Nota \"O que fazer ante o incumprimento de acordos parassociais?\" - 2013

July 15, 2017 | Autor: Sofia Vale | Categoria: Angola, Direito Empresarial, DIREITO COMERCIAL, Acordos Parassociais
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O QUE FAZER ANTE O INCUMPRIMENTO DE ACORDOS PARASSOCIAIS?

Sofia Vale Maio de 2013

Os acordos parassociais são extremamente utilizados na nossa prática societária. Eles podem ser celebrados antes da outorga do contrato de sociedade, estabelecendo as bases sobre as quais se constituirá uma nova sociedade, ou após a constituição da sociedade. É muito comum entre nós, no âmbito dos projectos de investimento a submeter perante a Agência Nacional para o Investimento Privado (ANIP), os futuros sócios de uma sociedade a constituir estabelecerem através de um acordo parassocial as linhas gerais do seu projecto de investimento, as obrigações de cada um dos futuros sócios para a realização do negócio social, as formas através das quais o projecto será financiado, bem como as regras que irão pautar o funcionamento dos órgãos sociais (regras estas que, no acto de constituição da sociedade, deverão ser transpostas para o pacto social). Estes acordos parassociais podem também assumir a natureza de um contrato-promessa de constituição de sociedade, para reforçar o compromisso dos sócios na sua constituição após a aprovação do projecto de investimento pela ANIP. Atenta a sua natureza tendencialmente confidencial, porquanto é prática comum a inserção de uma cláusula de confidencialidade nos acordos parassociais, a sua existência só é conhecida do público quando se verifica uma situação de incumprimento. Registe-se, porém, a tendência, no domínio dos mercados financeiros, no sentido de tornar públicos os acordos parassociais celebrados entre os sócios de sociedades que estejam sujeitas à supervisão de entidades reguladoras. Impondo a publicidade dos acordos parassociais, veja-se o artigo 113.º da Lei n.º 12/2005, de 23 de Setembro (Lei de Valores Mobiliários), em que se exige que sejam comunicados à Comissão de Mercado de Capitais, no prazo de três dias após a sua celebração, os acordos parassociais que «visem adquirir ou reforçar uma participação qualificada em sociedade aberta, ou assegurar ou frustrar o êxito de oferta pública de aquisição». No mesmo sentido vai o artigo 79.º, n.º 1, da Lei n.º 13/2005, de 30 de Setembro (Lei das Instituições Financeiras), nos termos do qual «os acordos parassociais entre accionistas de instituições financeiras relativos ao exercício do direito de voto estão sujeitos a registo no Organismo de Supervisão competente, sob pena de ineficácia».

Imagine-se, então, que uma das partes não cumpre o acordado em sede parassocial. De que mecanismos se pode socorrer a contraparte para exigir o respectivo cumprimento ou, tal não sendo possível, para ser ressarcida pelos danos que tal incumprimento lhe causou? Ainda que se verifique uma eficácia relativa dos acordos parassociais, nada obsta, prima facie, a que, em caso de incumprimento de uma obrigação do acordo parassocial, se apliquem as normas gerais relativas ao incumprimento das obrigações. Deste modo, os sócios lesados podem intentar uma acção de indemnização, para ressarcimento de perdas e danos contra o sócio que não cumpriu o acordo parassocial (artigos 562.º e 789.º do Código Civil). Contudo, no seio dos mecanismos gerais de reacção ao incumprimento, cabe indagar da possibilidade de se exigir judicialmente o cumprimento da obrigação constituída pelo acordo parassocial, ao abrigo do disposto no artigo 817.º do Código Civil (acção de cumprimento). Em regra, nada parece indiciar o afastamento do mecanismo da acção de cumprimento, desde que a prestação ainda seja possível. No que respeita à acção de execução específica (artigo 830.º do Código Civil), deve entender-se que ela poderá sder utilizada caso estejam preenchidos os pressupostos básicos para a sua aplicação: (i) a validade do acordo parassocial e (ii) a conformidade com os requisitos do artigo 830.º do Código Civil. Por exemplo, o recurso à execução específica deverá ser admitido nas relações entre sócios que subscrevam um acordo parassocial que consubstancie um contrato-promessa de transmissão de participações sociais. Os casos mais complexos de aplicação do mecanismo da execução específica correspondem aos acordos de voto. Parece inequívoco que à luz do disposto no artigo 19.º, n.º 1 da Lei das Sociedades Comerciais, sendo os votos emitidos na assembleia geral (em desconformidade com o acordo parassocial), estes tornam-se inimpugnáveis, restando apenas às restantes partes no acordo parassocial uma tutela indemnizatória – não sendo viável, pelas razões apontadas, o recurso ao mecanismo de execução específica. Mas o recurso à execução específica poderá, em nosso entender, admitir-se em casos de deliberações sociais futuras (o que inclui a renovação de deliberações quando os efeitos das deliberações anteriores ainda possam ser alterados), quando se verifique uma declaração antecipada de não cumprimento. Este entendimento não é, contudo, pacífico, para quem cuide que o direito de voto, atendendo à sua natureza, não poderá ser exercido através de uma sentença, sendo indissociável da pessoa do seu titular. É de admitir igualmente a possibilidade de recurso a providência cautelar, seguindo o regime plasmado no artigo 399.º do Código de Processo Civil, nas situações elencadas supra, para prevenir o incumprimento do acordo relativo ao direito de voto.

Mais discutível se afigura a possibilidade de incluir no contrato de sociedade uma cláusula na qual se preveja que o sócio que violar as disposições de um acordo parassocial que tenha subscrito pode ser excluído da sociedade, atenta a ineficácia relativa dos acordos parassociais plasmada no artigo 19º, n.º 1 da Lei das Sociedades Comerciais. Torna-se, por isso, prática corrente a inserção de pesadas cláusulas penais nos acordos parassociais, na tentativa de, por um lado, dissuadir comportamentos inadimplentes e, por outro lado, salvaguardar a posição da parte cumpridora em caso de incumprimento, mediante a fixação prévia do quantum indemnizatório que torna desnecessária a produção de prova quanto à extensão dos danos.

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