NOVAS PLATAFORMAS TELEVISIVAS: UM ESTUDO DO MERCADO DAS SÉRIES ESTABELECIDO NOS MODELOS HBO E NETFLIX

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FACULDADES INTEGRADAS HÉLIO ALONSO CURSO DE JORNALISMO

NOVAS PLATAFORMAS TELEVISIVAS: UM ESTUDO DO MERCADO DAS SÉRIES ESTABELECIDO NOS MODELOS HBO E NETFLIX

ANA ELISA WADOVSKI CARNEIRO

RIO DE JANEIRO 2013

 

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ANA ELISA WADOVSKI CARNEIRO

NOVAS PLATAFORMAS TELEVISIVAS: UM ESTUDO DO MERCADO DAS SÉRIES ESTABELECIDO NOS MODELOS HBO E NETFLIX

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Coordenação Pedagógica do Curso de Jornalismo como requisito parcial para a obtenção do grau de bacharelado em Jornalismo. Professora orientadora Ariane Holzbach

RIO DE JANEIRO 2013

 

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Aluno: Ana Elisa Wadovski Carneiro Novas Plataformas Televisivas: Um Estudo Do Mercado Das Séries Estabelecido Nos Modelos HBO E NETFLIX

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Coordenação Pedagógica do Curso de Jornalismo, das Faculdades Integradas Hélio Alonso como requisito parcial para a obtenção do grau de bacharelado em Jornalismo.

AVALIAÇÃO

NOTA FINAL: 9,5

AVALIADO POR Ariane Holzbach Gabriel Mendes Luciano Zarur

Rio de Janeiro, 26 de junho de 2013

 

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Sinto-me nascido a cada momento Para a eterna novidade do Mundo Fernando Pessoa

 

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AGRADECIMENTOS Os últimos meses em que elaborei esta redação foram os mais compensadores e desafiadores que tive, tanto nas conquistas pessoais quanto profissionais. A isto devo a confiança de colegas e professores que me auxiliaram na elaboração do meu primeiro trabalho acadêmico. Agradeço primeiramente a minha mãe Regina por nunca medir esforços em me garantir uma formação acadêmica de excelência e moldar meu caráter com seu exemplo de vida e amor incondicional. Você é a minha base e inspiração. Aos meu avós maternos Raimunda e Thadeu, que sempre foram minha luz nos momentos mais difíceis. Devo a vocês as melhores lembranças da minha infância. Vó, você é a maior saudade que eu guardo. Este trabalho é dedicado à senhora e à sua força em atravessar todas as adversidades com dignidade. Vô, obrigada por ter visto muita Televisão comigo (mesmo que a contragosto) e patrocinado a maior parte dos meus livros, me ensinando desde cedo a importância da leitura. Aos meus irmãos Guti e Téia, por entenderem minha ausência nos últimos meses de trabalho e torcerem pelo meu sucesso. Obrigada também aos meus sobrinhos Ruy e Yuri e aos meus cunhados Tânia e Silvano, por fazerem eu me sentir tão especial. Ao meu padrasto Ricardo, pela paciência nos momentos de crise e por me fazer acreditar no meu potencial. Obrigada por ter agido como um pai quando foi necessário. Aos queridos amigos que foram uma válvula de escape quando a responsabilidade pesou sobre os meu ombros. Obrigada pela companhia e pela amizade, tornando a minha vida muito mais completa. Desejo o mesmo sucesso a todos vocês nesta nossa caminhada. À minha orientadora Ariane Holzbach, por ter acreditado mais em mim do que eu mesma. Obrigada por compartilhar gentilmente seu conhecimento comigo e por todo incentivo nas horas mais críticas. Você faz parte desta conquista. Foi uma honra ser sua orientanda. Muito obrigada.

 

6   Faculdades Integradas Hélio Alonso Curso de Jornalismo Título: Novas Plataformas Televisivas: Um Estudo Do Mercado Das Séries Estabelecido Nos Modelos HBO E NETFLIX Autora: Ana Elisa Wadovski Carneiro Orientador: Ariane Holzbach

 

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RESUMO Compreender a tendência do mercado audiovisual para os próximos anos no contexto das séries televisivas é o objetivo deste trabalho. O estudo de caso contemplará

a

observação

dos

seriados

como

uma

proposta

de

entretenimento para o futuro da produção nacional, os quais priorizam o diálogo interativo com os fãs. Na primeira parte do trabalho, será observada a mudança de papel da Televisão quando estabelecido um novo momento da comunicação

propiciado

pela

internet.

A

segunda

parte

trata

do

estabelecimento da TV por assinatura, baseada na história da HBO e na recente sanção da Lei 12.485, que força a quebra do modelo hegemônico das narrativas das TV abertas brasileiras. As emissoras de TV recorrem ao mundo digital em busca de novas plataformas que permitam a criação de universos narrativos mais complexos e que agreguem valor à Televisão, estabelecendo marcas de qualidade dentro do contexto das redes sociais, priorizando a forma narrativa estudada na terceira parte deste trabalho, as séries.

Palavras-chave: Seriados; HBO; NETFLIX; Televisão, Interatividade

 

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ÍNDICE DE FIGURAS

Figura 1 . Página inicial do site Save The Sarah Connor Chronicles feito por fãs para que a série retorne à TV. Figura 2. Tela de um dos sites que disponibilizam para download todos os episódios da série Guerra dos Tronos da rede HBO. Figura 3. Pôster promocional da série do canal FOX estrelada pelo ator Kevin Bacon. Figura 4. O produtor e diretor Steven Spielberg anunciando sua parceria na criação da série exclusiva Halo durante um evento promovido pela Xbox. Figura 5. Página inicial da NETFLIX com anúncio de Arrested Development em streaming do site de videos por demanda. Figura 6. Página de seriados no aplicativo HBOGo apresenta séries disponíveis para assinantes premium. Figura 7. Elenco e produtores da série enviando suas mensagens para a campanha It Gets Better dentro da página oficial da HBO. Figura 8. Mapa que localiza personagens da trama e faz a breve descrição do episódio da semana disponível no site oficial da HBO. Figura 9. Tela inicial do HBO Connect para a série Guerra dos Tronos. Figura 10. Campanha Show Your Fangs para o inicio da sétima temporada de True Blood reuniu uma galeria de fotos com fãs na página do HBO Connect.

 

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SUMÁRIO Introdução............................................................................................ 1. A TV frente à Internet ........................................................... 1.1 Convergência dos meios....................................................... 1.2 Os meios e suas especialidades .................................................. 1.3 O modelo on demand .................................................................... 1.3.1 On demand como sinônimo de interatividade ......... 1.4 Os caminhos da televisão ................................................... 2. TV por assinatura versus TV aberta ............................................... 2.1 Primeiras transmissões em TV aberta no Brasil ............... 2.2 O Brasil e a TV aberta................................................................... 2.3 Histórico da TV a cabo no mundo............................................. 2.4 TV Segmentada........................................................................ 2.4.1 “It’s not TV. It’s HBO.”- A HBO em 1972.................... 2.4.2 A questão da censura................................................... 2.5 Histórico da TV a cabo no Brasil............................................ 2.6 A tecnologia nas transmissões – satélites, cabos e IPTV.......... 2.7 Lei 12.485: Estímulo à produção nacional e regulamentação do setor.............................................................................................. 2.8 A entrada das telefonias no segmento televisivo...................... 2.9 Como as TVs abertas estão se preparando para competir com o mercado de TV paga?............................................................ 2.10 Laboratório da Interatividade............................................... 3. Séries: O futuro do entretenimento na TV.................................. 3.1 Novelas versus Séries.............

 

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3.2 Séries na TV aberta..................................................... 3.3 Séries na TV fechada........................................... 3.4 O cinema convergindo para a TV.................................. 3.5 Netflix versus HBO ....................................................... 3.6 O Universo Das Séries Conduzindo Modelos De Interatividade.................. 3.6.1 Guerra dos Tronos e True Blood........................... 5. Conclusão .............................................................................. 6. Referências..............................................................................

 

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INTRODUÇÃO

Imaginar a Internet em oposição à televisão é bobagem; ao contrário, ela é apenas mais uma forma de enviar e receber a televisão. E a TV está se tornando mais popular, não menos. Suspeito que estamos testemunhando uma transformação da TV, ao invés do seu falecimento. Toby MILLER, chefe do departamento dos estudos de Mídia e Cultura na Universidade da Califórnia  

Há algum tempo, é discutido entre os teóricos de comunicação qual será o futuro de mídias como o rádio e a televisão. Especula-se sobre novas tecnologias suprimindo as “velhas”, causando a morte destas. Nesse sentido, a afirmação de Toby Miller não poderia ser mais clara, demonstrando que este argumento não está de acordo com os atuais rumos que os meios têm tomado, em especial, a Televisão. Estamos diante de novas formas de convergência que estão mudando constantemente a maneira com que vemos e pensamos essa mídia, sem que isso signifique que esteja se tornando outra coisa que senão ela mesma. Vivemos intensamente a “era da Internet”: criamos conteúdo, compartilhamos nossa vida pessoal, participamos de fóruns e comunidades, assistimos a filmes, ouvimos nossas músicas favoritas em qualquer estação e acompanhamos as notícias mundiais minuto-a-minuto, ou seja, comunicamo-nos de forma rápida e carregamos o mundo na tela do computador. De que maneira, então, não considerar que esse novo estilo de vida proporcionado pela tecnologia não esteja deixando as outras mídias obsoletas? Assim como ocorreu com o centenário rádio, a televisão também não perdeu seu espaço, tampouco se tornou uma concorrente à Internet, mas sim a sua extensão(Em recente pesquisa realizada pelo IBGE, no ano de 2012, o número de

 

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lares brasileiros com rádio chegou a 83,4%) 1 . Como afirmam teóricos como MCLUHAN (1920), a TV se apropria das características de outras mídias, conectando-se também à Internet, não como mero aparato mecânico - uma extensão da sua funcionalidade-, mas se firmando como um poderoso agente da convergência sendo esta a razão da TV possuir um status tão peculiar e especial em relação aos outros meios. Em tempo, utilizando ainda o exemplo do rádio, podemos observar que este continua com a mesma essência desde seu surgimento. A diferença crucial, nos dias de hoje, é que podemos escolher qualquer estação que desejamos ouvir tanto através de sites na Internet quanto dos aplicativos acessados pelo celular. A Internet mostrouse uma aliada na conquista de mais audiência, mantendo o rádio como um forte meio de comunicação até agora. A TV Digital Interativa é o resultado dessa transformação, possibilitando ao usuário uma experiência mais avançada que vai além do aumento na qualidade técnica de áudio e imagem. A base para o trabalho dessa união entre TV e Internet é uma consequência dos novos tempos de interatividade: é cada vez mais comum assistirmos à televisão com um notebook ou um celular em mãos, compartilhando cada evento em nossas redes de relacionamento. Para as gerações nascidas na efervescência da Internet – entre as décadas de 1980 e 1990 –, comumente chamadas “Geração Y” e “Geração Z”, respectivamente, é necessário participar o máximo possível dos processos narrativos, opinando com outras pessoas na continuação da trama, possuir acesso extra às informações que não estejam contidas explicitamente na narração e desfrutar deste mesmo universo em outras plataformas como jogos e histórias em quadrinhos; ou seja, sentirem-se imersas nos seus programas favoritos, ocupando uma posição mais ativa nos processos. Cientes disso, as grandes produtoras da TV segmentada, como a HBO e a FOX, estão ampliando seu conteúdo interativo e criando novas plataformas para proporcionar essa experiência, inclusive incentivando maciçamente a participação dos fãs nas redes sociais. Estes modelos interativos presentes na programação das TVs segmentadas geram cada vez mais audiência aos canais, colocando a televisão numa posição privilegiada, afastando a previsão de que a televisão estaria “morrendo” de alguma maneira.                                                                                                                 1

Pesquisa disponível em http://www.teleco.com.br/nrTV.asp. Acessado em 15/03/2013.

 

13   Em decorrência das novas formas de comunicação e interatividade

proporcionadas pela Internet - o que inclui a ascensão do formato da TV segmentada, em especial do canal HBO - o presente trabalho busca analisar como a produção de novos programas baseados na metodologia da interatividade modificaram a maneira com que se tem trabalhado a TV nas últimas quatro décadas. O primeiro capítulo será desenvolvido com base nas influências da Internet sobre a televisão, a fim de que se possa estabelecer um entendimento acerca das características da linguagem televisiva que garantiram sua sobrevivência nas últimas décadas. No segundo capítulo, a televisão passa a ser explorada sob a ótica do modelo à cabo ou, por assinatura, que resultou no boom dos canais segmentados e uma nova realidade para as TVs abertas que precisam repensar a variedade de conteúdos nas suas grades programação. Por fim, o terceiro capítulo irá abordar como a lógica das narrativas transmidiáticas e as múltiplas plataformas para exibição de filmes e séries têm gerado modelos de sucesso como a séries exclusivas Guerra dos Tronos e True Blood, do canal a cabo HBO e do site on demand NETFLIX, respectivamente.

 

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CAPÍTULO I A TELEVISÃO FRENTE À INTERNET

A televisão possui um lugar privilegiado na vida das famílias há várias décadas 2 . A combinação de som e imagem nos transportou para um novo e aparentemente mais completo testemunho dos fatos; uma reformulação na forma com que absorvemos informação. Este primeiro capítulo vai analisar, inicialmente, a televisão como um meio de comunicação de massa e as expectativas que o termo “interatividade” vêm gerando sobre o modelo televisivo já conhecido. Em tempo, será feita uma breve observação do que é interatividade, afim de que se possa esclarecer como se concretiza a convergência das mídias e de que forma elas favorecem os modelos on demand3. Há muito especula-se acerca do efeito que a televisão exerce sobre nós: ora um meio com capacidade de transcender barreiras culturais, ora um “alienador” de audiências (ADORNO, 2002). De qualquer forma, a TV permanece imperativa como um dos mais importantes meios de comunicação na sociedade contemporânea, bem como atesta Kersta (1942, p.26): “a televisão pode superar qualquer meio de comunicação em velocidade, precisão e segurança”. Embora o enunciado soe demasiado radical em uma época que Internet seja sinônimo de velocidade, esta questão poderá ser apreciada mais apropriadamente nas linhas que se seguem. Um estudo da Nielsen4 sobre a audiência na TV convencional demonstrou que os norte-americanos estão passando mais tempo em frente à televisão. De acordo com os dados do estudo, um americano comum assiste a 4 horas e 35 minutos por dia sem contar os espectadores que assistem à televisão online diretamente dos seus computadores. A relevância desses dados e a dificuldade em se mensurar o número total de pessoas que acompanham a televisão de alguma forma, quais sejam, computadores e smartphones, já sugeriu a criação de um novo dispositivo que                                                                                                                 2

Dados do IBGE disponível em http://goo.gl/Jy4HA. Acessado em 15/03/2013. On demand, ou em português, por demand, diz respeito aos conteúdos audiovisuais disponibilizados pelas operados de TV que permitem ao expectador escolher o momento em que deseja assistí-los. 4 Disponível em http://goo.gl/ng5wi. Acessado em 03/02/2013. 3

 

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também forneça os números desta audiência. É possível afirmar que, assim que este dispositivo se tornar uma realidade, haverá um salto significativo na média apresentada pela Nielsen. Desta forma, questionamo-nos: qual mudança ocorrida ao longo dessa década foi conveniente para a televisão, gerando os dados supracitados na pesquisa da Nielsen. Com segurança, podemos afirmar que o advento da Internet gerou uma renovação no modelo televisivo. Basta, então, compreender de que forma a televisão converge com a Internet, aprimorando-se e permitindo uma experiência mais interativa, sem que perca suas peculiaridades. Pode-se considerar que a TV passa por um processo de “remediação” (BOLTER e GRUSIN, 1999), ou seja, ela se inspira nos meios anteriores, atualizando-se retroativamente. Em outras palavras, a TV se apropria das características de seus antecessores, renovando-se de forma que ela não perca seu espaço na atual conjuntura tecnológica e comunicacional.5

1.1 CONVERGÊNCIA DOS MEIOS

Atualmente, considera-se que para que a TV possa usufruir do status “interativa”, ela precisa estar conectada à Internet de alguma forma, seja com o uso do set-top box6 ou já possuindo o conversor integrado ao aparelho - como é o caso das TVs digitais. Isto significa que a televisão, bem como qualquer outro que meio que busque a interatividade, possui uma relação de dependência com a função de trocas em mão-dupla propiciadas pela Internet. Embora dito que “o digital propicia a interatividade” (CANNITO, 2010, p. 27), não significa que a TV vá se tornar “menos” TV. Por mais que o caminho natural do digital seja parecer cada vez mais com a Internet, os meios se afirmam e elevam ao máximo a potencialidade das suas funções. A TV, por ter desenvolvido, ao longo de mais de 60 anos, uma linguagem

                                                                                                                5

Outros meios também realizaram o mesmo processo de remediação, basta observamos o caso do YouTube, uma visível remediação de várias tecnologias, entre elas o videocassete: visualização de vídeos tal como feito nos anos 1980 e 1990, incluindo a mesma disposição dos botões de acesso logo abaixo da tela. 6 Equipamento que conecta o televisor a uma fonte externa de sinal, transformando este sinal em conteúdo no formato que possa ser visualizado no meio televisivo.

 

 

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particular, tende a utilizar as oportunidades da interatividade dentro do seu próprio conteúdo, sem se confundir com uma tela de computador. Quando iniciamos o estudo acerca de interatividade, podemos confundir alguns conceitos e acabamos frustrando certas expectativas quanto aos papéis da televisão e da Internet neste cenário. Destarte, observemos a televisão como um meio de comunicação de massa: um único emissor com capacidade de chegar a inúmeros receptores ao mesmo tempo (PEIRCE, 1887). Ao que se propõe, a TV realiza com sucesso o seu papel, embora esta perspectiva tenha sido rediscutida. Primeiramente, devemos perceber que cada mídia tem seu papel e sua função, mantendo-se mais habilitadas nas especialidades para as quais foram desenvolvidas, mesmo se ponderarmos que os meios digitais estejam reunindo esses recursos – como a própria TV digital ou as múltiplas funções do iPad, o tablet da Apple. A esse respeito, JENKINS (2009) afirma que o “encontro” dos meios de comunicação não ocorre apenas tecnologicamente em aparelhos com múltiplas funções, mas sim nas mentes dos consumidores individualmente, percebidas pelas interações sociais e nas relações espontâneas com a tecnologia – batizada por Jenkins (2009) de “Falácia da caixa preta”(2009). Segundo o autor, ao contrário da união dos meios em um único aparelho como muitos atestam, ele observa várias “caixas pretas” nas casas, tais como televisores, periféricos de som, computadores, celulares etc. Para o pesquisador Newton Cannito (2011, p.25), “tudo indica que a tendência de convergência será especializar os aparelhos e mantê-los em comunicação wireless rede sem fio”. Significa que a tecnologia não tem focado seus esforços de forma a criar um único aparelho que compreenda todos os meios, mesmo que a versatilidade dos smartphones tenha encantado a todos com essa possibilidade. No entanto, como será abordado a seguir, os meios continuam mantendo suas característica e cada vez mais se afirmando nas suas especialidades. Nesse tento, podemos ainda questionar acerca da facilidade que seria a política de integração dos meios, o que incluiria o barateamento dos serviços, mas há várias questões relacionadas aos conceitos de pirataria e de direitos autorais que causariam enorme dificuldade na manutenção desta ordem – programas de pay-per-view poderiam ser “pirateados” deliberadamente para a rede aberta com poucos minutos de atraso. A esse respeito, é muito comum as distribuidoras de filme fecharem acordo com as programadoras de TV para que estas ofereçam com exclusividade os produtos que ainda não chagaram às locadoras ou à

 

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TV aberta: enquanto um grupo de espectadores adquiriu o pacote para esta exibição em pay-per-view, é possível que um usuário libere o sinal “pirateado” para qualquer pessoa que não tenha feito o mesmo.

1.2 OS MEIOS E SUAS ESPECIALIDADES

A exemplo do que foi discutido anteriormente, o Cinema possui similaridades à TV, no que tange à sua materialidade, pois os dois meios trabalham com as mesmas matrizes

de linguagem (CANNITO, 2010, p.41): som e imagem. Contudo, a

experiência oferecida não pode ser retransmitida por completo, mesmo que se possua uma televisão com tela de grandes dimensões e um refinado sistema de som em casa. É possível afirmar que não há uma tendência de substituição de um meio pelo outro, mas uma tentativa de reprodução das sensações oferecidas por eles. As salas de cinema são pensadas para recriar a atmosfera confortável do lar, com cadeiras que se assemelham a sofás e farto sistemas de lanches. Não é por acaso que isso inclua também os inconvenientes de pessoas se levantando ou atendendo celulares no meio do filme: temos a sensação que estamos em casa. O professor da Fundação Getúlio Vargas e um dos diretores da rede mexicana Cinépolis de cinema, Luiz Gonzaga de Luca (2012), observa ainda como a mudança nos formatos de tela do cinema ocorrem também por influência da televisão e viceversa. Basta lembrarmos como o antigo formato em 4x3, quase quadrado, foi alterado pela indústria cinematográfica para se destacar na concorrência com as telas dos televisores na década de 50. Um exemplo clássico destas constantes adaptações são as duas largas barras pretas nas partes superior e inferior dos filmes, que ocorreram acidentalmente pela diferença de proporção de tela adotada nos Estados Unidos, de 1.85m na horizontal para cada metro de altura e, de 1.66m na Europa. Quando uma película europeia era exibida nos cinemas norte-americanos, as duas barras eram necessárias, do contrário, cortes laterais eram feitos e, por ventura, elementos do filme sumiam de cena, causando estranheza no público7.                                                                                                                 7  Uma dessas situações inusitadas aconteceu em um filme de faroeste no qual o cowboy montado em seu cavalo conversa com o xerife que está encostado no poste. Realizado o corte lateral que retirou as duas figuras humanas de cena, temos o clássico diálogo entre o poste e o cavalo.    

 

18   Por outro lado, os grandes fabricantes de televisores investem maciçamente

em qualidade técnica para um ganho que se aproxime ao máximo da experiência cinematográfica, além de disponibilizarem configurações de tela que permitem ao espectador escolher em qual formato deseja ver seu programa, seja em 3x4, zoom ou wide screen. De qualquer forma, um meio continua não desqualificando o outro. O público sabe diferenciar os meios que utiliza e é comum que experimente o que cada um proporciona (CANNITO, 2010): embora um celular tenha como uma das funcionalidades a reprodução de filmes, o dono do aparelho sabe que aquilo continua sendo um celular e dificilmente deixará de frequentar o cinema ou assistir à televisão como de costume.

1.3 O MODELO ON DEMAND Por causa desse numero de mídias e suas várias combinações, a TV acabou sofrendo a pressão do formato da Internet, no qual o exercício da interação possui outros contrastes – como veremos mais adiante, a diferenciação pontual entre interatividade e reatividade. A popularização do ideal de interação mediada por computador criou uma ideia utópica sobre o que seria a interatividade na TV digital. Escolher a pauta dos maiores jornais, discutir abertamente com os apresentadores de um programa ou definir a escalação da Seleção durante a transmissão de um jogo de futebol podem ser facilmente exemplos daquilo que se espera da TV interativa. Na verdade, a TV, por continuar sendo TV, não vai funcionar neste sentido, como atesta Primo: Como a TV é fundamentalmente um meio massivo, podemos inferir que conversação e massa são termos que se opõem. A massa não conversa, não pode se encontrar e debater. (PRIMO, 2001 online)

Com efeito, as interações na TV não podem ser confundidas com algumas novas práticas que habitualmente apresentam-se: escolha dos ângulos de uma cena

 

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num filme ou a venda de peças no modelo on-demand8 oferecido pelas empacotadoras de TV a cabo. Para compreender a construção deste conceito de interatividade, precisamos fazer uma breve retrospectiva baseada no desenvolvimento tecnológico da televisão. Segundo, André Lemos (2002), há 4 níveis de interatividade na TV. O primeiro estágio – chamado pelo autor de nível 0 - diz respeito à televisão nos seus primórdios, em preto e branco, dispondo poucos canais e com o espectador limitado a ajustar configurações de som e imagem. Em seguida, no nível 1, a televisão já oferece cores, um número maior de canais e um controle remoto que permite maior poder do espectador sobre o aparelho. O nível 2, por sua vez, se consolida com o surgimento de videocassetes, câmeras e videogames (periféricos) – o que se deu principalmente a partir da década de 1980 (HOLZBACH 2012, P. 266) Neste estágio, já é possível gravar programas e alugar fitas de vídeo, promovendo a escolha do momento que for conveniente assisti-los. O antigo programa da Rede Globo, “Você Decide”, na qual a audiência podia definir o final de cada episódio é o representante do nível 3: interferência no conteúdo por meio de telefonemas ou correio eletrônico. Por fim, o nível 4 se apresenta na intervenção sobre o conteúdo em tempo real. Para ilustrar este último nível, Lemos oferece como um dos exemplos a escolha de ângulos de cena em um filme e os vídeos on demand . Para Alex Primo (2007, p. 23), a classificação de Lemos é competente, mas o último nível ignora os recentes estudos sobre TV digital, pois há algumas limitações nos modelos on demand, de forma que “a oferta de um grande número de canais na TV a cabo garante ao telespectador mais opções de entretenimento e informação. No entanto, os canais disponíveis oferecem tão somente um fluxo sequencial e unilateral.”

1.3.1 ON DEMAND COMO SINÔNIMO DE INTERATIVIDADE

Pesquisadores e estudiosos como Eugenio Bucci (2001), apontam questões mercadológicas para o uso incessante da palavra “interatividade” nos dias atuais. Isso                                                                                                                 8  A questão acerca do vídeo on demand ser uma experiência interativa será apreciada no capítulo seguinte.  

 

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quer dizer que os canais de TV utilizariam meros mecanismos de reatividade para iludir e prender a audiência, disfarçados de interatividade, apenas com o intuito de gerar mais lucro. Sendo essa uma questão espinhosa, evitaremos aqui tecer críticas mais pesadas ao abordar os modelos econômicos adotados pelos canais de TV. Em tempo, para compreender a crítica ao modelo on demand, é imprescindível que, primeiramente, estabeleçamos o conflito entre interatividade e reatividade9. A ideia de interatividade nos cerca em quase tudo que vemos. O conceito se tornou tão popular e relevante para o mercado que ele tem sido empregado em praticamente qualquer produto: brinquedos, rádios, televisores e até, como bem recorda PRIMO (2007), artigos esportivo da marca Rainha, que supostamente “interagem com você”, e um shampoo chamado “Interage” da linha Natura. Esse uso indiscriminado do termo faz com que a interatividade perca seu valor e vire um grande negócio para o consumo. O jornalista Eugenio Bucci tece uma crítica acalorada sobre a questão: A TV interativa, do presente ou do futuro, existe para seduzir o consumidor – e para silenciar o cidadão. Essa é sua lógica central. (...) Essa tal de interatividade deveria se chamar interpassividade. Interpassividade consumista: anabolizante para o comércio, nuvem de fumaça para a democracia (BUCCI, 2001, online)

Segundo SILVA (1998), o conceito de interatividade é oriundo da pop art, definido por uma aliança construída entre sujeito e objeto. O artista plástico Hélio Oiticica serve aqui como referência de trabalho interativo pois suas obras eram passíveis de interferência dos espectadores - os parangolés de Oiticica nunca estavam finalizados, podiam ser modificados constantemente; tornando-se uma obra do coletivo. Posto isto, o conceito de interatividade transcende o que chamamos de “interação”, uma vez que há a mudança no esquema clássico receptor-emissor porque a emissão da mensagem não se restringe a um dos polos. A participação coletiva na construção de uma obra é o foco desse entendimento acerca da interatividade, na qual é encerrada a mensagem em via de mão única, gerando múltiplas conexões e redes. Como consequência dessa bidirecionalidade, os caminhos percorridos pela mensagem são autônomos, livres,                                                                                                                 9  Autores como Alex Primo e André Lemos, nos seus trabalhos

“A interação mediada por computador” e “Anjos interativos. Sobre e a retribalização do mundo e interfaces digitais.”, respectivamente, têm somado seus esforços na diferenciação do termo interatividade e reatividade, realizando uma densa pesquisa do mundo tecnológico-digital e sua aplicação na realidade palpável.

 

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sem pré-determinações. Compreendendo que a autonomia é o fator principal na interatividade, PRIMO (2007) declara que a reatividade é programada e determinística. Em outras palavras, os sistemas reativos são pré-definidos, não possuindo trocas e, como no caso dos canais TV, há uma expectativa concreta quanto à resposta da audiência. Neste sentido, os vídeos on demand, considerados como a característica principal da televisão interativa, estão limitados ainda à sua venda no modelo payper-view. O pay-per-view (PPV) – ou, “pague-para-ver”,- é um sistema para compra de pacotes com programação específica na televisão em que todos os compradores assistem ao programa ao mesmo tempo. No Brasil, jogos de futebol, reality shows e eventos de luta são os pacotes mais oferecidos pelas empacotadoras de TV a cabo, cuja venda é extremamente lucrativa para os organizadores e produtores destes eventos. O UFC, uma das maiores organizações esportivas da atualidade, conseguiu se tornar a marca mais lucrativa de 201110. No UFC de número 100, em julho de 2009, o número de pacotes em PPV vendidos ultrapassou os 1,5 milhões, sendo a melhor marca obtida até agora pela organização. Necessariamente, os eventos deste porte ocorrem no mundo real em horário determinado e é imprescindível que a transmissão ao vivo para os assinantes do PPV siga este cronograma. Contudo, a crítica reside ainda no fato dessa inflexibilidade da escolha do horário, uma vez que a liberação do evento no formato on demand nem sempre esteja disponível.

1.4 OS CAMINHOS DA TELEVISÃO

Apesar das novas formas de consumo audiovisuais proporcionadas pela Internet, que permitiram ao usuário interações mais profundas e maior poder de decisão sobre como e quando consumir esses conteúdos, a Televisão soube se posicionar nesta realidade digital. Ao se apropriar das características de interatividade – que inclusive são demandadas pelo público de uma forma geral-, temos uma Televisão que se atualiza não apenas tecnologicamente, mas na criação e manutenção do seu conteúdo. Considerando que as mudanças nas interações mediadas pela

                                                                                                                10  Disponível  em  http://goo.gl/rH2hW.  Acessado  em  20/02/2013.  

 

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tecnologia estão em constante movimento, podemos afirmar que a discussão sobre os novos e possíveis rumos da televisão está distante de um fim.

 

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CAPÍTULO II TV POR ASSINATURA VS TV ABERTA

“Boa noite. Está no ar a televisão no Brasil.” A frase que abre este capítulo foi dita por Sônia Maria Dorce, aos 5 anos de idade, vestida de índia (símbolo da TV Tupi), inaugurando as primeiras transmissões na televisão brasileira.

2.1 PRIMEIRAS TRANSMISSOES EM TV ABERTA NO BRASIL Em 18 de setembro de 1950, o Brasil teve sua primeira transmissão televisiva diretamente de um estúdio na Rua 7 de Abril, na cidade de São Paulo. O grande idealizador do evento foi o jornalista Assis Chateaubriand, que pretendia ampliar seu conglomerado de mídias, Diários Associados,11 ao incorporar um canal de televisão à extinta TV Tupi. O investimento realizado à época por Chateaubriand foi bem alto, pois os aparelhos, além de serem caros, precisavam ser importados dos Estados Unidos. Ademais, por somente uma pequena parcela abastada da população brasileira ter acesso aos aparelhos, Chateaubriand decidiu espalhar 200 televisores em pontos mais movimentados da cidade de São Paulo. O videotape, que possibilitava a gravação e edição dos programas, ainda era uma realidade distante nos anos 1950, logo todos os programas televisivos eram feitos na base do improviso, ao vivo, o que durante muito tempo marcou o jeito brasileiro de se fazer TV. Os percalços para a fixação da TV no Brasil foram muitos: problemas alfandegários na importação de equipamentos, escassez de profissionais habilitados e pouca audiência. Destarte, Chateaubriand, usando de sua influência política nos meios                                                                                                                 11  Terceiro

maior conglomerado de empresas de mídia no Brasil fundada por Assis Chateaubriand, incorporava as já extintas TV Tupi e Revista O Cruzeiro.

 

 

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de comunicação, conseguiu lançar o primeiro modelo de jornal televisivo, Imagens do Brasil12, que ia ao ar às 21:30 e ainda conseguiu fechar contratos de publicidade para o horário. A televisão no Brasil copiou a programação que já existia no rádio, se utilizando dos moldes dos programas jornalísticos, telenovelas e inserções comerciais. Não obstante, a TV Tupi nasceu da Rádio Tupi e desta contratou a maioria dos profissionais da rádio, em especial atores e cantores conhecidos como Hebe Camargo, Lima Duarte, Ivon Curi, entre outros. Como afirma Holzbach (2012) “a televisão era uma espécie de rádio com imagens”. Ainda nos anos 1950, as concessões 13 do governo para as transmissões televisivas passaram a vigorar. Os primeiros canais a receber autorização foram a TV Record, TV Tupi e Canal 7, todas de São Paulo e a TV Jornal do Commercio, de Recife. Como não havia satélites, videotapes ou torres para uma rede de transmissão, as TVs eram locais e possuíam programação independente. Com efeito, a inauguração da TV Tupi no Rio de Janeiro ocorreu no ano de 1951, sendo o segundo canal de televisão do país. O videotape chega ao país nos anos 60, trazido pelo finado humorista Chico Anísio. A partir disso, há uma revolução da televisão: erros podiam ser previamente cortados do programa na edição final, os horários de exibição eram definidos numa grade programação e, principalmente, foi possível distribuir as fitas inicialmente no eixo Rio-São Paulo. Neste ponto, observamos um crescimento no número de emissoras e o surgimento da TV Excelsior, em 1960, que revolucionaria a televisão sendo a própria criadora de seu conteúdos - as telenovelas - que visavam a industrialização desta produção. A TV Globo inicia seus trabalhos em 1965, mas as Organizações Globo, fundada pelo jornalista Irineu Marinho existiam desde 1925, voltadas para o mercado de impressos com os jornais O GLOBO, Correio da Manhã e Diário Carioca – estes dois últimos já extintos. Hoje, a Rede Globo é uma das maiores emissoras de televisão do mundo, tendo notoriedade na produção e exportação de telenovelas para diversos países, o que incluiu seu nome no rol dos vencedores de prêmios internacionais como o Emmy.

                                                                                                                12

Estreando em 19 de setembro de 1950, na Rede Tupi, Imagens do Dia foi o primeiro telejornal a ser exibido no Brasil. 13 O modelo de concessões no Brasil e suas considerações serão abordados no tópico seguinte.  

 

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2.2 O BRASIL E A TV ABERTA

A TV aberta no Brasil ainda funciona com o sistema de concessão do governo, ou seja, todos os canais pertencem ao Estado que, por meio de uma licitação, concedem temporariamente o direito do uso às emissoras. Para concorrer à concessão, os canais de TV devem seguir regras impostas pelo governo como 70% do capital da empresa em posse de acionistas brasileiros e um limite de cota de até 10 estações no país, sendo o máximo de duas por estado. Cabe ao Ministério das Comunicações analisar as propostas de programação, bem como as condições financeiras e técnicas das emissoras. Ao final desta avaliação, as emissoras com as melhores médias na licitação recebem a concessão que deverá ser revisada após o término do contrato. A esse respeito, podemos afirmar que as emissoras ficam reféns dos interesses do Estado, a exemplo do que aconteceu à TV Globo nos anos 1980, que havia sido pressionada a não divulgar notícias prejudiciais ao governo militar, gerando insatisfação popular sobre sua possível conivência à ditadura. Fato similar, mas com proporções maiores, ocorreu à extinta TV Excelsior. Mario Wallace Simonsen, dono da TV Excelsior, era declaradamente um liberal democrata, contrário ao Golpe Militar de 1964 que instaurou a ditadura no Brasil. A emissora de Simonsen posicionava-se favoravelmente ao retorno de João Goulart à presidência do Brasil e divulgava notícias que desagradavam aos chefes militares. A perseguição a TV Excelsior chegou a níveis alarmantes. No Congresso, investigações escandalosas resultavam no fechamento de outras empresas que pertenciam a Simonsen como a companhia aérea Panair e a exportadora de café Comal (MARTINS, 2004). Os programas mais lucrativos da TV Excelsior iam sendo cancelados um a um pelo órgão de censura. Até meados dos anos 1970, a emissora ainda recusava-se a reeditar seus programas e, muitas vezes, ao invés de apagar os trechos censurados, exibia seus mascotes com as bocas tampadas e a palavra “CENSURA” na tela. Afundada em dívidas com impostos e multas, a emissora encerrou suas transmissões em 1 de outubro de 1970, sob ordem do governo militar. Atualmente, o Brasil possui nove redes televisivas, sendo elas, Globo, SBT, Record, Bandeirante, RedeTV!, CNT, RBT, Gazeta, NGT e ULBRA, incluindo as regionais Amazon SAT, TVCOM, Rede Meio Norte e Rede Diário. Somente a Rede Globo possui outros 18 canais associados como as conhecidas Rede Amazônica e

 

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RBS. Sob controle do Estado estão outros cinco canais NBR, TV Câmara, TV Justiça, TV Senado e TV Brasil, sendo que esta última é mais genuína experiência brasileira com uma TV pública. O estranhamento acerca do conceito de “TV Pública” é resultado da ausência deste modelo no histórico televisivo no Brasil. Por anos, foi confundida com televisão estatal, financiada e controlada pelo Estado. No entanto, TV Pública nada mais é que um canal com propostas de uma abordagem imparcial da informação, da cultura, da ciência e ligada profundamente à sociedade. Próximo a este ideal está a BBC de Londres, reconhecida ao redor do mundo principalmente pela produção dos seus documentários, prova de que qualidade e audiência podem andar lado-a-lado. Este distanciamento da TV pública no Brasil foi fortalecido pelo estabelecimento das grandes emissoras como a Rede Globo, que construíram fortes TVs comerciais (CANNITO, 2010). Mesmo dependentes das concessões do governo como afirmamos anteriormente -, o poder político e financeiro alcançado pelos grandes conglomerados foi a garantia da hegemonia do modelo televisivo que temos até hoje. Os interesses das redes abertas no Brasil também suprimiram a concorrência com a TV por assinatura. Até agora. Como será discutido mais adiante, poderemos observar que, ao contrário do ocorrido nos Estados Unidos, foram as grandes emissoras da TV aberta que implementaram os serviços de TV por assinatura no Brasil (POSSEBON, 2009).

2.3 HISTÓRICO DA TV A CABO NO MUNDO

A TV a cabo surge quando pequenos empresários passam a instalar antenas comunitárias (CATV) e a transmitir o sinal da TV aberta para áreas distantes em que o sinal não possuía uma boa recepção de espectro. No ano de 1950, um pequeno grupo de CATV idealiza a produção de conteúdo fechado para seus “assinantes” com filmes, previsão do tempo e notícias. Até o momento, o satélite ainda não existia e as TVs a cabo ainda tinham limitações geográficas na sua transmissão. Logo, com o surgimento do satélite no final dos anos 1960, as empresas expandem o alcance do seu sinal globalmente.

 

27   Em meados de 1970, qualquer um com o dinheiro pra alugar o satélite e a

infraestrutura necessária poderiam iniciar suas próprias companhias de TV a cabo (MULLEN, 2002). O modelo de negócio que se iniciava, excluía sistematicamente organizações políticas e grupos educacionais da jogada, uma vez que segmentos deste tipo dificilmente possuíam recursos financeiros para se sustentar. Os primeiro canais a se estabelecerem foram a HBO (filmes), a WTCG (atual CBS, oriunda de uma das maiores estações de rádio dos Estados Unidos) e o The Family Chanel (canal cristão). O investimento inicial necessário para estabelecer uma transmissão a cabo foi tão alto que os canais demoraram mais de uma década para se recuperarem financeiramente. Somente depois disto, as empresas puderam iniciar a produção dos seus próprios programas. A conhecida AMC, produtora das famosas séries The Walking Dead e Breaking Bad, começou seu negócio exibindo antigos clássicos americanos em preto e branco – razão pela qual AMC são as iniciais para American Movie Classics. No início do anos 1980, os conteúdos oferecidos na TV fechada especializavam-se em temáticas de lazer e hobbies:

programas de culinária,

artesanato, saúde e decoração. A despeito do Brasil que iniciou tardiamente a regulamentação de TV paga no final dos anos 1980, os Estados Unidos já possuíam, em 1948, um sistema de TV a cabo que se desenvolveu ao ponto de possuir 90% audiência no país (FRANCISCO FILHO, 2010). A independência financeira das primeiras empresas de TV a cabo nos Estados Unidos foi favorável para esse desenvolvimento, uma vez que, na ausência de contratos publicitários, os produtores estavam livres para explorar ao máximo a construção dos programas. Neste cenário, foi possível para as TVs por assinatura abandonarem o tradicional modelo de grade de programação variada - tal qual vemos na TV aberta - e investirem em canais segmentados.

2.4 TV SEGMENTADA A TV segmentada caracteriza-se pela especialização do canal num determinado segmento de entretenimento, existindo diversos gêneros como documentários (Discovery Channel), notícias (Bloomberg, CNN, GloboNews, BandNews), videoclipes (MTV), filmes e séries (HBO, TNT, FOX), saúde (Discovery

 

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Home & Health), moda (Fashion TV), esportes (Band Esportes, FOX Sports). Em tempo, canais segmentados não são apenas uma característica da TV a cabo, sendo que no Brasil também possuímos em TV aberta emissoras destinadas a temas como agronegócio (Canal Rural, Canal do Boi), filmes e séries (Cine Brasil TV), esportes (TV Esporte Interativo), entre inúmeras outras. No entanto, é preciso entender porque o modelo segmentado parece obter mais sucesso na TV a cabo do que na TV aberta. A maior parte da renda das emissoras abertas vem de contratos com anunciantes. Esta questão é tão importante que os anúncios de uma marca ultrapassam o espaço destinado ao intervalo comercial na TV aberta, de forma que as telenovelas utilizam inserções publicitárias ao longo da trama. Um exemplo mais recente para este tipo de publicidade é o remake da novela Guerra dos Sexos , na qual o pano de fundo da trama é uma grande loja de departamento que sempre exibe displays de marcas como AVON (produtos de maquiagem e beleza) e BOTTERO (calçados). Logo, todo o contrato de publicidade impõe uma conduta para as emissoras de TV aberta, a qual não permite a associação de seus produtos a uma imagem negativa. Em canais segmentados de filme como a HBO, os intervalos da programação são voltados para a divulgação do próprio canal. Ao invés de buscarem o aporte financeiro de marcas e anunciantes, estes canais investem nos seus próprios produtos licenciados. A especialização de um canal sobre determinado segmento gera uma assinatura de qualidade. Quando mencionamos o gênero documentário é fácil citarmos o canal Discovery Channel como referência de qualidade ou, se pensamos em séries associamos diretamente a HBO. Os canais esportivos podem ser o melhor exemplo para essa diferenciação de qualidade entre a TV aberta e TV por assinatura. Os direitos de transmissão dos jogos Pan-americanos de 2007 no Brasil foram de exclusividade da Rede Record, sendo que outras TVs abertas só poderiam mostrar imagens reprisadas do evento em seus telejornais citando inclusive a permissão de uso. No meio televisivo, discutiu-se que a Record estaria interessada em desbancar a Rede Globo nas transmissões esportivas em TV aberta e que em breve inauguraria também um canal por assinatura somente para esportes - é importante lembrarmos que o canal por assinatura SPORTV faz parte do pacote GLOBOSAT, pertencente ao conglomerado da Rede Globo). As críticas à transmissão dos jogos Pan-americanos realizada pela Record foram bastante negativas. Como a emissora possui inúmeros outros programas na sua

 

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grade, eventos importantes dentro do Pan foram ignorados nas transmissões, além dos intervalos comerciais inoportunos. Por outro lado, os assinantes de TV por assinatura acompanhavam todo o evento na íntegra. O apelo das transmissões na TV a cabo foi um duro golpe na audiência esperada pela Rede Record: os telespectadores que possuíam TV por assinatura não hesitaram em mudar de canal. Em linhas gerais, canais segmentados podem concentrar seus esforços num único objeto, enquanto as TVs abertas se digladiam por audiência nos mais diversos tipos de programa: novelas, telejornais, programas de auditório, sessão de filmes. Desta forma, as TVs segmentadas conseguem planejar mais cuidadosamente a sua plataforma de transmissão que vai além da tela do televisor, o que inclui um aproveitamento dos múltiplos recursos narrativos oferecidos pela Internet.

2.4.1 “It’s not TV. It’s HBO.”- A HBO EM 1972 Sob o slogan “It’s not TV. It’s HBO.” (não é TV, é HBO), o canal prime de assinaturas de filmes e séries se destaca como um dos modelos de maior sucesso em todos mundo. O estilo pioneiro do canal que abrange desde sua forma de transmissão até seu modelo de negócio garantiu a HBO o status de uma das maiores e mais assistidas emissora de TV a cabo do mundo (WALLSTEIN, 2012). A história oficial do canal remonta ao ano de 1965, pelas mãos de Charles Dolan, executivo do setor de cabeamento terrestre que, em parceria com a Time Warner, realizou o projeto de cabear todo o subterrâneo da ilha de Manhattan – uma inovação à época, já que os antigos postes de transmissão possuíam

“áreas de

sombra” que atrapalhavam o sinal em algumas localidades (JARAMILLO, 2002). Até esse momento, o canal desenvolvido pela Time Warner e idealizado por Dolan ainda se chamava The Green Channel. O histórico da TV a cabo no mundo relatou que desde os anos 1950 nos Estados Unidos já era possível as pessoas pagarem às empresas de cabeamento para receberem o sinal de outros canais nos seus televisores. No entanto, foi somente em 1968 que a FCC (Federal Comunication Commisions) regulamentou a TV a cabo nos Estados Unidos (GERSHON, 1990), possibilitando o estabelecimento da HBO. A HBO é inaugurada em 8 de novembro de 1972 exibindo filmes e eventos esportivos como o hóquei e o boxe, notoriamente de grande apelo na audiência norte-

 

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americana. A primeira transmissão foi uma partida de hóquei entre o New York Rangers e o Vancouver Canucks que aconteceu no Madison Square Garden, na cidade de Nova Iorque. Contudo, a HBO teve uma série de dificuldades no seu início. A principal delas foram as novas normas da FCC que proibiam os canais a cabo de exibiram filmes e eventos esportivos - justamente os carros-chefes da emissora – e, a transmissão contínua de programação. O impasse estabelecido entre a FCC e a HBO culminou num processo em 1975 (JARAMILLO, 2002). Em 1977, as imposições da FCC foram julgadas inconstitucionais pela corte americana, garantindo a permanência do modelo a cabo. A primeira vitória da HBO no processo contra o órgão regulador americano não foi suficiente para que a emissora esbarrasse em um outro problema que tomava cena na mesma época. Embora tenham conquistado inúmeros assinantes logo no seu início, o canal a cabo não conseguia manter a fidelização dos clientes que rapidamente abandonavam o serviço após poucas semanas de uso. Logo, a HBO realiza uma manobra inovadora que se mantém até hoje no seu modelo de negócio: a disponibilização do sinal para degustação. Atualmente, canais da Rede Telecine, do grupo GLOBOSAT, se utilizam do mesmo recurso a cada início de ano, que é a temporada de estreias de filmes recém-saídos do cinema. A programação do primeiro canal HBO não ocupava todo o horário do dia, o que resumia ao canal em uma transmissão de 9 horas, das 15 horas à meia-noite - no fuso horário americano – que se estendeu ao longo de nove anos. Neste sentido, a emissora teve um relativo atraso em relação a outras, tais como o Show Time, que já possuíam material para transmissão ininterrupta nos sete dias da semana. Para disputar espaço, a HBO lançou, em 1980, mais um canal, o Cinemax que primordialmente foi concebido para a exibição de filmes e musicais. Hoje, o Cinemax é mais conhecido pela programação adulta televisionada nas madrugadas. A fim de preencher as lacunas na programação e ganhar certa independência dos estudos hollywoodianos, a emissora passaria a produzir seu próprio conteúdo. O filme de 1983, The Terry Fox Story 14 - que narra a história de um canadense amputado percorrendo o país a fim de arrecadar fundos para pesquisas sobre o câncer - não só foi a primeira produção original da HBO como também o primeiro filme feito para a TV por assinatura. Programas infantis também foram as apostas iniciais da                                                                                                                 14

Disponível em http://www.imdb.com/title/tt0086427/ Acessado em 03.04.2013.

 

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emissora. Com o desenrolar de novos públicos-alvo, a HBO inaugurou novos canais como o HBO Family (animações e indicação para todas as idades), HBO Signature (documentário e telefilmes) e HBO Max (filmes independentes e clássicos).

2.4.2 A QUESTÃO DA CENSURA

A exemplo da indústria cinematográfica que possui seu próprio órgão regulador, o Hollywood’s Production Code, os canais por assinatura também restaram por desenvolver seu próprio código de autorregulamentação, chamado Television Code (BODDY, 1990). O código de regulamentação é fruto da cultura conservadora da sociedade dos Estados Unidos, baseada em uma moral cristã. A preocupação majoritária era garantir que o conteúdo considerado impróprio fosse vetado das produções, ou seja, a televisão não poderia simplesmente abandonar suas raízes no interesse público (JARAMILLO, 2002). Até então, a publicidade ainda fazia parte da renda das emissoras, de forma que – como já discutido anteriormente – os anunciantes não queriam seus nomes associados a imagens negativas e consideradas indecentes pela sociedade. Logo, em 1992, o Congresso Americano havia estabelecido horários com classificação livre, que englobavam o período das 6 da manhã até a meia-noite. Posteriormente, esse horário foi reduzido da meia-noite para às 22 horas. Para conter essa iniciativa do Congresso e manter autonomia na sua produção, as TVs por assinatura implementam duas saídas fundamentais. A primeira medida foi fazer uma classificação etária a qual indicasse o tipo de conteúdo que seria apresentado antes de cada programa. A segunda foi favorecida por um simples mecanismo no qual os clientes recebem senhas de acesso para assistir aos programas com temática adulta. Desta forma, programas considerados inapropriados poderiam ser exibidos em qualquer horário, inclusive permitindo a entrada da indústria pornô na TV por assinatura. Decerto, esses fatores contribuíram para a liberdade na exploração dos conteúdos e das narrativas pelas emissoras a cabo. Enquanto a TV aberta permanece refém de regulamentações, publicidade e censuras de horário, produtores de TV por assinatura se beneficiam da sua independência.

 

32   As séries Guerra dos Tronos, Roma, Spartacus, todas da HBO, Vikings do

History e Walking Dead da AMC são impensáveis para transmissão aberta: nudez, sexo, violência, exposição de mortos, uso de armas, temáticas adultas. Os canais SBT e BAND - ambos da TV aberta brasileira - geralmente compram essas produções para exibirem na sua programação da madrugada. Recentemente a TV Bandeirantes exibiu as primeiras temporadas das séries Walking Dead e Roma na grade noturna de programação, já tendo assumido o compromisso de transmitir as séries até o fim. Se por um lado o telespectador da TV aberta ganha a oportunidade de ver as produções estrangeiras famosas, por outro eles sofrem com o estilo de negócio executado pelas redes abertas. Um dos pioneiros na compra de séries estrangeiras, o SBT investiu em boas produções como Oz e Smallville, dos canais HBO e WARNER, respectivamente, em meados dos anos 2000. Ambos programas eram sucesso de audiência na TV por assinatura. No entanto, sem aviso prévio, a emissora decidia deliberadamente parar com a transmissão, sem que ao menos as temporadas chegassem ao último episódio – ou, season finale, como são conhecidas. Não obstante, as críticas à dublagem e à escolha dos títulos em português soavam confusas, até mesmo engraçadas para a maior parte dos fãs. A série The O.C, originalmente do canal Warner, ganhou o título “Um Estranho no Paraíso” e Fresh Prince of Belair (que até pouco tempo era exibida pelo canal no horário do almoço) se tornou “Um Maluco no Pedaço”. Isto posto, os canais pagos sabem da sua liberdade quando decidem produzir um roteiro que contenha elementos menos aceitáveis na TV aberta. O universo criado pelas séries pode abranger temas mais polêmicos como o sexo e a violência. Algumas narrativas necessitam destes elementos, do contrário seria forçoso conceber um roteiro como Roma (série sobre a ascensão e decadência do império romano) ou Oz (o cotidiano em uma prisão de segurança máxima), em que a dramaticidade da violência e do sexo eram inerentes à trama.

2.5 HISTÓRICO DA TV A CABO NO BRASIL O histórico da TV a cabo no Brasil ainda é muito impreciso. Para a maioria dos autores, é plausível que seu início tenha se dado em 1958, na serra de Petrópolis,

 

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no Rio de Janeiro, de maneira muito similar ao que ocorreu nos Estados Unidos, poucos anos antes: antenas comunitárias (CATV) instaladas no alto da serra transmitindo sinal para as residências em Petrópolis. À época, ainda não se imaginava o que viria a ser o negócio da TV por assinatura, mas é possível aceitar a proposta de que este momento já era um esboço do modelo, uma vez que o serviço a cabo era pago (POSSEBON, 2009). A pesquisa histórica realizada por Possebon (2009) ainda aponta outros lugares no Brasil que, por meio da antena comunitária, conseguiam acesso à TV. Nos anos 1960, em Manaus, o sinal de uma TV venezuelana era captado em alguns quarteirões da cidade. Durando apenas 5 anos, o serviço foi encerrado, dando espaço para uma TV aberta em UHF. Somente em 2001, a cidade de Manaus passaria a ter serviços de TV por assinatura. A partir dos anos 1970, o Brasil contabilizava dezenas de CATVs espalhadas pelo país, com cobertura de transmissão superior a pequenas comunidades e condomínios (HERZ, 1983). Este crescimento do serviço a cabo no país chamou a atenção de grandes conglomerados, em especial a da Rede Globo, que na tentativa de entender e desenvolver a nova tecnologia criou a TVC – Televisão por Cabos LTDA. No entanto, a Rede Globo não se pronunciava oficialmente quanto a sua entrada no mercado de TV a cabo. A partir deste ponto, já é possível traçar um paralelo no desenvolvimento da TV a cabo no Brasil e no resto do mundo. Enquanto nos Estados Unidos e Europa o serviço a cabo se desenvolvia pelas TVs independentes, no Brasil seu estabelecimento deu-se pelas mãos dos executivos da TV aberta. Se em meados dos anos 1970, a Globo recusava-se a admitir que entraria no mercado da TV por assinatura, nos anos seguintes ela se tornaria a grande responsável pelo serviço no país. A centralização da TV paga no Brasil é decorrência do controle de todas as etapas realizada pelas corporações Globo, assemelhando-a ao modelo da TV aberta. Este fato prejudicou “a sedimentação no hábito do espectador brasileiro” (CANNITO, 2010). Os canais independentes que são a marca da TV por assinatura no resto mundo são escassos dentro dos pacotes oferecidos pelas poucas programadoras. Com o propósito de evitar a concorrência com a TV paga, a Globo lançou mão de vários canais através da GLOBOSAT, atualmente a maior programadora no país. Nos pacotes de assinatura básica, os canais oferecidos são, em sua maioria, de propriedade da GLOBOSAT, entre eles GNT (variedades), SPORTV (esportes), MULTISHOW (música), TELECINE (filmes), GLOBONEWS (notícias). Em outras palavras,

 

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significaria que a demanda por canais segmentados de esportes, moda, música, filmes e notícias já estaria sendo suprida neste pacote, sem a necessidade de se buscar os concorrentes como Discovery, MTV, FOX Sports, CNN e HBO - inclusive, caso o espectador queira adquirir esses outros canais, ele teria de desembolsar um valor bem mais alto comparado aos demais. Isto porque as programadoras brasileiras ainda trabalham com o antiquado sistema de “venda por pacote”, ou seja, determinados canais só estão disponíveis em pacotes completos, como ocorre com a assinatura da HBO. Mesmo que o cliente não deseje, por exemplo, canais infantis, eles farão parte do menu de opções disponíveis. Nos Estados Unidos, já é possível escolher e personalizar o seu próprio pacote de canais. Outra questão que merece destaque no modelo de TV por assinatura brasileiro é o preço cobrado, que restringe o acesso a uma pequena parcela da população. Em matéria veiculada pelo jornal O GLOBO em 07 de março de 201215, uma pesquisa da ANCINE comparou o custo da TV por assinatura no Brasil com os outros países latinos, o qual comprovou que o assinante brasileiro paga até 204,37 por cento mais caro em um canal do que um assinante na Espanha – segundo país no ranking de TVs por assinatura mais caras. Esta realidade está prestes a ser alterada. A abertura do mercado para outras companhias de TV por assinatura irá melhorar a qualidade do serviço e inevitavelmente reduzirá os preços – economistas já apontam uma redução de até 30 por cento nos pacotes atualmente oferecidos. Desde 2011, a norte americana DISH iniciou o processo de entrada no Brasil quando lançou um satélite no território nacional, pagando um valor 3.500 por cento maior do que o exigido pela ANATEL16, vencendo a disputa com a SKY que pertence à DirectTV, maior concorrente do grupo DISH nos Estados Unidos. 2.6 A TECNOLOGIA NAS TRANSMISSÕES – SATÉLITES, CABOS E IPTV

As tecnologias introduzidas pelas transmissões nas TVs pagas não podem ser ignoradas uma vez que elas se tornam aliadas da TV digital, de forma a permitir o uso em potencial dos recursos disponíveis. O tipo de transmissão escolhido influencia                                                                                                                 15 16

Disponível em http://goo.gl/a0hDx Acessado em 12 de abril de 2013. Disponível em http://goo.gl/gMdwv Acessado em 12 de abril de 2013.  

 

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diretamente no custo-benefício que prioriza a melhor recepção de sinal com um custo monetário compensatório. O primeiro modelo de TV paga no Brasil foi estabelecido via cabo através das operadoras NET e TVA. Em si, o modelo costuma ser extremamente vantajoso quanto à qualidade de som e imagem. Por outro lado, a implantação dos cabos não chega a todas as regiões, além de ter a manutenção bastante onerosa. A tecnologia via satélite já está disponível há alguns anos e o recurso é conhecido como DTH – Direct To Home. Este sistema utilizado pelas operadoras SKY e DirectTV pode sofrer algumas quedas de sinal, mas prioriza aplicativos úteis à TV Digital como o guia de programação eletrônico, as multicâmeras (alteração nos ângulos de um filme) e os conteúdos extras da programação. Por último, a distribuição por IPTV (Internet Protocol TV) é pouco conhecida pois trata-se de uma novidade a ser desbravada pelas companhias telefônicas. A transmissão é realizada tanto por linhas telefônicas como por cabos óticos – razão pela qual as telefonias vêm investindo nesta tecnologia – e o preço tende a ser similar ao já ofertado pelas empresas de satélite e cabo. A dificuldade para a implementação do novo recurso reside na discussão acerca da internacionalização das empresas de comunicação social no Brasil – defesos por lei – uma vez que as operadoras de telecomunicação são estrangeiras. Resolvida esta questão, o IPTV pode acirrar a disputa no mercado de TV paga - colaborando para a redução dos preços – e tornar-se mais uma opção de distribuição em sinal digital.

2.7 LEI 12.485: ESTÍMULO À PRODUÇÃO NACIONAL E REGULAMENTAÇÃO DO SETOR

A regulamentação do setor fazia-se uma questão emergencial para a unificação e democratização do serviço de TV paga no país. Instituída em setembro de 2011, a lei 12.48517 surge com o intuito de criar uma nova dinâmica televisiva que propicie a valorização da produção nacional alimentada pelo incentivo à modernização e o acesso do serviço a mais pessoas.                                                                                                                 17

Disponível em http://goo.gl/iTVnC Acessado em 15 de abril de 2013.

 

36   Anterior à criação da lei, o Brasil já discutia a necessidade de um instrumento

que garantisse a melhora na prestação dos serviços que abrangesse as mudanças socioeconômicas sentidas nos últimos anos, em especial ao aumento na demanda do serviço por um nova classe C que se apresenta com maior poder aquisitivo. Razão esta suficiente para aquecer o mercado de TV paga no país, incluindo uma preocupação com o tipo de conteúdo a ser oferecido. A primeira preocupação da lei foi determinar que haja pelo menos a transmissão de 3 horas e 30 minutos de conteúdo nacional durante a semana na programação dos canais. Esta imposição gerou, a princípio, um desconforto por parte das programadoras. A SKY (grupo DirecTV) iniciou uma campanha de boicote à iniciativa alegando censura por parte da lei: informes publicitários em TVs e meios impressos alardeavam a situação durante meses antes mesmo da aprovação da lei pelo Congresso. De forma geral, o mercado respondeu positivamente já realizando as mudanças necessárias para atender ao dispositivo legal. Na Europa, há muitos anos vigora a lei que determina ao menos 50% de conteúdo nacional nas TVs do continente, não sendo uma novidade a questão da regulamentação às programadoras. A lei faz-se necessária no sentido de fomentar a produção nacional, criando um mercado forte o suficiente para competir na exportação de conteúdo próprio com produtores estrangeiros. Na expectativa de que a base de assinantes da TV paga chegue a 35 milhões nos próximos quatro anos18, o Brasil possui chances reais de se tornar um grande polo de produção audiovisual no mundo.

2.8 A ENTRADA DAS TELEFONIAS NO SEGMENTO TELEVISIVO

A lei 12.485 não apenas beneficiou a produção nacional, como também destravou a concorrência no setor das TVs pagas, autorizando a entrada das telefonias no segmento. Realizada a discussão quanto à prestação de serviço, a lei regulamentou a forma com que as empresas de telecomunicações poderão explorar o mercado, a fim de melhorar a oferta de serviços com baixo custo para os usuários, gerando pacotes que incorporem Internet, TV por assinatura e telefone.                                                                                                                 18

Disponível em http://goo.gl/NkryF Acessado em 15 de abril de 2013.  

 

37   As mudanças na nova lei resultam na melhoria da banda larga na Internet, já

que as empresas de telefonia estarão sendo estimuladas a investir na modernização do sistema e, sendo observadas de perto pela ANATEL (agência que regulamenta as telecomunicações no Brasil), serão obrigadas a cumprir os termos estipulados nos contratos com os seus usuários. A parceria entre a ANATEL e ANCINE é um passo importante para o estabelecimento de uma concorrência saudável entre as prestadoras de serviços e a construção de uma televisão que priorize a produção nacional, estimulada pela qualidade dos profissionais que se dedicam ao campo audiovisual brasileiro.

2.9 COMO AS TVS ABERTAS ESTÃO SE PREPARANDO PARA COMPETIR COM O MERCADO DE TV PAGA?

Tendo a Lei 12.485 movimentado significativamente o mercado da TV por assinatura, as redes abertas de televisão também tiveram que se posicionar nessa nova dimensão que o aumento da concorrência impôs. Durante muito tempo, a TV aberta reinou imperativa nos lares brasileiros realizando manobras que dificultassem o mercado para as TVs por assinatura, como a iniciativa da Rede Globo em controlar uma das maiores empresas de TV no Brasil, a NET. O crescente acesso da audiência aos modelos da TV fechada forçam as emissoras abertas a reverem a forma com que organizam suas grades de programação e produzem seus conteúdos. Não é esperado que a TV aberta reduza, por exemplo, a quantidade de intervalos comerciais já que a renda das emissora advém essencialmente dos contratos publicitários – cerca de 79,3%19. Tampouco espera-se que emissoras como Globo ou SBT invistam na especificidade, tornando-se canais segmentados. Ademais, o estilo do entretenimento na TV por assinatura deverá ser bastante copiado a longo prazo, com um aumento na produção de séries – que ocuparão o espaço das telenovelas -

e exibição de grandes eventos esportivos

estrangeiros considerados pouco atrativos para o público brasileiro de forma geral, como o Super Bowl e a liga de basquete NBA.

                                                                                                                19  Pesquisa

sobre televisão no Brasil FGV/ Aberta (2007).

 

38   O fim do conceito de grade de programação deverá ser o primeiro reflexo a ser

sentido na TV aberta. O estabelecimento do modelo on demand será, em grande parte, o responsável por esta transformação, já que cada vez mais clientes de TV por assinatura se utilizam do recurso para gravar também programas da TV aberta – neste ponto, vale salientar que uma parcela dos consumidores de TV por assinatura visa a qualidade do sinal do serviço para acompanhar as emissoras abertas. Para José Bonifácio de Oliveira Sobrinho (2012), o Boni, um dos mais respeitados profissionais da TV brasileira, o imperativo para o futuro da televisão será o imediatismo “porque para o público não faz sentido aguardar para ver determinado programa na hora em que a emissora quiser exibir"20. O conhecido horário nobre – ou, prime time - deverá perder sua força nos próximos anos, uma vez que o hábito dos consumidores foi modificado em função das múltiplas atividades e correria da vida contemporânea, já não sendo cabível por parte das emissoras a definição de horários específicos para cada programa. Este princípio de prime time é tão forte para a TV aberta que é comum observamos programas similares sendo transmitidos simultaneamente com o intuito de disputar audiência, como é o caso do Jornal Nacional (TV Globo) e o Jornal da Band (TV Bandeirantes) que são exibidos com poucos minutos de diferença durante as noites de segunda a sábado e, os programas Esporte Espetacular (TV Globo) e Esporte Fantástico (TV Record), ambos transmitidos no horário do almoço.

2.10 LABORATÓRIO DA INTERATIVIDADE A liberdade de produção e execução das narrativas garante aos canais por assinatura uma forte vantagem sobre as TVs abertas. Cada roteiro pode ser pensado minuciosamente com o propósito de desenvolver uma trama envolvente que estimule a participação da audiência. Este mesmo princípio tem fortalecido a quebra do modelo de entretenimento atual da TV no Brasil que, a longo prazo, deverá apostar na criação de conteúdos nos moldes das séries internacionais, os quais priorizam as narrativas transmidiáticas para a fidelização da audiência.                                                                                                                 20

http://goo.gl/MpWJu acessado em 07 de maio de 2013.  

 

39   No universo ficcional, a TV brasileira já tem mostrado seu potencial como

produtora de seu conteúdo – vide o exemplo da qualidade técnica nas telenovelas da Rede Globo- , necessitando apenas se atualizar e fazer melhor uso dos recursos disponibilizados pela tecnologia. Neste tento, os canais pagos têm executado com sucesso os seus projetos interativos dentro de shows e séries. A indústria do entretenimento cresce ao passo que seus programas geram o “buzz” (barulho) na Internet , alcançando a audiência que está além da televisão, uma tendência mundial da televisão e inerente à sua sobrevivência na atualidade: a fusão com a interatividade propiciada pelo ciberespaço.

 

 

 

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CAPÍTULO III O FUTURO DO ENTRETENIMENTO INTERATIVO NA TV

As séries televisivas da atualidade são um dos maiores atrativos nas emissoras de TV por assinatura, dada a variedade de temas e a liberdade na exploração dos roteiros que prendem o telespectador à trama. O sucesso desta fórmula de entretenimento leva a incontáveis novas séries lançadas a cada ano nas TVs norteamericana e inglesa – atualmente, as maiores produtoras de conteúdo deste tipo. Naturalmente, alguns programas não conseguem emplacar na audiência e são rapidamente extintos da emissoras, sendo imediatamente substituídos por outras produções – a fila de lançamentos de séries é extensa e o mercado mantém-se aquecido com a demanda. Neste sentido, as séries televisivas possuem certa vantagem sobre outras produções audiovisuais. Primeiramente, as histórias não nascem com prazo determinado para acabar, sendo que a maioria dos programas consegue sobreviver em média cinco anos na televisão, como House M.D (canal FOX) que durou exatas oito temporadas e The Sopranos (HBO) com seis, o que permite aos roteiristas desenvolverem com mais precisão personagens e trama. Outro aspecto importante é consagração das séries no âmbito virtual que mantém vivo o universo das tramas para os fãs e continuam a gerar lucros para as emissoras. O antigo sitcom Seinfeld, exibido durante os anos 90 pela rede NBC, gerou até hoje impressionantes 3,1 bilhões de dólares de lucro somente com cessão de direitos para exibição em canais menores americanos21, sem mencionar os usuários online que adquirem a série diretamente para seus computadores. Comparada à indústria cinematográfica, Seinfeld obteve melhores resultados que a maioria dos sucessos de bilheterias de Hollywood da última década22. Esta atemporalidade das séries é uma receita vantajosa para as produções tanto de TVs abertas quanto fechadas, forçando os produtores a repensar suas estratégias de                                                                                                                 21

Disponível em http://goo.gl/gaJ1g Acesso: 08 de maio de 2013. Considerado uma das maiores bilheterias do cinema, o filme Titanic arrecadou até hoje, em todo mundo, cerca de 900 milhões de dólares. Dados disponíveis em http://goo.gl/bmZQH. Acessado em 09 de maio de 2013. 22

 

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criação do universo ficcional considerando a importância da atividade de fãs na Internet, especialmente no que tange a interação da televisão com os aplicativos sociais desenvolvidos para esta finalidade. Destarte, este capítulo final fará uma análise do cenário televisivo atual considerando a tendência do entretenimento que baseia-se na criação de séries que priorizam a interatividade, observando modelos de sucesso como as séries do canal HBO, Guerra dos Tronos e True Blood.

3.1 NOVELAS VS SÉRIES

No Brasil, as telenovelas tem um espaço garantido na grade de programação das emissoras. Herança dos antigos programas de rádio, a novela brasileira ganhou reconhecimento mundial dada a complexidade das tramas, a produção bem executada e a identificação das pessoas com o abrangente universo de personagens que povoam as telenovelas. É inegável reconhecer que, ao longo das seis décadas de existência da televisão brasileira, as telenovelas tenham se estabelecido como um modelo hegemônico de entretenimento no Brasil. O poder desta narrativa é tão forte que as grandes emissoras abertas como Rede Globo, Record e Bandeirantes não deixam de fora da sua programação as telenovelas. Somente a Rede Globo exibe três novelas ao longo de sua grade diariamente às 18 horas, às 19 horas e às 21 horas – este último, sendo o carro chefe da emissora, com os maiores picos de audiência e um dos intervalos comerciais mais caros da televisão brasileira23. O investimento para a realização de uma novela é sempre muito alto, levando em conta o tempo de duração das tramas (cerca de sete meses), o cachê dos atores e as locações da gravação que, dependendo do autor, podem se passar até mesmo em locais estrangeiros. Este modelo, embora vívido e lucrativo, tem sentido o efeito da concorrência com as produções norte-americanas que priorizam o modelo das séries. Outro fator essencial foi a sanção da Lei 12.485 que determinou a obrigatoriedade de conteúdo nacional nas emissoras de TV fechada. Como a maior parte das produtoras nacionais não possuem o aporte financeiro de uma Rede Globo ou de uma Rede Record, as séries podem se tornar uma saída viável de produção já que além de                                                                                                                 23

Disponível em http://goo.gl/Co9ql Acessado em 14 de maio de 2013.

 

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atraírem público com facilidade, o roteiro pode ser pensado de forma mais econômica pelos seus realizadores. Como exemplo, podemos citar a série Sessão de Terapia, exibida pelo canal pago GNT, que conta com pouco mais de 8 personagens e se passa inteiramente dentro de um consultório psiquiátrico. A questão tem se aprofundado de tal maneira que a Globo vem investindo cada vez mais no campo das séries. A emissora já tinha experiência com minisséries de sucesso como A Casa das Sete Mulheres, Tenda dos Milagre, O Canto da Sereia, entre outras. Mas agora é mais comum observarmos uma maior inserção de séries – ao invés de minisséries - na programação, como as recentes Entre Tapas e Beijos e Louco por Elas, ambas caminhando para suas terceiras temporadas. A dificuldade dos produtores até então não era arranjar espaço na programação televisiva, mas sim garantir a sobrevivência destas tramas na TV aberta. Para esta regra, a exceção é o seriado de sucesso A Grande Família que teve sua primeira versão nos anos 1970 e ganhou um remake no inicio do ano 2000, o qual é exibido até hoje pela Rede Globo nas noites de quinta-feira. A Rede Globo sempre se orgulhou do seu pioneirismo ao que dizia respeito à criação de tramas com temas polêmicos como a emancipação feminina (Malu Mulher, 1980), gestação por barriga de aluguel (Barriga de Aluguel, 1987), clonagem humana e abuso de drogas (O Clone, 2001), e homossexualismo (Senhora do Destino, 2004). Logo, as primeiras mudança sentidas no estilo das narrativas nas próximas novelas deve, possivelmente, vir das mãos dos produtores da emissora. Não obstante, é o que de fato vem ocorrendo até agora: prato cheio para considerarmos uma inspiração na abordagem realizada pelo canal pago HBO, notoriamente um precursor de temáticas mais densas. A primeira medida tomada pela emissora (também dona dos canais pagos da GLOBOSAT) foi convocar toda a sua cúpula de autores, diretores e produtores para um workshop com a coautora da série Friends (sucesso mundial do canal WARNER que durou 10 temporadas e é exibida até hoje), Marta Kauffman. Em entrevista ao jornal O Estado de São Paulo24, a roteirista afirmou que quando uma novela acaba, as pessoas não continuam a assisti-la em DVD ou baixam os episódios pela Internet – como normalmente acontece com as séries-, bem como a estratégia de criação não precisa por quanto tempo determinada história pode durar na TV.                                                                                                                 24

Disponível em http://goo.gl/dp8Y2. Acesso: 16 de maio de 2013.

 

43   Atualmente, o autor João Emanuel Carneiro - responsável pelo mais recente

sucesso novelístico da Rede Globo, Avenida Brasil – está responsável pela supervisão de uma nova série cômica com doze episódios a ser lançada pelo canal até 2014, chamada A Segunda Dama25. Esta aposta significa muito para o momento atual da televisão brasileira porque o descolamento do autor para este novo setor indica o interesse da emissora em conquistar mais que a audiência da televisão: tentar ao menos repetir o mesmo apelo que Avenida Brasil teve nas redes sociais. É importante salientar que o mundo das séries vive especialmente no campo virtual por trabalharem com o conceito de entretenimento em duas telas – ou, second screen- que, utilizandose de aplicativos sociais desenvolvidos para tablets e smartphones, visa a participação mais ativas dos fãs em fóruns e comunidades virtuais, comentários online em redes sociais (Facebook, Twitter, GetGlue) e disponibilização de conteúdo extra nas páginas oficiais das emissoras - sendo este o abismo que separa o sucesso das séries na TV paga das séries feitas para a TV aberta.

3.2 SÉRIES NA TV ABERTA

A primeira questão determinante para a aprovação de uma série na TV aberta é o contrato com os anunciantes. Como observado no segundo capítulo deste trabalho, a TV aberta é refém dos intervalos comerciais e do ibope apontado pelo Peoplemetter, sendo dependente deste modelo ultrapassado de medição do alcance de um programa. Neste aspecto, as séries não conseguem sobreviver muito tempo na TV, sendo brutalmente canceladas ao menor sinal de insucesso com a audiência, deixando seus telespectadores sem a conclusão da trama ou, no pior cenário, passam até mesmo despercebidas por não terem tempo suficiente para criar empatia com o público. Obviamente, este quadro não é restrito ao Brasil. Embora estejamos pontuando as qualidades do negócio de TV paga estabelecido nos Estados Unidos, o país ainda possui grandes conglomerados de comunicação semelhantes ao que observável no nosso modelo atual. A rede norteamericana de TV aberta, ABC, foi o centro de uma discussão acerca do cancelamento da sua série Lone Star, a qual - apesar da excelência técnica e de ter nomes de peso                                                                                                                 25

Disponível em http://goo.gl/73ZVq. Acessado em 20 de maio de 2013  

 

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como o ator Jon Voight fazendo parte do elenco – foi abruptamente cancelada após a insatisfação dos executivos do canal com os números da audiência apresentados. Para ilustrar a dificuldade em se manter uma série ativa na TV aberta, o criador de Lone Star, Kyle Killen fez a seguinte comparação durante um debate sobre estudos da TV na Universidade do Texas, a FLOW: "A TV por assinatura é como uma pessoa com uma arma na cabeça do seu cão, e ameaçando atirar caso você não consiga entretê-la. A TV aberta também é como uma pessoa com uma arma na cabeça do seu cão, ameaçando atirar caso você não consiga entretê-la, mas a diferença é que se esta pessoa se sentir entediada ou perder a atenção por mais de 2 minutos, o seu cão está morto." (KILLEN, 2010 – online)  

Destarte, o posicionamento de Killen reflete quão cruel o mercado televisivo pode ser com seus próprios produtos, mesmo que o sucesso da trama esteja na recepção positiva da crítica e na conduta dos fãs que lutam no espaço virtual para que seus programas favoritos não sejam cancelados. Caso similar à Lone Star– mas até certo ponto bem sucedido - ocorreu com Terminator: The Sarah Connor Chronicles, do canal FOX (TV aberta nos Estados Unidos), que sobreviveu por duas temporadas graças ao engajamento dos fãs que criaram um site26 com o intuito de divulgar a trama na tentativa de dar continuidade à série.

Figura 1. Página inicial do site Save The Sarah Connor Chronicles feito por fãs para que a série retorne à TV. (Fonte: http://www.savethescc.com/ Acesso em 22 de maio de 2013).

                                                                                                                26  Ainda ativo, o site conta com uma boa adesão dos fãs que continuam determinados a resgatar a série. Disponível em http://www.savethescc.com/ Acessado em 22 de maio de 2013.  

 

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3.3 SÉRIES NA TV FECHADA Quando o imperativo é a audiência, canais abertos não se arriscam. Anunciantes têm mais peso que o público e o mercado é ditado pela segurança na aposta. Nas redes de TV fechada, a preocupação maior é em agradar a sua base de assinantes e não há vínculos com a publicidade comercial. Durante o break da programação, a rede HBO se dispõe exaltar aa própria marca, exibindo o seu legendário slogan “It’s not TV, it’s HBO” (Não é TV, é HBO), o que deixa claro como a solidificação do canal os elevou a um outro patamar, a ponto de se declararem não serem mais um mero canal de TV, mas ser a HBO. Uma permissão para assistir TV, sem ser olhado com desdém. Neste sentido, outra realidade é distinta dentro do negócio dos canais por assinatura: por serem canais ditos premium, ou seja, mais caros de serem adquiridos em um pacote de TV paga, eles possuem um perfil demográfico de pessoas com maior renda e melhor nível escolar. Consequentemente, há maior tolerância do público em se concentrar nas tramas mais lentas e densas. Desta forma, podemos esperar que produções audiovisuais dentro da HBO trabalhem em prol do assinante. Isto porque o canal acompanha o buzz que é gerado na Internet, ponderando o alcance das suas séries fora da tela do televisor e mantendo seus programas ativos enquanto a história for suficientemente atrativa para todos. Neste ponto de intersecção da HBO com a Internet, encontramos uma das maiores realizações do canal que prova quão bem estabelecido um modelo de negócio pode se tornar quando ele permite – mesmo que não explicitamente – não-assinantes usufruírem das produções originais. Nos últimos dois anos, a série Guerra dos Tronos – que conta a guerra entre várias famílias pelo trono da terra fictícia, Westeros - foi anunciada pelo site TorrentFreak27 como a série mais “pirateada” na Internet, ou seja, que mais teve downloads ilegais realizados na rede. Seria natural que o download ilegal de uma série representasse uma perda para qualquer outro canal de TV por assinatura, mas não para a HBO. Aproveitando-se do buzz gerado pelo sucesso da série, a HBO tomou algumas medidas iniciais para evitar que o número de downloads piratas disparasse na rede mundial de computadores. Primeiramente, o canal decidiu exibir os                                                                                                                 27

Disponível em http://goo.gl/A3gG6. Acesso: 22 de maio de 2013.

 

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episódios mundialmente, o que tornaria infundada a reclamação de que alguns países assistiam a série com semanas ou até meses de atrasos - e a espera era sanada através dos downloads. A segunda decisão foi oferecer sinal aberto para a grande estreia da terceira temporada, a fim de, obviamente, conquistar mais assinantes. Mas o mais importante ainda estava reservado nas palavras de um dos diretores da série que corroboraria a importância do apelo no mundo virtual solidificando o sucesso de uma série. Durante um festival de roteiristas na Austrália, o diretor David Petrarca afirmou que o download ilegal das séries não deveria ser encarado como algo negativo para o programa, já que a sobrevivência das séries existia com a ajuda do “buzz cultural”28.

Figura 2. Tela de um dos sites da internet que disponibilizam para download todos os episódios da série Guerra dos Tronos da rede HBO. (Fonte: http://goo.gl/EWFGj Acesso em 30 de maio de 2013)

                                                                                                                28

Disponível em http://goo.gl/24Xx9. Acesso: 22 de maio de 2013.

 

47   De fato, talvez na época em que a Internet ainda não fosse uma realidade, a

pirataria de programas significasse prejuízo para os cofres das emissoras, mas não atualmente em que boa parte dos lucros são fruto de produtos licenciados, vendas de DVDs e, principalmente, quando o trabalho com mídias sociais passou a ser fonte de renda. No entanto, o canal HBO se pronunciou ao jornal LA TIMES29 rapidamente alegando que a “série é distribuída mundialmente, legalmente disponível em larga escala e em uma grande variedade de plataformas. (...) Com esse tipo de sucesso, acompanham-se um falatório em redes sociais, então não há desculpa para se encontrar um lado positivo sobre downloads ilegais”. Querendo ou não, a HBO sabe que é completamente razoável aceitar o fato de que são os fãs que baixam suas séries pela Internet, os maiores consumidores de DVDs e os principais responsáveis pela perpetuação das produções do canal. Em linhas gerais, a TV aberta ainda terá uma maior precariedade quando o assunto é a competição com o modelo de negócio estabelecido por gigantes da TV paga. Seria uma boa analogia perceber que a mudança na TV aberta será como trocar a roda da bicicleta enquanto ela ainda está em movimento: não é possível zerar o processo já estabelecido ao longo de décadas e, o esforço para que o quadro ganhe novos contornos, dependerá da criatividade e da audácia dos executivos das emissoras abertas que precisam perceber a importância da conexão com o telespectador.

3.4 O CINEMA CONVERGINDO PARA A TV Tendo a televisão reconquistado um espaço importante na criação de boas histórias (sejam elas minisséries, séries, telefilmes ou novelas), ocupando até mesmo o posto que antes pertencia ao cinema, há uma interessante mudança na perspectiva de que, finalmente, a TV também oferece qualidade: diretores, atores e produtores renomados que migraram do cinema para a TV. Por muito tempo, grandes atores do cinema negaram papéis na televisão por acreditarem que suas imagens ficariam desgastadas, ofuscando o brilho que uma grande performance no cinema oferecia. Até mesmo o prestígio das premiações estava sempre atrelado à indústria cinematográfica, como o Oscar, o BAFTA e tantos outros.                                                                                                                

Disponível em http://goo.gl/7xNWV  

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48   Todavia, o Emmy - considerado o Oscar da televisão americana – estabeleceu

grandes nomes para a indústria audiovisual dando reconhecimento mundial à qualidade de produções feitas exclusivamente para a TV. Esta nova dinâmica de criação de séries resgatou alguns atores de um certo ostracismo em suas carreiras. A atriz Glenn Close que teve uma carreira marcada por grandes personagens no cinema, nunca chegou a receber um merecido prêmio da Academia, mas desde que aceitou o papel na série dramática Damages já foi contemplada com três Emmys e dois Golden Globes. Com certa razão, os atores não reconhecem que suas retomadas de carreira na TV tenham sido em consequência da dificuldade de emplacar novos sucessos no cinema, mas a debandada em massa para novas produções televisivas tem sido uma ótimo recomeço para eles. Próximo à situação de Glenn Close, o ator Kevin Bacon é reconhecido por boas escolhas de papéis e um trabalho de atuação sempre elogiado, mas nos últimos anos não emplacava muitos sucessos de grande público ou acabava dividindo os holofotes com atores mais jovens, como ocorreu no seu último personagem de cinema mais lembrado: o vilão de X-Men Primeira Classe. A grande volta do ator veio com a série The Following - produzida pela FOX e exibida pelo canal Warner no Brasil - que teve uma boa recepção da crítica e já foi renovada para mais uma temporada. Segundo matéria veiculada no jornal O Globo30, Kevin Bacon procurava por uma boa série e os produtores da FOX tinham ele como primeira opção para viver o policial Ryan Hardy que, na trama, precisa prender um assassino que comete seus crimes baseado nas obras do escritor Edgard Allan Poe. Ainda de acordo com a matéria, o ator não tinha muita intimidade com a televisão e a diferença na forma de construção de um personagem de série - que é mais lenta -, para um personagem de cinema - que precisa ser mais objetiva e aprofundada -, o deixou decepcionado após assistir sua performance no primeiro episódio. No entanto, Kevin Bacon compreendeu como a dinâmica mais prolongada de uma série pode oferecer ao ator a oportunidade de se deixar surpreender pelas várias nuances do personagem e reviravoltas que uma história contada em mais de 10 horas possui de vantagem sobre outra que precisa de um desfecho em pouco menos de duas horas, como é necessário no estilo narrativo do cinema.

                                                                                                                30  Disponível em http://goo.gl/xDDPE. Acesso: 22 de maio de 2013  

 

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Figura 3. Pôster promocional da série do canal FOX estrelada pelo ator Kevin Bacon (Fonte: http://goo.gl/nDUzZ Acesso em 30 de maio de 2013).

Em suma, a entrada de atores de peso no segmento das séries televisivas representa uma conquista do setor em oferecer ao telespectador a qualidade que há tanto tempo fora questionada. A crescente demanda por séries aqueceu o mercado audiovisual, tendo aberto portas para que outros profissionais também quisessem participar mais ativamente desta realidade. No caso brasileiro, já há uma significante adesão de nomes de peso para a criação de conteúdo destinado à televisão: o mais relevante deles é o diretor Fernando Meirelles que, no comando da sua produtora O2, já possui oito projetos de séries31 para os canais HBO, FOX e National Geographic. Apesar de se preparar para mais um longa-metragem no meio do ano, o diretor declarou que “a TV é hoje mais interessante que o cinema.32”, corroborando a ideia de que a inventividade é mais possível na TV do que no cinema. Em tempo, é irrefreável a adequação do audiovisual para tornar as séries uma nova e poderosa forma de entretenimento, comparável em qualidade técnica ao cinema e capaz de alavancar novas modalidades de produção que transcendam a própria televisão.

                                                                                                                31

Entre as séries já produzidas para a TV paga pela O2 de Meirelles estão “A Verdade de Cada Um”, transmitida pela National Geographic e “Contos do Edgar” para a FOX. 32 Disponível em http://goo.gl/zPe6n. Acessado em 23 de maio de 2013.

 

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3.5 O CASO NETFLIX A série House of Cards, primeira produção original do site de vídeo por demanda, NETFLIX, mostra os bastidores do poder na Casa Branca enquanto um congressista influente e de práticas pouco ortodoxas cruza o seu caminho com o de uma jovem jornalista ambiciosa. Assim como a jornalista que imprimi todos os seus esforços para poder usar as redes sociais na tradicional redação do jornal em que trabalha, a empresa NETFLIX também rompe com o modelo de produção televisiva ao que estamos acostumados, iniciando um novo segmento no qual outras plataformas de exibição também podem criar seus produtos próprios e disputar em pé de igualdade a atenção dos fãs de séries. Aproveitando-se da condição favorável do mercado para as séries, a NETFLIX investiu cerca de 60 milhões de dólares33 na produção de House of Cards ao escalar para o elenco o ator Kevin Space e toda a equipe do diretor David Fincher, dando um tom cinematográfico para todos os 14 episódios que foram disponibilizados ao mesmo tempo através do site - este último fator também foi outro grande acerto dos realizadores da série. Quando diretores e executivos da TV comentam a falta de audácia de produtores em se arriscarem mais quando o assunto é o desenvolvimento de uma série, é porque eles sabem que o mercado está se tornando mais voltado mais os interesses e hábitos dos fãs. Neste aspecto, a NETFLIX fez uma escolha arriscada mas extremamente acertada: ora, se este é um canal de vídeos por demanda, por que segurar a liberação de um episódio a cada semana quando o que está em jogo é a liberdade do cliente em escolher como, onde e de que forma ele quer consumir determinado programa? Foi partindo deste conceito que a empresa optou por proporcionar um dos momentos mais típicos na vida de um fã em séries: maratona ininterrupta com todos os episódios de uma temporada. Logo, os assinantes do site tinham à sua disposição todo o conteúdo de House of Cards. O hábito de um telespectador de série pode variar conforme sua disposição para acompanhar um produto de entretenimento. No molde mais clássico, há aqueles que acompanham pela televisão um episódio a cada semana, conforme determinado pelas emissoras de TV, outros, colecionam o box de suas séries e assistem novamente                                                                                                                 33

Dados do IMDB disponíveis em http://goo.gl/vfuEY. Acessado em 23 de maio de 2013.  

 

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todos os episódios em sequência. Mas em tempos de Internet e troca de informações em tempo real, a maioria opta por acumular todos os episódios em seus computadores para - da mesma forma que no exemplo anterior - assistir tudo de uma vez só. Reconhecer esses hábitos, compreender os desejos dos fãs e apostar em profissionais renomados foram as cartadas da NETFLIX para abrir esse precedente das séries “fora” da televisão. Para tanto, a tendência de transpor produtos genuinamente televisivos para outras plataformas de entretenimento parece ter chegado aos consoles de videogame também. Para o mundo dos gamers, já não é um fenômeno tão recente que diretores consagrados do cinema tenham percebido o potencial deste entretenimento e migrado suas equipes para a produção de jogos. Pioneiro no assunto, o diretor e produtor Steven Spielberg já trabalhava há alguns anos na famosa série de games, Halo. Até então, consoles de jogos como Playstation, da Sony e, Xbox da Microsoft, não funcionavam como plataformas de acesso aos conteúdos disponíveis na Internet, funcionando como simples reprodutores dos jogos desenvolvidos por outras empresas. Sendo assim, o que aqui cabe como um perfeito exemplo do novo mercado propagado pela NETFLIX, torna-se uma realidade quando o anúncio de que uma série sobre o jogo Halo será produzida por Steven Spielberg e disponível com exclusividade para o Xbox34.

Figura 4. O produtor e diretor Steven Spielberg anunciando sua parceria na criação da série exclusiva Halo durante um evento promovido pela Xbox. (Fonte: http://goo.gl/5XnDC. Acesso em 30 de maio de 2013).

                                                                                                                34  Disponível em http://goo.gl/DmTAF. Acesso: 24 de maio de 2013.  

 

52   Não obstante, o cenário construído pela NETFLIX poderia dar-se por

satisfeito até aqui, no contínuo de reproduzir o mesmo prestígio alcançado com House of Cards - como de fato fizeram quando Hemlock Grove, a segunda série lançada pela empresa de video on demand em parceria com o diretor Eli Roth, que foi uma das acessadas na Internet. No entanto, outra decisão foi crucial para estabelecer uma conexão direta do nome NETFLIX com o mundo das séries: o resgate de antigas séries já extintas, mas ainda com uma legião de ávidos fãs, como Arrested Development e Orange Is The New Black35.

Figura 5. Página inicial da NETFLIX com anúncio de Arrested Development em streaming como série original do site de videos por demanda. (Fonte: http://goo.gl/OTmJz Acesso em 20 de maio de 2013).

A NETFLIX não inicia apenas um importante ciclo na criação e no remake de séries, mas entra em um campo que até então era dominado apenas por grandes canais de TV paga, em especial, pela HBO. Percebemos que existe um bem executado trabalho de branding por parte dos executivos da NETFLIX em formar uma marca que seja referência de qualidade em produções de séries. Se em 1996 a HBO lançava um slogan que declarava explicitamente não se tratar mais de uma televisão – “It’s not TV, It’s HBO” -, a NETFLIX já deixa esse distanciamento mais nítido uma vez que seu surgimento não tem relação objetiva com a televisão em si. Por outro lado, a HBO agrega mais valor à sua marca por buscar em outras plataformas essa

                                                                                                                35  Disponível em http://goo.gl/sSkGj Acessado em 24 de maio de 2013.  

 

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aproximação com seus milhões de assinantes e, neste ponto, a NETFLIX ainda tem um longo caminho se quiser disputar o posto de HBO da Internet. Neste sentido, a HBO é, sem dúvida, um modelo a servir de inspiraração: o trabalho nas redes sociais, a disponibilização do conteúdo próprio on demand (com o recente HBOGo) e a proposta de interatividade e material extra que acrescentam mais profundidade às tramas. Por enquanto, ainda não há, por parte da NETFLIX, um canal de comunicação com os fãs das séries que senão por pequenas publicidades disparadas no Facebook, que carecem de mais informação sobre os próximos passos do canal e qual o destino das séries produzidas por eles.

Figura 6. Página de seriados no aplicativo HBOGo apresenta séries disponíveis para assinantes premium. (Fonte: http://digitaltrends.com/gaming/hbo-go-iscomingotogame_consoles-and-connected-tvs/. Acesso: 30 de maio de 2013).

3.6 O UNIVERSO DAS SÉRIES CONDUZINDO MODELOS DE INTERATIVIDADE A internet foi um divisor de águas nos processos interativos, tendo modificado significativamente as experiências comunicacionais contemporâneas. Tirando proveito logo de início das novidades oferecidas pela internet, grandes canais

 

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de TV por assinatura viram uma oportunidade única de alavancar seus produtos e conquistar novos assinantes. Neste intuito, o canal de TV por assinatura HBO e o site NETFLIX serão objetos de estudo deste capítulo, uma vez que ambos canais têm despontado no mercado audiovisual ao passo que, a cada grande produção original de série criada por ambos, um grande buzz (falatório) inicia-se no âmbito das redes sociais, tornando estes modelos os exemplos de maior destaque da atualidade. Essa fórmula que combinou o alcance da TV com a participação mais ativas dos fãs (propiciada pela internet) foi o combustível utilizado pela HBO nos últimos anos. A exemplo dessa importância do conceito de interatividade, podemos considerar que quando um produto televisivo é lançado, logo ele se torna objeto de busca nas redes sociais, seja só por informação adicional ou, como mais relevante neste tópico, quais plataformas são utilizadas para ampliar o universo de uma trama. Neste sentido, as séries televisivas já garantem, desde seu início, uma elaboração da trama que

leve em conta quais formas de interação serão mais

apropriadas e atrativas para os fãs. E para atrair fãs, não falta criatividade ou recursos criados para esta finalidade. Vários fatores podem ser apresentados para ao menos tentar explicar o porquê das séries televisivas estarem gerando uma busca um tanto quanto bem sucedida pela interatividade36, quais sejam, multiplicidade de tramas, variedade de plataformas, apelo jovem, alcance mundial tecnológico da TV (recepção do sinal em localidades distantes geograficamente). É importante ressaltar que ainda não há um pleno uso do ideal de interatividade, isto porque a TV não é um veículo de bidirecionalidade, mantendo seu papel de emissor, mas que com uso da internet permite algo mais próximo da participação do público e o início de uma nova fase que busque usar o máximo da potência de interações, sem que as ações não se confundam com uma mera simulação da participação dos fãs no desenrolar da trama. Desta forma, enquanto a interatividade não alcança seu pleno potencial, já podemos experimentar a oportunidade do diálogo através das ações realizadas pelos canais de TV que visam fidelizar seus assinantes e agregar valor à marca dentro do contexto das redes sociais.

                                                                                                                36

Claro que, como já discutido no primeiro capítulo, a interatividade se estende a inúmeros outros “produtos” além daqueles realizados pela televisão – mesmo que a jogada de marketing com o nome não represente necessariamente o verdadeiro conceito da ideia.

 

55   3.6.1 GUERRA DOS TRONOS E TRUE BLOOD Reconhecida a importância que a projeção de uma marca ganha no âmbito

virtual, a rede HBO realizou estratégias criativas na abertura de um espaço para os fãs compartilharem suas impressões sobre as séries – oferecendo até mesmo um certo controle sobre o andamento da trama dentro dos fóruns virtuais – e “viralizarem” pela rede o nome da série e, consequentemente, do canal realizador, sendo esta a melhor publicidade nos tempos atuais. A saga de Guerra dos Tronos já era um sucesso literário no mundo inteiro quando o canal HBO conseguiu persuadir o autor da trama, George R. R. Martin, a realizar uma adaptação televisiva para a história. O primeiro convite a George R R Martin surgiu da indústria cinematográfica que planejava fazer uma trilogia nos moldes de outros filmes de fantasia como O Senhor Dos Anéis, de J R R Tolkien e As Crônicas de Nárnia, de C S Lewis. No entanto, o autor achou impossível que uma adaptação do cinema conseguisse transmitir todas a complexidade de sua história. Não foi qualquer exagero de George R R Martin negar incialmente o convite, uma vez que os livros publicados já ultrapassavam 5 volumes e mais de mil personagens já tivessem sido criados para a trama. Se a limitação temporal do cinema era um impasse para a adaptação, o modelo de seriado para Televisão era a melhor saída na concretização da obra audiovisual em cima dos livros. Considerando o universo criado em Guerra dos Tronos, a HBO tem nas mãos uma das obras mais ricas no âmbito da fantasia. Quanto à trama, a história se passa no reino de Westeros, uma reprodução da idade média, mas com direito a dragões, seres místicos, reis e cavaleiros. A saga em Westeros inicia-se antes mesmo do tempo narrado na séria da HBO, o que já permitiu ao canal idealizar um novo roteiro de série que relate este espaço de tempo assim que Guerra dos Tronos atingir sua última temporada. A narrativa atual da série trata-se da disputa entre várias famílias pelo Trono de Ferro, após a morte inesperada do último rei. Não obstante, a trama que embora seja de fantasia, articula diversos aspectos de uma época violenta com traições, incesto e guerras sangrentas – bem ao estilo polêmico de outras produções do canal HBO. Logo, Guerra dos Tronos já tinha tudo pra ser tornar um sucesso de público e mais uma produção bem executada com a marca de qualidade do canal. O mesmo desempenho de criação de uma marca poderosa nas séries aplica-se a outro programa da HBO, True Blood. Embarcando na tendência atual de histórias

 

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sobre vampiros e lobisomens que dominou as últimas produções cinematográficas como Crepúsculo e Anjos da Noite, True Blood – que já está na sétima temporada – se passa nos tempos atuais em uma cidade fictícia da Louisiana, chamada Bon Temps. Após a criação de um sangue sintético (o True Blood) que substitui o sangue humano na alimentação dos vampiros, a existência destes seres pôde ser revelada para o mundo, aproximando uma telepata e um vampiro. A temática aparentemente simples, porém com bastante apelo sexual, foi usada como peça de uma publicidade forte que atraiu muitos fãs para as séries antes mesmo de seu lançamento. Neste ponto, True Blood não foi marcada necessariamente como uma série com plataformas interativas, mas sim de referência na utilização do poder de propagação de informação na Internet como um forte aliado de publicidade das TVs por assinatura. Para isto, a HBO enviou cartas criptografadas e mensagens secretas a personalidades influentes da Internet que, após decifrarem o código secreto, conseguiam acesso a um site exclusivo para vampiros e recebiam uma amostra do sangue sintético True Blood. Esta ação publicitária inicial alavancou curiosos nas redes sociais que ansiavam pela nova produção original do canal. Em seguida, outras ações marcavam ainda mais a popularidade do show na Internet e incentivavam o público a discutir sobre a trama. Com a campanha #TBWithdrawal, o canal lançou vídeos no YouTube em que os personagens da série mandavam mensagens de apoio aos dependentes do suco True Blood, alcançando uma campanha global com o marketing boca-a-boca dos usuários de redes sociais.

Figura 7. Elenco e produtores da série enviando suas mensagens para a campanha It Gets Better dentro da página oficial da HBO. (Fonte: http://hbo.com/#/true-blood/inside/index.html. Acesso: 31 de maio de 2013)

 

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Guerra do Tronos também possui sua própria ação de marketing e vários produtos licenciados com o nome da série. No entanto, devido a criação de um mundo próprio e civilizações fantásticas distantes da realidade, a série proporciona maior variedade de opções no desenvolvimento de plataformas mais interativas que True Blood. Os fãs que acompanham a série Guerra dos Tronos contam com uma variedade de plataformas de conteúdo adicional e um elaborado sistema interativo para a compreensão aprofundada da trama. Em parceria com a empresa HUGE que é especializada em tecnologia na comunicação, a HBO criou um serviço disponível para todas as plataformas (smartphones, tablets, computadores, etc) que complementa passo-a-passo o que acontece a cada episódio, com mapas de Westeros, perfil dos personagem e um breve histórico sobre as eras anteriores ao período da trama– chamado de Viewer’s Guide ou, “guia do telespectador”. Em tempo, estes modelos só são possíveis graças ao tempo em que uma história se permite ser contada no modelo das séries televisivas, podendo ser atualizados a cada nova temporada lançada e até mesmo trazer novidades no segmento.

Figura 8. Mapa que localiza personagens da trama e faz a breve descrição do episódio da semana disponível no site oficial da HBO. (Fonte: http://viewers-guide.hbo.com/season3/#!/map/episodes/28/ Acesso: 30 de maio de 2013).

 

58   É importante salientar que embora cada série ganhe seu próprio case de

conteúdo, a HBO possui ferramentas de uso geral que englobam um uso do conceito de interatividade. Neste aspecto, é possível apontar dentro do site do canal por assinatura um importante acesso na comunicação com o público que recebeu o nome de HBO Connect. A HBO já tinha emplacado no início dos anos 2000 a ideia de “watercooler conversations ou, simplesmente “conversas de bebedouro”, para definir o momento em que as pessoas se encontram em volta do bebedouro do trabalho e discutem rapidamente sobre os programas que acompanham na TV. Logo, a ideia do HBO Connect - segundo a descrição no próprio site - é trazer as watercooler conversations para o contexto das redes sociais e do comportamento participativo da audiência37. Desta forma, o HBO Connect reúne todo falatório das redes sociais em uma única tela, relacionando as palavras lançadas na Internet com o nome de cada produção do canal, otimizando a conversação entre os fãs.

Figura 9. Tela inicial do HBO Connect para a série Guerra dos Tronos. (Fonte: http://connect.hbo.com/game-thrones/ Acesso: 30 de maio de 2013).

                                                                                                                37  O video da propaganda

do HBO Connect encontra-se http://www.youtube.com/watch?v=y9eQOy50kK4. Acessado em 30 de maio 2013.

 

disponível

em

 

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Figura 10. Campanha Sho Your Fangs para o inicio da sétima temporada de True Blood reuniu uma galeria de fotos com fãs na página do HBO Connect. (Fonte: http://connect.hbo.com/events/true-blood/showyourfangs/ Acesso em 30 de maio de 2013).

Isto significa que novas formas de interação trabalhadas pelo canal HBO estão modificando a maneira com que vemos Televisão, uma vez que - embora seja este um ato solitário - tem proporcionado a conversação e o compartilhamento de opiniões em tempo real durante exibição do programa, o que inaugura uma nova fase comunicacional dentro da TV.

 

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CONCLUSÃO

A HBO, ao longo dos últimos anos, tem exercido um forte papel nesta nova configuração do espaço televisivo através do maciço investimento realizado nas plataformas de interação virtual. O gênero narrativo das séries, com sua atemporalidade dentro da Internet, garante a sobrevivência do modelo televisivo em outras plataformas menos convencionais como computadores, smartphones, tablets e, agora, consoles de videogame – como observamos no anúncio da Xbox em criar uma série própria. Isto significa dizer que a Televisão está em transformação, deslocando seu papel tradicional de mero emissor para um incentivador das interações humanas mediadas por outros dispositivos tecnológicos. Neste sentido, é imperativo afirmar que a TV está longe de ser um meio superado e próximo do seu tão discutido “fim”. Os estudos acerca da Televisão e de suas várias nuances têm demonstrado como este deslocamento tem se dado de forma natural, sem abalos drásticos na estrutura clássica de entretenimento oferecida por ela e, cujo ápice da transformação, só será sentido a longo prazo nos próximos anos. Para a TV aberta no Brasil, o momento tem sido muito propício para o investimento em novas plataformas, uma vez que o antigo modelo já não satisfaz o público inserido na configuração dos modelos de TV por assinatura, que assumem seu papel na Era Digital (ANDERSON, 2009). O mercado tem se forçado a reconhecer esta questão e já observamos uma tentativa dos grandes conglomerados de comunicação em participar deste contexto. Logo, é iminente que o estudo deste fenômeno televisivo e social passe a ser o campo de pesquisa de profissionais da área de comunicação e tecnologia. O resultado deste estudo corrobora a ideia de que a TV se reafirma no espaço virtual. Ela continua se apropriando dos dispositivos de outros meios e aumentando seu valor como instrumento de comunicação em massa. Neste ponto, é importante ressaltar que não há aqui uma tentativa de definição conclusiva sobre o assunto, mas o início de uma importante observação sobre os possíveis caminhos que a Televisão assumirá nas próximas décadas e quais formas de entretenimento serão mais apropriadas para este veículo, sem que se percam as suas característica de linguagem.

 

61   Como este trabalho analisa o momento atual destas transformações, falta o

distanciamento histórico necessário para observação de seus resultados. No entanto, este fator não reduz a importância da análise do papel televisivo e de que forma ele perpetua-se no âmbito comunicacional, em que os estudos a seu respeito são uma construção contínua e ininterrupta no meio acadêmico.  

 

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