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O “combate à corrupção" e as redes de poder internacional - JOTA

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Uma complexa circulação de quadros com redes conectadas Fabiano Engelmann 06 de Janeiro de 2017 - 07h49

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videnciar os laços que ligam a difusão e construção internacional de uma doutrina do “combate à corrupção” com as ações e operações empreendidas por instituições ancoradas nacionalmente – especialmente em países que se caracterizam pela importação de modelos institucionais –

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pressupõe uma agenda de pesquisa abrangente. Traz, no mínimo, o desafio de analisar duas dimensões profundamente interligadas. As conexões construídas em bases institucionais que unem organismos estatais semelhantes em diferentes países e -o mais importante – apreender a construção das relações estabelecidas com menor grau de formalização entre os agentes envolvidos nas operações de “combate a corrupção” e o espaço da promoção da circulação de expertises e doutrinas políticas. Em uma dimensão, encontramos diferentes perfis de acordos e convênios de cooperação inter-institucional entre frações da burocracia governamental e judicial incluindo organismos que adquirem crescente autonomia política e especialização nessa temática, como ministérios públicos, departamentos de polícia e o poder Judiciário. As coesões que unem o norte e o sul, baseiam-se também em uma complexa circulação de quadros com redes conectadas em menor nível de formalização. Nesse espaço ocorre o compartilhamento de experiências, modelos, ideias e expertises que contribuem para o reforço de doutrinas com fortes repercussões e resultados ainda indeterminados na reconfiguração da política nacional. Integram o espaço de construção da causa do “combate à corrupção”, um conjunto de agentes, organizações e instituições e um catecismo que reivindica sentidos ao mesmo tempo morais, jurídicos e científicos. Os agentes envolvidos circulam em ONGs e think-tanks[1] voltados para a promoção da transparência, modelos de governança e de rule of law incluindo a difusão de expertises voltadas para a instrumentos de mensuração da corrupção. Um dos efeitos de alavancagem nesses circuitos é a adoção por agências de promoção do desenvolvimento, como o Banco Mundial, de indicadores de desempenho institucional formulados nessas bases. Ou seja, a “ciência política” que perpassa as prescrições sobre os modelos de “combate a corrupção” adotados por agências de fomento de programas voltados para ajuda ao desenvolvimento é estreitamente vinculada à promoção de uma doutrina moral e política[2]. A partir da década de 1990, a temática do “combate à corrupção” passa a ganhar maior destaque internacional. A criação da ONG Transparência Internacional na Alemanha em 1993 pode ser tomada como um ponto de referência

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fundamental nesse sentido. Criada por ex-dirigentes do Banco Mundial, a ONG investe na criação e difusão de um “índice de percepção sobre a corrupção” que é adotado por organismos como a ONU e a OEA. No mesmo sentido, outras organizações como a OECD, Banco Mundial, FMI e BID passam a incluir, a partir da década de 90, essa temática nos seus modelos de avaliação de desempenho institucional contribuindo para a profusão de relatórios que hierarquizam os países quanto as práticas de “corrupção ” no setor público e privado. Em 1996, o Banco Mundial lança o Worldwide Governance Indicators com o objetivo de medir a “qualidade da governança” em diversos países servindo como ferramenta para influenciar a formulação de políticas públicas. A composição de um banco de dados sobre governança inclui, entre suas dimensões de análise, a mensuração das iniciativas institucionais de “combate à corrupção”. Entre esses índices, o mais difundido, o “índice de percepção da corrupção” criado pela ONG Transparência internacional é construído a partir da consulta a “especialistas” de cada país ancorando-se predominantemente em informações prestadas por grupos referenciais ligados a setores empresariais. O índice subsidia a produção de relatórios de desempenho que pontuam e classificam os países de acordo com a “percepção da corrupção” no setor público. Em 1996 a, OEA adota a Convenção Interamericana de Combate à Corrupção que foi um dos primeiros instrumentos normativos internacionais com foco em “medidas preventivas” contra atos corruptos. É interessante notar que além de prescrições institucionais que envolvem normas de conduta para o desempenho das funções públicas e modelos de arrecadação fiscal que impeçam a prática da “corrupção”; a convenção indicava a importância de fortalecer mecanismos que estimulem a “participação da sociedade civil” e de organizações não-governamentais nos esforços para prevenir a “corrupção”. A relação com esse espaço internacional de promoção da transparência e governança vinculado a agências internacionais de ajuda ao desenvolvimento, think tanks e Ongs, pode ser apreendida para além dos acordos formais de cooperação firmados pelas burocracias públicas nos percursos dos agentes envolvidos nas operações recentes que tensionam o campo político- representativo no caso brasileiro. Em uma via, na

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“participação técnica” de agências internacionais na transferência de modelos de investigação, coerção e condução das operações ao longo da realização das operações no espaço nacional, como no caso recente da “operação Lava-Jato” . E, em outra via, nas redes reforçadas por freqüentes viagens ao exterior patrocinadas por agências, universidades, institutos e mesmo órgãos governamentais estrangeiros para conferências, palestras ou “compartilhamento de experiências” por parte de lideranças de operações em curso. Também no próprio percurso de formação acadêmica e técnica das lideranças institucionais das operações, muitas tendo participado de programas de treinamento ou obtido títulos de pós-graduação em universidades ou agências estrangeiras especializadas na temática. No caso das operações, esse espaço de construção de redes de cooperação permanece cinzento proliferando iniciativas nem sempre chanceladas estritamente na legislação nacional, como no caso da controvérsia estabelecida na “operação Lava Jato”, em torno dos acordos de delação premiada negociados a partir dos Estados Unidos. [3] Essa perspectiva evidencia os vínculos entre o investimento na propagação de um novo catecismo que une desempenho institucional, modelos de governança e, mais amplamente, uma versão de Rule of Law. As bases desse movimento incluem um moralismo político que transcende as fronteiras jurídicas nacionais e mesmo os princípios da representação política do Estado democrático de direito. Ou seja, o fortalecimento de normas punitivas e incremento dos instrumentos jurídicos de controle de legalidade dos agentes públicos ligam-se a um catecismo político mais amplo. A apropriação dessa doutrina e seu uso por grupos políticos e burocráticos autônomos no interior do espaço nacional, em diferentes conjunturas, ocorre para além de suas bases institucionais e mobiliza a legitimidade também de redes internacionais. O resultado desse processo e seu potencial de (re)configurar ou abalar a representação política ainda está em aberto.

———————————— [1] Para uma análise detalhada do “espaço dos think tanks” e sua relação com a produção de políticas de governo ver MEDVETZ, Thomas. Think tanks in America. Chicago: Chicago University

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Press, 2012. Para a América latina ver ROCHA, Camila. Direita em rede: think tanks de direita na América latina. In: VELASCO e CRUS, Sebastião.; KAYEL, André.; CODAS, Gustavo (orgs.) Direita, volver! O retorno da direita e o ciclo politico brasileiro. São Paulo: Ed. Perseu Abramo, 2015. [2] Ver COEURDRAY, Murielle. Le Double jeu de l’importexport symbolique: la construction internationale d’un nouveau discours sur la corruption. Actes de la Recherche en Sciences Sociales. N. 151-152 (pp 91-90), 2004. [3] Ver MACEDO, Fausto “Oito delatores da Lava Jato negociam acordos fora do Brasil” Jornal O Estado de São Paulo, 06/12/2016. Disponível emhttp://politica.estadao.com.br/blogs /fausto-macedo/oito-delatores-da-lava-jato-negociam-acordosfora-do-brasil/ Acessado em 18/12/2016

Fabiano Engelmann - Professor do PPG Ciência Política da UFRGS e Pesquisador do Núcleo de Estudos em Justiça e Poder Político

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Redação JOTA

Roberto Soares Garcia

InterNews realiza seminário sobre combate à corrupção

Dez propostas de combate à corrupção

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