O Conector Argumentativo \"Já que\" - The Argumentative Connector \"Já que\"

August 9, 2017 | Autor: S. Jorge A. Ramos | Categoria: Linguística, Gramática textual, Conjunções, Conetores Argumentativos
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UNIVERSIDADE NOVA DE LISBOA Faculdade de Ciências Sociais e Humanas

GRAMÁTICA TEXTUAL DO PORTUGUÊS II O Conector Argumentativo "Já Que"

Docente:

Dr.ª Helena Trigo

Discente:

Jorge Ramos

Curso:

Linguística

Ano:

2.º

Data:

17-06-1999

UNIVERSIDADE NOVA DE LISBOA - Faculdade de Ciências Sociais e Humanas Gramática Textual do Português II

CONECTORES ARGUMENTATIVOS Um Conector Argumentativo pode-se definir como um morfema que articula dois ou mais enunciados intervindo numa estratégia argumentativa única como por exemplo: Conjunções de Coordenação, de Subordinação, Advérbios ou Locuções Adverbiais. A articulação dos referidos actos de linguagem (enunciados) intervêm assim na realização de Actos Ilocutórios (argumentação) que apontam para determinada Conclusão, Justificação, Contraste ou simples Adição de enunciados.

O CONECTOR "JÁ QUE" O conector sobre o qual se vai debruçar este trabalho, é uma conjunção subordinativa adverbial causal, estando por conseguinte destinada a marcar "causalidade"; simultaneamente é também um conector Argumentativo do tipo Justificativo: "Já que". Por ser uma conjunção, pode-se também dizer que este tipo de morfema é utilizado na organização do raciocínio do locutor, e consequentemente do(s) ouvinte(s), na medida em que marca a existência de uma ligação necessária entre dois enunciados ou proposições. Este género de conectores (justificativos), apresentam determinadas características particulares, as quais, serão aqui objecto de análise no que diz respeito, como já se frisou, ao conector "já que". Passa-se então à sua enumeração.

POSIÇÃO NO PREDICADO O conector em análise (já que) ao contrário de outro conector do mesmo tipo (justificativos): "pois", pode-se concretizar no começo ou no meio do predicado. Já por exemplo, o conector "pois" somente se pode concretizar no meio do predicado dado requerer um enunciado anterior a ele. Atente-se nos exemplos: (1) Já que sabes grego, vê se consegues traduzir este texto. (2) Vê se consegues traduzir este texto, já que sabes grego. (3) Pois sabes grego, vê se consegues traduzir este texto. (4) Vê se consegues traduzir este texto; pois sabes grego. Compreende-se claramente que o enunciado (3) apresenta um certo grau de estranheza enquanto a passagem do conector "pois" para o meio dos dois enunciados (4) já Página 2 de 6 Docente: Dr.ª Helena Trigo Discente: Jorge Ramos - Curso: Linguística – 2.º Ano

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concedeu ao predicado um maior grau de inteligibilidade. Relativamente aos enunciados (1) e (2) já não se denota qualquer grau de estranheza independentemente da posição do conector. Como segunda particularidade e ainda relativamente à posição no enunciado, reconhece-se que seguidamente ao conector, "já que", surge sempre o enunciado transportador do Argumento do predicado, isto é, se estivermos perante um predicado de dois lugares, sendo um dos predicados a conclusão ou consequência (R) e o outro a razão ou causa (P), este último, surgirá sempre a seguir ao conector, conforme exemplo: Já que

Sabes tudo,

diz lá o que aconteceu.

P

R

Razão/causa

Conclusão/consequência

Ou Diz lá o que aconteceu;

já que

sabes tudo.

R

P

Conclusão/consequência

Razão/causa

Assim, como P é apresentado como uma evidência, da qual se vai deduzir R, torna-se natural que a conjunção se possa posicionar no início do enunciado.

RESPOSTA A QUESTÕES Ainda estabelecendo a comparação com conectores da mesma família, o "já que", contrariamente a "porque", torna agramatical uma proposição que responda a uma questão do género: - Porque é que vais embora tão cedo? (1) Porque estou cansado. (2) Já que estou cansado. Repare-se que a resposta (1) está perfeitamente enquadrada gramaticalmente enquanto a (2) com a utilização do conector "já que" fica dotada de alguma estranheza.

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COMBINAÇÃO COM A CONJUNÇÃO "E" O conector "já que" pode ainda combinar-se com a conjunção "e" sem qualquer problema, facto que já não se consuma com outros conectores do mesmo tipo. Observese a título de exemplo: (1) Irei à aula já que tu insistes e já que hoje é Sexta-feira. (2) Irei à aula pois tu insistes e pois hoje é Sexta-feira. (3) Vou para a praia já que está bom tempo e já que há pouco trânsito. (4) Vou para a praia pois está bom tempo e pois há pouco trânsito. É evidente a agramaticalidade dos predicados (2) e (4). Nos predicados (1) e (3) onde "já que" é utilizado conjuntamente com a conjunção "e", não nos deparamos com qualquer problema de agramaticalidade.

CLIVAGEM E POSIÇÃO DE QUESTIONAMENTO A conjunção "já que" não pode ser encastrada numa estrutura clivada nem usada em posição de questionamento, antagonicamente a, por exemplo, "porque". Repare-se no exemplo: (1) É porque saiu desagasalhado que se constipou. (2) É já que saiu desagasalhado que se constipou. (3) É porque ele comeu pouco que está doente? (4) É já que ele comeu pouco que está doente? A agramaticalidade dos exemplos (2) e (4) corrobora assim o exposto no início deste ponto. Já utilizando o conector "porque", nos exemplos (1) e (3) constatam-se construções perfeitamente admissíveis gramaticalmente.

MODIFICAÇÃO POR ADVÉRBIO "Já que" exclui ainda a possibilidade de modificação por advérbio, o que não acontece com o mesmo conector confrontado no ponto anterior "porque". Focalizemo-nos nos exemplos: (1) Comi pouco, simplesmente porque não tenho fome. (2) Comi pouco, simplesmente já que não tenho fome. Página 4 de 6 Docente: Dr.ª Helena Trigo Discente: Jorge Ramos - Curso: Linguística – 2.º Ano

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(3) Ele chorou muito, provavelmente porque gostava muito do gato. (4) Ele chorou muito, provavelmente já que gostava muito do gato. É manifesta a diferença de aceitabilidade gramatical entre os predicados (1) e (2) e entre (3) e (4). (1) e (3) têm claramente um maior grau de aceitação do que os outros dois onde os advérbios (simplesmente e provavelmente) servem de modificador do conector "já que".

CONCLUSÕES O acto de fala que a conjunção "já que" caracteriza é um acto de inferência, isto é, a proposição P (razão ou causa) é apresentada com tal evidência pelo locutor, que se o ouvinte a aceita, será como que forçado a admitir R (conclusão ou consequência); isto, devido à relação específica que o locutor estabelece entre P e R quando emprega "já que". "Já que" destaca-se ainda pela sua dimensão polifónica, isto é, por uma dissociação entre a instância que profere o enunciado e a que dele se encarrega, que garante a sua verdade. Assim, em {P já que R}, a responsabilidade do ponto de vista sustentado em R é atribuída a uma instância enunciadora distinta, um sujeito indeterminado, o qual, dependendo do caso, poderia englobar o destinatário, a opinião pública, um determinado grupo de indivíduos e inclusive o próprio enunciador, se considerado independentemente da enunciação em causa.

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ÍNDICE CONECTORES ARGUMENTATIVOS .......................................................................... 2 O CONECTOR "JÁ QUE" ...................................................................................... 2 POSIÇÃO NO PREDICADO ..................................................................... 2 RESPOSTA A QUESTÕES ....................................................................... 3 COMBINAÇÃO COM A CONJUNÇÃO "E" .................................................. 4 CLIVAGEM E POSIÇÃO DE QUESTIONAMENTO ....................................... 4 MODIFICAÇÃO POR ADVÉRBIO ............................................................. 4 CONCLUSÕES .................................................................................................... 5 BIBLIOGRAFIA ...................................................................................................... 6

BIBLIOGRAFIA  Vogt, Carlos. 1978, "Cadernos de Estudos Linguísticos", Número 1, Páginas 35-50.  Maingueneau, Dominique. 1996, "Pragmática para o Discurso Literário", São Paulo,

Martins Fontes (Tradução da 1ª Edição Francesa de 1990).  Cunha

e Cintra, Celso e Lindsey. 1997, "Nova Gramática do Português

Contemporâneo", Lisboa, Edições João Sá da Costa.

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