O Auto da Paixão de Nise da Silveira - nasce o Hotel da Loucura.

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UMA ENFERMEIRA, QUE FAZIA A LIMPEZA DE MEU QUARTO, VIU SOBRE MINHA MESA UNS LIVROS SOCIALISTAS E ME DENUNCIOU À ADMINISTRAÇÃO. E ASSIM APRENDI OUTRA LIÇÃO, QUE DESMENTIA O QUE AFIRMAVAM OS LIVROS DE PSIQUIATRIA SOBRE OS DOENTES MENTAIS. ESSES LIVROS DIZIAM QUE OS ESQUIZOFRÊNICOS ERAM INDIFERENTES, SEM AFETO.

MAS A DOENTE QUE ME LEVAVA O CAFÉ TODA MANHÃ EM MEU QUARTO, QUANDO SOUBE DE MINHA PRISÃO, NÃO FICOU INDIFERENTE. EU NÃO ENTENDIA NADA DO QUE ELA FALAVA, MAS ELA ESTAVA ENTENDENDO O QUE SE PASSAVA. PEGOU DE MURROS A ENFERMEIRA QUE ME HAVIA DENUNCIADO. FUI LEVADA PARA A CASA DE DETENÇÃO, NA RUA FREI CANECA.

“ Nise da Silveira

G

rande gênio humano, rebelde e revolucionária, transformou a vida de todos nós, para sempre, com sua generosidade, honestidade, carinho e afeto por aqueles que a sociedade, com pretensões científicas, escolheu mutilar, amordaçar, abusar, dopar, violentar. Quanta pretensão! Quanta ousadia desta alagoana, única mulher a se formar em medicina na Bahia no ano de 1926, versada em Francês e Baruch Espinoza - o maior filósofo de todos os hereges-, que se recusou a apertar o botão do eletrochoque, por não aceitar a brutalidade de uma medicina higienista, oriunda da mistura de ideologias eugênicas e nazistas, e de outras bobagens da pseudo-ciência ocidental destinadas a purificar a sociedade de todos considerados estranhos e anormais, escórias inferiores. Nise fez uma revolução no Engenho de Dentro, a partir do convívio humano, amoroso, ético, tolerante, compreensivo e verdadeiramente científico. Compreendendo as diferenças, realizou uma investigação poderosa da psique humana e das suas relações com a cultura e a história. E melhor: Dra. Nise fez ciência através das artes e do conhecimento, curando por meio da criação humana, dando àqueles pacientes, por todos silenciados e ignorados, voz, pincel, alegria, teatro, dança, escultura, mostrando que outra humanidade, mais generosa, mais ética, mais bela e mais decente é possível. Abriu a possibilidade histórica de nos reencontrarmos com nossa natureza, com nossas essências, com nossos sentimentos, no convívio criativo, verdadeiro, sem falsidades ideológicas e emocionais. Gênio brasileiro não reconhecido em sua extensão, mais respeitada fora do que dentro do nosso país de futebol e televisão. Obrigado Dra. Nise por nos salvar da mediocridade e mesquinharia, por revelar o que há de mais nobre em nossa espécie, por mostrar que é possível transformar, por nunca ter temido as rupturas, as perseguições, por ter suportado a prisão, o abuso, a sabotagem dos medíocres que, confortáveis na ilusão do poder, agarram-se a ele e trucidam o diferente, o novo, o não compreendido. Nós vamos recuperar a dívida histórica que temos com a senhora.

Obrigado mestra.

Compareceram: Nelson Vaz, Amir Haddad, Vera Dantas, Ray Lima, Junio Santos, Heloisa Helena Costa, José Pacheco, Sergio Besserman Vianna, Luiz Roberto Londres, Francisco Gregório Filho, Mãe Tânia de Yemanjá, Cirandas da Vida, Grupo Tam-Tam/Santos, Centro de Promoção da Saúde – CEDAPS, Agentes Culturais de Saúde e Escolas Populares de Saúde e mais 654 participantes em 16 horas de espetáculoficina em dois dias.

“ Bem-vindos/as, Sim, todo ser humano é curioso e criativo. E sim, o viver é conhecer e o conhecer é viver. e que aprenda o mais simples. aprendemos o tempo inteiro uns com os outros, com os insetos, com os gatos, com as plantas, basta ter um olhar atento e ver o tanto de coisas incríveis que estão acontecendo conosco o tempo inteiro. a vida é muito maior, mais misteriosa e profunda do que supõem nossos sentidos que nos enganam. por isso, inventamos espaços de encontro como este: relações humanas, lugares, oficinas, convivência e liberdade. O programa é não ter programa. Você é responsável pelo desenvolvimento do seu projeto. arte e ciência juntas a favor da vida, da natureza, da humanidade. Ética e estética, honestidade e beleza. “Só posso ser bela se for antes honesta”, diz Ofélia ao Príncipe Hamlet. Oficinas, experimentos, experimentar o experimental. Todo ser humano é artista, todo ser humano é cientista. Precisam assumir isso, explorar os tesouros do conhecimen- to para aqueles cuja hora chegou. nunca é tarde demais. fazemos isso porque queremos ser cidadãos num estado livre, de permanente criação de direitos, de respeito, de solidariedade entre os povos, entre as classes, entre as tribos. nós, cidadãos, estamos inaugurando o i congresso aberto da universidade popular de arte e ciência em conjunto com o 11o fala, comunidade!, no teatro Carlos Gomes, no Rio de Janeiro, afirmando que é possível transformar a nós próprios e ao nosso mundo, demonstrando nossas experiências que, mais do que provam, inspiram um caminho trilhado por gênios da grandeza de nise da Silveira, uma das maiores cientistas da alma humana do mundo, e o grande paulo freire, anunciador da liberdade humana, da solidariedade, da beleza, da cultura, da nobreza de ser gente.” Extraído da Revista do I Congresso Aberto da Universidade Popular de Arte e Ciência

A UPAC - UNIVERSIDADE POPULAR DE ARTE E CIÊNCIA APRESENTA A TODOS OS PARTICIPANTES DO SEU II CONGRESSO SEUS PRINCÍPIOS FILOSÓFICOS, PEDAGÓGICOS E AS IDEIAS-FORÇA QUE REGEM SEU ANTI-PROGRAMA PEDAGÓGICO. Desde já declaramos publicamente e a quem interessar possa, que nossa proposta educacional está calcada em uma visão de educação que toma a vivência como caminho e considera o saber-de- experiência-feito como ponto de partida, base da produção do conhecimento. Aqui referenciamos um dos nossos mestres, Paulo Freire, que nos ensina que o conhecimento provém da experiência. Nos ensina ainda, dialogando com nossa mestra maior, Nise da Silveira, que não se educa só pela racionalidade. Portanto apresentamos a amorosidade como princípio fundante de nosso caminho pedagógico e que gera o afeto catalisador, grande legado de Nise que, por sua vez, gera cuidado e alegria também conceitos que nos iluminam e orientam o nosso caminhar. Aprendemos com Baruch de Spinoza que somos afetados pelas paixões e que as paixões que geram alegria despertam nossa potência de viver. Portanto as paixões alegres constituem-se também referencias de nossa pratica pedagógica. Também dialogando com Nise e Spinoza referendamos a idéia de Deus como algo inerente ao humano, síntese entre transcendência e imanência, sagrado e profano, corpo e espírito. Apresentamos a vida como centralidade, biocentrismo em vez de antropocentrismo. Portanto nossa universidade referencia as praticas tradicionais como o xamanismo, o candomblé e tantas outras, como caminhos de aprendizagens significativas, de fortalecimento da identidade e dos desvelamento do que Jung chamou de inconsciente coletivo. Na UPAC propomos uma ciência intuitiva, que considera a importância do ato criador e onde criação não se separa da invenção. Onde a poesia e a cultura popular revelam a beleza do conhecer que gera luz, faz nascer novas possibilidades de transformação do cotidiano em suas complexidades. Referenciamos ainda Paulo Freire ao compreendermos o humano como inacabado em sua incompletude que valoriza o saber do outro e da outra respeitando as diferenças e reconhecendo as semelhanças propondo o exercício da alteridade produtor de polifonias e policromias. Parte de uma visão ética que considera a fraternidade e a solidariedade como ideias-força e compreendendo a circularidade sistêmica, propõe mandalas como sínteses reflexivas e movimentos em teias que referendam a conjugação do verbo esperançar como estratégia de conquista da liberdade. E para que esses princípios e ideias-força possam materializar-se, nós atores sujeitos, protagonistas desta construção, aprendizes da arte do bem viver, propomos caminhos nos quais é possível conjugar o ser, saber e o querer, e onde a escuta sensível, o afeto, geram movimentos em potência, atitudes propulsoras para que o mergulho nas vivências produza a abstração acerca do vivido. Nosso caminhar pelos caminhos da terra nos ajudará a construir uma organização que rompa com as hierarquias e as estruturas rígidas; nossa dança pelas chamas energizantes do fogo alimentará a nossa rebeldia e manterá vivo o nosso espírito de luta; nosso navegar pelos caminhos das águas manterá viva a nossa criança e com ela a espontaneidade, o mimo com os que se achegam, a energia brincante que se faz roda-cirandando, cantando e colorindo os espaços com alegria a se expressar nos sorrisos, nos beijos e abraços; nossos vôos pela energia do ar, espalharão poemas e canções e convivendo e partilhando, ensinando e aprendendo vamos construindo o sentido mais profundo da ajuda mútua, do respeito, do diálogo, do ser feliz, onde o processo educativo se faz manifestação, festa, celebração. Sabemos que muitos são os que se deixam afetar pelas paixões tristes, geradoras de dor, medo, limitações que produzem marcas, cicatrizes, o medo que amordaça, produz amarras. Essas situações-limite são por vezes fardos pesados que muitos insistem em carregar e geram adoecimentos. Mas não as vemos como barreiras intransponíveis: acreditamos que é possível romper com o preconceito, a culpa, e a exclusão. Dizemos não à prisão, à drogadição. Conjugamos o verbo esperançar e como protagonistas desse caminhar vamos construindo o inédito viável rumo à nossa utopia. Nesse não lugar, essa escola sem paredes, nós, crianças, idosos, homens e mulheres de todas as cores e de todas as raças, com família e sem família, com eficiências e deficiências, artistas, músicos, abre alas, saltimbancos, educadores e educandos, mães de santo, xamãs, bruxos, magos, monstros, cuidadores e cuidadoras, loucos por arte e por vida vamos desenhando nosso percurso com o respeito a todos os seres, promovendo a inclusão dos diferentes, dos oprimidos em busca da independência em um processo de organização pautado na liberdade que tem a emancipação como conquista. Rumo ao inédito-viável seguimos em frente sem medo da felicidade, da alegria ou da loucura ofertamos a nossa gratidão aos nossos mestres da cultura popular, Nise da Silveira, Baruch de Spinoza, Nelson Vaz, Amir Haddad, José Pacheco, Heloisa Helena e tantos outros, por iluminarem nossos caminhos com seus ensinamentos e a todos os que ousaram conosco experenciar a loucura, a arte e a ciência nessa ocupação.

A partir dos diálogos construídos em vários encontros, os atores da Universidade Popular de Arte e Ciência formularam a hipótese de trabalho para o II Congressoespetáculoficina que consistirá na ocupação por três semanas do ex-Hospício do Engenho de Dentro, atual Instituto Municipal Nise da Silveira, construindo junto, criando junto, um espetáculo com atores de toda a rede da UPAC de todo o Brasil com participação facilitadora de atores populares, brincantes, mestres do teatro popular de todo o país, onde

Baseados na metodologia das Escolas de Samba do Carnaval do Rio de Janeiro e teatro de popular conduziremos diferentes discussões de conteúdo vivenciadas em diferentes espaços do Instituto (VIA PRAZEROSA), como o Museu de Imagens do Inconsciente (Porta de Entrada do Congresso), o Espaço Aberto ao Tempo, a Encantarte Editora, o Bloco de Carnaval Loucura Suburbana, a Rádio Revolução, Arena Gafieira Nise da Silveira, e os sítios históricos do hospício de mais de cem anos, trabalhando sempre de forma aberta e radicalmente construtivista; afim de propiciar um diálogo permanente, terapêutico, que busca conhecer a história, os ritos, os mitos e as tradições da comunidade interna do instituto bem como seu contexto ampliado, o Engenho de Dentro, o Rio de Janeiro, o Brasil e o mundos. O que construiremos será próximo de um desfile de carnaval\chegança\procissão\cortejo dionisíaco teatral com alas, cenas, discursos, poesias, personagens no que promete ser um dos maiores espetáculos públicos de nosso meio. Este espetáculo segue a já comprovada metodologia das Celebrações da Saúde (já foram realizadas 36 delas) mobilizadora, vinculante de grupos de educação popular. Para tanto contaremos com atores das favelas cariocas conectados as Escolas Populares de Saúde que vem desenvolvendo ações de educação Freireana e a Rede das Comunidades Saudáveis, unindo ética e estética, honestidade e beleza, revelando daqueles discriminados pela sociedade a beleza poética e os conteúdos profundos do inconsciente humano, iluminadores da natureza, especialmente aqueles declarados esquizofrênicos pela autoridade. Conforme demonstrado pela experiência da Dra. Nise da Silveira, estes conteúdos exibem exuberante significação arquetípica e ancestral, constituindo assim as “Imagens do Inconsciente”. Apostamos neste processo como uma possibilidade de reconstruir a discussão sobre sociedade loucura e preconceito a partir da experimentação da linguagem proposta. Evoé, dionisa-te!

II CONGRESSO DA UPAC - OCUPA NISE Enviado por raylimalima, qui, 19/07/2012 - 15:18 Por Ray Lima Nunca vi, vivi tanta ciência, educação popular, arte, amorosidade, humanização, produção de saúde, alegria, criatividade, fé, liberdade, afetividade incondicional, espontaneidade, vontade coletiva, expressividade, intuição, humanidade, etc. tudo isso junto e ao mesmo tempo. Uma polifonia de existência, resistência e saber. Desde o dia 09 de julho que estamos acampados, ou melhor, hospedados no Hotel da Loucura, no terceiro andar, um espaço adaptado de antigas enfermarias desativadas do hospital psiquiátrico Nise da Silveira. Trata-se do II Congresso da Universidade Popular de Arte e Ciência - UPAC que este ano acontece dentro de um hospital. Aqui nos misturamos com os “clientes” como Nise gostava de chamar as pessoas que são trazidas para cá em busca de tratamento, amparo e cuidado. Antes da Dra. Nise da Silveira reinavam o eletrochoque, a lobotomia e outras soluções tanto quanto brutas, violentas. Hoje sentimos que, embora com os avanços provocados pela ação corajosa e amorosa daquela mulher alagoana e nordestina a partir da arte e da ciência, muito tem a ser feito em termos de conduta médica e de aprofundamento da pesquisa e da prática da arte em processos de cura, de reanimação do ser para a retomada de sua dignidade como ser humano autônomo, liberto e senhor de si. Dra. Nise demonstrou que isso é possível por meio da criação artística, principalmente da pintura e também da terapia com animais. E nós, a partir do teatro, da cenopoesia, da dança, da música, das manifestações e celebrações criativas e alegres, em 15 dias de residência e resistência, convivendo com tantas pessoas maravilhosas, sensíveis, sofridas, mas extremamente inteligentes e capazes de se relacionar com o outro com uma sinceridade que nas relações sociais lá fora é muito raro encontrarmos. É assim, fazendo arte, comendo, aprendendo e vivendo juntos, até porque alguns deles e delas passaram a dormir no Hotel da Loucura conosco, portanto é desse modo que vamos desvendando os mistérios das relações humanas, dos desequilíbrios que a sociedade gera em nossos corpos e almas e depois nos expurga, nos afasta do convívio coletivo, nos atrancafiando nas redomas da solidão, do desprezo e da violência. Hoje não mais do eletrochoque e da lobotomia, mas ainda da chamada “camisa-de-força química” e do descuido, de sutis maus-tratos físicos e anímicos. Pelos depoimentos emocionados de cuidadores e clientes, pela nossa emoção, pela mudança sentida também em nós esse congresso representa um passo fundamental adiante em relação aquilo que Nise da Silveira iniciou nos 40 do século passado. O jovem artecientista Vitor Pordeus através da UPAC e do Núcleo de

Arte e Ciência da Secretaria de Saúde do Rio de Janeiro nos provoca e aponta caminhos. Por aqui já passaram José Pacheco da Escola da Ponte de Portugal, Amir Haddad do Tá na Rua do Rio de Janeiro, Dra. Vera Dantas das Cirandas da Vida-CE, o diretor, encenador, cenopoeta e dramaturgo Júnio Santos do Movimento Escambo Popular Livre de Rua, Dra. Heloísa Helena Costa da Universidade Federal da Bahia e seu filho, o psicólogo Ivan Costa; Além destes os grupos de teatro de rua de São Paulo:Pombas Urbanas, Inventivos e Buraco d’Oráculo; e ainda o músico e compositor Edu Viola e sua companheira educadora e cantora Lu Calheiros. Do Ceará: Pintou Melodia na Poesia; Cirandas de Arte, Aprendizagens, Pesquisa e Cuidado; as Cirandas da Vida; e o Templo da Poesia. De Sergipe: duas representantes do MOPS/ANEPS das práticas integrativas e populares de Cuidado de Aracaju; do Pará os estudantes de medicina e da Trupe da Pro-cura, Vitor Nino, Bruno Brabo e Bruno Passos; de Florianópolis a cuidadora e Homeopata Dra. Haydê Haviaras; do Rio o Cantor Ney Matogrosso; Mãe Tânia, Leo e Gabriela Haviaras do grupo Tupi NagÔ, e os agentes culturais de Saúde; o pesquisador da Fiocruz e palhaço Matraca; o dentista, gestor de saúde e músico Gert Wimmmer, entre outros; do Rio Grande do Norte, o Xamã e Pajé, Amauri Gurgel, o Bando La Trupe de Natal, representado por Filippo Rodrigo, e o Cervantes do Brasil de Macau. Do Nise da Silveira, Dra. Gladis coordenadora do Museu do Inconsciente, o diretor do Instituto Nise da Silveira, o ponto de cultura Loucura Suburbana. E por fim: Reginaldo ou dependendo da ocasião e do dia pode ser nosso Rei Naná ou nossa Rainha Judith; o Pelézinho, cantor, compositor e rei das embaixadinhas; Rogerinha, cantora de rap e samba maravilhosa; Roque, intérprete incrível de Roberto Carlos e ator; Odacir, cantor de samba canção e de raiz; Gadu, o Grande Arquiteto do Universo, de uma cultura literária invejável, canta Chico e recita Vinícius. Rogerinho, o nosso passarinho beija-flor, de uma singeleza, delicadeza absoluta e encatadora; Jeane Cardoso, Rita, Ritinha, Enoque, Janice, Flávia, Patrícia Marinho, Wagner, Miriam das empadas, Jorge, entre tantos outros e outras que não caberia nesta lista de homens e mulheres doidos e doidas para viver e ganhar um espaço para expressar suas dores, sonhos e esperanças. Aqui nasceu uma nova visão de saúde mental e o museu do inconsciente. Agora é dado um outro passo importante rumo a uma base de formação e de práticas substanciais em arte e ciência.

Estou espantando com tudo isso. Vida que segue sob o ritmo alegre e aprendente do Ocupa Nise e do Congresso da UPAC.

texto Rafaela Palmeira Vi se esculhambarem as pausas da matéria, do tempo, dos quilômetros. Assim, de se suspender as quietudes do juízo, da carne, dos sentidos. Foi do que vi, senti. Vivi esse tanto de poesia libertadora, da saúde sendo verso que conduz o mundo, tecendo fios da malha mais rara de que se soube, sentida. A saúde sendo vivenciada na sua inteireza de ser. Vi e vivi a potência do amor, sentido nas entranhas, nas vísceras, sem amarras ou códigos. A potência de libertação do amor, do afeto, de se ter a vida como profunda referência do viver, e de se achar na arte a expressão da criatividade e curiosidade das gentes todas. Vi a luta antimanicomial em sua expressão mais amorosa. Porque isso aqui não se trata de leis, ou de areia. Trata-se da ruptura dos nossos manicômios mentais, culturais. Dos muros e grades invisíveis do estigma, trata-se da libertação das amarras da discriminação. Vi se esfarelarem os parâmetros de normalidade, controle, coerção. Vi pessoas, e apenas pessoas, inteiras, amorosas, poéticas, malucas, cuidadoras, todas elas. Foi do que vi, um manicômio, e toda a energia do aprisionamento que ele carrega, na sua história de matéria, de vivido, de carne. Vi ele ganhar cores, em tons de sorrisos vindos dos cantos todos de que pode o afeto fazer morada. Vi um hotel de sabença, de acolhimento, de compartilhamento de afeto, vida e sonho. Vi o pai véi nos arredores, nas chagas tantas, e curas todas. Atotô! Vi o cuidado se tecer, de tantas faces, com tantos apelidamentos, sotaques, raízes... mas habitados todos na compreensão da unidade, na conexão universal das coisas e seres, da natureza, do amor. Aprendi na vida foi disso, de que o amor é o único caminho da verdadeira libertação. Das amarras da opressão, da exploração, da resignação. É o único caminho da saúde, dessa profunda, além e anterior aos sintomas, às chagas, aos rótulos. É esse amor que faz morada na inteira conexão com a vida. A vida, a vida, sim, a vida como postura política fundamental, basilar, a vida como centro de outro modelo societário, referenciado nela e na sua compreensão enquanto unidade do universo. E aprendi que é a temporária impossibilidade de vivenciar plenamente esse amor, que adoece as pessoas e as sociedades. E acredito com força que a arte é a expressão plena dessa conexão. Acredito na transformação, na liberdade e na libertação. Acredito no mundo em que a vida será a referência do viver. Acredito na gentileza, acredito no afeto. Acredito com força, com a força que eu sinto esse tanto de amor me inundando. Me ocupando por inteiro o juízo, as vísceras, os sentidos. Me ocupando por inteiro, me ocupando. E a ele, e a vocês, eu amo profundamente, e grito: SEM CULTO A CULPA, OCUPA NISE!!

Duas enfermarias desativadas do antigo Hospital Psiquiátrico metamorfoseadas em acolhedoras áreas de convívio com alimentação e hospedagem para os atores facilitadores convidados e aqueles que se inscreveram para hospedagem durante o congresso .

Produção de hospedagem para os convidados e participantes que aplicarem a necessidade de hospedagem. s !LIMENTAÎÍO s /lCINAS EXPRESSIVAS s  SEMANAS s  PARTICIPANTES PELO MENOS

Pesquisa, Memória e Publicização s 2EPØRTERES CIDADÍOS s 0UBLICAÎÜES s "LOGS 4WITTER ,IVESTREAM &ACEBOOK s 2EVISTAANAIS DO CONGRESSO  VOLUMES s LIVROS PANmETOS ARTIGOS ENCARTES FOLDERES vídeos, reportagens, documentários, filmes s &ORMAÎÍO DE GRUPOS DE AÎÍO CULTURAL

“Ação Cultural que sintetize nossas reflexões e práticas cujo processo possa ser multiplicado e integrado na rede de conversações UPAC”

da mestra Vera Dantas sobre o Ocupa Nise O mergulho no universo do Ocupa Nise foi por demais profundo e não cabe nas palavras. Nas quase 03 semanas no Hotel da Loucura deixei-me permanecer imersa, submersa nessas águas nem sempre perenes. Não saí muito do espaço a não ser para os momentos de celebrações. Por vezes o mergulho me levou a tamanha profundez que cheguei a ficar sem ar. No último dia de minha temporada no hotel acordei um pouco melancólica. Devagarinho fui emergindo, saboreando cada momento. Cuidei pela última vez das flores, varri as energias estagnadas do espaço com a maraca, enviei energia para cada um e cada uma que seguem gravados na minha memória e no coração e fui arrumando a bagagem devagarinho para não esquecer ninguém. Algumas passagens estavam mais vivas. Alguns sorrisos trouxe comigo num lugar muito especial. O sorriso da Tatiana, jamais esquecerei. Guardarei aquele rostinho se iluminando ao som da música e dançando e começando a cantar: salve o povo da terra, salve o povo do ar... puro ar essa menina, que eu pude cuidar em alguns momentos. Guardo também o sorriso maroto da Rogéria pedindo a música da arara. Ali vi a criança viva APESAR DOS CRACKS DOS ABANDONOS 4AMBÏM TROUXE A DOÎURA DO SORRISO INOCENTE de Rogerinho com seu profundo sentimento de gratidão. Mas na bagagem não levo apenas sorrisos. Levo os carões de Judite/Reginaldo a me ensinar a humildade; o carinho de Wagner querendo me levar na rodoviária; a serenidade de Marcelo em sua timidez mas grandioso quando soltou a voz silenciada; trouxe o cuidado de Jeane com o ambiente; a disponibilidade de Patrícia pra cuidar de todos; o sabor das empadas de Miriam. Trouxe a força de Ritinha (do Ceará) e sua obstinação EM SUPERAR SUAS DIlCULDADES O DESEJO DE VIVER DE 6INY *ACKSON A TEATRALIDADE DE Roque; a poesia de Nilo; os beijinhos de Janice; os questionamentos de Vinicius; o samba no pé de Elisangela, a voz pausada a me lembrar Cartola de Odacir; só pra falar de alguns. Fui reconstituindo cada momento. A roda com os educadores e educadoras do Núcleo me ensinou demais emais uma vez me emocionei com o carinho de cada um e cada uma. Correndo o risco de deixar alguns que a memória já não me garante os nomes, é impossível esquecer do cuidado incondicional de Miguel, , da disponibilidade de Augusto, da gentileza de Vanderson, da alegria amorosa de Leandra, das comidas e temperos saborosos de Moisés. da precisão e envolvimento de Léo, o pretinho, da da organização do Eduardo e Jaqueline, da precisão da Márcia Proença, das criações do Carlão, do amor de cada um e cada uma pela sua escola popular e sua comunidade. Emociono-me lembrando das meninas do Morro do Alemão a me trazerem lembranças do seu trabalho. Como agradecer tanto carinho e atenção? A continuidade da UPAC tem esse grupo e o Laboratório Tupi Nagô como esteio e ai preciso falar da criatividade do Perrolta e da dedicação de Leo Rosa e Gabriela Haviaras, esses dois seres maravilhosos. Pareciam-me dois anjos.

Um com sua doçura cuidando das plantas, colorindo o espaço com rosas e plantas de cura e sempre abre-alas, ativando os cortejos, incluindo. A outra, mulher dragão cuidando, protegendo, acarinhando e irrompendo em sinuosidade e força nas manifestações. Aprendi muito com vocês e serei sempre grata!! Nesse encontro pude perceber mais que antes a importância de uma comunicação comprometida, ousada. Esses atores da comunicação foram fundamentais. Ver Reginaldo/Judite/Naná, Patrícia e outros moradores do Nise atuando como cinegrafistas, fotógrafos, foi lindo. Os/as jornalistas, produtores e cineastas sambando na roda, tocando e se comprometendo com o cuidado; trazendo sua família pra a roda, os amigos famosos e anônimos pra dar uma cancha e as redes virtuais pipocando fotos, vídeos, depoimentos foi maravilhoso. Estar nessa ocupação me possibilitou ainda novos encontros que com certeza se farão novos pontos de redes, Os grupos de São Paulo me marcaram fortemente. Como temos em comum! Que força, compromisso e coragem. Reencontrar e brincar com Junio Santos foi um grande prazer! Ali se fez também encontros de gerações com meninos que vi nascer como Jadiel e os que vi pequininhos, brincando com meus filhos como Filippo, hoje maravilhoso ator brincante. Nessa temporada e no convívio com esse povo, também pude fazer um mergulho nas memórias da minha terra. Queria agradecer especialmente a Junio Santos porque ele foi o fio que foi tecendo esses momentos e a Ray Lima companheiro e mestre de tantas lutas e caminhadas. Nos momentos de leitura e reflexão a turma de estudantes foi minha companheira fiel. Com Vítor e os Brunos do Pará lemos Spinoza, Nise da Silveira e construimos nossas próprias reflexões, sínteses. Com Haidé e Gabriela Haviaras, Léo Rosa, Larissa, Honorato, Nicole e Amauri(pajé) construímos o cuidado com todos os sentidos da integralidade. Por fim vou emergindo impulsionada pela força revolucionária desse médico menino com sua acolhida amorosa, sua potencia articuladora e criativa, sua obstinada rebeldia e espírito de vanguarda. Volto ao Ceará em um intenso movimento de expansão e recolhimento. Levo comigo um pedacinho de cada um e cada uma, a inteireza de cada vivência; a força do coletivo e a alegria dionisíaca do teatro, da criação livre e insana. Minha gratidão aos que nomeei e aos que não foi possível nomear nesse primeiro capítulo. Um novo ser emerge, uma em muitos e inúmeros em um e vou cantando uma musica que aprendi com Júnio Santos... sozinho seremos cinco, juntinhos seremos um ...

Mais uma radiografia precisa do Hotel da Loucura e sua gerenta santa trindade, Judith, Reginaldo e Naná. O nosso pesquisador da UPAC é Vitor Nina de Belém do Pará. São e Salvo: Primeiras impressões após as vivências do Hotel da Loucura São e salvo estou de volta a minha casa após uma longa estadia no Hotel da Loucura. Acho que só retornei mesmo esta manhã, quando finalmente vesti o jaleco branco de todos os dias e retomei a rotina de trabalhos e estudos no hospital. O jaleco pesou nos meus ombros, já não estava mais acostumado com este tipo de figurino e, francamente, depois do que pude viver no Instituto Nise da Silveira, acho que alg umas lantejoulas lhe cairiam muito bem. A primeira impressão é esta: tudo parece estar revolvido neste hospital que conheço há anos. É como quando agitamos um formigueiro: nossos movimentos humanos, as paixões e os tropeços saltaram de baixo da terra e sou uma formiga que pode ver a si mesmo, em corredores apinhados de gente, todos juntos buscando uma doçura instintiva, mas presos a uma hierarquia violenta, à cegueira de pinças que é a lei deste reino, como de tantos outros. Afinal, o hospital nada mais é que teatro de rua! O espaço é público, aqui estão todos: o feirante, o brincante, o cientista, o louco, o corrupto. Meu figurino poderia ter mais cores, alguns retalhos. E uma peruca, quem sabe. Mas por certo, precisamos aqui em nosso hospital de um Reginaldo, que possa ser Judite e Naná ao mesmo tempo, com a naturalidade, graça e elegância das santíssimas trindades. Um rei que abraçasse a loucura para nos elucidar, e gritasse “Evoé!”, para que respondêssemos em coro “Evoé!”. Que nos ensinasse uma ética tão simples quanto verdadeira, como comer o quanto quiséssemos, mas não levar para casa. Um rei que conhecesse a lógica dos maltrapilhos, que habitasse o hospital há décadas e que o chamasse de lar não de forma abstrata, mas real, mesmo que imposta. Que tivesse o corpo mutilado, que tivesse aprendido a sorrir mesmo sem dentes contra o punho fechado daqueles que só lhe deram prescrições sedativas e restrições à liberdade. Um rei que tivesse aprendido o Amor no hospital, e pudesse nos conduzir de volta ao Amar. Nós, que fomos saneados, que estamos sãos e salvos à custa da lobotomia de Dionísio.



PARA NAVEGAR CONTRA A CORRENTE SÃO NECESSÁRIAS CONDIÇÕES RARAS: ESPÍRITO DE AVENTURA, CORAGEM, PERSEVERANÇA E PAIXÃO

“ Nise da Silveira

FICHA TÉCNICA



NÃO SE CUREM ALÉM DA CONTA. GENTE CURADA DEMAIS É GENTE CHATA. TODO MUNDO TEM UM POUCO DE LOUCURA.

VOU LHES FAZER UM PEDIDO: VIVAM A IMAGINAÇÃO, POIS ELA É A NOSSA REALIDADE MAIS PROFUNDA.” - NISE DA SILVEIRA

“ Nise da Silveira

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