Sociais, que ia criando, em Assistir e Ensinar. Orientação esta, se recuarmos 30 anos, bastante nova, e diremos mesmo original…»12. Olhando em retrospectiva tudo porque pugnou, verificamos que afinal foram várias as lutas que deram forma à sua Obra. Infelizmente não teve tempo de lançar as bases daquela que se afigurava como a sua próxima grande luta; o Cancro, doença que alastrava pelo mundo a olhos vistos e que começava a ser motivo de séria apreensão. Tentou criar em Coimbra um Centro Regional, a integrar no Instituto de Oncologia, que não avançou devido ao desinteresse da Faculdade de Medicina. Muitas decisões tomadas no âmbito da sua Obra Social seguiram o modelo francês, resultado das viagens de estudo que realizou pela Europa. Uma marca muito própria que deixou nos diversos estabelecimentos foi o gosto e sensibilidade estética, sendo de realçar a policromia: «Vejo pois o culto da cor, a cor como expressão da beleza…E então cada quarto, cada dormitório ficou com a sua cor…»13. Para Bissaya Barreto «…os hospitais são hotéis em que os hóspedes são doentes». Por isso os diversos estabelecimentos facilmente se destacavam pela beleza e nobreza dos materiais que empregavam; o mármore nos revestimentos e pavimentos, os quadros a óleo nas paredes, bibelôs, esculturas, e motivos diversos de decoração. Na qualidade de Presidente da Junta de Província da Beira Litoral as suas iniciativas e intervenções não se circunscreveram à questão assistencial. Um bom exemplo é‑nos dado pelo envolvimento na questão da criação do Campo de Aviação. A partir de meados da década de trinta do século passado, Bissaya‑Barreto interessa‑se particularmente em dotar Coimbra e região de um Campo de Aviação digno e eficiente. Além de justa, a aspiração reflectia um sentido de modernidade: a aeronáutica desenvolvia‑se rapidamente a nível internacional e nacional, tornando‑se pilar na defesa nacional, no comércio e turismo. Por intermédio dos esforços desenvolvidos pela Junta de Província chega‑se a consenso para o local onde a infra‑estrutura deveria surgir;

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a «achada de S. Domingos», na freguesia de Antanhol, às portas da Cidade de Coimbra. O ano de 1940 será fulcral para o sucesso do projecto; a 10 de Março aterra, a título experimental, o Tiger Nº 146 da Força Aérea, tripulado pelo Major Humberto Pais e, em Abril, inicia‑se a exploração da Escola de Aviação Civil Bissaya‑Barreto. Por fim, e em clima de festa, inaugura‑se a 15 de Julho o Campo de Aviação, dando‑se por finda a 1ª fase da sua história. A 2º fase compreendeu a ampliação da pista para 1.000 metros, cabendo o esboço do projecto aos Srs. Drs. José Pimenta e Viriato Namora. Esta etapa foi muito complexa de resolver, até porque foi necessário contornar a conhecida questão do Acampamento Romano. Por fim, e em 1968, materializou‑se a 3ª fase com o tão desejado alcatroamento da pista. A 18 de Dezembro de 1988, o Aeródromo, com o nome Bis‑ saya‑Barreto, foi inaugurado oficialmente, ficando a assinalar a efeméride o busto do homem que tanto pugnou pela aviação regional. A sociedade não ficou indiferente ao poder de realização de Bissaya‑Barreto no campo assistencial. A partir da década de vinte, e nas mais diversas cidades e instituições, encontramos manifestações de apreço pelo professor e médico, concretizadas em votos de louvor, concessões honoríficas e beneméritas e homenagens diversas de expressão local. Não podendo neste espaço dedicar atenção a cada uma delas, parece‑nos justo destacar duas cerimónias de grande dimensão: ‑ A Homenagem da Cidade e da Região por ocasião da Jubilação de Bissaya‑Barreto como professor universitário. A 29 de Outubro de 1956 o professor, por limite de idade, deixou de poder exercer as suas funções universitárias. Correu célere a notícia do Jubileu como Professor Catedrático da Universidade de Coimbra levando a uma sucessão de homenagens pelo país e, em especial, pela Região Centro. Em Coimbra esse dia seria de romaria, ao ser conhecida a notícia de que o professor chegaria à cidade no comboio “Foguete”: «…foi o suficiente para que à Estação Velha se deslocassem muitas centenas de pessoas, que utilizaram grande número de automóveis, com o fim de tributarem ao Homem que ontem deixou a vida do Professorado Universitário, uma quente manifestação de simpatia,

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AS COLÓNIAS DE FÉRIAS (anos 60) Fo t o M e m ó r i a

À esquerda, a chamada das crianças no anfiteatro e à direita as crianças no refeitório (Figueira da Foz).

Pormenor das crianças agrupadas no anfiteatro (Figueira da Foz).

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respeito e estima (…) dezenas de pessoas acercaram‑se da respectiva carruagem, tomando nos braços o ilustre professor que, não escondendo a surpresa e a sua emoção, começou a receber os cumprimentos de todos quantos ali se encontravam, por entre salvas de palmas e aclamações vibrantes»14. Mas a grandiosa homenagem da cidade de Coimbra estava guardada para o dia 02 de Dezembro, numa iniciativa do Conselho Provincial da Beira Litoral. Durante a tarde Bissaya‑Barreto foi recebido com pompa e circunstância nos Paços do Concelho pelo então Presidente da Câmara Municipal, Brigadeiro Correia Cardoso. Um momento de grande comoção foi a realização de um desfile dos seus antigos doentes no átrio «…grandiosa manifestação de alto significado, e que deu ensejo a cenas verdadeiramente emocionantes»15. Seguiu‑se a sessão solene no Salão Nobre, presidida pelo Ministro do Interior, Dr. Trigo de Negreiros, onde marcaram presenças as mais significativas individualidades: todos os presidentes das Câmaras Municipais do Distrito e da Província da Beira Litoral, Governadores Civis representantes dos diversos organismos do Estado, etc. Para a noite guardou‑se o acto final da efeméride, a realização de um banquete de homenagem no Ginásio do Liceu D. João III, presidindo à mesa de honra o Presidente da Assembleia Nacional, Conselheiro Albino dos Reis. Bissaya‑Barreto, perante tantas manifestações de apreço afirmará: «È na verdade agradável ver ao fim de tantos anos, tantas pessoas que me prendem à vida, que me deram vida e a quem eu dei vida»16. ‑ Homenagem Nacional ao Prof. Bissaya‑Barreto. Realizou‑se 23 anos depois da morte da ilustre personalidade, a 11 de Outubro de 1997. A ideia da homenagem partiu do Dr. Manuel Machado, à época presidente da Câmara Municipal de Coimbra. Na cerimónia usaram da palavra o Dr. Almeida Santos, que proferiu a Oração de Sapiência sobre o homenageado, o Dr. Manuel Machado, Eng.º Nuno Viegas Nascimento e Prof. Dr. Rui Alarcão e Silva, Reitor da Universidade de Coimbra. Recordemos as palavras do Presidente da Fundação Bissaya‑Barreto, Eng.º Nuno Viegas Nascimento: «Esta Homenagem Nacional ao seu Patrono, congregando a presença das mais ilustres e destacadas figuras nacionais que, assim,

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se quiseram associar aos mais lídimos representantes de Coimbra e seu termo, é o testemunho inequívoco de que o Professor Doutor Bissaya‑Barreto legou ao País a Obra Social ímpar que prestigia Portugal, constituindo um significativo e relevante valor acrescentado para as terras que tiveram a felicidade de ser escolhidas pelo Mestre para nelas implantar uma nova Instituição». Bissaya‑Barreto recebeu, de forma justa e oportuna, condecorações pelo trabalho desenvolvido. As mais significativas foram: ‑ Medalha de Serviços Distintos, conferida pelo Governo da República a 21 de Outubro de 1919. ‑ Grã‑Cruz da Ordem de Benemerência, grau conferido pelo Presidente da República a 23 de Outubro de 1956 e entregue em Coimbra em cerimónia realizada no dia 02 de Dezembro do mesmo ano. ‑ Medalha de Mérito Relevante, concedida pela Câmara Municipal de Coimbra, a 15 de Novembro de 1956, por ocasião do Jubileu como professor «…atendendo ás suas excepcionais qualidades e notáveis serviços prestados à Comunidade»17. ‑ Grã‑Cruz da Ordem Militar de Cristo: Concedida pelo Presidente da República, (Grão Mestre das Ordens Portuguesas), a 27 de Abril de 1963. ‑ Medalha de Serviços Distintos (Ouro): Diploma concedido pelo Ministro da Saúde e Assistência, a 8 de Dezembro de 1967. Tanto as homenagens a que fizemos referência como as distinções que têm procurado, ao longo dos tempos, dignificar Bissaya‑Barreto e a sua Obra apenas suavizam o nosso pensamento. De facto, para tão vasto campo de actuação e realização assistencial, com um legado riquíssimo qualitativa e quantitativamente, a grande Homenagem Nacional a Bissaya Barreto está por realizar; uma homenagem abrangente, transversal a toda a sociedade e multissectorial. À imagem do Homem e da Obra! Passaram 34 anos sobre a morte de Bissaya‑Barreto, que nos deixou a 16 de Setembro de 1974. O país vivia, na altura, profundas transformações político‑sociais de grandes consequências para os estabelecimentos que criou. Alguns mantiveram‑se, outros adaptaram‑se a novas funções. Pese embora tudo o que aconteceu no pós‑25 de Abril, o grande legado de Bissaya‑Barreto ao mundo foi a sua Obra Social, feita de

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dezenas de estabelecimentos adaptados a um combate permanente à doença e à dor; relembremos, a titulo de exemplo os preventórios, os sanatórios ou os hospitais que criou. Em alguns edifícios encontraremos ainda, apesar das inevitáveis alterações, a «marca» de Bissaya Barreto; Hospital da Colónia Portuguesa do Brasil, Maternidade Bissaya‑Barreto ou Hospital Pediátrico. Mas a criança norteou sempre o seu pensamento, pois é aí que a vida começa. Ainda hoje podemos observar a beleza e funcionalidade das Casas da Criança ou a obra mais emblemática de todas – quem não conhece o Portugal dos Pequenitos? Parque miniatural ludo‑temático ao ar livre, onde a criança brinca e aprende e o adulto contempla, verdadeira lição de história de Portugal, monumental e regional, onde sabiamente o professor conjugou as diversas disciplinas artísticas; a arquitectura, a escultura, a azulejaria, os ajardinamentos… Bissaya‑Barreto sentia uma profunda admiração pela História. A dada altura e perante uma obra que granjeava fama e adeptos pelo mundo fora compreendeu que iria ocupar um lugar de destaque na galeria dos homens ilustres. Sucesso que no entanto, inevitavelmente, suscitava também invejas e ódios. Por estes motivos, e para que outros não viessem a desvirtuar o sentido da história (neste caso a história da sua obra social), deixou escrito pelo seu próprio punho como as coisas se passaram; a alegria pelos sucessos alcançados, a tristeza quando algo corria mal. Falamos dos 7 volumes que escreveu sob o título Subsídios para a História (1946‑1964), de cunho marcadamente memorialista, e dos 3 volumes da série Uma Obra Social (1970‑1971), de conteúdo mais técnico‑científico. Lê‑los é conhecer Bissaya‑Barreto, é apaixonar‑se pela grandeza do Homem e da Obra. Não poderemos também esquecer os exemplos e as atitudes de Bissaya‑Barreto que encontraram eco na imensa massa de colaboradores, fosse do homem ou da obra, das mais variadas origens e formações académicas, que durante décadas foram a base de funcionamento de cada estabelecimento. Alguns já não estão entre nós, mas uma característica intemporal os une; a dedicação ao homem e à obra. A 26 de Novembro de 1958 o despacho ministerial publicado no Diário do Governo Nº 277, IIIª Série, reconhecia, oficialmente, a Fundação Bissaya‑Barreto. O professor desejava ardentemente a sua

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criação da qual esperava a garantia de expansão e continuidade da sua extensa Obra. Pertencendo‑lhe a iniciativa do projecto contou com a preciosa ajuda de um grupo de amigos e admiradores que foram os signatários dos estatutos originais: D. Ernesto Sena de Oliveira, Dr. Lino Augusto Cardoso Pinto de Oliveira, Coronel Ernesto Nogueira Pestana, Conselheiro Dr. José Perestrelo Botelheiro, Dr. Joaquim Moura Relvas, Dr. José dos Santos Bessa e Engº José Horácio Moura. Expressão de uma vontade organizada ao serviço da justiça social, a vocação da instituição ficou desde logo enunciada no art.º 1º dos estatutos: « (…) os signatários constituem, na cidade de Coimbra, uma instituição particular de utilidade pública e fins de assistência, destinada a continuar a obra criada e mantida durante mais de meio século pelo Prof. Doutor Bissaya‑Barreto, quer como cidadão quer como orientador de organismos assistenciais». Bissaya‑Barreto dirigiu a fundação com o seu nome durante 16 anos, incluindo no 1º Conselho de Administração 3 fundadores; Dr. Lino Cardoso, Dr. José dos Santos Bessa e Eng.º Horácio de Moura. Primeira administração cuja actuação mostraria o caminho a seguir: «Desde cedo esta primeira Administração demonstrou uma grande sensibilidade empresarial na gestão dos bens adstritos à Fundação e um forte compromisso com as causas sociais, com destaque para as questões da Educação e Saúde das idades infanto juvenis, traduzidas no lema, tão bem enquadrado no estilo dos anos 50 e rapidamente tornado célebre: Façamos felizes as crianças da nossa terra»18. Bissaya‑Barreto instituirá a fundação, por disposição testamentária, como sua herdeira universal. Em 1959, por Portaria do Ministério do Interior inserta no Diário do Governo Nº 298, IIª Série, de 23 de Dezembro de 1959, a Junta de Província foi autorizada a ceder à Fundação Bissaya‑Barreto, a título gratuito os seguintes estabelecimentos de Assistência: Portugal dos Pequenitos, Casa da Criança “Rainha D. Leonor” em Castanheira de Pera, Casa da Criança “D. Maria do Resgate Salazar” no Luso, Casa da Criança “D. Joaquina Barreto Rosa”, de Arganil, Casa da Criança “D. Maria da Natividade Filipe” em Coja, Casa da Criança de Pedrógão Grande, Preventório “Ar Alto” de Macieira de

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Cambra, Colónia Balnear “Dr. Oliveira Salazar” na Gala (Figueira da Foz) e Colónia de Férias “Ar e Sol” de Vila Pouca da Beira”. Em 1963 transitou também para a posse da Fundação Bissaya Barreto o Instituto de Surdos, de Bencanta‑Coimbra. O falecimento de Bissaya‑Barreto ocorreria alguns meses depois da Revolução de Abril de 1974, trazendo conturbação à instituição devido à conjuntura político‑social da época. Na época assumiu a presidência do Conselho de Administração o Arquitecto Naval Luís Viegas do Nascimento, que nesse momento crítico desempenhou papel fundamental na preservação do património e gestão da instituição. Apesar de desaparecido prematuramente sucedeu‑lhe na presidência da instituição seu filho, o Eng.º Nuno Viegas Nascimento, que prosseguiu o desenvolvimento e consolidação da Fundação Bissaya‑Barreto, tomou posse como Presidente da Fundação Bissaya Barreto em 1981 mantendo‑se no desempenho das funções durante 27 anos.

B. O Ninho dos Pequenitos: pilar da Luta Antituberculosa …

B. O Ninho dos Pequenitos: pilar da Luta Antituberculosa e da Obra de Protecção à Grávida e Defesa da Criança (OPGDC) 1. Origens, enquadramento e organização A criação do Ninho dos Pequenitos inseriu‑se simultaneamente em dois eixos ou áreas de actuação de Bissaya‑Barreto: A Obra de Protecção à Grávida e Defesa da Criança e Luta Antituberculosa, preocupações resultantes do contexto social e médico da época. A OPGDC, que era peça chave do Arsenal Anti‑tuberculoso, tinha como divisa a conhecidíssima frase «Façamos felizes as crianças da nossa terra». Por outro lado, a Luta Antituberculosa utilizava o slogan «Pelos Tuberculosos, contra a Tuberculose». Quando em Março de 1927 Bissaya Barreto assume os destinos da Junta Geral do Distrito o panorama na região envolvente a Coimbra era tudo menos animador «…pois a Assistência real à Criança e à Grávida se fazia apenas através de umas pobres e reduzidas obras de caridade e de um paupérrimo Hospício sem função social!»19. Os Hospícios emergiam como os herdeiros directos das antigas Rodas, destinados a receber crianças expostas e abandonadas. O Hospício Distrital de Coimbra, pelo decreto de 22 de Fevereiro de 1911, havia terminado as suas funções enquanto tal, dando lugar à Maternidade com creche e anexa à Faculdade de Medicina, estruturas que funcionavam no Dormitório do Pilar (actual Escola Secundária de Jaime Cortesão). Esta modificação não trouxe grandes alterações no terreno, como se deduz de uma intervenção do procurador da Junta Geral do Distrito, Dr. Octaviano de Sá, em Junho de 1923: «Considerando que apesar dessa extinção tal era a importância do mesmo instituto que, como secção da Maternidade pelo mesmo Decr.º criada, se pode dizer que ele subsistiu nas mesmas condições em que anteriormente funcionava embora a sua administração fosse cometida a órgãos diferentes dos que anteriormente o administravam»20.

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Estas estruturas, que acolhiam os expostos e desvalidos do distrito transitaram, em 1923 e ao abrigo de uma troca para um precário edifício da Praça da República ‑ uma velha casa da Quinta do Mosteiro de Santa Cruz, onde funcionou a Casa das Obras Públicas e a Abegoaria Municipal. A troca de instalações ocorreu na presidência do município pelo próprio Bissaya‑Barreto (1923‑1926). Um facto que ajuda a explicar o muito interesse da municipalidade pelo assunto, motivando a apresentação de uma proposta pelo vereador Dr. Sanches de Morais, a qual mereceu a aprovação da Câmara Municipal na sessão de 15 de Fevereiro de 1923: «…se dirija ao Director da Faculdade de Medicina, no sentido de conseguir que a Faculdade aceite a troca do edifício onde actualmente está instalado o Instituto Industrial e Comercial de Coimbra e terrenos anexos, pelo edifício do Hospício e respectivo parque, porque esta troca vem beneficiar o ensino técnico e permite, com reduzido número de despesas para o Estado, instalar convenientemente aquele importante estabelecimento de ensino»21. Esta transferência ficou regulamentada no Decreto N. º 8785 de 28 de Abril de 1923: «Tendo sido criada a Maternidade anexa à Faculdade de Medicina, para a qual passaram as receitas e encargos do Hospício, funcionando em edifício próprio e independente daquela e em local muito afastado; Havendo no referido edifício simplesmente uma secção hospicial de Maternidade, na qual está instalado um limitadíssimo número de crianças, cerca de uma dezena, servindo a casa quasi exclusivamente para habitação do Oficial de Registo e da Regente; Considerando que o edifício onde funcionam as escolas técnicas pode muito bem servir para a referida secção hospicial da Maternidade (…); Podendo, assim, efectuar‑se a troca dos respectivos edifícios e terrenos anexos, o que faculta simultaneamente à Faculdade de Medicina terreno próximo à cerca do Hospital para nele se construírem edifícios para as diferentes secções; e às escolas técnicas de Coimbra uma conveniente instalação em local situado conforme conveniências da sua população escolar;

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(…) Tendo em atenção os superiores interesses do ensino, as justas aspirações da cidade de Coimbra e a necessidade duma conveniente preparação técnica do povo daquela importante região do País (…) Artigo 1º ‑ é atribuída à Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra a posse do actual edifício e terrenos anexos onde se encontram instaladas a Escola Industrial Brotero e o Instituto Comercial e Industrial de Coimbra para neles se instalar provisoriamente a secção hospicial da Maternidade da referida Faculdade e respectivo pessoal que por lei tenha direito a residência, até à sua conveniente instalação em pavilhões próprios junto da Clínica do Doutor Daniel de Matos § Único – O Governo promoverá uma conveniente instalação destes serviços de assistência, sob proposta da Faculdade de Medicina de Coimbra; Artigo 2.º é atribuída ao Ministério do Comércio e Comunicações a posse de todos os edifícios e terrenos do antigo Hospício do Distrito de Coimbra para nele se instalar a Escola Industrial de Brotero e o Instituto Industrial e Comercial de Coimbra»22. No entanto a transferência de instalações não será pacífica. De facto, alguns procuradores à Junta Geral do Distrito de Coimbra levantaram dúvidas acerca da legalidade da entrega do edifício do Hospício Distrital ao Conselho Escolar do Instituto Comercial. À cabeça da contestação estava o Dr. Octaviano de Sá, que expôs o pensamento de um grupo de membros da Junta do Distrito, em sessão de 11 de Junho de 1923, na qual critica duramente a transferência, tanto a nível legal como funcional. Recordava o procurador que após a extinção das Juntas Gerais em 1892 tal era a importância do Hospício para o Estado que decidira «…nem suprimi‑lo, nem perturbar a forma de Administração em que tinha vivido que a Comissão Distrital continuou como a J. G. extinta a presidir à respectiva administração»23. Desta reflexão Octaviano de Sá partiu para a parte legal da transferência: «…todos os diplomas que posteriormente se tem ocupado do mesmo Hospício o têem feito por forma ofensiva dos direitos da Comissão Distrital e hoje da Junta Geral do Distrito, destacando‑se o decreto n.º 8785, em que o Governo supondo‑se proprietário do

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O NINHO DOS PEQUENITOS Fo t o M e m ó r i a

O Jardim de Infância do Ninho dos Pequenitos na Praça da República. Em cima, pormenores dos espaços e em baixo panorâmica geral.

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O Parque Infantil do Ninho dos Pequenitos na Praça da República. Em cima, sala de refeições e em baixo, sala de trabalhos.

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edifício onde o mesmo Instituto funciona o dá ao Instituto Industrial de Coimbra em troca de outro onde tem estado instalado este estabelecimento (…) tal medida governamental sobre nada a recomendar sob o ponto de vista dos interesses da maternidade e Hospício a cargo da Universidade pelo cit. Decr. de 1911, ainda é digna de reparo por pretender dotar melhores serviços que não demandam condições de higiene iguais àquelas que são necessárias para serviços como os da Maternidade e Hospício de Crianças»24. Esta intervenção finaliza colocando em causa o interesse público da transferência e propondo a resolução da situação nos tribunais, para o que seria necessário escolher um advogado estranho a Coimbra que tentasse «…a reivindicação do Edifício e o restabelecimento dos serviços do Hospício por forma autónoma e independente do Estado». Tratava‑se afinal de uma posição que vinha no seguimento da manifestação da população da cidade e de algumas Câmaras Municipais do Distrito. De modo diferente pensavam outros procuradores, liderados pelo Dr. António de Almeida e Sousa, para quem a Junta Geral nada tinha com o edifício sendo a troca «…apenas o resultado d’um acto praticado entre a Faculdade de Medicina e dois Ministérios». Apesar das discordâncias, o Governo manter‑se‑á firme na sua decisão, nunca duvidando da legalidade do procedimento e indeferindo o pedido para suster a aplicação do citado decreto. Mais: a 11 de Junho de 1923 o Governo informa a Junta Geral do Distrito que já foram aprovadas verbas para aplicação «exclusivamente construção Maternidade»25, designadamente 100 contos pelo Ministério do Comércio e 1.500 contos pelo Ministério do Trabalho. Assim, e durante o Verão de 1923, consumou‑se a transferência do Hospício. Adaptado o edifício a novas funções, cedo se vem a revelar impróprio «…tal a humidade, a falta de sol, de higiene e de tudo que por lá havia»26. De facto, durante os anos 20 foram frequentes as notícias acerca do esbulho praticado naquele edifício, que vivia em difícil situação económica, tornando urgente uma solução eficaz. A Junta Geral do Distrito, a partir de Março de 1927 e já com Bissaya‑Barreto na sua presidência, procurou espaços físicos que pudessem dar corpo à ideia da protecção sanitária e social das mulheres grávidas, das mães e dos filhos na 1ª e 2ª idades. Na verdade podemos dizer

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que a OPGDC «…nasceu com a devolução à Junta Geral (decreto‑lei nº 19.034 de 4 de Novembro de 1930) da Secção Hospicial da Maternidade de Coimbra, que mais não era do que a sucedânea do Hospício Distrital, de honrosa e nobre tradição, retirado à Comissão Distrital pelo já referido decreto de 22 de Fevereiro de 1911, que o pôs sob a alçada da Faculdade de Medicina»27. Tratava‑se de reaver o antigo Asilo das crianças abandonadas, a antiga Roda, que por alturas da implantação da República fora entregue à Faculdade de Medicina para o ensino da Pediatria e Puericultura. Apesar de nunca ter sido utilizada para tal fim a entrega à Junta Geral do Distrito motivou reacção da dita faculdade. Por iniciativa da Junta dá‑se a reconversão da Secção Hospicial ou Hospício do Distrito de Coimbra, ali se instalando, perto da actual Praça da República onde hoje está a sede da AAC, o Centro de Defesa e Protecção da Criança. O desejo do professor foi expresso na reunião do órgão administrativo a que presidia, no dia 28 de Agosto de 1930: «O Senhor Presidente no uso da palavra disse: que, chegou ao seu conhecimento que o Hospício da Maternidade ia ser extinto e antes que tal propósito vá por diante propõe que se oficie ao senhor Director Geral de Assistência Publica, fazendo‑lhe sentir o desejo desta Junta Geral em não ver desaparecer tão útil Instituição que esteve sobre a sua administração directa e que tantos benefícios espalhou por todo o distrito. Que se peça pois ao Senhor Director Geral de Assistência para que longe de o extinguir o faça reverter de novo à posse desta Comissão Administrativa para ali se instalar o “Centro de Defeza e Protecção da Creança”»28. A cedência foi tornada possível pelo decreto 19.034 de 14 de Novembro de 1930 (Diário do Governo n.º 266), tomando a Junta posse do Edifício do Hospício Distrital, por auto de entrega realizado em Lisboa na Direcção Geral de Assistência, no dia 26 do mesmo mês. Em face desta cedência a Junta Geral trabalhou incessantemente: expediu 385 circulares «…pedindo a colaboração do pobre e do rico para a fundação da Obra de Protecção à Grávida e Defesa da Criança. Foram expedidas 800 circulares informando as bases em que era lançada a Obra de Protecção à Grávida e Defesa da Criança, procurando interessar as Câmaras, os Administradores de Concelho, as Juntas de Freguesia e entidades particulares»29.

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O assunto do Hospício Distrital não passaria despercebido à edilidade. Consumada a cedência, a Câmara Municipal aborda o assunto na sessão de 4 de Dezembro de 1930: «Resolveu‑se dar todo o apoio à criação nesta cidade, no antigo Hospício Distrital, dum centro de Protecção e Defesa da Criança, e enviar ao Ministro do Interior e ao Director‑Geral de Assistência, telegramas de agradecimento pela cedência do Hospício à Junta Geral do Distrito»30. No remodelado edifício do Hospício Distrital, Bissaya‑Barreto promoveu a criação de várias estruturas de apoio à criança e combate à doença, no conjunto designado por Centro de Protecção e Defesa da Criança: ‑ O Ninho dos Pequenitos. Esta valência impõe especial atenção na medida em que o conceito subjacente e a acção concreta acusam uma evolução nos primeiros anos de existência. A este propósito dizia‑se, no suplemento A Saudinha, de Fevereiro de 1933: «É que, na realidade, O Ninho dos Pequenitos já não é hoje o simples Ninho que o seu fundador ambicionara no primeiro momento, como refúgio das criancinhas em perigo de contrair a tuberculose; não, ele vai mais longe, visto que tem abertas as suas portas a todas as crianças dos primeiros três anos de vida que correm risco de perder‑se, ora sob o peso do abandono a que os pais as votaram, ora sob a acção das múltiplas causas de miséria social, física ou material, que tanto abundam por aí além, especialmente nos centros populosos. Dest’arte o Ninho dos Pequenitos passou a ocupar um lugar primacial entre as melhores Obras de Assistência Infantil que no país existem, constituindo sem dúvida o «bouquet» de toda a Obra, encantadora e proveitosíssima, que se chama Obra de Protecção à Grávida e Defesa da Criança»31. Era já, como o próprio fundador anunciara, uma valência onde seriam «… aninhadas, todas as crianças fracas, infezadas, pobres de saúde e de robustez, desampa‑ radas da sorte, vitimas amanhã da fome e da miséria se a Sociedade as não agasalhar»32. Por tudo isto Bissaya‑Barreto apelidava o Ninho de «a Casa das Crianças abandonadas e doentes», emergindo como o embrião das futuras Casas da Criança. Abriu nos inícios de 1931 sob a direcção clínica do Prof. Luís Raposo, convidado para o efeito pela Junta Geral do Distrito em Dezembro de 1930. O quadro de pessoal era constituído por: uma regente, vigilantes, cozinheiras, lavadeiras, ajudantes de vigilante e enfermeiras. Não havia tempo a perder…pelas crianças!

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O Ninho dos Pequenitos, criado para internar até aos 3 anos os filhos de tuberculosos pobres, abriu com capacidade para 48 crianças. Tinha uma especial função na profilaxia anti‑tuberculosa. Não sendo a tuberculose hereditária mas existindo uma mãe tuberculosa, o Ninho recebia as crianças expostas ao contágio, predispostas, defendendo‑se o filho do contágio da Mãe, entrando o recém‑nascido no Ninho onde poderia viver dos 0 aos 3 anos, transitando nesta idade para o Preventório onde se mantinha até aos 10 anos seguindo nessa altura para a Escola Profissional de Agricultura de Semide, onde recebia educação e aprendia um oficio para que aos 18 anos estivesse apto a entrar na vida activa33. Destinando‑se este estabelecimento ao internamento, articulava‑se porém com o mecanismo da colocação familiar, como explicava o professor em Setembro de 1932: «A tuberculose não é uma doença hereditária. Mas a tuberculose do adulto, é quási sempre adquirida em criança, no meio infectado em que se é obrigado a viver. A defesa da criança é, portanto, a medida mais segura e eficaz da luta contra essa doença. A profilaxia infantil no distrito de Coimbra, é feita pela “Obra de Gran‑ cher”. Consiste essa organização em afastar as crianças das mães a partir do dia do seu nascimento, retirá‑las a tempo do meio infectado, visto o contágio poder dar‑se ao fim de alguns dias, ou mesmo de algumas horas. Essas crianças colocam‑se no campo, entregues a famílias de camponeses, física e moralmente sãs. Os médicos locais velam constantemente pela sua saúde. Acompanham o seu desenvolvimento. Organizam as suas fichas»34. Em Setembro de 1932 o Ninho contava com 60 crianças e era seu lema, desde a fundação, «Roubar à Morte os Pequenitos». No I Congresso Nacional de Protecção à Infância o professor decifrará a frase: «…é o lema duma das nossas instituições; esta frase exprime, em síntese, o mais importante e urgente problema da Nação. Resolvê‑lo é missão que não pode pertencer somente ao Estado, mas deve sê‑lo com a colaboração do Estado»35. Uma legenda tão ou mais forte quanto a dureza da realidade que o médico e professor não se cansará de relembrar: «Morrem em Portugal em cada ano trinta mil crianças de zero a um ano de idade. E destas criancinhas a maior parte poder‑se‑ia salvar, se outra fosse a educação em matéria de higiene do nosso povo se outras fossem as condições de assistência infantil do nosso país!»36.

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O Ninho foi, em certa medida, o embrião das conhecidas Casas da Criança. Ali fazia‑se ainda a distribuição de O Livro da Mãe, onde se registavam os dados sobre a criança, contendo indicações e ensinamentos indispensáveis para a boa criação dos bebés. ‑ Um Dispensário anexo ao Ninho vulgarmente conhecido como Dispensário da Praça da Republica ou Dispensário de Protecção à Grávida e Defesa da Criança, «…guarda avançada, onde se pratica a Assistência Ante‑Natal, de maneira a cuidar da Criança no ventre da Mãe e essa Assistência prolonga‑se na primeira e segunda Infância»37. Foi inaugurado em 26 de Outubro de 1931 e Bissaya‑Barreto realçou as vantagens do Dispensário para as classes pobres de Coimbra: «A cada pequeno consulente atribuir‑se‑á uma ficha clínica, onde se registarão todos os dados que interessam ao seu desenvolvimento e saúde (…) fornecer‑se‑á às mães os ensinamentos necessários para a criação dos seus filhinhos. Para maior facilidade do serviço clínico organizou‑se um pequeno livro chamado Livro das Mães, que a Junta Geral do Distrito mandou editar, onde se contêm os ensinamentos mais elementares e onde, ao mesmo tempo, se procede ao registo dum certo número de dados, respeitantes à criança (…) Pelo que respeita a auxílio material, propõe‑se o Dispensário fornecer leite em pó, farinhas e outros produtos alimentares e medicamentosos, às criancinhas mais necessitadas»38. ‑ Uma Maternidade também anexa ao Ninho onde, segundo Bissaya‑Barreto, «A mulher pobre, indigente ou que não tem condições bas‑ tantes em sua casa (facto a averiguar por Enfermeiras Visitadoras), para ter o seu parto, recolhe à Maternidade do Ninho, pequena instituição, mas grande em serviços prestados, onde, sob assistência médica competente, o parto tem lugar»39. Instalada de forma provisória «…resultou das necessidades imperiosas do ensino das enfermeiras e das alunas da Escola de Serviço Social e também da manifesta insuficiência da Maternidade da Faculdade de Medicina para ocorrer às necessidades da região»40. ‑ Um Lactário inaugurado mais tarde e cuja falta Bissaya‑Barreto anotava em Janeiro de 1933 ao fazer uma súmula dos serviços prestados pela OPGDC: «Leite pouco se tem ministrado e razão está em que não foi possível, ainda apesar de todos os bons esforços nesse sentido, pôr a funcionar o Lactário que há de ser criado junto do Dispensário»41.

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Na sessão de 18 de Dezembro de 1930 Bissaya‑Barreto apresentava aos seus pares a planta das obras a realizar para instalação do Ninho dos Pequenitos no Centro de Protecção e Defesa da Criança, segundo o desenho do mestre António Ferreira de Araújo. Imediatamente aprovada, logo se decidiu dar princípio às obras. Na ocasião mais se resolveu iniciar de imediato as obras na chamada casa da física para ali instalar um Dispensário de higiene maternal e infantil para que começasse a funcionar no mais curto espaço de tempo42. No dia 21 de Junho de 1931, a Obra de Protecção à Grávida e Defesa da Criança, englobando o Centro de Protecção e Defesa da Criança e o Ninho dos Pequenitos seriam inaugurados oficialmente no âmbito de um vasto programa intitulado «Os dias da Tuberculose», dinamizado pela Junta Geral. De 21 a 23 desse mês foram ainda inaugurados outros estabelecimentos: Hospitais de Celas, Sanatório da Colónia Portuguesa do Brasil, Preventório de Penacova e Escola e Asilo de Semide (vide Correio de Coim‑ bra, 27-06-1931, p. 4). Na noite do dia 22 decorreu no Teatro Avenida um Sarau em benefício do Ninho com actuação do orfeon académico. A estes acontecimentos se referiu no mês seguinte o Prof. Dr. Luís Raposo que entusiasmado via abrir‑se caminho para o combate à tuberculose através da «educação do povo no sentido da higiene e profilaxia», numa altura em que segundo os seus cálculos a tuberculose apresentava uma taxa superior às estatísticas oficiais de 2.500 ano 43. Mais. Para o ilustre clínico as festas então realizadas eram um momento histórico, ao mesmo tempo prólogo e epílogo: «…prólogo porque nos anunciam o alvorecer de um dia radioso e lindo, cheio de promessas e de bênçãos em favôr dos desprotegidos da sorte, hoje ainda a braços com a miséria e coma tuberculose (…) epílogo porque marcam a efectivação duma obra formidavelmente grande que a Junta Geral do Distrito de Coimbra levou a cabo com ardor e entusiasmo vivido de bem servir por bem fazer»44. Voltando ao dispensário. Ali se distribuíam, sob orientação dos prestigiados clínicos Luís Raposo e Gilberto Veloso da Costa, rações de farinha, leite em pó e outros produtos alimentares de acordo com as prescrições médicas. No final do primeiro ano de funcionamento o Dispensário justificava a sua criação; 2.000 consultas para 715 crianças inscritas. Naquela obra se vacinaram muitas crianças contra doenças

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O NINHO DOS PEQUENITOS Fo t o D o c u m e n t a

Primeira folha do livro de matrícula dos internados no Ninho dos Pequenitos (1927-1934). Nota: Os registos de 1927 e 1930 dizem respeito, provavelmente, a desvalidos internados na Secção Hospicial da Maternidade.

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Boletim da obra de protecção e defesa da criança (frente e verso), Março de 1947.

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como a difteria, que provocava até então uma elevada mortalidade nos primeiros dez anos de vida. Verifica‑se mesmo um incremento extraordinário de vacinações nos últimos dois meses de 1931 quando se espalhou pela cidade o boato (com algum fundamento) que grassava em Coimbra uma epidemia de difteria. Paralelamente, desencadeou‑se o movimento que envolveu a sociedade através do conhecido mecanismo «…colocação familiar através das Beiras, isto é; a Obra de Grancher, e por isso muitas crianças, filhas de tuberculosos, estão colocadas em casas de famílias sãs, sadias e de boa moral, que as criam, as acarinham e as amparam sob a fiscalização também da Junta Geral»45. Com o Ninho dos Pequenitos já em funcionamento, Bissaya‑Barreto preocupa‑se com a vertente financeira do mesmo. Por isso, será aprovada a proposta para que as mães dos menores internados no “Ninho dos Pequenitos”, que possam contribuir com uma quota mensal para a mesma Instituição o passem a fazer, encarregando o Oficial do Registo, Senhor Doutor Santos Madeira, de saber quais as mães que estão em condições de poderem contribuir para a Instituição46. Para o Ninho dos Pequenitos, à semelhança de outros estabelecimentos da Obra Social, concorreram não só apoios estatais, mas também donativos individuais. De facto Bissaya‑Barreto conseguirá montar uma máquina de grandes dimensões angariadora de fundos para o Ninho, envolvendo a sociedade, ao nível das instituições e pessoas mais representativas da cidade. Vejamos, detalhadamente, dois exemplos. O primeiro exemplo, datado de Abril de 1934, centra‑se na participação do Teatro Avenida: «No dia 30, segunda‑feira, vai realizar‑se no Teatro Avenida uma récita importante a favor do “Ninho dos Pequenitos”, simpática obra de assistência infantil a cargo da Junta Geral do Distrito de Coimbra. O grupo dramático do Ginásio Clube Figueirense representará a peça “O Aldrabão” em que tem afirmado os seus créditos e colhido grandes triunfos. Com outros números importantes de que se compõe o espectáculo, temos a certeza de que o Teatro Avenida vai ter uma enchente à cunha e o “Ninho dos Pequenitos” uma noite de alegria que se traduzirá em brilhantes resultados para uma obra de tão grande alcance.

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Sabemos que há grande interesse em assistir ao espectáculo, não só por se tratar do “Ninho” mas também porque o programa é seleccionado com números interessantes»47. O segundo exemplo, também de 1934, passa pela contribuição dos artistas: «Esteve em exposição no Parque da Cidade o quadro do pintor Sr. Guilherme Filipe intitulado “O Infante de Sagres”, que vai ser rifado a favor do “Ninho dos Pequenitos”. O sorteio será feito pela lotaria da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa de 27 de Outubro próximo. Estão já passados muitos bilhetes, o que não é para admirar, porque os seus possuidores contribuem para uma simpatia obra de assistência»48. Outras formas de apoios, algumas delas originais, serão experimentadas: venda do selo Anti‑Tuberculoso, uma garraiada, a 15 de Maio de 1932; abrindo o Ninho dos Pequenitos aos associados que o quisessem ser; Semana da Uva, em Setembro de 1932, revertendo o produto da venda de flores e frutas; Festas de Beneficência (Outubro de 1932, no Luso promovida por Comissão de Senhoras e Cavalheiros), redução pelos SMC, no preço da água e electricidade consumida (50 % em Novembro de 1932); o Serão de Arte e Beneficência organizado pela Empresa do Grande Casino Peninsular, propriedade do industrial Alfredo da Silva, a favor do Ninho. No que toca a esta primeira fase da vida do Ninho, temos a destacar as contribuições do: Comandante Henrique Baeta das Neves bem como do emergente Diário de Coimbra. 2. A importância do Ninho dos Pequenitos no contexto assistencial: experiências, originalidades e pioneirimos Muitos anos depois da sua idealização e construção, Bissaya‑Barreto referiu‑se ao modelo que seguira na construção do Ninho: «O pro‑ blema foi estudado sem arquitectos, mas com grande entusiasmo e grande interesse; havíamos acompanhado bastante de perto a renovação que Mussolini havia feito na Itália nas obras de protecção à Infância.

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Lemos, estudámos, aprendemos. E a verdade é que a instalação do Ninho dos Pequenitos representou uma verdadeira revolução, operada em casas de assistência, especialmente de assistência às Crianças»49. Nesse texto, fundamental para a compreensão da ideia subjacente à obra, o professor referiu‑se em particular o programa construtivo: «Houve ideias novas e originais no que diz respeito às dimensões das casas, ao seu mobiliário e ao seu funcionamento. Partiu‑se deste princípio, tão simples, tão banal: a casa e o seu equipamento faz‑se conforme o habitante. Até então uma casa de Assistência para crianças depois de montada também podia servir para asilo de velhos ou para quartel de Polícia…Tudo passou a ser feito conforme o habitante. Criaram‑se modelos próprios e proporcionados, para cama, para cadeiras, lavató‑ rios, sanitários, mesas, etc., e surgiu a cor como elemento principal de decoração. Sempre nos encantou a influência da cor… Bastantes anos depois, em Congressos e noutras reuniões sobre problemas liga‑ dos à Infância, vi larga discussão sobre a influência do colorido ambiental sobre o psiquismo da Criança…Coimbra já conhecia o assunto e conhecia‑o por observação e aplicação durante anos»50. Em 1986 recordava Santos Bessa que «a impressão causada por estas novas instalações foi tal que o J. Costa Lima, então categorizado elemento da Companhia de Jesus, depois de visitar o Ninho e o Portugal dos Pequenitos, escreveu um longo artigo, na Broteria, em 1939, em que anunciava estar‑se a realizar, em Coimbra, uma verdadeira “Revolução Puericultural”»51. Bissaya‑Barreto recordava com especial emoção a ida do Ninho dos Pequenitos em representação da cidade e região à Exposição da Criança realizada em Lisboa, a pedido do Director‑Geral da Assistência Machado Pinto, durante Abril de 1933. O programa passou por montar alguns serviços em tamanho e mobiliário iguais aos da Sede, o que foi realizado com grande sucesso: «Quarenta mil pessoas desfilaram pelo Pavilhão das Exposições no Parque Eduardo VII o que equivale a dizer que 40 000 pessoas proclamaram a representação da Junta Geral de Coimbra como a nota mais interessante, mais brilhante e mais digna de admiração de toda a Exposição; o trânsito esteve quási sempre impedido na frente das boxes, que reproduziam, em tamanho natural, algumas das instalações da sede da Obra de protecção à Grávida e Defesa da Criança, da Praça da República.

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Toda a imprensa focou, duma maneira deveras cativante, a colaboração que a Junta Geral de Coimbra houve por bem dar à Exposição»52. Curiosamente e com tanto entusiasmo também se dizia que em Lisboa haviam começado os preparativos para fazer um Ninho dos Pequenitos…No mesmo sentido recordava o professor em 1970: «E então, esta a parte de maior consolação – o Ninho dos Pequenitos passou a ser o padrão a adoptar, a copiar, a reproduzir; e, na verdade, começámos a encontrar nas Creches, nas Cantinas, nas Escolas maternais, o mesmo tipo de mobiliário, o mesmo género de decoração, o mesmo arranjo»53. Novos métodos de ensino e nova pedagogia foram ensaiadas em Coimbra via Ninho «…com professoras especializadas e com instalações pedagó‑ gicas próprias e apropriadas, destinadas ao ensino de línguas (francês, inglês e alemão) das crianças da classe média»54. Experiência que acabaria ao fim do 2º ano. Outra componente do Ninho era o Parque Doutor Oliveira Salazar, que foi o «…precursor doutras formações que mais tarde se desenvolveram e multiplicaram chamadas Casas da Criança»55. 3. Constance Davon, O Ninho dos Pequenitos e a Escola Normal Social de Coimbra A Obra de Protecção à Grávida e Defesa da Criança (OPGDC) ficou marcada não só pelo inspirador do projecto (Bissaya‑Barreto), mas também pela influência da escola e do serviço social francês na sua organização e funcionamento, que teve na puericultora Constance Davon, formada pela Escola de Puericultura da Faculdade de Medicina de Paris, a principal intérprete. Marie Constance Davon, nascida no Sul da França em 1897, conhecerá de perto a Obra em curso no Verão de 1936: «A pedido do professor Bissaya Barreto e do Bispo da Diocese a vigaria provincial da Congregação das Franciscanas Missionárias de Maria, Isabelle de France (…) visita as obras sociais da Junta Distrital (…) Em Maio e Agosto de 1936 vem para Coimbra um grupo de francesas, Isabelle de France, Marie Constance Davon, Madeleine Jamot, Raymond Trouvay e a portuguesa Ester de Jesus Fernandes, da Congregação, para assumirem a direcção da Obra de Protecção à Grávda e à Criança (OPGC) que lhes fora confiada»56.

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O Ninho dos Pequenitos e a Escola Normal Social «No Ninho entram as crianças ainda de «biberon», onde se formam até aos quatro anos sob os desvelos das Missionárias Franciscanas de Maria. Só quem não visitou este Centro não faz ideia da ordem, higiene, mil atenções dis‑ pendidas com seres doentes, infecciosos uns, tarados outros, e sempre com o sorriso casto nascido da caridade e da persuasão de servir a Jesus Cristo naqueles pequenitos. (…) Por toda a parte o primor do arrumo e da limpeza vai desde a camita ao talher, aos pratos, às mesas, aos lugares de trabalho, às aulas e aos jardins dos Parques. Nestes, as crianças jogam, aprendem ao ar livre, têm trabalhos manuais, e são assistidas maternalmente para as suas saúdes frágeis não se perderem irremediavelmente. (…) Integradas nesse centro de assistência maternal, vão as Madres Missionárias reger a «Escola Normal Social», que comporta três anos de ensino teórico e correspondentes estágios práticos, devendo a aluna, no quarto ano, efectuar um estágio num Centro de Assistência Maternal e Infantil, para receber o diploma oficial e poder reger centros análogos. A escola tem duas secções, uma de saúde, para visitadoras, puericultoras, enfer‑ meiras especializadas para creches, maternidades, dispensários, gota de leite, etc., para assistentes médico-pedagógicas de higiene social (sífilis, cancro, tuberculose, alcoolismo) e assistentes familiares (puericultora e profilaxia mental). A outra secção de educação destina-se a formar educadoras para crianças nor‑ mais (aulas de jardins infantis) reeducadoras de anormais e retardados, perfeitas de internatos, colónias pueris, e monitoras do ensino familiar e larário. A estas últimas dá-se-lhes apenas um certificado que as declara aptas para os empregos mencionados, com cursos e prática de formação especializadas para as suas funções. O curso desta «Escola Normal Social» compreende, no primeiro ano, puericultura e pediatria; no segundo, higiene social e pedagógica; no terceiro, psicologia, higiene e profilaxia mental, criminologia, assistência familiar e infantil, educação e assistência escolar, correspondendo a cada ano lectivo um diploma especial, que confere a cada diplomada direitos de acção. Esta formação técnica especializada da mulher que há-de tratar com crianças impõe-se entre nós, e folgamos que se ministre completamente por quem tem ciência e prática largamente provadas». [Bissaya-Barreto In Uma Obra Social realizada em Coimbra, Vol. I, Coimbra, 1970, Pp. 226-227]

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Designada directora da Obra de Protecção à Grávida e à Criança, veio propositadamente de França para abrir o Ninho dos Pequenitos, reorganizando os serviços existentes e propondo um programa de estudos, estágios e regulamentos. O tipo de ensino que defende pretende formar «…a assistente social polivalente, que, consoante as necessidades, poderia desenvolver actividades de enfermagem, de educadora, de visitadora ou de conselheira»57. Após ter conhecido de perto a realidade social do país, Constance envolve‑se no processo pela criação da Escola Normal Social de Coimbra, o que aconteceu em 1937 pela Congregação “Franciscanas Missionárias de Maria”, pertencendo o alvará à Junta de Província da Beira Litoral. Observando que as raparigas da alta sociedade de Coimbra não tinham nenhuma ocupação, mas que gostariam de ajudar como voluntárias, propõe‑lhes um curso de puericultura e de formação social. O curso abriu em 10 de Janeiro de 1937, contando com o apoio do Prof. Luís Raposo, chefe clínico do Ninho, que no dia seguinte daria a primeira conferência para 42 raparigas inscritas. Deste modo se formava a Escola Normal Social58. No entanto, o processo de oficialização da Escola Normal Social só será regularizado pelo Decreto‑lei nº 30135, de 14 de Dezembro de 1939, que aprovou o seu plano geral de estudos e programas. Bissaya‑Barreto será o primeiro presidente da Escola Normal Social. A criação desta escola seria de fundamental importância para o funcionamento da Obra, uma vez que antes do seu aparecimento o pessoal que se encontrava ao serviço dos vários estabelecimentos não possuía os requisitos necessários, nomeadamente: «…garantia da formação de pessoal especializado no domínio da assistência social. Pessoal que era encaminhado, preferencialmente, para trabalhar nos diversos equipamentos de assistência da Junta e, em particular, na rede de ensino pré‑escolar – as denominadas Casas da Criança (…) que se distribuía pela Beira Litoral, bem como o parque comum a esta rede, o conhecido Portugal dos Pequenitos»59. Ali se formaram, em curso especializado, assistentes sociais e Enfermeiras‑puericultoras visitadoras de infância, sendo neste caso «…o único centro de ensino do País onde se formavam estas profissionais»60. Muitas destas diplomadas foram colocadas em instituições da OPGDC, nomeadamente nas Casas da Criança.

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Uma das principais intervenções desta Escola e da própria Constance Davon, incidiu nas Casas da Criança: «Constance Davon deslocava‑se mensalmente a todas as Casas da Criança, em número de nove até 1950, onde se realizam estágios e as assistentes sociais são colocadas em lugares de chefia. Em resultado de todo este trabalho desenvolvido nestas organizações, regista‑se uma baixa na taxa de mortalidade infantil»61. Constance dirigirá a Escola Normal Social durante 19 anos e até 1958, de forma persistente e firme na defesa das suas ideias e convicções, tendo sempre como objecto a justiça social e a defesa dos direitos do ser humano. Deste modo e como recordava Bissaya‑Barreto «O Ninho dos Peque‑ nitos com a sua pequena maternidade, com as consultas externas constituía um esplêndido campo de estudo e de trabalho para as alunas da Escola Normal Social sobretudo no capítulo da Puericultura e da Pediatria»62. 4. A ampliação do Ninho dos Pequenitos: cozinha, refei‑ tório, parque infantil e jardim‑de‑infância O Ninho dos Pequenitos depressa excedeu as expectativas, preenchendo a lotação fixada. Logo em Junho de 1932, pensa‑se em construir uma cozinha e um refeitório de acordo com as novas exigências. Para esta ampliação tornou‑se necessário que o Oficial de Registo da Maternidade de Coimbra dispensasse os aposentos que ocupava com sua família por direito próprio. As obras de ampliação decorreram durante o ano de 1933, tendo‑se inaugurados os novos espaços a 07 de Janeiro de 1934, os quais permitiam a partir de então acolher cerca de 100 crianças63. Intimamente relacionado com o Ninho esteve a criação do seu Parque Infantil. Na sessão da Junta de 01 de Fevereiro de 1934 Bissaya‑Barreto vê aprovada a sua proposta onde o papel dos parques sai reforçado: «1º Proceder aos estudos preciosos para a construção imediata d’um parque infantil; 2º Proceder aos estudos da divisão da cidade em zonas, de maneira que cada uma tenha o seu Parque Infantil; 3º Solicitar para esse fim a cooperação

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do Estado e doutras entidades e instituições; 4º Procurar interessar a cidade na realização desta grande obra e solicitar para ela o seu auxílio»64. Para tal foi necessária a cooperação da Câmara Municipal de Coimbra, que cederia à Junta Geral do Distrito a Rua de Entremuros, ali localizada. A cedência foi legalizada na sessão camarária de 20 de Junho de 1934, e os terrenos foram de fundamental importância para a ampliação do ninho e edificação do tão desejado parque infantil65. Construído, parcialmente, com as pedras da apeada Torre de Santa Cruz para ele concorreu a cooperação do Estado e da Câmara Municipal de Coimbra. Este parque, o primeiro da Obra Social destinado a crianças pobres, teve festas comemorativas da inauguração nos dias 2 e 3 de Maio de 1936, com as forças reunidas para um mesmo fim, realizaram‑se as festas comemorativas da inauguração do primeiro parque infantil da Obra Social destinado a crianças pobres66, o qual fora baptizado, em Abril, com o nome de «Parque Infantil Doutor Oliveira Salazar». Curiosamente este parque foi construído aproveitando as pedras da apeada Torre de Santa Cruz e ali se realizaram de 1934 a 1936 o Baile de Gala das Faculdades. Para a construção do Parque Infantil a Junta contará com a colaboração preciosa do poder municipal que em Junho de 1934 vem a ceder a Rua de Entremuros. Em Dezembro de 1936, expedem‑se ofícios às Juntas de Freguesia da Cidade para que indiquem 10 crianças, dos 3 aos 7 anos, para serem admitidas no novo Parque Infantil. Os números mais esclarecedores sobre o intenso trabalho desenvolvido no complexo Ninho dos Pequenitos/Maternidade anexa/ e Dispensário anexo, foram publicados em Janeiro de 1939 e reportavam‑se apenas aos 10 meses anteriores:

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Tabela – Movimento no Ninho dos Pequenitos, Maternidade e Dispensário da OPGDC, Março‑Dezembro 193867 Ninho dos Pequenitos Consultas de crianças de 0 a 3 anos Consultas de crianças de 3 a 10 anos Consultas de Pediatria Inscrições de crianças Operações Curativos, tratamentos, etc. Injecções Cuti‑reacções Colheitas de sangue Análises diversas Aplicações de R.U.V. Pensos Operações uterinas Pesagens Banhos de limpeza Vacinações anti‑variólicas Vacinações anti‑diftéricas Maternidade anexa ao Ninho dos Pequenitos Consultas de grávidas Inscrições Análises de urinas Análises diversas Curativos Injecções Pensos Pesagens Partos Operações Colheitas de sangue Dispensário anexo ao Ninho dos Pequenitos Consultas de crianças de menos de 3 anos Consultas de crianças de 3 a 10 anos Consultas de tuberculose Consultas de otorrinolaringologista Consultas de pediatria Inscrições Consultas de mulheres grávidas

29 3 6 94 1 33.686 2.430 73 1 44 379 1.534 1 980 11.834 56 15 101 19 3 39 1.262 360 331 108 9 1 15 683 1.940 342 90 317 164 23

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Operações Curativos, tratamentos, etc. Injecções Cuti‑reacções Reacções diversas Colheitas de sangue Análises de sangue Análises de urina Análises diversas Aplicações de R.U.V. Pensos Subsídios Operações de otorrinolaringologista Pesagens Vacinações anti‑variólicas Vacinações anti‑diftéricas Banhos de limpeza

5 3.092 3.092 3.473 44 17 2 6 2 13 417 879 2 319 11 12 4

Nos meios estatais cedo despertou a curiosidade, tendo sido visitado demoradamente pelo Presidente da República, General Óscar Carmona, no dia 06 de Julho do mesmo ano. Mais tarde, em Abril de 1936 foi baptizado com o nome «Parque Infantil Doutor Oliveira Salazar». O estabelecimento, que crescia a olhos vistos, despertou uma onda de solidariedade a nível regional. Recolhemos algumas das iniciativas até 1947: ‑ Comissões Organizadoras de festas, um pouco por toda a parte, faziam chegar as subscrições obtidas nos seus eventos em favor do Ninho. Neste caso incluem‑se tanto as festas de beneficência, como a organizada pelo Grande Casino Peninsular, na Figueira da Foz, em Dezembro de 1942 ou o Baile promovido pela Associação Académica em Novembro de 1944. ‑ Donativos diversificados, nomeadamente de empresas, a nível financeiro ou material, continuavam a afluir: Vista Alegre, Câmara Municipal de Coimbra (em especial oferta de carnes), Sociedade de Produtos Lácteos – Nestlé ‑ (oferta de brinquedos), Sociedade de Fa-

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zendas, Grémio das Carnes, Junta Nacional de Produtos Pecuários, Aliança Comercial de Miudezas… ‑ Donativos pessoais, em dinheiro e/ou géneros alimentícios: Ângelo da Fonseca, Capitão Argel de Almeida, José Bessa, Conde de Fijô, Augusto Alves Barata, Carlos Augusto Louzada, Júlio da Cunha Pinto, José Correia Amado, Antonio Luiz Martha… ‑ Iniciativas diversas, entre as quais destacamos duas pela originalidade que encerram: do Teatro Avenida que a partir de 1939 cede o camarote Nº 2 às crianças do Ninho, para puderem assistir às peças aos Sábados. Neste teatro se fará ainda uma récita a favor da instituição, representada pelo Grupo Figueirense “Por Bem”, com a peça “O Rosário”68; do Hotel Astória, sito em Coimbra que durante anos, especialmente durante as décadas de 40 e 50, cedeu o produto da venda de entradas no terraço do Hotel, por ocasião das Festas da Rainha Santa. São ainda de registar os legados testamentários. O Ninho dos Pequenitos será ampliado com um Jardim‑de‑infância, estrutura que Bissaya‑Barreto há muito desejava. Na sessão do órgão distrital de 13 de Agosto de 1936, é mencionada a necessidade da cedência dos terrenos que a Câmara Municipal de Coimbra «… possuía junto do Ninho dos Pequenitos e confinante com a Avenida Sá da Bandeira e travessa que liga com a rua Abílio Roque e Praça da Republica com o fim de ali ser criado por esta Junta um Jardim de Infância para crianças de trez a sete anos, dando assim à cidade mais uma instituição de assistência infantil, aonde as famílias possam internar, durante o dia, os seus filhos, ficando mais livres para melhor poderem tratar das suas ocupações e aonde as crianças possam receber a educação física e moral adequadas às suas edades, mediante o pagamento de uma pequena mensalidade. Que esta nova instituição “Jardim de Infância” nada tem a ver com o “Parque Infantil Doutor Oliveira Salazar” já criado e só destinado a crianças pobres»71. Logrará uma vez mais os seus intentos, na medida em que a Câmara Municipal na sua sessão de 30 de Agosto cederá os terrenos necessários para tal fim, consignando inclusivamente um voto de louvor e agradecimento pela “obra meritória para a Cidade”. Na sequência a ordem é para levantar planta dos terrenos, que será executada pelo arquitecto Luís Benavente, e elaborar respectivo orçamento das obras a executar.

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O Jardim de Infância tomará a designação de “Dona Maria do Resgate Salazar» e através dele a vida ao ar livre tomou um maior desenvolvimento no Ninho dos Pequenitos «…com um ambiente de maravilha que era o Jardim dos Pequenitos, ao cimo da Avenida Sá da Bandeira contornando para a Praça da República. Em Julho e Agosto, em dias quentes e de Sol, à hora do banho na Piscina, a alegria esfusiante de tantas crianças e mais, a gente que passava encostava‑se às grades e interrompia o trânsito»70. Com o Ninho dos Pequenitos em pleno vapor Bissaya‑Barreto alerta, nos finais dos anos 30, para os custos inerentes a uma obra desta natureza: «Tôda esta obra é dispendiosa, sobretudo a primeira infância: as exigências de conforto, os cuidados de alimentação e, por vezes, alimentação muito cara, os me‑ dicamentos, os subsídios em leite, farinha e tratamento a mais de mil crianças, que passam pelo Dispensário, representa um elevado encargo para a Junta de Província da Beira Litoral e absorvem parte importante das suas receitas»71. Consciente do êxito da sua obra Bissaya‑Barreto exprime um desejo: «…é preciso promover um grande movimento Pró‑Infância: é preciso que o Estado e as Autarquias locais acariciem os serviços de protecção à criança, multiplicando as obras de Assistência Infantil, criando Ninhos, Creches, Dispensários, isto é, organizando um numeroso e bem equipado armamento puericola, que possa dar combate ao terrível espectro da mortalidade infantil, grave flagelo Nacional e Social (…) que tenha por lema esta frase curta, mas expressiva, que encerra em si todo um programa – Tudo pela Criança72. Em 1937 a Junta Geral do Distrito dá lugar à Junta de Província da Beira Litoral, efeitos da reorganização administrativa do país. Já depois desta alteração e com novos concelhos a integrarem a noção provincial Bissaya‑Barreto manifestará, diante dos seus pares, a vontade em continuar a luta que lançara anos antes: «…que era seu desejo, estender a acção social desta Junta, quanto possível a Leiria e Aveiro, fundando creches, lactários, jardins, etc, enfim uma Obra de Protecção à Grávida e Defesa da Criança à semelhança do que tinha feito em Coimbra»73. Por esta altura já o Ninho dos Pequenitos funcionava a todo o gás, nele se aplicando a vacina B.C.G., nos primeiros 10 dias de vida e

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pela via bocal, que então se afirmava «…como tendo real valor, não curativo, mas sim profiláctico. Deve‑se aos estudos de Calmette e dos seus colaboradores Guerin e B. Weill‑Halle, pelo que é designada com as iniciais dos seus nomes»74. Por outro lado, as crianças e menores a rumarem, anualmente, à Figueira da Foz, para as Colónias Marítimas. Na realidade, a instituição modelar, alcançara fama nacional. Prova do que afirmamos está na autorização concedida pela Junta de Província à Direcção Geral de Saúde, para que «…um grupo de 12 das suas enfermeiras viessem a Coimbra, em visita de estudo, a fim de tomarem conhecimento directo da Obra de Assistência da mesma Junta e, em especial, da Obra de Assistência à Grávida e Defesa da Criança, devendo, para isso, assistir a prelecções que serão feitas na Escola Normal Social»75. O Programa de Trabalhos, a decorrer em Dezembro de 1939 e válido para 10 dias, seria gizado por Bissaya Barreto. Da programação fazia parte a visita aos diversos estabelecimentos da obra, incluindo o Ninho dos Pequenitos. O Estado reconhecia, assim, a importância e alcance da Obra Social de Bissaya‑Barreto. Como dissemos, o Ninho dos Pequenitos integrou desde a sua raiz a Obra de Protecção à Grávida e Criança, como pilar fundamental da mesma. Em Janeiro de 1936 foram inventariados os bens dos diversos estabelecimentos que a integravam, tarefa de que foi incumbida a Regente do Ninho, Emília de Oliveira. Nele se incluiria, logicamente, o Ninho. Inventário que publicamos em apêndice e do qual podemos extrair com apreciável grau de profundidade a organização espacial da Obra: ‑ Dispensário de Protecção e Defesa da Criança: incluía o Gabinete Médico, os utensílios, o Gabinete da Enfermeira‑Visitadora, a Sala de Espera ‑ O Ninho dos Pequenitos ‑ Os Ninhos de Leite (Lactário) ‑ As enfermarias: para doenças infecciosas, para doenças não infecciosas, isolamento, e camaratas (a verde e a de alumínio) ‑ Os Salões: dos 24, o amarelo, o lilás ‑ As Casas de Banho, para crianças e funcionários ‑ A Cozinha e a Lavandaria ‑ Camaratas, Dispensas e Corredores… Este inventário, além da disposição espacial dos diversos estabelecimentos ou unidades funcionais e dos diversos artigos a cada um

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pertencentes, contém a descrição de porcelanas, louças, artigos de limpeza, vidros e a menção à existência de quadros decorativos em alguns locais. Num dos registos consta a relação de louças “de bacalite” pertença do Dr. Bissaya‑Barreto, mas que o próprio disponibilizara para a OPGC. Importa ainda reter com atenção a quantidade de “reserva de roupas” da Obra, efeito talvez dos legados e ofertas vindas do povo76. Nos anos 40 a Obra de Protecção à Criança era constituída por 3 unidades fundamentais: o Ninho dos Pequenitos, a Maternidade e o Dispensário – estruturas que no conjunto se designavam por Dispensário de Higiene Maternal e Infantil. Numa estrutura tão bem pensada e organizada, não se estranha que a partir de meados dos anos 40 a frequência de crianças dentro da Obra de Protecção à Criança – Ninho dos Pequenitos e Parque Infantil ‑ passasse a ser controlada diariamente, através de boletins estatísticos. Tomando apenas como exemplo os registos relativos ao ano de 1947, podemos acompanhar a frequência média mensal das duas estruturas – Ninho e Parque: GRÁFICO 1

Para as oscilações no número de crianças do Ninho contribuíram decisivamente factores intimamente relacionados com o funcionamen-

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to da própria instituição, designadamente o mecanismo de colocação familiar, que foi responsável por 8 saídas de crianças. Saídas nem sempre repostas por novas entradas. Acrescente‑se ainda que, em termos de mortalidade, apenas uma criança pereceu durante o ano de 1947 dentro das instalações. Dos referidos boletins diários77, assinados pela bem conhecida Constance Davon, foi possível extrair os dados relativos aos cuidados médicos e sanitários prestados às crianças: curativos, banhos, pensos, injecções, tratamentos A.S., consultas, pesagens e vacinações. Os 4 primeiros cuidados referidos foram os mais constantes ao longo do tempo, atingindo nalguns casos valores muito significativos: GRÁFICO 2

De facto, o total anual de cada variável não deixará de causar algum espanto: 7244 curativos, 16780 banhos, 1500 pensos e 4346 injecções. A estes números poderemos ainda acrescentar outras intervenções igualmente importantes para a saúde das crianças: 1227 tratamentos

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A.S, 44 consultas (de pediatria e oftalmologia), 1042 pesagens, e 195 vacinações. De acordo com os registos, inseridos nos boletins, haviam sido assistidas até Maio de 1947 na Obra de Protecção e Defesa da Criança 13492 crianças. Um valor que por extrapolação permite calcular em aproximadamente 30.000 crianças ali assistidas anualmente. Apesar de todos estes cuidados e vontade em ajudar os mais desfavorecidos, a verdade é que o Dispensário sofria duros golpes na sua função. De facto e até Março de 1947, encontramos em alguns boletins uma inquietante anotação: «Durante toda a semana, o movimento do Dispensário foi muito reduzido, devido à falta de medicamentos». Um cenário que se agravaria passando a inquietação a desânimo: «O movimento do Dispensário (curativos) parou. Não temos recebido medicamentos desde o mês de Março de 1947». Apesar das dificuldades o Ninho e suas crianças haveriam de sobreviver! Com a construção do Complexo Assistencial da Quinta da Rainha e consequente troca de terrenos e construções que adiante explicitamos, o Ninho dos Pequenitos seria transferido provisoriamente para a Casa da Criança de Castanheira de Pêra, onde se manteve até ser transferido para as novas instalações, inauguradas em Abril de 1969. 5. Breve súmula de alguns estabelecimentos da OPGDC A Obra de Protecção à Grávida e Defesa da Criança compreendeu ainda a criação de múltiplos estabelecimentos de que aqui resumidamente damos conta: ‑ As Casas da Criança: Espalhadas pela Região Centro, as Casas da Criança tornaram‑se um dos ícones arquitecturais mais conhecidos e apreciados de Bissaya‑Barreto. Estabelecimentos modelo foram durante décadas a guarda avançada na assistência às crianças maravilhosamente enquadradas no lema desta luta; «Façamos Felizes as Crianças da Nossa Terra». Entre 1936 e 1970 Bissaya Barreto promoveu e dinamizou 24 Casas da Criança. Número impressionante que denota um imenso esforço, em muito ditado por 2 objectivos perseguidos pelo professor no seu programa de protecção à infância:

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«…necessidade urgente da defesa dos filhos dos tuberculosos contagiantes» e «… as exigências duma boa educação de ordem fisíca, afectiva, moral, intelectual e social da criança»78. Das Casas da Criança de então, faziam parte uma Consulta de Pediatria, sob a direcção dum Pediatra, uma Creche (0 a 3 anos) e um Parque Infantil (3 aos 7 anos), sob a orientação duma Puericultora ou duma Assistente Social. Bissaya‑Barreto tinha o objectivo de criar uma rede de Casas da Criança, capazes de cobrir todos os concelhos que integravam a província, ou seja; criar uma unidade por concelho. A primeira Casa da Criança a ser inaugurada foi a de Estarreja, a 18 de Dezembro de 1938, que funcionou num anexo do Hospital Visconde Salreu79. Além do apoio da Junta de Província, algumas Casas da Criança só foram possíveis com legados de beneméritos enquanto outras resultaram do apoio de grupos e comissões locais. Nas Casas da Criança Bissaya‑Barreto aplicou correntes pedagógicas em que assentam nos nossos dias as modernas filosofias da educação: Froebel, Pestalozi e Montessori foram os guias orientadores da acção educativa. ‑ O Portugal dos Pequenitos: o Portugal dos Pequenitos é a mais conhecida obra de Bissaya‑Barreto, tanto a nível nacional como internacional. Depois de a planear como parque comum à rede de Casas da Criança que pretendia implementar, encomendou o projecto ao arquitecto Cassiano Branco em 1937. Compreendeu 3 fases de construção: ‑ A 1ª fase decorreu entre 1938 e 1940. Compreendeu a edificação quer do conjunto das casas regionais portuguesas quer o núcleo de Coimbra, onde se representaram os principais monumentos da cidade. Cassiano Branco contou com a colaboração do grande artista, Mestre Jesus Cardoso, responsável pela execução dos trabalhos. ‑ Assim, a 2ª fase corresponderá à área monumental e nela se ilustraram os principais monumentos do país. Foi responsável pela execução destes trabalhos Valentim de Azevedo. ‑ No decurso da década de 50, o Portugal dos Pequenitos entrará na sua 3ª fase de construção, juntando‑se à parte Continental a parte insular e ultramarina, ou seja, aquilo que na altura se designou por «Império Português para os Pequenitos», englobando a representa-

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ção etnográfica e monumental dos países africanos de língua oficial portuguesa e ainda Macau, Timor e Brasil. Em pleno funcionamento esta obra teve subjacente a seguinte intenção, que Bissaya‑Barreto procura transmitir: «…este mundo que se apresenta aos pequeninos é bem a sua Pátria, a sua terra, tal como a prepararam, trabalharam e modelaram para eles, através de oito séculos, trinta gerações de antepassados (…) é o reflexo de tudo que nos é dado ver com o nome de Português, de tudo o que lhes cumpre amar e acarinhar; é a esplêndida sedução do património ancestral na nobreza das suas tradições, da sua história e das sas artes»80. Parque miniatural ludo‑temático ao ar livre, onde a criança brinca e aprende e o adulto contempla, verdadeira lição de história de Portugal, monumental e regional, onde sabiamente o professor conjugou as diversas disciplinas artísticas; a arquitectura, a escultura, a azulejaria, os ajardinamentos… ‑ As Colónias Balneares Infantis: a criação destas colónias veio dar resposta às pretensões de Bissaya‑Barreto na dupla luta que travava não só pela defesa da criança, mas também contra o mal da tuberculose. Em 1947, a Comissão Municipal de Assistência lançava um desafio à Junta de Província da Beira Litoral: a criação de uma Colónia Balnear Infantil na Figueira da Foz, com capacidade para 500 crianças. Num ápice promover‑se‑á a sua construção na Mata Florestal (Mata do Cabedelo) em terreno cedido pelos Serviços Florestais. Iniciadas as obras em 1949 abrirá as portas com a admissão de 300 crianças. A 24 de Setembro de 1950 seria a colónia inaugurada oficialmente na presença de altas individualidades do Estado. Durante anos e de acordo com a profilaxia defendida por Bissaya Barreto a Colónia Balnear cumpriu com a sua função: «As crianças, banhadas aqui por uma luz mais enriquecida de raios ultravio‑ letas, movimentando‑se num espaço mais amplo, menos poeirento, menos sujo do que as ruas das Cidades e do Campo; os deserdados da sorte e da fortuna que não poderiam ter as suas férias nem beneficiar destas férias, todos tiveram possibilidades de vir pôr‑se em contacto com a natureza, gozar umas semanas em pleno ar livre, ar puro, de sol, e conseguir saúde que os irá livrar de uma longa hospitalização Isto chama‑se fazer profilaxia…»81.

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À margem da semana – O Ninho dos Pequenitos «Na minha visita a Coimbra, fui ver também o “Ninho dos Pequenitos”, de que tinha ouvido falar, mas que não conhecia ainda. Fiquei encantada com essa obra tão carinhosa, tão útil, tão bela, que se deve à competência e à caridade dum médico ilustre, o Dr. BissayaBarreto. Sob a vigilância das Irmãs Missionárias de Maria, as criancinhas pobres, abandonadas, encontram refúgio, ternura material, higiene, cuidados, e salvam-se das garras da miséria e da doença, que destruiriam aquelas frágeis existências ou as deixariam para sempre contaminadas. Tudo é risonho, agradável à vista, no “Ninho dos Pequenitos”. A simplicidade não exclui o bom gosto, a graça de que a infância tanto precisa. As cores harmonizam-se nos azulejos, nos mosaicos, nas cortinas, nos móveis singelos, talhados ao tamanho dos minúsculos habitantes. As crianças alegres, gordinhas, buliçosas, crescem ao abrigo da asa branca das Irmãs. Têm ar, luz, sol, no grande jardim, no refeitório arejado, na casa em que brincam e fazem esses pequeninos trabalhos que são brinquedos também. São escolhidas as que devem passar, a seu tempo, para o Preventório de Penacova; as doentes têm os seus quartos de isolamento, e em tudo há ordem, paz, alegria e escrupuloso asseio. Eis aqui uma pequenina roliça, corada, de olhos pretos, tipo bem português. Entrou para ali com quatro dias, tem agora alguns meses. Lança os bracinhos ternos ao pescoço da Irmã, que lhe sorri, com esse ar de angélica maternidade, que ilumina o rosto da mulher que voluntariamente se dedica às crianças. Estamos na secção das mais pequeninas, que já se vão deitar nas suas caminhas confortáveis. Olham-nos sem estranheza, com os seus olhos límpidos, bem abertos nos rostinhos redondos. Do jardim, guiadas por outra Irmã, um bando das mais cresciditas, chilreando como passarinhos, vêm recolhendo ao “Ninho”. A Madre Superiora acompanha-nos e fala-nos da obra, da sua utilidade, do seu alcance; o seu rosto de linhas nobres e finas, irradia fé, inteligência, serena doçura. Suaviza o espírito o contacto com uma obra assim, consagrada à infância, cuidando do corpo e da alma de entezinhos indefesos, que se afogariam no mar da vida sem o socorro da mão caridosa… Se pudéssemos esquecer que, por outro lado, a loucura dos homens ceifando tantas vidas em flor!» [Maria de Carvalho - escrito originalmente no Diário de Lisboa e transcrito para A Saúde Outubro 1940, Ano X, Nºs 235 e 236 P. 3]

B. O Ninho dos Pequenitos: pilar da Luta Antituberculosa …

‑ Casas de Educação e Trabalho: Bissaya‑Barreto interessou‑se pela criação de Casas de Educação e Trabalho, vocacionadas para a formação de jovens do sexo feminino onde se aprendiam diversos mesteres; costura, tecelagem, trabalhos agrícolas, serviços de domésticos… Conhecemos alguns destes estabelecimentos: Casa de Educação em Sever do Vouga, que resultou do legado do Capitão Bernardo Barbosa de Quadros em 1939. De acordo com vontade testamentária à casa deu‑se o nome da esposa do benemérito, D. Helena de Quadros; em Monte Redondo nasceria o Instituto D. Maria do Patrocínio Costa, consequência do testamento do professor Luis Pereira da Costa; e em Cantanhede e em Travanca de Lagos também se edificaram Casas de Educação e Trabalho. No âmbito da Luta Antituberculosa e Defesa da Criança a Junta Distrital criaram‑se ainda outros estabelecimentos do tipo, mas na dupla função Preventório/Colónia de Férias. Assim nasceu o Preventório de Penacova ou o Preventório do Ar Alto – ou Colónia de Montanha ‑ em Macieira de Cambra, adaptando‑se o antigo edifício dos Paços do Concelho, por cedência do município. O local foi seleccionado com base no clima da região e a unidade, que começou a funcionar em 1953, tinha o objectivo de proteger as crianças já tocadas pelo bacilo de Koch, os primo‑infectados. Em paralelo, Bissaya‑Barreto centraria esforços na criação da Colónia de Meia Altitude voltada para «…as crianças que, durante o Verão, não podem ir para a beira mar, pela acção agressiva do clima sobre o aparelho respiratório»82. A alternativa passava pelos ares do campo e da montanha encontrando‑se Vila Pouca da Beira em situação privilegiada. Em 1952 o Ministério das Finanças cedia à Junta de Província da Beira Litoral o antigo Convento do Desagravo para que nele se edificasse a tão desejada Colónia. Os trabalhos de adaptação iniciaram‑se em 1954 erguendo‑se um estabelecimento com capacidade para 500 crianças. A 11 de Junho de 1955 a designada “Colónia de Férias de Meia Altitude Ar e Sol” era inaugurada oficialmente.

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C. A transferência do Ninho dos Pequenitos para o Complexo Materno‑Infantil da Quinta da Rainha Bissaya‑Barreto desde cedo desejou estender a Obra de Protecção à Infância a todo Portugal. Nas teses que apresentou ao Congresso Beirão em 1936 propôs a criação ou fundação em cada cidade das Beiras daquilo que designou como Instituto de Protecção à Grávida e Defeza da Criança. Uma estrutura que queria organizada em 2 secções: «1ª Secção – Protecção à Mãe (Assistência pré‑concepcional e ante, intra e post‑natal). a) Uma pequena Maternidade utilizada apenas pelas mães cujas habitações sejam absolutamente inaproveitáveis por falta de capacidade ou condições higiénicas; b) Uma consulta de grávidas, que faça assistência ante e post natal e que disponha de enfermeiras visitadoras e pessoal clínico, que possa prestar serviços no domicílio; c) Um serviço de ensino popular de higiene (afixes, brochuras, gravuras, filmes, conferências, etc.) e de educação sanitária que prepare as futuras mães; d) Um serviço de auxílio material às mães e de vigilância e fiscalização das leis de regulamentação do trabalho das grávidas e das puérperas. 2º Secção – Defeza da Criança (compreenderá): a) Dispensário de Consulta de crianças; b) Visitas ao domicílio, feitas por enfermeiras visitadoras; c) Creche; d) Lactário; e) Parque Infantil; f) Praia artificial (raios ultra‑violetas) g) Dispensário ambulante, para a população rural; h) Obra de educação e puericultura (ensinamentos sobre aleitamento materno, regimens alimentares e profilaxia das doenças contagiosas, etc.)»83 Este Instituto queria‑se central, de cariz citadino, procurando juntar‑se na sua organização diversos agentes; do Poder Central, Autárquico, Local, Assistência Pública e Privada. Mas o que verdadeiramente nos capta a atenção é que Bissaya‑Barreto o define como

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«…a realização da primeira fase do problema da assistência materno‑infantil, que é urgente instituir em Portugal»., ou seja, que a ideia de um Instituto vocacionada para a Infância e Maternidade nasceu muito tempo antes do complexo que hoje conhecemos. O Complexo Materno‑Infantil da Quinta da Rainha, próximo ao Largo de Celas‑Coimbra, tornou‑se obra grandiosa e emblemática de Bissaya‑Barreto. Foi inaugurado a 28 de Abril de 1963 passo final de uma história cheia de vicissitudes: ‑ O Decreto‑lei nº 32.651, de 2 de Fevereiro de 1943 criou o Instituto Maternal, com a sede em Lisboa e delegações no Porto e Coimbra. Por portaria de Abril do mesmo ano criou‑se a Comissão Instaladora da delegação de Coimbra, constituída pelos Drs. José Alberto de Faria (Presidente), D. Pedro da Cunha, João Espregueira Mendes, Fernando Macedo Chaves, António Simões Correia, Francisco Fernandes Homem e Bissaya Barreto84. Terminada a sua missão e apresentado o relatório final, foi dissolvida pelo Governo através da Portaria de 8 de Maio de 1945, a qual determinou que lhe prestassem «publicos louvores pelo zêlo e competência de que deu provas no exercício das suas atribuições»85. ‑ A 18 de Maio de 1946 decretou‑se a criação da Delegação do Instituto Maternal de Coimbra nomeando o Ministro Supico Pinto como director da delegação Bissaya‑Barreto, contra o voto da Faculdade de Medicina. A delegação instalou‑se de forma provisória no Largo da Sé Velha, inaugurando‑se o serviço em Setembro de 1946, contando com uma Maternidade e Consultas Externas de Puericultura, Pediatria e Obstetrícia e Ginecologia86. O discurso inaugural da antiga sede logo foi aproveitado por Bissaya‑Barreto para anunciar o plano geral do complexo, defendendo também a necessidade da criação em Coimbra de um Instituto de Puericultura, afinal o seu grande sonho. De facto, em ofício enviado pelos finais de Fevereiro de 1946, ao Sub‑secretário de Estado das Obras Públicas, o professor definiu os objectivos que o norteavam na criação deste estabelecimento: «Dada a importância que tem, no presente e no futuro do nosso País, uma sistematizada e bem orientada luta contra a mortalidade infantil, urge criar em

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Coimbra um INSTITUTO DE PUERICULTURA, estabelecimento de estudo e de investigação de todos os problemas relacionados com a vida e saúde das crianças, órgão coordenador de todas as Casas de Assistência materno‑infantil, delegação da Zona Central do Instituto Maternal, centro de irradiação e intensiva e bem orientada campanha de educação sanitária e profilática das futuras Mães, meio de estudo e de ensino de puericultura e divulgação das suas noções e ainda escola de médicos puericultores e enfermeiras puericultoras»87. Bissaya‑Barreto desejava edificar este complexo num local específico a «…Quinta da Rainha, donde estava para sair, para novas instalações a Escola do Magistério Primário»88. A obtenção da Quinta da Rainha foi o obstáculo a remover, até porque vários organismos do Governo andavam interessados na aquisição e utilização do espaço. Sabia‑se, por exemplo, que o Ministro das Obras Públicas desejava instalar naquele local, junto ao Campo de Jogos de Santa Cruz, um complexo desportivo universitário. Mas não estava só nas pretensões. A 16 de Julho de 1945, a Junta de Província toma conhecimento de um despacho do Ministro das Finanças dirigido aquele órgão no qual se dá conta da autorização para a troca de terrenos entre a Câmara Municipal, detentora de terrenos no Calhabé, para implantação do novo Liceu Feminino pelos da Quinta da Rainha, na posse da Junta das Construções para o Ensino Técnico e Secundário. O despacho, não referindo implicitamente o projecto do grande complexo que Bissaya‑Barreto pretendia instalar na cidade, faz‑lhe menção indirecta: «Sendo o serviço que a Junta se propõe instalar de evidente interesse público e municipal, parece indicado que a Junta ponha em contacto com a Câmara – virtualmente possuidora da Quinta visto já estar adquirido o terreno para o Liceu – e com ela chegue a acordo sobre a aplicação dos serviços em causa na Quinta ou parte dela»89. Ao saber‑se que o terreno onde estava instalado o Ninho dos Pequenitos poderia ficar livre, a Faculdade de Medicina, anterior proprietária do mesmo tentará fazê‑lo regressar à sua posse, pois pensava ali instalar os serviços da faculdade. Esse desejo será expresso em ofício dirigido ao Reitor da Universidade: «O Conselho Escolar da Faculdade de Medicina, em sua sessão de onze do corrente mês, tomou conhecimento de que havia em Coim-

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bra o projecto de organização de uma empresa que levasse a efeito a edificação de uma Casa de Espectáculos, para o que se pensava em obter, da Junta de Província da Beira Litoral, a alienação, por venda dos terrenos onde se encontra instalado o “Ninho dos Pequenitos”. – Estes terrenos foram pertença da Faculdade de Medicina (Decreto‑lei Nº 8785, de 28/05/1923). Passaram, mais tarde, para a posse da Junta de Província da Beira Litoral. – Tendo‑se verificado a exiguidade do espaço destinado, no Plano de Obras da Cidade Universitária, às instalações da Faculdade de Medicina e à necessária e urgente ampliação das instalações do seu Hospital escolar: ‑ Sendo a situação desses terrenos, pela sua contiguidade com a cerca dos Hospitais e sua localização, a mais favorável para a construção dessas novas instalações como projectara a Faculdade de Medicina quando esses terrenos lhe pertenciam; ‑ O Conselho Escolar resolveu levar ao conhecimento de Vossa Excelência esta parecer e o pedido para que, junto das Instancias Superiores, da Comissão Administrativa das Obras da Cidade Universitária, e da Junta de Provincia da Beira Litoral, seja ponderada a conveniência que, para a assistência hospitalar do centro do país e para a melhoria das condições de trabalho e de ensino da Faculdade de Medicina, adviria de esses terrenos, no caso da sua alienação, ficarem integrados nas possibilidades do plano de obras da Cidade Universitária, para as instalações referidas. Reitero a Vossa Excelência os protestos da minha mais subida consideração. – A Bem da Nação. – Faculdade de Medicina de Coimbra, em dezanove de Junho de mil novecentos e quarenta e cinco – O Director. A) Álvaro Fernando de Novais e Sousa…»90. Apesar dos pretendentes, o professor procura célere e numa primeira fase, o entendimento com a Câmara Municipal, alinhavando as bases de um entendimento, por ofício‑carta: “Em referencia ao oficio numero dois mil trezentos e quarenta, de vinte e nove de Setembro, e à nossa conversa de vinte e três de Julho, últimos, permita vossa Excelência que faça alguns reparos que se me apresentam merecedores de ponderação. – Na verdade, esta Junta de Província entende que deve indemnizar a Câmara Municipal da importância de trezentos e sessenta e sete contos dispendida na

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aquisição dos terrenos do Calhabé destinados ao Liceu e, bem assim, da importância de duzentos e cinquenta e oito contos destinados à aquisição de terrenos em frente ao Liceu D. João III. – Deverá ainda a Junta de Província contribuir com metade (cento e vinte e cinco contos) da verba destinada à urbanização do local em torno do Liceu, visto outra quantia igual dever ser concedida pelo Estado. – Parece à Junta de Província que nestes termos deverá ser feito o entendimento com a Câmara da superior presidência de Vossa Excelência, pois, por certo, Vossa Excelência terá o desejo de cooperar também na realização de uma obra – Protecção à Grávida e Defesa da Criança – que julgamos da maior necessidade na nossa terra e do maior interesse a bem do País, e, por outro lado, Vossa Excelência e a sua Câmara contribuirão para que Coimbra fique enriquecida com uma Organização assistencial valiosa pelo volume de construção a realizar e valiosa, sobretudo, pelo valor social do trabalho a empreender»91. As negociações prosseguem e, nos finais de Janeiro de 1946, a Câmara Municipal aceita as condições propostas pela Junta que previa «…a instalação de uma obra de assistência na referida Quinta – deliberou cedê‑la pela quantia de novecentos mil escudos, para nela se proceder à instalação da Obra de Protecção à Grávida e Defesa da Criança»92. Aceitará a Junta esta proposta na reunião de 01 de Fevereiro do mesmo ano embora reconheça que os vinte e cinco mil escudos destinados a outras despesas resultantes de urbanização não devessem ser incluídos na importância pedida. Mas é tal o desejo de se colaborar na grandiosa Obra de Protecção à Grávida e Defesa da Criança de que o País tanto precisa e em que Coimbra devia marcar uma posição decisiva, que a Junta da minha Presidência aceita o preço por Vossa Excelência fixado. – É desejo da Junta de Província da Beira Litoral solicitar de Vossa Excelência permissão para que o pagamento se faça em dois anos a fim de não haver necessidade de reduzir a lotação das Casas de Assistência que tantos benefícios vem prestando à cidade, ou mesmo para não termos de encerrar algumas»93. Aos poucos e poucos, o grande sonho de Bissaya‑Barreto tornava‑se realidade. O seu sonho, o projecto de construções a realizar e os objectivos a atingir, ficariam expressos na comunicação enviada ao Sub‑Secretário de Estado das Obras Públicas:

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O Instituto de Puericultura segundo Bissaya-Barreto «Dada a importância que tem, no presente e no futuro do nosso País, uma sistematizada e bem orientada luta contra a mortalidade infantil, urge criar em Coimbra um INSTITUTO DE PUERICULTURA, estabelecimento de estudo e de investigação de todos os problemas relacionados com a vida e saúde das crianças, órgão coordenador de todas as Casas de Assistência materno-infantil, delegação da Zona Central do Instituto Maternal, centro de centro de irradiação e intensiva e bem orientada campanha de educação sanitária e profilática das futuras Mães, meio de estudo e de ensino de puericultura e divulgação das suas noções e ainda escola de médicos puericultores e enfermeiraspuercultoras. A possibilidade que se tem de reunir no mesmo local – local privilegiado nesta cidade – todas as modalidades de assistencia materno-puerícula e a integração das que já existem, permitindo realizar nesse Instituto investigações sobre todos problemas, que se relacionem com a higiene e a saúde da Criança Portuguesa poderá vir a ser valioso meio de informação e de colaboração com o Estado na resolução dos problemas que a digam respeito entre os quais – e não deverá ser de menor valor – criar, para o nosso meio, o modelo das varias obras de amparo à criança, organizadas sob o ponto de vista científico e prático, de maneira a terem o máximo de eficiência. Dentro deste pensamento teríamos: a) Secção de Serviços de Assistência; b) Secção de estudos e investigação; c) Secção de Educação e Publicidade. Interessa, por agora, numa primeira fase a instalação da Secção a) para o que será necessário criar os seguintes serviços: I – Escola Normal Social e residência para quarenta alunas; II – Dispensário para consultas pré-nupciais e pré-natais lactantes e de primeira infancia, com gabinetes anexos de: otorrinolaringologia, oftalmologia, ortopedia, Raio X, fisioterapia, e laboratório de analises; III – um lactário; IV – Uma Maternidade com quarenta leitos; V – Um Ninho para cinquenta crianças e uma cozinha dietética para preparar e ensinar a preparar os alimentos e alimento-medicamentos usuais em puericultura e pediatria; VI – Uma creche para sessenta crianças; VII – Um parque infantil para cem crianças; VIII – Um Museu de higiene infantil; IX – Uma Biblioteca da especialidade; X – Sede da direcção e secretaria da Obra de Assistência MaternoInfantil da Delegação do Centro.

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Eis, Senhor Sub-Secretário de Estado, o programa de construção a fazer na Quinta da Rainha, cita na parte central de Coimbra, para as quais venho solicitar a comparticipação do Estado, começando pela assistência técnica. Sabedor do justo critério de Vossa Excelência na solução dos problemas de saúde publica e sabedor de que Vossa Excelência reconhecerá que o mesmo problema em Portugal tem mais importância, exige mais rápida solução e tem mais valia – porque é a vida do próprio País que está em causa – do que este, confio em que Vossa Excelência irá dedicar a tão grande problema a inteligência, a dedicação, o carinho, já tantas vezes revelado em assuntos cuja actualidade e cujo valor ficam muito aquém deste que trago ao esclarecido espírito de Vossa Excelência.» [Ofício enviado por Bissaya-Barreto na qualidade de Presidente da Junta de Província da Beira Litoral ao Sub-Secretário de Estado das Obras Públicas In Livro de Actas da Junta de Província da Beira Litoral, Nº 16, 1945-1947, Fls. 76v.-77]

Planta do Complexo Materno-Infantil da Quinta da Rainha (retirado do livro Delegação do Instituto Maternal Zona Centro)

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O Decreto‑Lei Nº 35.893, de 7 de Outubro de 1946, autorizará a Direcção Geral de Fazenda Pública a ceder a título definitivo o prédio do Estado “Quinta da Rainha”, enquanto a Junta de Província deveria entregar 900 contos à Câmara Municipal, a título de compensação. Entretanto, esta verba será paga com o dinheiro contraído por empréstimo junto da Caixa Geral de Depósitos no valor de 1.500 contos, do qual apenas parte se havia utilizado. Querendo a Junta de Província entrar na posse do edifício, pelo menos da parte rústica, a isso se oporá o Director da Escola do Magistério Primário considerando a parte rústica como parte de um todo necessário ao normal funcionamento dos serviços. A tal pretensão dará razão a Direcção Geral da Fazenda Pública em Abril de 1947 informando que «…apenas poderá dispor de uma pequena faixa do lado poente e do lado norte visto a Escola do Magistério Primário funcional em quatro pavilhões e num campo de jogos disseminados na “Quinta”»94. As faixas a ceder e o muro a construir serão, numa primeira fase, motivo de uma polémica entre as partes, levando a uma intervenção directa da Direcção Geral do Ensino Primário quanto às condições a observar «As condições a que deve obedecer são: o muro de vedação deve ter alicerces, revestimento, embora a cal grossa, altura de dois metros e oitenta centímetros e largura de vinte e cinco centímetros. ‑ As faixas de terreno a ceder, são: Primeira = toda a extensão da Rua Augusta ao extremo nascente, desde a esquina norte do ginásio, paralela à mesma Rua até à esquina Norte da Nora; Segunda: a que vai da Rua Augusta (limite nascente da Quinta), tendo aproximadamente de largura dezassete metros e quinze centímetros de comprimento e sessenta e sete metros e setenta centímetros. Nesta faixa o muro deve ser erguido sobre o existente fechando‑se um arco de comprimento, digo, comunicação que o mesmo possui, para o resto da Quinta»95. Bissaya‑Barreto resolverá a situação envolvendo num complexo processo de negociação a Associação Académica de Coimbra. Sabendo que este organismo andava procurando uma sede condigna reúne‑se, no seu gabinete, com a direcção estudantil propondo‑lhe, na

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qualidade de Presidente da Junta de Província, a cedência dos terrenos ocupados pelo Ninho dos Pequenitos, na Praça da República, se fosse autorizada a permuta desses terrenos com os da Quinta da Rainha, para onde desejava transferir essas instalações. Na altura, a direcção estudantil era composta por Mendes Silva (Presidente), Júlio Serras e Silva (Vice‑Presidente) e Viriato Namora (Tesoureiro). Este último elemento relatou os contornos dessa importante reunião com o professor: «Serve‑vos aquela área? São 7.000 contos (ao tempo…) Outra desilusão!..Mas há uma alternativa, continuou: Estou a diligenciar, por troca, a cedência da Quinta da Rainha para ali construir uma Grande Instituição Polivalente (…) Se assim for e estiverem interessados…mexam‑se…mas não percam tempo. Há mais quem queira. Vão ter muito que lutar. Por mim têm a minha preferência, a minha palavra e todo o meu apoio»96. A direcção estudantil seguirá os conselhos de Bissaya‑Barreto. Com a Academia unida e conseguidos os apoios do Ministro da Defesa, General Santos Costa e do Ministro das Obras Públicas, Engenheiro Arantes e Oliveira, o passo decisivo deu‑se na audiência com o Presidente do Conselho, Oliveira Salazar. A direcção traria de Lisboa não só uma grande receptividade ao projecto mas também a palavra de honra em como as obras começariam o mais cedo possível. A permuta, a contento de todos e com todas as finalidades atingidas, foi autorizada pelo Despacho do Ministro das Obras Públicas de 24 de Maio de 1954: «a) O Estado por intermédio da Comissão Administrativa das Obras da Cidade Universitária de Coimbra e pelo Fundo do Desemprego, habilitará a Junta de Província da Beira Litoral, mediante escalonamento conveniente, com a importância de nove mil contos, montante previsto do custo do Instituto Maternal, recebendo em contrapartida o recinto do Ninho dos Pequenitos actual (terreno e construções). Esquema formal: Comissão Administrativa das Obras da Cidade Universitária de Coimbra: Terreno do Ninho, três mil e quinhentos contos; edifícios existentes, mil contos. Fundo de Desemprego: Comparticipação nas despesas com a construção do Instituto Maternal, quatro mil e quinhentos contos. Total nove mil contos.

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b) A construção do Instituto Maternal será levado a efeito pela Junta de Província, segundo o projecto a fornecer pelo Ministério das Obras Públicas, no regime de obras comparticipadas pelo Fundo de Desemprego. As obras serão iniciadas no prazo de seis meses, dando‑se precedência às relativas a novas instalações do Ninho dos Pequenitos, de forma a que o estado entre efectivamente na posse do actual Ninho e construções – Excepto Escola de Enfermagem – até final de Setembro de mil novecentos e cinquenta e cinco. O edifício da Escola de Enfermagem – só poderá ser entregue ao Estado após a conclusão dos pavilhões da Escola Normal e Maternidade do novo Instituto Maternal. c) O Ministério das Obras Públicas obriga‑se a construir novas instalações para a Escola do Magistério Primário, iniciando desde já o estudo do respectivo projecto e imprimindo às obras subsequentes a maior rapidez possível e esforçando‑se por libertar as actuais instalações na Quinta da Rainha antes do fim do primeiro semestre de mil novecentos e cinquenta e sete. O Ministério das Obras Públicas colaborará com a Junta de Província da Beira Litoral nas diligências para se encontrar uma solução de instalação provisória para a Escola de Magistério Primário, que permita antecipar sensivelmente a referida data. A Junta deliberou aceitar as condições do acordo proposto e encarregar o Excelentíssimo Presidente de outorgar na respectiva escritura de venda, fixando as condições que julgar necessárias para a resolução do assunto até final.»97 A Comissão Instaladora da Delegação do Instituto Maternal da Zona Centro era constituída pelo Prof. Doutor Fernando Baeta Bissaya Barreto, Dr. José dos Santos Bessa, Dr. José de Miranda Vasconcelos e José Pinto Teles. O projecto da obra de construção dos edifícios para a Delegação do Instituto Maternal, em Coimbra, seria solicitado ao arquitecto Carlos Ramos98, tendo a construção sido arrematada por António Veiga, de Lisboa, pelo preço da sua proposta ‑ 9.579.900$00 ‑ com parecer favorável da Direcção Geral dos Serviços de Urbanização99. No escalonamento das verbas a pagar pela Comissão Administrativa das Obras da Cidade Universitária à Junta de Província para construção do Instituto Maternal, definiu‑se a construção do Ninho

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dos Pequenitos para 1954, no valor de 500.000$00, pequena fatia de um imenso bolo que ascendia a 4.655.500 escudos, autorizados por portaria publicada no Diário do Governo, Nº 239, de 11 de Outubro de 1954100. O decreto‑lei nº 40.046, de 22 de Janeiro de 1955 (Diário do Governo, I.ª série, p. 66), autorizará a Comissão Administrativa do Plano de Obras da Cidade Universitária de Coimbra, a celebrar escritura com a Junta de Província nas seguintes condições: «Considerando que para a construção das novas instalações da Associação Académica de Coimbra, previstas no plano de obras da Cidade Universitária de Coimbra, o local que reune melhores condições para esse efeito é o das actuais instalações do Ninho dos Pequenitos, abrangendo terrenos e edificações; Considerando que a Junta de Província da Beira Litoral, entidade a quem pertencem as instalações do Ninho dos Pequenitos, concorda em vender ao Estado essas instalações (…) Artigo 1.º É autorizada a Comissão Administrativa(…) a celebrar escritura com a Junta de Província da Beira Litoral para a venda por esta ao Estado das actuais instalações (terrenos e edificações) do Ninho dos Pequenitos em Coimbra, pela importância de 4.500.000$00». Esta verba seria liquidada de forma faseada entre 1955 e 1958. Entretanto, no segundo semestre de 1955, as instalações do antigo Ninho dos Pequenitos seriam encerradas sendo o mesmo transferido para a Casa da Criança de Castanheira de Pêra, enquanto se concretizavam as novas construções do Instituto Maternal. Durará algum tempo a mudança de todos os edifícios para as novas instalações, designadamente da Escola Normal Social, última a desocupar os antigos espaços da Junta. Aproximadamente duas décadas depois de apresentado o plano geral das construções, a 28 de Abril de 1963, eram inauguradas as novas instalações na Quinta da Rainha da Delegação do Instituto Maternal da Zona Centro, sob a alta presidência do Chefe de Estado, Almirante Américo Deus Rodrigues Thomaz. Substituíam‑se deste modo não só as antigas instituições congéneres do Largo da Sé Velha bem como o Ninho dos Pequenitos, o Parque Infantil Oliveira Salazar e o Jardim anexo, até então localizados na Praça da República mas

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que tiveram de ser sacrificados à construção das novas instalações para a Associação Académica, cujo anúncio público das obras se fez a 20 de Fevereiro de 1955. Como dissemos, o projecto do novo complexo da Quinta da Rainha foi elaborado pelo arquitecto Prof. Carlos Ramos, sob a consultoria técnica do Eng.º Júlio de Araújo Vieira. Ficou constituído pelas seguintes unidades: Maternidade Bissaya‑Barreto, Radiodiagnóstico e Radioterapia, Escola de Enfermeiras Parteiras Puericultoras, Ninho dos Pequenitos, Parque Infantil “Doutor Oliveira Salazar”, Creche “D.ª Maria do Resgate Salazar”, Lactário, Edifício das Consultas Externas, Sala de Conferências, Administração, Lavandaria e Rouparia, Cozinha Geral, Depósito de Medicamentos, Jardins, Desenhos e Pinturas Murais, Baixos Relevos Esculturais e Fontes de Energia. O Instituto Maternal seria classificado como o 1º Centro de Estudos de Puericultura do País. As competências do Instituto passavam pela assistência médico‑sanitária e social no âmbito da protecção materno‑infantil, realização de trabalhos de investigação clínica, laboratorial e de campo, formação de pessoal médico, de enfermagem e social, mantendo para tais fins um centro de estudos e de investigação científica. Ao discursar na cerimónia de inauguração percebe‑se que para Bissaya‑Barreto o ambiente era já de concórdia e união em torno do projecto. No entanto, para trás, ficara um historial de luta intensa que a emoção do momento não disfarçaria: «Neste momento, tão profundamente emocionante, em que vejo a materialização de pensamentos, de ideias, de projectos, em que vejo a solução de tantas dúvidas, de tantas preocupações e de tantas hesitações, ao contemplar esta obra, realmente grande, para as Mães (…) Ora, faz‑me bem a mim, no instante em que vai começar a funcionar este Monumento à Mãe desconhecida, que há‑de tornar feliz muitas Mães e que há‑de fazer felizes muitas crianças da Nossa Terra, evocar a memória das Nossas Mães. Façamos pois, uns momentos de íntimo recolhimento e profunda saudade, em adoração a todas Elas»101. De facto, o Ninho dos Pequenitos transformava‑se, deixando essencialmente o carácter sanitário e acentuando a sua vertente social, ficando‑lhe reservado especial papel no contexto do Instituto Maternal: «Vem substituir uma instituição que foi sacrificada à construção das novas instalações destinadas às actividades circum‑escolares.

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Destina‑se a recolher crianças da 1.ª infância que, temporariamente, não possam ser mantidas em ambiente familiar – por perda da Mãe, do Pai ou dos dois, por doença grave de um deles ou por qualquer outra situação que o imponha. Dispõe de dormitório, refeitório, salas de banho, salas de distracção e educação, de solário e de jardins privativos. As crianças aqui recolhidas serão assistidas segundo os modernos preceitos, por pessoal especializado»102. Por alturas da transferência do Ninho, da Praça da República para o Instituto Maternal, haviam‑se operado significativos progressos científicos na luta contra a tuberculose, os quais por sua vez trouxeram importantes transformações ao nível da relação criança‑mãe: «A vacinação pelo BGC e a terapêutica com os tuberculostáticos tinham tornado obsoleta a indicação de internamento para separar o RN da mãe tuberculosa, mas permanecia a necessidade de o fazer por motivos sociais e cresciam as preocupações pelos problemas afectivos»103. Na época, o Ninho era complementado por duas instituições que desde cedo o acompanharam: ‑ «Parque Infantil “Doutor Oliveira Salazar” ‑ Também substituiu uma instituição congénere que desapareceu pelas mesmas razões que acima referimos. Destina‑se a crianças da 2.ª infância (entre os 2,5 e os 7 anos) que aqui farão estágio diurno. Funcionará como o “jardim de Infância”. As crianças que aqui passam o dia – principalmente filhos de operários e de famílias modestas – terão assegurados não só a alimentação, mas também a sua higiene individual, a profilaxia das doenças contagiosas e a moderna pedagogia própria das suas idades. Dormitórios, salas de reunião de pequenos grupos com educadoras, aulas ao ar livre, piscinas, jardins, balneários e sanitários, constituem as dependências onde há‑de decorrer o seu dia na instituição. Pessoal especializado velará pela sua saúde e pela sua educação». ‑ «Creche “D.ª Maria do Resgate Salazar” – Vem completar as duas instituições precedentes. Servirá para estágio diurno das crianças da primeira infância, pertencentes a famílias que, por circunstâncias sociais ou outras razões, carecem de quem lhas vigie e proteja durante o dia»104.

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O Ninho dos Pequenitos foi inaugurado a 28 de Abril de 1969, voltando a Coimbra para novas e modelares instalações depois de mais de uma década instalado na Casa da Criança de Castanheira de Pera105. Uma cerimónia importante e concorrida, um facto destacado pela comunicação social local: «A entrada em funcionamento das novas instalações foi ontem feita, numa cerimónia simples mas bastante significativa pelas pessoas que quiseram estar presentes e entre elas, além de algumas senhoras, e muitos outros que não nos foi possível registar, os Srs. Eng.º Horácio de Moura, governador civil; Eng.º Araújo Vieira, presidente da Câmara Municipal; dr. Santos Madeira, director do “Diário de Coimbra”; Eng.º Costa Alemão, director dos Edifícios Nacionais; Dr. Moura Relvas; Dr. Francisco Cortez, vereador da Câmara Municipal; Dr. Santos Bessa, Director Clínico do Centro de Saúde e Assistência (…) médicos e altos funcionários de toda a obra da Junta Distrital e da Fundação Bissaya‑Barreto, que a ela e às suas instituições estão ligados O Sr. Prof. Bissaya Barreto depois dos cumprimentos, guiou todos os presentes nas visitas às novas instalações, cujas dependências, dormitório, sala de aula, refeitório, copa, roupeiro, com mobília apropriada e com decorações no sentido de chamarem a atenção das crianças, foram demoradamente percorridas, bem como os jardins onde já brincavam crianças»106.

Discurso de Bissaya-Barreto na inauguração do Ninho dos Pequenitos «Meus Senhores: Vai recomeçar a sua vida, em Coimbra o Ninho dos Pequenitos, instalado há anos, e durante anos, na área hoje ocupada pelos edifícios da Associação Académica, na Rua Oliveira Matos e vizinhanças, à qual cedeu os terrenos que lhe pertenciam. Dali seguiu para o conjunto assistencial infantil de Castanheira de Pera donde agora vem para ocupar instalações próprias e apropriadas, erguidas de propósito onde, espero, continuará a sua missão, mais ac-

C. A transferência do Ninho dos Pequenitos…

tualizada, pois são passados anos e, neste prazo, muito se tem ensinado, muito se tem aprendido sobre a Criança, desde a sua vinda ao Mundo até à entrada no Mundo da Escola e da Vida… Não há exagero, nem imodéstia se disser que o Ninho dos Pequenitos teve uma acção notável e marcante do movimento Pró-Criança no nosso País, pelo interesse que despertou, pelas iniciativas que provocou, pelas limitações que determinou, mas sobretudo porque trouxe para Portugal as Missionárias de Maria com as suas puericultoras, assistentes sociais, educadoras de infância, diplomadas em Pediatria e mais pessoal em que agora se fala constantemente, mas que, trinta anos atrás, quando começámos ninguém sabia o que eram e para que eram… Instalámos pois, em Portugal métodos novos de trabalho; iniciámos directrizes novas sobre cuidados Pró-Criança; difundimos regras de higiene infantil, inteiramente desconhecidas entre nós, onde, como obra de Protecção à Criança havia apenas o Asilo de Infância Desvalida e a herança da antiga Roda para enjeitados, ambas instituições nas mãos de mestres da douta Faculdade. (…) Se notável foi com efeito, a influência exercida no nosso País, pelo Ninho sob o ponto de vista científico, assistencial e humano, não foi menos decisiva a influência da criação de instalações próprias e de mobiliário adequado cuja anatomia e fisiologia se apresentavam inteiramente novas e originais, pelo inedetismo dos modelos, na forma e nas dimensões, que em breve, se generalizaram, sugerindo estranhos e policrómicos tipos de decorações, que, hoje, trinta anos depois, se consideram correntes, aconselháveis e indiscutíveis. (…) Com este Passado, e tendo no seu Passado muito mais iniciativas de interesse e de grande responsabilidade, o Ninho tinha de voltar para Coimbra e tinha de vir ocupar instalações, que não desmerecessem das que havia criado e vivido, instalações que acabaram de visitar…Esta é pois a sua nova Casa e vou dizer-lhes o que vai fazer…qual a sua missão, missão que só poderá ser bem cumprida com o esforço colaborante de todos que, trabalham neste Instituto. O Ninho, inicialmente, foi concebido para receber as crianças, que houvessem de ser separadas das Mães, logo a seguir ao nascimento, pelo perigo, que para o filho possa representar o convívio com a Mãe doente. Estavam e estão ainda em semelhante situação os filhos das tuberculosas e os filhos das leprosas, precisamente para que não fiquem tuberculosos e leprosos… Nunca, em qualquer outro caso, sem fortíssimas razões poderemos consentir que o filho, nos primeiros tempos, seja afastado da mãe…» [Diário de Coimbra, 29 de Abril de 1969, P. 5]

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Inauguração do Complexo Materno-Infantil da Quinta da Rainha. As entidades oficiais aguardando o início da cerimónia: em primeiro plano e ao centro Américo Tomás, Presidente da República, ladeado por Horácio de Moura, Governador Civil de Coimbra.

Inauguração do Complexo Materno-Infantil da Quinta da Rainha. As entidades oficiais visitando as instalações: da esquerda para a direita e em primeiro plano, Américo Tomás e Bissaya-Barreto

Como nos recorda uma das primeiras educadoras, Dra. Graça Araújo, o Ninho abriu com crianças vindas de Castanheira de Pera e Penacova. Esta unidade foi inicialmente projectada e pensada para o local onde afinal se veio a instalar o parque infantil. De facto, o Prof. Bissaya alterou o esquema uma vez que pensou em abrir um espaço para os filhos dos funcionários nesse local. O conjunto Ninho‑Creche‑Parque Infantil designava‑se por Obra Infantil do Instituto Maternal. De acordo com o desejo do Professor Bissaya‑Barreto a Obra foi dotada de «… Educadoras de Infância, profissionais que em Portugal, estavam a começar a ser formadas e cuja existência e funções eram quase desconhecidas» 107. Eram provenientes do «Instituto Formadoras da Infância de Nossa Senhora da Anunciação, em Coimbra, que seguia o método Montessori». No depoimento que nos legou, refere a educadora o grande interesse posto pelo

C. A transferência do Ninho dos Pequenitos…

mentor de toda a obra: «O Dr. Bissaya queria que o Instituto Maternal fosse tão bom no conteúdo pedagógico quanto nas suas magníficas instalações e foi por isso que a minha colega de curso que abriu o Parque, adquiriu o melhor material didáctico da época (C.Miranda) e proporcionou às colegas a melhoria dos seus conhecimentos através das revistas francesas, Education Enfantine, Pomme d´Api e L´École des Parents. Foram, ainda, nossa referência os livros, “Introdução à Psicologia da Criança” de 1960 e “La Pedagogia Contemporanea” de 1961, de Émile Planchar, ilustre professor universitário de Coimbra e posteriormente de Madrid». Este valioso testemunho, alude também à evolução no funcionamento e organização internos da instituição (objectivos, apoio técnico), na viragem dos anos 60 para a década seguinte: «Mas o Dr. Bissaya mais uma vez marca a diferença pois o Ninho foi perspecti-

Inauguração do Complexo Materno-Infantil da Quinta da Rainha. Discurso de Bissaya-Barreto. Da esquerda para a direita, Santos Bessa (pediatra e deputado), Eng. Arantes e Oliveira, Ministro das Obras Públicas, Américo Tomás, Presidente da República

Inauguração do Complexo Materno-Infantil da Quinta da Rainha. As entidades oficiais visitando as instalações: da esquerda para a direita e em primeiro plano, Américo Tomás e Bissaya-Barreto

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vado por ele não só para acolher crianças de famílias disfuncionais, mas também para apoiar mães que tivessem de estar internadas, quer na maternidade quer por tuberculose, e ainda as mulheres trabalhadoras no Instituto Maternal com turnos à noite. Tentámos, com grande abertura de espírito, transformar o “internato” na “casa das crianças”. Para individualizar mais as crianças compraram‑se roupas e até bibes diferentes. Arranjaram‑se armários de madeira, tipo cacifo, para que cada uma tivesse as “suas coisas”. Para dar as melhores condições psico‑pedagógicas havia no Ninho equipas técnicas interdisciplinares, constituídas por enfermeiras para os bebés e educadoras para os mais velhos, ambas apoiadas por vigilantes. Foi inclusivamente criada uma sala de actividades de jardim‑de‑infância para onde foi trabalhar a educadora Maria Teresa Sarmento, que era da mesma Escola e tinha estagiado connosco no Parque e que, após a minha saída do Ninho, ficou responsável por ele (…) foi recrutada também em 1969 uma assistente social, Margarida Cordeiro Porto para pôr em ordem todos os processos das crianças e acompanhar as suas famílias. Foram por ela trabalhados também processos de adopção de crianças que ali estavam».

D. O Ninho dos Pequenitos: do Centro de Saúde e Assistência…

D. O Ninho dos Pequenitos: do Centro de Saúde e Assistência Materno‑Infantil do Dr. Bissaya‑Barreto à integração no Centro Hospitalar de Coimbra A partir de 1964 funcionou na dependência do Instituto Maternal e nas instalações que constituíam o conjunto assistencial da Quinta da Rainha o Centro de Saúde e Assistência Materno‑Infantil do Dr. Bissaya Barreto, criado pelo Decreto‑Lei nº 45.591, de 03 de Março do mesmo ano, emanado do Ministério da Saúde e Assistência cujo nome seria posteriormente, rectificado para Obra de Assistência Materno‑Infantil do Dr. Bissaya Barreto, para não se confundir com a designação dos Centros de Saúde então criados. Importa referir, com especial atenção, que a este Centro se afectaram os seguintes estabelecimentos: Ninho dos Pequenitos, Parque Infantil Dr. Oliveira Salazar e Creche D. Maria do Resgate Salazar (que estavam dependentes da Junta Distrital); a Maternidade Bissaya‑Barreto, dispensários materno‑infantis da área de Coimbra e Escola de Enfermagem (até então integrados na Delegação do Centro do Instituto Maternal)108. O Centro tinha como principais competências: «1º Exercer todas as actividades relacionadas com a assistência médico‑sanitária e social do âmbito da protecção materno‑infantil; 2º Realizar trabalhos de investigação clínica, laboratorial e de campo respeitante à saúde materno‑infantil; 3º Formar e adestrar pessoal médico, de enfermagem e social para o exercício de funções no domínio da assistência materno‑infantil»109. Uma palavra também para a Casa da Mãe. A ideia da sua criação, na Figueira da Foz, nasceu no Verão de 1944, tendo‑se aproveitado para o efeito o edifício onde estivera o Hospital Militar. A inauguração ocorreu em Outubro de 1947 e durante 16 anos a Casa da Mãe funcionou como extensão da Delegação da Zona Centro do Instituto Maternal. Era uma unidade assistencial, especializada, que procurava diminuir os infanticídios e abandono de recém‑nascidos. Com a criação do Centro de Assistência Materno‑Infantil, a Casa da Mãe passou a depender do Instituto Maternal em Lisboa e, por

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decreto do Ministério da Saúde e Assistência, de 5 de Maio de 1967, foi‑lhe conferida autonomia. A importância do Ninho dos Pequenitos, em termos técnicos, está bem patente no facto de caber à sua directora a selecção das Assistentes Sociais especializadas em Puericultora que deveriam reger as diversas Casas da Criança. Sete anos depois da criação do Centro de Saúde e Assistência Ma‑ terno‑Infantil do Dr. Bissaya Barreto, o Decreto‑Lei nº 93/71 de 22 de Março tornou possível a concretização de um dos últimos desejos do professor – a criação do Centro Hospitalar de Coimbra. Neste se incluíria quer o Centro de Saúde, criado em 1964, quer o estabelecimento dele parte integrante ‑ o Ninho dos Pequenitos. Recordemos o histórico decreto‑lei: «Artigo1º ‑ Ao abrigo do disposto no artigo 8º do Decreto‑lei nº 48 357, de 27 de Abril de 1968, é criado o Centro Hospitalar de Coimbra, dotado de personalidade jurídica e de autonomia administrativa, sem prejuízo da sua dependência das Direcções‑Gerais de Saúde e dos Hospitais. Artigo 2º ‑ 1. O Centro Hospitalar de Coimbra é um complexo funcional, com órgãos centrais de administração e de direcção técnica e serviços de apoio comuns, constituído pelos seguintes estabelecimentos: a) Hospital‑Geral da Colónia Portuguesa do Brasil; b) Obra de Assistência Materno‑Infantil do Dr. Bissaya Barreto; c) Hospital Pediátrico de Celas; d) Hospital Ortopédico e de Recuperação»110. Pelo mesmo Decreto‑Lei o Centro de Neurocirurgia de Coimbra, foi integrado no Hospital Geral da Colónia Portuguesa do Brasil, passando a constituir um Serviço Central do mesmo Hospital. A cidade de Coimbra reagiu à criação do seu Centro Hospitalar. A 07 de Abril de 1971 uma representação de Coimbra deslocou‑se a Lisboa para agradecer ao Ministro.

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E. O Ninho dos Pequenitos depois de Abril de 74 1. A criação da Unidade de Intervenção Precoce (UIP) «A U.I.P., instalada em edifício contíguo ao Ninho dos Pequenitos, constituía uma antiga aspiração da Maternidade Bissaya Barreto, em consonância com a filosofia sempre aí presente da valorização das questões sociais e da humanização dos cuidados às grávidas e crianças, que em alguns aspectos, foi pioneira no País». Foi com estas palavras que Vicente Souto nos relembra os contornos da criação da U.I.P, que a seguir recordamos nos seus passos essenciais. Em Maio de 1986, numa reunião da Liga de Amigos, fez‑se a apresentação pública à Fundação Bissaya‑Barreto do projecto da Unidade de Intervenção Precoce que pretendia integrar o Ninho numa «Unidade que fizesse a profilaxia desde o período pré‑natal das dificuldades de relação precoce. O Ninho funcionaria como a Unidade de Internamento para as situações ainda não resolvidas e permaneceria como um Centro de orientação e tratamento das crianças em situação de abandono»111. Uma orientação que não mais se perdeu sendo entretanto reforçada por nova ideia: «Mais tarde, dado que esse abandono poderia ter sido antes do parto, a ideia foi a de fazer do Ninho uma “Unidade de Cuidados Intensivos para a Relação”. Mesmo no internamento seria fomentada a relação precoce com mãe, se isso fosse possível e, caso de isso não acontecer, esse internamento seria tratado numa perspectiva de vinculação, por um pessoal preparado para o fazer. Esta perspectiva seria mantida até à solução da entrega a um casal ou família, capaz de a adoptar de modo correcto, num espaço de tempo tão curto quanto possível»112. A partir de 1988 o Ninho foi incluído num projecto que mereceu a aprovação do Ministério da Saúde e que se traduziu na criação da Unidade de Intervenção Precoce na Relação Mãe/Filho, aprovada em Dezembro daquele ano, e anunciada publicamente na sessão de homenagem ao Dr. Santos Bessa prestada no Hospital Pediátrico de Coimbra pela Ministra da Saúde, Dr.ª Maria Leonor Beleza. Um

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anúncio que foi o corolário do elevado interesse que o distinto pediatra sempre tivera na criação da dita unidade. A unidade designou‑se, inicialmente, por Centro de Intervenção Precoce de Casos de Risco Relacional. Foi autor do projecto‑piloto o Dr. Jorge Biscaia, que apresentou a proposta ao Ministério da Sáude «…visando a formação dum centro pioneiro em Portugal, onde se instalarão os serviços de apoio ao relacionamento mãe/filho, que se encontram a funcionar no Instituto Maternal Bissaya‑Barreto»113. A 26 de Outubro de 1990 foi inaugurado pelo Sr. Vice‑Primeiro Ministro, Dr. Fernando Nogueira e pelo Ministro da Saúde, Dr. Arlindo de Carvalho, o novo edifício da Unidade de Intervenção Precoce (UIP) na relação mãe/filho (afixando‑se placa evocativa do acto), onde se integrava tecnicamente o Ninho, já renovado. Uma unidade que começou a funcionar sob direcção do Dr. Jorge Biscaia e Prof. Eduardo Sá, com objectivos bem claros: «Começou por ser um serviço que recebia as mulheres que tinham sido arrastadas para a prostituição; adolescentes violadas pelos pais ou irmãos; grávidas que se drogavam; que não queriam os filhos; que tinham filhos com anomalias detectadas in útero; que sofriam de problemas psicológicos após anteriores abortamentos provocados, no fundo aquelas que ninguém queria. Começaram a ser vistas ali por uma equipa com Assistentes Sociais, Psicólogos, Pediatras, Obstetras e Enfermeiras que lhe faziam de imediato a observação clínica e a ecografia e depois as seguiam até ao parto assistido. Iam sabendo que os apoios não acabavam mesmo após o nascimento»114. Acrescente‑se ainda que algumas mães potencialmente abandonantes, como as que viviam em situação de prostituição eram acolhidas a seguir ao parto pelas Irmãs Adoradoras que colaboravam com o Ninho.

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Afectos no Ninho nas décadas de 60/70

A equipa multidisciplinar. Identifica-se a Educadora Graça Araújo e a Vigilante Isidora.

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Afectos no Ninho nas décadas de 60/70

A equipa multidisciplinar. Identifica-se a Educadora Graça Araújo e a Vigilante Isidora.

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Santos Bessa, O Ninho e a Unidade de Intervenção Precoce Aquando do I Encontro com a Ternura, realizado na Casa Museu da Fundação Bissaya-Barreto, em Maio de 1991, o Dr. Jorge Biscaia assinalou muito justamente «…a ligação muito íntima que a Unidade de Intervenção Precoce sempre teve com o Dr. Santos Bessa. Foi sugestão sua que pela primeira vez apresentei todo o seu projecto numa reunião de amigos da Fundação, foi na sua festa de homenagem que esta Unidade foi publicamente aprovada, a sua inauguração coincidiu com o último acto público a que ainda conseguiu estar presente. Na sua intervenção Jorge Biscaia considerou ainda o Ninho dos Pequenitos como «…um Serviço de Cuidados Intensivos para os casos de abandono e de maus tratos e que está ligado à Unidade de Intervenção Precoce como seu Serviço de Internamento. Foi uma Obra criada e acarinhada pelo Prof. Bissaya Barreto e pelo Dr. Santos Bessa há mais de 60 anos e que agora tentamos ajudar». O Dr. José dos Santos Bessa nasceu na Carapinheira do Campo, concelho de Montemor o Velho, a 25 de Junho de 1904. Terminou o curso de Medicina em 1930, foi interno dos Hospitais Civis de Lisboa (1931-1934) e médico militar, especializando-se em Pediatria em 1934. Nos finais dos anos 30 fixa residência em Coimbra, sendo em 1941 mobilizado para os Açores, como Chefe de clínica médica do Hospital Militar de Ponta Delgada. Regressado em 1944 a Coimbra, inicia uma íntima colaboração com o Prof. Dr. Bissaya-Barreto, em especial na Obra de Protecção à Grávida e Defesa da Criança e Luta Anti-Tuberculosa. A este nível ocuparia múltiplos postos de significativa responsabilidade: Chefe de Serviços da Delegação de Coimbra do Instituto Maternal, de 1946 a 1956, Delegado do Instituto Maternal na Zona Centro, de 1957 a 1964; Delegado do Instituto de Assistência Nacional aos Tuberculosos, desde 1951; Médico-Chefe da B.C.G., Zona Centro, desde 1952; Director Clínico do Centro de Saúde e Assistência do Prof. BissayaBarreto, desde Marcço de 1964. Foi deputado à Assembleia Nacional por Coimbra, desde 1945, chegando a ser vice-presidente. Naquele órgão defendeu os interesses de Coimbra e região de forma constante e incansável. A ele se deve, por exemplo, a construção do Hospital Pediátrico de Coimbra. Como profissional da saúde pertenceu a diversos organismos: Presidente do Conselho Regional de Coimbra da Ordem dos Médicos (1950-1953; 1959-1974); Presidente da Delegação da Cruz Vermelha Portuguesa, em Coimbra; Presidente da Sociedade Portuguesa de Pediatria, de 1961 a 1963; Membro correspondente da Associação Francesa de

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Pediatria; Membro da Comissão Nacional de Vacinações; Professor da Escola Normal Social; Professor de Pediatria na Faculdade de Medicina de Coimbra (1967-1974). Publicou diversas obras. Na qualidade de Pediatra formou gerações de especialistas. Para Jorge Biscaia o seu mestre “Formou assim uma escola muito antes de ser considerado para Professor de Pediatria”. Em termos de personalidade definiu Santos Bessa como “preocupação pelos outros, tenacidade, lealdade”. De espírito aberto ao futuro, tinha sede de novos conhecimentos. Insistia junto dos seus alunos que a Pediatria era uma disciplina social, para assim se conseguir o bem-estar das crianças. Foi fundador e vogal do Conselho de Administração da FBB entre 1958 e 1991. Faleceu a 30 de Janeiro de 1991, quando contava 85 anos.

A UIP foi integrada no Centro Hospitalar de Coimbra (Maternidade Bissaya‑Barreto) através da Portaria nº 532/91, publicada no Diário da República I Série B, de 20/06/1991. Desde então tem como objectivo intervir na melhoria da relação mãe‑filho e pai‑filho e acompanhar antes e após o nascimento, as situações de risco. Procura o reforço da relação pais‑filho e a estimulação precoce nas famílias de risco como meio eficaz de melhorar a saúde e o bem‑estar das crianças, de potenciar o seu bom desenvolvimento psicomotor e de prevenir os maus tratos. Funcionam nesta Unidade as consultas de: Obstetrícia, Psiquiatria, Pedopsiquiatria, Psicologia e Pediatria. No novo contexto, desenhado a partir de 1991, o Ninho passou a ter como finalidade acolher e encaminhar as crianças na idade pré‑escolar, que se encontrassem em risco, por abandono ou negligência dos pais, ou porque foram vítimas de maus‑tratos, impossibilitando a continuação no seu meio familiar. Em íntima ligação com a Maternidade Bissaya‑Barreto, pela problemática antiga ligada à mãe e às crianças, ali se tem feito a profilaxia de algumas situações desde o período perinatal. Na história da UIP e, ao nível da coordenação, é justo destacar o papel decisivo desempenhado inicialmente pelo Dr. Jorge Biscaia e, posteriormente, pela sua sucessora, Dra. Fátima Negrão.

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2. A cooperação entre o Centro Regional de Segurança Social de Coimbra e a Fundação Bissaya‑Barreto Com o Ninho integrado naquela unidade onde acolhia «…crianças por razões de natureza social e ser exclusivamente custeado por uma instituição de saúde, levou à necessidade de uma análise cuidadosa sobre a sua viabilidade futura, tanto mais que o Ministério da Tutela passou a considerar exclusivamente o financiamento de actividades de carácter assistencial, de ensino e investigação dos hospitais, o que punha em risco o futuro daquela unidade»115. Das reflexões acerca deste momento importante e sensível para o futuro do Ninho e da UIP, nasceu importante decisão: «Considerada a “imprescindibilidade” do Ninho dos Pequenitos e até a necessidade de alargamento da sua capacidade, foram realizados contactos com a Fundação Bissaya Barreto e os serviços locais da Segurança Social, no sentido da celebração de acordos de cooperação que garantissem a sua viabilidade financeira, o que teve, por parte da Fundação, um bom acolhimento, desde logo pelas ligações de carácter afectivo geradas no sonho e na capacidade de realização de um patrono comum»116. Assim, em 1990 e no seguimento de variados contactos foi assinado um protocolo entre o C.H.C./Maternidade Bissaya‑Barreto e a Fundação Bissaya Barreto (IPSS) para apoio ao Ninho, passando a Fundação a deter o suporte jurídico do Ninho. Esta primeira plataforma de entendimento conduziu, posteriormente, a três acordos de cooperação entre a FBB e a Segurança Social: ‑ O primeiro foi assinado a 27 de Maio de 1991. Tratou‑se de um acordo de cooperação típico que regulou o funcionamento do Lar para menores. Tinha por finalidade «…o desenvolvimento por parte da Instituição e de acordo com as necessidades reais da Comunidade e prioridades estabelecidas em matéria de Acção Social de actividades de apoio na área populacional de Infância e Juventude (…) serão exercidas no Internato situado em Ninho – Maternidade Bissaya‑Barreto – Coimbra, equipamento/serviço, devidamente dimensionado e equipado para o funcionamento das actividades que a Instituição se

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obriga a manter de acordo com as normas e orientações estabelecidas e em conformidade com os seus estatutos»117. Este acordo, como nos recorda a Dra. Albertina Costa (apêndice 1), «veio a permitir que fossem realizadas obras de requalificação, assim como, a admissão de pessoal, com vista à reabertura do berçário o que veio a concretizar-se colmatando assim a ausência de uma estrutura que recebesse bebés no distrito». Na altura fixou‑se a lotação máxima de utentes em 25, definiu‑se a comparticipação financeira do Centro Regional e acordou‑se na renovação automática do acordo findo o primeiro ano de duração, por igual período, desde que não fosse denunciado ou rescindido. ‑ O segundo acordo foi rubricado a 12 de Julho de 1995 e teve como objectivo «dar execução a um projecto de Acolhimento Familiar para crianças em risco sendo ou não deficientes». As actividades eram exercidas a partir da sede da FBB «…para o Serviço de Acolhimento Familiar de Crianças em Risco, em estreita colaboração com o Estabelecimento “Ninho dos Pequenitos”, equipamento da Fundação, integrado no Projecto de Acolhimento Familiar»118 e abrangeu 5 crianças em famílias de acolhimento. ‑ A 1 de Setembro de 1997 celebrou‑se o último dos acordos entre as instituições, cabendo à FBB o desenvolvimento de «…actividades de apoio, prioritariamente à Infância e Juventude (…) no âmbito da resposta social de Creche e localizam‑se no Ninho sito em Coimbra»119, prevendo‑se abranger 10 utentes. Estes acordos conferiram ao Ninho dinâmicas novas, dando origem a uma reconhecida e profícua colaboração. Disso nos dá conta o depoimento da Dra. Fátima Mota: «…o caso do Projecto Renascer que teve como objectivo prevenir e reduzir o tempo de institucionalização, em especial das crianças internadas no Ninho dos Pequenitos (…) desenvolveram‑se igualmente acções direccionadas para mulheres, maioritariamente mães e crianças vítimas de violência doméstica, num tempo (1995) em que o problema emergia, com um carácter de reconhecido pioneirismo e inovação, como foi o caso do Projecto Re‑Formar, do Serviço SOS Mulher, da Casa da Mãe e da Casa do Pai onde se dava continuidade à acção do Ninho, acolhendo crianças com idades compreendidas entre os 6 e os 12 anos de idade»120.

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A história de uma adopção «E o dia-a-dia continuava de uma forma absorvente, e os anos iam passando sem quase nos darmos conta. Mas, apesar de todo este envolvimento, no imaginário de cada um de nós sempre estiveram os filhos que não tínhamos mas desejávamos. Estávamos conscientes de que tínhamos muito AMOR para dar e que em algum lugar haveria uma criança a precisar desse amor. Começámos então a dispor de algum tempo nos fins-de-semana para ir connosco uma criança que vínhamos buscar ao Ninho. E sentíamo-nos bem… Nesses momentos, aqueles pequenitos que trazíamos até nossa casa preenchiamnos o dia, para eles era um contacto íntimo com um meio familiar, para nós era a alegria de os ver tão felizes. E começou a desenhar-se para nós o cenário possível da adopção de uma criança. Até que um dia… Um dia, a educadora responsável pelo Ninho, Teresa Sarmento, que já sabia da nossa disponibilidade para adoptar uma criança, e que já nos conhecia há uns anos, disse-me, num encontro breve: “Tenho no Ninho duas crianças para vós. Passa lá, eles são irmãos e estão em condições de poder ser adoptados”. Pensei de imediato: “A Teresa enloqueceu! Duas crianças? (…) à noite em casa contei ao meu marido a conversa com a Teresa. A resposta dele foi idêntica à minha: “Logo duas? (…) Não voltámos a falar nisso mas em cada um de nós ia “fermentando” qualquer coisa e aquilo que inicialmente parecia uma loucura, ia ficando cada vez mais esbatido ao mesmo tempo que se ia avolumando o desejo de conhecer as duas crianças. Entretanto era Verão e as crianças estavam na praia. Num Domingo à tarde fomos até à praia para as visitar. Isolado de todos os outros estava um menino a brincar sozinho, muito concentrado na sua actividade que só olhou para nós com um ar desconfiado quando nos viu a pegar na sua irmãzita ao colo. Esta era uma bebé linda (…) muito pequenina, muito branquinha com uns lindos olhos verdes e uns pelinhos louros na cabeça a fingir cabelo, parecia “nadar” num “babygrow” castanho muito pequeno para uma criança da idade dela, mas enorme para ela. A partir desse dia ficámos com a certeza de que seriam aqueles os nossos filhos. Quando regressaram da praia passámos a trazer para casa, todos os fins-desemana, o irmão mais velho, depois as estadias passaram a ser mais prolongadas e cada vez lhe custava mais a regressar ao Ninho, até que finalmente vieram os dois para nossa casa nesse dia 1 de Setembro de há seis anos atrás. Nesse dia nasceu uma família – Já não éramos só dois, passámos a ser quatro.» [Maria do Rosário Gama - «O Filho e o Nascimento da Família» In O Amor e o Abandono, I Encontro com a ternura, 26 Maio 1991, Unidade de Intervenção Precoce da Maternidade Bissaya-Barreto e Fundação Bissaya-Barreto (org. de), P. 27]

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A Casa da Mãe foi a resposta a situações complexas – a das mães violadas ou adolescentes. Ali se fazia o seu internamento com o filho em quartos individuais, numa casa recuperada da responsabilidade da FBB: «O internamento do filho era sempre demorado. Na realidade dada a idade dessas mães havia a preocupação com sua escolaridade e continuação dos estudos de modo a dar‑lhes um pequeno curso profissional (Restauração ou Manicure por exemplo) de modo a proporcionar‑lhes uma certa independência económica no futuro. Esse tempo, necessariamente longo de internamento, permitia o difícil trabalho duma equipa pluridisciplinar (Assistente social, psicóloga/psiquiatra) que procurava desenvolver a relação mãe / adolescente ‑filho e as apoiasse até lhes dar uma vida mais adulta e consciente»121. Contudo, o estreitamento institucional sofreria duro revés em 2004, altura em que os ditos acordos foram denunciados pela Fundação Bissaya‑Barreto. 3. A criação e acção da SORRISO (Associação dos Amigos do Ninho dos Pequenitos) Por comunicação de 4 de Maio de 2004 a Fundação Bissaya‑Barreto denunciou unilateralmente os acordos de cooperação celebrados com o Centro Distrital de Segurança Social, o que determinou a transferência da titularidade do acordo. Entretanto, alguns anos antes, mais propriamente a 16 de Novembro de 1998, havia-se constituído a SORRISO, de que foram fundadores entre outros: Dr. Vicente Manuel Nogueira Souto, Dr. Joaquim Eduardo Nunes Sá, Maria de Fátima dos Reis Neves, Dr. Jorge Biscaia, Dr.ª Albertina Costa, Eng. Pedro Malta, Dr.ª Fátima Mota, Dr.ª Eugénia Castanheira. No documento constitutivo da associação pode ler‑se «Que são os fundadores de uma Associação, sem fins lucrativos, denominada “SORRISO, ASSOCIAÇÃO DOS AMIGOS DO NINHO DOS PEQUENITOS” (…) Que a Associação tem por objecto a promoção de actividades de apoio a crianças…»122. Na mesma ocasião elaborou‑se um projecto de estatutos.

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O Ninho dos Pequenitos visto do exterior.

A denúncia do acordo obrigaria a alterações significativas: o Centro Distrital de Solidariedade e Segurança Social de Coimbra escolheria a SORRISO, em dois momentos diferentes, para assumir o novo acordo de cooperação: 1.A 20 de Setembro de 2004, sendo Presidente da SORRISO o Dr. Vicente Souto e Presidente do Conselho de Administração dos CHC, o Dr. António Veiga e Moura, celebrou‑se um acordo entre estas instituições tendo como objectivo a implementação de financiamento alternativo ao Ninho dando continuidade ao trabalho desenvolvido. Nesse documento a SORRISO constituía‑se «como suporte jurídico do Ninho dos Pequenitos e passará a receber e a gerir as verbas que lhe forem atribuídas pelo C.D.S.S.S. (…) manterá os objectivos que se propôs na data da fundação (…) a manter com idêntico padrão de qualidade, a actividade que tem vindo a desenvolver com crianças desprovidas de meio familiar normal». Por outro lado o CHC «…continuará responsável pela gestão técnica do Ninho dos Pequenitos através do seu serviço de Neonatologia a que pertence a Unidade

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de Intervenção Precoce, em cujo projecto o Ninho desde sempre foi incluído (…) a manter o apoio actual, nomeadamente a cedência das instalações (…) e compromete‑se, junto do Centro Distrital de Segurança Social, a encontrar a melhor solução para garantir o funcionamento do Ninho»123. O acordo definia, ainda, que as duas instituições criariam uma comissão conjunta com inclusão de um elemento da Segurança Social. Por outro lado, os encargos foram repartidos do seguinte modo: SORRISO: encargos com pessoal (auxiliares de acção educativa e contabilista), 4 famílias de acolhimento, material didáctico, roupas, material de consumo corrente (escritório), produtos de higiene e limpeza, actividades extracurriculares e transportes. Centro Hospitalar de Coimbra: encargos com pessoal (educadoras, assistente social, pediatras, psicóloga, pedopsiquiatra, auxiliares de O Jardim do Ninho dos Pequenitos.

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apoio e auxiliares de acção médica; prestação de serviços (limpeza, alimentação e tratamento de roupas), equipamentos e manutenção (instalações, água, luz e telefone), material de consumo corrente (escritório) e outros. 2. A 29 de Outubro de 2004, sendo Director do Centro Distrital de Segurança Social de Coimbra o Dr. José Manuel Oliveira Alves convencionou‑se com a Sorriso o seguinte protocolo de cooperação: 1. «A “Sorriso – Associação dos Amigos do Ninho dos Pequenitos” assume a titularidade jurídica inerente ao funcionamento do estabelecimento anexo à Maternidade Bissaya Barreto, denominado “Ninho dos Pequenitos”, no que respeita às valências de Creche, Lar de Crianças e Jovens e Acolhimento Familiar em termos análogos ao protocolado com a Fundação Bissaya Barreto, cujo clausulado conhece e se considera reproduzido para todos os efeitos»124. Nesta altura estava em curso a constituição e o registo da Sorriso como IPSS. Paralelamente seria concedido por despacho da Secretária de Estado da Segurança Social autorização para a celebração de acordos de cooperação. Os seus estatutos foram registados definitivamente a 19 de Outubro de 2006 no Livro Nº 11 das Associações de Solidariedade Social sob o nº 60/2006, considerando‑se tal registo e nos termos da lei como efectuado a 16/1/2006. A declaração foi publicitada em Diário da República, 2ª Série, Nº 218 de 13 de Novembro de 2006, estando assinada pelo Director de Serviços António Teixeira, da Direcção Geral da Segurança‑Social, da Instalações interiores do Ninho dos Pequenitos.

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Sala de actividades do Ninho dos Pequenitos.

Família e da Criança (do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social). No capítulo 1 dos referidos estatutos enunciam‑se a denominação, sede, âmbito de acção e fins da nobre instituição: «ARTIGO 1º ‑ A “Sorriso – Associação dos Amigos do Ninho dos Pequenitos”, adiante designada por “Sorriso” é uma instituição particular de solidariedade social com sede em Coimbra, na Maternidade Bissaya‑Barreto, sita na Rua Augusta – 3000‑061 Coimbra; ARTIGO 2º ‑ A “Sorriso” abrange o Distrito de Coimbra, não prossegue quaisquer fins lucrativos e tem como objectivos: 1 – A promoção de actividades de apoio integrado às crianças privadas de meio familiar, nomeadamente assegurar o normal e adequado funcionamento do Ninho dos Pequenitos nas suas valências de Lar, Creche e Acolhimento Familiar, sendo este o seu objectivo prioritário;

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2 – O desenvolvimento de actividades de prevenção primária em saúde familiar, e colaboração com outras entidades, nomeadamente a Maternidade Bissaya‑Barreto; 3 – A organização de acções de sensibilização da comunidade e dos profissionais, em geral, para a problemática da criança em risco e da criança institucionalizada; 4 – A angariação de meios financeiros destinados a melhorar o conforto e a qualidade do atendimento das crianças utentes do Ninho dos Pequenitos»125 A 9 de Junho de 2006, a SORRISO celebrou protocolo de cooperação com o Centro Sócio‑Cultural de Nossa Senhora de Lurdes. Segundo tal documento – Cáusula II – a cooperação pretende abranger preferencialmente: «1. Troca de informações em áreas de interesse comum; 2. Integração de crianças da SORRISO nas várias valências do Centro Sócio Cultural Nossa Senhora de Lurdes de acordo com o regulamento e disponibilidade do mesmo. 3. Colaboração da SORRISO disponibilizando a participação, de funcionários ou associados do Centro, em acções de formação que venha a realizar» Em Assembleia Geral da SORRISO realizada a 20 de Março de 2007 aprovaram‑se as alterações aos estatutos por unanimidade, tendo em vista o reconhecimento da associação como IPSS. A 28 de Novembro de 2007 houve importante reunião na história da SORRISO. De facto, há já algum tempo que a Segurança Social se havia manifestado relativamente às dificuldades decorrentes do facto do Ninho se enquadrar, formalmente, no Centro Hospitalar de Coimbra, mesmo depois de a SORRISO se ter constituído como IPSS. Alguns dias antes, a 23 de Novembro de 2007, o Centro Distrital da Segurança Social de Coimbra pedira à associação que se pronunciasse e decidisse sobre a denuncia do acordo existente para

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Lar de Crianças e Jovens e Creche e celebração de acordo atípico para Centro de Acolhimento Temporário. Para discussão das alterações e ajustes a realizar reuniram‑se no dito dia e no Gabinete do Presidente do Conselho de Administração do CHC, EPE representantes das duas instituições entre os quais o Presidente do CHC Dr. Rui Pato e o Presidente da SORRISO Dr. Vicente Souto. De acordo com a acta o Presidente da SORRISO daria conhecimento de dois factos muito relevantes: ‑ A Segurança Social havia informado que «…só podem financiar a Sorriso, no âmbito da gestão do Ninho até 80%, sublinhando por isso, o Presidente da Sorriso, a necessidade de manterem para assegurar o funcionamento da Instituição, algum apoio por parte do CHC, EPE» ‑ O pedido feito pela Segurança Social para que a situação se regularizasse «…com a maior urgência possível, propondo, para o efeito, que a Sorriso assine o Acordo atípico que se encontra proposto (Acordo de Centro de Acolhimento Temporário de Crianças em Risco) para aprovação, até o CHC, EPE obter a homologação do seu Regulamento Interno, após o que seria revisto esse mesmo acordo entre a Sorriso e a Segurança Social, e necessariamente celebrado um novo Protocolo entre o CHC, EPE e a Sorriso» No seguimento foi acordado entre as partes e nos termos do referido protocolo a celebrar após a homologação do regulamento interno do CHC, EPE as seguintes cláusulas: «‑cedência, a título gratuito, à Sorriso, das instalações onde actualmente se encontra instalado o Ninho, para esse mesmo fim, mais concretamente, Centro de Acolhimento Temporário de Crianças em Risco: ‑ Assunção por parte do CHC dos encargos decorrente dessa utilização, com a água e energia daquelas instalações»126. O referido protocolo foi assinado a 2 de Fevereiro de 2008, no Centro Hospitalar de Coimbra, EPE sito na Quinta dos Vales, em S. Martinho do Bispo, confirmando o acordado anteriormente, ou seja:

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«O Centro Hospitalar de Coimbra, EPE, autoriza que a Instituição de Solidariedade Social Sorriso continue a utilizar, a título gratuito, as instalações onde actualmente se encontra instalado o “Ninho dos Pequenitos» (Cláusula Primeira ‑ Objecto) e «O indicado espaço destina‑se exclusivamente a esse mesmo fim, mais concretamente, funcionamento do Centro de Acolhimento Temporário de Crianças em Risco denominado “Ninho dos Pequenitos”». Os tempos foram mudando e tanto o Ninho como a Sorriso tiveram de acompanhar esse devir: «- Em 1992 a maioria das crianças era admitida no Ninho a pedido dos pais ou familiares próximos ou pessoas da comunidade, e nele permaneciam quase até aos 10-12 anos sem que houvesse intervenção do Tribunal. Situações mais complexas é que eram confiadas judicialmente. Frequentemente saiam aos fins-de-semana e férias com a família pelo que as visitas durante a semana eram praticamente inexistentes. Muitas dessas crianças acabaram por transitar para outras instituições. - Há dez anos para cá, nomeadamente após a publicação da Lei n.º 147/99 de 1 de Setembro, todas as crianças são admitidas no Ninho apenas por decisão judicial (por se encontrarem em situação de perigo), situação que nunca é aceite pelos pais. As saídas com estes ou com qualquer outra pessoa apenas se processa por decisão do Tribunal e só em situações muito pontuais (…) Enquanto se aguarda pela concretização dos Projectos de Vida tem-se procurado integrar as crianças com mais de 18 meses em infantários localizados na comunidade envolvente através de celebração de protocolos de cooperação, proporcionando-lhes experiências em contextos sociais diferentes o que ajuda a minimizar os efeitos nefastos da institucionalização. (…) A articulação com a UIP é uma mais-valia que tem contribuído para o sucesso do nosso trabalho. É de salientar o contributo das equipas médica e de enfermagem que tem permitido acolher no Ninho dos Pequenitos crianças doentes, com deficiências e portadoras de doenças infecciosas que habitualmente mais nenhum centro acolhe»127. Uma das principais missões da Sorriso é oferecer o melhor destino às crianças, como dá conta o gráfico que se segue:

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Destino das Crianças do Ninho nos Últimos 10 Anos Adopção

25 20 15 10 5 0

Família Instituição

1999 2001 2003 2005 2007 2009

Família Acolhimento Falecido

Apesar das beneficiações que sofreu ao longo dos anos o Ninho está «neste momento a decorrer obras que vão permitir reestruturar o espaço, nomeadamente os quartos de dormir e berçário, cumprindo assim com as orientações da Segurança Social, tendo em vista a celebração de um Acordo Atípico para o Ninho, que veio a ser assinado com efeitos a partir do dia 01/06/2009. Apesar de ter sido atribuída uma lotação para 20 crianças o acordo apenas contempla o pagamento de 15, continuando a manter o grupo etário dos 0 aos 6 anos»128. O acordo assinado permite manter um corpo de profissionais constituído por uma Assistente Social, que acumula o cargo de Directora Técnica, uma Educadora Social, uma Funcionária Administrativa e 10 Auxiliares de Acção Educativa, que desenvolvem um trabalho de qualidade, empenhado em proporcionar às crianças um equilíbrio emocional estável e um crescimento em harmonia. O financiamento é ainda complementado por parcerias com entidades públicas e privadas e ainda pelas quotizações dos sócios. Ao finalizarmos a história do Ninho, brevemente contada, terminamos com o excerto de um texto de Jorge Biscaia, que traduz o sentimento daqueles que tudo têm dado em prol da instituição:

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«A ternura é como um grande lago que recolhe as águas de muitas nascentes. Das margens tornadas férteis, abrem-se muitos rios, como braços prontos a distribuir tudo o que reuniram em si. Assim, aqueles que têm esperança de receber a água da ternura, não morrem mirrados pela sede de um olhar ou pela falta de um gesto de acolhimento. Essa água, orientada para os outros, vai dar-lhes uma nova energia que lhes permitirá desenvolver encontros de solidariedade e fará mais viva a luz com que se vê a esperança. A vinculação, a relação precoce, é uma das maiores nascentes dessa albufeira inicial que recolhe as fontes da ternura». Jorge Biscaia «Perder para encontrar» 2003

Unidade de Intervenção Precoce.

Reunião da Direcção do Ninho com a Equipa Técnica

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O renovado berçário do Ninho

A renovada sala de actividades dos bebés do Ninho

Apêndice I

APÊNDICE I Depoimentos sobre o Ninho dos Pequenitos/ Unidade de Intervenção Precoce

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Apêndice I

O Ninho / Unidade de Intervenção Precoce Jorge Biscaia*

A UIP (Unidade de Intervenção Precoce da Relação Mãe Filho) foi uma ideia sonhada que começou a ser concretizada com o novo edifício que ainda agora ocupa após ter recebido o apoio da Ministra da Saúde desse tempo, Profª. Leonor Beleza . No fim da Festa de Homenagem ao Dr Santos Bessa, em que eu falei dele com a amizade que se tem por quem eu sempre considerei um segundo pai, ela que presidia á cerimónia do Hospital Pediátrico de Coimbra e que também o admirava, anunciou e patrocinou a Unidade de Intervenção Precoce da Maternidade Bissaya‑Barreto, que comigo e com o Prof. Eduardo Sá começou a funcionar em Coimbra. Começou por ser um serviço que recebia as mulheres que tinham sido arrastadas para a prostituição; adolescentes violadas pelos pais ou irmãos; grávidas que se drogavam; que não queriam os filhos; que tinham filhos com anomalias detectadas in útero; que sofriam de problemas psicológicos após anteriores abortamentos provocados, no fundo aquelas que ninguém queria. Começaram a ser vistas ali por uma equipa com Assistentes Sociais, Psicólogos, Pediatras, Obstetras e Enfermeiras que lhe faziam de imediato a observação clínica e a ecografia e depois as seguiam até ao parto assistido. Iam sabendo que os apoios não acabavam mesmo após o nascimento. Na realidade, o Ninho dos Pequenitos tinha sido fundado, já em 1931 pelo Professor Bissaya‑Barreto para internar os filhos de mães tuberculosas, afastando‑os da mãe para assim evitar o contágio, que seria inevitável e mortal, nessa época praticamente sem tratamento específico. Em 1963 no complexo da Obra Materno Infantil, da quinta da Rainha junto dos Jardins Infantis e da Maternidade aí construída, a vacinação pelo BCG e o aparecimento dos fármacos antituberculosos cada vez mais eficazes que foram aparecendo, fizeram evoluir esse motivo de separação, aparentemente salvadora de vidas e criaram

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cada vez mais a preocupação pelas necessidades afectivas das crianças internadas. Já então o Professor Bissaya‑Barreto dizia que a “Ternura da mãe era a vitamina de maior valor para a formação do psiquismo do filho “. Nessa ordem de ideias é apresentada publicamente à Fundação Bissaya‑Barreto numa reunião da sua Liga de Amigos realizada no Portugal dos Pequenitos, já em 1986, o “Projecto da Unidade de Intervenção Precoce. O Ninho dos Pequeninos, funcionaria como uma Unidade de Internamento para as situações não resolvida e permaneceria como um Centro de Orientação e tratamento das crianças em situação de abandono desde o seu nascimento”. Mais tarde, dado que esse abandono poderia ter sido antes do parto, a ideia foi a de fazer do Ninho uma “ Unidade de Cuidados Intensivos para a Relação “. Mesmo no internamento seria fomentada a relação precoce com mãe, se isso fosse possível e, caso de isso não acontecer, esse internamento seria tratado numa perspectiva de vinculação, por um pessoal preparado para o fazer. Esta perspectiva seria mantida até à solução da entrega a um casal ou família, capaz de a adoptar de modo correcto, num espaço de tempo tão curto quanto possível. Embora o internamento devesse procurar ser sempre de curta duração, o pessoal deveria fazer pequenos cursos teórico‑ práticos de vinculação perinatal periodicamente renovados. As dificuldades jurídicas foram desde então tratadas graciosamente, pela Doutora Eliana Gersão que, com seu enorme prestígio, tem procurado resolver desde essa altura, alguns problemas com o Tribunal de Menores. Todas estas novas perspectivas obrigaram a fazer Obras que reformassem o edifício do Ninho, que nessa altura (1986), estava muito degradado. Essas reformas do edifício continuaram e, hoje é a terceira vez que estão a ser feitas, agora já com a responsabilidade da Associação o Sorriso e da Segurança Social. Porém, algumas mães, potencialmente abandonantes, tinham problemas complexos, como por exemplo aquelas que viviam numa situação de prostituição.

Apêndice I

Acontece que naquelas que estavam nessa situação, tentávamos que fossem acolhidas, a seguir ao parto pelas Irmãs Adoradoras, que colaboravam connosco. Para além duma ou outra intervenção que as Irmãs nos foram pedindo, fui um dia convidado por uma delas para ir falar às que elas tinham a residir num Lar ‑Casa que então possuíam. Desejavam que eu lhes dissesse alguma coisa sobre a relação mãe filho e sobre o papel da mãe, no quebrar da quase doença genética que representava a falta de amor materno, como um dos elementos propagadores do mal de que elas estavam agora a sofrer. Assistiram muitas, talvez umas vinte ou trinta, já não sei bem. Umas tinham bebés no berço, outras em menor número, amamentavam. Havia grávidas e algumas, que ouviram sempre muito atentas, sem filhos visíveis junto delas. No fim fizeram perguntas, mostraram os bebés, queixaram‑se dos seus vómitos, das suas dores e eu lá fui falando e achando‑os todos bonitos. No final duma manhã longa, quando me vinha embora, a Irmã que me tinha convidado disse‑me que tinha sido o dia internacional da mulher. E foi aí que senti a verdadeira medalha (Grã Cruz de Sant’Iago e Espada) que com outros três amigos vim a receber como um dos Pioneiros da Bioética). Isto porque, tinha estado várias horas a falar daquilo que gosto, com profundo respeito por essa pobres mulheres coisificadas e desprezadas, algumas, como vim a saber depois, possuindo mesmo no seu passado terríveis histórias. Outra das situações complexas, era a das mães violadas ou adolescentes, algumas mesmo de treze ou quinze anos. Essas violações eram cometidas algumas vezes por pais, irmãos mais velhos, ou padrastos... Para essas foi criada a depois chamada, mais tarde, Casa da Mãe. O seu internamento com o filho em quartos individuais passou a realizar‑se numa casa recuperada da responsabilidade da Fundação Bissaya‑Barreto. O internamento do filho era sempre demorado. Na realidade dada a idade dessas mães havia a preocupação com sua escolaridade e continuação dos estudos de modo a dar‑lhes um pequeno curso profissional (Restauração ou Manicure por exemplo) de modo a proporcionar‑lhes uma certa independência económica no futuro.

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Esse tempo, necessariamente longo de internamento, permitia o difícil trabalho duma equipa pluridisciplinar (Assistente social, psicóloga psiquiatra) que procurava desenvolver a relação mãe / adolescente‑filho e as apoiasse até lhes dar uma vida mais adulta e consciente. Para as mães tóxico‑dependentes criou‑se um Lar que permitisse o internamento com o filho e a continuação do tratamento e, por vezes a própria reconstituição da família em que o marido era muitas vezes o mais difícil de tratar. Para as mães com filhos com deficiências ou anomalias, havia contactos pessoais com Instituições locais como a APPACDM ou a Paralisia Cerebral , que permitiam apoios posteriores aos nascimentos , por excelentes equipas que faziam desses locais muito bons apoios para o futuro.. Todo o trabalho sobre a Relação Mãe Filho deve começar desde o início da Gestação. Tem imensos problemas insucessos êxitos e fracassos. Mas como todos os caminhos, só se fazem andando. Este andar pressupõe um dar‑se as mãos numa equipa pluridisciplinar. Instituições diversas e complementares com mesmo espírito e os mesmos objectivos, devem ser criadas e acarinhadas. O Ninho foi um sonho inicial do Professor Bissaya‑Barreto e do Dr. Santos Bessa. Continuar a desenvolver esse sonho foi o nosso único mérito e o nosso grande privilégio. * Pediatra, ex‑director da Neonatologia da MBB e da UIP, Presidente da Assembleia Geral da Sorriso Bibliografia Biscaia, Jorge ‑ Perder para Encontrar, Gráfica de Coimbra, 2004 Biscaia, Jorge ‑ A que pais têm os filhos direito, Gráfica de Coimbra, 2008 Jorge Biscaia e Eduardo Sá ‑ Do amor e do abandono UIP, 2001 Gráfica de Coimbra Sá, Eduardo ‑ A Maternidade e o bebé ‑ Fim de Século, 1997 Santos Bessa ‑ vol I Nº 2 Revista da Fundação Bissaya‑Barreto

Apêndice I

Das Fraquezas se fez Forças ‑ uma cooperação frutuosa Fátima Mota*

A circunstância do Ninho dos Pequenitos, criado inicialmente para internar crianças em risco de contágio por tuberculose da mãe, ter deixado de ter, com o desenvolvimento da medicina e dos fármacos, a sua função essencialmente de carácter sanitário, levou a que passasse, mais tarde, (1963) a ter um papel de cariz sobretudo social, uma vez que nele se passou a “recolher crianças da primeira infância que temporaria‑ mente não pudessem ser mantidas em ambiente familiar por perda da mãe, do pai, ou dos dois, ou por doença grave de um deles ou ainda por qualquer outra situação social que o impusesse”. Mais tarde, o facto do Ninho, que em 1988 foi integrado na Unidade de Intervenção Precoce na Relação Mãe/Filho, da Maternidade Bissaya Barreto, ter passado a acolher crianças por razões de natureza social e ser exclusivamente custeado por uma instituição de saúde, levou à necessidade de uma análise cuidadosa sobre a sua viabilidade futura, tanto mais que o Ministério da Tutela passou a considerar exclusivamente o financiamento de actividades de carácter “assistencial, de ensino e investigação dos hospitais, o que punha em risco o futuro daquela unidade. Considerada a “imprescindibilidade” do Ninho dos Pequenitos e até a necessidade de alargamento da sua capacidade, foram realizados contactos com a Fundação Bissaya Barreto e os serviços locais da Segurança Social, no sentido da celebração de acordos de cooperação que garantissem a sua viabilidade financeira, o que teve, por parte da Fundação, um bom acolhimento, desde logo pelas ligações de carácter afectivo geradas no sonho e na capacidade de realização de um patrono comum. Nesta conformidade, em Outubro de 1990, foi celebrado um acordo de cooperação entre o Centro Hospitalar de Coimbra/Maternidade Bissaya Barreto e a Fundação Bissaya Barreto, Instituição Privada de Solidariedade Social (IPSS), que passou a ser a detentora do suporte jurídico do Ninho e, desse modo, a poder realizar, o que veio a acontecer a 27 de Maio de 1991, um protocolo de cooperação

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com os serviços locais da Segurança Social, que tinha por finalidade o desenvolvimento de actividades de apoio na área populacional de Infância e Juventude, a exercer no Ninho dos Pequenitos, cuja lotação máxima foi de 30 utentes. Este acordo, em vigor até 2004, deu origem a uma muito profícua colaboração cuja importância foi reconhecida, não somente pelas instituições envolvidas, mas também pelos diversos organismos que, numa linha de trabalho em rede, cooperaram e trabalharam, numa perspectiva intersectorial e interinstitucional. Na verdade, para além do significativo reforço do grupo das profissionais, cuidadoras das crianças internadas, a Fundação Bissaya Barreto veio a celebrar, em 1995, um novo protocolo de cooperação com a Segurança Social, para creche e famílias de acolhimento, o que veio a imprimir novas dinâmicas no funcionamento do Ninho. De salientar que era, igualmente, propósito da Maternidade Bissaya Barreto e da Fundação Bissaya Barreto que ambas as instituições cooperassem no sentido de realizarem no Ninho as adaptações necessárias à sua função de acolhimento de crianças no período neonatal e durante o primeiro ano de vida, em situação de abandono, e de oferecerem “as melhores condições de estimulação e apoio” à “integração familiar ou adopção”das crianças. Este desiderato tinha na sua base a consciência dos efeitos nefastos para as crianças da institucionalização prolongada e as vantagens de uma rápida e adequada inserção social. O papel pioneiro de ambas as instituições no que respeita à atenção à criança, salientado neste protocolo, esteve, sem dúvida, presente num conjunto de actividades que vieram, posteriormente, a ser desenvolvidas, salientando‑se o Projecto Comunitário de Apoio à Mulher e à Criança em Risco e os Projectos Re‑Nascer e Re‑Formar, promovidos pela Fundação Bissaya Barreto, em

Apêndice I

parceria com o Centro Hospitalar de Coimbra/Maternidade Bissaya Barreto e o Centro Regional de Segurança Social de Coimbra. Será de realçar também as múltiplas actividades, então, desenvolvidas, direccionadas maioritariamente para os cidadãos mais vulneráveis – crianças (famílias com crianças institucionalizadas) – como foi o caso do Projecto Re‑Nascer que teve como objectivo prevenir e reduzir o tempo de institucionalização, em especial das crianças internadas no Ninho dos Pequenitos. Desenvolveram‑se igualmente acções direccionadas para mulheres, maioritariamente mães e crianças vítimas de violência doméstica, num tempo (1995) em que o problema emergia, com um carácter de reconhecido pioneirismo e inovação, como foi o caso do Projecto Re‑Formar, do Serviço SOS Mulher, da Casa da Mãe e da Casa do Pai onde se dava continuidade à acção do Ninho, acolhendo crianças com idades compreendidas entre os 6 e os 12 anos de idade. Esta reconhecida capacidade de interpretar e identificar novas problemáticas constitui e faz também parte do legado do nosso patrono. Na verdade, o Professor Bissaya Barreto deixou à região centro e ao país uma vasta e importantíssima Obra de que a Maternidade Bissaya Barreto e a Fundação Bissaya Barreto fazem parte, mas também uma não menos importante e exemplar Atitude, alimentada num permanente estado de alerta para os problemas emergentes na sociedade da sua época e num espírito inquieto e empreendedor. “No Portugal do seu tempo, onde a miséria ainda só tinha por precaríssima resposta o supérfluo, ou seja a esmola, e onde a pobreza permanecia ainda como fazendo parte da ordem natural das coisas, ele (Bissaya‑Barreto) foi a Segurança Social e o Estado Providência que não havia”1. A violência no seio das famílias, escondida nas paredes da casa e encoberta em verdadeiros “pactos de silêncio”, também ela parecendo fazer “parte da ordem natural das coisas”, encerra muitas vezes, relações desiguais, sustentadas em sentimentos de medo e de 1 Almeida Santos, discurso proferido na Homenagem Nacional ao Prof. Doutor Bissay‑ Barreto, 11 de Outubro de 1997, na qualidade de Presidente da Assembleia da República.

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insegurança, com consequências pessoais, relacionais e familiares devastadoras, muito em especial para as crianças, e custos sociais e económicos elevadíssimos. É neste contexto que num olhar retrospectivo, enquadramos a rica colaboração que a Comissão criada, formada por elementos designados por ambas as instituições (MBB e FBB) conseguiu alcançar. Esta “permanente e eficaz” colaboração foi possível graças ao empenhamento de todos, sendo aqui de realçar o saudoso Engenheiro Pedro Malta, um dos representantes da Fundação, que a esta missão dedicou um contagiante entusiasmo e empenhamento. * Directora da Área da Família Fundação Bissaya‑Barreto

Apêndice I

O recomeço nas novas instalações * Graça Araújo

O Dr. Bissaya Barreto era um grande Pedagogo, uma pessoa inovadora para a época e foi por isso que em 1968 quis dotar a Obra Infantil do Instituto Maternal, de Educadoras de Infância, profissionais que em Portugal, estavam a começar a ser formadas e cuja existência e funções eram quase desconhecidas. Tinha eu acabado de tirar o curso no Instituto Formadoras da Infância de Nossa Senhora da Anunciação, em Coimbra, que seguia o método Montessori, quando fui convidada para ir abrir o Ninho no Instituto Maternal. Era uma jovem, cheia de idealismos, com vontade de lutar para aperfeiçoar o mundo e aceitei o desafio. Felizmente para contrabalançar a falta de experiência havia uma enorme vontade de saber mais, de construir, de fazer o meu melhor. Fui para o local certo. O Dr. Bissaya queria que o Instituto Maternal fosse tão bom no conteúdo pedagógico quanto nas suas magnificas instalações e foi por isso que a minha colega de curso que abriu o Parque, adquiriu o melhor material didáctico da época (C.Miranda) e proporcionou às colegas a melhoria dos seus conhecimentos através das revistas francesas, Education Enfantine, Pomme d´Api e L´École des Parents. Foram ainda nossa referência os livros, “Introdução à Psicologia da Criança” de 1960 e “La Pedagogia Contemporanea” de 1961, de Émile Planchar, ilustre professor universitário de Coimbra e posteriormente de Madrid. Quando cheguei ao Instituto Maternal ainda trabalhei algum tempo no Parque onde para além do trabalho de equipa devo salientar a integração que fizemos de uma criança autista, situação impensável na altura. Tivemos para isso o apoio da Drª Manuela Mendonça, autora do livro “ Mais Vale Prevenir...Memórias de uma Época e de um Contributo para a Saúde Mental Infantil” de 2002, nossa extraordinária professora da cadeira de Higiene Mental que nos influenciou de forma decisiva para uma abertura de espirito à prevenção da saúde mental infantil.

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Cresço pessoal e profissionalmente e fico responsável pelo Ninho que abre em 1969 com um grupo de crianças vindas de Castanheira de Pera e Penacova. Todas vestidas de igual, todas de cabelos muito curtos, todas muito “asiladas”. Era assim naquele tempo! Mas o Dr. Bissaya mais uma vez marca a diferença pois o Ninho foi perspectivado por ele não só para acolher crianças de famílias disfuncionais mas também para apoiar mães que tivessem de estar internadas quer na maternidade quer por tuberculose e ainda as mulheres trabalhadoras no Instituto Maternal com turnos à noite. Tentámos, com grande abertura de espírito, transformar o “internato” na “casa das crianças”. Para individualizar mais as crianças compraram‑se roupas e até bibes diferentes. Arranjaram‑se armários de madeira, tipo cacife, para que cada uma tivesse as “suas coisas”. Para dar as melhores condições psico‑pedagógicas havia no Ninho equipas técnicas interdisciplinares, constituídas por enfermeiras para os bebés e educadoras para os mais velhos, ambas apoiadas por vigilantes. Foi inclusivamente criada uma sala de actividades de jardim‑de‑infância para onde foi trabalhar a educadora Maria Teresa Sarmento, que era da mesma Escola e tinha estagiado connosco no Parque e que, após a minha saída do Ninho, ficou responsável por ele. Foi um ano de trabalho muito empenhado que concluí com a exposição dos trabalhos das crianças feita nos corredores de entrada do Ninho, toda devidamente legendada, demonstrando quer as técnicas empregues quer a evolução das crianças ao longo do ano. Esta exposição foi visitada pelo Dr. Bissaya e mereceu dele o seguinte comentário: “Se fosse hoje não tinha mandado pintar as paredes do Ninho”. Para quem conhece as pinturas murais e o quanto o Dr. Bissya admirava a arte, este foi o maior elogio ao nosso trabalho, o seu reconhecimento. No ano seguinte, com a colaboração da Maria José Manso, as crianças de idade pré – escolar foram integradas nas salas do Parque e a sala de actividades do Ninho recebeu crianças do exterior. Foi assim possível que se criassem laços de amizade com crianças do exterior e suas famílias, que fossem convidadas para as suas festas de anos, fins‑de‑semana e...Natal.

Apêndice I

Não havendo no Ninho a figura masculina, pois as funcionárias eram todas mulheres, foi ainda solicitado o apoio dos escuteiros que realizavam com os mais velhos, actividades dentro e fora do Ninho. No Verão íamos quinze dias para a Colónia de Férias da Gala, Figueira da Foz, juntamente com as crianças da Tocha. Convívios agradáveis, outras vivências...e o benefício da praia. Era assim proporcionado o contacto com o mundo fora das paredes do internato! O Ninho era tão importante, já com características mais técnicas e não só beneméritas, que foi recrutada também em 1969 uma assistente social, Margarida Cordeiro Porto para pôr em ordem todos os processos das crianças e acompanhar as suas famílias. Foram por ela trabalhados também processos de adopção de crianças que ali estavam. Saí do Ninho em Setembro de 1970. Vivi lá um curto mas intensíssimo período da minha vida profissional que ainda hoje evoco com entusiasmo e prazer. *Educadora de Infância

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Uma visão sobre o Ninho… *Maria Albertina Costa

Estávamos nos finais de 1991 quando me é colocado um desafio, integrar um projecto inovador na Maternidade Bissaya Barreto – a Unidade de Intervenção Precoce na Relação Mãe – Filho (UIP), um serviço de excelência que procura fazer um trabalho na prevenção dos maus tratos, com início na gravidez. A minha experiência profissional com grávidas e com crianças era nula, mas perante um projecto tão inovador e aliciante resolvi aceitar a proposta e dar o meu modesto contributo para o seu desenvolvimento. No início de 1992, integrei então a equipa que a pouco e pouco foi crescendo em número e qualidade, sob a orientação do Dr. Jorge Biscaia. O Ninho estava enquadrado tecnicamente na UIP e assim passo a integrar, também, a sua equipa. Recordo as Educadoras, Teresa Sarmento e Fátima Neves, a primeira, responsável pelo Ninho na altura e a segunda, que posteriormente lhe sucedeu. Eram praticamente as únicas técnicas que constituíam a equipa, acompanhadas de um grupo de auxiliares de acção educativa, que com todo o seu saber e dedicação proporcionavam às crianças um ambiente acolhedor e afectuoso. A assinatura em 1991 do acordo, por parte da Fundação Bissaya Barreto com a Segurança Social, veio a permitir que fossem realizadas obras de requalificação assim como a admissão de pessoal, com vista à reabertura do berçário o que veio a concretizar-se colmatando assim a ausência de uma estrutura que recebesse bebés no distrito. O trabalho multidisciplinar e interinstitucional cresceu e produziu frutos que se traduziram em parcerias no desenvolvimento de projectos de intervenção social na área das crianças e mulheres em risco nomeadamente, com a Fundação Bissaya Barreto, dos quais se releva sobretudo, o envolvimento de todos com um objectivo comum, num autêntico trabalho em rede. A articulação com a UIP é uma mais-valia que tem contribuído para o sucesso do nosso trabalho. É de salientar o contributo das equipas médica e de enfermagem que tem permitido acolher no Ninho

Apêndice I

dos Pequenitos crianças doentes, com deficiências e portadoras de doenças infecciosas que habitualmente mais nenhum centro acolhe. Igualmente temos beneficiado da colaboração da restante equipa, nomeadamente Psicólogas, Assistentes Sociais, Educadoras e Pedopsiquiatra. Os tempos foram mudando sob o ponto de vista sociológico e foram sendo produzidos suportes legislativos na área da protecção de menores, o que a esta distância nos permite ter uma visão das alterações que se foram processando, senão vejamos; - Em 1992 a maioria das crianças era admitida no Ninho a pedido dos pais ou familiares próximos ou pessoas da comunidade, e nele permaneciam quase até aos 10-12 anos sem que houvesse intervenção do Tribunal. Situações mais complexas é que eram confiadas judicialmente. Frequentemente saiam aos fins-de-semana e férias com a família pelo que as visitas durante a semana eram praticamente inexistentes. Muitas dessas crianças acabaram por transitar para outras instituições. - Há dez anos para cá, nomeadamente após a publicação da Lei n.º 147/99 de 1 de Setembro, todas as crianças são admitidas no Ninho apenas por decisão judicial (por se encontrarem em situação de perigo), situação que nunca é aceite pelos pais. As saídas com estes ou com qualquer outra pessoa apenas se processa por decisão do Tribunal e só em situações muito pontuais. No entanto procura-se promover a participação das famílias, ajudando-as a compreender as reais necessidades das crianças, tendo sempre em conta o Projecto de Vida delineado pela Equipa Técnica em articulação com a Equipa Multidisciplinar de Assessoria aos Tribunais, outras instituições da comunidade e Tribunais. Enquanto se aguarda pela concretização dos Projectos de Vida tem-se procurado integrar as crianças com mais de 18 meses em infantários localizados na comunidade envolvente através de celebração de protocolos de cooperação, proporcionando-lhes experiências em contextos sociais diferentes o que ajuda a minimizar os efeitos nefastos da institucionalização. O gráfico que inserimos, traduz o trabalho que se desenvolve no Ninho, onde a maioria dos projectos de vida oscila entre a integração

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na família e a adopção, sendo que a transição para outra instituição é praticamente inexistente Passou-se portanto de uma cultura onde predominava a informalidade, para outra com características cada vez mais formais. A ocorrência de problemas, gerados por se trabalhar muitas vezes na base da confiança, tem conduzido à produção de decisões e orientações por parte da tutela, numa tentativa de formalizar e uniformizar critérios de intervenção em todas as instituições de acolhimento de crianças. Foram-se fazendo várias obras de beneficiação ao longo dos anos, estando neste momento a decorrer obras que vão permitir reestruturar o espaço, nomeadamente os quartos de dormir e berçário, cumprindo assim com as orientações da Segurança Social, tendo em vista a celebração de um Acordo Atípico para o Ninho, que veio a ser assinado com efeitos a partir do dia 01/06/2009. Apesar de ter sido atribuída uma lotação para 20 crianças o acordo apenas contempla o pagamento de 15, continuando a manter o grupo etário dos 0 aos 6 anos. Ao fim destes anos, temos consciência que nem sempre as soluções encontradas para as nossas crianças foram as mais adequadas, mas as possíveis. Foram travadas muitas batalhas nem sempre compreendidas. Valeu-nos a cumplicidade, a compreensão, a cooperação e a solidariedade profissional de todos os elementos com quem trabalhamos, sem as quais não teríamos conseguido ultrapassar os vários revezes com que nos fomos deparando. *Assistente Social Vice-Presidente da Direcção da Sorriso

Apêndice II

APÊNDICE II Inventário dos bens da Obra de Protecção à Grávida e Criança [Janeiro 1936]

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Inventário de Mobiliário ‑ Utensílios e Rouparia da Obra de Protecção à Grávida e Criança”, Coimbra, Janeiro 19362 3

Nº de peças 1 1 5 1 2 1 1 1 1 1 1 1 2 1 1 1 1 2 2 2 1 1 1 1

Descrição dos bens3 Dispensário de Protecção e Defesa da Criança ‑ Gabinete do médico ‑ Secretária Ficheiro Cadeiras Armário de vidro para ferros étagères de ferro com tampo de vidro Suporte para irrigadores, completo Banco giratório Barómetro Manómetro étagère de ferro com tampo de mármore Lavatório fixo Toalheiro fixo, de vidro Quadros decorativos Tinteiro de metal Cinzeiro de alumínio Balde de louça Termocautério Abaixadores de língua (1 de vidro, 1 de metal) Compassos de baudelocque Estetoscópios Oscilometro de Pachon Espéculo – máscara de anestesia Escarrador Mesinha de macacaúba

Fonte: A.U.C. ‑“Inventário de Mobiliário ‑ Utensílios e Rouparia da Obra de Protecção à Grávida e Criança” (Pt) In Inventários de Bens, 1933‑1947 Inventário de Mobiliário ‑ Utensílios e Rouparia da Obra de Protecção à Grávida e Criança (Cx.) Coimbra, Janeiro 1936 (16 Pp). 3 Este inventário promoveu a descrição dos bens de toda a Obra de Protecção à Grávida e Criança. Datado de Janeiro de 1936, está assinado pela Regente Ninho dos Pequenitos, Emília de Oliveira, e foi antecedido de outro inventário, apenas relativo ao Ninho dos Pequenitos, datado de 31/12/1933 e assinado pela mesma regente. Na transcrição efectuada mantivemos a disposição e organização da descrição de bens feita no original, actualizando apenas a grafia. 2

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Nº de peças 2 1 1 2 15 2 1 1 3 5 1 6 6 3 3 2 2 1 6 1 2 3 2 2 3 13 4 1 1 1 1 1 1 1 1 1

Descrição dos bens3

Casacos de médico Utensílios Seringa de 20 cm 3 Seringa de 3 cm 3 Seringas de 2 cm 3 Agulhas de injectar Pinças Várias colecções do jornal “A Saúde” Saco para gelo Saco para água Ebulidores Taças Garrafão de 5 L. Boiões de louça Borrachas para ouvidos Caixas niqueladas para gaze Tesouras Sondas canulas Pinças de garras Bisturi Frascos conta‑ gotas Irrigador de vidro Filtros de vidro Copos graduados Irrigadores de esmalte Tabuleiros de esmalte Funis Frascos de vidro com rolha esmerilada Termómetros Coxim Gabinete da enfermeira visitadora Cama de ferro pintada de branco Étagère de ferro com tampo de vidro Étagère fixo com tampo de mármore Balança para pesar crianças Lavatório fixo Toalheiro fixo Escarrador Sala de Espera Étagère de mogno com mármore

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Nº de peças 12 1 1 1 1 6 2 13 1 13 1 1 1 4 1 2 2 2 4 2 1 4 1 2 1 2 8 8 8 1 8 14

Descrição dos bens3 Cadeiras de macacaúba Secretária de macacaúba Mesa de centro Lavatório fixo Escarrador Quadros decorativos Vasos com plantas Ninho dos Pequenitos Leitos de ferro (crianças) Leito de ferro (adulto) Bancos Banquinha Lavatório (completo) Mesinha de macacaúba Cadeirinhas Cómoda de mogno com tampo de mármore Quadros decorativos Enfermarias ‑ Doenças infecciosas ‑ Caminhas de ferro Berços Doenças não infecciosas Caminhas de ferro Berços Mesinha de macacaúba Cadeirinhas Isolamento Caminha de ferro Berços Mesinha de macacaúba Cadeiras Camarata verde Caminhas em ferro Banquinhas em ferro Bancos Quadro decorativo Camarata de alumínio Caminhas em ferro Ninhos de Leite Berços em ferro

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Nº de peças 10 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 2 1 1 24 24 24 1 1 3 1 8 1 4 8 4 1 4 9 2 2 3 2 1 2

Descrição dos bens3

Bancos em ferro Cama em ferro (para a vigilante) Banquinha em ferro Lavatório (completo) Étagère em ferro e tampo de mármore Mesa em madeira Tabuleiro Cómoda toilete com mármore e espelho (mogno) Imagem (Menino Jesus) Relógio despertador Jarra em bacalite Quadros decorativos Calorífero a petróleo Calorífero a serradura Salão dos 24 Caminhas de ferro Banquinhas de ferro Bancos de ferro Cama Banquinha Quadros decorativos Termómetro de parede Salão Amarelo Caminhas de ferro Mesinha de macacaúba Cadeirinhas Salão lilás Caminhas de ferro Banquinhas Mesinha de macacaúba Cadeirinhas Varanda Parques em macacaúba Quadros decorativos Cadeirinhas de rodas Gaiolas Caloríferos a serradura Casa de mármore Caminha em ferro Étagères em ferro com mármore

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Nº de peças 1 1 1 1 15 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 5 5 1 5 1 12 5 2 2 1 4 6 1 1 2 1

Descrição dos bens3

Lavatório fixo Aparelho de raios U.V. Balança vulgar e pesos Balança de pesar crianças W.C. (crianças) Retretes Sifão Idem (criadas) Retrete Banheira em mármore Idem (empregadas) Retrete Banheira esmaltada Bidet Lavatório fixo Espelho de étagére Idem (regente) Retrete Bidet Lavatório fixo Banheira esmaltada Casa de banho das crianças Banheiras de porcelana Suportes de ferro Lavatório Mesas de macacaúba com tampo de cortiça Quadro decorativo Casa de lavatórios das crianças Lavatórios fixos Bacias de pés Étagères de vidro Espelhos Mesinha de macacaúba Cadeirinhas Quadros decorativos Gabinete da Regente Secretária de macacaúba Escaparate de macacaúba Mesas de macacaúba Chaveiro de macacaúba

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Nº de peças 9 3 2 197 2 1 1 1 1 5 3 1 6 2 2 1 1 1 1 2 4 1 16 53 12 2 2 1 1 3 1 1 6 1 1 1

Descrição dos bens3 Cadeiras de macacaúba Cadeiras de macacaúba tipo Celas Grafonolas Discos em bom uso Candeeiros em latão (azeite) Casa de Costura Máquina de costura Singer Armário de madeira para roupas Mesa Secretária Cadeiras Roupeiros de verga Açafate Ferros de engomar Tabuleiros Tábuas de engomar Tábua para engomar mangas Tinteiro de vidro Suporte para canetas Bandeira nacional Casa de mesa dos meninos Escaparates em macacaúba bufetes Mesa redonda Mesas quadradas Cadeirinhas Cadeirinhas tipo Celas Cozinha Armários em macacaúba fixos Bancas Fogão em ferro Esquentador para banhos Lava‑louças Sifão Mesa em madeira Bancos Étagére de ferro com tampo de mármore Relógio de parede Recipiente para lixo Corredores

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Nº de peças 50 1 4 13 3 2 3 1 2 1 10 2 1 1 1 11 6 1 2 1 1 4 3 1 4 3 3 1 1 1 6 1 2 2 1 7 2

Descrição dos bens3 Quadros decorativos Filtro Mesinhas de macacaúba Cadeirinhas Arquibancos Comodazinhas Armariozinhos Caixa para correio Cadeiras de bebe Escada portátil Carrinhos com lona Mesas quadradas com mármore Mesa rectangular Banca armário Armário fixo para material de limpezas Camarata das criadas Camas de ferro Banquinhas de ferro Banquinha com mármore Cadeiras Despertador Canapé Lavatórios fixos Dispensas Armários Salgadeira fixa Cestos Latas para azeite Alguidares de barro Banca velha Pote de barro Quartos de arrecadação Lavatório de madeira com tampo de mármore Banquinhas de madeira Serviço de lavatório em porcelana Lavatórios de ferro incompletos Camas Espelho com moldura Cadeiras Armários

Apêndice II

Nº de peças 3 1 1 1 2 2 2 1 1 1 1 2 3 1 2 1

Descrição dos bens3

12 33 2 4 6 106 5 6 18 11 49 3 1 79 137

Arcas Baú de cabedal Baú de folha Bacia alta, de cama Cabides Mesas Caloríferos a petróleo (inutilizados) Coluna Suporte para féretros Bengaleiro Canapé Banheiras de mármore Banheiras de folha para crianças Caixa de relógio Banquinhas de cabeceira com mármore Esterilizadora desmontada Louças e utensílios de mesa e cozinha ‑ Louças de bacalite pertencentes ao Ex.mo Snr. Doutor Bissaya‑Barreto ‑ Jarras Caixas Leiteiras grandes Leiteiras pequenas Taças grandes Tigelas Taças cobertas Fruteiras Travessas Pratos grandes Pratos pequenos Argolas de guardanapo Manteigueira Colheres Pires

79 78 5 9 54

Copos grandes Copos pequenos Caixas grandes Taças pequenas em gomos Tigelinhas

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Nº de peças 32 2 9 61 6 3 5 11 10 5 7 40 50 1 4 1 7 2 57 57 46 5 64 3 20 60 106 50 7 29 20 20 8 4 8 1 4 10 1

Descrição dos bens3

Chávenas Tabuleiros Porcelanas, vidros, esmaltes, etc. Saladeiras porcelana Canecas Terrinas Travessas fundas Travessas Leiteiras 10 bules Bules para doentes Açucareiros Chávenas Pires Molheira Canecas para água Fruteira Jarras para flores Manteigueiras Pratos de sopa Pratos de guardanapo Pratos de sobremesa Boiões Tigelas Potes de barro Tigelas Púcaros de esmalte Pratos Tigelas Tabuleiros Cafeteiras Panelas Tachos Alguidares Fervedores Passadores Jogo de medidas de alumínio Panelas de alumínio Copos Galheteiro

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Nº de peças 1 1 1 1 1 5 5 1 6 1 1 12 1 1 2 7 4 1 144 26 7 4 12 1 5 6 1 1 3 1 4 9 7 1 3 2 3 3 1 7

Descrição dos bens3 Serviço de almoço em metal (3 peças) Bule de esmalte Suporte de artigos de limpeza em esmalte Suporte para facas Suporte para toalhas de cozinha Colheres de sopa Colheres de chá Concha para açúcar Facas de cozinha Cutelo Martelo para bifes Talheres Saca‑rolhas Almofariz Peneiras Conchas para sopa em esmalte Espumadeiras Garfo para fritos Colheres de alumínio para sopa Garfos de alumínio Bilhas para leite de alumínio Funis de alumínio Colheres para chá de alumínio Colher para arroz de alumínio Colheres de pau Descansos para talheres Ralador Cesto para pão Pratos de vidro Copo graduado Cálices Copos Candeeiros a petróleo Rolo para massas Tábuas Tachos de ferro fundido Fogareiros Tachos de cobre Jarro de esmalte Caçarolas

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Nº de peças 3 1 3 1 2 1 1 2 1 1 1 2 6 2 1 5 1 1 7 3 4 71 86 721 8 1 vedação 3 3 85 120 35 20 30 100 150 3

Descrição dos bens3

Tabuleiros Balança e pesos Garrafões Carretilha Esmagadores de batata Triturador para carne Almotolia em alumínio Saleiros em esmalte Palmatória Filtro Terrina em alumínio Assadeiras em barro Alguidares em barro Medidas em madeira Várias formas e latas para doces Lavandaria Máquina de lavar a electricidade Bacias grandes Caixote para roupa Cântaro de 20 litros Artigos de limpeza e outros Bacias de esmalte Baldes de zinco Joelheiras Bacios Botijas Frascos para leite Toldos de vela para praia Roupas em uso Toalhas de mesa, adulto Guardanapos grandes Toalhas de mesa de crianças Babetes Toalhas de cozinha Toalhas de mão Lençóis de adulto Lençóis de criança Travesseiros Lençóis turcos

Apêndice II

Nº de peças 157 200 40 400 60 120 33 33 24 6 1 1 25 62 7 296 37 32 11 226 5 38 78 377 2 214 111 241 12 89 61 21 36 52 46 318 130 53 37

Descrição dos bens3

Cobertas de cama Cobertores Oleados de cama Peças de vestuário para crianças Pares de sapatos Pares de meias Batas de pessoal Aventais Toucas Reserva de roupas, etc. Pares de brincos de ouro Medalha em esmalte e ouro Sinal em prata para livros Anveters de lã Anveters de algodão Vestidos de lã Camisolas de algodão Cobertores de algodão Combinações de algodão Macacos de flanela Camisas Calções Calças Camisas de rapaz Casacos de flanela Coletes Babetes Bibes de uniforme Fraldas Lençóis de cama (adulto) Lençóis de caminha Lençóis de berço Lençóis de felpa Toalhas Toalhas de estopa Calças de rapaz Casacos de lã Vestidos de lã Vestidos de algodão Combinações de flanela

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Nº de peças 8 27 160 7 38 45 1 151 16 12 9 11 2 7 79 438 1 1 9 9 106 235 4 85 metros 4 196 320 208 571 296 71,5 134 3 86 138 10 3 31 1 1

Descrição dos bens3

Combinações de lã Mantéus Toucas Enxovais de recém‑nascidos Gorros Babetes de lactantes Naperon bordado Lenços de assoar Travesseiros Travesseiras Guardanapos Almofadas decorativas Tapetes Cobertas Pares de botinhas de lã Pares de meias Suspensórios Cachecol Xailinhos de lã Camisolas de lã Chapéus Pares de sapatos Saquinhos para babetes Sarja branca para casacos Metros de cretone de bonecos Metros de tecidos de lã Metros de riscado Metros de flanela Metros de Bretanha Metros de linoline Metros de chita Metros de sarja de riscas Rolos de oleado para cama Babetes Toalhas Rolos de sarja para babetes (restos de peças) Meios couros de sola Retalhos de tarlatanas Presépio com 57 figuras Porção de miudezas para costura

Apêndice II

Nº de peças 21 8 53 5 2 1 1

Descrição dos bens3 Escovas para dentes Escovas para diferentes usos Pentes Tesouras Fitas métricas Esponja de borracha Porção de sabonetes e pastas para dentes

Coimbra, 31 de Janeiro de 1936 A Regente do Ninho dos Pequenitos Emília de Oliveira

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Bibliografia

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Fontes Manuscritas

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ARQUIVO DA ASSOCIAÇÃO SORRISO (AAS) ‑ Acordo de Cooperação Tipíco celebrado entre o Centro Regional de Segurança Social de Coimbra e a Fundação Bissaya‑Barreto, 27 Maio 1991 ‑ Acordo de Cooperação Atipíco celebrado entre o Centro Regional de Segurança Social do Centro/Serviço Sub‑Regional de Coimbra e a Fundação Bissaya‑Barreto, 12 de Julho 1995 ‑ Acordo de Cooperação celebrado entre o Centro Regional de Segurança Social do Centro/Serviço Sub‑Regional de Coimbra e a Fundação Bissaya‑Barreto, 1 Setembro 1997 ‑ Cópia da Constituição de Associação, 4º Cartório Notarial de Coimbra, Livro de Escrituras Diversas, Nº 90‑H ‑ Estatutos da “Sorriso – Associação dos Amigos do Ninho dos Pequenitos ‑ Acordo de Cooperação entre o Centro Hospitalar de Coimbra (Maternidade Bissaya Barreto / Ninho) e a Sorriso – Associação dos Amigos do Ninho dos Pequenitos, 20 de Setembro 2004 ‑ Protocolo celebrado entre o Centro Distrital de Segurança Social de Coimbra e a Sorriso, 29 Outubro 2004

Notas

NOTAS

1 A.E.S.F.‑Livro dos Exames de Saída do Curso Geral, Alumnos Internos, 1899‑1905, Fl. 26 2 A.E.S.J.F. – Livro dos Termos de Exames Complementares, 1902‑1903, Fl. 55 3 Pierre Goemaere – Bissaya‑Barreto (…) 1942, P. 23 4 Id. Pp. 31‑32 5 «Dois Homens: O Doutor Bissaya‑Barreto e o Dr. Alberto Diniz da Fonseca» In Diário de Coimbra Nº 7609, Ano XXIV, Sábado, 04/07/1953, P. 8. 6 Id. P. 9 7 Pierre Goemaere – Bissaya‑Barreto (…) 1942, P. 62. 8 Jorge Pais de Sousa – Bissaya Barreto: Ordem e Progresso (…) Coimbra, 1999, P. 15. 9 Id. P. 140. 10 Bissaya‑Barreto – Uma Obra Social realizada em Coimbra, Vol. I (…) 1970 Id. P. 11. 11 Jorge Pais de Sousa – Bissaya‑Barreto (…) Pp. 15‑16. 12 Bissaya‑Barreto – Uma Obra Social (…) Vol. III, P. 698. 13 Bissaya‑Barreto – Subsídios para a História (…) Vol. IV, P. 161 14 «Centenas de categorizadas figuras dos vários sectores sociais de Coimbra em manifestação espontânea e vibrante saudaram ontem à noite o Prof. Bissaya‑Barreto à sua chegada de Lisboa» In Diário de Coimbra, Nº 8801, 30 de Outubro de 1956, Ano XXVII, P. 1. 15 «Foram de extraordinário relevo as homenagens que o Prof. Bissaya‑Barreto ontem recebeu nesta cidade e a que se associaram milhares de pessoas de todas as categorias sociais e das mais diversas regiões do País» In Diário de Coimbra Nº 8834, 03 de Dezembro de 1956, Ano XXVII, P. 1 e 13. 16 Id. P. 13 17 Armando Carneiro da Silva (Nota preambular e síntese) – Anais do Município de Coimbra, 1940‑1959, Edição da Biblioteca Municipal, Coimbra, 1981, P.392. 18 Fundação Bissaya‑Barreto 50 Anos, 2007, P. 16. 19 Bissaya‑Barreto – Uma Obra Social realizada em Coimbra, VolI. Coimbra Editora Lda., Coimbra P. 90. 20 A.U.C. – Fundo da Assembleia Distrital: Livro de Actas da Junta Geral do Distrito de Coimbra, Nº 13, 1914‑1926, Fls. 62‑62v. 21 Anais do Município de Coimbra, 1920‑1939, P. 63

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22 Vide Santos Bessa ‑ «Comemoração dos 20 anos de actividade da Maternidade Bissaya‑Barreto» In Revista da Fundação Bissaya‑Barreto, Vol. 1, Nº 2, Coimbra, Dezembro, 1986, Pp. 35‑36 23 A.U.C. – Fundo da Assembleia Distrital: Livro de Actas da Junta Geral do Distrito de Coimbra, Nº 13, 1914‑1926, Fl. 62v. 24 Id. 25 A.U.C. – Fundo da Assembleia Distrital: Livro de Actas da Comissão Administrativa e Executiva da Junta Geral do Distrito de Coimbra, Nº 35, 1922‑1930, Fl. 31v. 26 Luís Raposo – Obra de Protecção à Grávida e Defesa da Criança – suas origens e seus fins, Coimbra, Tipografia da Gráfica de Coimbra, 1931 P. 8 27 Id. P. 4. 28 A.U.C. – Fundo da Assembleia Distrital: Livro de Actas da Comissão Administrativa e Executiva da Junta Geral do Distrito de Coimbra, Nº 36, 1930‑1932, Fls. 40‑40v. 29 «A Saúde – um Ano Depois», Nº 25, Janeiro 1932, P. 2 30 Anais do Município de Coimbra, 1920‑1939, P. 298 31 «A Acção do “Ninho dos Pequenitos nos dois primeiros anos da sua existência», In A Saudinha, Nº 11, Fevereiro 1933, P. 1 32 A.U.C. – Fundo Assembleia Distrital: Livro de Actas da Comissão Executiva da Junta Geral de Distrito, Nº 36, 1930‑1932, Fl. 65. 33 «Notas do Relatório que no dia 2 de Novembro de 1938 a Junta de Província da Beira Litoral, em obediência ao Artº 242º do Código Administrativo, houve por bem apresentar ao Conselho da ,mesma Junta» In A Saúde, Jan., Fev. e Março, 1939, Ano IX, N.ºs 193 a 198, P. 9 34 «A Profilaxia da Tuberculose “ O Ninho dos Pequenitos”» In A Sáude, Nº 42, Setembro 1932, P. 2 35 Bissaya‑Barreto – Uma Obra Social (…) Vol. I (…) P. 272. 36 A.U.C. – Fundo Assembleia Distrital: Livro de Actas da Comissão Executiva da Junta Geral de Distrito, Nº 36, 1930‑1932, Fl. 65v. 37 «Notas do Relatório que no dia 2 de Novembro de 1938 a Junta de Província da Beira Litoral, em obediência ao Artº 242º do Código Administrativo, houve por bem apresentar ao Conselho da ,mesma Junta» In A Saúde, Jan., Fev. e Março, 1939, Ano IX, N.ºs 193 a 198, P. 8 38 «Dispensário da Obra de Protecção à Grávida e Defesa da Criança» In A Saúde, Outubro 1931, Nº 20, P. 2 39 «Notas do Relatório que no dia 2 de Novembro de 1938 a Junta de Província da Beira Litoral, em obediência ao Artº 242º do Código Administrativo, houve por

Notas

bem apresentar ao Conselho da ,mesma Junta» In A Saúde, Jan., Fev. e Março, 1939, Ano IX, N.ºs 193 a 198, P. 9 40 Bissaya‑Barreto – Uma Obra Social (…) Vol. I (…) P. 91. 41 «Um ano de serviço no Dispensário da “Obra de Protecção à Grávida e Defesa da Criança», In A Saúde, Janeiro 1933, Nº 50, P. 2 42 A.U.C. – Fundo Assembleia Distrital: Livro de Actas da Comissão Executiva da Junta Geral de Distrito, Nº 36, 1930‑1932Fl. 66. 43 Luís Raposo «A Tuberculose e a Criança» In A Saúde, Agosto, 1931, Nº 15, P. 1 44 Luís Raposo «A Tuberculose e a Criança» In A Saúde, Julho 1931, Nº 13, P. 1 45 Bissaya‑Barreto – «A obra da Assistência da Junta Geral de Coimbra» In Congresso da União Nacional, Discursos teses e comunicações, Vol. II, Ed. União Nacional, Lisboa, 1935, P. 165. 46 Fundo Assembleia Distrital: Livro de Actas da Comissão Executiva da Junta Geral de Distrito, Nº 36, 1930‑1932, Fl. 169. 47 «Ninho dos Pequenitos» In Correio de Coimbra, Sábado, 28 Abril 1934, P. 2 48 «A favor do Ninho dos Pequenitos» In Correio de Coimbra, 14 Julho 1934, P. 4 49 Bissaya‑Barreto – Uma Obra Social realizada em Coimbra, Vol. I (…) 1970, P. 333 50 Id. Pp. 333‑334 51 Santos Bessa ‑ «Comemoração dos 20 anos de actividade da Maternidade Bissaya‑Barreto» In Revista da Fundação Bissaya‑Barreto, Vol. 1, Nº 2, Coimbra, Dezembro, 1986, P. 37 52 «A Exposição da Criança» In A Saúde, Nº 58, Maio 1933, P. 4 53 Bissaya‑Barreto – Uma Obra Social realizada em Coimbra, Vol. I (…) 1970, P. 334 54 Id. 55 Id. P. 335 56 Alcina Maria de Castro Martins – Génese, Emergência e Institucionalização do Serviço Social Português, Textos Universitários de Ciências Sociais e Humanas, Fundação Calouste Gulbenkian, Fundação para a Ciência e Tecnologia, Ministério da Ciência e da Tecnologia, 1999, P. 254. 57 Id. P. 256. 58 Id. 59 Jorge Pais de Sousa – Bissaya‑Barreto (…) P. 15. 60 Alcina Maria de Castro Martins – Génese, Emergência e Institucionalização do Serviço Social Português, (…) P. 373. 61 Id. P. 293. 62 Bissaya‑Barreto – Uma Obra Social (…) Vol. I (…) P‑335

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63 Fundo Assembleia Distrital: Livro de Actas da Comissão Executiva da Junta Geral de Distrito, Nº 37, 1932‑1935, Fl. 140. 64 A.U.C. – Fundo Assembleia Distrital: Livro de Actas da Comissão Executiva (…) Nº 37, 1932‑1935, Fl. 144. 65 A.U.C. – Fundo Assembleia Distrital: Livro de Actas da Comissão Executiva da Junta Geral de Distrito, Nº 37, 1932‑1935, Fls. 158v.‑159v. 66 A. U. C. – Fundo Assembleia Distrital: Livro de Actas da Comissão Executiva (…) Nº 38, 1935‑1937, Fl. 44v. 67 «Notas do Relatório que no dia 2 de Novembro de 1938 a Junta de Província da Beira Litoral, em obediência ao Artº 242º do Código Administrativo, houve por bem apresentar ao Conselho da ,mesma Junta» In A Saúde, Jan., Fev. e Março, 1939, Ano IX, N.ºs 193 a 198, Pp. 8 e 9 68 A.U.C. ‑ Fundo Assembleia Distrital: Livro de Actas da Comissão Administrativa da Junta de Província da Beira Litoral, Nº 39, 1937‑1940 fl. 137 69 A. U. C. – Fundo Assembleia Distrital: Livro de Actas da Comissão Executiva (…) Nº 38, 1935‑1937Fl. 57. 70 Bissaya‑Barreto – Uma Obra Social (…) Vol. I (…) Pp. 334‑335 71 «Notas do Relatório que no dia 2 de Novembro de 1938 a Junta de Província da Beira Litoral, em obediência ao Artº 242º do Código Administrativo, houve por bem apresentar ao Conselho da ,mesma Junta» In A Saúde, Jan., Fev. e Março, 1939, Ano IX, N.ºs 193 a 198, Pp. 9 e 10 72 Id. P. 14 73 A. U. C. – Fundo Assembleia Distrital: Livro de Actas da Comissão Administrativa da Junta de Província da Beira Litoral, Nº 39, 1937‑1940, Fl. 8v. 74 Luís Raposo «A Tuberculose e a Criança» In A Saúde, Setembro, 1931, Nº 17, P. 2 75 A. U. C. – Fundo Assembleia Distrital: Livro de Actas da Comissão Administrativa da Junta de Província da Beira Litoral, Nº 39, 1937‑1940Fl. 176. 76 Vide Apêndice II da obra. 77 Dados extraídos de A. U. C. – Fundo Assembleia Distrital: Movimento de Internados no Ninho dos Pequenitos, 1947 (Pt.) 78 Bissaya‑Barreto – Uma Obra Social (…) Vol. I Pp. 89‑90 79 Id. P. 234. 80 Pierre Goemaere – Bissaya‑Barreto (…) P. 124. 81 Bissaya‑Barreto – Uma Obra Social (…) Vol. I (…) P. 284. 82 Id. P. 291.

Notas

83 «Protecção à infância» In A Saúde, Nºs 137 e 138, Setembro, 1936, P. 6 84 Bissaya‑Barreto – Uma Obra Social (…) Vol. I (…) P. 102 85 Bissaya‑Barreto – Subsídios para a História, Vol. I, P. 6. 86 Santos Bessa – Alocução proferida pelo Exmo. Sr. Dr. José dos Santos Bessa na Ceri‑ mónia da Tomada de Posse do Conselho Geral do Centro Hospitalar em 26 de Janeiro de 1990, Coimbra, 1990, P. 17 87 A.U.C. ‑ Livro de Actas da Junta de Província da Beira Litoral, Nº 16, 1945‑1947, Fl. 77. 88 Santos Bessa ‑ «O Centro Hospitalar de Coimbra e a Acção do Professor Doutor Bissaya‑Barretp» In Ver da Fundação Bissaya‑Barreto, Vol. 2, Nº 3, Coimbra, Junho 1987, P. 22 89 A.UC. – Livro de Actas da Junta de Província da Beira Litoral, Nº 16, 1945‑1947, Fl. 3v. 90 Id. Fl. 4v. 91 Id. Fls. 56v.‑57 92 Id. Fl. 72 93 Id. 94 Id. Fl. 175v. 95 Id. Fls. 185‑185v. 96 Viriato Namora ‑ «Os meus subsídios…Trilogia Ninho dos Pequenitos – Associação Académica – Obra de assistência Materno Infantil do Professor Bissaya‑Barreto» In Notícias, Ano 1, Número 2, Fundação Bissaya‑Barreto, Julho 1997, P. 2. 97 A.UC. – Livro de Actas da Comissão Administrativa da Junta de Província da Beira Litoral, Lº Nº 23, 1954‑1955, Fl. 54 98 Id. Fl. 89v. 99 Id. Fl. 138v. 100 Id. Fls. 89v.‑ 90 e 116. 101 Bissaya‑Barreto – Uma Obra Social (…) Vol. I, Pp. 136‑137. 102 Manuel Chaves e Castro (org. de) ‑ Delegação do Instituto Maternal Zona Centro, Coimbra, alinea D) 103 «Breves Notas na História do Ninho dos Pequenitos» In O Amor e o Abando‑ no, I Encontro com a ternura, 26 Maio 1991, Unidade de Intervenção Precoce da Maternidade Bissaya‑Barreto e Fundação Bissaya‑Barreto (org. de), P. 27 104 Manuel Chaves e Castro (org. de) ‑ Delegação do Instituto Maternal Zona Centro, Coimbra, alinea D) 105 «O “Ninho dos Pequenitos” voltou a funcionar em Coimbra» In Diário de Coimbra, 29 de Abril de 1969, P. 5

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o ninho dos pequenitos ‑ 8 décadas a fazer sorrir as crianças da nossa terra

106 Id. 107 Vide Depoimento da Dra. Graça Araújo no Apêndice I da obra. 108 Bissaya‑Barreto – Subsídios para a História, Vol. VII, Pp. 319‑321. 109 Id. P. 320 110 Id. Pp. 791‑794. 111 «Breves Notas na História do Ninho dos Pequenitos» In O Amor e o Abando‑ no, I Encontro com a ternura, 26 Maio 1991, Unidade de Intervenção Precoce da Maternidade Bissaya‑Barreto e Fundação Bissaya‑Barreto (org. de), P. 27 112 Vide Depoimento do Dr. Jorge Biscaia no Apêndice I da obra. 113 «Centro de Intervenção Precoce estimula relação entre mãe e filho» In As Beiras, 12/12/1989, P. 114 Vide Depoimento do Dr. Jorge Biscaia no Apêndice I da obra. 115 Vide Depoimento da Doutora Fátima Mota no Apêndice I da obra. 116 Id. 117 A.A.S. – Acordo de Cooperação Tipíco celebrado entre o Centro Regional de Segurança Social de Coimbra e a Fundação Bissaya‑Barreto, 27 Maio 1991. 118 A.A.S. ‑ Acordo de Cooperação Atipíco celebrado entre o Centro Regional de Segurança Social do Centro/Serviço Sub‑Regional de Coimbra e a Fundação Bissaya‑Barreto, 12 de Julho 1995 119 Acordo de Cooperação celebrado entre o Centro Regional de Segurança Social do Centro/Serviço Sub‑Regional de Coimbra e a Fundação Bissaya‑Barreto, 1 Setembro 1997 120 Vide Depoimento da Doutora Fátima Mota no Apêndice I da obra. 121 Vide Depoimento do Dr. Jorge Biscaia no Apêndice I da obra. 122 A.A.S – Cópia da Constituição de Associação, 4º Cartório Notarial de Coimbra, Livro de Escrituras Diversas, Nº 90‑H, Fls. 80 123 A.A.S. – Acordo de Cooperação entre o Centro Hospitalar de Coimbra (Maternidade Bissaya Barreto / Ninho) e a Sorriso – Associação dos Amigos do Ninho dos Pequenitos, 20 de Setembro 2004 124 A.A.S. – Protocolo celebrado entre o Centro Distrital de Segurança Social de Coimbra e a Sorriso, 29 Outubro 2004 125 A.A.S. – Estatutos da “Sorriso – Associação dos Amigos do Ninho dos Pequenitos 126 A.A.S. – Cópia da Acta de 28/11/2007 127 Vide Depoimento da Doutora Albertina Costa no Apêndice I da obra. 128 Id.

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