O caso católico

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07/05/2015

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O caso católico Embora sejam maioria no país, católicos têm influência política menor do que se supõe porque são menos religiosos e frequentam menos os cultos, diz pesquisa TAGS: eleições, Religião, Rio de Janeiro, São Paulo

Glaucio Soares

Antes de analisar as relações entre religiões e política, é importante saber algo sobre elas. Em uma pesquisa com amostragem probabilística feita no Distrito Federal, que uso porque tinha várias perguntas sobre a religião, fica claro que as religiões não são iguais. A composição social e econômica dos féis das religiões difere muito. Comecemos com o sexo: numa pesquisa que realizei no Distrito Federal, as mulheres representavam 67% do total de fiéis da Igreja Universal e também pesavam muito em outras pentecostais (59%). Entre católicos e protestantes tradicionais, a percentagem era mais baixa (54% e 53%). As diferenças educacionais também eram significativas: a Universal tinha a mais alta percentagem de  analfabetos e de pessoas com primeiro grau incompleto: 45%­20% a mais que os católicos e quase 40% a mais que os espíritas. Ela não estava isolada, uma vez que 33% dos féis de outras igrejas evangélicas pentecostais tinham o mesmo nív el educacional, assim como 40% daqueles das não pentecostais.

Parte considerável da influência de uma igreja se dá através do contato direto com os _éis, incluindo a intensidade e a frequência desses contatos. Os fiéis, por sua vez, influenciam uns aos outros. No DF, os católicos, maioria no Brasil, frequentavam menos a Igreja, seus ritos e suas iniciativas. Na mencionada pesquisa, somente 17% iam à igreja mais de uma vez por semana, em contraste com 51% dos protestantes, 53% dos evangélicos não pentecostais, 55% dos seguidores da Universal e 68% dos fiéis de outras igrejas ev angélicas pentecostais (como a Assembleia de Deus).

Silvia Fernandes, analisando dados  do Catolicismo no Brasil, encontrou diferenças menores, mas na mesma direção: no Rio de Janeiro, os católicos que participavam de atividades da própria igreja mais de uma vez por semana eram 18% do total, ao passo que entre os não católicos essa percentagem era 27%. Em São Paulo, as diferenças eram maiores: 15% e 34%.  As redes sociais dos católicos são mais ligadas a outras atividades, ao passo que, nas denominações mencionadas, a sociabilidade também é variada, mas dentro do grupo religioso. Talvez seja justo dizer que boa parte dos que se declaram católicos são apenas “nominais”, para fins de censo: no Distrito Federal, dois em cada três católicos se consideravam pouco ou nada religiosos.

Síndromes Essas duas constatações – baixa frequência e baixa religiosidade – nos leva à conclusão de que o poder dos católicos baseado nos números está artificialmente inchado. É significativ o o contraste com os ev angélicos, entre os quais apenas um em três se declarav a pouco ou nada religioso.

Essa associação é estatisticamente muito significativa. O caráter hierárquico da Igreja Católica não ajuda a formar redes espontâneas de fiéis. Essas condições contribuem para explicar porque seu êxito político é menor do que o número de fiéis sugere. As características religiosas formam síndromes com variáveis socioeconômicas e políticas. As áreas residenciais evangélicas são as de IDH mais baixo, renda mais baixa, educação mais baixa. Elas têm dado mais apoio a candidatos populistas no Rio de Janeiro, assim como a http://revistacult.uol.com.br/home/2013/09/o­caso­catolico/

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evangélicos como Benedita, Garotinho, Rosinha e Crivella, mas em São Paulo areas semelhantes eram redutos eleitorais dos partidos e candidatos de esquerda, sobretudo do PT. Dada a composição socioeconômica e a distribuição espacial dos evangélicos, fica fácil ver que Russomanno avançou, como afirma Ricardo Kotscho, “principalmente nos redutos petistas das extremas periferias das zonas leste e sul, que votaram em Marta Suplicy nas últimas eleições”. Em São Paulo, Haddad e Russomanno disputam o voto em várias áreas onde Serra não penetra. Além do ambiente fav oráv el nessas áreas, a riv alidade entre petistas e tucanos os impediu de v er que o candidato forte, a ser derrotado, é Russomanno. Quem quiser ganhar as eleições tem que ganhar dele.

Enquanto a principal trincheira de petistas e tucanos é política e econômica, a de Russomanno é religiosa e social. O mundo mudou e tucanos e petistas não se deram conta. A politização evangélica é clara. Em caso de vitória, prevejo a partidarização. Renato Galdino, presidente do conselho político do ministério evangélico de Santo Amaro, teria se filliado formalmente ao PRB. A politização é clara, e vem de cima. Bem de cima, aliás. Segundo o bispo Edir Macedo, Deus tem um plano político: que os fiéis da Igreja Universal do Reino de Deus e os evangélicos que sejam seus aliados governem o Brasil. Essa afirmação é explicitada no liv ro Plano de Poder, escrito com Carlos Oliv eira.

Pode mudar ou a eleição está definida em São Paulo e no Rio de Janeiro? Em São Paulo, com quatro em cada dez votos ainda indefinidos na pesquisa espontânea, há margem para mudança. Porém, além de receber a grande maioria dos votos indefinidos, o candidato teria que receber apoio substancial de Lula. Para evitar a transferência de regiões e bairros inteiros, antes petistas, para candidatos evangélicos, Lula teria que mergulhar na campanha. Ironicamente, esse apoio intenso e ostensivo não favoreceria apenas Haddad, mas Serra também, o inimigo tradicional. Outra possibilidade, politicamente irônica, seria, no segundo turno, Serra apoiar Haddad ou Haddad apoiar Serra. É difícil que aconteça. Diferenças Rio­SP No Rio, o quadro é diferente: o voto religioso é mais antigo e mais estudado. Analisando a votação de Crivella, bispo da Igreja Universal e candidato à prefeitura do Rio de Janeiro em 2004, Sonia Terron sublinhou que ele obteve votações mais significativas nas zonas oeste, Central do Brasil e na Leopoldina. Cesar Romero Jacob, Hees, Waniez e Brustlein escrutinaram as eleições para prefeito e para presidente nas cidades do Rio de Janeiro e em São Paulo, de 1996 a 2010. Concluíram que a votação recebida por Crivella foi forte em “áreas [...] onde a presença de evangélicos é mais expressiva”. Há uma clara correlação, mas também há colinearidade com a baixa renda e outros indicadores de pobreza. Os autores citados concluíram que o caráter religioso da candidatura de Crivella e o caráter antiecumênico que atribuem às igrejas pentecostais teriam levado os eleitores dos bairros mais católicos do Rio a rejeitá­lo. Mencionam que os dados do censo atribuem quase dois terços da população da cidade aos católicos e apenas 1 7 % aos ev angélicos. Creio que os autores superestimaram a significação da declaração censal dos católicos.

Em 2012, Paes, franco favorito, recebe muito apoio de pessoas influentes (Lula, Dilma, Cabral) e de partidos, como o PT e o PMDB. Recebe mais apoio dos evangélicos do que seus oponentes. Porém, se os católicos têm contra  seus candidatos o baixo envolvimento religioso dos fiéis, os evangélicos não formam uma igreja só, mas muitas. No Rio de Janeiro, Crivella alcançou apoio consideravelmente mais alto nas áreas pentecostais do que nas com alta proporção dos eleitores que o IBGE chama de evangélicas “de missão” (luterana, metodista, batista, congregacional, adventista, entre outras). Pelos dados censais, as de missão são mais relevantes no Rio de Janeiro do que em São Paulo – 16% x 11%. O apoio das não pentecostais é eleitoralmente mais importante no Rio do que em São Paulo. As duas capitais não se comportam de maneira igual: embora tenham semelhanças, há importantes diferenças. No Rio de Janeiro, os partidos organizados de esquerda não tiveram a consistente penetração em algumas regiões que tiveram em São Paulo; em contrapartida, líderes populistas como Chagas Freitas e Brizola, o mais conhecido de todos, deixaram marcas profundas na política estadual e municipal. A geografia socioeconômica do Rio de Janeiro é mais simples: como sublinha o cientista político Antonio Carlos Alkmim, todos os indicadores pioram à medida que nos afastamos da orla, dando os contornos para uma geografia eleitoral que se repete há décadas. Porém, as favelas constituem um óbice às generalizações bidimensionais: cobrem perto de 4% do território, são, aproximadamente, cerca de mil e abrigam entre 20 e 25% da população carioca. Dificultam as generalizações espaciais baseadas em zonas e bairros, e exigem unidades de análise menores. Muitas, localizadas nas zonas sul e norte, têm uma composição socioeconômica, religiosa e política marcadamente diferente da zona ou bairro em que se situam. Levando em consideração toda essa  massa de informações, quem ganhará as eleições para prefeito do Rio de Janeiro e de São Paulo? http://revistacult.uol.com.br/home/2013/09/o­caso­catolico/

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