O Absurdo em Álvaro de Campos, em “Passagem das Horas”

May 20, 2017 | Autor: Samara Araujo | Categoria: Fernando Pessoa, Jean Paul Sartre, Albert Camus, Absurdo, Literatura De Lo Absurdo
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SARTRE, p. 153
SARTRE, p.141.
Ibidem.
SARTRE, p. 69.
CAMUS, p. 44
CAMUS, p. 33
BARBARAS, 2011. Ora, essa determinação absolutamente negativa do pensamento corresponde à uma determinação da coisa como aquilo que é totalmente alheio à significação e não a tolera ou incorpora de maneira nenhuma. Há, em Pessoa, uma tentativa única para dizer a coisa como pura presença, excluindo a significação : "... ser uma coisa é não significar nada. /Ser uma coisa é não ser susceptível de interpretação"(233).
CAMUS, p. 59


APEIRON

Revista Filosófica dos Alunos da
Universidade do Minho



Nº 6 –
Filosofia, Literatura e Cinema
(12/2015)


Convidado de Honra:

Noël Caroll
(CUNY - Graduate Center)



Organização: Steven S. Gouveia (Ph.D. Student – Universidade do Minho)

Tradução: Diana Neiva (Master Student – Universidade do Porto)

Editora: CreateSpace Independent Publishing

ISBN-13: 978-1522830443 / ISBN-10:1522830448 

Apoio: Núcleo de Estudantes de Filosofia da Universidade do Minho

Contacto: [email protected] ou [email protected]














6. O Absurdo em Álvaro de Campos, em "Passagem das Horas"

A noção do absurdo é inserida na obra A náusea de Sartre e posteriormente inspira Camus a desenvolvê-la em o O mito de Sisífo. Nos dois autores trata-se de uma espécie de sentimento que é gerado após a observação e apreensão do olhar que se lança sobre o mundo, culminando numa forma de compreensão, e posição diante deste. É a partir daí que tentarei mostrar como no poema Passagem das horas identifico tal movimento, o absurdo que se revela nos versos de Pessoa. Apresento a argumentação de Sartre e Camus e relaciono, identificando o mesmo movimento nos versos do poeta. Porém, o direcionamento que sugerem para adiante do absurdo será diferente, e no poema de Álvaro de Campos, aponto semelhanças com o caminho proposto por Camus. Pela absorção da realidade, Sartre e Camus concordam com a gratuidade do mundo, com a contingência que há nos fatos e a ausência de sentido que prevalece. Surgindo assim a náusea seguida do absurdo na obra de Sartre, veremos aqui como é tal passagem.
A náusea é um romance de Sartre, onde o personagem principal com nome de Roquentin, por vezes visto como alterego do filósofo, e desta forma posteriormente desenvolve e apresenta sua filosofia a partir das noções que ali inicia. A obra é escrita em forma de relatos diários. Expressamente percebo muito do tom da fala de Roquentin nos versos do poema Passagens das horas. Em A náusea o autor expõe descrevendo a percepção do protagonista de forma intimista e confessional em sua realidade de escritor, revelando impressões que o levará a nomear como absurdo o que percebe. Questionando-a, como faz o poeta, na posição de engenheiro naval do heterônimo Álvaro de Campos. Vemos descrições que nos conduzem a disposições que também percebemos no poema. O ponto central que leva a entender a noção de absurdo através dos relatos do personagem de Sartre é sua compreensão de que realidade permanece com ausência de sentido, o que o leva a sentir náusea, e ao entendê-la é possuído pelo absurdo, que é uma espécie de sentimento. Como podemos ver em suas palavras:

É então isto a Náusea, esta ofuscante evidência? As voltas que dei à cabeça. Tanto que escrevi acerca dela! Agora sei: existo - o mundo existe - e sei que o mundo existe. É tudo. Mas é-me indiferente. É estranho que tudo me seja indiferente: mete-me medo que assim seja. (SARTRE, p.75-76)

Ao descrever o que sente ao observar o mundo e as relações nele, a indiferença do mundo perante todas as nossas tentativas de entendê-lo a náusea se faz presente em Roquentin. Isso se dá justamente pela falta completa de sentido que há na realidade. A meu ver, se encontra nos versos de Álvaro, e é associada a todo sentido que é dado ao mundo. Podemos identificar nos versos do poema este lidar com o mundo já significado e a não validação destes, o que e culmina no absurdo:
Não sei se a vida é pouco ou demais para mim.
Não sei se sinto de mais ou de menos, não sei
Se me falta escrúpulo espiritual, ponto-de-apoio na inteligência,
Consangüinidade com o mistério das coisas, choque
Aos contatos, sangue sob golpes, estremeção aos ruídos,
Ou se há outra significação para isto mais cômoda e feliz.
Ao longo da obra, Sartre expõe a descrição da náusea na tentativa de descobrir sua verdade fundamental, o absurdo surge quando Roquentin se pergunta o porquê da náusea. Como nos versos do poeta, o absurdo vem após uma percepção do contingente, da não compreensão de toda significação já estruturada no mundo que é totalmente arbitrária. O que também podemos ver nos versos do poema que tratamos:
A certos momentos do dia recordo tudo isto e apavoro-me,
Penso em que é que me ficará desta vida aos bocados, deste auge,
Desta entrada às curvas, deste automóvel à beira da estrada, deste aviso,
Desta turbulência tranqüila de sensações desencontradas,
Desta transfusão, desta insubsistência, desta convergência iriada,
Deste desassossego no fundo de todos os cálices,
Desta angústia no fundo de todos os prazeres,
Desta sociedade antecipada na asa de todas as chávenas,
Deste jogo de cartas fastiento entre o Cabo da Boa Esperança e as Canárias.
Podemos evidenciar o aparecimento do sentimento do absurdo em passagens do romance, como visto no diálogo de Roquentin com outro personagem nomeado como "Autodidata" num café. Quando este que acabara de lhe revelar um grande humanismo, exibindo sua visão sobre as relações e o sentido que deu para sua vida, o protagonista sente o escárnio que lhe sobrepõe perante qualquer sentido e razões dadas para a compreensão da realidade. Roquentin pensa: "Os homens. Tenho de amar os homens. Os homens são admiráveis. Sinto vontade de vomitar - e, bruscamente, ela chega. Cá está ela: a Náusea." Perante todos os sentidos criados por homens em suas relações convencionais e habituais, ao percebê-los, lhe causavam a náusea, até mesmo este grande humanismo que se revelava nas palavras do Autodidata. O que também se mostra nos versos do poeta:
Torna-me humano, ó noite, torna-me fraterno e solícito.
Só humanitariamente é que se pode viver.
Só amando os homens, as ações, a banalidade dos trabalhos,
Só assim - ai de mim! -, só assim se pode viver.
Só assim, ó noite, e eu nunca poderei ser assim!
Ainda no diálogo, ao analisar e apontar o que vê no comportamento de um casal naquele mesmo instante, Roquentin percebe como toda e qualquer descrição de significações relacionais não lhe convencem de verdade alguma, são convenções e recortes cristalizados que nos dizem como é que se vive. Neste momento se vê absorvido pela náusea. Para ele todos os sentidos dados, seja o amor ou qualquer humanismo, é possível ser ridicularizado, toda dedução da dinâmica dos relacionamentos, com suas aparências, são vazias de sentido e de propósitos, não há sentido algum. Aponto parte deste momento no texto:
No fim de contas, é preciso matar o tempo. São os dois jovens e de boa compleição: ainda têm diante deles uns trinta anos. Por isso não se apressam, saboreiam o seu vagar, e não deixam de ter razão. Quando tiverem dormido juntos, precisarão de encontrar outra coisa para encobrir o enorme absurdo da sua existência. Embora... Será absolutamente necessário mentirmos a nós próprios?
Percorro a sala com os olhos. É uma farsa! Todas estas pessoas estão sentadas com uns modos sérios. A comer. Não, não estão a comer: estão a recobrar forças para levar a bom termo a tarefa que lhes incumbe. Cada um tem a sua porfiazinha pessoal que o impede de se aperceber de que existe; não há nenhum que não se julgue indispensável a alguém ou a alguma coisa. (SARTRE, p.140)
Nos versos de Álvaro de Campos percebemos como se segue o encaminhar para estes aspectos vistos em Sartre, e o absurdo mais claramente em Pessoa como algo relacionado a meu ver com o espasmo:
Vi todas as coisas, e maravilhei-me de tudo,
Mas tudo ou sobrou ou foi pouco - não sei qual - e eu sofri.
Vivi todas as emoções, todos os pensamentos, todos os gestos,
E fiquei tão triste como se tivesse querido vivê-los e não conseguisse.
Amei e odiei como toda gente,
Mas para toda a gente isso foi normal e instintivo,
E para mim foi sempre a exceção, o choque, a válvula, o espasmo.
Através do olhar de Roquentin, Sartre descreve a vontade que há em atribuirmos sentido à vida, já que não há sentido algum, e que, toda descrição de sentido é puramente do ser que o confere. Diante de tamanha contingência, seja no nível individual como social, Sartre diz deste dever atribuir sentido e aponta: "penso que é exactamente essa a espécie de mentira que andam perpetuamente a pregar a si próprios" insistindo "que estamos aqui, tantas pessoas, a comer e a beber para conservar a nossa preciosa existência, e que não há nada, nada, nenhuma razão para existir."O poeta demonstra também este conflito em seus versos, diz dessa mesma imposição a que se refere Sartre, de um sentimento de não enquadramento a estes ajustes em termos da necessidade de conferir sentido à realidade, e às nossas vidas:
Não sei sentir, não sei ser humano, conviver
De dentro da alma triste com os homens meus irmãos na terra.
Não sei ser útil mesmo sentindo, ser prático, ser quotidiano, nítido,
Ter um lugar na vida, ter um destino entre os homens,
Ter uma obra, uma força, uma vontade, uma horta,
Uma razão para descansar, uma necessidade de me distrair,
Uma cousa vinda diretamente da natureza para mim..
Roquentin e Álvaro de Campos salientam as relações sociais como mera norma criticando os significados que aderimos de forma tão habitual. A exemplo de reflexões que compartilham quando observam como é a rotina dos homens, os dias de trabalho, o dia resignado ao descanso, "tinham apenas um dia para apagar as suas rugas, os seus pés-de-galinha, os vincos amargos que dá o trabalho da semana". O que também se vê no poema, um olhar à mesmice do cotidiano com suas amarras:
A sua vida pacata, as suas casas suburbanas com jardim,
Os seus half-holidays inesperados...
Em outro momento do poema:
E todos os que se levantam cedo para ir trabalhar
Vão da mesma casa para a mesma fábrica por o mesmo caminho...
Conduzidos a tal recorte da realidade, simplesmente, os homens consentem ao que já foi construído. No que diz respeito a toda apresentação e comportamento perante outros homens, em todas as suas formas, como mera criação da mente humana, afinal, nossos recortes poderiam ser diferentes se assim o quiséssemos. Talvez assim quisesse o poeta, e assim vejo quando diz da necessidade de pôr o "coração" em tudo:
Passa tudo, todas as coisas num desfile por mim dentro,
E todas as cidades do mundo, rumorejam-se dentro de mim ...
Meu coração tribunal, meu coração mercado,
Meu coração sala da Bolsa, meu coração balcão de Banco,
Meu coração rendez-vous de toda a humanidade,
Meu coração banco de jardim público, hospedaria,
Estalagem, calabouço número qualquer cousa
(Aqui estuvo el Manolo en vísperas de ir al patíbulo)
Meu coração clube, sala, platéia, capacho, guichet, portaló,
Ponte, cancela, excursão, marcha, viagem, leilão, feira, arraial,
Meu coração postigo,
Meu coração encomenda,
Meu coração carta, bagagem, satisfação, entrega,
Meu coração a margem, o lirrite, a súmula, o índice,
Eh-lá, eh-lá, eh-lá, bazar o meu coração.
Tanto o poeta como Sartre lançam seus olhares para o mundo e natureza, às coisas que apenas existem em suas dinâmicas, percebendo que tudo foi simplesmente dado, a realidade está como sempre esteve, em todos seus acidentes. Ambos afirmam que a natureza é indiferente ao homem, vemos em Sartre através da percepção de Roquentin:
O essencial é a contigência. Quero dizer que, por definição, a existência não é a necessidade. Existir é estar presente, simplesmente; os existentes aparecem, deixam que os encontremos, mas nunca se podem deduzir. Há pessoas, creio eu, que perceberam isto. Somente, tentaram dominar essa contingência inventando um ser necessário e causa de si próprio. (SARTRE, p. 163)
A contingência em Sartre se relaciona com a falta de sentido da realidade, o mundo está acontecendo não importa o que dissemos sobre, a ação humana parece ser necessária, mas só no mundo que inventamos, um mundo dos homens. Os sentidos dados por nós são dissolvidos perante a natureza, mantidos na cultura, no hábito.
Nos versos de Álvaro também se nota a percepção de tal indiferença da natureza, demonstrando inquietação vinda destes sentimentos com que lida o poeta:

Dói-me a imaginação não sei como, mas é ela que dói,
Declina dentro de mim o sol no alto do céu.
Começa a tender a entardecer no azul e nos meus nervos.
Vamos ó cavalgada, quem mais me consegues tornar?
Eu que, veloz, voraz, comilão da energia abstrata,
Queria comer, beber, esfolar e arranhar o mundo,
Eu, que só me contentaria com calcar o universo aos pés,
Calcar, calcar, calcar até não sentir.
O poeta está a perceber a natureza e apelando para a imaginação para sentir tanto tudo que é oferecido que tenta se transformar em abstração, quisera ao menos afetar o mundo com seus sentidos, ou deixar de sentir. A realidade não muda quando lhe conferimos algum. Todas as ideias que possuímos sobre esta, são construídas pelo homem, e é neste momento que se compreende a náusea. Desta forma, Roquentin e o poeta, passam a colocar suas ideias, a saber, que todo contexto está envolto pela náusea, uma espécie de mal-estar pela contingência que há, pela impossibilidade de algum sentido que de fato seja aderente ao real. Esta compreensão é chamada de experiência do absoluto ou de absurdo:
Mas eu, ainda agora, tive a experiência do absoluto: o absoluto ou o absurdo. Aquela raiz, não havia nada em relação a que ela não fosse absurda. Oh! Como poderei fixar isso com palavras? Absurda: em relação às pedras, aos tufos de erva amarela, à lama seca, à árvore, ao céu, aos bancos verdes. Absurda, irredutível; nada - nem sequer um delírio profundo e secreto da natureza - podia explicá-la. É claro que eu não sabia tudo, não tinha visto a semente germinar nem a árvore crescer. Mas, diante daquela espessa massa rugosa, nem a ignorância nem o saber tinham importância: o mundo das explicações e das razões não é o da existência. (SARTRE, 161-162)

A natureza e os homens existem apenas, não é possível explicá-los. No momento em que se percebe a impotência diante à acidentalidade dos fatos, a arbitrariedade nas escolhas, nas relações, no mundo que nos é indiferente, apreende-se a náusea. Esta encaminha para a compreensão do absurdo, e conduzirá a filosofia sartreana para a liberdade de tornar-se ser necessário, ao conferir algum sentido à vida. Inquietação que não se encontra na poesia de Álvaro, apresentarei semelhanças com a resposta de Camus. Em Sartre, a resposta ao absurdo é que, como a realidade é absorvida em acidentes, se está livre para irrogar sentido. A partir da compreensão da náusea e que qualquer situação no mundo é desprovida de sentido, Sartre afirmará a necessidade de criarmos algum. Roquentin, no fim do romance perceberá que os sentidos devem existir, e somos livres para escolhê-los, dar razões para fundamentar o ser. A saída do absurdo para Sartre é a liberdade de escolher sentido. Quando ao ouvir uma música e sentir o inexplicável justificar aquele que canta, ao menos um pouco sua existência , é um dos exemplos de Roquentin para justificar a liberdade e a necessidade de sentido. Em Álvaro, há a tentativa de compartilhar desta ideia, como um movimento natural do homem, por outro lado, identificamos a precariedade na atribuição de sentidos, e nos versos o poeta se diz inepto para justificar-se com algum sentido:
Só estou bem quando ouço música, e nem então.
Jardins do século dezoito antes de 89,
Onde estais vós, que eu quero chorar de qualquer maneira?

Como um bálsamo que não consola senão pela idéia de que é um bálsamo
O poeta, neste caso, não crê que algum sentido possa abrandar e realmente se há liberdade, talvez justificasse sua existência por sua criação poética, mas essa possibilidade é rechaçada em outros poemas, que não tratarei aqui. O sentido é uma tentativa em vão para responder à vida, ao absurdo, o que vai ao encontro com o que diz Camus. Para Camus a liberdade de atribuir sentido ao mundo não retira o sentimento do absurdo, pois todas as escolhas são arbitrárias. Trata de uma liberdade que se encontrará presa no fato de ter que escolher e atribuir sentido. Qualquer justificação para a escolha de tal sentido é também absurda, perante a realidade que é totalmente independente de nós. O significado do mundo, para Camus, está nele próprio, não se encontra nos homens, e tentar explicá-lo é necessidade humana, dar algum sentido é saltar da realidade, desta imersão do absurdo. Nos versos do nosso poeta surge o assombro perante o absurdo em vários momentos do poema. Há uma descrição imensa da aleatoriedade, na contingência dos sentidos dados o absurdo se mostra, o poeta talvez o resolva com um amor absoluto pelo próprio mundo. Demonstro o verso:
Sentir tudo de todas as maneiras,
Ter todas as opiniões,
Ser sincero contradizendo-se a cada minuto,
Desagradar a si próprio pela plena liberalidade de espírito,
E amar as coisas como Deus.
Neste verso o sentir está colocado acima do que pode ser dito, justificado por algum sentido. A liberdade está na capacidade de não aderir a nenhum, em poder se contradizer. Há a liberdade no poeta em se colocar imerso na contingência, sem preocupar-se em escolher, podemos ver a riqueza da descrição e sua capacidade de simulação da possibilidade de ser outro, de estar em qualquer outra situação, de se lançar no absurdo pela falta de sentido, ou de se imaginar possuidor de qualquer sentido que possa ser dado. A acidentalidade e arbitrariedade dos fatos, o descomedimento de escolher qualquer sentido, com justificativas injustificáveis, enfim, o poeta se diz simpático a qualquer sentido dado, e afirma que a existência o satisfaz:
Eu quero ser sempre aquilo com quem simpatizo,
Eu torno-me sempre, mais tarde ou mais cedo,
Aquilo com quem simpatizo, seja uma pedra ou uma ânsia,
Seja uma flor ou uma idéia abstrata,
Seja uma multidão ou um modo de compreender Deus.
E eu simpatizo com tudo, vivo de tudo em tudo.
São-me simpáticos os homens superiores porque são superiores,
E são-me simpáticos os homens inferiores porque são superiores também,
Porque ser inferior é diferente de ser superior,
E por isso é uma superioridade a certos momentos de visão.
Simpatizo com alguns homens pelas suas qualidades de caráter,
E simpatizo com outros pela sua falta dessas qualidades,
E com outros ainda simpatizo por simpatizar com eles,
E há momentos absolutamente orgânicos em que esses são todos os homens.
Sim, como sou rei absoluto na minha simpatia,
Basta que ela exista para que tenha razão de ser.
Não pensemos que esta simpatia que diz o poeta por vários modos de ser é um certo humanismo, o poeta pode se contradizer a cada momento, é aí que está sua liberdade. Em Camus e no poeta nossa vontade de atribuir sentido ao mundo, nossos recortes da realidade são totalmente arbitrários e desprovidos de verdade, portanto, qualquer razão plausível poderá ser rejeitada, qualquer sentido dado à existência. No poeta, fingindo cria em seus versos o que poderiam ser descrições de algumas das infinitas situações possíveis, lida com o fato de poder se colocar no papel de qualquer homem e se identificar com qualquer escolha ou sentido, brinca com a representação dos sentidos dados a realidade:
Fui para a cama com todos os sentimentos,
Fui souteneur de todas ás emoções,
Pagaram-me bebidas todos os acasos das sensações,
Troquei olhares com todos os motivos de agir,
Estive mão em mão com todos os impulsos para partir,
Febre imensa das horas!
Angústia da forja das emoções!
Trocar olhares com todos o motivos de agir é lidar com os sentido, a significação, simulá-la para si vendo a aleatoriedade destes. Diz de tantos impulsos e emoções que podem estar presentes na liberdade de escolha, mas que enfim é uma "forja das emoções". O ponto em Camus é que todas as nossas escolhas que levamos tão a sério, após a compreensão do sentimento de absurdo estão imersas numa espécie de ceticismo prático, uma dúvida incessante de tudo que consideramos tão fidedigno de interesses. Os sentidos propostos por Sartre que tentam de alguma forma justificar nossa existência, os propósitos que são respondidos frente ao sentimento do absurdo, são arbitrariamente injustificáveis para Camus. Em Álvaro, num verso talvez se resuma a injustificação que também é possível visualizar: "E a vida dói quanto mais se goza e quanto mais se inventa." Enfim, não podemos valorar todas as escolhas, por que não há o certo, a casualidade permanecerá infinitamente sem razões válidas. Não há justificativas sérias diante do acaso, daí surgirá a dúvida, a falta de sentido, o sentimento do absurdo continuará presente para Camus, "Sí, el hombre es su propio fin. Y es su único fin." O homem absurdo em Camus sabe que não pode justificar-se a si próprio, não há nada para justificar.
Na falta de sentido que calculam para atribuirem à vida, os dois filósofos não são pessimistas, apresentam suas respostas para sair do absurdo. Sartre propõe a liberdade para concedermos sentido à existência, e Camus e nos versos do poema, o valor da vida é a própria vida. É possível ver que o valor da vida está nela mesma, em viver e sentir toda sua gratuidade, demonstro o quanto é evidente esta semelhança entre Camus e no poema visto num pequeno verso deste "há só um caminho para a vida, que é a vida...".
Camus vai evocar a noção de esperança, referindo-se às tentativas de dar propósito para a vida, afirmando que todas as várias opções são ilusões, o absurdo não é eliminável. Diante de tantas possibilidades de propósitos e escolhas, que não podem ser regra, são arbitrárias, não há projetos específicos que possam ser levados a sério, por mais relevantes que sejam e proporcionarem sentido à vida de quem os vive. O fato é que, para Camus o sentido da vida não pode ser dado por algo fora dela. Nada é tão sério quanto à vida mesma, nenhum projeto seria genuíno suficiente para lhe conferir sentido, o mundo continuará indiferente frente a todos estes. Percebo que no poema aqui citado está em conformidade com o pensamento de Camus, quando diz da indiferença da natureza aos nossos sentidos dados que gera raiva no poeta, e no filósofo virá depois algo numa outra obra que se possa associar O homem Revoltado. Vejamos nos versos:
Raiva, espuma, a imensidão que não cabe no meu lenço,
A cadela a uivar de noite,
O tanque da quinta a passear à roda da minha insônia,
O bosque como foi à tarde, quando lá passeamos, a rosa,
A madeixa indiferente, o musgo, os pinheiros,
Toda a raiva de não conter isto tudo, de não deter isto tudo,
Uma das facetas do absurdo é perceber a nossa irrelevância perante o mundo. Então porque se engajar em qualquer projeto arbitrário? Pergunta Camus. Sentir o absurdo é perceber que não conferimos nenhum sentido legítimo e verdadeiro ao nos engajarmos no que propomos realizar. Os recortes que fazemos da realidade justificando nossas escolhas são todos sem critérios realmente aplicáveis perante o absurdo, assim perdem-se os conceitos e todos os sentidos em razões injustificáveis, já que permanece a arbitrariedade das escolhas.
A ideia de Camus e Sartre é apresentar exemplos para que compartilhemos o sentimento do absurdo em todas as interações sociais como uma espécie de afastamento para perguntarmos o porquê de fazermos tais escolhas. Propondo um modo de olhar para o mundo, e após observá-lo e não encontrar sentido, indo ao encontro do sentimento do absurdo que não é negativo. Uma vez que o mundo é desprovido de sentido, e mesmo assim tentamos atribuir, visualizar algum sentido, todo recorte da realidade é completamente contingente. O modo como nós construímos o mundo é totalmente facultativo, Roquentin deduz que poderia ser completamente diferente do que é, os tais recortes que criamos. Encontramos a liberdade em Sartre, por perceber que na falta de sentido, somos livres para dar sentido ao mundo e às nossas vidas, já que ao criarmos não estamos condicionados a nenhum. Sartre conduz uma cadeia de argumentos que culminam na possibilidade de construir o mundo da forma que preferirmos, há liberdade para tal. Sua teoria ali iniciada pode ser vista como uma sugestão para uma construção social, incitando ao revolucionário. Mas não se trata de cair num comportamento revoltado, que Camus vai desenvolver posteriormente já comentado aqui. Sartre sugere uma construção que pode ser realizada por todos, para reconfigurarmos o modo que damos sentido ao mundo, poderia se dizer de uma proposta de uma revolução ontológica.
Ao desenvolver a noção, que é ao mesmo tempo sentimento, o absurdo em O mito de Sisífo Camus diz que as explicações da realidade não nos retiram do absurdo, e que o sentido está nas próprias imagens dadas pela vida, confrontadas com qualquer significação que atribuímos, dito em suas palavras:
Pensar no es unificar, hacer familiar la apariencia bajo el rostro de un gran principio. Pensar es aprender de nuevo a ver, dirigir la propia conciencia, hacer de cada imagen un lugar privilegiado. Dicho de otro modo, la fenomenología se niega a explicar el mundo, quiere ser solamente una descripción de lo vivido. Coincide con el pensamiento absurdo de su afirmación inicial de que no hay verdad, sino solamente verdades. Desde el viento de la tarde hasta esta mano que se apoya en mi hombro, cada cosa tiene su verdad. (CAMUS, p.23)

A verdade é a própria vida, não o que é dito, é o vivido. Contrário a Sartre, que propõe mudanças ao atribuir sentidos, ou seja justificações da vida em sentidos e situações, para Camus, julgar o mundo é intenção do homem que tem como fim se direcionar nele, notando que os fatos não são afetados por nossa significação dada. Nada nos isola do absurdo, tal atitude é uma forma de tentar resolver o caos que é a realidade. Todos os problemas que nos colocamos para resolver, somente existem na condição de ser homem, se fossemos outros animais, estaríamos em maior conexão com o mundo, não teríamos problemas filosóficos, nem necessidade de explicar a realidade. Vemos semelhanças a este argumento nos versos do poeta:
Fui educado pela Imaginação,
Viajei pela mão dela sempre,
Amei, odiei, falei, pensei sempre por isso,
E todos os dias têm essa janela por diante,
E todas as horas parecem minhas dessa maneira.
Somos homens e agimos como tal, estamos compartilhando o mundo e nossa significação. O mundo nos é nosso dessa maneira, como parece supor o poeta. A consciência que temos da realidade é a tensão entre o que é fazer parte do mundo e a tentativa de compreendê-lo. Em nossa finita dimensão humana, o poeta assim diz: "Assisto a tudo e definitivamente" e também lidará com a nossa necessidade de explicar o mundo em outros versos, como:

Ó fome abstrata das coisas, cio impotente dos momentos,
Orgia intelectual de sentir a vida!
A ânsia de sentir abstratamente, intelectualmente o mundo, o racional se pondo a prova. A revolta, que surgirá em Camus, nasce quando há a busca incessante de conferir algum sentido e a permanente limitação do presente. Conflitivamente, assim se busca alguma resolução para o problema do absurdo, ou apenas o aceita. Cito-o:
En la medida en que imaginaba una finalidad en su vida, se supeditaba a las exigencias de un propósito que había de alcanzar y se convertía en esclavo de su libertad. Así, ya no podré obrar sino como el padre de familia (o el ingeniero, o el conductor de pueblos, o el supernumerario de correos) que me dispongo a ser. Creo que puedo elegir ser esto en vez de otra cosa. Lo creo inconscientemente, es cierto. (CAMUS, p.30)

A liberdade de escolha para Sartre, em Camus não existe, é também uma prisão tal escolha. Em sua análise, Camus diz que diante do conhecimento que a vida não tem sentido algum, o suicídio aparece como alternativa diante o absurdo, colocado a partir da única pergunta que o autor considera importante, que é se a vida vale ou não a pena, presente também no poema de Álvaro:
Seja o que for, era melhor não ter nascido,
Porque, de tão interessante que é a todos os momentos,
A vida chega a doer, a enjoar, a cortar, a roçar, a ranger,
A dar vontade de dar gritos, de dar pulos, de ficar no chão, de sair
Para fora de todas as casas, de todas as lógicas e de todas as sacadas,
E ir ser selvagem para a morte entre árvores e esquecimentos,
Entre tombos, e perigos e ausência de amanhãs,
E tudo isto devia ser qualquer outra coisa mais parecida com o que eu penso,
Com o que eu penso ou sinto, que eu nem sei qual é, ó vida.
Em outro momento, outra resposta do poeta sobre a vida:
Acenderam as luzes, cai a noite, a vida substitui-se.
Seja de que maneira for, é preciso continuar a viver.
Em resposta, se a vida vale à pena, Camus diz que nem mesmo Galileu defendeu sua verdade quando sua vida estava em perigo. O suicídio é uma tentativa certa de eliminar o absurdo, retirando-se do desafio. O autor demonstra no exemplo de Kirilov, personagem do grande romance Os possessos de Dostoiévsky, que decidido a se matar, e tornar-se deus por que este já não mais existe, então poderia se retirar da vida para demonstrar que é livre. Porém, foi demonstrado que sua atitude não pôde ser séria, pois nada é tão importante quanto à vida. Camus aponta a obra de Fiodor Dostoiévsky como um exemplo da percepção do absurdo, e diz que nesta é colocado muitas vezes a pergunta se a vida vale à pena ou não. A vida não precisa de um sentido para ser vivida, e o suicídio é responder que não vale à pena. É saltar para fora do absurdo, uma covardia diante deste, numa relação direta com o sentimento de lidar com a crise e não poder retirar da realidade sentido algum. É aí que Camus vai aconselhar a revolta na obra já citada, e desta forma, sugerir como colocar-se à disposição de enfrentar o absurdo, sabendo da impossibilidade de conseguir aplacá-lo. Não saberia se posso atribuir o sentimento de revolta presente nos versos de Álvaro, como vimos, muitas vezes diz de sentir raiva, outras amor absoluto, enfim, aposto numa outra resposta que há no poema à única pergunta relevante para Camus: "Assim como não gosto da vida, mas gosto de senti-la..." Talvez, nos versos do poeta, este nos diz também que o que vale a pena é mesmo o contingente, na falta de sentido ou significado, o mais importante é tudo o que se pode sentir. O que alimenta sua poesia mostra o contingente de como o mundo nos aparece, mais o sentimento do absurdo e "A impossibilidade de exprimir todos os sentimentos".
O homem está acostumado a viver, diz Camus, antes, muito mesmo de começar a pensar. E talvez por raciocínios, chegaríamos à conclusão de que a vida não vale pena. Mas a lógica não abarca o que é a realidade, simplesmente ordena nossos pensamentos, na experiência da realidade não há unidade alguma. As representações não nos dizem respeito do que é a realidade, simulam apenas, fingem. As análises e busca de linearidade nas razões não são válidas. Camus diz que as verdades estão em cada imagem, contexto, o que perpassa o poema. As ideias dizem apenas do homem, falam de um universo metafísico que criamos, dessa "orgia intelectual" citada num verso do poema. Deixemos que o poeta nos fale sobre este conflito:
Sinto na minha cabeça a velocidade de giro da terra,
E todos os países e todas as pessoas giram dentro de mim,
Centrífuga ânsia, raiva de ir por os ares até aos astros
Bate pancadas de encontro ao interior do meu crânio,
Põe-me alfinetes vendados por toda a consciência do meu corpo,
Faz-me levantar-me mil vezes e dirigir-me para Abstrato,
Para inencontrável, Ali sem restrições nenhumas,
A Meta invisível — todos os pontos onde eu não estou — e ao mesmo tempo ...
O metafísico se refere ao mundo também, está em relação, mas ao mesmo tempo não está, como diz o poeta. Está no mundo com os homens. Conhece-se o homem a partir de sua história, mas não conhecemos um homem especificamente, mesmo que o vejamos sempre. E tampouco a poesia de Pessoa poderá ser decifrada por deduções lógicas. Camus parte para um ponto em comum a Sartre, não podemos sequer deduzir os homens, e o verdadeiro conhecimento é impossível, podemos ver a realidade, podemos apenas descrevê-la. Defendo que também assim o faz o poeta, partindo da subjetividade para a universalidade. Com linguagem tão livre para lidar e criar símbolos é a linguagem poética, e capaz de ressignificá-los. Por outro lado é uma poesia que diz do mundo, da existência, Barbaras explica que a obra de Pessoa é uma resposta à pergunta : como falar do mundo como totalidade, como existência pura? O mundo é para ser sentido para o poeta, a necessidade de interpretação é uma necessidade humana. A explicação então, que audácia. Camus desenha num exemplo, que podemos acordar e perceber não conhecer a mulher que amamos durante anos, tampouco poderíamos ter algum conhecimento da realidade. O tempo nos assusta, mas resolve o absurdo, pois nos encaminha para o fim de nossa condição, nos versos de Pessoa se mostra tal inquietação da presença constante do sentimento do absurdo na existência:
Assim fico, fico... Eu sou o que sempre quer partir,
E fica sempre, fica sempre, fica sempre,
Até à morte fica, mesmo que parta, fica, fica, fica...
Existir é permanecer no absurdo, até morte a sua certeza "mesmo que parta, fica". Nenhum sentido humano pode se encaixar como uma verdadeira descrição da realidade, esta não se afeta por qualquer significação. Talvez o melhor que podemos fazer, e que assim o poeta faz, é descrever como percebemos a existência, sentindo-a. Os vários modelos, ou formas de conferir sentido à vida que diz Camus, somente demonstram a luta incessante que travamos ao lidar com o absurdo. Desta forma, adquirimos consciência que nossas esperanças são apenas um consolo, para que vejamos alguma linearidade e compreensão, em relação aos fatos no mundo e nossa existência. É forçosamente necessário, o intuito de assumir o controle do discurso da realidade, o que é impossível, por isto Camus afirma a inutilidade de criarmos sentido. Deixemos que o poeta nos fale desta incapacidade da razão, da obscuridade de nossas tentativas de explicar o mundo:
Rola, bola grande, formigueiro de consciências, terra,
Rola, auroreada, entardecida, a prumo sob sóis, noturna,
Rola no espaço abstrato, na noite mal iluminada realmente
Rola ...
A pequenez das consciências, a sociedade um formigueiro, sob o sol ou noite, o espaço abstrato continuará mal iluminado pela razão que se esforça por ver. O mundo não pode ser percebido a partir de nenhuma significação, seja psicológica, romântica, artística, lógica racional, ou até mesmo irracional, que Camus diz ser a perspectiva religiosa. Oferece-nos exemplos comuns como uma vida don-juanesca, uma forma de hedonismo, que será rejeitada, entre outras que o autor desenvolve em O mito de Sísifo. A questão é que, nenhuma ideia ou prática, diz como seria o certo modo de compreender a realidade, ou se engajar nela, estamos apenas em cada cenário, diria Camus, nosso poeta nos mostraria. É o mundo que desperta nossa alegria de vivermos, descrevendo e compreendendo cada privilegio que se segue em estar vivo. Contemplando as multifacetas da experiência, de forma tão singular e contingente, com o olhar isento de aspectos psicológicos e metafísicos, que Camus diz serem aspectos das duas verdades do pensar, na tentativa de explicar o que vemos, que o poeta nos fale que não podemos explicar o mundo, podemos vê-lo, senti-lo:
Eu, sinto que ficou fora do que imaginei tudo o que quis,
Que embora eu quisesse tudo, tudo me faltou.
Cavalgada alada de mim por cima de todas as coisas,
Cavalgada estalada de mim por baixo de todas as coisas,
Cavalgada alada e estalada de mim por causa de todas as coisas ...
Cavalgada desmantelada por cima de todos os cimos,
Cavalgada desarticulada por baixo de todos os poços,
Cavalgada vôo, cavalgada seta, cavalgada pensamento-relâmpago,
Cavalgada eu, cavalgada eu, cavalgada o universo — eu.
Helahoho-o-o-o-o-o-o-o ...
O que há são apenas relatos de percepção, de descrição da imagem do que vemos, e assim pensamos que somos. Para o poeta, ser é existir, sentir, não é pensar, mas sua poesia é também pensamento, consciência do sentir.
Camus aponta para Sisífo, da mitologia grega, como o herói do absurdo, na imagem do mito ele é condenado ao inferno a carregar inutilmente uma pedra montanha acima, mesmo esta rolando de volta montanha abaixo, assim infinitamente. Compreender o absurdo é saber que todo o nosso trabalho é inútil, depois de encerrados na ausência de sentido. Sisífo antes de morrer, pôs tudo à prova, os deuses, o amor de sua mulher. Já no inferno, quis voltar a terra, obviamente, viu que preferia a vida, e "pero cuando volvió a ver el rostro de este mundo, a gustar del agua y del sol, de las piedras cálidas y del mar, ya no quiso volver a la oscuridad infernal."Obrigado a retornar para o inferno, Sisífo, vai realizar a tarefa interminável sem significado. Camus se diz interessado no momento que a pedra rola montanha abaixo e ele deve buscá-la novamente, é aí que ele pensa, é dita hora da consciência. Essa tomada de consciência é um triunfo para Camus, a tragicidade de nossa história é quando tomamos alguma consciência dela. Assim, Camus vê Sisífo abarcar o termo que vai desenvolver posteriormente, a do homem revoltado, pois sabe de sua circunstância, tem consciência de sua condição. Desta forma poderá lançar-se em vários modos de sentir a vida, sempre o apelo à felicidade se contrapondo à tristeza. Por outro lado, Camus diz que a felicidade se relaciona com o absurdo, Sisífo é feliz aos seus olhos, mesmo com todo o fardo absurdo, pois há um mundo que não lhe parece inútil, e a luta, o esforço lhe é suficiente.

Toda la alegría silenciosa de Sísifo consiste en eso. Su destino le pertenece. Su
roca es su cosa. Del mismo modo, el hombre absurdo, cuando contempla su
tormento, hace callar a todos los ídolos. (CAMUS, p. 61)

Enfim, nosso poeta, em seu último verso, podemos ver nossa capacidade de persistir e resistir, buscando aderência à realidade pelo sentir, ressalta o movimento, o nosso entrelaçamento tão friccionado, tensionado pela exploração do mundo:

Meu ser elástico, mola, agulha, trepidação ...






















Sâmara Costa –
Universidade Federal de Minas Gerais

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