O crescimento do neoconservadorismo e da extrema direita nos Estados Unidos da América

May 31, 2017 | Autor: G. Franco de Andrade | Categoria: Extreme and Far Right
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O CRESCIMENTO DO NEOCONSERVADORISMO E DA EXTREMA DIREITA NOS ESTADOS UNIDOS DA ÁMERICA NO SÉCULO XXI (2001 2009) Carina Rafaela de Godoi Felini1 Guilherme Ignácio Franco de Andrade2 Resumo: Como forma de problematizar o crescimento do neoconservadorismo e da extrema direita nos Estados Unidos no século XXI, esta pesquisa pressupõe que estes projetos políticos, no período de 2001-2009, levantaram questões teóricas e conceituais de grande relevância, mostrando possuir ramificações diversas e, portanto, justificando seu estudo. Assim sendo, procuraremos compreender o movimento neoconservador nos Estados Unidos, reativado durante o governo de George W. Bush (2001-2005) após os atentados terroristas de 11 de setembro. Além disto, exploraremos brevemente o conceito histórico de ste movimento, raiz do modelo político que pretendemos estudar nesta pesquisa, é uma corrente político-filosófica que defende a tradição das instituições e sua evolução ao longo do tempo. Sua influência sobre autores neoconservadores e direitistas foi vital para a formação de seus próprios projetos, tais quais verificamos nos EUA no período proposto. Palavras-chave: neoconservadorismo; extrema direita; Estados Unidos.

Apontamentos iniciais Para problematizar os partidos de extrema direita e o neoconservadorismo atualmente, faz-se necessário levantar questões teóricas e conceituais de grande relevância, como entender o projeto partidário com que estamos lidando, compreender sua origem e formação, suas raízes históricas e suas influências ideológicas. É mister escolhermos caminhos teóricos e métodos de análise que nos permitam obter resultados concretos, não caindo no erro de realizar uma crítica superficial, rasteira, ou que não seja suficiente em alcançar os objetivos da pesquisa. Para tanto, temos que inserir nosso objeto dentro de uma categoria de análise para termos uma aproximação mais real dele e assim pensar o melhor método investigativo que nos ajude a chegar a um resultado próximo da realidade. Assim sendo, nosso formato de trabalho procurará, de forma simples, exemplificar movimentos de extrema direita e do neoconservadorismo nos Estados Unidos (EUA). De forma a aprofundar a discussão sobre a extrema direita estadunidense, procuraremos nos apoiar nas origens do partido fascista europeu, representante em um primeiro momento dos interesses de parte dos pequenos burgueses e da classe média. Aqui procuraremos entender as consequências históricas que formaram o fascismo e sua estreita relação com capitalismo. Ademais, devemos entender o conceito de fascismo para tratar os partidos de extrema direita e sua emergência no século XXI, quais as formas de atuação hoje,

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Mestranda em Ciências Sociais na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul PUC/RS, na linha de pesquisa de Organização e Sociedade, orientada por Teresa Cristina Schneider Marques. Bolsista CNPq. Email: 2 Doutorando em História na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul PUC/RS, na linha de pesquisa Sociedade, Urbanização e Imigração, orientado por Leandro Pereira Gonçalves. Bolsista CNPq. Email:

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quais as rupturas com o fascismo clássico, compreendendo que, dentro da conjuntura atual, quais adaptações foram necessárias para a permanência do projeto fascista no século XX e XXI. Depois, partimos para a compreensão do movimento neoconservador, revitalizado durante o governo de George W. Bush (2001-2005) após os atentados terroristas de 11 de setembro. Assim, julgamos que a problematização acerca do crescimento do neoconservadorismo e da extrema direita nos Estados Unidos no século XXI, tal como esta pesquisa pressupõe, somente poderá ser feita de forma clara a partir de conceitos acerca de projetos políticos que os antecederam. Tanto o neoconservadorismo quanto a extrema direita representam desafios teóricos e conceituais de grande relevância, mostrando possuir ramificações diversas e antecedentes importantes que justificam seu estudo. O Conservadorismo enquanto espectro político

conservar, de deixar intacto e, ao mesmo tempo, de manter longe o que é novo, afirmando a ordem instituída. No campo político, que é de nosso interesse neste trabalho, o conservadorismo segue o mesmo padrão, porém mais ligado ao conceito de uma crença na manutenção da ordem previamente instituída. Se compreendermos o conservadorismo como ideologia, então este nos levará aos postulados do político inglês Edmund Burke (1729humana ficava para trás no que tange ao desenvolvimento da sociedade, uma vez que, em sua opinião, seriam os sentimentos e hábitos do homem que fariam este papel. A crítica de Burke à Revolução Francesa consistia em nada mais do que uma crítica ao racionalismo científico, ao individualismo e aos valores liberais, que, para ele, deixavam de lado as tradições e os costumes. Para ele, este racionalismo parecia estar fora de lugar nas práticas políticas, o que o incitava também a acreditar que a sociedade se encontrava em um nte. Em suma, a característica mais essencial deste conservadorismo que acabamos de expor, é possuir uma postura histórica em favor do passado, colocando fé na própria História, crendo que é justamente neste passado que há exemplos bons para a sociedade atual. Desta forma, o conservadorismo não deixa de ser uma corrente político-filosófica que defende a tradição das instituições (diferentemente daquelas que resultam de projetos feitos a partir do conservadores como anti-modernos ou anti-progressistas, que resistentes ao voluntarismo (TEIXEIRA, 2007, p. 43). A Extrema Direita

para identificar esses partidos citados acima. No meio acadêmico o termo não é unanimidade, é frequentemente alvo de debate. A terminologia surgiu em meio à imprensa para classificar grupos neonazistas, neofascistas, que surgiram após a II Guerra Mundial, para determinar uma separação da direita clássica para com os grupos mais reacionários (EATWELL; MUDDLE, 2004, p. 8). O projeto político da extrema direita busca romper com a política dos partidos tradicionais, rejeitando os valores democráticos das sociedades ocidentais europeias, por considerá-la decadente, responsável pelo desmantelamento do Estado Nacional,

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enfraquecimento da soberania nacional, por corromper a instituição família, os valores morais e religiosos (WINOCK, 1994, p. 16). A extrema direita tem como aspiração destruir a atual ordem social, política e econômica, e implantar um novo regime, baseado em seus princípios: um Estado Autoritário, apoiado no patriotismo, aliado às forças militares e policiais, em uma sociedade hierárquica, meritocrática e tecnocrática (MAYER; PERRINEAU, 1989. p. 176). Outra característica fundamental da extrema direita é a criação de padrões sociais, étnicos, de orientação sexual e religiosa que devem ser seguidos. Assim como o fascismo, a extrema direita cria inimigos internos e externos que seriam responsáveis pela decadência da sociedade, pela fragilidade da economia do país, classificam grupos que em seu entendimento seriam responsáveis pela violência e desemprego (JAMIN, 2009. p. 117). O radicalismo da extrema direita tem em seu projeto político raízes permanentes do fascismo, pois busca uma sociedade harmoniosa, homogênea (étnica e cultural), sem conflitos de classe mesmo inserido no sistema capitalista, assim como o fascismo, mantém a exploração do capitalismo com o objetivo de resgatar a sociedade tradicional (que acredita ser verdadeira), baseado nos princípios de família, da religião, do desenvolvimento da nação acima dos objetivos individuais (MILZA, 1992). Nesse ponto em que esclarecemos as características principais, demonstra a ligação intrínseca entre a extrema direita e o projeto fascista. Outra característica atual da extrema direita é o rompimento com a União Europeia, por acreditar que após a criação da comunidade europeia e o uso do euro enquanto principal moeda, os Estados perderam sua autonomia e controle da sua economia. Para a extrema direita o euro é um dos principais responsáveis pela atual recessão econômica. Nosso entendimento sobre a extrema direita nos leva a pensar o quanto estas se comunicam com os autores neoconservadores estadunidenses. No próximo tópico cabe trazer a definição do neoconservadorismo e como este foi gestado nos EUA. De fato, o movimento neoconservador possui raízes e uma interligação muito profunda com a extrema direita já tratada anteriormente. O Neoconservadorismo Tendo florescido na década de 1960, surge na linha de frente um nome primordial para o pensamento neoconservador, Irving Kristol, um dos maiores teóricos do movimento. Segundo Kristol, a diferença entre conservadorismo e neoconservadorismo residia na noção de que o primeiro se baseava primordialmente no fato de manutenção da ordem pública e da moralidade tradicional ao passo que o segundo não se preocupava em pensar primordialmente sobre a realidade interna norte-americana, mas sim em analisar sua política externa. O objetivo neoconservador consistiria mais em superar os conservadores em matéria de política internacional, abrindo espaço para a exportação dos valores estadunidenses. Objetivamente, os neoconservadores foram, aos poucos, difundindo sua teoria e ampliando-a, sendo que uma de suas principais características repousa na tendência de ver o mundo prioritariamente pela ótica do bem/mal. Cabe reparar que na lógica neoconservadora preconiza a descrença diante da capacidade de projetos de engenharia social em transformarem a realidade socioeconômica substancialmente, dessa forma, a noção conservadora vigente entendia que as políticas sociais levariam a uma cultura de acomodação. Ademais, os neoconservadores sempre nutriram certo ceticismo em relação à legitimidade internacional, considerando leis, instituições e opinião pública internacionais irrelevantes.

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Diante do exposto e ao mesmo tempo retornando ao período pós-atentados terroristas de 11/09 nos governos de Bush, nota-se que a Casa Branca procurou exprimir de toda maneira que a lógica neoconservadora que explicitava que o poderio estadunidense deveria ser usado para fins morais, enxergava os EUA, como nação, com responsabilidades especiais no mundo, partindo de uma noção na qual se acreditava que sua sociedade deveria ser modelo para os demais países devido ao seu excepcionalismo (FUKUYAMA, 2006. p. 2). Os atentados de 11 de setembro trouxeram como corolário uma questão, que até aquele momento pouco se pensava, na qual permeava uma espécie de dúvida sobre qual o papel dos EUA no mundo ou como a diplomacia estadunidense deveria se comportar? Ou seja, como buscar alguma forma de aplicar nosso intervencionismo agora que fomos alvo de ataque? Estas questões permitiram a entrada do neoconservadorismo na cúpula em Washington. Após perder espaço político durante a Guerra Fria, o neoconservadorismo seria naquele momento revisitado e transformado em uma ferramenta de forma a direcionar a política externa nortede setembro de 2001, os neoconservadores ganharam força e se tornaram o grupo mais influente em Washington" (MAGALHÃES, 2008, pg. 17). No pensamento neoconservador em política externa dos EUA há forte presença da questão internacionalista, que se opõe ao espectro dos que pregam uma postura isolacionista. Neste ponto faz-se mister entender que os neoconservadores fizeram uso de critérios relacionados ao poder e à segurança dos EUA, mesmo não sendo universalistas em sua acepção, mas possuindo algo mais parecido a um internacionalismo de caráter nacionalista e patriótico. Os neoconservadores faziam suas análises e criavam seus pressupostos através acreditar na existência de uma suposta singularidade dos Estados Unidos em relação aos demais Estados nacionais (TEIXEIRA, 2007). Sumarizando: o neoconservadorismo procurava unir a condição internacionalista a um sentimento nacionalista. A questão do poderio militar estadunidense é central para os neoconservadores em questão de política externa. Partindo do conceito das relações internacionais de instrumentalização do uso da força notamos que é justamente sobre este conceito que a questão bélica para os neoconservadores busca apoio. Não há debate que indique que a doutrina neoconservadora não se consolidou nos EUA durante o governo de Bush, exercendo uma influência considerável. A política externa norte-americana fez um giro grandioso no que tange a questões sobre guerra preventiva e exportação da democracia como melhor forma de governo, tudo, obviamente, apoiado pela corrente neoconservadora da Casa Branca. Apontamentos finais Em matéria de estudos sobre a extrema direita e o neoconservadorismo norteamericano pouco ainda é trabalhado, o que justifica a atualidade da pesquisa acerca destas vertentes políticas. Buscamos trazer o que nos instigou a tratar destes temas de forma sucinta, porém, cabe ressaltar novamente, que a universalidade desta temática nos impediu de sermos mais breves. Conforme vimos, a pesquisa pressupôs que estes projetos políticos, no período de 2001-2009, levantaram questões teóricas e conceituais de grande relevância, o que nos levou a procurarmos compreendê-los mais profundamente. Ao entrarmos na seara pretendida, notamos que tanto a extrema direita quanto o neoconservadorismo estadunidense representam modelos políticos extremamente relevantes atualmente. A extrema direita norte-americana apoia-se em um radicalismo cujo projeto político tem raízes permanentes no fascismo, conforme vimos anteriormente. Este modelo, nos

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Estados Unidos, trouxe consigo características reguladoras da sociedade como qualquer outro modelo extremista traria, negando os direitos de existir uma proposta diferente, de existir uma oposição. Já a doutrina neoconservadora se consolidou nos EUA durante o governo de Bush, exercendo uma influência considerável. A política externa norte-americana representou a pedra sobre a qual o governo de Bush se apoiaria. A aplicação do receituário neoconservador trouxe consigo mudanças acerca questões de guerra e cultura estadunidenses, o que, por sua vez, modificaria a maneira com a qual os Estados Unidos passaram a lidar com seus aliados e inimigos no exterior. O neoconservadorismo estadunidense durante o governo de Bush teve como prioridade tratar de questões relativas à política externa. Esta foi sua característica mais marcante até o momento que Bush vagou seu assento na Casa Branca. Referências bibliográficas BARBOSA, Jefferson Rodrigues. Integralismo e ideologia autocrática chauvinista regressiva: crítica aos herdeiros do sigma. Marília, 2012, pg.199. Tese (Doutoramento em Ciências Políticas) Universidade Estadual Paulista. BETZ, Hanz-George. The New Politics of Resentment: Radical Right-Wing Populist Parties in Western Europe. New York, Comparative Politics, Vol.25 No. 4, 2011, p. 413. BRANDALISE, Carla. Europes des patries: histórico da extrema direita europeia. Revista Cena Internacional, ano 7, n. 1. Brasília: UNB, 2005. CAMUS, Jean-Ives. L'extreme Droite Aujourd'Hui. Paris, Editions Milan, 2003. CONVERSE, Philip E. Ideology and Discontent. DOLES, Luiz Felipe Pereira. Neoconservadorismo e a política externa dos Estados Unidos da América: De Leo Strauss à Doutrina Bush. UNB Universidade de Brasília, Instituto de Relações Internacionais, Programa de Pós-graduação em Relações Internacionais, 2012. EATWELL, Roger; MUDDLE, Cas. Western Democracies and the New Extreme Right Challenge. New York and London, Routledge. 2004. FUKUYAMA, Francis. After Neoconservatism. The New York Times, 19 de fev., 2006. JAMIN, Jaime. L imaginaire du Complot: Discours d extrême droite en France et aux EtatsUnis. Amsterdam, Amsterdam University Press, 2009. KNIGHT, Kathleen. Transformations of the concept of ideology in the twentieth Century. American Political Science Review. Vol. 100, n. 4, nov/2006. LEITE, Lucas Amaral Batista. A influência do discurso neoconservador na política externa americana e suas consequências. Fronteira, v. 7, n. 13, 1° sem. 2008. MAGALHÃES, David Almstadter. Os Think Tanks norte-americanos e a reconstrução do Iraque: divergências e convergências entre liberais e neoconservadores. Dissertação de mestrado, PUC SP, 2008.

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