NOSTALGIA SEM PRUMO: A POLÍTICA EXTERNA DE MICHEL TEMER APÓS A SAÍDA DE JOSÉ SERRA

May 23, 2017 | Autor: C. Pereira da Sil... | Categoria: International Relations, Foreign Policy Analysis, International Political Economy, Foreign Policy, Financial Crisis of 2008/2009, History of Brazilian Foreign Relations, Mercosur/Mercosul, Grand Strategy, Brazilian Foreign policy, BRICS, Economia Política, Relações Internacionais, Política Externa, História da Política Externa Brasileira, Economia Brasileira, Politica Externa brasileira no governo lula, gramáticas políticas no Brasil, Brazil foreign policy, Estudos de Defesa, Defesa Estratégica, Segurança Estratégica, Segurança Externa, Segurança Interna, Segurança Pública, Gestão Estratégica Internacional, Sistema Interestatal, Guerras e Conflitos, Poder, Ciência Política, Sociologia, Antropologia., Brasil - Argentina, Política Externa Brasileira, Nova República, PSDB, Fernando Henrique Cardoso, Donald Trump, Brasil - Itamaraty - PEB, Economia Brasileira Contemporanea, Política no Brasil Governo Lula e Dilma, History of Brazilian Foreign Relations, Mercosur/Mercosul, Grand Strategy, Brazilian Foreign policy, BRICS, Economia Política, Relações Internacionais, Política Externa, História da Política Externa Brasileira, Economia Brasileira, Politica Externa brasileira no governo lula, gramáticas políticas no Brasil, Brazil foreign policy, Estudos de Defesa, Defesa Estratégica, Segurança Estratégica, Segurança Externa, Segurança Interna, Segurança Pública, Gestão Estratégica Internacional, Sistema Interestatal, Guerras e Conflitos, Poder, Ciência Política, Sociologia, Antropologia., Brasil - Argentina, Política Externa Brasileira, Nova República, PSDB, Fernando Henrique Cardoso, Donald Trump, Brasil - Itamaraty - PEB, Economia Brasileira Contemporanea, Política no Brasil Governo Lula e Dilma
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NOSTALGIA SEM PRUMO: A POLÍTICA EXTERNA DE MICHEL TEMER APÓS A SAÍDA DE JOSÉ SERRA Carlos Frederico Pereira da Silva Gama1 Diretor de Assuntos Internacionais Professor de Relações Internacionais

Universidade Federal do Tocantins (UFT) Simplificar as complexidades da política externa é uma atitude tentadora. Seja pela via do personalismo (reduzindo políticas públicas às idiossincrasias do ocupante da chancelaria), seja através de um downsizing institucionalizado (menos tarefas, menos ambiciosas, mais eficiência). A sedução das narrativas simples ajuda a reduzir ansiedades políticas, facilita a comunicação e aparentemente dissolve as incertezas em voga. Infelizmente, a redução da complexidade nos leva frequentemente a um conjunto de paradoxos. O Brasil de Dilma Rousseff herdou de Lula (e menor escala, de FHC) ambições regionais e globais. Hora um “global trader” integrante de cadeias globais de produção, hora um “global player” na posição confortável de emergente, capaz de transformar instituições internacionais em seu favor. O fim do boom das commodities tornou insustentável a produção de novas classes médias pela via do consumo e dificultou políticas públicas de transferência de renda. A realização de megaeventos não dinamizou a economia, tampouco se mostrou capaz de projetar poder suave no plano externo. A derrapagem econômica foi acompanhada pelo esfacelamento da aliança PT-PMDB. Em meio a desilusões eleitorais e abundantes denúncias de corrupção, a supervisão judicial sobre o sistema político atingiu extensão inédita. Num par de anos, a Nova República envelheceu décadas. O impeachment de Dilma não trouxe respostas ao quadro de constrangimentos entrelaçados nos planos doméstico e internacional. Longe disso: o governo interino agregou mais perguntas ao drama em curso. Ao declinar da postura emergente de um “global player”, Michel Temer adotou perfil similar ao segundo mandato de FHC. Buscou parcerias tradicionais de comércio e investimento com Estados Unidos e Europa. Em detrimento de novos horizontes, o Brasil buscaria o status de “global trader”. Entretanto, Dilma foi levada a reativar tais alianças no seu breve segundo mandato. Num mundo parcialmente globalizado entre-crises, os países emergentes não conseguiram transformar por completo a ordem internacional e os poderes estabelecidos vivem uma lenta recuperação. Uma política externa ecumênica e pragmática busca ampliar o limitado leque de escolhas dos emergentes, num mundo menos próspero. Sem novos frutos para colher, os que Temer produziu foram requentados do passado recente. Desde a viagem de senadores oposicionistas de Dilma à Venezuela em Junho de 2015, a política externa se inclinou na direção do PSDB. Encabeçada pela chapa derrotada em 2014 (Aécio Neves e Aloysio Nunes Ferreira), a comitiva incluía José Serra até a véspera do embarque. Após a visita e recepções de familiares de presos políticos venezuelanos, a crise venezuelana se tornou um trunfo na disputa política doméstica, enfraquecendo Rousseff. Doravante, a Comissão de Relações Exteriores do Senado (presidida por Aloysio) passou a promover uma agenda externa própria. O impeachment tornou esses opositores de Dilma a vanguarda da “nova” PEB. Sem surpresas e com as bênçãos de Aécio, Temer guindou primeiro Serra (2016) e em seguida Aloysio (2017) ao Itamaraty. Subitamente, constrangimentos maiores do que a personalidade dos chanceleres se fizeram visíveis. Desde o fim do século XX, o Brasil vive processo acentuado de desindustrialização, acompanhado por ondas de precarização do trabalho. A commoditificação da pauta de exportação brasileira se acentuou, ao passo que a

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Agradecimentos a Manoela Assayag que motivou a feitura do texto e cujos preciosos comentários aprimoraram o argumento central

produtividade e inovação nos demais setores submergiam. Ser um “global trader” não é suficiente para reverter as implicações dessa transformação no perfil da inserção do país no sistema internacional. A política externa de Temer buscou resolver essas contradições sem, porém, indicar caminhos para a mudança. Parte dos analistas apostou no perfil de Serra – candidato presidencial com milhões de votos, senador, deputado federal, ministro, governador e prefeito de São Paulo. Sua força política e postura proativa seriam suficientes para quebrar impasses na política externa e dinamizar o Itamaraty. Outros apostaram na redução das ambições como bálsamo. A reaproximação com o “Ocidente” (EUA e Europa) traria alívio imediato para um país debilitado. Tarefas menos ambiciosas e mais tradicionais seriam concretizadas de forma mais rápida e eficiente pelo consórcio PMDB-PSDB. Abreviada por uma enfermidade, a gestão Serra produziu resultados desapontadores, frustrou as expectativas de seus apoiadores e comprometeu seu desejo de disputar a presidência em 2018. Negociações com a União Europeia emperraram em disputas Brasil-Argentina por protagonismo regional. O perfil baixo de Temer não fez sombra às aspirações flamantes de Maurício Macri. A diplomacia presidencial, já combalida sob Dilma, se tornou ainda mais invisível no governo interino. Apesar de colaborarem para marginalizar decisivamente a Venezuela de Nicolás Maduro, a disputa assimétrica entre Brasil e Argentina por mercados e investimentos deixou o MERCOSUL numa desconfortável paralisia. A predileção por Hillary Clinton motivou falas memoráveis de Serra – “a vitória de Donald Trump não pode acontecer, é um pesadelo”. Em seguida, o Brasil foi esnobado de forma ultrajante pelo presidente eleito. Os EUA se recusaram a receber integrantes do contestado governo Temer, alegando problemas de agenda. Por outro lado, Trump se reuniu com urgência com o presidente argentino, bem como com outros mandatários sul-americanos – num recado claro. Mudanças de rumo trazem efeitos inesperados, nem sempre bem-vindos por seus idealizadores. O governo improvisado após o impeachment reduziu a autonomia de voo do Ministério das Relações Exteriores. O ministro da Indústria, Comércio Exterior e Serviços Marcos Pereira entabulou mais negociações, realizou mais viagens internacionais (e foi menos contestado por suas declarações) do que Serra. A Fazenda de Henrique Meirelles agiu com desenvoltura (e músculo político) condizentes com uma candidatura presidencial, ao contrário do ofuscado chanceler. A doença que vitimou Serra não traz consolo algum para uma política externa que perdeu seu lugar no mundo, sem recuperar o prestígio perdido em meio a fraturas mais expostas que as de outrora. A renúncia de Serra frustrou seus profetas e deu continuidade ao desconforto do Itamaraty na redivisão de tarefas do Brasil aspirante a “global trader”. A escolha de Aloysio Nunes Ferreira, por sua vez, indica que o governo Temer ainda não sabe como viabilizar uma grande estratégia no plano externo mas mantém em curso o precário arranjo político que o alçou ao Palácio do Planalto. Recentemente, a revista Foreign Affairs defendeu uma política externa de perfil baixo (se unindo ao coro dos descontentes com a retórica inflamada e frequentemente desastrosa de Trump). A discrição pragmática produziria frutos mais duradouros que a pirotecnia megalomaníaca, a menores custos. No caso brasileiro, a suposta virtude da invisibilidade se tornou o último refúgio contra os críticos. Na condução da “nova” política externa sob Temer, palavras são de prata, mas o silêncio é de ouro.

REFERÊNCIAS Abdalla, Igor (2016). "Temos de volta o Itamaraty!". Instituto Teotônio Vilella. Disponível em: http://itv.org.br/pensando-obrasil/politica-externa/temos-de-volta-o-itamaraty-por-igor-abdalla . Acesso em: 26 de Setembro de 2016. Barrocal, André (2016). “José Serra, um chanceler 'decorativo'”. Carta Capital. Disponível https://www.cartacapital.com.br/politica/jose-serra-um-chanceler-decorativo. Acesso em: 25 de Setembro de 2016.

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