O CONSEQUENCIALISMO AMBIENTAL: ENTRE O FORMALISMO E A EFETIVIDADE DA PROTEÇÃO JURíDICA DO MEIO AMBIENTE

July 27, 2017 | Autor: GAbriela Lima | Categoria: Environmental Law, Consequentialism
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coordenadores Guilherme José Purvin de Figueiredo Marcelo Abelha Rodrigues

ISSN 1517-9192

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Revista de Direitos Difusos

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Diretor Executivo: Guilherme José Purvin de Figueiredo. Apoio institucional: IBAP - Instituto Brasileiro de Advocacia Pública; APRODAB - Associação dos Professores de Direito Ambiental do Brasil; JROAM - Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental; NIMA-Jur Núcleo Interdisciplinar de Meio Ambiente da PUC-Eio, AADA - Asociación Argentina de Derecho Administrativo, ABRAMPA - Associação Brasileira do Ministério Público do Meio Ambiente e Grupo de Pesquisa Direito Ambiental na Sociedade de Risco/ UFSC. Supervisão Editorial:

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L)t'iii 1)fuss

y ciencias socjales: perspectivas latinoamericanas. Buenos Aires: CLACSO, 2000. LNIiN1, Nina [Coord.]. Direito à educação. São Paulo: EDUSP, 2009. . Direito à educação: igualdade e discriminação no ensino. áo l'aulo: EDUSP, 2010. SAlOMÃO FILHO, Calixto; FERRÃO, Brisa Lpes de Mello; RIBEIRO, Ivan César. Concentração, Estruturas e Desigualdade: As origens coloniais da pobreza e da má distribuição de renda. São Paulo: Idcid, 2006.

O CONSEQUENCIALISMO AMBIENTAL: ENTRE O FORMALISMO E A EFETIVIDADE DA PROTEÇÃO JURíDICA DO MEIO AMBIENTE

SANDEL, Michael J. Justiça: o que é fazer a coisa certa. Tradução de I-Ieloísa Matias e Maria Alice Máximo. S. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2012. SANTOS, Boaventura de Sousa. Reconhecer para Libertar: os Caminhos do Cosmopolitismo Multicultural. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.

Gabriela Garcia Batista Lima'

RESUMO

SANTOS, Gislene Aparecida dos. Reconhecimento, utopia, distopia: os sentidos da política de cotas raciais. São Paulo: Annablume, 2012.

A presente análise busca compreender um pouco mais sobre o consequencialismo ambiental no direito: analisando os argumentos jurídicos consequencialistas e o fundamento do direito nas fases pré-. -legislativas, legislativa e aplicação do direito. Em seguida, busca-se ilustrar tal análise com alguns exemplos específicos, distintos entre si, mas que mostram importantes vertentes do direito ambiental no Brasil: a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 101, ilustrando a relação entre o Estado, direito ambiental e comércio; a Ação Popular 3388, da Raposa Serra do Sol no Superior Tribunal Federal (STF), mostrando a relação entre atuação Estatal e os direitos indígenas; e, em terceiro lugar, o Habeas Corpus (HC) impetrado a favor de dois chimpanzés, no Superior Tribunal de Justiça (STJ, HC 096344), ilustrando a relação entre o Estado e a proteção dos animais. Uma análise do consequencialismo no direito ambiental vista aqui deixar claro como o fundamento consequencialista é importante para a efetividade do meio ambiente. Longe de finalizar o assunto, a presente análise objetiva inspirar o debate em torno do tema, que se amplie para esses elementos e outros que possam ser fomentados pela pesquisa jurídica.

YOUNG, Iris Marion. Structural Injustice and the Politics of Difference. In: LENZ, Günter H; DALLMANN, Antje [Orgs.1.Justice, Governance, Cosrnopolitanism, and the Folitics of Difference: reconfigurations in a Transnationa World. Berlin: Humboldt-Universitãt, 2007.

1 Dou toranda em Direito. Doutorado em cotutela pelo Centro Universitário de Brasília com a Université Aix-Marseille III. Mestre e Bacharel em Direito. Especialista em direito internacional ambiental. E-mail para contato: [email protected] . 1114

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Palavras-chave: Consequencialismo ambierital. Direito Ambiental. Argumentação Jurídica.

ABSTRACT The present analysis aims to understand a little more about the consequentialisrn in environmental Iaw by analyzing the legal arguments in environmental law, that are consequencialists before the law making, in the legislative process and in law enforcement. Then, this study try to iliustrate this analysis with specific examples, distinct from one another, hut important, because they show different aspects of environrnental iaw in Brazil: the "Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental" ADPF 101, illustrating the relationship between the State, environmental law and trade, the Popular Action 3388, of the "Raposa Serra do Sol" in the Federal Supremo Court (from Portuguese, STF), showing the relationship between State action and indigenous rights, and, thirdly, thc Habeas Corpus on behalf of two chimpanzees (ETC 096 344), iii the Superior Court of Justice (STJ), illustrating the relationship hetween the state and protection of animals. An analysis of consequentialism in environmental law make clear that the environmental consequentialism is important for the effectiveness of the environment protection. Far from finishing the subject, this analysis airns to inspire debates around the theme. Keywords: Environri s.'ntal consequentialism. Environmental Law. Legal argurnents.

INTRODUÇÃO Em julho de 2009, foi julgado o caso dos pneus no Superior Tribunal Federal (STF), pela Arguiçãn de Descumprimento de Preceito Fundamental - ADPF 101- A ação buscava anular algumas decisões judiciais, que permitiam a entrada comercial de pneus usados no Brasil. Um dos efeitos da ação foi consolidar a política socioambiental do Poder Executivo, que impedia o comércio internacional de pneus usados diante de medidas de proteção da saúde e do meio ambiente no país. Dentre os aspectos jurídicos possíveis de serem trabalhados no julgamento da ADPF, chama-se aqui atenção para um ponto específico, que diz respeito à uma análise de argumentação jurídica e efetividade da 116

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proteção ambiental: o caminho que os argumentos tomavam no momento da decisão de conhecimento da ação. O julgamento da ADPF é útil para ilustrar o embate possível de ser sugerido entre o consequencialismo e o formalismo na argumentação jurídica ambiental. Isso se percebe pelo argumento do Ministro Marco Aurélio, que era contrário ao entendimento dos demais ministros, no que dizia respeito ao conhecimento da ADPF: enquanto todos julgavam pelo conhecimento da ADPF, justificando pela relevância das conseqüências da decisão para a efetividade do desenvolvimento sustentável, o Ministro Marco Aurélio, que teve o voto vencido, era contra o conhecimento, tomando como base um aspeÇto formal do direito, esclarecendo que a matéria apreciada não era matéria cahíci em ADPF, mas sim em ação rescisória. Um argumento nesse sentido pode ser interpretado como formalista, no sentido de se prevalecer a forma do direito, ao invés da proteção do meio ambiente. A priorização de das consequências ambientais em detrimento de elementos formais é, para esse artigo, um aspecto do consequencialismo ambiental. Por outro lado, o argumento do Ministro pode ser tido como consequencialista se raciocinarmos que o Ministro objetivava evitar as consequências de se permitir o uso aparentemente inadequado dc uma forma jurídica, que abriria, pois, um precedente para demandas semelhantes. O consequencialismo orienta-se para quais consequências estamos, de fato, falando; consequências para o meio ambiente, consequências para o mundo processual, etc.. Ainda que pareça redundante, é preciso explicar esse aspecto. Estamos falando aqui do consequencialismo ambiental, ou seja, da consideração das consequências de urna decisão para o meio ambiente, e, nesse sentido, o argumento do Ministro Marco Aurélio é, para essa análise, formalista. Esse embate entre formalismo e consequencialismo ambiental chama atenção para a seguinte questão: cru termos de efetividade da proteção ambiental, o caminho da argumentação jurídica deve priorizar o consequencialismo ambiental, o irnpactd da decisão para o objetivo de proteção ambiental, sob pena de falta de efetividade da norma jurídica e a causa de danos à saúde humana. Por outro lado, é possível apresentarmos a insuficiência da estrutura gerada pelo viés consequencialista da proteção ambientai, quando centraliza a construção da efetividade dessa proteção no Estado. E uma insuficiência relacionada à estrutura de nossa proteção jurídica ambiental, coni as consequências econômicas e sociais, decorrentes da intervenção estatal em prol do meio ambiente. E o que podemos ver nos 117

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casos da Raposa Serra do Sol e no caso dos Chimpanzés, de diferentes in aneiras. O caso da Raposa Serra do Sol trata-se da Ação Popular 3388 no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Estava em questão a demarcação de terras para algumas populações indígenas, exploração das terras por arrozeiros. O mérito dizia respeito à declaração de nulidade da Portaria 534, que havia sido questionada corno inconstitucional por não condizer com os poderes dados ao Executivo pela Constituição. A nulidade não ocorreu, tendo a legalidade da Portaria sido reconhecida em prol dos direito indígenas, tendo a sentença da referida ação, efeito mandarnental condicionante. O formalismo foi desconsiderado ao se consolidar urna situação nova via Portaria, e, portanto, for.a dos poderes coostitucionais de regulamentação pelo Executivo. Muitas famílias não ind genas, arrozeiros, entre outros, ficam em situação complicada. O outro exemplo, o caso dos Chimpanzés, é aqui relacionado ao } labeas Corpus (HC) 096344, em 2007, à favor de dois Chimpanzés que nrarn apreendidos porque sua origem estava irregular. Todavia, porque não se cabe HC à favor de animais, houve falta de objeto. O caso foi julgado improcedente. O formalismo prevalece e nesse caso em específico nos permite pensar a relação homem-natureza que podemos criar. Nesse caso dos Chirnpanzés, dentre os vários aspectos que podemos estudar, linotamos aqui para a observação de que a proteção dos animais se perde, diante da impossibilidade de readaptação dos animais principalmente por serem exóticos, em relação ao ambiente brasileiro e por não serem selvagens, houve quebra da relação afetiva deles com o seu dono. Esse raciocínio levanta alguns debates já antigos na teoria do ditão: a relação entre direito e moral, principalmente no sentido de ir ou não para além do formalismo jurídico; e, de outro lado, a relação entre direito e a justiça, sendo esta última personalizada pelo equilíbrio enLa' interesses econômicos, sociais e ecológicos no momento da realizada norma. Ambos os debates têm em seu eixo de decisão, escolher Imitar-se ao cumprimento da forma, ou buscar considerar também as eo:it'qüências da decisão. Longe de finalizar o assunto, a presente análise objetiva inspirar ta te em torno do tema, que se amplie para esses elementos e outros que possam ser fomentados pela pesquisa jurídica. Na medida em que o consequencialismo se torna mais claro, normalmente existe uma priorização de quais consequências, em verdade, estamos dispostos à lidar. É o peso argumentativo das escolhas: o consequencialismo ambiental se torna capaz de ultrapassar um formalismo jurídico, ou vice-versa. 118

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A presente análise busca compreender um pouco mais sobre o consequencialismo ambiental no direito, e, logo em seguida, busca-se ilustrar tal análise com o estudo de casos específicos, distintos entre si, mas que mostram importantes vertentes do direito ambiental. O primeiro caso trata da já mencionada ADPF 101, ilustrando a relação entre o Estado, direito ambiental e comércio; o segundo é o caso da Raposa Serra do Sol no STF (Ação Popular 3388), mostrando a relação entre atuação Estatal e os direitos indígenas; e, em terceiro lugar, ocaso do Habeas Corpus impetrado a favor de dois chimpanzés, no STJ (FIC 096344), ilustrando a relação entre o Estado e a proteção dos animais. Uma análise do consequencialismo no direito ambiental vista aqui deixar claro como o fundamento consequencialista é importante para a efetividade do meio ambiente.

1. UMA ANÁLISE DO CONSEQUENCIALISMO AMBIENTAL NO DIREITO O consequencialismo em sentido amplo, como já mencionado, é atentar-se para as diferentes repercussões em uma escolha, o que, em direito ambiental, comporta uma raiz do surgimento desse âmbito jurídico, relação essa que pode ser bem ilustrada tanto pelo entendimento da sociedade de riscos, quanto pelo campo da argumentação jurídica. Segundo Atienza, o estudo da argumentação jurídica pode ocorrer em pelo menos três campos jurídicos onde ocorrem argumentações. O primeiro consiste na produção de normas jurídicas, percebendo-se argumentações ocorrendo tanto em uma fase pré-legislativa, quanto em uma fase legislativa e, como um terceiro campo de argumentação, a dogmática jurídica 2 . Veremos o consequencialismo nesses campos.

1.1 O CONSEQUENCIALISMO NA FASE PRÉ-LEGISLATIVA DO DIREITO AMBIENTAL Na fase pré-legislativa, os argumentos se efetuam como conseqüência do surgimento de um problema social, que suscita a criação de uma norma para sua regulamentação, tendo forte conteúdo político. É a própria relação entre direito e política, na apreciação dos riscos ambientais. Ora, o próprio surgimento do arcabouço jurídico para a proteção 2 ATIENZA, Manuel. As razões do direito: teorias da argumentação jurídica. 3' Ed. São Paulo: Landy, 2003, p18- 19

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ambiental surgiu nessa clivagem de se considerar os diferentes impactos das ações do homem, racionalizar suas decisões. Historicamente, a proteção ambiental começa a ganhar espaço no direito internacional a partir dos anos 60, a fim de tratar de problemas arnhientais até então locais ou regionais 4, ao cxemplo de casos famosos como o do Silent Sprinç, nos Estados Unidos, das usinas químicas construídas na Baía de Minamata, no Japão, em 1957, Chernobyl, dentre outros, fizeram emergir normas tratados que, por sua vez tiveram forte influência na formação dos direitos ambientais nacionais e vice-versa. As normas apresentam-se como a consolidação da constatação dos riscos ambientais, e o consequencialismo é uma característica que compõe tal constatação. A definição do risco é a tomada de decisão em torno de um fato, ponderando-se, no campo das conseqüências possí'eis, o limite que julgam suportável ao homem, apresentando um aspecto político, uma avaliação política do aceitável, do permissível, do que deve ser seguro fazer. 5 Os diferentes riscos, com destaque para os riscos ecológicos, fomentam as discussões políticas em torno da regulamentação das atividades sociais, um aprendizado com as conseqüências já sofridas e uma busca por prevenir-se e precaver-se. Ora, o que seria essa compreensão senão urna forma de explicar os princípios bases do direito ambiental: o da prevenção (risco conhecido) e o da precaução (risco desconhecido)? A partir daí, percebemos que os atores começam a fomentar normas para tratar dos problemas ambientais, quando, então, podemos analisar o consequencialismo na fase legislativa.

1.2 O CONSEQUENCIALISMO NA FASE LEGISLATIVA DO DIREITO AMBIENTAL A fase legislativa engloba argumentos técnico-jurídicos para compor o ordenamento jurídico vigente 6 . Seguindo os ditames da fase .3 Para um histórico do direito do desenvolvimento sustentável no campo ambiental: KISS, Alexandre, Introduction to International Environmental Law, 2 Revised £:d i t un , UNÍIAR, Geneva, Switzerland, 2005, p. 28-29. E também, SACHE, Ignacy. l)esenvolviinento sustentável: do conceito à ação de Estocolmo a Joanesburgo. lo: VAREL1,A, ivhircelo Dias; BARROS-PLATIAU, Ana Flávia (orgs). Proteção internacional do meio ambiente. Brasília: UN1TAR, UniCEUB e UnB, 2009, p. 37-48, p. 41 4 ['ORTER, Gareth, BROWN, Janet Welsh; CHASEK, Pamela S, Global environmental politics. 3. cd. United States of America: Westview Presa, 2000, p. 01-02. 5 LUI -[MANN, Niklas. Risk: a scciological theory. New York: Aldine de Gruyter, 1993, p30. 6 ATIENZA, Manuel. As razões do direito: teorias da argumentação jurídica. 3' Ed, São Paulo: Landy, 2003, p18- 19

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pré-legislativa, as normas são o produto das transformações na ciência e na política em torno da tomada de consciência acerca de um determinado problema ambiental 7. E o direito é utilizado em seu papel de buscar conscientizar e controlar as conseqüências das ações humanas. A formação de normas jurídicas ambientais, para lidar com as conseqüências das ações humanas, se manifesta em dois níveis: o da dimensão individual e outra institucional. A dimensão individual é decorrente da conscientização dos cidadãos relativamente à perenidade dos recursos e à necessidade de contribuir para a preservação da natureza, emergindo uma opinião pública acerca da necessidade de proteção ambiental; e o da-dimensão institucional, é a criação de departamentos nos governos ligados ao meio ambiente. O fundamento consequencialista perrneia também o âmbito legislativo, na construção da eficácia jurídica ambiental. Primeiro pela clara roupagem de racionalização das ações humanas: o direito vem regular a interferência humana no meio ambiente, para garantir uma sustentabilidade para gerações presentes e futuras 5. Em segundo lugar, constituem-se com base em fundamentos consequencialistas, os princípios constitucionais de direito ambiental, contidos no artigo 225 da Constituição Federal, corno o princípio da prevenção, desenvolvimento sustentável, participação, informação, dentre outros. Repercutem, por sua vez, nos diferentes instrumentos de proteção arnbicntal, previstos na Política Nacional do Meio Ambiente, como o licenciamento ambiental, estudos de impacto ambiental, zoneamento econômico ambiental, dentre outros. O consequencialismo ambiental na legislação traduz-se para a necessidade de racionalização das ações humanas. É o que se espera da boa governança de um Estado, a dual diligência 9 de produzir legislação e criar um controle administrativo para a efetividade dessa legislação. 7 ANDRESEN, Steinar; SKJAERSETH. Science and techrtology from agenda setting to implementation. In: BODANSKY, Daniel; BRUNNEE, Jutta; HEY, ElIen. The OXFORD handbook of international environmental law. OXFORD Llniversity Press Inc., New York, 2007, p. 182-204, p. 183. 8 O conceito de desenvolvimento sustentável foi expresso só em 1987, pelo Relatório da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, como "o desenvolviinento que satisfaz as necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras para satisfazerem as suas próprias necessidades". Significa suprir as necessidades essenciais dos seres humanos, como a alimentação, vestuário, habitação e emprego e lhes dar oportunidades de satisfazer suas aspirações por uma melhor qualidade de vida. 9 BIRNIE, Patricia; BOYLE, Alan. International Law & the environment. Second Edition. Oxford University Press, 2002, p. 112.

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í\ lógica consequencial ista repercute, assim, no campo de constituição da lógica técnico-jurídica do direito ambiental, tendo o Estado o principal ator para a formação dessa proteção. Contudo, aqui podemos perceber uma repercussão complexa do consequencialismo ambiental. Como protetor do meio ambiente, o Estado age intervindo na economia, o que implica em uma recepção negativa das normas arnbientais por parte dos empreendedores, que as enxergam não como ações importantes para proteger o meio ambiente, mas como um custo a mais nas suas atividades. Sem uma argumentação consequencialista, é muito difícil alterar essa recepção negativa da norma para uma efetividade espontânea, sem a necessidade de mecanisrnos de controle e sanção. Nesse sentido, a atuação estatal toma-se por natureza insuficien[e, por duas principais razões. A primeira é justamente a recepção nor malmente negativa das normas ambientais que são vistas como entrave .'i realização de qualquer negócio econômico. A segunda é que envolve muito mais que apenas interesse de proteção ambiental muitas vezes envolve interesses comerciais, de proteção indígena, de proteção da vida dos animais, o que torna complexo a procura pela solução justa em um conflito de interesses. É importante percebemos outras clivagens do consequencialismo como fundamento do direito ambiental e nas técnicas jurídicas de sua fase legislativa, em especial, a econômica, juridicamente, a recepção em sentido econômico das normas ambientais é negativa, no sentido de ser vista como um dever a mais, um custo a mais para a realização de alguma atividade: trata-se da recepção de um dever ser que interfere no modo de agir do interlocutor, acrescentando algo que tenha que levar em conta, ao atuar. Esse sentido negativo da recepção econômica da norma não é na sua fase pré-legislativa, mas é conseqüência de uma fraca argumentação consequencialista econômica nesta fase, diante de uma prevalência da argumentação consequencialista ambiental na discussão dos riscos e necessidades de prevenção e precaução de danos ambientais. Tendo a eficácia jurídica ambiental tomado essa forma consequencialista quase que puramente ambiental, a interpretação para as outras repercussões de uma decisão fica à critério da interpretação da norma, é quando percebemos a importância da expansão consequencialista na aplicação da norma.

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1.3 O CONSEQUENCIALISMO NA APLICAÇÃO DA NORMA Como terceiro campo de argumentação jurídica, temos a parte dogmática, aqui ilustrada pela aplicação da norma. O conscquencialismo no momento da aplicação da norma corresponde a uma forma de racionalização, de justificação da decisão. A racionalização, por sua vez, está diretamente relacionada com a compatibilidade da regra com os valores e projetos devida da sociedade. Trata-se da justificação da decisã&°. Com respaldo na teoria de argumentação jurídica de MacCormick, vale destacar que a justificativa da decisão não se confunde com o dever de sentenciar. Explica o autor que o pronunciamento da sentença não decorre de um argumento, é um dever; não decorre dc lógica, é um ato convencionado. A qualidade normativa pode ser estabelecida pela lógica, mas o ato da decisão em si não, a sentença não é um produto da decisão da lógica da argumentação que a justifica. A sentença é um dever, como já dito, o juiz precisa declarar suas razões de decisão. Essa distinção desmascara e mostra o como as sentenças se mostram como se dedutivas fossem, mas o ato em sim não o é 11 Reconhecer esse ponto, segundo o autor, é reconhecer uma nor-ma como formalmente válida. Entretanto, a validade formal não garante a veracidade da conclusão; se são verdadeiras ou não, é uma questão empírica, ao envolver outros elementos, cuja legitimidade permeia os fatos, provas e mesmo contexto histórico e entendimento herrnenêutico apresentado, e eis um aspecto da importância da justificativa. Considerar as consequências, nesse sentido, deve ser feita de forma que a decisão possa ser universalizável, esteja coerente com os princípios envolvidos, e esteja consistente com o sistema jurídico em que se insere. O consequencialismo, nesse sentido, não tem apenas uru norte fático, de se analisar as conseqüências da decisão do ponto de vista dos fatos envolvidos, mas sugere também a apreciação para as consequencias da decisão para o ordenamento jurídico, dada a possibilidade de sua aplicação a casos futuros também. Assim, diante da possibilidade de escolha entre as lute rpretaçóes possíveis de uma justificativa, ainda que aparentemente dedutiva diante .

10 MACCORMICK, Neil. Argumentação jurídica e teoria do direito. Tradução Waldéa Barcelios. São Paulo: Martins Fontes, 2006, p. 05. li MACCORMICK, Neil. Argumentação jurídica e teoria do direito. Tradução Waldéa Barceilos. São Paulo: Martins Fontes, 2006, p. 41

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da sua justificativa, ter sido oriunda de um ato de escolha dentre as possibilidades possíveis e não de urna dedução vinda de urna única possibilidade. O juiz pode esclarecer uma ambiguidade, escolhendo um dos significados possíveis e apresentando sua justificativa de forma dedutiva. Da mesma forma, pode escolher uma boa razão, na ausência de lei ou precedente, justificando-a e pode escolher retratar determinado fato como se direito fosse, opinando a respeito. Vimos até aaui, urna análise do consequencialismo tias fases pré-legislativa, legislativa e na fase de aplicação da norma. Em todas elas, percebe-se a importância do consequencialismo como fundamento da norma ambiental, e que deve ser considerado na construção dos instrumentos de proteção arnbiental, e também na aplicação da norma. Entretanto, principalmente na fase legislativa e na aplicação da norma, a atuação do Estado não é suficiente para a efetividade do desenvolvimento sustentável, principalmente em razão dos diferentes interesses envolvidos. O consequencialismo não deve ser só ambientai, mas econômico, social, político. São os interesses que estão em jogo e que devem perniear a argumentação jurídica na busca da solução justa para o caso concreto, não se linutando o direito ambiental, ao formalismo jurídico. Veremos, tais questões, em uma breve análise de três casos distintos entre si, mas que ilustram clivagens importantes do direito ambiental: o caso doS pfleu., o caso da raposa do sol e o caso do chimpanzé.

2.0 CONSEQUENCIALISMO NO DIREITO AM BIENTAL: O EXEMPLO DA ADPF DOS PNEUS, DA AÇÃO POPULAR DA RAPOSA SERRA DO SOL E O HC DOS CHIMPANZÉS O consequencialismo ambientai na aplicação do direito é diretamente relacionado à efetividade jurídica tida como justa para a conclusão de um caso, é, pois, ponderar as repercussões da decisão para os interesses e conseqüências sociais que estão em questão. Para tanto, veremos alguns exemplos. Iniciando pelo exemplo dos pneus, dois caminhos poderiam ter sido tomados: um que faria prevalecer o formalismo jurídico, conforme o voto do Ministro Marco Aurélio; e outro que faria prevalecer o consequencialismo no direito a riibiental, conhecendo da ação para tratar da decisão que proibiu a entrada de pneus. E foi justamente porque os ministros levaram em consideração as conseq0ências da decisão para a promoção da proteção de aspectos ambientais e sociais, que foi possível 124

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uma solução a favor do desenvolvimento sustentável pela decisão da ADPF. O consequencialismo aqui fez sobrepor um requisito formal em nome da proteção ambiental e desenvolvimento sustentável. Fez parte da justificativa da decisão, a repercussão que essa teria para a saúde da população, diante das conseqüências que teríamos em termos de surtos de dengue, e poluição da terra, principalmente. Se a decisão permitisse a entrada de uma quantidade imensa de pneus usados, apenas lidar com infrações ao livre comércio, certamente teríamos hoje fatos de poluição e saúde pública que poderiam ser levantados diante da dificuldade de se dar destinação final para tantos pneus. Nesse sentido, é um ponto importante do direito ambiental, sua característica utilitarista, para além de sua característica como parte de um corpo jurídico, devendo, portanto, ser fiel também a um formalismo jurídico. Outro caso polêmico que, entretanto, permaneceu-se um argumento a favor da forma jurídica, diz respeito ao Habeas Corpos impetrado pelo fiel depositário de dois chimpanzés para a soltura e devolução dos chimpanzés "Liii" e "Megh", de nome científico Pan Troglodytes, no Superior Tribunal de Justiça, o HC 096344, em 200712. Os animais foram apreendidos porque sua origem não estava regularizada, não havia como afirmar sua posse ao depositário. No caso dos Chimpanzés, o argumento principal do depositário era, dentre outras coisas, de que a apreensão estava sendo uma lesão à liberdade e saúde dos animais, e pretendia voltar a ter a posse deles. Saúde principalmente pelo afeto que tinham um com o outro. Ao julgar o caso, o relator, Ministro Castro Meira considerou incabível o HC, pois não era a favor de um ser humano, a previsão legal para tal impetração, julgando improcedente, sem resolução de mérito. Esse último é um exemplo de quando se prevaleceu um argumento formal e não consequencialista, e, se consideramos o argumento e provas dadas pelo fiel depositário, de que os animais eram acostumados e felizes à vida que tinham antes da sua apreensão, a proteção desses animais foi prejudicada. Entretanto, foi mantida a consistência da regra encontrada com o ordenamento jurídico vigente. Esses dois casos demonstram bem a importância de argumentos consequencialistas para a proteção ambiental e, da mesma forma, mostram a possibilidade de diferentes escolhas, cabíveis de serem justificadas. E que ambas possuem urna clivagem de concordância com os

12 HC 096344. Acesso 0.3.08.2012.

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valores e projeto de boa vida, pela consistência ou coerência, importa observar que é cabível uma escolha entre interpretações, formais ou consequencialistas. Contudo, a vertente consequencialista tem relação direta com a efetividade do direito ambiental, no Seu fundamento de proteger o meio ambiente. No caso dos Chimpanzés, estes já tinham uma qualidade de vida, que poderia ter sido mantida pelo particular, se cabível a ação. Por outro lado, corno aspectos mais técnicos e também importantcs para a efetividade jurídica da proteção ambiental e desenvolvimento sustentável, em ambos os casos, foi reproduzida a obrigação estatal para com o meio ambiente: na ADPF, a proibição estatal foi mantida, mas também se tornou imperativo regulamentar a destinação final dos pneus. Foram tomadas as devidas providências de destinação final para o comércio nacional de pneus. No caso dos Chimpanzés, não cabendo o 1 labeas Corpus, cabia ao Estado dar a qualidade de vida aos animais; o ic foi perdido, entretanto, foi a oportunidade de dividir essa responH com uru particular. a é uma interpretação possível, afinal, fundamentada em uma .0 conseqLiencialista, contudo, que leva em consideração tamo ao a insuficiência do Estado para lidar com a responsabilidade ambienLI em geral. Logicamente o ideal teria sido obter autorização prévia do o;.;ão ambiental responsável, ou talvez, associar-se a algum zoológico, outro caminho em conjunto com a administração póblica ambiental. outro lado, permitir a ação seria aceitar o consequencialismo do ponvista da repercussão das ações para a efetividade do direito, tendo i vista a insuficiência do Estado, de modo geral, o que seria descentralizar a responsabilidade arribiental estatal para dividi-la com o particular que se dispôs a cuidar dos aruimais, por meio do judiciário. Outra análise interessante de um viés de consequencialismo amhiental é a ação popular do caso da Terra Indfgena Raposa Serra do Sol, no Estado de Roraima. A questão indígena de autodeterminação econômica e cultural é uma reivindicação histórica, assim como a necessidade de implementação de desenvolvimento sustentável, situação dos arrozeiros e outras famílias não indígenas. Ainda que se tenha reconhecido direito dos povos indígenas, é urna questão de etnodesenvolvimenlo. O etnodesenvolvimento inclui uma abordagem ética e finalista dos processos desenvolvimentistas, levando-se em consideração as consequências que programas de desenvolvimento não adaptados podem levar aos povos indígenas 0 . Parece a melhor solução reconhecer 13 F!LOCF-IE, Geoffroy. Ethnodéveloppement, Développerneni durable ei droit en ArnaLonie. (Tradução Livre). Bruylarut, Bruxelies, 2007, p. 25.

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o direito dos povos indígenas, mas a questão dos arrozeiros e outras famílias também não pode ser deixada de lado. Existe, no entanto, uma incomensurabilidade nos elementos em jogo e um peso histórico em prol dos indígenas. A decisão julgou parcialmente procedente, reconhecendo a demarcação da terra para as populações indígenas que lá residem, e ordenou a gestão para o Instituto Chico Mendes, no âmbito do Parque Nacional do Monte Roraima, unidade de conservação que coincide com a terra indígena, dentre outra5 14. A sentença, reconhecendo a Portaria, criou situação nova, por seu efeito rnandamental além de condenatório' 5 afirmando os direitos dos indígenas à favor de suas terras, em detrimento de não indígenas que ali se encontram, que foram condenados à sair. Destarte, a análise acima delineada, embora limitada somente a três exemplos, possuem algumas considerações interessantes. Os casos foram capazes de demonstrar as diferentes escolhas possíveis, em casos envolvendo direito ambiental e desenvolvimento sustentável. Mostrou também a importância de argumentos consequencialistas, por serem capazes de chegar mais próximo ao objetivo de proteção do meio ambiente e também como a preponderância de um ponto formal é consistente com o ordenamento.

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3. CONCLUSÃO No estudo proposto, buscou-se analisar, ainda que brevemente, o consequencialismo no direito ambiental, nos momentos pré-legislativo, legislativo e aplicação da norma. As considerações resultados dessa pesquisa subsidiaram uma posterior reflexão acerca da efetividade pelo estudo de alguns exemplos polêmicos na Justiça. O consequencialismo em direito ambiental é um campo em que o formalismo jurídico não é dado suficiente. A questão - teórica - vem a ser compreendida na prática: ir para além do formalismo jurídico pode ser visto como buscar uma adequação do direito para os objetivos diante dos quais ele foi formado. É trabalhar o direito haja vista uma visão utilitarista, já que ilustra uma interface com os objetivos políticos da sociedade no momento da aplicação das regras jurídicas. Nesse sentido, o consequencialismo pode ser visto como ponte entre o direito e o ideal 14 PET 3388. Disponível em: Acesso em: 0308.2010. 15 SILVA, Flávia Regina Ribeiro. Ação Popular Ambiental. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008, p. 216.

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D i tuios Dijuos

de vida boa coletiva ou individual. Tem relação direta com a atuação do Estado como principal ator na construção da eficácia e efetividade do direito ambiental. Na fase pré-legislativa, de constituição das normas, essa relação entre o consequencialismo e o direito ambiental deixou clara a ponte entre direito, política e moral. O consequericialismo pôde ser vislumbrado na construção da norma ambiental, refletido nas discussões e definições em torno do risco ambiental. A conceituação de risco é justamente o resultado de um debate político em torno das ações humanas, racionalizando para apreciar quais conseqüências eram julgadas como suportáveis pelo homem. Sendo esses resultados (os riscos) normatizados, os riscos ambientais demonstram, então, a relação entre direito e política e entre direito e moral, e a norma reflete então o que foi convencionado como um bom projeto de vida e de atuação na sociedade. Tais características sugerem para um conceito de direito que inclua elementos morais. Talvez, seja esse en.foque que permite a possibilidade de se levantar argumentos consequencialistas no momento da aplicação da norma, se a efetividade jurídica de uma norma ambiental, nesse sentido, sugere a concretização do projeto de boa vida envolvido na norma. O consequencialismo perrneia então, a relação entre direito, política e moral no direito ambiental, de forma que o conceito de direito aciui, envolve aspectos morais, decorrentes de todo um debate político e ponderação de diferentes interesses. Constituída a norma, importa observar que o consequencialismo também repercute na fase legislativa, dogmática jurídica, na construção da lógica de apreciação da proteção ambiental, do como se tratar tais questões ambientais. O papel do Estado, que tem posição importante na estrutura da efetividade do direito ambiental, apresenta, contudo suas limitações. Ao mesmo tempo, essas limitações refletem a importância do judiciano e da argumentação jurídica; e, de outro lado, a necessidade de o consequencialismo para com as repercussões da decisão. O consequenciolismo pode fazer parte da justificativa da decisão, ou seja, o processo de cirgurnentação jurídica considerada racional. A racionalidade estará ligada com a relação entre a regra encontrada na interpretação e os valores e projeto social refletido nas normas e princípios jurídicos. Os casos trazidos como exemplos permitiram ilustrar o processo de justificativa como feito após uma escolha entre interpretações possíveis, ora prevalecendo aspecto formal, ora aspecto material. O consequencialismo ambiental se deu tio reconhecimento da importância ch AÍ)l'F 101 para a proteção ambiental, além da importância da Ação 1. 2í

Popular 3388 para os direitos indígenas. Por outro lado, muitos aspectos econômicos e sociais decorrem de tal decisão. No entanto, mesmo com as consequências não ambientais de urna decisão em prol cio meio ambiente, o consequencialismo ainda é a via importante para a efetividade jurídica ambiental. Se tornarmos o exemplo dos Chimpanzés, o formalismo incorreu em detrimento da saúde desses animais. Nesse sentido, a efetividade do desenvolvimento sustentável tem suas variáveis nas falhas e pontos fortes da estrutura jurídica voltada para tanto, e também na ausência ou presença de um posicionamento moral compatibilizado com a ética que tal objetivo envolve. Talvez essa seja a conclusão obvia, mas que tem aspectos relevantes para a otimização da efetividade jurídica e da utilização de argumentos consequencialistas. Formalista ou consequencialista, a argumentação jurídica faz parte da atuação no Direito, de forma que, em sua dinâmica, por sentenças, decisões, processos, ambos os argumentos vêm a ser legítimos. E para além disso, é preciso, no entanto, atentar-se para a insuficiência do Estado para tratar de danos e riscos ambientais que tem seu alcance global, na apreciação de argumentos consequencialistas e do balanço de interesse por detrás desse consequencialismo. O ponto a ser destacado é a relação entre o consequencialismo na argumentação jurídica ambiental e a efetividade das decisões de desenvolvimento sustentável. O consequencialismo ambiental vem a ser a ponte para a decisão justa, uma que pondera as repercussões possíveis de sua instituição, e que pode, inclusive, interligar os diferentes atores envolvidos, para a resolução do problema que estiver em questão naquele momento.

REFERÊNCIAS ANDRESEN, Steinar; SKJAERSETH. Science and technology from agenda setting to implementation. In: BODANSKY, Daniel; BRUNNÉE, Jutta; HEY, Elien. lhe OXFORD handbook of international environmental law. OXFORD University Press Inc., New York, 2007, p. 182-204. ATIENZA, Manuel. As razões do direito: teorias da argumentação jurídica. 3 Ed. São Paulo: Landy, 2003 BIRNIE, Patrícia; BOYLE, Alan. International Law & the environrnent. Second Edition. Oxford University Press, 2002 FILOCHE, Geoffroy. Ethnodéveloppement, Développement durable et droit en Amazonie. (Tradução Livre). Bruylant, Bruxelies, 2007, p. 25. 129

R'oista de Direitos Dijiaos

HC 096344. Disponível em:
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