O currículo tradicional de Anatomia é satisfatório para os estudantes do último ano de medicina? Uma avaliação retrospectiva

June 6, 2017 | Autor: Muhammad Zafar | Categoria: Medical Students, Teaching Methods, Case Study, Einstein, Boolean Satisfiability
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Artigo Original

O currículo tradicional de Anatomia é satisfatório para os estudantes do último ano de medicina? Uma avaliação retrospectiva Does the existing traditional undergraduate Anatomy curriculum satisfy the senior medical students? A retrospective evaluation Zahid Ali Kaimkhani1, Masood Ahmed2, Musaed Al-Fayez3, Muhammad Zafar 4, Asad Javaid5

RESUMO Objetivo: Apresentar os resultados de um estudo sobre opiniões e conhecimento de residentes de primeiro ano e estudantes de medicina sobre o Currículo de Anatomia e suas sugestões para organizar um curso de bases clínicas em anatomia. Métodos: Residentes de primeiro ano, ao final de seu ano clínico, e estudantes de medicina ao final de seu ano de graduação foram solicitados a avaliar o Currículo de Anatomia que tiveram nos anos pré-clínicos. Resultados: A maioria dos respondentes avaliou o ensino geral de anatomia adequado, mas a grande maioria considerou os cursos de anatomia clínica, anatomia de imagem e anatomia de superfície e viva muito curtos. Os residentes de primeiro ano e estudantes classificaram os cursos de anatomia e temas clínicos integrados como essenciais para seu treinamento clínico e sentiram a necessidade de um curso de anatomia orientado para a clínica, com estudos de casos e participação de docentes de clínica nos anos de ciclo básico. Conclusões: Avaliações retrospectivas ao final do primeiro ano de residência e no último ano de graduação são “evidências” úteis a serem consideradas na reforma do currículo de anatomia, especialmente para desenvolver um Curso de Bases Clínicas em anatomia. Os resultados de tais estudos devem ser levados em conta ao se discutirem as modificações do currículo de anatomia. Descritores: Anatomia/educação; Currículo/padronização; Educação de graduação em Medicina/padronização; Médicos; Questionários; Estudantes de Medicina; Ensino/métodos; Ensino/padronização

ABSTRACT Objective: To present the results of a study concerning views and feedback from the interns and medical students about the Anatomy

Curriculum, as well as their suggestions to design a Clinical Core Course in Anatomy. Methods: Interns at the end of their clinical year and medical students at the end of their final year were asked to evaluate the Anatomy Curriculum that they experienced in their undergraduate pre-clinical years. Results: Most respondents found that the duration of gross anatomy taught it was adequate, but the vast majority expressed clinical anatomy, imaging anatomy, and surface and living anatomy courses as too short. Interns and medical students ranked anatomy courses and integrated clinical topics as keystone for their clinical training and felt the need of clinically oriented anatomy, case studies and participation of clinical faculty in pre-clinical years. Conclusions: Retrospective evaluations at the end of internships and final-year of under graduation are helpful “evidence” to be considered in reforming the anatomy curriculum, particularly in developing clinical core course in anatomy. The results of such studies should be taken into consideration when discussing modifications to anatomy curriculum. Keywords: Anatomy/education; Curriculum/standards; Education, medical, undergraduate/standards; Physicians/psychology; Questionnaires; Students, Medical; Teaching/methods; Teaching/standards

INTRODUÇÃO Os currículos tradicionais de escolas de medicina fazem uma separação clara entre as ciências biomédicas básicas e os anos clínicos(1). Anatomia humana é um dos assuntos fundamentais em um currículo de medicina, mas o tempo designado para o ensino de anatomia a alunos de medicina tem

Trabalho realizado no Departmento de Anatomia da King Saud University – Riyadh, Saudi Arábia. 1

MB, BS, Mphil; Professor do Departamento de Anatomia da King Saud University – Riad, Arábia Saudita.

2

MB, BS, Mphil, PhD; Professor titular do Departamento de Anatomia da Faculdade de Medicina da Al Qasim University – Buraidah, Arábia Saudita.

3

MB, BS, Mphil; Professor do Departamento de Anatomia da King Saud University – Riad, Arábia Saudita (Professor-assistente).

4

MB, BS, MPhil, PhD; Professor titular do Departamento de Anatomia da King Fahad Medical City – Riad, Arábia Saudita.

5

BDS, MCPS, MDS; Professor titular da Faculdade de Odontologia da Al Qasim University – Buridah, Arábia Saudita

Autor correspondente: Masood Ahmed – Department of Anatomy and Histology, College of Medicine, Al Qasim University, 51452 – PO Box 6666 – Buraidah – Arábia Saudita – Tel.: 00966-6-3800050, (ext.2503) – e-mail: [email protected] Data de submissão: 28/6/2009 – Data de aceite: 17/8/2009

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sido reduzido substancialmente, tanto nos EUA como na Europa(2,3). A despeito de reduções na importância, no tempo dedicado, e no status do ensino de anatomia nos currículos médicos modernos, o conhecimento de anatomia continua sendo uma pedra fundamental na medicina e em profissões correlatas(4). Como resultado dessa restrição, numerosas tentativas foram feitas para adaptar a organização e, ocasionalmente, o conteúdo às circunstâncias alteradas. Todos os aspectos da anatomia foram reduzidos independentemente de sua relevância vocacional(5). Apesar dessas tentativas, o papel da Anatomia dentro do currículo médico é cada vez mais contestado(6-7). Anatomistas, portanto, têm o desafio de administrar níveis exigidos de conhecimento anatômico básico em um prazo de tempo reduzido e com menos recursos(4). Na tentativa de orientar os formadores de opinião envolvidos no desenvolvimento do currículo de Anatomia Clínica na Faculdade de Medicina, o Comitê de Assuntos Educacionais da Associação Americana de Anatomistas Clínicos (Educational Affairs Committee of the American Association of Clinical Anatomists, AACA) preparou um documento que define os contornos de um currículo de anatomia que leve à formação de médicos ou outros profissionais de saúde(8). O fato de o ensino baseado em problemas com um tipo híbrido de currículo, em que as preleções tradicionais têm menor importância, está a caminho em várias faculdades de medicina abertas recentemente na Arábia Saudita. Isso tem gerado um debate acirrado sobre o sistema tradicional satisfazer os objetivos requeridos de transmitir o sólido conhecimento de anatomia necessário para capacitação e raciocínio clínicos. As recomendações do AACA(8) foram a pedra fundamental para a revisão do currículo de Anatomia existente. Vários passos devem ser discutidos na Faculdade de Medicina para se iniciar um novo currículo(9-10). Acreditamos que, no debate sobre a relevância de várias matérias diferentes no currículo médico básico, as opiniões dos estudantes de Medicina ao final de seu currículo devem ser incluídas(11-12). Aliás, o World Summit on Medical Education (Cúpula Mundial sobre Educação Médica), em 1993, enfatizou a necessidade de colocar os alunos como parceiros em todos os níveis de educação médica, incluindo planejamento, desenvolvimento, e avaliação do currículo(13). Foi dentro desse contexto que se realizou o presente estudo. As ciências anatômicas são ensinadas tradicionalmente como três cursos separados, ou seja, Anatomia Macroscópica, Histologia, e Embriologia, em escolas de Medicina tradicionais, como a Faculdade de Medicina da Universidade King Saud em Riad, Arábia Saudita. Aqui, ele é feito primordialmente no formato de preleção e aula de laboratório. Cada ano acadêmico vai de setembro até junho do ano seguinte, um pouco menos que um ano acadêmico pleno. O curso de anatomia tem einstein. 2009; 7(3 Pt 1):341-6

carga de 390 horas (16 horas de créditos) distribuídas em quatro semestres durante dois anos pré-clínicos. A Anatomia Macroscópica é um curso de 287 horas (10 horas de créditos), Histologia tem 75 horas (3 horas de créditos), e Embriologia é um curso “intensivo” de 28 horas (2 horas de créditos). Anatomia de Cabeça e Pescoço (C&P) e Neuroanatomia são ensinadas no segundo ano pré-clínico, e Histologia e Embriologia, no primeiro ano pré-clínico. No primeiro ano pré-clínico, a cada semana, os alunos trabalham por cinco horas no laboratório de Anatomia Macroscópica e, por duas horas, no laboratório de Histologia, enquanto os alunos do segundo ano pré-clínico passam duas horas no laboratório de Anatomia Macroscópica. O Quadro 1 fornece uma versão abreviada do programa do curso de Anatomia na Faculdade de Medicina, da Universidade King Saud. Quadro 1. Programa de atividades e tempo alocado para o curso de anatomia Ano letivo 1o

Semestre 1o (15 semanas)

2o (13 semanas)

2o

3o (15 semanas) 4o (13 semanas)

Anatomia macroscópica (287)* Anatomia Geral (3) Membros superiores (36), Tórax (34), Abdome (parte I) [Parede abdominal anterior, cavidade peritoneal, estruturas intraperitoneais] (28), Aprendizado baseado em problemas (4) Abdome (Parte II) (21), Pelve e períneo (32), Membros inferiores (36), Aprendizado baseado em problemas (2) Cabeça e pescoço (45) Aprendizado baseado em problemas (2) Neuroanatomia (42), Aprendizado baseado em problemas (2)

Histologia (75)* 1 hora aula teórica: 2 horas Laboratório

Embriologia (28)* Aulas teóricas

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*Carga horária mostrada entre parênteses.

OBJETIVO Apresentar os resultados de um estudo sobre opiniões e feedback de residentes e alunos de Medicina acerca do Currículo de Anatomia, bem como as suas sugestões quanto à formulação de um Curso Clínico Básico de Anatomia. MÉTODOS Este estudo foi realizado durante o ano acadêmico de 2007 a 2008, no Departamento de Anatomia da Universidade King Saud. Questionários auto-administrados foram distribuídos a residentes e alunos do último ano do curso de Medicina, que foram solicitados a fazerem uma análise retrospectiva da relevância de seus cursos de Anatomia, classificando diferentes regiões e cursos como

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“curtos demais”, “adequados”, “longos demais”, ou “supérfluos” para seus anos clínicos e/ou residência. O curso de Anatomia Macroscópica foi dividido em dez regiões. Os participantes também foram solicitados a sugerirem meios para melhorar o currículo de Anatomia. As diferenças foram calculadas entre os residentes e alunos do último ano de Medicina e entre homens e mulheres.

RESULTADOS No total, 355 respostas foram recebidas após distribuição de 450 questionários, o que representa uma taxa de respostas de 78,8%. Houve 140 (70%) residentes e 215 (86%) estudantes de Medicina. As mulheres representaram 24 e 37%, respectivamente. Não houve nenhuma diferença significativa entre os residentes e os alunos do último ano de Medicina. Os resultados principais são apresentados na Tabela 1. Tabela 1. Avaliação dos cursos de anatomia por residentes de primeiro ano e estudantes de medicina do último ano (n=355) Cursos de anatomia I II

Anatomia geral Anatomia regional Parede torácica e abdominal Tórax Abdome Pelve, períneo Extremidades Coluna vertebral, dorso Crânio, cavidade craniana Face, olhos, ouvidos Pescoço Cérebro, medula espinhal III Anatomia de superfície e viva IV Anatomia de imagem V Anatomia clínica VI Anatomia do desenvolvimento (Embriologia) VII Anatomia microscópica

49

47,5

3

Supérfluo (Desnecessário) (%) 0,5

7

75

18

-

12 22,5 25 8 35

78 70 65 63 45

9 6 10 27 15

1 1,5 2 -

16

68

15

1

15

74

11

-

17 20

75 65

8 14

1

72

25

56

38

6

-

54 25

36 58

10 22

-

15

61

23

1

Muito Adequado Muito curto (%) (%) longo (%)

-

A primeira questão era se eles reconheciam que o tempo intenso gasto na aprendizagem de anatomia tinha sido necessário; 91% votaram “sim”. A segunda pergunta tratou dos diferentes cursos ensinados em Anatomia. A respeito de Anatomia Macroscópica, entre 45 e 78% dos respondentes avaliaram que foi ensi-

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nada com duração “adequada”, entre 7 e 35% “muito curta”, e entre 5 e 27% como “muito longa”. Surpreendentemente, a maioria dos respondentes (72%) classificou a Anatomia Viva e de Superfície como de duração “muito curta”, apenas 20% como “adequada”, e 3% como “muito longa”. A duração da Anatomia Clínica e de Imagens foi considerada “muito curta” por mais de 50% e “adequada” por cerca de 35%. No assunto de Anatomia Geral, uma porcentagem quase igual de participantes considerou a duração “adequada” e “muito curta”, e 3% a considerou “muito longa”. O curso de Embriologia foi considerado “adequado” por 58% do entrevistados e teve classificação quase igual entre “muito curta” e “muito longa”, enquanto 61% julgaram o ensino de Anatomia Microscópica “adequado”, 15% como “muito curto”, e 23% como “muito longo”, mas quase nenhum respondente considerou Anatomia Viva, Anatomia de Superfície, Anatomia em Imagens, Anatomia Clínica e Embriologia como “supérfluo”, diferente de Anatomia Microscópica e muitas regiões da Anatomia Macroscópica. Outra questão foi se o desenvolvimento do sistema nervoso e cabeça e pescoço deveriam ser ensinados no primeiro ou no segundo ano; a maioria das respostas (68%) foi em favor do segundo ano. Dentre as sugestões para melhorar o currículo de Anatomia, 63% dos respondentes pediram mais tópicos de orientação clínica, mais aprendizado baseado em problemas (PBL) e estudos de caso (41%), e mais Anatomia Viva e de Imagens (43%). Vinte e um por cento sugeriram aulas de revisão sobre o desenvolvimento do sistema nervoso e da cabeça e pescoço no segundo ano, enquanto 18% também sugeriram palestras feitas por clínicos.

DISCUSSÃO A anatomia humana forma a base para a medicina clínica; assim, o seu lugar no currículo médico merece atenção especial. A despeito da explosão de informações de pesquisa médica e das crescentes possibilidades diagnósticas e terapêuticas de tecnologias médicas, uma atenção à saúde efetiva ainda se estabelece em uma sólida base anatômica; e isso inclui a peça fundamental do diagnóstico clínico: o exame físico(14-15). Até onde se sabe, este é o primeiro estudo realizado na Arábia Saudita que pergunta a residentes e alunos de último ano do curso de Medicina sobre quão bem foram preparados por seu currículo de Anatomia para o treinamento clínico. Os alunos são frequentemente solicitados a avaliarem o currículo de Anatomia, mas, em geral, isso é feito apenas após o término do curso. Nesse momento inicial, os alunos não têm condições de avaliar que porções de conhecimento de Anatomia Topográfica, Anatomia Viva, Anatomia de Superfície, Anatomia em einstein. 2009; 7(3 Pt 1):341-6

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Imagens, e Anatomia Microscópica têm relevância clínica. Pabst(11) fez um levantamento entre alunos de Medicina do último de ano quanto à relevância do seu curso de Anatomia. Enquanto isso, outros autores(16-17) perguntaram a residentes até que ponto seu currículo médico os havia preparado para o treinamento em medicina geral ou em pós-graduação, mas não sobre a relevância da Anatomia como base para os anos de treinamento clínico e residência. No presente estudo, pedimos a residentes e alunos de Medicina do último ano que avaliassem a relevância dos seus cursos de Anatomia com os anos de treinamento clínico na graduação e residência. Os resultados deste levantamento não devem ser excessivamente interpretados, mas são úteis na discussão de como modificar o currículo de Anatomia. Uma comparação de tais dados entre países teria de levar em consideração as diferenças de legislação, número de alunos, critérios de admissão, etc., como parcialmente resumidas para a Europa e os Estados Unidos(18). Um fato interessante que emerge desta investigação é que ela claramente contradiz as tendências, disseminadas demais, considerando que a Anatomia tem se tornado um braço que pode ser negligenciado no currículo médico moderno. Neste estudo, surgiu um provável esboço geral aparente que poderá ajudar o corpo docente a desenvolver um currículo básico de Anatomia, sem comprometer ou até mesmo incorporando melhorias no conhecimento básico necessário para a prática clínica. A maioria dos participantes achou que o ensino das diferentes regiões de anatomia macroscópica ensinadas foi “adequado”, mas consideraram extremidades como “muito longos e supérfluos”. Esses achados são comparáveis aos de um levantamento de alunos de Medicina ao final de um currículo de graduação(11-12). Cerca de 2/3 dos entrevistados sentiram que a Anatomia de Superfície e Anatomia Viva que lhes foi ensinada foi “muito curta” e pediaram que houvesse mais tempo no currículo. Outros investigadores(19-21) também argumentam em favor de uma carga horária maior em Anatomia de Superfície e Anatomia Viva. Os resultados desta investigação sustentam plenamente essas sugestões. O exame físico de uma pessoa é a aplicação de Anatomia de Superfície(22-23). As sessões de Anatomia Viva também fornecem um pano de fundo indispensável para a maioria dos procedimentos invasivos(24). Do mesmo modo, um sólido conhecimento em Anatomia de Superfície sempre foi necessário para radiografias acuradas, já que a maior parte dos pontos centrais radiográficos se baseia na Anatomia de Superfície(25). Com a redução geral do tempo designado para o ensino de Anatomia a alunos do curso de Medicina(2-3), a cobertura de Anatomia Geral parece sofrer o máximo de prejuízo(26). Um estudo recente também reflete essa opinião. No currículo atual, apenas três horas (Quaeinstein. 2009; 7(3 Pt 1):341-6

dro 1) foram designadas para Anatomia Geral, tempo considerado muito curto. A Anatomia Geral estabelece a fundação para toda a matéria de Medicina(26), apresentando a linguagem da Medicina ao aluno. A comunicação clara e concisa com os colegas é parte essencial do treinamento em todas as áreas da Medicina. Um dos objetivos de qualquer currículo de Anatomia Clínica deve ser o desenvolvimento de um vocabulário em terminologia anatômica. O feedback neste estudo mostra que o consumidor necessita de mais ênfase em Anatomia Geral no currículo revisado. A maioria dos internos e alunos sentiu que a Anatomia Clínica e de Imagens que foram ensinados tiveram duração “muito curta”. Em um levantamento, Pabst(11) também encontrou uma necessidade óbvia de mais horas de Anatomia Clínica no curso de graduação. A maioria dos clínicos também acha que a atual educação anatômica de estudantes de Medicina é inadequada, e que está aquém do mínimo necessário para a prática segura da Medicina(27). Eles frequentemente culpam os anatomistas por ensinarem aos alunos detalhes demais, e não as estruturas de relevância clínica(11). Na realidade, em Anatomia, enfrenta-se o conhecido dilema de que quando os alunos têm de apreender grandes quantidades de informação sobre a anatomia do corpo, não têm um conceito correto sobre sua aplicabilidade na Medicina Clínica. Quando estão prontos para usar o conhecimento anatômico, uma porção substancial da informação já foi esquecida(28). A Anatomia Clínica se aplica aos aspectos estruturais da Biologia humana de forma a compreender melhor a função e disfunção do corpo humano(24). A proficiência em Anatomia Clínica requer uma compreensão de todo o corpo humano e da capacidade de aplicação de tal conhecimento na resolução de problemas clínicos(24). Há amplo consenso entre clínicos para que haja uma maior integração vertical do ensino de Anatomia em todo o currículo de graduação(28). Os resultados deste levantamento também sustentam uma Anatomia com maior orientação clínica no currículo de graduação. Uma observação digna de nota foi de que mais da metade dos residentes e alunos julgaram que a Anatomia de Imagens ensinada teve duração “muito curta”. A Anatomia de Imagens é parte importante do material de aprendizado(29). Não há dúvidas de que o imageamento clínico sofisticado seja um caminho essencial para o estudo preciso de estrutura e sua manutenção(30). Por meio do estudo de Anatomia de Imagens, o aluno de Medicina tem condições de usar as informações aprendidas no laboratório de Anatomia para identificar e compreender as formas e relações entre as estruturas anatômicas em um ser vivo. Em alguns centros, a dissecção clássica é realçada pelo uso de ultrassom (US), visualização tridimensional (3D), reconstrução compu-

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tadorizada multiaxial da imagem, e imageamento por ressonância nuclear magnética multiplano (RNM)(29). Os residentes e alunos sentiram necessidade de mais aprendizagem baseada em problemas (PBL) e estudos de caso, considerados instrumentos de aprendizagem de valor. Tavares e Silva(30) documentaram que os alunos atribuíam particular importância aos estudos de caso. Os estudos de caso ou o ensino baseado em casos poderá ser introduzido não como um currículo baseado em problemas, como foi feito por Dinsmore et al.(28), mas como a representação de um compromisso entre a abordagem educacional tradicional sem dissecção e a introdução de Anatomia por Imagens, Seccional, e Viva, como descrito por Tavares e Silva(30). A introdução de mais sessões baseadas em casos e ensino baseado em problemas (PBL) motivará os alunos a adquirirem aptidões de aprendizagem autodirigidas, como relatado por Peplow(31). A Anatomia Topográfica de cabeça e pescoço e a Neuroanatomia são ensinadas no segundo ano, enquanto a Anatomia do seu Desenvolvimento é ensinada no primeiro ano. Os alunos salientam a dificuldade que enfrentaram em compreender o desenvolvimento de cabeça e pescoço e do sistema nervoso por causa de uma lacuna entre a Anatomia Topográfica e a Anatomia do Desenvolvimento desses cursos. Cerca de 2/3 votaram em favor do segundo ano, e cerca de 1/4 pediu preleções de revisão no segundo ano. Acredita-se que os alunos terão maior benefício quando entenderem a Anatomia Macroscópica de cabeça e pescoço e Neuroanatomia. A maioria dos respondentes estava satisfeita com a Anatomia Microscópica e do Desenvolvimento ensinados, mas julgaram que a duração da matéria era “muito curta”. Pabst e Rothkötter(12) também relataram que os residentes classificaram a Anatomia Microscópica como necessária.

CONCLUSÕES A avaliação de um currículo médico deve ser um procedimento com múltiplos passos: os alunos devem ser examinados e solicitados a preencher questionários após diferentes fases do currículo, assim como ao seu final, a fim de definir retrospectivamente a relevância dos cursos, como documentado no presente levantamento. Os resultados deste estudo claramente indicam que mesmo alunos de Medicina no início deste século não só necessitam conhecer Biologia Celular, mas também ter um profundo conhecimento em Anatomia. O acréscimo de mais Anatomia Viva e Clínica a novos currículos de Anatomia poderá motivar os alunos. O acréscimo de um seminário de Anatomia Viva com a apresentação de pacientes e vídeos sobre problemas clínicos comuns em cada região tornará o ensino de Anatomia mais relevante. Isso também pode motivar aos alunos a apreciarem a imensidão de fatos na Anatomia.

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No novo currículo, os cursos de Anatomia poderão combinar dissecção clássica com instrumentos que os médicos e cirurgiões usarão no futuro. Os alunos devem ser apresentados às mais novas tecnologias disponíveis para visualização do corpo com experiência prática no laboratório de Anatomia. A dissecção clássica também pode ser realçada com o uso de ultrassom (US), visualização 3D, reconstrução multiaxial computadorizada de imagens, e RNM. Isso requer uma abordagem interdisciplinar com cirurgiões, médicos e corpo docente básico do ensino de Anatomia. Sugere-se que os residentes, ao final de sua residência, e clínicos também sejam solicitados a avaliarem o currículo de anatomia do curso de graduação.

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