O CÂNONE DA INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO

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O cânone da interpretação conforme a Constituição

O CÂNONE DA INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO The precept of interpretation according to the Constitution Revista de Processo Comparado | vol. 2/2015 | p. 335 - 354 | Jul - Dez / 2015 DTR\2016\48 Rogério Rudiniki Neto Mestrando em Direito Processual Civil pela Faculdade de Direito da UFPR. [email protected] Frederico Augusto Gomes Mestrando em Direito Processual Civil pela Faculdade de Direito da UFPR. [email protected] Área do Direito: Constitucional Resumo: Este trabalho, que tem como premissa a separação entre "texto" e "norma", investiga e problematiza o tema da "interpretação conforme a Constituição". Tal expediente pode ser visto como uma mera técnica interpretativa, ou como uma forma de controle de constitucionalidade. Após o estudo do problema no âmbito do direito comparado, questionam-se as premissas que fundamentam o emprego da "interpretação conforme", especialmente o dogma do "respeito ao legislador". Ao final, propõem-se limites à utilização da figura. Palavras-chave: Interpretação conforme a Constituição - Controle de constitucionalidade - Respeito ao legislador - Presunção de constitucionalidade - Direito comparado. Abstract: This essay, which is premised on the separation between "text" and "norm", investigates and discusses the "interpretation according to the Constitution". This mechanism can be seen as a mere interpretative technique, or as a form of judicial review. After studying the problem in the context of comparative law, we question the assumptions that underlie the use of "conforming interpretation", especially the dogma of "respect for the legislature". As conclusion, there is a limit proposed to this interpretation according to the Constitution. Keywords: Interpretation according to the Constitution - Judicial review - Respect for legislature - Presumption of constitutionality - Comparative law. Sumário: 1A diferença entre texto e norma - 2Métodos tradicionais de interpretação - 3Métodos de interpretação constitucional - 4A interpretação conforme a Constituição - 5Interpretação conforme e declaração de nulidade sem redução de texto - 6O problema no direito italiano - 7A opinião de Virgílio Afonso da Silva - 8A opinião de Richard Posner - 9As críticas do constitucionalismo popular - 10Notas conclusivas 1 A diferença entre texto e norma A admissão da diferença entre "texto" e "norma" é o pressuposto central do presente estudo. Conforme lembra Luiz Guilherme Marinoni, tal distinção era ignorada pelas chamadas "teorias formalistas", próprias ao contexto da Revolução Francesa, que defendiam estar 1 a atividade do juiz circunscrita à simples descrição do texto legal. Em oposição ao formalismo, vieram à tona as "teorias céticas" - vertentes radicais pautadas por valores antipositivistas inerentes à corrente do direito livre. De acordo com elas, a decisão judicial não se restringe à aplicação do texto da lei; pelo contrário, em tal expediente entram em cena os valores e as opções políticas do magistrado - responsável pela criação da norma. As teorias céticas podem ser criticadas pelo fato de relegarem a um segundo plano o texto da lei, ignorando que ele traz consigo limites objetivos à Página 1

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atuação do intérprete.

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Contudo, é preciso apontar que, de regra, há uma incompreensão das teorias jurídicas positivistas, seja sobre a influência dos demais ramos do saber sobre o direito, seja sobre a interpretação das leis. Em Kelsen, a interpretação é tratada como ato de vontade do julgador, que, dentro da moldura fixada pela lei, pode escolher livremente a 3 interpretação a ser dada. Ato contínuo, surgem as correntes intermediárias, entre as quais se insere a noção de "open texture" concebida pela por Herbert L. Hart, que difere os casos fáceis dos difíceis (somente estes demandariam a atividade interpretativa) e a "teria da resposta correta", relacionada a Ronald Dworkin, pela qual - mesmo para os casos difíceis - sempre existe uma resposta correta. Destarte, a corrente encabeçada por Hart pode ser questionada quando se leva em conta que mesmo os textos mais claros reclamam alguma dose de interpretação; já a teoria de Dworkin é posta em cheque por não explicitar qual é a maneira de se chegar à resposta correta, além de não ser plausível cogitar que possa 4 existir uma norma anterior à atividade interpretativa ("expediente ideológico"). Registre-se que, conforme aponta Giovanni Tarello, hodiernamente não mais subsiste o velho brocardo do "in claris non fit interpretatio". Na ressalva de Tarello, essa expressão surgiu entre os escritores do Direito Comum dos séculos XVI-XVIII, e não possuía a conotação atual ("o claro prescinde de interpretação"). Na época, o termo "interpretatio" fazia referência à atividade dos doutrinadores e às decisões dos tribunais que possuíam autoridade de direito objetivo nos assuntos que não se encontravam diretamente disciplinados na "Lex" ("Corpus Juris Civilis"). Deste modo, o "in claris non fit interpretatio" era um princípio de hierarquia de fontes, pelo qual o recurso à "interpretatio" estava excluído quando a matéria em discussão estivesse expressamente 5 regulada na "Lex". Já com o advento do Código Napoleônico e das codificações subsequentes, a expressão "interpretação" passou a significar a atribuição de sentido a um texto normativo, de modo que, com a Escola da Exegese - a qual defendia que a interpretação deveria se adequar à vontade do legislador histórico e à expressa letra da lei -, o "in claris non fit interpretatio" recebeu novo conteúdo semântico, passando a ser relacionado ao dogma pelo qual a utilização da interpretação deveria ser ao máximo evitada, isso em respeito 6 ao legislador. É interessante notar que "exegese" é uma palavra oriunda do estudo das sagradas escrituras, a qual descreve a posição passiva do estudioso diante de um texto de origem divina. O intérprete apenas explica a vontade já encontrada no texto em questão, o que, na passagem do sacro para o secular, se torna a atividade de encontrar a "vontade do 7 legislador", supostamente já manifestada no texto da lei. Tais orientações relacionam-se com o célebre pensamento de Montesquieu, para quem a atividade judicante é meramente silogística, restrita à aplicação do direito produzido pelo Parlamento. Na lembrança de Marinoni, isso fazia algum sentido naquele contexto, pois os juízes anteriores à Revolução Francesa mantinham laços com as classes privilegiadas, além do fato de que esses cargos podiam ser herdados ou vendidos. Havia grande desconfiança para com a magistratura, conhecida por proferir decisões com base em 8 razões escusas. Todavia, a ideia de que o texto claro não necessita de interpretação não passa de uma ilusão, mormente quando se leva em conta que um mesmo termo pode assumir 9 10 diferentes acepções, que não são estanques, variando conforme o local ou a época. Isso porque "é impossível analisar o significado de um termo sem considerar o contexto 11 no qual se insere, ou seja, seu significado contextual", devendo-se considerar o significado de base, que é aquele significado estático reconhecido no plano teórico quando abstraída a interpretação contextual, e o significado contextual, que é derivado Página 2

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dos processos de comunicação social.

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Some-se a isso a inviabilidade de uma interpretação estritamente objetiva, pois o 13 intérprete sempre será influenciado por elementos externos ao texto. Nesse sentido, Daniel Mitidiero preconiza que o resultado interpretativo obtido varia de acordo com a posição que o intérprete ocupa na sociedade, sua opinião política, seu conceito de justiça etc. Tais dados certamente refletem na posição a ser tomada diante 14 de determinado conflito de interesses. Além disso, resta superada ilusão trazida pelas grandes codificações de que tudo o que interessa ao direito poderia ser regulamentado pela lei. Ocorre que diuturnamente surgem novas situações conflituosas cuja solução não encontra previsão legal expressa, o que novamente reclama a atuação do intérprete. Todas essas circunstâncias conduzem à conclusão de que não existe uma identidade 15 entre "texto" e "norma" (texto interpretado). Deste modo, por "texto" pode ser compreendido todo o enunciado capaz de exprimir 16 fontes do direito. Por "norma" entende-se o significado atribuído a determinado texto. De acordo com Ricardo Guastini, por exemplo, há textos que revelam uma multiplicidade de normas; textos ambíguos (que podem ser interpretados de maneiras diversas); textos sinônimos (dos quais se extrai a mesma norma); normas que decorrem da combinação de dois ou mais textos ou ainda textos que não revelam nenhuma norma 17 (tal como ocorre com a invocação de Deus no preâmbulo da Constituição). Como se vê, o texto legal não possui um significado intrínseco (a priori). O sentido do 18 texto (norma) é construído pelo juiz em seu expediente interpretativo. 2 Métodos tradicionais de interpretação Os métodos tradicionais de interpretação são fruto da contribuição de Savigny, fundador da Escola Histórica do Direito. Savigny falava nas interpretações gramatical, histórica e 19 sistemática, tendo sido posteriormente inserida nesse rol a interpretação teleológica. Pela interpretação gramatical, parte-se das possibilidades semânticas das expressões integrantes do texto legal, de modo que, em homenagem à segurança jurídica, é vedado 20 ao intérprete distorcê-las. Ainda dentro da interpretação gramatical, considerando que o sentido das palavras pode variar conforme o momento histórico, ao se deparar com um termo próprio à linguagem técnico-jurídica, o intérprete deve buscar o significado que a expressão tinha quando da 21 edição da lei. Já pela interpretação histórica, é interessante perquirir acerca das intenções das comissões e dos relatores responsáveis pela redação de determinada lei, com o fim de 22 averiguar o contexto em que foi produzida, bem como seus objetivos. Todavia, pode-se dizer que, em nosso contexto, a interpretação histórica assume uma função secundária, pois, diferente do que ocorre nos países da "common law", nos de tradição romano-germânica os trabalhos e a intenção do legislador recebem pouca atenção por 23 parte da jurisprudência e da doutrina. Por sua vez, a interpretação sistemática parte do pressuposto de que a ordem jurídica é 24 um sistema pautado pela unidade e pela harmonia. Em outra toada, a interpretação teleológica considera que a função do Direito é a 25 realização de fins sociais. Diante disso, dentre os critérios de interpretação teleológica, assumem importância os chamados princípios éticos-jurídicos, entre os quais se inserem, 26 por exemplo, o princípio da tutela da confiança. 3 Métodos de interpretação constitucional Página 3

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É possível cogitar que os princípios acima citados sejam utilizados no processo de 27 interpretação constitucional. Todavia, como afirma Luís Roberto Barroso, as normas constitucionais apresentam grande especificidade em alguns aspectos, como em relação: "a) à superioridade jurídica; b) à natureza da linguagem; c) ao conteúdo específico; d) 28 ao caráter político". Logo, Barroso identifica os seguintes princípios instrumentais de interpretação constitucional: "a) princípio da supremacia da Constituição; b) princípio da presunção de constitucionalidade das leis e atos do Poder Público; c) princípio da interpretação conforme a Constituição; d) princípio da unidade da Constituição; e) princípio da 29 razoabilidade ou da proporcionalidade; f) princípio da efetividade". Neste estudo nos deteremos apenas no estudo do "princípio" da interpretação conforme a Constituição. Desde já, fazemos a ressalva de que, em verdade, a interpretação conforme não é um método de interpretação do texto constitucional, mas sim de normas infraconstitucionais. 4 A interpretação conforme a Constituição De acordo com Gilmar Ferreira Mendes, a técnica da "interpretação conforme a Constituição" guarda origens no postulado americano, incorporado pela doutrina brasileira, segundo o qual, em um contexto de dúvida, o juiz deve reconhecer a 30 constitucionalidade da lei em análise. A interpretação conforme a Constituição funda-se no princípio da "unidade da ordem 31 jurídica" e na valorização da "supremacia do legislador". Luis Roberto Barroso afirma que o fim da interpretação conforme à Constituição é a "preservação da validade de determinadas normas, suspeitas de inconstitucionalidade, assim como à atribuição de sentido a normas infraconstitucionais, de forma que melhor 32 realizem os mandamentos constitucionais" Dessa forma, a interpretação conforme à Constituição se revela, ao mesmo tempo como técnica de interpretação e um mecanismo 33 de controle de constitucionalidade. Como técnica de interpretação, ela traz para os juízes e tribunais o dever de interpretar a Constituição de modo a que sejam realizados os fins e valores sociais da forma mais adequada (deve ser escolhida a interpretação que mais se coaduna com os ditames constitucionais). Já como mecanismo de controle, a interpretação conforme possibilita que o intérprete - especialmente a Corte Suprema, responsável pelo controle concentrado de constitucionalidade -, preserve o texto da lei, afastando determinada interpretação, ainda que ela possa ser a mais óbvia considerando a dicção legal. Ou seja, "nessa hipótese, o tribunal, simultaneamente, infirma uma das interpretações possíveis, declarando-a inconstitucional, e afirma outra, que compatibiliza a norma com a 34 Constituição". Ato contínuo, desponta a questão dos limites da interpretação conforme a Constituição. De acordo com Karl Larenz, o emprego deste mecanismo não pode ultrapassar os limites 35 impostos pela literalidade do texto da lei. Em sentido similar, Gilmar Ferreira Mendes aduz que a interpretação conforme não pode ser entendida como uma autorização para que a Corte melhore ou aperfeiçoe a lei, sendo que - nesse expediente - qualquer alteração drástica no conteúdo da lei constituiria grave interferência na esfera de atribuições do legislador, de modo que, nesses casos, seria muito mais adequado a 36 simples pronúncia da nulidade da disposição suspeita de inconstitucionalidade. 5 Interpretação conforme e declaração de nulidade sem redução de texto Para Virgílio Afonso da Silva, a interpretação conforme (ao conferir ao texto legal um sentido que seja compatível com a Constituição), situa-se no âmbito da "interpretação da lei". Por sua vez, a declaração de nulidade sem redução de texto estaria no âmbito da 37 "aplicação da lei", uma vez que busca excluir alguns casos específicos de aplicação.Página 4

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A importância da distinção das figuras da interpretação conforme a Constituição e da declaração de nulidade sem redução de texto é corroborada pelo fato de o legislador brasileiro ter feito menção expressa a elas na Lei 9.868/1999 ("que dispõe sobre o processo e julgamento da ação direita de inconstitucionalidade e da ação declaratória de constitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal"). Conforme prevê o art. 28, caput e parágrafo único, do referido diploma legal: "Art. 28. Dentro do prazo de dez dias após o trânsito em julgado da decisão, o Supremo Tribunal Federal fará publicar em seção especial do Diário da Justiça e do Diário Oficial da União a parte dispositiva do acórdão. Parágrafo único. A declaração de constitucionalidade ou de inconstitucionalidade, inclusive a interpretação conforme a Constituição e a declaração parcial de inconstitucionalidade sem redução do texto, têm eficácia contra todos e efeito vinculante em relação aos órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública federal, estadual e municipal." Deste modo, tem-se entendido que, pela técnica declaração de nulidade sem redução, o intérprete exclui apenas uma determinada hipótese de aplicação do texto geral; já pela interpretação conforme, mantêm-se a validade do texto, desde que interpretado de 38 determinada maneira. Sobre o tema, ensina Georges Abboud que a declaração de nulidade sem redução do texto (Teilnichtigerklarung ohne Normtextreduzierung) não se iguala à interpretação conforme a Constituição, apesar de também não atingir o texto normativo em si. É que nela se ataca uma das possibilidades interpretativas do texto legal. "Se uma lei X possibilita a interpretação X´, X´´ e X´´´, pode o Supremo entender que apenas uma dessas variantes de sentido é desconforme à Constituição e 39 declarar que o sentido normativo X' apenas é inconstitucional", mantém-se, assim, a incolumidade do texto legal, bem como das demais possibilidades interpretativas. Por ora, cumpre ressaltar que, ao menos no direito brasileiro, a interpretação conforme, de acordo com a situação, pode ser técnica de interpretação ou técnica de controle de constitucionalidade. Já a declaração de nulidade sem redução de texto sempre será técnica de controle. Na lembrança de Afonso da Silva, em um sistema tal como o alemão, onde os juízes ordinários não têm competência para declarar a nulidade uma lei - essa competência é privativa do tribunal constitucional -, em relação eles, a interpretação conforme é apenas 40 uma técnica interpretativa. 6 O problema no direito italiano Na lição de Antonio D´Atena, a Corte Constitucional italiana surgiu em 1956 e logo se defrontou com o problema de encontrar uma posição em um espaço que de um lado era dominado pelo Parlamento, e de outro pela magistratura ordinária. O Parlamento possuía uma tradição de onipresença, e teria dificuldades em se sujeitar a outro órgão constitucional. Por sua vez, a magistratura ordinária era marcada por grande 41 corporativismo. Logo, a jovem Corte Constitucional foi obrigada a adotar escolhas estratégicas tendo em vista sua relação com o Parlamento, e, de um modo geral, como os demais poderes. A primeira opção seria assumir uma posição "demolitória", banindo o ordenamento a legislação fascista em vigência. A outra opção era uma posição conservadora - que foi o 42 caminho inicialmente adotado. O primeiro problema ocorreu quando a Corte Constitucional foi chamada a analisar o art. 2.º da lei de segurança, que tratava dos meios que o Prefeito poderia adotar para lidar com situações extraordinárias que não poderiam ser remediadas com os meios ordinárias. Caso a disposição fosse cancelada, o Estado estaria privado de um meio indispensável à manutenção da segurança pública; por outro lado, a disposição não Página 5

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poderia ser mantida, pois estava claramente em sentido contrário ao texto da 43 Constituição. Para contornar essa situação, a Corte fez uso da chamada "sentenza-monito", em especial na sentença n. 8/1957, por meio da qual, em vez de expurgar a disposição do ordenamento, fez-se - no dispositivo da decisão - um apelo ao legislador para que 44 adequasse o art. 2.º da lei de segurança à Constituição. Em um segundo momento, surgiu a técnica da "sentenze interpretative di rigetto". Ela tem como base a diferença entre texto e norma. Na ocasião, a Corte negou a ocorrência do vício denunciado (excesso de delegação), pois a disposição em questão poderia - e deveria - ser interpretada de forma diversa daquela adotada pelo magistrado a quo. Essa interpretação diversa, e orientada de acordo com a Constituição, vinha exposta na motivação da decisão tomada pela Corte Constitucional, que, em seu dispositivo trazia a frase: "no senso expresso na motivação". Esse tipo de sentença trouxe consigo um 45 intenso debate, sobretudo em relação aos seus efeitos. Ato contínuo, novamente a Corte foi chamada a se pronunciar sobre o art. 2.º da lei de segurança, pois a técnica da "sentenza-monito" não foi capaz de atingir os efeitos pretendidos. O legislador não se sensibilizou com o apelo feito pela Corte, e os juízes ordinários seguiram interpretando o dispositivo de forma inconstitucional. Desta feita, a Corte Constitucional elaborou a chamada "sentenza interpretativa de accoglimento", que em seu dispositivo explicitava que a disposição em questão poderia ser interpretada 46 tanto em dissonância, como em consonância com a Constituição. Posteriormente, passou-se a falar na Itália também na técnica "interpretazione della legge conforme alla Costituzione", que problematiza, especialmente, a atuação do magistrado ordinário que se depara com uma lei inconstitucional. Pela interpretação conforme, nos termos em que é preconizada pela doutrina italiana, o magistrado ordinário só pode reconhecer a controvérsia acerca da constitucionalidade de determinado dispositivo - remetendo à análise da questão à Corte Constitucional - após submetê-lo a uma tentativa de interpretação conforme a Constituição. Caso seja possível salvar o dispositivo mediante a utilização de determinada interpretação, a discussão 47 encerra-se aqui. Sabe-se que o ordenamento italiano, diferente do modelo brasileiro ou do norte-americano, não conhece o controle difuso de constitucionalidade, trabalhando tão somente com o concentrado, de incumbência da Corte Suprema. Deste modo, na Itália o magistrado ordinário não está autorizado a realizar qualquer juízo acerca da constitucionalidade de determinada lei, o que nos leva a crer que naquele país a interpretação conforme pode ser vista, em um primeiro momento, como uma técnica de interpretação que, em um segundo momento, caso a questão seja remetida à Corte Constitucional, abre espaço para o controle de constitucionalidade. 7 A opinião de Virgílio Afonso da Silva Primeiramente, cumpre ressaltar que, diferentemente do pensamento de Luís Roberto Barroso, já mencionado neste trabalho, para Virgílio Afonso da Silva, a interpretação conforme não pode ser considerada um princípio da interpretação, pois não tem como 48 objeto a interpretação da própria Constituição, mas sim de leis infraconstitucionais. Outrossim, Afonso da Silva critica o pensamento de Gilmar Mendes, que fundamenta a interpretação conforme a Constituição na ideia de unidade da ordem jurídica. Ocorre que, "dar prioridade à interpretação que mantém a constitucionalidade da lei" e "ter a Constituição como parâmetro interpretativo" (unidade da ordem jurídica), são ideias muito diversas, de modo que, a noção de unidade da ordem jurídica, como defendida 49 por Konrad Hesse, não pode ser aceita no Brasil sem maiores modificações. Por outro lado, a noção de presunção de constitucionalidade das leis é demasiado Página 6

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simplista, sendo aceita tanto no Brasil como no exterior sem maiores questionamentos. Não possui maior valor argumentativo quando relacionada ao tema da interpretação conforme a Constituição. Ora, por essa presunção, nos dizeres de Virgílio Afonso da Silva, bastaria uma "faísca" de constitucionalidade para que fosse extirpada qualquer dúvida, ainda que procedente, acerca da constitucionalidade do dispositivo em análise. Outrossim, é muito difícil, senão impossível, não encontrar nenhum argumento, ainda que pobre, que defenda a constitucionalidade de certa lei. Em verdade, existindo um confronto entre argumentos favoráveis e desfavoráveis à constitucionalidade de determinada disposição, o intérprete deverá cotejá-los e sopesá-los, fazendo prevalecer aqueles que sejam mais fortes, ainda que isso redunde no cancelamento no texto 50 (declaração de inconstitucionalidade). Ademais, não é adequado dizer que existe um dever de interpretar conforme a Constituição, pois igualmente existe uma série de outras variáveis também inspiradas da Constituição, que podem apontar no sentido na inconstitucionalidade da lei em debate. Por exemplo, ao invés da presunção de constitucionalidade, pode ser adotada a 51 presunção do "in dúbio pro libertate". A noção de presunção legal também não encontra adequado campo de atuação em sede de controle de constitucionalidade. Ocorre que a noção tradicional de presunção contém a possibilidade de prova em contrário, por outro lado, a ideia de presunção constitucional não admite prova em contrário (constitucionalidade ou inconstitucionalidade não se provam). Destarte, em se tratando de texto legal que supostamente contrarie disposição constitucional inserida por emenda, a presunção de constitucionalidade somente fará sentido se o dispositivo infralegal questionado for posterior à promulgação daquela emenda. Além do mais, por óbvio, a presunção de constitucionalidade não pode ser 52 aplicada às normas anteriores à Constituição de 1988. A justificativa da interpretação conforme a Constituição com base no respeito ao legislador também é problemática. Sucede que, de modo geral, a utilização da interpretação conforme redunda em alteração no sentido originário da lei, mormente 53 quando o intérprete vai além daquilo que o texto dispõe. Mesmo Gilmar Mendes reconhece que o STF, ao realizar a interpretação conforme a Constituição, dá pouca ou nenhuma atenção à vontade do legislador, sendo certo que a 54 utilização de tal técnica quase sempre implica na alteração do sentido original do texto. Feitas essas considerações, Afonso da Silva questiona qual seria o real papel ocupado pela interpretação conforme a Constituição no direito brasileiro? Para o autor, ela teria a sutil função de concentrar toda a atividade interpretativa - inclusive das leis infraconstitucionais - nas mãos do STF, mormente em razão do art. 28, parágrafo único, da Lei 9.868/1999, que dispõe que as declarações de inconstitucionalidade, "inclusive a interpretação conforme a constituição, têm eficácia contra todos e efeito vinculante em relação aos órgãos do Poder Judiciário e Administração Pública". Nesses termos, bastaria que o STF chamasse de interpretação conforme o esclarecimento acerca do significado de qualquer disposição legal para que outras interpretações (ainda que não sejam 55 contrárias à Constituição) fossem em absoluto afastadas. 8 A opinião de Richard Posner Em trabalho sobre a interpretação das leis, Richard Posner apresenta uma ideia mais consentânea com a noção de respeito ao legislador, ainda que ela seja de difícil assimilação para o operador do direito brasileiro. Para Posner, ao aplicar a lei, o magistrado deve pensar uma maneira de penetrar na mente dos legisladores, imaginando como eles gostariam que o dispositivo fosse 56 aplicado ao caso sob julgamento. O para o autor citado, não seria função do magistrado manter o dispositivo atualizado Página 7

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segundo valores contemporâneos, pois as leis aprovadas são fruto do compromisso firmando entre grupos com opiniões nem sempre convergentes. Tal compromisso não 57 poderia ser desconsiderado quando da interpretação e aplicação da lei. Nada obstante, essa concepção pode ser criticada justamente por impedir o desenvolvimento no direito por meio da atuação das Cortes. Ora, na maioria das vezes a produção legislativa não dá conta das novas situações que diuturnamente surgem na vida social, de modo que as presentes gerações não podem ficar reféns de escolhas feitas no passado que não mais possuem aceitação geral. Ademais, no contexto brasileiro, em razão de nossa história política, tal como na Itália, nem todas as leis foram feitas em um ambiente democrático. Adaptando tal análise para o âmbito da interpretação conforme a Constituição, talvez seja razoável deslocar a ideia de respeito à vontade do legislador para a preocupação de que a atividade interpretativa não transborde, ou mesmo viole, as possibilidades semânticas comportadas pelo texto legal. 9 As críticas do constitucionalismo popular A noção do "dogma do respeito ao legislador" pode, de algum modo, ser problematizada conjuntamente com as ideias próprias ao "constitucionalismo popular". Em primeiro lugar é importante pontuar que o constitucionalismo popular é uma construção doutrinária que surgiu no contexto da tradição constitucional estadunidense. É uma teoria datada e localizada no tempo e espaço, desenvolvida com olhos numa tradição específica, de forma que seu transporte para nosso ambiente constitucional não pode ser realizado sem os devidos cuidados. A Constituição dos Estados Unidos, nos termos de seu preambulo, foi promulgada pelo 58 povo reunido em assembleia nacional. Assim, o constitucionalismo popular parte da ideia de que o intérprete máximo e mais autorizado da Constituição é o próprio povo. Comumente se diz que o controle de constitucionalidade das leis surgiu, nos Estados Unidos, no precedente Marbury vs. Madison, decisão em que, numa manobra engenhosa e bastante inteligente, o presidente da Suprema Corte Norte Americana, John Marshal, optou por não aplicar uma lei considerada inconstitucional que possibilitaria analisar o pedido de Madison para ser empossado em determinado cargo público a contragosto do chefe do executivo. Dessa maneira, evitou-se o confronto com o Poder Executivo, que à época era bastante forte, consagrando, por outro lado, um precedente que garantia ao 59 Poder Judiciário negar validade a leis consideradas inconstitucionais. O fundamento para tanto era que os juízes fizeram um juramento quando da sua posse, 60 o qual seria violado se fizessem cumprir uma lei inconstitucional. Entretanto, Larry Kramer, em aprofundada análise histórica, demonstra que a possibilidade de controle de constitucionalidade das leis (judicial review) sempre esteve presente no direito estadunidense, mesmo antes do julgamento de Marbury vs. Madison. 61

Para Kramer, o fundamento para o controle de constitucionalidade nunca foi uma suposta prevalência do Poder Judiciário sobre o Poder Legislativo, mas, ao contrário, o fato de que, se qualquer cidadão poderia deixar de cumprir uma lei inconstitucional, o mesmo se aplica a todos os poderes e servidores públicos, dentre os quais os 62 magistrados. Há assim uma virada na leitura do controle de constitucionalidade e da interpretação constitucional, que, na perspectiva dessa corrente teórica, deve ser devolvida ao povo, 63 que é, ao fim e ao cabo, o autor da Constituição. Deve-se levar em conta também que, se a Constituição foi elaborada pelo povo, seus representantes são os membros do Página 8

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parlamento eleitos para tanto. Assim, em termos de interpretação da Constituição, é devido ao Poder Legislativo a mesma deferência que se dá ao Judiciário. Segundo Cass Sunstein, embora os tribunais não devam, como regra geral, se pautar pela opinião majoritária ao proferir suas decisões, devem, em certa medida, levar em conta a opinião pública e possíveis reações populares, as quais podem fornecer 64 informações sobre a correta interpretação da Constituição. Assim, a restrição judicial à democracia (invalidação de uma lei democraticamente aprovada) enfraqueceria seus atributos constitucionais, por meio de mecanismos inferiores, uma vez que atropela o debate democrático. Isso não quer dizer que as atuais democracias sejam perfeitas e as decisões produzidas pelas Cortes são, ao contrário, imperfeitas, mas que as imperfeições da primeira não poderiam ser aperfeiçoadas pelos 65 mecanismos da segunda. Contudo, essas considerações feitas pela doutrina norte-americana não podem ser automaticamente transportadas para o contexto brasileiro. Como visto, o constitucionalismo popular parte do pressuposto de que as leis são editadas em contextos democráticos. Mas essa é uma realidade que nem sempre por nós vivenciada, muitas de nossas leis, que ainda se encontram vigentes, foram editadas em períodos autoritários, sem o devido debate e sem a manifestação dos representantes daqueles que são afetados pelo ato. Feita essa ressalva, a partir das ideais expostas neste tópico, podemos extrair a conclusão de que os magistrados, notadamente aqueles que ocupam a Suprema Corte, não devem ser os únicos legitimados interpretar a Constituição ou a interpretar as leis conforme a Constituição. Há mecanismos capazes de trazer algumas doses de democracia ao expediente interpretativo. No sistema jurídico brasileiro existe a possibilidade de que pessoas e entidades interessadas ou especializadas na questão a ser decidida manifestem-se em juízo em audiências públicas ou na condição de amicus curiae - conferindo maior legitimidade democrática à atividade jurisdicional. Exemplo dessa atuação, conforme indicam Cláudio Pereira de Souza Neto e Daniel Sarmento, ocorreu na ação direita de inconstitucionalidade ajuizada em face da Lei de Biossegurança (Lei 11.105/2005), na qual foi impugnada a possibilidade de pesquisas com células-tronco embrionárias (neste processo, a possibilidade de concessão de 66 67 interpretação conforme a Constituição aos dispositivos questionados foi debatida). Na referida ação, entidades representantes de ambos os interesses envolvidos na discussão participaram dos debates na condição de amicus curiae, culminando na realização de audiência pública que contou com a manifestação de duas dezenas de especialistas no assunto. Ainda que o STF tenha dado a última palavra sobre o caso, sua decisão contou com o respaldo do amplo debate e da participação social na discussão, o 68 que acabou por conferir maior legitimidade à atuação do STF. 10 Notas conclusivas Há algum tempo restou superada a ideia de que o juiz não deve interpretar a lei, ou ainda que os textos claros não necessitam de interpretação. Logo, surgem as correntes que diferenciam as noções de "texto" e "norma". Por texto, entende-se todo e qualquer documento que pode ser considerado uma fonte do direito, sendo que após a atividade interpretativa do magistrado, seria construída a norma, de modo que um mesmo texto pode gerar uma ou mais normas. Essa distinção é fundamental para compreensão da técnica da interpretação conforme a Constituição. Ao passo que a declaração de nulidade sem redução do texto afasta determinada Página 9

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hipótese de aplicação do dispositivo em análise, a interpretação conforme (quando utilizada como técnica de controle de constitucionalidade) mantém a validade do dispositivo, desde que interpretada de certa maneira. O tema também é objeto de análise no direito italiano. Naquele país a Corte Constitucional tem uma histórica recente, e foi obrigada a buscar seu espaço em um ambiente dominado pela supremacia do parlamento e pelo corporativismo da magistratura ordinária. Ao se deparar com leis promulgadas no contexto do fascismo, a Corte italiana inicialmente adotou uma postura conservadora, limitando-se a constituir em mora o Parlamento para ela que adequasse às leis a Constituição. Em um segundo momento passou a admitir a diferença entre texto em norma, afastando alegação de inconstitucionalidade conquanto o dispositivo em questão fosse interpretado de acordo com a motivação da sentença proferida pela Corte Suprema. Todavia, surgiram sérias dúvidas acerca da eficácia de tais decisões. Ato contínuo, a Corte Constitucional italiana passou mencionar no dispositivo a interpretação que deveria ser adotada para manter a constitucionalidade da lei. Já em um momento posterior, admitiu-se que os magistrados ordinários pudessem realizar a interpretação conforme a Constituição antes de remeter à questão a Corte Constitucional. No Brasil, os pressupostos justificadores da interpretação conforme a Constituição são alvo das severas críticas de autoria de Virgílio Afonso da Silva, para quem os pressupostos da unidade do ordenamento jurídico, da presunção de constitucionalidade das leis e do respeito ao legislador não sobrevivem a uma abordagem mais acurada. Ocorre que, na maioria dos casos, ao proceder à interpretação conforme a Constituição o STF acaba se distanciando do desiderato originário do legislador, o que demonstra que a ideia de respeito à vontade do legislativo deve ser afastada. Em sentido oposto, cita-se o posicionamento de Richard Posner, para quem, qualquer juiz, ao interpretar uma lei, deve considerar que ela é produto do pacto de setores com interesses nem sempre convergentes, de modo que tal acordo deve ser respeito pelo Poder Judiciário. Convergindo com a ideia de Richard Posner, os autores do constitucionalismo popular têm demonstrando que não pode haver, em termos de atribuição de significado à Constituição, uma preponderância do Judiciário sobre os demais poderes, bem como que efetivos avanços civilizacionais só podem ser de fato obtidos pelo debate democrático, e não por decisões de uma Corte isolada que em nada dialoga com a sociedade. Todavia, as correntes citadas nos dois parágrafos antecedentes, como visto, não podem ser trazidas para o contexto brasileiro uma necessária filtragem. Desta feita, como alternativa ao dogma do respeito ao legislador, no expediente de interpretação de "leis" conforme a Constituição, ao menos devem ser evitadas interpretações que não sejam comportadas pelo texto legal objeto de controle (ou mesmo que sejam nitidamente incompatíveis com ele), uma vez que, conquanto o texto seja apenas ponto de partida da atividade interpretativa (que redundará na criação da norma), ele também lhe oferece limites objetivos. Esse cuidado contribuirá com a preservação da separação dos poderes. Se, respeitada essa limitação, não for possível "salvar" determinada lei, a melhor solução possivelmente será bani-la do ordenamento. Em adição à ressalva supramencionada, destaca-se a necessidade que, especialmente quando a interpretação conforme a Constituição for manejada pelo STF como técnica de controle de constitucionalidade - capaz de exarar efeitos erga omnes -, exista ampla manifestação de grupos e setores que representam todos os lados interessados na controvérsia, em audiências públicas ou na condição de amicus curiae, de modo a mitigar o natural déficit democrático inerente a este processo. Página 10

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1 MARINONI, Luiz Guilherme. O STJ enquanto corte de precedentes. 2. ed. São Paulo: Ed. RT, 2014, p. 80-81. 2 Idem, p. 82-83. 3 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. 6. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2000, p. 387-397. 4 MARINONI, Luiz Guilherme. O STJ enquanto corte de precedentes. 2. ed. São Paulo: Ed. RT, 2014, p. 83-89; HART, Herbert L. A. O conceito de direito. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1986; DWORKIN, Ronal. O império do direito. 3.ed. São Paulo: Martins Fontes, 2014, p. 271-331. 5 TARELLO, Giovanni. L´interpretazioni della legge. Milano: Giuffrè, 1980, p. 33-34. 6 Idem, p. 34. 7 GROSSI, Paolo. L'Europa del diritto. 6.ed. Roma-Bari: Larterza, 2010, p. 153-154. 8 MARINONI, Luiz Guilherme. O STJ enquanto corte de precedentes. 2. ed. São Paulo: Ed. RT, 2014, p. 26-27. 9 "A afirmação, que se houve com frequência, de que os termos inequívocos não carecem de interpretação induz tanto mais em erro, quanto, feita a abstração de números e nomes próprios, a maior parte dos termos da linguagem corrente, e também a linguagem legal, não são inequívocos. Já a constatação de que do sentido literal resulta "inequivocamente" este ou aquele significado é, em regra, o resultado de uma interpretação. O uso linguístico geral é precedido por um uso linguístico especial da lei, a não ser que resulte de outros critérios que a lei se afastou aqui do seu uso próprio. O significado intencionado em cada caso pode resultar, com suficiente clareza, do uso linguístico especial da lei; neste caso a interpretação é levada a seu termo com a averiguação do uso linguístico da lei e com a constatação de que a lei se não afastou aqui dele. Interessa então apenas e ainda um desenvolvimento do Direito, caso existam os pressupostos para tal. Mas, em regra também um uso linguístico estabilizado por parte da lei deixa ainda aberta a possibilidade de diferentes variantes de significado; então são decisivos os outros critérios". LARENZ, Karl. Metodologia da ciência do direito. 2. ed. Lisboa: Fundação Caloustre Gulbenkian, 1983, p. 415. 10 Exemplo clássico que demonstra a afirmação é o da placa com os dizeres "proibido entrar em trajes de banho". Não há nenhuma dúvida sobre o sentido atribuído aos significantes da norma em questão, contudo ela ganha significado diferente quando está a frente de um restaurante à beira mar daquele que lhe é atribuído se está na entrada de uma praia de nudismo. 11 WARAT, Luiz Alberto O direito e sua linguagem. Porto Alegre: Fabris, 1984, p. 65. 12 Idem. 13 GUASTINI, Riccardo. Interpretare e argomentare. Millano: Giuffrè, 2011, p. 93. 14 MITIDIERO, Daniel. Corte Superiores e Cortes Supremas: do controle à interpretação, da jurisprudência ao precedente. São Paulo: Ed. RT, 2013, p. 54. Página 11

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15 Idem. 16 GUASTINI, Riccardo. Interpretare e argomentare. Millano: Giuffrè, 2011, p. 63. 17 GUASTINI, Riccardo. Interpretare e argomentare. Millano: Giuffrè, 2011, p. 65-68. 18 MARINONI, Luiz Guilherme. O STJ enquanto corte de precedentes. 2. ed. São Paulo: Ed. RT, 2014, p. 90-93. 19 BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 314. 20 BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 315-316. 21 LARENZ, Karl. Metodologia da ciência do direito. 2. ed. Lisboa: Fundação Caloustre Gulbenkian, 1983, p. 389. 22 Idem, p. 396. 23 BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 316. 24 Idem, p. 318. 25 Idem, p. 319. 26 LARENZ, Karl. Metodologia da ciência do direito. 2. ed. Lisboa: Fundação Caloustre Gulbenkian, 1983, p. 406. 27 Karl Larenz entende que não há problemas na aplicação dos princípios tradicionais na interpretação constitucional. Nas palavras desse autor: "No que respeita à minha opinião pessoal, não vejo fundamento bastante para não se aplicarem, pelo menos em princípio, os princípios interpretativos gerais também à interpretação da Constituição, pois que a Constituição é, enquanto lei - tal como todas as outras leis (redigidas na maior parte em linguagem corrente) -, uma obra de linguagem, eu, como tal, carece de interpretação, tal como as proposições nela contidas têm o caráter de normas; o seu efeito vinculativo não é certamente menor, mas mais vigoroso do que o das demais leis". (LARENZ, Karl. Metodologia da ciência do direito. 2. ed. Lisboa: Fundação Caloustre Gulbenkian, 1983, p. 438). 28 BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 322. 29 Idem. 30 Idem, p. 1366. 31 MENDES, Gilmar Ferreira. Controle de constitucionalidade na Alemanha (a declaração de nulidade, a interpretação conforme à Constituição e a declaração de constitucionalidade da lei na jurisprudência da corte constitucional alemã). Revista de Direito Administrativo, v. 193, p. 23. 32 BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 325. 33 Idem.

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34 Idem. 35 LARENZ, Karl. Metodologia da ciência do direito. 2. ed. Lisboa: Fundação Caloustre Gulbenkian, 1983, p. 411. 36 MENDES, Gilmar Ferreira. Controle de constitucionalidade na Alemanha (a declaração de nulidade, a interpretação conforme à Constituição e a declaração de constitucionalidade da lei na jurisprudência da corte constitucional alemã). Revista de Direito Administrativo, vol. 193, p. 24. 37 SILVA, Virgílio Afonso da. Interpretação conforme a constituição: entre a trivialidade e a centralização judicial. Revista Direito GV, vol. 3, 2006, p. 201. 38 BRANCO, Paulo Gustavo Gonet; MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de Direito Constitucional. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 1368. 39 ABBOUD, Georges. Jurisdição constitucional e direitos fundamentais. São Paulo: Ed. RT, 2011, p. 188. 40 Idem. 41 D'ATENA, Antonio. Conclusioni - Interpretazioni adeguatrici, diritto vivente e sentenze interpretative della Corte costituzionale. In: Corte Costituzionale, Giudici Comuni e Interpretazioni Adeguatrici. Atti del Seminario Svoltosi in Roma (Palazzo della Consulta, 6 Novembre 2009). Milão: Giuffrè, 2010, p. 342. 42 D'ATENA, Antonio. Conclusioni - Interpretazioni adeguatrici, diritto vivente e sentenze interpretative della Corte costituzionale. In: Corte Costituzionale, Giudici Comuni e Interpretazioni Adeguatrici. Atti del Seminario Svoltosi in Roma (Palazzo della Consulta, 6 Novembre 2009). Milão: Giuffrè Editore, 2010, p. 343. 43 D'ATENA, Antonio. Sentenze Interpretative ed Evoluzione del Ruolo della Corte Costituzionale. In: Lezioni di Diritto Costituzionale. 3. ed. Turim: G. Giappichelli Editore, 2012, p. 145. 44 Idem. 45 Idem, p. 145-146. 46 D'ATENA, Antonio. Sentenze Interpretative ed Evoluzione del Ruolo della Corte Costituzionale. In: Lezioni di Diritto Costituzionale. 3. ed. Turim: G. Giappichelli Editore, 2012, p. 147. 47 Sobre a interpretação conforme no direito italiano, teorizam Gustavo Zagrebelsky e Valeria Marcenò: "Considerando la questione di costituzionalità della legge in funzione dell´inteperetazione, se comprende e si justifica pienamente l´orientamento della giurisprudenza della Corte costituzionale che esige, como condizione di ammissibilità della questione di costituzionalità, che il giudice che si rivolge abbia esplorato le possibilità a sua disposizione per addvenire a un´ interpretazione della legge conforme alla Costituzione. In questo modo, la dimensione costituzionale delle controversie giuridiche entre pienamente e legittimamente nella cognizione dei giudici d´ogni tipo. Non risulta più sostenibile la dotrrina, avanzata in in primo tempo, anche alla luce degli intendimenti espressi dal Costituente, che separava nettamente i campi: da un lato, la legge e la giurisdizione comune, con al vértice i poteri interpretativi della Corte di cassazione; dall´altro, la Costtituzione e la giurisdizione costituzionale. La nozioni di "non manifesta infondatezza", prevista come condizione della questione di legittimità costituzionale, cosi re-interpretata, risulta modificata, rispetto a quanto la si intendeva Página 13

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come garanzia della separazione netta di tali due campi, atraverso l´assegnazione al giudice che solleva la questione di um potere limitado alla semplice delibazione superficiale del rapporto tra legge e la Costituzione". ZAGREBELSKY, Gustavo; MARCENÒ, Valeria. Giustizia costituzionale. Bolonha: Il Mulino, 2012, p. 340. 48 SILVA, Virgílio Afonso da. Interpretação conforme a constituição: entre a trivialidade e a centralização judicial. Revista Direito GV, vol. 3, 2006, p. 192. 49 Idem, p. 195. 50 SILVA, Virgílio Afonso da. Interpretação conforme a constituição: entre a trivialidade e a centralização judicial. Revista Direito GV, vol. 3, 2006, p. 195-196. 51 Idem, p. 197. 52 Idem, p. 198. 53 Idem. 54 BRANCO, Paulo Gustavo Gonet; MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de Direito Constitucional. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 1370-1371. 55 SILVA, Virgílio Afonso da. Interpretação conforme a constituição: entre a trivialidade e a centralização judicial. Revista Direito GV, vol. 3, 2006, p. 205. 56 POSNER, Richard. Statutory Interpretation - in the Classroom and in the Courtroom. University of Chicago Law Review. vol. 50, 1983, p. 817. 57 Idem, p. 819. 58 "We the people of the United States, in order to form a more perfect union, establish justice, insure domestic tranquility, provide for the common defense, promote the general welfare, and secure the blessings of liberty to ourselves and our posterity, do ordain and establish this Constitution for the United States of America". 59 TUSHNET, Mark. I dissent: Great Opposing Opinions in Landmark Supreme Court Cases. Bostons: Beacon Press, 2008, p. 1-5. 60 Idem. 61 KRAMER, Larry. The people themselves. Popular constitutionalism and judicial review. New York: Oxford University Press, 2004, p. 73-92. 62 Idem, p. 35-72. 63 MICHELMAN, Frank I. Constitutional autorship. In: ALEXANDER, Larry (editor). Constitutionalism: philosophical foundantios. Cambridge: Cambridge University Press, 1998, p. 64-98. 64 SUNSTEIN, Cass R. If People would be outraged by their rulings should judges care? The Social Science Research Network Eletronic Paper Collection: htpp://ssrn.com/abstract_id=965581 65 BELLAMY, Richard. Political constitutionalism: a republican defence of the constitutionality of democracy. Cambridge: Cambridge University Press, 2007. 66 STF, Pleno, ADIn 3.510/DF, j. 29.05.2008, rel. Min. Carlos Brito. Página 14

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67 SARMENTO, Daniel. SOUZA NETO, Cláudio Pereira de. Direito Constitucional: teoria, história e métodos do trabalho. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum: 2014 68 SARMENTO, Daniel. SOUZA NETO, Cláudio Pereira de. Direito Constitucional: teoria, história e métodos do trabalho. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum: 2014, p. 204.

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