O CONTENCIOSO FRONTEIRIÇO NEW RIVER TRIANGLE: DA DISPUTA TERRITORIAL ENTRE GUIANA E SURINAME ÀS ESTRATÉGIAS DE INTEGRAÇÃO NO PLATÔ DAS GUIANAS

July 25, 2017 | Autor: Cinthia Mirla | Categoria: Border Studies, South American Integration, Guiana Shield
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Graduanda em Relações Internacionais pela Universidade Federal do Amapá (UNIFAP). Bolsista pelo programa PIBC/CNPq, integrante do grupo de estudos POTEDES (Políticas, Territórios e Desenvolvimento) e do OBFRON (Observatório das Fronteiras do Platô das Guianas). Email: [email protected]. Link para o Lattes: http://lattes.cnpq.br/6981849365751961.
Docente do Curso de Relações Internacionais da UNIFAP. Coordenador do Grupo POTEDES e do OBFRON (www2.unifap.br/obfron). Email: [email protected]. Link para o Lattes: http://lattes.cnpq.br/4273415074232882.
O CONTENCIOSO FRONTEIRIÇO NEW RIVER TRIANGLE: DA DISPUTA TERRITORIAL ENTRE GUIANA E SURINAME ÀS ESTRATÉGIAS DE INTEGRAÇÃO NO PLATÔ DAS GUIANAS
Cinthia Mirla Soares Rocha
Gutemberg de Vilhena Silva

RESUMO
Este artigo explora elementos relevantes causados pela disputa no Triângulo do Rio Novo – TRN ("New River Triangle"), região situada na tríplice fronteira entre Guiana, Suriname e Brasil. A metodologia utilizada foi análise bibliográfica - a partir de consultas a periódicos internacionais, - e pesquisa documental, por meio de sites como os do Caricom; governo guianês; CIA FACTBOOK entre outros. De maneira geral, Guiana e Suriname nunca conseguiram uma arbitragem satisfatória para a resolução de litígio territorial sobre o TRN. A atual conjuntura sul-americana de integração regional, no entanto, tem motivado uma redefinição geopolítica no subcontinente que implica em um plano geopolítico de cooperação transfronteiriça, o qual também afeta as relações bilaterais entre Guiana e Suriname.

Palavras-chave: Geopolítica; Guiana; Suriname; "New River Triangle".

ABSTRACT
This paper explores relevant elements caused by the dispute in the New River Triangle - TRN, located in the tri-border region between Guyana, Suriname and Brazil. The methodology used was literature review - from consultation to international journals - and documentary research through sites like those of CARICOM; Guyanese government; CIA Factbook among others. In general, Guyana and Suriname have never got a satisfactory arbitration for the settlement of the territorial dispute over the TRN. The current situation of South American regional integration however has motivated a geopolitical redefinition in the subcontinent that implies on a geopolitical plan of border cooperation, which also affects bilateral relations between Guyana and Suriname.
Key-words: Geopolitics; Guyana; Suriname; "New River Triangle".



INTRODUÇÃO
Guiana e Suriname são países que fazem parte da região geopolítica do platô das guianas, e dentro desse escudo compreendido pelo norte da República Federativa do Brasil, Guiana Francesa, República Cooperativista da Guiana, República do Suriname, República Bolivariana da Venezuela, e uma pequena parte do Estado Plurinacional da Bolívia, enfatizaremos o Suriname e a Guiana por serem protagonistas da disputa fronteiriça do Triângulo do Rio Novo – TRN ("New River Triangle"). Esses últimos apresentam características distintas dos demais Estados soberanos da América do sul, por terem culturas complexas, seus idiomas serem exclusivamente falados em seus territórios e em nenhum outro país da região, como o inglês e o holandês, respectivamente. Suas colonizações, pela Grã-Bretanha (Guiana) e Países Baixos (Suriname), terem sido atípicas as demais voltadas às potências ibéricas, e ainda, por suas projeções econômicas estarem mais voltadas para o Caribe do que para os sul-americanos. Temos então "Uma Outra América do Sul", como relatou Paulo Visentini (2008).
O objetivo deste trabalho é relacionar as iniciativas de integração sul-americanas, como a Unasul, o Mercosul e a Caricom, no que interliga Guiana e Suriname e os reflexos no contencioso fronteiriço Triângulo do Rio Novo - TRN ("New River Triangle") e averiguar se esses mecanismos de integração regionais são eficientes quanto a resolução de controvérsias. A história moldou, apesar das interseções, um litígio a respeito da soberania do TRN, que, apesar de algumas tentativas de acordo, não consegue ser resolvido.
Para que se possa avaliar os pontos concomitantes na presente proposta, seguir-se-á uma ordem de exposição: A estruturação do contencioso, instrumentos de integração regional, resultados e as considerações finais.

O CONTENCIOSO "NEW RIVER TRIANGLE"
A região reivindicada pelo Suriname é chamada de Triângulo do Rio Novo - TRN (Mapa 1), mas também pode ser mencionada como "Tigri", equivale a uma extensão de 5000 km² aproximadamente, sendo sua localização na tri-fronteira entre Brasil ao sul, Suriname ao Leste e Guiana ao Oeste. Mesmo sendo um setor pouco povoado (DONOVAN, 2005) dispõe de minerais, como bauxita, metais preciosos, como ouro, e reservas de petróleo (RAMRAJ, 2002). Tem sido palco de uma difícil desavença entre Suriname e Guiana, não pelo combate direto, e sim, pela ameaça a integridade territorial da Guiana (DONOVAN, 2005).


Mapa 1 – Localização do litígio territorial do Triângulo do Rio Novo

Essa divergência territorial encontra sua gênese no período colonial, devido ao fato de os limites não terem sido bem demarcados (DONOVAN, 2003), deixando para as nações que lá se constituíram após o pacto colonial tardio, Guiana e Suriname, um território não claramente definido que gera tensões, mesmo até o momento não havendo nem cogitado nenhum enfrentamento armado.
No ano de 1930, foi feito um acordo, elaborado pelas metrópoles das ainda colônias, Guiana Inglesa e Guiana Holandesa, estabelecendo que o seguimento do rio Courentyne a ser considerado deve ser o rio Kutari. Todavia, no ano de 1939, com a eclosão da guerra civil europeia, a proposta foi posta em segundo plano, sem a devida assinatura e oficialização do mesmo. Já em 1962, com a volta das discursões sobre o embate, os Países Baixos propuseram, oficialmente, um novo marco delimitador, desta vez, o Novo Rio - NR ("New River") seria o prolongamento mais profundo do rio Corentyne, logo, seria a linha divisória (JOSEPH, s/d; DONOVAN, 2003, 2005).
As relação binacional Guiana-Suriname foram ficando mais tensas, na medida em que não se conseguia um consenso. Após sua independência em 1966, a Guiana aderiu o princípio da linha de equidistância no que se refere ao Corentyne, dividindo em espaços iguais a extensão do rio, no intuito de apaziguar as divergências no que concerne a exploração dos recursos do rio. No entanto, as tentativas expansionistas surinamesas se intensificaram nos anos 60, quando o governo do Suriname enviou secretamente ao triângulo suas forças armadas com o propósito de ocupar a área, sem o consenso do governo da Guiana. Mesmo com os esforços de manter a integridade de seu território, a Guiana teve dificuldades em exercer sua soberania, pois a República do Suriname estava disposta a conquistar tal território, momento no qual a área foi rebatizada de "Tigri" (RAMRAJ, 2002) pelos invasores. Só em 1969 as tropas guianesas tiveram sucesso no controle das terras do TRN (GAO, 2009). Até que, por sua vez, o Suriname conquistou sua independência, 1975. Foi consequentemente reafirmado seu interesse na região do TRN (RAMRAJ, 2002). Desde a primeira postura invasiva na década de 60, o governo do Suriname havia se mantido estável e as tensões continuavam em um baixo nível, no geral, resumindo-se a apreensões de barcos e pescadores que, por ventura, invadissem o limite um do outro. A baixa probabilidade de um confronto armado se deve ao interligamento que as economias de ambos países apresentam e às iniciativas de cooperação bilateral. Em 1986, foi criado o Conselho de Cooperação Guiana-Suriname para estimular o desenvolvimento recíproco, situação que aproximou os dois Estados, invertendo o clima de rivalidade. Porém, a situação voltou a se abalar quando em 1995, o Suriname publicou mapas oficiais aderindo a região reivindicada como território nacional, fazendo com que o governo da Guiana se sentisse provocado (DONOVAN, 2003; DONOVAN, 2005; RAMRAJ, 2001).
Apesar disso, a forte ligação econômica, social e cultural que os países dispõem um ao outro são alicerces suficientes para uma condução pacífica no desenrolar das negociações do contencioso, pretendendo não abalar os importantes laços de crescimento conjunto.
INSTRUMENTOS DE INTEGRAÇÃO REGIONAL
Integração é um processo segundo o qual se delega progressivamente poderes a uma organização internacional, passando por fases de fusões nacionais (SOUSA, 2005). No que concerne a Guiana e o Suriname, abordaremos três instrumentos e suas capacidades de constrangimento no contencioso do Triangulo do Rio Novo. O Mercado Comum do Sul (MERCOSUL), por sua importância na América do Sul e na recente aproximação desses países com o MERCOSUL, e a União das Nações Sul-Americanas (UNASUL) são importantes instrumentos de integração sul-americanos (PEREIRA, 2012). Vale ressaltar ainda que o principal instrumento de integração de ambos países é a CARICOM (Comunidade do Caribe e Mercado Comum), fruto de uma arquitetura histórica ímpar ao que condiz com a América do Sul.
Para que se possa entender o nível de constrangimento das organizações no contencioso, vejamos: O MERCOSUL teve início com o Tratado de Assunção, assinado em 1991 (AMORIM, 2009) (ITAMARATY, s/d). Porém, Guiana e Suriname não são membros efetivos, no entanto, desde 2012, os dois países passaram a participar de algumas reuniões (MERCOSUL, s/d) (JORGE, s/d), podendo-se considerar algum nível de influência nessa relação. Podemos perceber ainda, essa comunidade, a partir do Protocolo de Brasília, tem um sistema de controvérsias ligado à diplomacia e à mediação, prevalecendo à ideia de resguardar a soberania Estatal, não se submetendo a um órgão permanente que julgue os litígios (ITAMARATY, s/d).
Sendo vista como uma proposta de complementação do anterior, buscando promover a integração física da região, a UNASUL, constituída pelos 12 países da América do Sul, foi criada com a assinatura de um tratado elaborado na Reunião Extraordinária dos Chefes de Estado e de Governo, em Brasília no ano de 2011. Esta, por sua vez, tem um objetivo relevante para esta análise: Defender a perspectiva de solucionar pacificamente controvérsias regionais (ITAMARATY, s/d), assim como anteriormente associado ao MERCOSUL. Por fim, a CARICOM, foi criada com a assinatura do Tratado de Chaguaramas, vigorando a partir de 1973. Seu principal objetivo é a cooperação entre os países caribenhos, estimulando o comércio entre eles, estimulando o desenvolvimento e a integração, da qual, Guiana e Suriname são membros.
Referente ao contexto apresentado, as iniciativas integracionistas podem fazer com que os países aumentem suas conexões externas, variando-as, por consequente, diminuindo a vulnerabilidade externa (GONÇALVES, 2009). Logo, no que cabe analisar, essa possível expansão dos pontos de fluxos comerciais poderiam deixar Guiana e Suriname mais à vontade para intensificar as reivindicações sobre o TRN.
Em contra partida, de acordo com Gonçalves (2009), o MERCOSUL enfrenta um confrontamento de iniciativas voltadas a integração, o que resultaria em uma perda de eficiência do bloco, perdendo a força de sua influência, no caso, não tendo tanta força para cobrar uma postura conclusiva das partes em desacordo. No caso da UNASUL, por ter um foco mais restrito ao escudo guianês, os resultados reais das políticas integracionistas podem surtir mais efeito. De acordo com TEIXEIRA e ANSELMO (2010), os países amazônicos buscam na cooperação a superação dos seus países como periferias no atual sistema internacional, assertiva que explica a forte aproximação da Guiana com seu vizinho apesar dos impasses territoriais. Até porque, de acordo com VISENTINI (2008), a Guiana e o Suriname são considerados como "uma outra América do Sul", devido justamente a essa marginalização econômica e social, e ao contraste que estes fazem com o restante dos países sul-americanos.
Para amarrar as argumentações abordaremos uma divisão feita por TEIXEIRA e ANSELMO (2010) em dois polos distintos: Arco da Estabilidade e arco da Instabilidade. No primeiro, No primeiro, estão inseridos os países pertencentes ao Cone-Sul, que no que tange o continente, é a região mais desenvolvidos e onde o processo de integração é mais efetivo, logo, apresenta uma menor propensão para os processos conflitivos. No arco seguinte, temos os países mais dispostos ao envolvimento em divergências, incluído neste temos a Guiana e o Suriname (TEIXEIRA E ANSELMO, 2010).
Não por coincidência, mas as principais zonas de conflitos não se encontram nessa região, isso porque, ambos países, como exposto anteriormente, conseguem manter relações amistosas apesar de tudo, além de não ter envolvido no contencioso, ofensivas militares direitas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Infere-se que, de acordo com Rigalia (1998), temos dois tipos principais de integração: a cooperação e o conflito. Observa-se então, que temos esses dois pontos contrários em uma mesma relação binacional Guiana-Suriname. Por um lado, o interesse inflexível dos Estados em relação à soberania da região do Triângulo. As estratégias de integração voltadas para o Suriname e para a Guiana, os quais fazem parte da geopolítica do platô das guianas, têm se mostrado pouco eficientes, umas vez que existe pouco material sobre as perspectivas do MERCOSUL e da UNASUL no âmbito litigioso do TRN, no entanto, podemos nos respaldar na premissa que ambos defendem a diplomacia e por ultimo a mediação como meios eficazes e suficientes para as possíveis controversas. A Caricom, por sua vez, com maior peso e influência, pode ser o caminho mais seguro para a mediação, uma vez que ficou acordado por seus membros que tomaria partido da demarcação do mar territorial da Guiana em relação ao Suriname em 2000.
Quaisquer que seja as tentativas pro-desenvolvimentistas que a Guiana e o Suriname desempenhem, um posicionamento antagônico referente a algo essencial ao estado, como é a fronteira nacional, é um passo retrógrado ao avanço do desenvolvimento mútuo. O que percebemos ao tentar gesticular à respeito da participação de organizações internacionais na postura da Guiana e do Suriname é que na verdade, o que mantém as relações diplomáticas entre os dois países são as parcerias de cooperação (TEIXEIRA e ANSELMO, 2010) e as iniciativas de integração, vitais para o desenvolvimento de países com baixo índice de desenvolvimento.
A manutenção das rivalidades é um contraponto quando se quer projetar a integração (TEIXEIRA E ANSELMO, 2010), pois além de o contencioso vir se arquitetando há anos, a diplomacia não consegue resolver a divergência, mantendo assim duas relações concomitantes, uma amistosa de cooperação econômica e social e outra, divergente no que se refere às fronteiras marítimas e terrestres. Para que as organizações internacionais consigam efetivar suas iniciativas de integração, é preciso que se crie um ambiente de confiança entre seus membros. O contencioso do New River não é o principal obstáculo dos processos integracionistas na América do Sul, mas é claro, mostra-nos claramente uma falta de harmonia que pode vir a configurar um ambiente pouco propenso ao progresso.

REFERÊNCIAS

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