O alinhamento político brasileiro inicio da Guerra Fria

May 30, 2017 | Autor: Gilvandro Silva | Categoria: História do Brasil, Historia política y social siglos XIX y XX, Historia Economica
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O alinhamento político brasileiro no inicio da Guerra Fria.

O governo Dutra (1946-1951) começa após o fim da segunda guerra mundial, após 15 anos de Getúlio Vargas no poder e o fim do estado novo (1937-1945). Com o objetivo de desenvolver e industrializar o Brasil processo esse começado no governo de Vargas e dentro do novo contexto internacional do pós-guerra, ascensão dos EUA e o começo da guerra fria (EUA X URSS), o governo Dutra alinhou o país aos projetos de integração e segurança proposta pelos EUA e aceitou as propostas de reorganização da economia internacional feitas pelos estadunidenses, no que se refere à política econômica Brasileira, como "aliado fiel" tomou algumas medidas, como: a abertura ao comércio e ao investimento estrangeiro, com um aumento significativo das importações e remessas de lucros. Esse liberalismo econômico a priori esperando reciprocidade dos EUA, através de linhas de crédito fartas, ofertas de financiamentos, empréstimos para desenvolver o país não aconteceu, e as expectativas de entrada de recursos externos que era central a política liberalizante, seja para garantir o desenvolvimento, seja para evitar ameaças à estabilidade cambial e monetária, pelo aumento de importações e remessas são frustradas.
Tendo suas expectativas frustradas, mas já comprometido com o projeto liberal, com uma base conservadora e sem habilidade ou vontade para barganhar de forma dura apesar do controle de minerais estratégicos pelo país, o governo Dutra começa a sofrer os efeitos das medidas de liberalismo econômico, não obtendo as vantagens e financiamentos esperados, não sabendo explorar as poucas oportunidades existentes, o governo que gastou suas reservas e não industrializou, se viu em um cenário que o aumento das importações e remessas de lucros, sem correspondente aumento das exportações ou investimentos novos no país gera uma crise cambial provocada pela abertura liberal. Sem saída o governo Dutra muda o rumo na sua política econômica, restaura os controles cambiais com restrições a saída de capitais e importações, criando condições para impulsionar e muito favoravelmente o processo de industrialização do país nessa reviravolta política.


O governo Dutra desde 1946 até meados do ano seguinte adota uma política governamental para a economia do país que foi marcada por tentativa de restabelecer os princípios liberais do Laissez-faire, isto é, a abstenção do estado em relação aos controles sobre a economia, em especial no tocante a politica cambial. Assim, visando se afastar da politica Varguista considerada muito estatizante e muito próxima dos sindicatos e com isso próximo do comunismo e ainda com a ideia de sepultar o estado novo e seus projetos, o governo Dutra dentro de um contexto histórico diferente do vivido por Vargas e o seu Estado Novo, visto que Vargas governou no período das ameaças Germânicas e durante a segunda guerra mundial e soube aproveitar o momento, Dutra governa no período do pós-guerra, o período de reconstrução e o começo da guerra fria. Assim é que, Dutra tentando livrar-se do espectro da "intervenção estatal" Varguista, ao mesmo tempo em que buscava combater a inflação proveniente da época da guerra, adotou uma politica de livre-importação de bens manufaturados. Essa política visava atrair multinacionais principalmente estadunidenses para abrir filias no país, estimulando o crescimento e também visava conseguir financiamento do governo estadunidense, visto as medidas adotadas atenderem aos interesses dos EUA e suas empresas.
Embora durante a guerra os EUA tenham financiado projetos do governo Vargas, como o reaparelhamento do exército brasileiro, e tenha dado sinais que a ajuda continuaria no pós-guerra, os projetos de financiamento do governo Dutra não lograram êxito junto ao governo estadunidense, a condição do Brasil de "aliado especial" virou fumaça, os EUA voltaram seus esforços e dinheiro para a reconstrução da Europa e Ásia, locais estratégicos para evitar a influencia Soviética e garantir a posição de potencia capitalista hegemônica do 'mundo livre'. Essa realidade é confirmada com o fracasso da missão brasileira a Washington que tentava obter empréstimos governamentais para financiar o reaparelhamento dos transportes marítimos e terrestres do país, o governo Dutra não percebeu o novo contexto geopolítico após o fim da guerra.
A Missão Abbink (1948) dizia que "o Brasil faça sua expansão econômica através do uso máximo de seus recursos internos". Assim, com a guerra fria, a politica externa estadunidense continua voltada para a Europa e leste Asiático, por necessidades macro - politicas determinadas por exigência de segurança e econômicas.
Agora o governo Dura não tinha os trunfos de Vargas e nem a habilidade politica para negociar, mesmo quando teve oportunidade não teve habilidade, mentalidade para negociar, barganhar, como na oportunidade dos minerais essenciais (areias monazíticas e outros) minérios essenciais para o complexo industrial-militar dos EUA. O Brasil tem sua expectativa de financiamentos americanos frustrados e ainda com uma diplomacia inábil e por ter realizado sem contrapartidas um programa de liberalização do balanço de pagamentos muito além daquele exigido pela conferencia de Bretton Woods favorecendo os EUA e suas empresas e perdido o trunfo das reservas cambiais acumuladas durante a guerra.
Diante das reservas de divisas acumuladas durante o conflito mundial, no governo Dutra nos primeiros anos (1946/48), grande parte das divisas acumuladas durante a guerra foi praticamente dissipada, principalmente na "importação de bens de consumo supérfluo e suntuário". Segundo Assis Chateaubriand,
"cerca de 2 bilhões de dólares se despenderam depois da queda do Estado Novo, em compra de utilidades no EUA. Entre 1947 e 1948 importaram-se 120 000 veículos, gastando-se 250 milhões de dólares. Todo o parque de auto-ônibus (...) foi renovado e pago em dólares".
Muito pouco se utilizou para a compra de máquinas e equipamentos industriais e ainda o governo Dutra utilizou parte dos créditos do Brasil para com a Inglaterra na compra de empresas ferroviárias britânicas aqui instaladas, cujo material rodante era considerado antigo e desgastado.
A politica liberal não teve o efeito esperado, os financiamentos não vieram, os investimentos e filiais foram poucos, a industrialização com as multinacionais não aconteceu e ainda houve no período a estagnação da indústria nacional. Dessa forma o projeto de economia liberal (defendida por teóricos como Eugenio Gudin), teve, entretanto, de ser abandonada em junho de 1947, com a reintrodução dos controles cambiais, uma vez que a reservas em dólares do Brasil estavam praticamente esgotadas, limitando a capacidade de importação do país. Era a falência da política do laissez-faire, que obrigava também a fartas emissões de papel-moeda, o que desvalorizava o cruzeiro em relação ao dólar. Ainda em 1947, o governo Dutra começou a inclinar-se para formas rudimentares de planejamento da economia, ideia já defendida em 1944 pelo industrial Roberto Simonsen. Foram estabelecidos controles cambiais, que valorizavam o cruzeiro e dificultavam as importações. Uma política de crédito bancário mais liberal foi também aplicada aos setores chaves da indústria nacional. Como consequência geral deste processo, houve um relativo crescimento industrial, "espontâneo", mesmo sem a adoção do planejamento estatal proposto por Simonsen, que defendia uma industrialização acelerada, mas a base de Dutra no congresso não apoiava o investimento estatal como feito por Vargas. Na formulação de Pedro Malan (1984, p.65),
"(...) As autoridades monetárias e cambiais do governo Dutra aparentemente depositaram vasta confiança em uma solução duradoura para o potencial desequilíbrio do balanço de pagamentos nacional através da conta de capital, vale dizer, através de uma política liberal de cambio que, em estimulando as saídas de capital, pudesse estimular também ingressos brutos em proporção ainda mais significativa no futuro".
A conferencia de Bretton Woods é o embrião do FMI e BID, debates e sugestões como a de Keynes visam criar instrumentos multilaterais para reorganizar o desequilíbrio comercial entre os países industrializados e não industrializados, o controle da oferta do dólar e com isso favorecer o cambio, entre outras. A proposta de H.D White é aceita e o FM E BIRD são criados, o dólar é a moeda comercial internacional (divisa-chave) e o capitalismo "se renova", os países ricos ditam as regras e os EUA ditam as cartas.
O governo Dutra exagera na abertura liberal proposta em Bretton Woods, não tem tempo de aproveitar dos empréstimos do FMI que demoram um tempo maior que o seu mandato para ser capitalizado e com uma visão equivocada da politica econômica e talvez esperando uma guerra dos EUA com a URSS fosse premente, a aliança politica-militar com os EUA fazia sentido e traria frutos econômicos, não percebendo a nova geopolítica estadunidense e o fato de o Brasil não sofrer no período de ameaças externas ou internas que preocupa-se os EUA. Internamente já tinham cassado o PCB e seus políticos eleitos, as forças politicas conservadoras já tinham contido e desarticulado a ideia de centralização estatal. Logo o Brasil não era preocupação para o EUA dentro do contexto de influencia e geopolítica do começo da guerra fria. O governo Dutra demorou reagir ao erro causado pelo excesso de otimismo liberal na condução da sua politica econômica. A crise de 1947 levou o governo a dar meia volta e apoiar a substituição de importações "leve" que se seguiu (concentrada em bens de consumo duráveis), contornando parcialmente "gargalos" (escassez de divisas, crédito e infraestrutura) que a limitavam.
Em 1948 o governo Dutra envia ao Congresso Nacional um projeto de lei que visava a instituir "um programa governamental de despesas e investimentos para os exercícios de 1949 a 1953". Era a soma das sugestões dos vários ministérios, coordenada em termos administrativos e contábeis pelo Departamento Administrativo do Serviço Público (DASP). O programa recebeu o nome de SALTE, sigla originada pelas primeiras letras das quatro áreas prioritárias de ação: Saúde, Alimentos, Transportes e Energia. Os recursos que viabilizariam os investimentos nesses setores deveriam sair do orçamento federal e de empréstimos internos e externos. Mas, como não passava da junção de vários estudos isolados, sem os necessários ajustamentos e articulações, em 1949 foi aplicado apenas em parte, e em 1952 já estava quase totalmente abandonado. Segundo o historiador Tomas Skidmore "o fracassado programa SALTE (...) foi o máximo que o governo Dutra conseguiu para se aproximar de um planejamento em escala nacional".
Nos dois últimos anos de seu governo, Dutra favoreceu uma adequação ainda maior da política brasileira a estratégia econômica dos EUA. Os responsáveis por esse alinhamento foram os membros da Comissão Técnica Mista Brasil-EUA, conhecida como "Missão Abbink". O resultado dos estudos desenvolvidos pela comissão foi divulgado em junho de 1949, foi definido como os "principais pontos de estrangulamento" da economia nacional. Sua visão conservadora identificava os aumentos salariais como um dos principais geradores da inflação. Segundo o pensamento da comissão, o Brasil não poderia obter um crescimento "equilibrado e rápido (...) em condições rápidas e contínuas de elevação de preços." A comissão chegou à conclusão que o Brasil deveria adotar uma politica econômica dentro de uma visão monetarista, liberal e conservadora dos EUA no período de guerra fria e adotada pelos órgãos internacionais de fomento, financiamentos internacionais.



Considerações finais.
O plano liberal do governo Dutra foi um erro de estratégia governamental, embora o governo Dutra não possa ser identificado plenamente ao liberalismo econômico, as forças conservadoras da sua base de apoio influenciaram nas politicas do seu governo, na rejeição das politicas nacionalistas e estatizantes do Estado Novo e na adoção das politicas liberais. Gerson Moura (1985, p47) está correto ao afirmar que motivações locais são importantes para explicar o alinhamento político-militar quase incondicional aos EUA:
...no Brasil, o anti-sovietismo era uma arma do autoritarismo, um modo específico de controlar o conflito de classes na sociedade. Naturalmente as classes dirigentes brasileiras deram boas vindas à ideologia política do 'mundo livre' contra a 'cortina de ferro', visto que ela coincida plenamente com suas preocupações internas... Os setores conservadores que detinham as rédeas do governo eram incapazes de reconhecer a legitimidade do conflito social e consideravam as reivindicações operárias e nacionalistas como um pretexto para a ação comunista.
Portanto, sem a habilidade de Vargas para negociar e aproveitar as oportunidades e um contexto histórico do pós-guerra e guerra fria desfavorável geopoliticamente ao país, com um otimismo exagerado dos liberais e certa subserviência aos EUA, o governo Dutra teve seu plano econômico frustrado, resistiu em reagir, reagiu parcialmente e no final ficou entre o nacionalismo que evitava e as orientações econômicas defendidas pelos EUA. Embora tenha sentido que o país não era mais o "Aliado especial" dos EUA, permaneceu sempre fiel aos Estadunidenses. Seu plano SALTE não foi adiante, como sua politica liberal que sofreu uma meia volta em 1947. O contexto histórico de tensão da guerra fria, a propaganda intensiva contra os comunistas, a pressão constante dos EUA, ajudam explicar, um pouco, algumas atitudes de Dutra, mas não as justificam. A ideia de afastar-se de Vargas e o projeto conservador liberal estavam dentro da base do seu governo. Embora tenha feito tanto para afastar sua politica da era Vargas, ironicamente acabou tendo exatamente Vargas como seu sucessor no governo do país, que não levou o plano SALTE adiante e acabou com o restante da sua política liberal.
Referências bibliográficas
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BASTOS, Pedro Paulo Zanluth. De bom vizinho a aliado fiel: comentários sobre o alinhamento econômico e político do Brasil aos Estados Unidos nos primórdios da Guerra Fria. IE/UNICAMP. Campinas, nº 194, set 2011. Disponível em: http://www.anpec.org.br/encontro2010/inscricao/arquivos/000- d5e1dedb60718b13db1f23d849670e3a.pdf

MOURA, Gerson. O alinhamento sem recompensa: a política externa do governo Dutra. Rio de Janeiro: CPDOC-FGV,1990. Disponível em: https://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/handle/10438/6613

ABREU, Marcelo de Paiva. A economia brasileira 1930- 1964. Rio de Janeiro: PUC, 2010 Disponível em: http://www.econ.puc-rio.br/pdf/td585.pdf




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