O aeroporto e suas funções na cidade contemporânea: o caso do Aeroporto Internacional André Franco Montoro

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INSTITUTO FEDEREAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DE SÃO PAULO VITOR MARTINS GONÇALVES

O AEROPORTO E SUAS FUNÇÕES NA CIDADE CONTEMPORÂNEA: O CASO DO AEROPORTO INTERNACIONAL ANDRÉ FRANCO MONTORO

São Paulo 2015

VITOR MARTINS GONÇALVES

O AEROPORTO E SUAS FUNÇÕES NA CIDADE CONTEMPORÂNEA: O CASO DO AEROPORTO INTERNACIONAL ANDRÉ FRANCO MONTORO

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito básico à obtenção do título de especialista

em

Aeroportos



Projeto

e

Construção. Orientadora: Prof.ª Dr.ª Sandra Regina Casagrande de Moraes

São Paulo 2015

G63a

Gonçalves, Vitor Martins. O aeroporto e suas funções na cidade contemporânea: o caso do Aeroporto Internacional André Franco Montoro / Vitor Martins Gonçalves. São Paulo: [s.n.], 2015. 87 f.: il. Orientadora: Profª. Dra. Sandra Regina Casagrande de Moraes. Monografia (Pós-graduação Lato Sensu em Aeroportos – Ênfase em projeto e construção) - Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo, IFSP, 2015. 1. Aeroportos 2. Urbanismo 3. Infraestrutura de transporte 4. Globalização I. Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo II. Título

CDU 656.7

DEDICO ESTE TRABALHO À Minha companheira de todas as horas e para toda a vida, Tainá Maiara Farias, com quem compartilho as motivações, paixões e questionamentos que me conduziram a este estudo. Minha mãe Magda Rincon Martins e meu pai Luiz Carlos Gonçalves, que me proporcionaram a educação e o suporte que hoje me permitem caminhar com meus próprios pés. Meus irmãos Tatiana Martins Gonçalves e Vinicius Martins Gonçalves que, justamente por discordarmos uns dos outros em muitos aspectos da vida, desde muito novos, me ensinaram a questionar e embasar minhas argumentações e me ensinaram, deste modo, a beleza da pluralidade. Minha orientadora Prof.ª Dr.ª Sandra Regina Casagrande de Moraes, pela maturidade e tranquilidade com que me conduziu pelo percurso que resultou nas páginas que seguem.

“A divisão internacional do trabalho significa que alguns países se especializam em ganhar e outros em perder.” GALEANO, Eduardo (2014, p.17)

RESUMO O estudo que segue busca compreender a função social que os aeroportos exercem nas cidades contemporâneas, tomando como estudo de caso a relação que o Aeroporto Internacional André Franco Montoro – anteriormente conhecido como Aeroporto Internacional de São Paulo/Guarulhos – localizado na cidade de Guarulhos, possui com a Região Metropolitana de São Paulo – RMSP. O faz através de uma análise da dinâmica socioeconômica das cidades, desde as primeiras civilizações até as megacidades do século XXI, buscando características que ligam as primeiras trocas comerciais entre campo e cidade ao abrangente capitalismo globalizado.

Palavras-chave: Aeroportos, Urbanismo, Infraestrutura de Transporte, Globalização.

ABSTRACT The study that follows seeks to understand the social function of airports in contemporary cities, using as case study the relationship that André Franco Montoro International Airport - previously known as São Paulo / Guarulhos International Airport - located in the city of Guarulhos, has with the Metropolitan Region of São Paulo. It is done by an analysis of the socio-economic dynamics of cities, from the earliest civilizations to the megacities of the century, looking for features that connect the first trade between country and city to the global capitalism.

Keywords: Airports, Urban Planning, Transport Infrastructure, Globalization.

SUMÁRIO 1-INTRODUÇÃO.................................................................................................................. 1 1.1 OBJETIVOS..........................................................................................................1 1.1.1 Objetivo Geral.......................................................................................................... 1 1.1.2 Objetivos Específicos...............................................................................................2

1.2 JUSTIFICATIVA......................................................................................................2 1.3 PÚBLICO ALVO.....................................................................................................3 1.4 ABRANGÊNCIA.....................................................................................................3 2-O MUNDO EM URBANIZAÇÃO........................................................................................4 2.1 NA AURORA DAS CIDADES SURGEM AS REDES........................................................6 2.2 GLOBALIZAÇÃO: AMPLIAÇÃO DA REDE AO NÍVEL GLOBAL..........................................9 2.3 ECONOMIA: FORÇA MOTRIZ DA GLOBALIZAÇÃO.....................................................16 2.4 A TEORIA DA ACUMULAÇÃO E A GLOBALIZAÇÃO DA RACIONALIZAÇÃO.......................20 3-AS CIDADES NA GLOBALIZAÇÃO...............................................................................26 3.1 INFRAESTRUTURA DE TRANSPORTE NAS CIDADES CONTEMPORÂNEAS....................37 3.2 FUNÇÕES TÉCNICAS E ECONÔMICAS DOS AEROPORTOS........................................38 3.3 FUNÇÕES SOCIAIS, IDEOLÓGICAS E POLÍTICAS DOS AEROPORTOS..........................43 4-O CASO DO AEROPORTO INTERNACIONAL ANDRÉ FRANCO MONTORO.............47 4.1 A AVIAÇÃO CIVIL NO BRASIL.................................................................................47 4.2 A INDUSTRIALIZAÇÃO DE GUARULHOS E A CONSTRUÇÃO DO AEROPORTO INTERNACIONAL ANDRÉ FRANCO MONTORO..........................................................................49 4.3 INDICADORES SOCIAIS DE GUARULHOS, DA REGIÃO METROPOLITANA DE SÃO PAULO E DO

ESTADO DE SÃO PAULO...............................................................................................54 4.4 A DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL DAS VULNERABILIDADES SOCIAIS E O AEROPORTO.........61

5-CONCLUSÃO.................................................................................................................. 67 6-BIBLIOGRAFIA............................................................................................................... 68

LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Evolução da taxa de urbanização mundial..................................................4 Figura 2 – Evolução mundial das populações urbana e rural, de 1950 até 2050 (projeção).......................................................................................................................5 Figura 3 – Planificação encontrada em tábua na região da cidade Suméria de Nipur.. .......................................................................................................................................6 Figura 4 – Mapa do velho mundo, incluindo o mundo conhecido pelos Europeus até então: Europa, África e Ásia. Produzido por Fra Mauro entre 1497 e 1459...............11 Figura 5 – Mapa de 1570, produzido por Abraham Ortelius, já incluindo as Américas. .....................................................................................................................................12 Figura 6 – Port de mer avec la villa Médicis, de Claude Lorrain................................15 Figura 7 – Globalização por Guille 3691. Economia baseada em empresas privadas transnacionais.............................................................................................................19 Figura 8 – Incidência de favelas urbanas em porcentagem.......................................23 Figura 9 – Porcentagem de imigrantes sobre a população total................................24 Figura 10 – Acumulação da fração das cidades e zonas urbanas mais ricas no Produto Interno Bruto – PIB Mundial..........................................................................29 Figura 11 – San Cristobel slums, Lima, Peru..............................................................36 Figura 12 – Christ the Redeemer (O Cristo Redentor) looks out over the favela.......36 Figura 13 – Conexões aéreas globais........................................................................37 Figura 14 – Distritos de Guarulhos.............................................................................50 Figura 15 – Região Metropolitana de São Paulo – RMSP. ........................................51 Figura 16 – Evolução da expansão urbana de Guarulhos..........................................53 Figura 17 – Localização das favelas e construções precárias de Guarulhos............55 Figura 18 – IPVS por quantidade populacional dos municípios.................................59 Figura 19 – V1 – Residem em domicílio com serviços inadequados de infraestrutura.. .....................................................................................................................................64 Figura 20 – V2 – Renda familiar per capita igual ou inferior a ¼ do salário mínimo.. 65 Figura 21 – V3 – Famílias em situação de Extrema Pobreza renda per capita de até R$70,00.......................................................................................................................65 Figura 22 – V4 – Responsável com menos de 4 anos de estudo..............................66 Figura 23 – V5 – Mulher chefe de família com filhos até 15 anos..............................66

LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Evolução da taxa de urbanização brasileira................................................5 Tabela 2 – Importância econômica das cidades em relação ao tamanho de sua população....................................................................................................................32 Tabela 3 – Evolução das favelas em Guarulhos.........................................................56 Tabela 4 – Evolução do IDH em Guarulhos................................................................56 Tabela 5 – Grupos do Índice Paulista de Vulnerabilidade Social................................57 Tabela 6 – Evolução do Índice Paulista de Vulnerabilidade Social de Guarulhos......57 Tabela 7 – Evolução do Índice Paulista de Vulnerabilidade Social.............................58 Tabela 8 – Índice Paulista de Vulnerabilidade Social do Município de São Paulo.....59 Tabela 9 – Critérios adotados para formação dos grupos de município do IPRS......61 Tabela 10 – Cinco maiores casos de Vulnerabilidade Social em Guarulhos - 2013.. 62

LISTA DE ABREVIAÇÕES ALESP

Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo

BNDE

Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico

IBGE

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IDH

Índices de Desenvolvimento Humano

IPRS

Índice Paulista de Responsabilidade Social

IPVS

Índice Paulista de Vulnerabilidade Social

ONU

Organização das Nações Unidas

PIB

Produto Interno Bruto

RMSP

Região Metropolitana de São Paulo

SEADE

Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados

VASP

Viação Aérea São Paulo

1- INTRODUÇÃO Confunde-se a relação de causa e consequência entre as cidades e os equipamentos de transporte, de conexões com outras cidades, outras regiões, outros países e continentes. Tanto a cidade nasce e se desenvolve como ponto de cruzamento de diversos fluxos – de mercadorias, pessoas, mensagens – como gera, ela própria a necessidades de outros fluxos, demandando a criação de equipamentos específicos para esta finalidade. Essa jornada inicia-se com as primeiras estradas, passando pelos portos – que possibilitam as navegações e marcam o ponto onde finda o solo firme e inicia-se o desconhecido – depois as estações e linhas ferroviárias e, mais recentemente os terminais aeroportuários, ou simplesmente aeroportos. Sempre obras de grande empreitada e que exigem grande criatividade por sua natureza própria de enfrentar o desconhecido, o distante. As características e funções sociais que os equipamentos de transporte, com ênfase nos aeroportos, desempenham na sociedade globalizada/globalizante, especialmente no século XX e neste início de século XXI são analisadas nesta pesquisa.

1.1 OBJETIVOS 1.1.1 Objetivo Geral

Este trabalho visa analisar como se dá a relação destes equipamentos, espaços de fluxos (CASTELLS, 1999), de dimensões e capacidade de transporte cada vez maiores, com as cidades e regiões em que eles estão inseridos e exercem influência. Regiões estas que, a despeito de incluírem um grande equipamento de transporte em seus limites, não deixam de ser o local onde habitam, trabalham, estudam, vivem pessoas para as quais a vida não necessariamente possui a mesma escala dos seus vizinhos, os aeroportos.

1

1.1.2 Objetivos Específicos

Analisar: 1. A

dinâmica

das

cidades,

desde

seu

nascimento

até

a

contemporaneidade. 2. As principais características da cidade contemporânea. 3. Qual a função desempenhada pelos aeroportos nestas cidades, ou, se mais de uma função, quais essas funções. 4. Como se articulam as funções e características supracitadas no caso do Aeroporto Internacional André Franco Montoro e do município de Guarulhos.

1.2 JUSTIFICATIVA Sendo o aeroporto objeto deste estudo o mais importante de toda a América do Sul e a cidade que o abriga a nona mais rica do sétimo país mais rico do mundo, seria plausível imaginar que os indicadores de qualidade de vida – incluindo aí renda, saúde e educação – da população guarulhense apresentassem bons níveis. Porém, em verdade, estes indicadores, como será mostrado neste estudo, bons não são. A percepção de baixos níveis de qualidade de vida em áreas próximas ou muito próximas a um equipamento infraestrutural tão importante para a economia brasileira, como é o caso do Aeroporto Internacional André Franco Montoro, analisada

junto

a

crescente

economia

dos

países

desenvolvidos

e

em

desenvolvimento, exige explicações para a disparidade de tantos viverem em condições inadequadas – muitas vezes na ilegalidade, inclusive – em ambientes que movimentam tantos recursos. Essa disparidade não pode ser considerada um fenômeno natural e motivou este estudo.

2

1.3 PÚBLICO ALVO Este trabalho destina-se a arquitetos, urbanistas, cientistas sociais, geógrafos, gestores de cidades e de aeroportos e organizações de moradores de bairros e cidades que abrigam aeroportos.

1.4 ABRANGÊNCIA O presente trabalho visa analisar a função social e econômica dos aeroportos nas cidades e regiões metropolitanas dos séculos XX e primórdios do XXI. A análise se dá sobre o pano de fundo da sociedade globalizada e em intensificação da globalização do capitalismo tardio – ou neocapitalismo (DERRIDA, 1994, p.58), sem focar em políticas públicas ou gestões específicas, entendendo as cidades como a expressão

espacial

da

sociedade

(CASTELLS,

1999,

p.499),

buscou-se

compreender a dinâmica entre as cidades, desde sua origem, a relação do modo de produção atual com estas para, por último, identificar como o aeroporto se insere nessa lógica maior que apenas a do equipamento de transporte. Analisou-se também um caso concreto – o Aeroporto Internacional André Franco Montoro e a cidade de Guarulhos/Região Metropolitana de São Paulo (RMSP) – para identificação das características gerais na materialidade de um exemplo concreto.

3

2- O MUNDO EM URBANIZAÇÃO Segundo dados da Organização das Nações Unidas – ONU (Figura 1) no ano de 2010 50,6% da população mundial vivia em cidades (UN-HABITAT, 2008), no Brasil (IBGE, 2011, p.45) no mesmo ano este número era de 84,4% (Tabela 1). Mas, o que representam estes números? A despeito das incontáveis diversidades entre os locais que o ser humano habita para análises amplas estes se classificam entre duas categorias: urbanos e não-urbanos. A fração do total de 100% da quantidade de pessoas que habitam zonas urbanas é chamada taxa de urbanização e quando, em alguma região, esta representa a maior fração do total, ou seja, quando ultrapassa os 50%, tal região é considerada “urbana”. Logo, pode-se concluir pelos números supracitados que o mundo, hoje, é urbano. Além de já urbano o mundo está se urbanizando: cada vez mais e mais pessoas, tanto em números absolutos quanto em proporção, vivem nas cidades. De acordo com previsão da ONU em 2030, as pessoas serão maioria nas cidades em todas as regiões do mundo (Figura 2) incluindo as hoje menos urbanizadas África e Ásia, chegando à taxa de urbanização mundial de 70% em 2050 (UN-HABITAT, 2008, p.VIII).

Figura 1 – Evolução da taxa de urbanização mundial. Disponível Consultado em 19 de novembro de 2014, 21h00min.

em:

Claro que previsões não podem ser tratadas como realidades certas no futuro, uma vez que eventos imprevisíveis podem alterar estes valores, porém diferentes estudos apontam para o crescimento da urbanização no mundo de modo que

será

assumido

estas

previsões

como

cenário

de

referência

para

desenvolvimento deste trabalho. Ora, como o mundo já é urbano e tente a se 4

urbanizar mais, procurar compreender a dinâmica entre cidades e a dinâmica nas cidades é fundamental – mais do que ontem e menos do que amanhã – para analisar os possíveis caminhos da humanidade, ao menos para as primeiras décadas do século XXI. Quais diferenças estruturais a urbanização do mundo representa para o ser humano? As pessoas vivem mais próximas, mais adensadas, em construções mais caras e maiores, porém confinadas em casas e apartamentos menores. Alteram-se as relações familiares e sociais, as relações comerciais e produtivas. Porém, a variação de dois fatores interessa mais, neste estudo: as dinâmicas e hierarquias territoriais, tanto nas relações campo-cidade, quanto nas relações cidade-cidade. A importância destes itens para a compreensão dos aeroportos ficará mais evidente no decorrer do trabalho. Tabela 1 – Evolução da taxa de urbanização brasileira.

URBANA

RURAL

URBANA

RURAL

(absoluto)

(absoluto)

(percentual)

(percentual)

160.925.792

29.830.007

84,36

15,64

Região Norte

11.664.509

4.199.945

73,53

26,47

Região Nordeste

38.821.246

14.260.704

73,13

26,87

Região Sudeste

74.696.178

5.668.232

92,95

7,05

Região Sul

23.260.896

4.125.995

84,93

15,07

Região Norte

12.482.963

1.575.131

88,79

11,21

Brasil

FONTE: Disponível em: Consultado em 19 de novembro de 2014, 21h19min.

Figura 2 – Evolução mundial das populações urbana e rural, de 1950 até 2050 (projeção). Com no gráfico disponível em: Consultado em 21 de novembro de 2014, 23h00min.

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2.1 Na aurora das cidades surgem as redes Historicamente, a cidade nasce da transformação da aldeia, “quando a indústria e os serviços já não são executados pelas pessoas que cultivam a terra, mas por outras que não tem esta obrigação” (BENEVOLO, 1997, p.23). O que possibilitou a ocupação de pessoas e instrumentos em atividades não ligadas ao trabalho da terra, à produção de alimentos e extração de matéria-prima? Segundo Leonardo Benevolo (1997, p.23), esta desobrigação do trabalho da terra, por parte da sociedade, surge – de acordo com os documentos disponíveis – na Mesopotâmia e se deve à existência de excedente na produção no campo, resultado da agricultura, que mantém, além dos trabalhadores da terra, os habitantes da cidade. Beneficiada pela distribuição do excedente da produção rural, livre das obrigações de trabalho da terra, a cidade foi palco de transformações sociais mais rápidas. Ainda segundo o mesmo autor, na cidade desenvolvem-se a indústria e os serviços que, por sua vez, aplicando seus avanços no campo, possibilitaram o aumento da produção rural. Neste cenário, as diferentes atividades marcam também as diferenças entre grupos sociais: de um lado a cidade abriga a classe dominante que exerce autoridade sobre o campo, do outro lado, com sua classe de trabalhadores subordinados aos primeiros (Figura 3).

Figura 3 – Planificação encontrada em tábua na região da cidade Suméria de Nipur. (BENEVOLO, 1997, p.26).

6

Não será abordada nesse trabalho a questão de dominação ou apropriação da produção na relação campo-cidade, e sim somente destacar a divisão das atividades em duas tipologias de lugares distintos: o campo que trabalha a terra e extrai matéria-prima da natureza, e a cidade que administra, consome, transforma e – o que interessa destacar aqui – comercializa a produção. Faz mais sentido falar sobre a cidade no plural – as cidades – do que no singular, pois esta entidade não é autônoma. Para estudar a dinâmica das cidades é necessário, portanto, estudar a(s) rede(s)

que

as

incluem.

Se,

de

acordo

com

Paul

Singer,

a

cidade,

independentemente de ser uma única ou uma rede destas, não é nunca autossuficiente, pois “não pode produzir nem os alimentos para sua população nem a matéria-prima para sua indústria.” (SINGER, 1995, p.141), logo, não pode existir sem relação de troca ou de domínio com o campo, assim como necessita de relações de troca ou de poder com outras cidades, para vender e comprar produtos e serviços. Do campo importa-se matéria prima e alimentos, bens para consumo interno e bens a serem transformados pela indústria, e vendidos a outras cidades, ou mesmo vendidos de volta para o campo. Sobre certa perspectiva, a cidade é a expressão física desta estrutura comercial. Da diferença dos valores entre o que importa e o que exporta, determina-se a capacidade da cidade se sustentar e crescer, ou seja, de continuar comprando do campo e de outras cidades, produzindo serviços e bens industrializados para serem consumidos e vendidos. Paul Singer, em Economia Política da Urbanização (1995), expõe a estrutura comercial das cidades: A relação entre as atividades de exportação e as de consumo interno no seio da economia urbana são bastante complexas. Como a cidade não é autossuficiente, o seu tamanho é, em última análise, determinado pela sua “capacidade de importar”, que resulta primordialmente do valor de sua exportação. Se este for elevado, o nível de renda é alto, o que geralmente atrai imigrantes, acarretando o aumento da população e, consequentemente, o desenvolvimento das atividades de consumo interno. Como, no entanto, a distinção entre os dois tipos de atividade é bastante abstrata (a não ser em casos extremos), pois a cidade em geral exporta excedentes de sua produção para o consumo interno, o seu crescimento pode alimentar sua exportação constituindo-se deste modo um processo cumulativo de crescimento (SINGER, 1995, p.143).

Portanto, ainda segundo o mesmo autor (1995, p.143) importação e exportação de bens e serviços são partes de um processo cumulativo de crescimento das cidades. Cumulativo porque retroalimentado. Como supracitado, a 7

cidade não produz alimentos nem matéria-prima, logo “seu tamanho [ou o tamanho de sua população] é, em última análise, determinado pela sua capacidade de importar”. Já sua capacidade de importar depende do poder de compra da cidade que é determinado “pelo valor de sua exportação”, pelo excedente de sua produção interna. Quanto maior é esse valor de exportação, maiores tendem a ser as oportunidades de trabalho o que acelera o crescimento de sua população por atrair imigrantes. Se fossem desconsideradas restrições ao crescimento, como por exemplo, falta de espaço nas cidades, migrações, fome, guerras, etc., o crescimento de determinada cidade em determinado intervalo de tempo poderia ser considerado proporcional a si mesmo, exponencial (LEITE, SILVA, SOUZA, 2011). Espaço urbano é aquele que, portanto, se insere entre a produção e o escoamento desta, ponto nodal em um sistema em rede que vive da troca e, se estas trocas de bens e serviços configuram, em grande medida, o motivo de ser das cidades, a ampliação dos mercados torna-se imperativo para o crescimento econômico e combustível para a aceleração da dinâmica social por exercer pressão para o aumento da produção, tanto nos campos quanto nas cidades. A “expansão dos mercados” segundo Leo Huberman, “constituiu sempre um dos incentivos mais fortes à atividade econômica” (1983, p.99), pois “só se fabrica ou cultiva além da necessidade de consumo quando há uma procura firme. Quando não há essa procura, não há incentivo à produção de excedentes” (1983, p.26). Os equipamentos necessários para existência, manutenção e ampliação do transporte de mercadorias e pessoas (prestadores de serviço e autoridades) assumem importância central para a sociedade. Estradas e portos tornam-se catalisadores do crescimento econômico das redes urbanas. Expandir mercados, aumentar fluxos de bens de consumo e pessoas, demandam, além do aumento da produção, aumento dos equipamentos de transporte. Se por carroça, aumento de estradas; se por barcos, aumento de portos. Antes de prosseguir, porém, será necessário uma definição de rede adequada ao estudo das cidades e da função de seus equipamentos de fluxo. Por identificar funções distintas a pontos nodais e arcos de transmissão com clareza, será adotado aqui a definição que uma rede é:

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[...] toda infraestrutura, permitindo o transporte de matéria, de energia ou de informação, e que se inscreve sobre um território onde se caracteriza pela topologia dos seus pontos de acesso ou pontos terminais, seus arcos de transmissão, seus nós de bifurcação ou de comunicação (CURRIE apud. SANTOS, 2009, p.262).

Esta definição interessa aqui por entender que a matéria formadora de uma rede é a infraestrutura que a possibilita, e esta é caracterizada pela relação entre seus pontos nodais. Para ilustrar, segundo esta definição, no caso de duas aglomerações, uma cidade e outra rural, conectadas por uma estrada, podemos considerar que a rede é formada pela estrada e pelos veículos que possibilitam o transporte de carga pela estrada; e caracterizada pela relação de troca de bens de consumo e serviços, resultante da dependência que a cidade possui dos alimentos e matéria-prima que o campo produz, e dos serviços especializados e bens industrializados que o campo importa da cidade para aumentar sua produção.

2.2 Globalização: ampliação da rede ao nível global Mesmo dependente da produção do campo, as cidades crescem e se transformam mais rapidamente do que o campo (BENEVOLO, 1997, p.26) fazendo desses locais onde os fluxos são a razão de existir, moradias fixas para um número crescente de pessoas. Considerando a estrutura economia das cidades conforme definida por Paul Singer (1995), a sociedade urbana só existe “em rede”, a urbanização do mundo amplia a tendência à conectividade entre as partes. Esse aumento de conectividade, impulsionado pelo imperativo do crescimento dos mercados, não pressupõe paz entre as partes, multilateralismo, tão pouco pressupõe benefícios a todos os envolvidos. A colonização das Américas e de grandes áreas da costa da África, durante a expansão marítima da Europa (FERREIRA, PIMENTA, PAULA, SILVA, TAKAMI, 2008), é um exemplo de como a ampliação dos mercados e a criação de novos arcos de transmissão pode ser imposta e baseada em relações de dominação ou exploração, em vez de realizada por interesse de todas as partes da rede. Como citado no início deste capítulo, o mundo está se urbanizando, alçando a nível global a característica das cidades de expansão das conexões comerciais em um fenômeno – ou diversos fenômenos – conhecido sobre diversos aspectos como Globalização. 9

Provavelmente um dos termos que mais possui significados distintos e mais alimenta opiniões divergentes, à Globalização são atribuídas histórias diferentes, características diferentes e benefícios e malefícios diferentes. Podem-se destacar algumas características que indicam a já citada não necessária vantagem a todos os envolvidos para a ampliação da rede a nível global, como, por exemplo, a visão de Anthony Giddens de que a globalização é “dirigida pelo Ocidente” e pautada “pelo poderia político e econômico dos Estados Unidos” (GIDDENS, 2006, p.17), produzindo enormes desigualdades. Para esse autor o fenômeno de ampliação da rede vai além do crescimento das relações comerciais entre regiões do mundo, influenciando a vida comum dos indivíduos, as concepções de família, a cultura dos povos e o mundo ainda debate o que, exatamente, é globalização e se esse é um fenômeno novo ou não. Por exemplo, para David Harvey (2006, p.8) o termo ganhou destaque nos últimos vinte anos – isto dito em um texto publicado originalmente em 1996 – substituindo em muitas análises conceitos como imperialismo, colonialismo e neocolonialismo como ferramentas para “organizar o pensamento”; enquanto para outros autores a globalização foi iniciada por Portugal com a Expansão Marítima (Figuras 4 e 5) e colonização das Américas e costa da África (RODRIGUES, DEVEZAS, 2009). Outros ainda consideram que a Expansão Marítima trata-se da Primeira Globalização, e a globalização do fim do século XX seria a Segunda Globalização.

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Figura 4 – Mapa do velho mundo, incluindo o mundo conhecido pelos Europeus até então: Europa, África e Ásia. Produzido por Fra Mauro entre 1457 e 1459. A orientação norte/sul está invertida, com o sul acima e o norte na parte de baixo do mapa. (MAURO, 1459)

Assim como Rodrigues e Devezas, para alguns pensadores – chamados por Giddens de céticos – “a economia global não é assim tão diferente do que existia em períodos antecedentes” (2006, p.20). Seja nas últimas décadas, seja nos últimos séculos, as civilizações vêm expandido sua rede comercial e política, negociando ou dominando povos e regiões do mundo, fazendo com que esse fenômeno seja compreendido não como uma variação qualitativa, mas sim como uma variação de escala da sociedade. Para aqueles classificados como radicais por Giddens (2006, p.20) a globalização, além de ser um fenômeno novo e real, espalha seus efeitos em todas as partes do mundo, enfraquecendo as fronteiras entres as nações. Para eles a força crescente das trocas comerciais, da velocidade e dos capitais estrangeiros enfraqueceu, inclusive, o próprio Estado, uma vez que os grandes agentes privados podem desestabilizar economias inteiras movimentando enormes quantias de capital rapidamente, diminuindo a capacidades dos Estados tanto de produzir soluções para seus problemas, como inclusive a produção dos problemas fica cada dia mais dependente de fatores externos. Portanto, se para alguns a Globalização é uma 11

ampliação de uma estrutura secular, para outros ela representa uma alteração de paradigma, em que inclusive a hierarquia de influência dos agentes sociais é modificada.

Figura 5 – Mapa de 1570, produzido por Abraham Ortelius, já incluindo as Américas. (ORTELIUS, 1570)

Não há, contudo, uma continuidade inabalada da estrutura econômica das cidades mesopotâmicas aos nossos dias. Apesar do imperativo da expansão dos mercados ter fomentado a criação e ampliação de redes comerciais desde as primeiras civilizações, conforme exposto por Benévolo (1997) e Singer (1995), no mundo ocidental, durante o enorme período histórico denominado Idade Média o pensamento econômico, determinado – como diversas áreas do conhecimento humano à época – pelo pensamento escolástico cunhado na Igreja, que condenava moralmente o lucro como finalidade da produção e do comércio. Segundo Rossetti (1988, p.84), desde o início da Idade Média o comércio ocupa papel secundário na estrutura social, e a produção de bens é, principalmente, destinada ao consumo interno. A partir do século XI um forte crescimento demográfico impulsiona, com o aumento da mão de obra, a produtividade e o comércio exterior ganha força, especialmente para a venda de tecidos, acelerando o desenvolvimento das cidades.

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Para esse autor ainda (1988, pp.86-87), o crescimento da importância das cidades, dos artesãos produtores e dos comerciantes na transição da Idade Média para a Idade Moderna – época das grandes navegações – diminuiu a importância da Igreja no pensamento econômico, reduzindo as “restrições dos escolásticos ao comércio e ao lucro”, e o Estado se consolidou como centralizador da riqueza. Nasce desta estrutura um novo pensamento econômico posteriormente conhecido como mercantilismo que seria caracterizado pela valorização dos Estados e a busca desse por acumulação de riquezas, especialmente metais preciosos: quanto mais metais preciosos acumulados, estocados, mais rica era considerada uma nação. Já para Pierre Deyon (2001), nenhum pensador do período denominado mercantilista – entre os séculos XVI e XVIII – utilizou o termo para si, tampouco a pluralidade de pensamento e práticas econômicas satisfaria a classificação a que foram posteriormente inseridos. Porém, com as colonias advindas das grandes navegações, os mercados são expandidos em oferta de matéria-prima, de força de trabalho e de consumo de manufaturas. O comércio exterior teria como objetivo último exportar mais em valor do que importar e o excedente “deveria ser recebido não em mercadorias, mas em lingotes de ouro e prata” (ROSSETTI, 1988, p.87), retomando a dinâmica de expansão dos mercados das civilizações da antiguidade. Os portos substituem os muros feudais como paradigma das cidades (Figura 6). A função das colônias de Portugal e Espanha era, alinhado com o pensamento mercantilista, fornecer metais preciosos para serem acumulados e, também, matéria-prima para ser comercializada – em outras regiões do mundo – em troca desses mesmos metais. A expansão mercantilista insere América e África majoritariamente como fornecedores – ainda que as colonias também tivessem de importar manufaturados dos colonizadores – de modo a não lucrarem com a compra e venda de bens de consumo que disputam o jogo da acumulação na rede: para os colonizados só é dada a opção de perder. Na

França,

as

crescentes

tensões

entre

os

produtores

industriais

incomodados com privilégios e monopólios concedidos à nobreza, a enorme maioria da população que vivia na pobreza, e a monarquia decadente, resultaram em críticas ao mercantilismo absolutista do Estado, confeccionando escolas de pensamento econômico pautadas por outros princípios, a começar com os 13

fisiocratas e, com François Quesnay, “seu principal representante” (CORAZZA, 1985): escola esta baseada “no liberalismo e individualismo” (ROSSETTI, 1988, p.90). Segundo Corazza (1985, p.16) para o pensamento fisiocrata “o trabalho agrícola é o único produtivo, porque tem a capacidade de gerar esse excedente, que é apropriado, num primeiro instante, pelos proprietários da terra” além de já identificar classes sociais por sua posição na produção, divindindo a sociedade em três classes: produtiva, propretária e estéril. O Estado não é convidado, porém a intervir nesta divisão de classes. Para Rossetti (1988, pp.87-89), por exemplo, esses classificavam a regulamentação por parte do Estado como antinatural e, portanto, indesejável. Para esse autor ainda, a Inglaterra do mesmo período vivia uma revolução nos métodos de produção proporcionada por grandes avanços científicos denominada Revolução Industrial. Nesse ambiente é publicado A Riqueza das Nações, de Adam Smith (2010), que inaugura a Escola Clássica de Economia, que segundo Corazza (1985, p.22) tratava a economia como ciência de um estadista para ampliação da riqueza e poder de uma nação, tendo como principais fatores dessa riqueza e desse poder a divisão do trabalho e a acumulação de capital. Já para Rossetti, (1988, pp.91-92), esse pensamento era, assim como a fisiocracia, baseado na liberdade de mercado e no individualismo, deslocando o foco da acumulação de metais preciosos pelo Estado, para a democratização do acesso a melhores condições de vida para toda a população de uma nação, com a diferença dos fisiocratas de não considerar as atividades agrícolas superiores às industriais, o que fez os primeiros a considerarem como a principal atividade econômica.

14

Figura 6 – Port de mer avec la villa Médicis de Claude Lorrain, óleo sobre tela de 1638. (LORRAIN, 1638).

Com a evolução do racionalismo e empirismo, cunhados nos séculos anteriores, o século XVIII viveu o apogeu da crença na razão com o Iluminismo (CHASSOT, 1994, p.114) como corrente de pensamento laica que via um caminho de progresso contínuo às atividades humanas, vindo a ser base de seus pensamentos econômicos liberais que acreditavam que, com a liberdade de mercado, ao longo do tempo todos os problemas se resolveriam racionalmente e conduziriam ao progresso geral da humanidade. Com os fisiocratas e a escola clássica, a economia alcançou status de ciência e deu base teórica para o capitalismo efervescente da Revolução Industrial. Este breve histórico do pensamento econômico é importante para identificar as características que produziram e estão no centro do sistema econômico responsável pela ampliação das conexões comerciais a nível global: o Capitalismo.

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2.3 Economia: força motriz da globalização É frequentemente publicado que esse fenômeno não é apenas econômico, mas sim uma complexa trama de fatores, culturais, sociais e, também, econômicos, “uma revolução global na vida corrente, cujas consequências se estão a fazer sentir em todo o mundo, em todos os domínios, do local do trabalho à política” (GIDDENS, 2006, p.24). Segundo Ianni (2001, pp.13-15), “a descoberta de que a terra se tornou mundo, de que o globo não é mais apenas uma figura astronômica” produziu uma alteração no modo de perceber e “fabular” o mundo e uma enorme variação de conceitos, de “metáforas da globalização” surgiu para explicar o mundo do século XX, alguns dos quais estudados aqui, uns com abordagens culturais, outros com abordagens políticas e outros com abordagens econômicas. Dentre os mais divulgados se encontra o conceito de “aldeia global”, cunhado por Herbert Marshall McLuhan que acreditava “que as novas tecnologias de informação e de comunicação transformariam o mundo em uma enorme aldeia” (TREMBLAY, 2003, p.18). A palavra aldeia, aparentemente paradoxal por ser tão contraditória com o crescimento dos centros urbanos e com os avanços tecnológicos do fenômeno de que trata – a globalização – não é usada aleatoriamente. A contradição entre o fenômeno e o conceito retira parte da carga negativa que poderia ser associada ao controle concentrado nos países ricos ocidentais, apagando a possibilidade de a desigualdade poder influenciar os caminhos do mundo em globalização. Segundo o mesmo autor, a palavra aldeia: [...] refere-se ao estereótipo do lugar calmo e agradável situado em um ambiente idílico, sem barulho nem poluição, onde vivem em harmonia, amor e amizade os membros de uma pequena comunidade solidária. (TREMBLAY, 2003, pp.18-19).

Conceitos como “aldeia global” que abordam a globalização a partir das trocas culturais ou dos avanços nas tecnologias da comunicação inserem os benefícios mais visíveis da globalização como forças motrizes, levando a crer, segundo IANNI (2001, p.16) que “são ocasionados pela técnica e, neste caso, pela eletrônica”, o que, se não anula, ao menos minimiza os problemas, tratando-os como passageiros e que serão superados com o tempo, e que isso se dará bem rápido, “em pouco tempo” em todas “as províncias, nações e regiões, bem como 16

culturas e civilizações”, todas reunidas nesse grande pacto global, compondo um cenário otimista em parte relacionado com o racionalismo dos séculos que gestaram o capitalismo, utilizando-se de um conceito que: [..] sugere que, afinal, formou-se a comunidade mundial, concretizada com as realizações e as possibilidades de comunicação, informação e fabulação abertas pela eletrônica Sugere que está em curso a harmonização e a homogeneização progressivas. (IANNI, 2001, p.16).

Para não confundir as diversas partes de um fenômeno tão complexo é importante discernir entre setores afetados pela globalização e setores propulsores desta, estando, para Giddens (2006, p.25), a economia “entre as forças propulsoras” do fenômeno. As alterações culturais nos países afetados impactados não podem ser analisadas como causa, mas também não como fenômenos “a parte” que ocorreriam independentemente da expansão das conexões comerciais movidos apenas pela vontade de misturar diferentes culturas. Discurso esse que tem a capacidade de naturalizar um fenômeno construído – e, como já citado, propulsionado especialmente por interesses econômicos – traduzindo algo tão complexo e que possui incontáveis atores em uma marcha homogênea em direção única à evolução social ampla e irrestrita. Esse trabalho não visa negar a existência de trocas culturais riquíssimas nem classificá-las como negativas apenas, caindo em um discurso ideologizado sobre a globalização que denuncia os malefícios e omite os benefícios. Tampouco visa desconsiderar a importância dos avanços tecnológicos para a configuração e expansão da globalização, colocando a tecnologia como meramente subordinada a interesses econômicos, cedendo a uma concepção hierárquica simplista. O objetivo aqui da distinção entre as partes do fenômeno é justamente – identificando os diferentes agentes, as diferentes causas e diferentes consequências em diferentes partes do mundo – evitar os discursos ideologizados que a glorificam tanto quantos os que a condenam indiscriminadamente. Reconhecendo que a análise é limitada pela “não determinação” dos fenômenos sociais, a tentativa é identificar quais as forças que impulsionam a globalização e quais as características dos agentes que representam estas forças para caracterizar a própria globalização. Lembrando a distinção já citada entre uma rede (a infraestrutura), e que é “caracteriza pela topologia dos seus pontos” (CURRIE apud. SANTOS, 2009, p.262). 17

Tanto a troca cultural não pode ser considerada propulsora da enorme expansão das conexões globais que, para Giddens (2006, p.24), esta é, inclusive, “a razão que leva ao reaparecimento das identidades culturais em diversas partes do mundo”, fortalecendo movimentos nacionalistas em resposta ao enfraquecimento dos Estados e de culturas nacionais. Ou seja, em diversas ocasiões diferentes regiões do globo buscaram e ainda buscam resistir à pressão pela planificação do mundo, tanto criando barreiras econômicas quanto culturais. Assim como as ações não são, necessariamente, homogêneas a nível global, as reações locais também não. Nações podem se posicionar favoráveis à globalização instalando suas empresas em outros países, ou vendendo produtos e serviços para o mundo ao mesmo tempo em que se utilizam de protecionismo fiscal para defender suas empresas da concorrência externa. Portanto, a globalização é econômica, política, social e cultural, porém as pautas econômicas possuem maior protagonismo do que as pautas culturais e sociais; sendo que alguns atores econômicos ganham mais influência que outros. Por exemplo, para o historiador Eric J. E. Hobsbawm (2008), a economia da globalização é especialmente caracterizada por empresas privadas transnacionais (Figura 7) que ganham em tamanho e influência a cada novo canto mundo que é “globalizado”: Temos uma economia mundial em rápida globalização, baseada em empresas privadas transnacionais que se esforçam ao máximo para viver fora do alcance das leis e dos impostos do Estado, o que limita fortemente a capacidade dos governos, mesmo os mais poderosos, de controlar as economias nacionais. (HOBSBAWM, 2008, p.41).

Não se deve ceder ao simplismo de considerar as características de um fenômeno global como determinísticas, ou seja, que se trata de um projeto detalhado, seguido à risca pelos agentes sociais e que, por exemplo, todas as nações e entidades privadas caminhem de acordo com esse projeto. A globalização deve ser analisada como um fenômeno probabilístico, no qual as características indicam tendências que guiam uns mais e outros menos, os agentes sociais em conjunto. Manuel Castells expõe tanto o protagonismo das empresas privadas quanto relativiza as características da globalização: As verdadeiras unidades de comércio não são países, porém empresas, e redes de empresas. Isso não significa que todas as empresas atuem mundialmente. Mas quer dizer que a meta estratégica das empresas, grandes e pequenas, é comercializar onde for possível em todo o mundo,

18

tanto diretamente como através de suas conexões com redes que operam no mercado mundial. (CASTELLS, 1999, p.156).

Figura 7 – Globalização por Guille 3691 (em tradução livre). Economia baseada em empresas privadas transnacionais. (EFFERVESCENT ME, [2012?])

De modo que, segundo o mesmo autor, dada à velocidade com que aumenta a fração população mundial que vive em cidades, hoje, (Figuras 1 e 2) a sociedade passa a ser analisada, globalmente, como “sociedade em rede”.

19

2.4 A teoria da acumulação e a globalização da racionalização Retomando a posição de Paul Singer (1995) sobre a dinâmica das cidades, que necessitam da expansão de mercados para alimentar sua própria expansão, será analisado o papel da acumulação capitalista para produzir a globalização. Baseando-se nas ideias sobre ampliação dos mercados como força propulsora das conexões entre regiões cada vez mais distantes do globo, é fácil ceder à tentação de acusar que, por trás de todo movimento expansivo está a ganância de querer cada vez mais e até a arrogância dos acumuladores a julgarem ter o direito de acumular mais. Não seria sensato, porém, creditar às características pessoais a essência de um fenômeno que cruzou séculos e continentes e foi proporcionado por diversos povos distintos, tampouco seria suficiente para abordar o enorme aumento de velocidade e intensidade das conexões comerciais proporcionados pelo capitalismo. Com a divisão social do trabalho e com a revolução industrial a capacidade de produção aumentou vertiginosamente. Usando o mesmo exemplo que Adam Smith inicia o clássico “Riqueza das Nações” (SMITH, 2010, pp.18-19), a divisão do trabalho possibilitou que dez homens trabalhando em fases distintas da fabricação de alfinetes, usando maquinário adequado produzissem juntos, aproximadamente, quarenta e oito mil unidades; enquanto artesanalmente um homem poderia produzir no máximo vinte alfinetes por dia: um aumento de, no mínimo, duzentas e quarenta vezes na produtividade desse setor. Porém o aumento da produtividade não representou uma redução de duzentas e quarenta vezes na carga horária de trabalho dos produtores de alfinete, mas sim um aumento da produção e da renda de quem investiu capital na produção. O exemplo é semelhante a incontáveis situações em que novas tecnologias ou gestões mais eficientes aumentam a capacidade produtiva de indústrias e serviços, mas o excedente não foi convertido em redução de trabalho, mas sim em aumento da produção e redução do custo de produção. O aumento da produtividade, tanto pela redução de custos, quanto pelo aumento da comercialização, visa à acumulação de capital como lucro pelo capital investido. Porém, como supracitado, não se trata apenas de cobiça ou qualquer outro sentimento individual passível de crítica moral: o imperativo da acumulação de capital “não se origina da cobiça inerente do capitalista, mas surge nas forças 20

inteiramente independentes da vontade individual do capitalista.” (HARVEY, 2005, p.42), trata-se de uma necessidade crescente do capitalista aumentar sua competitividade em uma corrida com outros capitalistas que também investem seu capital acumulado em escala progressiva para aumentar a produtividade: [...] o desenvolvimento da produção capitalista faz do contínuo aumento do capital investido numa empresa industrial uma necessidade e a concorrência impõe a todo capitalista individual as leis imanentes do modo de produção capitalista como leis coercitivas externas. Obriga-o a ampliar seu capital continuamente para conservá-lo, e ampliá-lo ele só o pode mediante acumulação progressiva. (MARX, 1996, vol.2, p.225).

A concorrência levando ao crescimento da produção exerce pressão para aumentar os mercados, a fim de ser comercializada. Com diferentes produtores concorrentes entre si visando aumentar sua produtividade – e fazê-lo mais rapidamente que os outros, um dado mercado tende a ser saturado relativamente rápido, portanto a produção nos moldes do capitalismo necessita constantemente expandir suas fronteiras físicas ou sociais para prosperar. Ao capitalista cabe a lógica de acumular capital por meio do lucro, trabalho não pago, e investir esse capital no processo produtivo com finalidade de aumentar a produção e consequentemente aumentar a acumulação de capital advindos também do trabalho não

pago,

sucessivamente

e

progressivamente

(LIMA,

2009,

pp.2-3).

Competitividade pressiona capitalistas a reorganizarem seus locais de produção, mas também o impelem a buscar territórios ainda não saturados por sua lógica produtiva, em uma lógica produtiva que ou aumenta sua intensidade em um local já “colonizado” ou “coloniza” novos, sempre com o mesmo objetivo: Se envia capital para o exterior, isso não ocorre porque ele não poderia ser empregado no próprio país. Ocorre porque ele pode ser empregado no exterior a uma taxa de lucro mais elevada. (MARX, 1996, vol.3, p.193).

A produção deve criar mercados a fim de evitar uma crise de superprodução ou de falta de condições para realização da produção, em um processo retroalimentado “de circulação entre produção e realização” (HARVEY, 2005, p.71) em que “não só a produção é imediatamente consumo e o consumo, imediatamente produção; (...) mas cada qual cria o outro à medida que se realiza” (MARX, 2011, p.67). Esse processo crescente de concorrência e criação de novos mercados e condições de produção leva à expansão do modo de produção capitalista para cada vez mais novos territórios; porém a produção capitalista necessita de certas condições para 21

que possa se realizar, como: “a existência de um excedente de mão-de-obra [...] que pode alimentar a expansão da produção, (...) a existência no mercado de quantidades necessárias (ou oportunidades de obtenção) de meios de produção (...) a existência de mercado para absorver as quantidades crescentes de mercadorias produzidas” (HARVEY, 2005, pp.42-43). Ao modo de produção capitalista não é dada a possibilidade de estagnação ou de estabilidade inabalável dos níveis, modos e recursos para produção: O capitalismo gera suas próprias crises. Em outras palavras, a sociedade capitalista tem como contradição inerente o fato de que a capacidade de reprodução ampliada do capital (objetivo da produção) é obstruída pelo próprio sistema econômico posto em funcionamento. (LIMA, 2009, p.8)

Segundo Harvey (2005, pp.42-43) a inexistência de quantidades suficientes de um dos itens anteriormente citados pode levar a uma crise, portanto deve ser considerados “mecanismos” para criar estas condições quando necessário. Para o aumento da força de trabalho, devem existir condições de “estímulo ao crescimento populacional, a geração de correntes migratória” ou aumento da produtividade dos indivíduos, possibilitando contratação de menos trabalhadores. As crises inevitáveis teriam, nesta dinâmica, a função de racionalizar o processo, uma vez que rearticulam os recursos, os modos de produção, os salários e os mercados para possibilitar um novo ciclo para a acumulação se realizar: Ou seja, quando o sistema tenta sanar uma dificuldade intrínseca, superar uma barreira posta por ele mesmo, o resultado é que ele adia o problema e o coloca em base mais ampla, pois a produção é acrescida e a contradição é reforçada. (LIMA, 2009, p.8).

Como mecanismos para aumentar a oferta dos meios de produção citados por David Harvey como “máquinas, matérias-primas, infra-estrutura física [e outros] que possibilitam a expansão da produção conforme o capital é reinvestido” (2005, p.42) está a possibilidade de transformação dos terrenos físicos para que sejam adequados à lógica de produção capitalista, assim como a de acréscimo da força de trabalho quando necessário, seja pela inclusão de grupos sociais novos na produção capitalista – como foi a inserção de crianças nas fábricas durante a revolução industrial – ou com o estímulo a fluxos migratórios intensos como os que podem ser identificados nas Figuras 8 e 9, fluindo dos países mais pobres para os mais ricos, tal qual uma osmose em que solutos (países) distintos possuem distintos níveis de saturação (ocupação) de sua força de trabalho. Do mesmo modo – dentre os 22

mecanismos para aumento dos mercados para absorver o excedente da produção – está a possibilidade de transformação do terreno social para criar novas necessidades e desejos de consumo, pois “O problema surge quando o consumo não é suficiente para realizar a produção crescente.” (LIMA, 2009, p.9). O modo de produção vigente, portanto, necessita produzir e reproduzir constantemente suas próprias

condições

para

sustentar-se:

“[...]

nas

economias

capitalistas

desenvolvidas, a oferta da força de trabalho, a oferta dos meios de produção e da infra-estrutura, e a oferta da demanda são todas produzidas.” (HARVEY, 2005, p.43). Expandem-se mercados e capitais investidos simultaneamente à expansão das transformações físicas e sociais, em um ciclo que, em resumo, expande a adequação dos territórios à lógica capitalista de produção sem limites reais à vista, pois toda insuficiência de condições ou é superada pela criação de novas condições, ou produz uma crise que reorganizará o mercado através da busca da racionalização dos processos.

Figura 8 – Incidência de favelas urbanas em 2001, em porcentagem. (UN-HABITAT, 2004).

23

Figura 9 – Porcentagem de imigrantes sobre a população total em 2000, em porcentagem. (UN-HABITAT, 2004).

Se “desde o princípio, o processo de desenvolvimento do capitalismo é simultaneamente um processo de racionalização” (IANNI, 2001, p.145) e como supracitado a expansão dos mercados conduz a transformações dos terrenos físicos e sociais em que se inserem também a racionalização – como característica inerente ao capitalismo – insere-se nas mais diversas esferas da sociedade: racionalizam-se as relações e os espaços, os recursos e as instituições. Lembrando que uma rede “se caracteriza pela topologia dos seus pontos” (CURRIE apud. SANTOS, 2009, p.262) a racionalização característica do capitalismo insere-se – movida pela expansão contínua que resulta da acumulação progressiva – em todas as esferas da rede, tornando-se característica desta. O capitalismo produz com sua expansão o “desenvolvimento de formas racionais de organização das atividades sociais em geral [...] da fábrica à escola, da agência do poder estatal à família” (IANNI, 2001, p.145-146). Em suma, um processo que tem início pela necessidade da acumulação progressiva pela concorrência acaba por introduzir a racionalização como característica dominante até de atividades não necessariamente produtivas; reforçando que os interesses econômicos são a força motriz principal da globalização expansível e em constante alteração:

24

O processo de acumulação origina a tendência da penetração das relações sociais capitalistas em todos os aspectos da produção e da troca, e em todo o mundo. (HARVEY, 2005, p.61).

Ainda segundo o mesmo autor: A acumulação é o motor cuja potência aumenta no modo de produção capitalista. O sistema capitalista é, portanto muito dinâmico e inevitavelmente expansível: esse sistema cria uma força permanentemente revolucionária que, incessante e constantemente, reforma o mundo em que vivemos. O estado estacionário de reprodução simples é, para Marx, logicamente incompatível com o modo capitalista de produção. (HARVEY, 2005, p.41).

25

3- AS CIDADES NA GLOBALIZAÇÃO Durante o século XX o mundo viu sua população triplicar, seu território político cindir-se em dois grandes blocos, guerras devastadoras eclodirem, e um conjunto de revoluções nas tecnologias de transporte e comunicação que “praticamente anulou o tempo e a distância” (HOBSBAWM, 1995, p.22). Um século que, de acordo com Emir Sader (2000, p.8) “combinou desenvolvimento tecnológico com concentração de renda, debilitamento dos laços de sociabilidade com hegemonia dos grandes meios audiovisuais de caráter monopólico”. O mundo do final do século era quantitativamente e qualitativamente diferente do mundo de seu início, tendo “deixado de ser eurocêntrico” após um processo de declínio do protagonismo econômico e populacional (reduzindo de um terço para um sexto sua participação na população mundial) do continente que “ainda [era] centro inquestionado de poder, riqueza, intelecto e civilização ocidental quando o século começou” (HOBSBAWM, 1995, p.23). Além disso, e mais impactante, segundo o mesmo autor ainda, o mundo se viu configurado como “uma unidade operacional única [...] notadamente em questões econômicas” de modo que “economias nacionais", definidas pelas políticas de

Estados

territoriais,

estão

reduzidas

a

complicações

das

atividades

transnacionais”. Houve um deslocamento dos centros de poder do Velho Mundo (Europa) para o Novo Mundo (Estados Unidos da América – EUA) e também dos Estados para as empresas transnacionais. A queda da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas – URSS, o enfraquecimento dos movimentos sindicais “enfraqueceram o desafio histórico do capitalismo” (CASTELLS, 1999, p.39); porém de um capitalismo em transformação, revolucionado pelas novas tecnologias de comunicação

que

poderiam

transmitir

ordens

e

informações

praticamente

instantaneamente, o capitalismo baseado nas empresas pode descentralizar atividades a fim de otimizar recursos, reduzir custos ou acelerar processos. Segundo Sader (2000, p.8): O século XX se anunciava como século do socialismo e termina com a consolidação da hegemonia do capitalismo, e em sua forma mais selvagem – ideologia norte-americana, neoliberalismo econômico, dominação do capital especulativo, do consumismo, do egoísmo, da predação ambiental.

O protagonismo dos mercados, sua crescente influência sobre os Estados, um ambiente de pano de fundo de disputas em que cada parte se esforça para ser mais 26

atraente ao capital estrangeiro, e certo descrédito no estadismo, permitiram que os mercados financeiros fossem desregulamentados e direitos sociais fossem drasticamente reduzidos (CASTELLS, 1999, p.39). O otimismo desenfreado na racionalidade do livre mercado ganha novo fôlego, em um renascimento das crenças do pensamento econômico clássico. A infraestrutura de transportes e comunicações é a rede global dos nossos dias e a lógica dos mercados seu paradigma. Esse cenário, porém, se desenhava com a industrialização do século XIX e do início do século XX, quando nascem boa parte dos grandes avanços tecnológicos que mudariam o tipo de vida desejado durante o século XX: Com a fotografia, o rádio, o telefone, o cinema, o carro, a lâmpada, estavam dadas as invenções fundamentais para o tipo de vida que se considerou de bem-estar ao longo do século XX. A elas se somariam logo depois o avião e, mais tarde, a televisão e o computador, além dos vários aparelhos domésticos, para complementar o tipo de vida do final do século XX. (SADER, 2000, p.121)

Um novo produto passa a dominar conceitualmente a economia global do final do século XX: a informação. Informação, esta palavra que pode ser vaga ou abrangente sempre foi fundamental para as trocas comerciais e relações de poder, mas o que diferencia sua posição atualmente é que ela deixou de ser apenas uma parte da produção para tornar-se “o produto do processo produtivo”, ou seja, “os produtos das novas indústrias de tecnologia da informação são dispositivos de processamento de informações ou o próprio processamento de informações” (CASTELLS, 1999, pp.119-120). Como produto a informação passa a demandar condições para que seja comercializado, tanto o desenvolvimento de uma indústria de ponta quanto à implantação de infraestrutura necessária para transmitir informação. A importância da informação é tamanha para Castells que a competitividade de “empresas, regiões ou nações” é determinada pela eficiência com que estas gerenciam a informação nesta economia em que, para esse autor: [...] a produtividade e a competitividade de unidades ou agentes [...] dependem basicamente de sua capacidade de gerar processar e aplicar de forma eficiente a informação baseada em conhecimento. (CASTELLS, 1999, p.119)

Nesse cenário, analogamente às primeiras cidades conhecidas, as cidades contemporâneas são o local de desenvolvimento, fortalecimento e protagonismo, por excelência, na rede global empresarial que vem sendo produzida pela expansão 27

capitalista em todo o mundo; e a acumulação progressiva de capital pelos que detém (e investem) mais capital também se verifica em escala maior: a acumulação/concentração espacial de capital das cidades – alinhado com a estrutura econômica supracitada definida por Paul Singer (1995, p.143) – “constituindo-se deste modo um processo cumulativo de crescimento” (Figura 10). Paradoxalmente

fala-se

em

dois

fenômenos

espaciais

desta

economia

informacional: 1) descentralização das atividades comerciais, produtivas e seus centros de controle, baseado justamente nas novas tecnologias de informação e comunicação, que permitem o gerenciamento à distância de operações comerciais e enormes movimentações de investimento quase que instantaneamente; e 2) concentração das grandes empresas em centros urbanos estratégicos cada vez mais densos e mais importantes pra economia mundial. O primeiro fenômeno produziria uma redução na procura e densidade dos grandes centros urbanos, pois seria possível manter as atividades empresariais sem arcar com os altos custos do valor dos imóveis urbanos e sem os malefícios da poluição e demais problemas das grandes cidades. O segundo fenômeno, por outro lado, indica um crescimento das desigualdades globais, uma vez que os grandes capitais estariam sediados nas cidades mais importantes. Saskia Sassen (2005) identificou algumas características desses dois fenômenos – dispersão das atividades e concentração das empresas em um número relativamente pequeno de grandes cidades – que os ligam, desfazendo a aparente contradição inicial. Por exemplo, o aumento de operações em diferentes locais do globo, junto ao aumento da interação entre as partes da rede, produz significativo aumento da complexidade da gestão destas atividades, aumentando a importância de centros de decisão estratégica.

28

Figura 10 – Acumulação da fração das cidades e zonas urbanas mais ricas no Produto Interno Bruto – PIB Mundial. (UN-HABITAT, 2008).

Esta complexidade comporta em si a exigência da concentração de um grande número de funcionários altamente qualificados em sedes bem localizadas assim como a contratação de serviços altamente especializados de outras empresas – também resultantes do aumento da complexidade das atividades gerenciais. Segundo a mesma autora, estas empresas – demandadas e terceirizadas – tenderiam a se concentrar em locais de referência, próximas umas das outras: […] the geographic dispersal of economic activities that marks globalization, along with the simultaneous integration of such geographically dispersed activities, is a key factor feeding the growth and importance of central corporate functions. The more dispersed a firm's operations across different countries, the more complex and strategic its central functions—that is, the work of managing, coordinating, servicing, financing a firm's network of operations. […] these central functions become so complex that increasingly the headquarters of large global firms outsource them: they buy a share of their central functions from highly specialized service firms—accounting, legal, public relations, programming, telecommunications, and other such services. (SASSEN, 2005, p.28).

Por abrigar grande parte das sedes das maiores empresas do mundo – especialmente privadas – estas cidades seriam, então os centros urbanos mais influentes do mundo globalizado, onde são tomadas decisões e enviadas ordens e 29

informações que influenciam todo o mundo globalizado: as chamadas Cidades Globais. Estas se caracterizariam, ainda por serem os grandes centros do terceiro setor da economia, movidas principalmente pelo mercado financeiro e por grandes firmas prestadoras de serviço especializado: Sassen favorece um paradigma que enfatiza a produção das finanças e dos serviços avançados, não apenas enquanto categoria residual da produção industrial, mas particularmente como uma atividade em si própria (KOULIOUMBA, 2002, p.31).

Além das demandas de gestão, a crescente interação entre atividades que ocorrem em diferentes locais do globo exige maior oferta de infraestrutura física para a realização das trocas de informação e transações financeiras como, por exemplo, centros de processamento de dados e cabeamento de fibra ótica – instalações onerosas cuja concentração reduz os custos de construção e manutenção. Outro fator que conduz à concentração das grades empresas em centros urbanos consolidados é a gama de serviços que esses tem a oferecer aos funcionários mais bem qualificados e remunerados destas empresas que cidades menores não tem, como, por exemplo, teatros, museus e restaurantes (SASSEN, 2012). Neste ponto cabe destacar uma diferença estrutural na análise econômica da Cidade Informacional de Castells e da Cidade Global de Sassen, considerando a primeira como “industrial” e a segunda “pós-industrial”. A visão industrial considera a dinâmica da industrialização e competitividade de determinadas regiões e a desindustrialização de outras, assim como a dinâmica de indústrias de ponta e indústrias antigas e “a redistribuição territorial do trabalho” (PRETECEILLE apud. RIBEIRO, JÚNIOR, 1997, p.69). Segundo esse autor ainda, a visão pós-industrial de Sassen considera o setor serviços – especialmente o financeiro e os necessários ao seu funcionamento – como hierarquicamente superiores aos demais setores, tido como menos influentes na economia globalizada: A visão “pós-industrial” é [...] centrada no terciário superior, com ênfases variáveis, do “modo de produção informacional” ao conjunto capital financeiro-serviços oferecidos às empresas [...] e os serviços e tecnologias que garantem o desenvolvimento e a preponderância dessas atividades, quais sejam transportes e tecnologias ligadas à circulação e ao tratamento da informação. Essa visão é construída sobre a hipótese do papel primordial desses setores em relação aos outros, em particular à produção industrial, considerada implícita ou explicitamente como ultrapassada e relegada à um papel secundário quanto à definição do dinamismo da economia e da

30

capacidade de inovação. (PRETECEILLE apud. RIBEIRO, JÚNIOR, 1997, pp.68-69).

Segundo Koulioumba (2002, p.31), Sassen classifica como Cidades Globais – que possuem as características supracitadas em comum – primeiramente Nova York, Londres e Tóquio, “centros financeiros e de negócios do mundo desenvolvido [...] mas inclui, ainda, outras cidades do mundo em desenvolvimento, tais como: São Paulo e Cidade do México”. Porém seu trabalho não aborda enfaticamente as relações entre as Cidades Globais nem entre si nem entre elas e outras cidades influentes do mundo. Retomando a concepção de que fenômenos sociais não devem ser tratados como determinísticos, especialmente quando de grandes escalas que envolvem incontáveis agentes, devemos considerar estas tendências à dispersão das atividades e à concentração das grandes empresas como [já dito] tendências. Nem todas as companhias buscarão ter sede em Nova York, nem necessariamente uma indústria de peças para processadores de informação será mais rentável que uma indústria de outro setor. Outro ponto de atenção é que a enorme complexidade dos dados permite abordagem muito diferente sobre as mesmas informações. Por exemplo, a Tabela 2 classifica cidades por ordem de importância economia em relação à sua população, sendo todas as cinco primeiras cidades latino-americanas. Se fosse considerar a participação de cada indivíduo de determinada cidade na produção de seu país, conforme indica a Tabela 2, não poderia considerar os habitantes de Nova York, Londres ou Tóquio mais influentes para seus respectivos países. Portanto a determinação dos critérios de classificação altera significativamente a hierarquia em que serão classificadas as cidades do mundo.

31

Tabela 2 – Importância econômica das cidades em relação ao tamanho de sua população.

População Região urbana, País

(A)

(B)

(em milhões) Porcentagem Porcentagem da população do PIB nacional total nacional total

Razão (B/A)

São Paulo, Brasil

17,9

8,6

36,1

4,20

Buenos Aires, Argentina

13,0

35,0

53,0

1,51

Santiago do Chile, Chile

5,5

35,6

47,4

1,33

Lima, Peru

7,9

28,1

43,1

1,53

Guayaquil, Equador

2,3

13,1

30,1

2,30

Cidade do México, México

18,7

14,2

33,6

2,37

Todas as cidades, México

-

60,1

79,7

1,33

São Salvador, El Salvador

1,4

25,8

44,1

1,71

Casablanca, Marrocos

3,6

12,1

25,1

2,07

Abidján, Cote d’Ivoire

3,3

18,1

33,1

1,83

Nairóbi, Quenia

2,6

5,2

20,1

3,87

-

11,9

30,3

2,55

11,1

6,1

16,1

2,64

-

19,9

38,9

1,95

Xangai, China

12,8

1,2

12,5

10,42

Manila, Filipinas

0,4

12,1

25,1

2,07

Bangkok, Tailândia

6,5

10,9

37,4

3,43

Moscou, Rússia

10,5

5,8

10,9

1,88

-

47,1

70,1

1,49

Todas as cidades, Quenia Karachi, Paquistão Todas as cidades, Índia

Todas as cidades, Turquía FONTE: UN-HABITAT, 2004.

Porém isto não significa que não existam centros de maior influência sobre a economia global do que outros, significa ainda menos que São Paulo e Buenos Aires são os centros urbanos mais influentes do mundo atualmente. Não se trata de desqualificar as dinâmicas e hierarquias entre as cidades determinadas pelos estudos de Sassen e Castells, mas sim de apontar para a necessidade de atenção com critérios de classificação. Grande quantidade de estudos foram produzidos ao longo da segunda metade do século XX, e ainda são, com o intuito de compreender as grandes cidades contemporâneas. Termos como megacidades, cidades mundiais e cidades globais, são frequentemente utilizados para conceituar ou idealizar cidades e seus papéis na economia mundial. Diferentes abordagens são dadas e 32

diferentes conceitos utilizados, porém algumas características destas cidades se destacam nas nos estudos sobre as cidades contemporâneas, como, por exemplo, Serem importantes sedes do poder político, as cidades mundiais vão além disso. Elas ultrapassam, pois, a rede nacional urbana, tornando-se parte de um sistema internacional. Estas cidades têm surgido a fim de possibilitar um domínio da rede metropolitana do planeta. (KOULIOUMBA, 2002, p.31)

Um conceito cunhado por Rem Koolhaas (1998, p.1248) cruza as grandes cidades contemporâneas, abrangendo características que destacam os conceitos de cidade global e cidade informacional, como a dimensão e da posição que ocupam na hierarquia econômica e política e o impacto das novas tecnologias de transporte e comunicação produzidas do século XX, especialmente os aeroportos e as telecomunicações. Esse conceito que aproxima cidades tão distantes quanto Los Angeles e São Paulo justamente por identificar que estas se aproximam mutuamente, em direção a uma estética e cultura comum as diversas grandes cidades, em um movimento para a consolidação da Cidade Genérica (1998, p.1248). Para o mesmo autor esta convergência entre as cidades contemporâneas só é possível ao custo da perda de suas identidades. Retomando alguns efeitos da globalização apontados por Giddens (2006) e Ianni (2001), a expansão das conexões comerciais produziu mesclas culturais nem sempre voluntárias por todos os agentes e que resulta, inclusive, em muitos movimentos de proteção cultural e de valorização de identidades nacionais. Em uma abordagem pouco usual, Koolhaas não cede à conotação negativa que carrega à palavra “genérica” e parte da constatação de que se esse fenômeno “ocorre em tão grande escala, deve significar algo”, mais do que apenas desvantagens aos envolvidos, deve possuir vantagens. E o contrário também é questionado por Koolhaas (1998, p.1248): “What are the disadvantages of identity, and conversely, what are the advantages of blankness?” (KOOLHAAS, 1998, p.1248). Pois se os mais influentes centros urbanos do mundo caminham nesta direção, é justa a hipótese de que deva trazer vantagens e que talvez não seja um fenômeno acidental, mas sim deliberado, ou até natural derivado da constante aceleração do crescimento populacional que tende a produzir uma assimetria na proporção entre entre presente e passado: To the extend that identity is derived from physical substance, from the historical, from contexto, from the real, we somehow cannot imagine that anything comporary – made by us – contributes to it. But the fact that humam growth is exponential implies that the past will at some point

33

become too small to be inhabited and shared by those alive. (KOOLHAAS, 1998, p.1248).

Cada vez mais e mais pessoas nascendo para dividir a mesma identidade, cada vez mais e mais turistas e migrantes entrando em contato com outras identidades, exercem pressão sobre esta que, para resistir, necessita ser forte, inabalável, apoiada firmemente sobre bases fixas e estáveis. Segundo Koolhaas, a crescente resistência que a identidade exerce para sobreviver só pode ser realizada com o custo de se tornar caricata e auto referenciável. Pensamento este que, importante destacar, naturaliza a supressão das identidades e desnaturaliza sua permanência,

sua

resistência,

colorindo

com

tons

de

ideologia

o

justo

questionamento, porém esta aprece como dedução e não como premissa. Segundo Cláudio Rezende Ribeiro (2010), Koolhaas lança – com esse conceito – uma visão sobre o futuro das cidades representado em edificações como hotéis e aeroportos (ambas fazem parte da circulação de agentes da economia globalizada): Os edifícios síntese desta cidade seriam os aeroportos e os hotéis, que cada vez mais se tornam espaços abrangentes e representantes da vida estereotipada de cada aglomeração urbana. Vale destacar que esta proposição de Koolhaas se pretende uma leitura aplicável a um espaço total, isto é, a um objeto que se constrói hoje e que representaria o futuro de todos os outros. A cidade genérica é uma espécie de germe do que está para acontecer, ela se reproduz em diversos cantos do globo criando simultaneamente sua perenidade descartável, ou ainda, a cidade genérica seria para Koolhaas uma ideia a ser alcançada, uma espécie de “revolução urbana” lefebvriana vista a partir do olhar de um arquiteto 'global'. (RIBEIRO, 2010)

A cidade genérica é, para Koolhaas, o resultado deixado pelo pensamento moderno assim que ele se esvai, assim que ele não prosperou; o encontro entre o vazio deixado pela modernidade com a hiperconectividade das telecomunicações: “The Generic City is what is left after large sections of urban life crossed over to cyberspace.” (KOOLHAAS, 1998, p. 1250). Por outro lado, quando Koolhaas identifica que identidades fortes oferecem resistência à alterações, à exposição de suas contradições oferece uma possível característica que justifica a tendência supressão das identidades locais que a globalização do capitalismo fomenta, uma vez que, retomando a teoria da acumulação, o sistema de produção capitalista que caracteriza a globalização “cria uma força permanentemente revolucionária que, incessante e constantemente, reforma o mundo em que vivemos” (HARVEY, 2005, p.41). Portanto a resistência às alterações nas estruturas físicas e sociais se 34

configura como barreira para a necessária revisão dos meios para sobrevivência dos mercados: The stronger identity, the more it imprisons, the more it resists expansion, interpretation, renewal, contradiction. Identity becomes like a lighthouse – fixed, overdetermined: it can change it position or the pattern it emits only at the cost of destabilizing navigation. (Paris can only become more Parisian – it is already on its way to becoming hyper-Paris, a polished caricature (...) (KOOLHAAS, 1998, p.1248).

Os grandes centros urbanos sediam – além das já citadas sedes de agentes sociais influentes (economicamente, politicamente e culturalmente) – movimentos contraditórios de generalização (e valorização do genérico) e movimentos de resistência interna à generalização dos espaços e culturas. A adoção de lógicas produtivas e sociais semelhantes em diferentes regiões do mundo produzem não apenas centros comerciais ou indústrias semelhantes. Não apenas a estética genéricas é multiplicada, mas também o são as situações “não planejadas” (Figuras 11 e 12). As cidades globais se parecem também por serem palco de acentuadas desigualdades sociais entre suas regiões centrais e periféricas: “[...] a globalização acompanhada de mercados livres, atualmente tão em voga, trouxe consigo uma dramática acentuação das desigualdades econômicas e sociais no interior das nações e entre elas.” (HOBSBAWM, 2008, p.11)

35

Figura 11 – San Cristobel slums, Lima, Peru. (PRESTON, 2007)

Figura 12 – Christ the Redeemer (O Cristo Redentor) looks out over the favela. (BENNETT, 2013).

36

3.1 Infraestrutura de transporte nas cidades contemporâneas Após esta breve conceituação sobre a estrutura das cidades, e o panorama das cidades contemporâneas, será analisado quais as funções que o transporte aéreo exerce nesta economia globalizada, especialmente, qual o papel dos aeroportos nas cidades contemporâneas. Adequado à um fenômeno de escala global, mais de uma função, ou de um grupo de funções é exercida pelos elementos que o compõe. Os aeroportos são equipamentos de transporte que exigem alta tecnologia, possibilitam conexões relativamente muito rápidas e entre regiões do globo muito distantes (Figura 13). Em outras palavras, os aeroportos possibilitam conexões

que

antes

eram

inviáveis.

Relativizam

as

distâncias:

gasta-se

praticamente o mesmo tempo para viajar de São Paulo à Nova Iorque de avião do que de São Paulo à Belo Horizonte de ônibus, igualando em tempo viagens que percorrem quinze vezes mais em distância. O aumento da velocidade e da conectividade possui funções materiais/técnicas/econômicos (infra-estrutura), mas também sociais/ideológicos/políticos (super-estrutura).

Figura 13 – Conexões aéreas globais. (BURDETT, SUDJIC, 2010. p.30)

37

3.2 Funções técnicas e econômicas dos aeroportos O primeiro grupo de funções materiais está vinculado à capacidade do transporte aéreo de distribuir rapidamente produtos e pessoas. Como o modo de produção capitalista precisa constantemente expandir suas fronteiras para sobrevivência dos mercados, assim como necessita criar a infraestrutura necessária para seu para sua realização, a construção de aeroportos tanto possibilita a circulação de bens produzidos quanto de pessoas necessárias ao estabelecimento e funcionamento de atividades industriais e comerciais. Os equipamentos de transporte estão inseridos nesse grupo de elementos físicos responsáveis por permitir a realização das atividades de uma determina região ou cidade: a infraestrutura. Conceito bastante abrangente, a palavra “Infraestrutura” adequa-se ao uso em diversas áreas do conhecimento humano, das ciências sociais à engenharia (BARAT, 2012, p.33). Segundo o mesmo autor, no que se refere à realidade material do meio: Podemos dizer que a infraestrutura – no singular – de um país, região ou área urbana é o conjunto das instalações necessárias às atividades humanas, tais como o sistema de logística e transporte, energia elétrica, telecomunicações, bem como as redes de gás canalizado, abastecimento de água, coleta e tratamento de esgotos e recepção de águas pluviais. (BARAT, 2012, p.33).

Portanto a infraestrutura de transporte aéreo é o conjunto de elementos físicos que possibilitam a circulação de bens e pessoas em uma determinada região (podendo ser “região” um conjunto de cidades próximas de um mesmo país ou mesmo um ou mais continentes). A priori os aviões podem transportar qualquer indivíduo, assim como, atendendo a requisitos de segurança, pode transportar quaisquer tipos de produto. Porém o transporte aéreo opera com elevados custos que direcionam qual o público-alvo desse setor de transportes. Por exemplo, no transporte de cargas aéreas, é usual que sejam transportados bens industrializados de alta tecnologia, produtos perecíveis, órgãos e medicamentos – produtos com alto valor agregado (CASTRO, 2012, p.15). Do mesmo modo direcionam também quais pessoas tendem a utilizar mais os aeroportos, como, por exemplo, aqueles responsáveis por implementação e funcionamento das empresas e serviços que são necessárias ao mercado. Os aeroportos servem, portanto, à expansão dos agentes 38

sociais que caracterizam a globalização, os agentes econômicos: proprietários investidores, técnicos e burocratas, por exemplo. De Castells à Sassen os aeroportos atendem aos setores estratégicos da economia global em rede: da visão industrial informacional de Castells – conectando indústrias de alta tecnologia –, e da visão pós-industrial terciária de Sassen – conectando empresas privadas prestadoras de serviço, empresários e investidores: Os serviços distributivos (transportes, telecomunicações e comércio) respondem, por sua vez, enquanto agentes facilitadores do processo de internacionalização da economia mundial. (KOULIOUMBA, 2002, p.38). No bojo destas mudanças – que propiciaram a intensificação dos deslocamentos de pessoas e mercadorias –, o papel do transporte aéreo foi, sem dúvida, decisivo como suporte à globalização. (BARAT, 2012, p.94).

Se, para Castells (1999), a sociedade em rede é informacional e a informação produto comercializável de alto valor agregado, o transporte de pessoas que dominam ou contém em si informações e conhecimentos sobre processamento de informação pode ser considerado como atividade importante para o mercado mundial. O transporte aéreo não é apenas paralelo às tecnologias de comunicação na transformação da economia nos séculos XX e XXI, como também esses se cruzam, influenciam-se mutuamente. A demanda por seus serviços é influenciada por estas tecnologias, uma vez que a comunicação em rede potencializou às oportunidades de produção descentralizada: O crescimento do uso da internet e dos sistemas de tecnologia da informação trouxe, por sua vez, mudanças radicais mas cadeias logísticas, principalmente em decorrência das tendências em direção à terceirização e à produção de componentes ou produtos fora do país ou região (offshoring). (BARAT, 2012, p.35).

Considerando que a descentralização da produção resulta da busca por redução nos custos de produção – por exemplo, por meio da utilização de mão de obra mais barata em um mercado menos saturado pela oferta de empregos, ou de menores impostos ou regulações ambientais e trabalhistas mais leves – retoma-se aqui a tendência à expansão dos mercados, tanto para escoamento quanto para produção (portanto da produção descentralizada) decorrente da teoria da acumulação progressiva de Marx (1996), movida por constante ampliação da concorrência. A globalização da lógica capitalista de produção dispersa as fases da cadeia para regiões distantes entre si, a fim de baratear os custos e isso só é 39

possível graças às tecnologias de comunicação que permitem organizar, controlar e racionalizar processos cada vez mais complexos, por envolverem cada vez mais produtores: A formação de cadeias produtivas em escala mundial deu origem a cadeias logísticas igualmente complexas e dispersas, para o abastecimento de insumos e produtos. O transporte é, obviamente um dos mais importantes elos dessas cadeias logísticas que exigem técnicas modernas de acondicionamento, manuseio, estocagem, transferência e deslocamento das mercadorias. (BARAT, 2012, p.93).

A descentralização da produção – cujo controle e gestão, por outro lado, encontram-se centralizados em cidades estratégicas – em nível global cria uma setorização da produção no mundo: Cria-se nova divisão internacional do trabalho, adequada às principais sedes da indústria mecanizada, que transformam parte do globo terrestre em campo de produção preferencialmente agrícola para o outro campo preferencialmente industrial. (MARX, 1996, vol.2, p.82).

Pode-se falar em quatro aspectos que possibilitam ao capitalismo renovar sua capacidade de acumulação: adequação de “atividades preexistentes” ao modo de produção capitalista “(por exemplo, a transformação da agricultura de subsistência em agricultura empresarial)”; produção de novas demandas de consumo; “estímulo ao crescimento populacional”; e “expansão geográfica” dos mercados. Os três primeiros David Harvey classifica como processos de “intensificação da atividade social, dos mercados e das pessoas numa específica estrutura espacial” e o quarto como processo de “organização espacial” (HARVEY, 2005, pp.45-46). A instalação de aeroportos atende a necessidade de expansão das fronteiras e da conexão de novos mercados e de novos centros produtores, expandindo a influência dos centros industrializados e permitindo que locais não conectados se insiram na rede global de produção. Enquanto a expansão dispersão geográfica da cadeia produtiva, possibilitada pelas tecnologias de transporte e comunicação, é uma necessidade que visa otimizar recursos e reduzir custos, a atividade real de circulação (e os agentes intermediários que isso cria: alfândegas, consultorias, funcionários) porém, entra no mercado como fator de acréscimo nos custos: A circulação possui dois aspectos: o movimento físico real de mercadorias do lugar de produção ao lugar de consumo, e o custo real ou implícito ligado ao tempo consumido e às mediações sociais (a cadeia de atacadistas, varejistas, operações bancárias etc.) [...] Marx considera o primeiro aspecto como integrante do processo produtivo e, portanto, gerador de valor [...] O

40

segundo é considerado como custo necessário de circulação. (HARVEY, 2005, p.47).

Por um lado, são os principais agentes econômicos da globalização e os bens de alta tecnologia produzidos por indústrias privadas o público-alvo da aviação, por outro a infraestrutura necessária para esses deslocamentos são onerosas e incidem sobre o preço dos produtos e serviços. Para aumentar a acumulação, os processos de racionalizam de recursos buscam reduzir custos a fim de aumentar a competitividade, e os investidores privados evitam arcar ao máximo com os custos. Muitas vezes, porém, “[...] esses objetos são construídos por grandes investimentos do Estado, socializando os custos, mas quem acaba operando é a iniciativa privada” (NOVAES, 2012, p.142). Analogamente à concorrência entre empresas privadas, as cidades e regiões competem entre si pela atração das grandes empresas e de seus capitais, a fim de movimentar suas economias; e a oferta de infraestrutura, como, por exemplo, um aeroporto, é um dos fatores competitivos que auxiliam na determinação da posição que alguma cidade ou região pode ocupar na hierarquia dos espaços globais: [...] a concorrência interurbana e o empreendedorismo urbano abriram os espaços urbanos dos países capitalistas avançados a todos os tipos de novos padrões de desenvolvimento, mesmo quando o resultado líquido tenha sido a reprodução de parques científicos, enobrecimento de regiões degradadas, world trade centers, centros culturais e de entretenimentos, grandes shopping centers com equipamentos pós-modernos etc. A ênfase na criação de um local favorável para os negócios acentuou a importância da localidade como lugar de regulação concernente à oferta de infraestrutura, às reações trabalhistas, aos controles ambientais e até à política tributária em face do capital internacional. A assunção do risco pelo setor público e, em particular, a pressão para o envolvimento do setor público na oferta de infraestrutura, significou que, para o capital multinacional, o custo da mudança localizacional diminuiu, proporcionando maior mobilidade geográfica à este mesmo capital. (HARVEY, 2005, pp.178179).

Internamente, ou seja, dentro de um país ou região, a instalação de aeroportos representa hierarquias e especializações territoriais, além de estratégias de desenvolvimento. Um aeroporto é um ponto de conexão de uma determinada região com diversas outras, normalmente bastante distantes, e portanto é um ponto que canaliza os deslocamentos de grandes áreas. Nesse sentido um aeroporto pode estimular atividades comerciais e industriais onde se insere e onde se conecta, concentrando potenciais. O aeroporto comporta em si a possibilidade de conectar 41

uma região ao mercado global, ou ao menos de aumentar sua importância no mercado regional: Os aeroportos podem e devem ser observados não mais como um simples ponto de conexão entre o modo aéreo e o modo rodoviário, mas sim como integrantes de uma ou mais cadeias produtivas, podendo ser catalisadores dos processos industriais. Entenda-se produção, neste caso, principalmente como a prestação de serviços e, secundariamente, como as atividades de manufatura e extração de matérias-primas. (VASCONCELOS, 2007, p.2). O aeroporto é um equipamento territorial que, integrado ao sistema aeroportuário e de controle do espaço aéreo nacional, constitui-se como objeto da organização do espaço geográfico e fator de reorganização do mesmo. Sua localização e funcionalidade específica em certos pontos do território dizem respeito à força de um conjunto de agentes sociais prevalecentes, em determinados momentos de decisão política e econômica, implicando na criação de uma situação geográfica que se torna favorável aos interesses desses mesmos agentes e à e organização do sistema de acessibilidades e valorização diferencial do lugar onde incidem e ocasionando impactos diversos, em sua natureza e alcance. (BAYER, 2011, p.157).

Como elementos de grande importância na oferta de infraestrutura que as cidades e regiões podem oferecer aos investidores, a construção de um aeroporto deve obedecer a um projeto de desenvolvimento regional, pois permite articular uma grande área de influência, alterando sua lógica produtiva. Os aeroportos, assim, possibilitam alterações radicais na dinâmica econômica de cidades e regiões metropolitanas, analogamente ao desenvolvimento de cidades ao longo de rodovias e ferrovias nos últimos séculos do milênio, não devendo ser considerados simplesmente como equipamentos de transporte, mas também de desenvolvimento econômico e inserção nos mercados globais: Os meios de transporte merecem destaque por exercer influência na formação de grandes centros urbanos. Durante o século XVIII, o modal marítimo propiciou o aparecimento de importantes cidades próximas aos portos. No século XIX foi a vez de o modo ferroviário provocar o mesmo efeito, que se repetiu no século XX devido às rodovias. A tendência é o transporte aéreo ser considerado um fator decisivo para o desenvolvimento no século XXI, pelas novas necessidades de conectividade que o mercado exigirá. (VASCONCELOS, 2007, p.1).

Retomando a estrutura econômica das cidades (SINGER, 1995), a cidade se define por suas conexões globais, sendo que sua capacidade de crescimento é dependente de sua capacidade de exportação: Se examinarmos, agora, a economia de uma cidade por dento, verificamos que ela se divide em duas partes: atividades que se destinam ao exterior e

42

atividades que atendem o consumo interno. São as primeiras que definem a função econômica da cidade. (SINGER, 1995, p.143).

A cidade contemporânea, os aeroportos inserem o “local” na economia “global” e o “global” em uma economia “local”, rearticulando o regional.

3.3 Funções sociais, ideológicas e políticas dos aeroportos Se tecnicamente a função dos aeroportos é conectar mercados, desenvolver regiões inserindo-as nos fluxos de mercadorias e serviços da globalização; estudouse aqui quais as funções social, política e ideológica desses grandes, impactantes, deslumbrantes e onerosos equipamentos de transporte. No primeiro grupo de funções analisou-se o papel dos aeroportos tomando como base que esse faz parte de um conjunto de elementos que compões a infraestrutura material para funcionamento das atividades comerciais e industriais. Nesse segundo grupo de funções, menos diretamente palpáveis, partiremos da ideia de que também há infraestrutura necessária para sustentação das mesmas atividades, porém no âmbito político-ideológico. Especialmente se considerar que boa parte da infraestrutura de transporte aéreo é custeada pelo Estado, ou seja, por todos, fica claro que a manutenção desses equipamentos e o papel que desempenham tem de ser socialmente minimamente aceita. Pois bem: Infraestrutura seria, assim, a base de um sistema onde os componentes se relacionam. O conceito difundiu-se pela economia e ciências sociais e, do ponto de vista filosófico, o marxismo o disseminou como um conjunto de relações sociais e econômicas que determinam as superestruturas, estas representando o complexo das ideologias e instituições religiosas, filosóficas, jurídicas e políticas dominantes numa sociedade. (BARAT, 2012, p.33).

Há de existir, portanto, uma base ideológica para as funções que o aeroporto ocupa no imaginário das sociedades contemporâneas. Em alguns casos, o aeroporto – uma criação do século passado – atua como um dos principais símbolos da modernidade, ícone da conectividade global, da velocidade, da tecnologia e do desenvolvimento. Exemplos desta exaltação são, a confecção de conceitos como Airport City e Aerotropolis (KASARDA, LINDSAY, 2011) – que mesclam aeroportos e cidades em ambientes colossais, alçando o equipamento de transporte à paradigma da cidade do futuro –, ou uma antiga declaração de Le Corbusier à um editor de uma 43

revista em que diz que o dia em que viu um avião como o mais importante de sua vida: Once asked by a magazine editor to name his favourite chair, Le Corbusier cited the seat of a cockpit, and described the first time he ever saw an aeroplane, in the spring of 1909, in the sky above Paris – it was the aviator the Comte de Lambert taking a turn around the Eiffel Tower – as the most significant moment of his life. He observed that the requirements of flight of necessity rid aeroplanes of all superfluous decoration and so unwittingly transformed them into successful pieces of architecture. To place a Classical statue atop a house was as absurd as to add one to a plane, he noted, but at least by crashing in response to this addition, the plane had the advantage of rendering its absurdity starkly manifest. ‘L’avion accuse,’ he concluded. (BOTTON, 2008, pp.56-57).

Assim como a compra de um automóvel novo, a construção de um aeroporto pode indicar prosperidade econômica, bem-estar e segurança para uma região. Não estão erradas percepções de que o aeroporto simboliza velocidade, conectividade e modernidade, uma vez que o transporte aéreo verdadeiramente opera à altíssima velocidade, conecta regiões distantes do globo, utiliza e desenvolve tecnologia de ponta, assim como está repleto de procedimentos de qualidade e segurança em suas operações. Porém, pode ser equivocada a percepção de que, além de representar estas características para uma determinada região, um aeroporto oferece amplamente suas qualidades para esta mesma região. Como citado no capítulo anterior, tanto para cargas quanto para pessoas, o transporte aéreo possui público-alvo, público preferencial; e este público é representante dos agentes dominantes da economia global e da indústria de ponta e portanto um grupo relativamente pequeno e seleto de usuários. Os aeroportos sofrem o paradoxo de atender aos setores estratégicos da economia global enquanto são, em verdade, grandes equipamentos fixos construídos em um determinado local. Não deixa de ser verdade que os aeroportos são atores do desenvolvimento ou do crescimento econômico de determinado local ou região, porém a população beneficiada pelas qualidades da velocidade e conectividade não é, necessariamente, aquela que habita as adjacências dos aeroportos; demograficamente a aviação pode não ser tão representativa da contemporaneidade quanto economicamente: Na família dos imaginários da globalização e das técnicas, encontra-se a ideia, difundida com exuberância, de que a velocidade constitui um dado irreversível na produção da história, sobretudo ao alcançar os paroxismos dos tempos atuais. Na verdade, porém, apenas algumas pessoas, firmas e instituições são altamente velozes, e são ainda em menor número as que utilizam todas as virtualidades técnicas das máquinas. Na verdade, o resto

44

da humanidade produz, circula e vive de outra maneira. Graças à impostura ideológica, o fato da minoria acaba sendo representativo da totalidade, graças, exatamente à força do imaginário. (SANTOS, 2008, pp.121-22).

Entra em conflito não apenas a legitimidade da aviação como símbolo da contemporaneidade, mas também a justificativa dos investimentos socializados em infraestrutura aeroportuária à serem operados e ocupados por nichos menores e privados da população; uma vez que, ou os investimentos poderiam ser destinados a outros fins, ou os aeroportos poderiam servir à outras funções: Pode-se dizer que a velocidade assim utilizada é duplamente um dado da política e não da técnica. De um lado, trata-se de uma escolha relacionada com o poder dos agentes e, de outro, da legitimação desta escolha, por meio da justificação deum modelo de civilização. É neste sentido que estamos afirmando tratar-se mais de um dado da política que, propriamente, da técnica, já que esta poderia ser usada diferentemente em função do conjunto de escolhas sociais; (SANTOS, 2008, p.122).

Representando a globalização da economia ocidental, os aeroportos contribuem com a estética correspondente da Cidade Genérica de Koolhaas (1998), reforçando o isolamento com o local onde se insere: “Is the contemporary city like the contemporary airport – “all the same”? (KOOLHAAS, 1998, p.1248). Paradoxalmente, enquanto construção de estética genérica – ou seja, semelhante à outros aeroportos – estes grandes e modernos equipamentos de transporte de alta tecnologia serve de local de diferenciação com o entorno “menos desenvolvido”: Once manifestations of ultimate neutrality, airports now are among the most singular, characteristic elements of the Generic City, its strongest vehicle of differentiation. (KOOLHAAS, 1998, p.1251).

Os aeroportos tão pouco podem ser compreendidos apenas como equipamentos que possibilitam as operações de pouso e decolagem, embarque e desembarque, que uma parte substancial de suas receitas – entre um terço e metade – não se devem às tradicionais operações da aviação civil, sua função primordial – mas sim de atividades comerciais abrigadas em suas instalações e do estacionamento. Genérico, portanto, entre si e entre outros equipamentos. Se os aeroportos contemporâneos são semelhantes entre si – se há uma estética comum à eles, genérica, assim como há para os shoppings centers contemporâneos – e se parte significativa da vida nos aeroportos é semelhante à vida nos shoppings, os aeroportos simbolizam um genérico maior que si, simbolizam uma estética de vida

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genérica em que se pode viver de um aeroporto para um hotel, para um shopping, e de um aeroporto para outro: (…) airports become emblematic signs imprinted on the global collective unconscious in savage manipulations of their non-aviatic attractors – taxfree shopping, spectacular spatial qualities, the frequency and reliability of their connections to other airports. In terms of iconography/performance, the airport is a concentrate of both the hyper-local and the hyper-global – hyperglobal in the sense you can get goods there that are not available even in the city, hyper-local in the sense you can get things there that you get nowhere else (KOOLHAAS, 1998, pp.1251-1252).

A rede de aeroportos, comunicando-se mais entre si do que com os locais onde estes equipamentos possam estar inseridos, representam a vida global, da fábula da aldeia global, não apenas por permitir que seu público-alvo possa, de fato, usufruir das altas velocidades e fluidez das modernas tecnologias de transporte aéreo, mas também por serem portadoras de microclimas de estática e possibilidades de vida global e genérica que conversa mais com os setores propulsores da globalização – terciário superior e indústria de ponta informacional – do que com a cultura dos locais onde, efetivamente, estão construídos: Becoming bigger and bigger, equipped with more and more facilities unconnected to travel, they are on the way to replacing city. The in-transit condition is becoming universal. Together, airports contain populations of millions – plus the largest daily workforce. In the completeness of their facilities, they are like quarters of the the Generic City, sometimes even it’s the reason for being (its center?), with the added attraction of being hermetic systems from which there is no escape – except to another airport. (KOOLHAAS, 1998, p.1252).

46

4- O CASO DO AEROPORTO INTERNACIONAL ANDRÉ FRANCO MONTORO

4.1 A aviação civil no Brasil A aviação nasce cedo no Brasil, com o primeiro voo registrado em 1911, apenas cinco depois do histórico voo de Santos Dumont sobre Paris, sendo realizado por Edmond Plauchut no Rio de Janeiro (DUARTE, 2012, pp.16-17) – à época Capital Federal dos Estados Unidos do Brasil – ainda que o voo não tenha sido completado e a aeronave tenha caído de oitenta metros de altura no mar. Segundo Barat, (2012, p.129) o país fora pioneiro na aviação civil durante a primeira metade do século XX, tendo como função inicial a integração física do território nacional, de centros econômicos a áreas remotas dos 8.515.767,049 km² (BRASIL, 2013, p.48). As primeiras companhias1 e linhas aéreas brasileiras2 surgem na segunda metade dos anos 1920, e em 1936 a Viação Aérea São Paulo – VASP, fundada três anos antes, inaugura a linha Rio – São Paulo (DUARTE, 2012, p.18). De acorodo com Bielschowsky e Custódio (2011, pp.72-75) o setor foi demandado pelo “crescimento e diversificação da economia brasileira entre 1920 e o início da década de 1960”, tendo sido dominado de início por empresas europeias e somente entre as décadas de 1940 e 1950 é que as companhias nacionais começam a disputar

espaço

no

mercado

interno

com

as

estrangeiras

europeias

e

estadunidenses, devido à maior difusão tecnológica do setor e políticas indústrias. Porém, segundo os mesmos autores ainda (2011, p.78), o baixo crescimento econômico do país durante quase toda a década de 1960 afetaram o mercado da aviação civil, sendo revigorado apenas no final da década por medidas de “regulação de mercado destinada a garantir a rentabilidade das empresas” e pelo crescimento do chamado “milagre econômico” – período caracterizado por grande crescimento econômico, transformações do mercado financeiro e maior associação e dependência do capital estrangeiro, com: 1 Companhia Condor Syndikat 2 Linha da Lagoa que conectava Pelotas, Porto Alegre e Rio Grande

47

[...] taxas de crescimento acima de 10% ao ano, isso se deveu a reorganização do sistema financeiro brasileiro bem como a alta liquidez internacional e beneficiou-se do grande crescimento do comércio mundial e sua abertura comercial e financeira em relação ao exterior (DANIEL, 2012).

Segundo o mesmo autor ainda (2012), durante o período houve, porém, “o aumento da concentração de renda e deterioração de importantes indicadores de bem-estar social”. Na segunda metade dos anos 1970 e durante os 1980 o modelo de crescimento dependente de crédito estrangeiro somado ao “primeiro choque dos preços do petróleo e mais adiante uma elevação da taxa de juros norte-americana e outro choque dos preços do petróleo” inserem o Brasil e outros países em uma crise chamada de “crise da dívida” que, segundo Bielschowsky e Custódio (2011, p.81) instaurou, no país, um “longo período de estagnação, que se estendeu até 2002”. Segundo estes autores ainda (2011, p.84), a redução da demanda decorrente da estagnação econômica, somada ao aumento dos custos operacionais de aeronaves e infraestrutura mais avançadas tecnologicamente levaram à um grande endividamento das companhias aéreas e a estagnação contribuiu para o surgimento de uma “guerra dos preços” que colapsou quase todas as empresas nacionais, com exceção da TAM3 que: [...] expandiu suas atividades na década de 1980, adquirindo a Votec em 1986, começando a operar a ponte aérea Rio-São Paulo em 1989, e se expandindo no mercado nacional com a desregulamentação da década de 1990 (BIELSCHOWSKY, CUSTÓDIO, 2011, p.84).

Ainda segundo estes autores (2011, p.86), a guerra dos preços e a dívida das companhias aéreas colapsaram, além de si próprias, o modelo regulatório de tarifas pelo Estado. A desregulamentação viria a ocorrer em três fases, com “abertura das rotas nacionais a empresas regionais” e “remoção do controle de preços”, 1992, 1997-1998 e 2001-2002, com alguma retomada de regulamentação a partir de 2003. Entre 2003 e 2010 período que experimentou crescimento do mercado de aviação civil superior ao crescimento do Produto Interno Bruto – PIB, tanto no transporte de passageiros quanto no de cargas, tendo enfrentado limitações diferentes das anteriores, como excesso de demanda e falta de oferta de infraestrutura. 3 Originalmente Táxi Aéreo Marília, posteriormente conhecida como TAM – Transportes Aéreos Regionais, fundada em 1961, a TAM viria a se tornar uma das vinte maiores empresas aéreas do mundo. Disponível em .

48

4.2 A industrialização de Guarulhos e a construção do Aeroporto Internacional André Franco Montoro. Atualmente com, aproximadamente, um milhão e trezentos mil habitantes, o município de Guarulhos é o segundo em Produto Interno Bruto (PIB) do Estado de São Paulo e o nono de todo o país. Não é versão única que a fundação de Guarulhos se deu no tempo da fundação de São Paulo, mas trata-se de versão amplamente aceita (OLIVEIRA, 2008) que se consolidou como aldeia indígena por volta de 1560 com a concentração de índios entre a Aldeia de Guarulhos e a Aldeia de São Miguel, cada uma situada em uma margem do Rio Tietê (IBGE, 2014), sendo emancipada de São Paulo apenas em 1880 (TOLEDO, 2011, p.168) – à época uma região rural com poucos habitantes. O município de São Paulo, por exemplo, em 1890 contava com apenas sessenta e cinco mil habitantes. Este número (população paulistana) expandiu-se rapidamente entre o final do século XIX e início do século XX, passando para, aproximadamente duzentos e quarenta mil habitantes em 1900 – época que já contava com a inauguração da linha de bondes do Bom Retiro – e chegando com mais de quinhentos mil habitantes em 1920. Com a finalidade de atender a demanda do crescimento do município de São Paulo, instalam-se em Guarulhos as primeiras olarias, iniciando a industrialização guarulhense. Tanto que esta ocupação industrial das primeiras décadas do século XX se deu, principalmente, nas áreas próximas à São Paulo (TOLEDO, 2011, p.171). Em 1915 a construção da linha de trem da Cantareira atrai a ocupação de indústrias e moradias ao longo de sua extensão, assim como as indústrias acompanharam a linha férrea em São Paulo e os trabalhadores acompanharam as indústrias. Nos anos 1950 a industrialização de Guarulhos se acelerou, multiplicando por aproximadamente seis vezes a quantidade de indústrias em apenas três anos – de 1953 a 1956 – (NOVAES, 2012, p.57) sendo estas majoritariamente instaladas ao longo do modal de transporte símbolo da época: as rodovias, como por exemplo a chegada da Rodovia Presidente Dutra no início da década de 1950 (TOLEDO, 2011, p.171). A ocupação da extensão rodoviária por indústrias e trabalhadores expande a mancha urbana para regiões como “Cumbica, Bom Sucesso, Parque São Luís e Jardim Presidente Dutra” (DUARTE, 2012, p.96). Até então a ocupação se concentrava nas áreas próximas à São Paulo, “na área central e no bairro de Vila Galvão” (TOLEDO, 49

2011, p.171), bairros estes identificados pelos números 12 e 45, respectivamente na Figura 14. Para compreensão da proximidade com o Município de São Paulo, ver Figura 15 que representa a RMSP.

Figura 14 – Distritos de Guarulhos. (TOLEDO, 2011, p.170).

50

Francisco Morato Franco da Rocha

Santa Isabel Mairiporã

Cajamar Pirapora do Bom Jesus

Caieiras

Arujá

Santana de Parnaíba

Itaquaquecetuba

Barueri Osasco Jandira Itapevi Carapicuíba Vargem Grande Paulista Cotia

Guararema

Guarulhos

Taboão da Serra Embu das Artes

Poá Ferraz de Vasconcelos

São Paulo

São Caetano Suzano do Sul Santo Mauá André Diadema Ribeirão Pires

Itapecerica da Serra

Mogi das Cruzes

Salesópolis Biritiba Mirim

Rio Grande da Serra São Bernardo do Campo

São Lourenço da Serra

Embu-Guaçu

Juquitiba

Figura

15



Região

Metropolitana

de

São

Paulo



RMSP.

Disponível

em:

. Consultado em 06 de abril de 2015 às 17h00min.

Para este autor ainda (2011, p.169), esta alavancada na industrialização de Guarulhos se dá durante o segundo governo Vargas (entre 1951 e 1954) e o paradigma da “industrialização acelerada como condição para o progresso social e a autonomia nacional”. Marcos desta década são, por exemplo, a criação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE) em 1952 e da Petrobras no ano seguinte, acompanhados de leis e decretos que limitavam a remessa de lucros para o exterior. Para se dimensionar adequadamente o crescimento de Guarulhos a partir dos anos 1950, importante considerar que no início desta década a população era de, aproximadamente trinta e cinco mil pessoas – semelhante à São Paulo da década de 1870 – e passou para cento e um mil habitantes em 1960 e mais que duplicando até 1970, chegando a duzentos e trinta e sete mil habitantes (IBGE, 2014). Durante a década de 1980 a população guarulhense passou de, aproximadamente, quinhentos e trinta mil habitantes para mais de novecentas e setenta mil. Para Novaes (2012, pp.56-62), parte significativa desta população crescente se deve às migrações de trabalhadores “vindos principalmente da Bahia, de Minas Gerais e Pernambuco”: 51

O termo industrialização deve ser entendido como processo social complexo, que engloba a formação de um mercado nacional, esforços de estruturação do território para torná-lo integrado, com a expansão do consumo em formas diversas, o que dinamiza o setor terciário e ativa o próprio processo de urbanização.

Para esta autora ainda (2012, p.56), a urbanização ocorre como resultado de um projeto nacional de integração, industrialização e modernização, marcada por investimentos federais em rodovias que, como identificado, no caso da Dutra e da Fernão dias, são determinantes para organização da ocupação territorial urbana e dos fluxos de pessoas e mercadorias. Guarulhos, assim como outras cidades da Região Metropolitana de São Paulo, passou a receber indústrias que fugiam da valorização dos terrenos do município de São Paulo (NOVAES, 2012, p.57). Ao final dos anos 1960 Guarulhos possuía uma diversificada gama de instalações industriais que produziam, dentre outras coisas, “materiais elétricos e de comunicações”, mecânica”, “metalúrgica”, “produtos alimentares” e “material de transporte” (NOVAES, 2012, p.61). A valorização dos terrenos que levou indústrias às cidades adjacentes à São Paulo, combinada com o forte crescimento populacional resultou na expansão das periferias habitacionais, no deslocamento da classe trabalhadora para regiões cada vez mais distantes dos centros econômicos, aumento as periferias tanto de São Paulo quanto dos municípios industrializados que receberam suas indústrias, como, por exemplo, Guarulhos. Loteamentos de novas áreas ao norte do município foram “promovidos pelo poder público municipal e por agentes sociais à ele vinculados” (NOVAES, 2012, p.65), conduzindo à ocupação em direção à Serra da Cantareira e legitimando estes loteamentos com revisões das Leis de Zoneamento (Figura 16).

52

Figura 16 – Evolução da expansão urbana de Guarulhos (NOVAES, 2012, p.59).

A industrialização da metade do século XX, aliada às demandas por maiores pistas dos nascentes aviões à jato pressionaram as autoridades aeroportuárias a pensar em alternativas ao Aeroporto de Congonhas, o que levou o Aeroporto de Viracopos a se tornar Aeroporto Internacional de Viracopos em 1960, além da articulação de propostas para determinação de um possível novo aeroporto internacional. Segundo Duarte, (2012, pp.30-31), variadas propostas, decretos, desapropriações, projetos e recursos antecederam o início das obras do Aeroporto Internacional de São Paulo/Guarulhos, em 1980 e o início suas operações em 1985; e o longo caminho até esta data contracena com a rapidez em que ganhou importância, chegando a ser o aeroporto que mais operava voos comerciais e receita em toda a América do Sul em apenas dois anos de atividades. O aumento de atividade aeroportuária impulsiona a economia guarulhense, porém: 53

Enquanto poucos ganhavam com o crescimento econômico do município, a maioria da população se alojava em áreas sem infraestrutura elementar, o que é atestado por diferentes dados, entre eles o de que havia em Guarulhos, em 1987, 200.446 domicílios particulares permanentes, dos quais apenas 51% tinham ligação de água encanada e apenas 26% de rede de esgoto (NOVAES, 2012, p.65).

4.3 Indicadores sociais de Guarulhos, da Região Metropolitana de São Paulo e do Estado de São Paulo. Paralelamente à economia da cidade, crescem as periferias guarulhenses. Cruzando dados da evolução das favelas e assentamentos precários em Guarulhos com a localização e dimensões das favelas atuais – com grande concentração nos bairros vizinhos ao aeroporto, Novaes conclui que a expansão dos assentamentos precários foi intensificada com a chegada do Aeroporto Internacional de São Paulo Guarulhos (2012, p.128) – Figura 17 e Tabela 3. De acordo com o Relatório de Gestão de 2013 da Prefeitura Municipal de Guarulhos, houve significativa evolução dos Índices de Desenvolvimento Humano (IDH) no município, saindo de 0,544 em 1991 para 0,763 em 2010. Porém, pode-se verificar pelo Ranking Estadual dos Municípios que Guarulhos, mesmo sediando o mais importante aeroporto da América do Sul, perdeu posição para outros municípios do Estado – ou seja, evolui significativamente, mas evoluiu menos (Tabela 4).

54

Figura 17 – Localização das favelas e construções precárias de Guarulhos. (NOVAES, 2012, p.127).

55

Tabela 3 – Evolução das favelas em Guarulhos.

Ano

Nº de favelas

Nº de domicílios

População

1970

01

12

Sem informação

1973

32

1.326

6.930

1987

65

Sem informação

Sem informação

1989

94

8.600

43.000

1991

Sem informação

Sem informação

52.506

1993

203

22.000

112.000

1994

218

22.500

115.000

1995

240

26.000

130.000

1996

253

26.000

133.000

1997

289

28.200

141.000

1998/99

301

39.000

177.000

2000

Sem informação

Sem informação

163.757

2002

343

33.000

152.000

FONTE: NOVAES, 2012, p.125.

Tabela 4 – Evolução do IDH em Guarulhos. 1991

2000

2010

0,511

0,678

0,763

132

150

115

IDHM Longevidade

0,717

0,787

0,831

IDHM Educação

0,320

0,553

0,717

IDHM Renda

0,703

0,717

0,746

IDHM Ranking Estadual dos Municípios

FONTE: GUARULHOS, 2014, p.14.

O mesmo relatório analisa o município e seus bairros através, ainda, de outro indicador: o Índice Paulista de Vulnerabilidade Social (IPVS): O Índice Paulista de Vulnerabilidade Social (IPVS) permite identificar nos municípios do Estado de São Paulo, particularmente naqueles de maior porte, áreas em que predominam famílias expostas a diferentes níveis de vulnerabilidade social. O IPVS baseia-se em dois pressupostos: as múltiplas dimensões da pobreza consideradas em um estudo sobre vulnerabilidade social; e a segregação espacial como um fenômeno presente nos centros urbanos paulistas, contribuindo assim decisivamente para a permanência dos padrões de desigualdade social que os caracterizam. Assim, buscou-se a criação de uma tipologia de situações de vulnerabilidade, agregando-se, aos indicadores de renda, outros referentes à escolaridade e ao ciclo de vida familiar (GUARULHOS, 2014, p.14).

56

O índice divide a população em grupos crescentes de acordo com sua vulnerabilidade: Tabela 5 – Grupos do Índice Paulista de Vulnerabilidade Social.

Índice Paulista de Vulnerabilidade Social - IPVS Grupo 1

Baixíssima vulnerabilidade

Grupo 2

Vulnerabilidade muito baixa

Grupo 3

Vulnerabilidade baixa

Grupo 4

Vulnerabilidade média

Grupo 5

Vulnerabilidade alta

Grupo 6

Vulnerabilidade muito alta (urbano)

Grupo 7

Vulnerabilidade muito alta (rural)

FONTE: GUARULHOS, 2014, p.15.

Cruzando dados dos Relatórios de Gestão de 2011, 2012 e 2013, compõe-se a Tabela 5, que segue: Tabela 6 – Evolução do Índice Paulista de Vulnerabilidade Social de Guarulhos.

Índice Paulista de 2011 Vulnerabilidade (% da população) Social - IPVS Grupo 1 3,42

2012 (% da população)

2013 (% da população)

3,42

1,60

Grupo 2

12,46

12,46

28,50

Grupo 3

24,89

24,89

21,60

Grupo 4

44,35

44,35

19,50

Grupo 5

2,32

2,32

15,10

Grupo 6

12,56

12,56

13,70

FONTE: GUARULHOS, 2012, 2013 e 2014.

Nota-se, além de uma piora recente dos índices – com diminuição dos grupos de baixíssima, muito baixa e baixa vulnerabilidade e aumento dos grupos de média, alta e muito alta vulnerabilidade – que aproximadamente metade da população guarulhense está submetida às condições dos grupos 4, 5 e 6. Em 2011, aproximadamente 14,88% da população estava exposta à alta ou muito alta vulnerabilidade social, mesmo sendo Guarulhos, como supracitado, o município com o segundo maior PIB do Estado. Em 2010, a média do Estado de São Paulo nestes dois grupos para o mesmo índice era de 12,9%: 57

Tabela 7 – Evolução do Índice Paulista de Vulnerabilidade Social do Estado de São Paulo.

Índice Paulista de Vulnerabilidade Social - IPVS

2010 (% da população do Estado)

Grupo 1 – baixíssima vulnerabilidade

8,3

Grupo 2 – vulnerabilidade muito baixa

42,4

Grupo 3 – baixíssima baixa

16,6

Grupo 4 – vulnerabilidade média

18,2

Grupo 5 – baixíssima alta

8,8

Grupo 6 – baixíssima muito alta (urbano)

4,1

Grupo 7 – vulnerabilidade muito alta (rural)

1,6

FONTE: Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (SEADE), Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (ALESP), 2010.

Importante destacar a inexistência nos Relatórios de Gestão da Prefeitura Municipal de Guarulhos do Grupo 7 de IPVS, por analisar grupos rurais. Nota-se que os grupos de maior vulnerabilidade são maiores em Guarulhos do que na média do Estado. Por exemplo, o Grupo 6 – vulnerabilidade muito alta (urbana) – é mais que três vezes maior em Guarulhos do que na média do Estado, e Grupo 1 – baixíssima vulnerabilidade – é cinco vezes menor. Não se trata de exclusividade de Guarulhos, importante notar. Segundo o relatório de IPVS de 2010, “os grandes centros urbanos apresentam maior desigualdade social” no Estado (SEADE, ALESP, 2010, p.9) – Figura 18 – sendo, por exemplo, na (RMSP) 16,6% da população situa-se nos Grupos 5 e 6, de alta e muito alta vulnerabilidade social. Mesmo sendo uma média mais próxima da de Guarulhos do que a do Estado todo, a porcentagem de população nos Grupos 5 e 6 ainda é muito inferior na RMSP do que em Guarulhos: 28,8% em 2013. Se for comparado com o IPVS de Guarulhos de 2011, mais próximo em data aos apresentados pelo SEADE em 2010, Guarulhos estava um pouco menos crítica do que a RMSP, com 14,88% nos Grupos 5 e 6. São Paulo, a capital do Estado e maior cidade em população e PIB, por exemplo, exibe índices semelhantes aos de Guarulhos (Tabela 7).

58

Figura 18 – IPVS por quantidade populacional dos municípios. (SEADE, ALESP, 2010, p. 9).

Tabela 8 – Índice Paulista de Vulnerabilidade Social do Município de São Paulo.

Grupo 1 – baixíssima vulnerabilidade

2010 (% da população do Município) 13,3

Grupo 2 – vulnerabilidade muito baixa

39,5

Grupo 3 – vulnerabilidade baixa

17,2

Grupo 4 – vulnerabilidade média

13,6

Grupo 5 – vulnerabilidade alta

8,9

Grupo 6 – vulnerabilidade muito alta (urbano)

7,5

Índice Paulista de Vulnerabilidade Social

FONTE: SEADE, ALESP, 2010.

Outro índice é considerado no Relatório de Gestão, o Índice Paulista de Responsabilidade Social (IPRS). Segundo o Relatório de Gestão (2014, p.15): Os indicadores do Índice Paulista de Responsabilidade Social sintetizam a situação de cada município no que diz respeito à riqueza, escolaridade e longevidade, e quando combinados geram uma tipologia que classifica os municípios do Estado de São Paulo em cinco grupos (GUARULHOS, 2014, p.15).

59

Segundo publicação da Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (SEADE) junto à Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (ALESP), o IPRS: [...] acompanha o paradigma que sustenta o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). Esse modelo pressupõe que a renda per capita é insuficiente como único indicador das condições de vida de uma população e propõe a inclusão de outras dimensões necessárias a sua mensuração. Assim, além da renda per capita, o IDH incorpora a longevidade e a escolaridade, adicionando as condições de saúde e de educação das populações em um indicador mais abrangente de suas condições de vida (SEADE, ALESP, 2012, p.11).

Avaliando indicadores de renda, escolaridade e longevidade (SEADE, ALESP, 2012, p.11) o IPRS busca apreender as condições de vida da população dos municípios e suas alterações em “períodos mais curtos que os dez anos que separam os censos demográficos” (SEADE, ALESP, 2012, p.11). Às três primeiras variáveis, classificadas como “setoriais” pelo índice (renda, escolaridade e longevidade) o IPRS acrescenta uma quarta “tipológica”, na qual classifica os municípios em um dos cinco grupos que buscam resumir a análise dos indicadores setoriais (Tabela 9). Sendo, resumidamente, os cinco grupos: Grupo 1: reúne municípios com elevado nível de riqueza e bons indicadores sociais. [...] Grupo 2: engloba localidades com bons níveis de riqueza que não se refletem nos indicadores sociais, os quais se situam aquém dos registrados para os municípios pertencentes ao Grupo 1. [...] Grupo 3: municípios com nível de riqueza baixo, mas com bons indicadores nas dimensões escolaridade e longevidade. [...] Grupo 4: [...] esse grupo apresenta baixa riqueza e níveis intermediários de longevidade e/ou escolaridade. [...] Grupo 5: composto por localidades tradicionalmente pobres, com baixos níveis de riqueza, longevidade e escolaridade (SEADE, 2012, pp.17-19).

De acordo com o Relatório de Gestão de 2013, “Guarulhos está classificado no grupo 2, embora com níveis de riqueza elevados, ainda não atingiu bons indicadores sociais.” Com indicadores de Alta riqueza, média longevidade e baixa escolaridade. (GUARULHOS, 2014, p.15). Do mesmo modo São Paulo, capital, está no Grupo 2.

60

Tabela 9 – Critérios adotados para formação dos grupos de município do IPRS.

Critérios para formação dos grupos de municípios Grupos

Categorias Alta riqueza, alta longevidade e média escolaridade

Grupo 1

Alta riqueza, alta longevidade e alta escolaridade Alta riqueza, média longevidade e média escolaridade Alta riqueza, média longevidade e alta escolaridade Alta riqueza, baixa longevidade e baixa escolaridade Alta riqueza, baixa longevidade e média escolaridade

Grupo 2

Alta riqueza, baixa longevidade e alta escolaridade Alta riqueza, média longevidade e baixa escolaridade Alta riqueza, alta longevidade e baixa escolaridade Baixa riqueza, alta longevidade e alta escolaridade Baixa riqueza, alta longevidade e média escolaridade

Grupo 3

Baixa riqueza, média longevidade e alta escolaridade Baixa

riqueza,

média

longevidade

e

média

escolaridade Baixa riqueza, baixa longevidade e média escolaridade Grupo 4

Grupo 5

Baixa riqueza, baixa longevidade e alta escolaridade Baixa riqueza, média longevidade e baixa escolaridade Baixa riqueza, alta longevidade e baixa escolaridade Baixa riqueza, baixa longevidade e baixa escolaridade

FONTE: ALESP, 2012, p.15.

4.4 A distribuição espacial das vulnerabilidades sociais e o Aeroporto. Compreendendo Guarulhos como município de alta renda, mas com baixos e médios indicadores de saúde e educação, será analisado a distribuição interna destas caraterísticas no município, ou seja, como estas condições se distribuem nos bairros, especialmente com relação ao Aeroporto. A Prefeitura Municipal de Guarulhos analisa dezessete tipos de indicadores de vulnerabilidade social, que vão desde a renda, como, por exemplo, “renda familiar per capita igual ou inferior a ¼ do salário mínimo”, e “famílias em situação de Extrema Pobreza” a problemas de “violência doméstica” e “criança ou adolescente com idade escolar fora da escola”. 61

Destes dezessete, cinco foram separados como os de maior incidência no município (Tabela 10): Tabela 10 – Cinco maiores casos de Vulnerabilidade Social em Guarulhos - 2013.

Cinco maiores casos de Vulnerabilidade Social em Guarulhos, 2013. Casos

Vulnerabilidades

2213

V2 – Renda familiar per capita igual ou inferior a ¼ do salário mínimo

1090

V1 – Residem em domicílio com serviços inadequados de infraestrutura

832

V4 – Responsável com menos de 4 anos de estudo

776

V5 – Mulher chefe de família com filhos até 15 anos

693

V3 – Famílias em situação de Extrema Pobreza (renda per capita de até R$70,00)

FONTE: GUARULHOS, 2014, p.51.

Analisando a distribuição espacial destes casos de vulnerabilidade social, através dos mapas dos bairros de Guarulhos (Figuras 19, 20, 21, 21 e 23) – onde as manchas mais escuras indicam maior porcentagem de casos de vulnerabilidade social em cada bairro – nota-se claramente uma maior vulnerabilidade nos bairros adjacentes ao Aeroporto Internacional, a despeito da enorme importância que o Aeroporto tem para o PIB e geração de emprego local: aproximadamente mil e setecentas empresas operam na comunidade aeroportuária de Guarulhos, empregando mais de vinte e oito mil funcionários, dos quais metade são residentes no município. Guarulhos cresceu mais do que a média da RMSP durante os anos 1980, incentivado pelos investimentos em rodovias, como, por exemplo a Rodovia Ayrton Senna – à época Rodovia dos Trabalhadores – inaugurada em 1982, e pela construção do Aeroporto Internacional Franco Montoro – à época Aeroporto Internacional de São Paulo/Guarulhos. Como supracitado, os grandes investimentos em modais de transporte, desde o início do século XX com a linha férrea, passando pelas rodovias e chegando ao aeroporto, direcionaram a ocupação de indústrias e habitantes, os quais, ainda hoje se expandem em direção às áreas de preservação ao norte, e ao leste e sudeste do aeroporto e da Rodovia Presidente Dutra: Do ponto de vista da localização dos contingentes populacionais, sabe-se que há uma expansão do crescimento populacional em direção ao norte,

62

especificamente nas franjas das áreas que fazem divisas com as áreas de proteção ambiental e áreas de altas declividades. Reside aqui uma pressão deste crescimento populacional nas áreas de proteção ambiental (Cabuçu de Cima, Tanque Grande e Morro Grande) e também um crescimento na porção leste do município, na divisa com o Município de São Paulo. Segundo os dados do Censo em 2000, habitavam os bairros de Cumbica, Pimentas, Presidente Dutra e Bonsucesso, 335.000 pessoas, ou seja, mais de 30% da população, no lado oposto da Rod. Presidente Dutra ao Centro da cidade, justamente nas regiões com menos infraestrutura (GUARULHOS, 2011, p.42).

Para Novaes, estes grandes investimentos públicos em infraestrutura de transporte que retornam principalmente em lucros para a inciativa privada, [...] constituem um exemplo de violência estrutural, que amplia outras modalidades de violências noticiadas. Exemplo emblemático foi a chegada do Aeroporto [Internacional de Guarulhos] que hoje é rodeado por bairros em que a existência das pessoas é marcada por diferentes carências (NOVAES, 2012, p. 142).

Ainda segundo a mesmo autora, não se trata, porém, como outras características de Guarulhos da RMSP, de caso exclusivo do município ou da região, mas de um paradigma que se apresenta em todo o país em que o Estado assume custos de infraestrutura para se integrar à modernização. Retomando que um aeroporto internacional insere um local no mercado global, mas também insere o mercado global em um determinado local. Para se modernizar, se tornar competitivo, atraente para o mercado global o Estado precisa investir em infraestrutura, seja na economia global baseada setor terciário superior de Sassen (2012) ou na Indústria de ponta de Castells (1999), independente desta “modernização” resultar em melhoras ou não na qualidade de vida da maioria da população: Assim como para a formação socioespacial brasileira, a relativa pujança econômica não se traduz em qualidade de vida para a maior parte dos munícipes guarulhense [...] (NOVAES, 2012, p. 23).

Analogamente ao exposto por Milton Santos (2008), a percepção da fluidez e da velocidade mesmo sendo dados reais da modernidade – pois existem tecnologias que possibilitam mais conexões com o mundo e de modo mais rápido, como as telecomunicações e os aviões – na realidade, a maior parte das pessoas não vivem suas vidas em relativa grande fluidez nem velocidade portanto não se beneficiam destes avanços, sendo Guarulhos – sede do mais importante equipamento de infraestrutura de transporte aéreo de toda América do Sul – um exemplo desta constatação: 63

Em oposição aos subespaços fluidos, a maioria da população convive com a fluidez limitada, observada pela precariedade, do ponto de vista quantitativo e qualitativo, dos meios de transporte coletivos (NOVAES, 2012, p. 142).

Figura 19 – V1 – Residem em domicílio com serviços inadequados de infraestrutura. (GUARULHOS, 2014, p.53).

64

Figura 20 – V2 – Renda familiar per capita igual ou inferior a ¼ do salário mínimo. (GUARULHOS, 2014, p.56).

Figura 21 – V3 – Famílias em situação de Extrema Pobreza renda per capita de até R$70,00. (GUARULHOS, 2014, p.59).

65

Figura 22 – V4 – Responsável com menos de 4 anos de estudo (GUARULHOS, 2014, p.61).

Figura 23 – V5 – Mulher chefe de família com filhos até 15 anos. (GUARULHOS, 2014, p.64).

66

5- CONCLUSÃO A função dos aeroportos nas cidades contemporâneas – inseridas em uma rede economia global e globalizante, caraterizada principalmente pelo modo de produção capitalista e sua expansão tão necessária à sua manutenção – é plural: ou seja, são funções. Dificilmente seria razoável considerar apenas uma função quando se fala de fenômenos complexos, como são os fenômenos sociais, sem ceder à abordagens simplistas. Foi identificado neste estudo que os aeroportos são atores econômicos estratégicos de desenvolvimento regional, por serem necessários à inserção de uma região nos mercados globais, seja pelo transporte de atores sociais (por exemplo, investidores, empresários, prestadores de serviços altamente especializados) seja pelo transporte de cargas de alto valor agregado (por exemplo, produtos industriais de alta tecnologia, fármacos e órgãos). Identificou-se, também, que os aeroportos possuem funções ideológicas, ao representarem em suas instalações e operações signos da modernidade como, por exemplo, alta velocidade e conectividade com diversas partes do mundo, redução das distâncias físicas, além de organização e limpeza. Cruzando os dois grupos de funções dos aeroportos (de infraestrutura econômica e de superestrutura ideológica), foi identificado que estes podem ser articulados de modo a beneficiar a população dos locais onde estes grandes e onerosos equipamentos são construídos, trazendo crescimento econômico e oportunidades de emprego; assim como podem, ainda, serem articuladas de modo a – se o primeiro grupo não trouxer benefícios reais para a maioria da população local – o segundo grupo de funções ser utilizado para validar socialmente a socialização dos custos dos aeroportos aliada à privatização dos lucros. Os aeroportos são equivalentes, para a cidade contemporânea, ao que foram os portos e ferrovias para cidades de outrora: agentes estratégicos do poder econômico e político – assim como de suas disputas – que respondem aos paradigmas de sua época, sendo benéficos ou malefícios a sociedade à medida que a articulação do poder econômico e político o forem. 67

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