O DEBATE ACERCA DA QUESTÃO AGRÁRIA NOS LIVROS DIDÁTICOS DE GEOGRAFIA DE ENSINO MÉDIO

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O DEBATE ACERCA DA QUESTÃO AGRÁRIA NOS LIVROS DIDÁTICOS DE GEOGRAFIA DE ENSINO MÉDIO¹ Ariel Pereira da Silva Oliveira - UEL [email protected]

RESUMO O presente artigo tem como objetivo analisar os conteúdos pertinentes à geografia agrária nos livros didáticos do ensino médio, e assim entender como a questão agrária vem sendo abordada neste material. Como os conteúdos da geografia agrária são muito amplos, o artigo terá como foco a grande e pequena propriedade, e temas ligados a elas, como concentração fundiária e reforma agrária. No tocante à metodologia realizamos levantamentos e leituras de bibliografias relevantes e condizentes à temática, e leitura e análise de livros didáticos do ensino médio, que abordem temáticas relacionadas à geografia agrária, além disso, fizemos uma sistematização dos dados coletados, redação preliminar, conversa com a orientadora e por fim, a redação final. Com relação às análises, o resultado foi que apesar de certos conteúdos serem abordados, eles não são mostrados em sua totalidade nem exige análise critica por parte dos alunos. Palavras-chave: Geografia agrária. Livros didáticos. Ensino médio.

INTRODUÇÃO O presente artigo faz parte da disciplina Ensino da Geografia e Estágio de Vivência Docente (6EST308), do 3º ano de Geografia, da Universidade Estadual de Londrina (UEL). A questão agrária se mostra muito importante e complexa, uma prova disso é a repercussão que assuntos relacionados a esta temática têm na academia e na mídia sendo sempre alvo de debates e discussões entre os diferentes pontos de vista existentes, que buscam explicar a complexidade do espaço agrário brasileiro. A geografia agrária desempenha grande relevância no entendimento da produção do espaço geográfico no campo, seu estudo engloba desde relações de trabalho, permeando por questões políticas, culturais e econômicas.

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Este artigo foi realizado, como parte da Disciplina de Ensino da Geografia e Estágio de Vivência Docente, do 3º ano do curso de licenciatura em Geografia na Universidade Estadual de Londrina (UEL). 13

Refletir sobre o campo é refletir sobre o espaço geográfico e sua produção; seu estudo é relevante principalmente nas escolas, pois os alunos podem ter contato com problemáticas referentes ao espaço agrário onde ocorre tanto a produção agrícola (alimentos e/ou commodities), quanto as relações sociais, por meio das atividades

agrícolas,

neste

sentido

é

possível

analisar

as

interações

socioambientais, e as modificações nos espaços geográficos que o tempo impõe. Por isso é necessário preocupar com o ensino desse conteúdo e como ele vem sendo abordado, pela mídia, professores, e nos livros didático, que é o objeto do presente artigo, sendo assim espera-se entender um tema da questão agrária em especifico, ou seja, como a estrutura fundiária vem sendo trabalhada nos livros didáticos. Para isso seguimos os seguintes caminhos metodológicos: levantamentos e leituras de bibliografias relevantes e condizentes à temática, e leitura e análise de livros didáticos do ensino médio, que abordem temáticas relacionadas à geografia agrária, além disso, fizemos uma sistematização de dados, redação preliminar, conversa com a orientadora e por fim, o relatório final. Neste sentido o presente artigo tem como objetivo responder a seguinte questão: A questão agrária, em especifico o tema estrutura fundiária no campo brasileiro e assuntos diretamente ligados a ele como reforma agrária e o movimento sem terra, foram ou não negligenciada em algum momento, pelos livros didáticos analisados?

A IMPORTÂNCIA DA EDUCAÇÃO GEOGRÁFICA NA FORMAÇÃO DO SUJEITO CRÍTICO Segundo Tomita (2012) ensinar é diferente de doutrinar, pregar, anunciar ou meramente repassar conteúdos, ensinar significa desenvolver a capacidade de visão e leitura crítica, neste sentido a Geografia objetiva o estudo e análise da organização do espaço geográfico. O ensino da geografia permite o individuo viver e conviver em sociedade, para a autora, hoje é imprescindível abordar conteúdos de cunho natural, social, político, e cultural nas aulas de geografia, a aula deve ser instigadora, o aluno deve pensar, argumentar por si só, não somente memorizar e reproduzir. Nesse sentido aparece a importância do livro didático o qual pode e deve abordar os conteúdos que a autora considera relevantes, o livro didático é um instrumento que deve auxiliar na construção de sujeitos críticos. Sousa Neto (2005) nos lembra de que a escola é a “oficina” do professor, o lugar pelo qual passaram todos os profissionais, foi graças à escola e aos 14

professores que se formaram inúmeros profissionais que desempenham importante função social hoje como médicos, advogados, historiadores, etc.; ou seja, os professores tiveram e têm grande responsabilidade sobre os destinos da sociedade. Em suma, a escola pode formar um aluno crítico, ou um simplesmente dar continuidade ao processo que já vem se estendendo há tempos no meio escolar: formar indivíduos desprovidos das percepções necessárias para interpretar o mundo em sua totalidade. Ainda segundo ele, quem opta por ser e/ou continuar professor, estará diariamente contribuindo e educando a sociedade dentro e fora da escola. O ensino não depende exclusivamente do professor, assim como a aprendizagem não depende exclusivamente do aluno, o professor não é mais inteligente, por conseguinte, sua experiência deve e trajetória não deve se descartada. Cabem aos alunos e professores se tornarem protagonistas críticos da realidade, a tarefa do professor seria simplificar os saberes, contribuindo para a passagem do senso comum para o científico, uma das dificuldades que a geografia enfrenta é a falta de articulação entre os diferentes campos do conhecimento, sendo uma das causas para perda de encanto pelo ensino, por parte dos alunos, e infelizmente mesmo com toda a importância que essa ciência tem na formação do aluno, existem casos onde ela é vista como algo secundário, acarretando na priorização do ensino de matemática e português (TOMITA, 2012) Cavalcanti (2011) contribui nesse debate quando nos lembra que é necessário mostrar aos alunos a importância daquilo que eles estudam, segundo ela o pouco conhecimento de lugares diferentes por parte dos alunos gera um restrito horizonte geográfico o mundo fora da pratica imediata é geralmente mostrado somente pela televisão, os conteúdos de geografia ficam muito distantes do campo de visão e preocupação dos alunos, a geografia na escola deve ser direcionada para o estudo do conhecimento cotidiano trazido pelo aluno para posteriormente confrontá-lo com o conhecimento sistematizado que estrutura o raciocínio geográfico. Nesse sentido Tomita (2012, p.42) destaca “O ensino deve partir das realidades vividas pelos alunos, transformando-as em conhecimentos cientifico, para que assim elas sejam reconstruídas dentro do contexto de conhecimento, propiciando uma aprendizagem significativa”. Ainda segundo a autora, a geografia faz parte do dia-a-dia, e a aproximação do conhecimento científico com o cotidiano do aluno, torna o aprendizado mais prazeroso e dinâmico.

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Neste debate é importante destacarmos que a função atual do estudo da geografia na escola, é formar uma consciência espacial, um raciocínio geográfico, conhecer, localizar, analisar, sentir e compreender a espacialidade. A consciência espacial, o raciocínio geográfico, as informações e conceitos dão autonomia às pessoas. Portanto, a escola guarda a possibilidade de transformação, nela se encontra valores, a possibilidade de tornar o aluno um cidadão, ela é uma das agencias destinadas a propiciar a formação humana, autorreflexão, desenvolvimento de operações mentais etc., a escola deve confrontar o cotidiano com o conhecimento científico. Ainda, para superar o formalismo didático é preciso ter professores e alunos envolvidos no processo de ensino/aprendizagem, é necessário buscar clareza quanto à utilidade dos conhecimentos geográficos, e mostrar aos alunos que a geografia é uma pratica social que ocorre na história cotidiana dos homens, dentro de sala é possível fazer mudanças, aguçar mais os sentidos para conhecer melhor os alunos e suas praticas socioespaciais (CAVALCANTI, 2011). Ainda nesse debate a respeito da relevância da escola e do professor na construção de um sujeito crítico Kaercher (2007) também tem importantes colocações a respeito, para ele o educador deve entender que os alunos são capazes de melhoria, capazes de superarem o estado atual, ele devem apostar no crescimento, a atuação do educador pode fazer diferença, mas o educador não é dono da verdade. Todo aquele que ensina, é um “crente”, precisa acreditar no que ensina, e a falta de vontade de educar constitui um importante obstáculo epistemológico, a educação assume seu sentido, quando o educador constrói seu “suicídio pedagógico”. Para ele o essencial na relação de ensino e aprendizagem está no aluno, no seu desejo de aprender, esse é um não poder importante dos educadores, desenvolver o desejo do aluno em aprender é preciso que o professor tenha o mesmo desejo, busca-se a educação não para manipular, e sim desenvolver neles o desejo de aprender, pensarem a complexidade da nossa existência, uma ‘boa’ educação é aquela que ajuda o educando a criar autonomia e independência, desenvolvendo nele a capacidade de agir livremente. Outro autor que contribui de forma relevante no sentido de mostrar a importância da educação na construção de um sujeito crítico é Bauman (2011), segundo ele a educação deve ser continua e vitalícia, junto a isso ele entra na questão de “dominação” destacando que a educação deve lutar contra isso, ele diz que nessa sociedade a incerteza é instrumento da dominação, a educação deve 16

empoderar o cidadão, fazer dele um sujeito ativo, crítico e consciente capaz de tomar as decisões que possam influenciar sua vida. A importância da educação geográfica na formação do sujeito crítico fica mais claro quando Damiani (2006) diz que um espaço realiza-se como social quando é apropriado, nesse sentido conhecer o espaço significa conhecer as relações que se está sujeito, sendo assim o cidadão só se define como tal, ao reconhecer-se sua produção, já infracidadão é aquele que não se reconhece em suas obras, nesse sentido a alienação do espaço e a cidadania configuram um antagonismo. O infracidadão tem seu espaço reduzido ao espaço geométrico, essa restrição não atinge somente aos mais pobres, mas esses são os mais atingidos. Nesse sentido Damiani (2006) discute o papel do ensino de geografia na formação do cidadão, segundo ela por meio do ensino deve-se abrir caminho para representar as aspirações da sociedade civil, as instituições de ensino devem se misturar intrinsecamente com a sociedade civil, para ela é possível um trabalho educativo, visando esclarecer os indivíduos sobre sua condição de cidadão, fazendo reconhecer a si mesmos como sujeitos sociais. Neste sentido o ensino é um processo de conhecimento do aluno mediado pelo professor, em especifico no ensino de geografia, ele contribui para a formação de cidadania, para Cavalcanti o indivíduo só se torna cidadão com a contribuição de varias instancias entre elas a escola, já que nela acontece à construção e reconstrução do conhecimento, a escola é o espaço de encontro e confronto de saberes produzidos ao longo da história, nela ocorre a ampliação da capacidade de crianças e jovens compreenderem o mundo em que estão inseridos (CAVALCANTI 2002). Segundo Barros, Teixeira e Santos (2013) a escola contribui para a construção do conhecimento, conhecimento esse que deve ser crítico, os conteúdos veiculados no livro didático precisam conscientizar o educando sobre as incoerências de sua realidade, o livro didático como um meio de veiculação do conhecimento é em vários casos único recurso presente em sala, ele precisa transmitir uma informação clara, sem estereótipos e ideologias.

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O USO E A IMPORTÂNCIA DOS LIVROS DIDÁTICOS NA EDUCAÇÃO GEOGRÁFICA Segundo Spósito (2002) a partir da década de 1970 verifica-se preocupação com a formulação de currículos oficiais, o crescimento rápido do sistema educacional brasileiro sem proporcional qualificação e rebaixamento de salários tornou “imperioso” a necessidade de um currículo. Já na década de 1980 foi marcada pela democratização, oferecendo conjunturas para a revisão dos currículos oficiais, de um lado pela mudança política e de outro pelos debates no interior das universidades que estavam questionando as bases desses currículos, no caso da geografia nesse período, esta ciência passa por uma redefinição de seus paradigmas a partir de 1978. Na década de 1980 houve certo estimulo a municipalização do ensino que levou a formulação das propostas curriculares por secretarias municipais de educação. Na segunda metade dos anos 1990 verificou-se retomada do papel federal a definição de políticas curriculares com a proposição dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs). Ainda para a autora é crescente o papel do livro didático no processo ensino-aprendizagem, sobretudo após o aumento de alunos nas escolas públicas, que teve como consequências a piora das condições de trabalho e maior interesse econômico por parte do mercado editorial, esses parâmetros citados interferiram nos conteúdos dos livros didáticos, os parâmetros curriculares revelam preocupação do governo em assumir o papel de propor o que ensinar e aprender, os currículos se tornaram forte indutor do trabalho pedagógico, os professores acabam assumindo o que lhes são propostos, em vez de avaliar e formular uma proposta onde ele é o autor. Segundo Castrogiovanni e Goulart (1988), o livro didático torna-se cada vez mais um instrumento necessário como complemento às atividades didáticas pedagógicas. A seleção do material didático deve sempre ser alvo de uma reflexão profunda, é preciso que o professor tenha claro o papel da Geografia no contexto histórico-social atual, o professor necessita ter conhecimento de sua disciplina tanto no conteúdo quanto, e fundamentalmente na metodologia, um professor bem preparado terá condições de fazer uma análise criteriosa do material. Os autores ainda destacam que um bom livro didático deve levar em consideração: (a) fidedignidade das afirmações, conceitos e informações; (b) deve estimular a criatividade, ou seja, não deve conter ideias prontas, fechadas ou limitadas e sim 18

estimular o aluno a uma interpretação, reflexão e análise crítica; (c) uma correta representação cartográfica; (d) uma abordagem que valoriza a realidade, interpretando cada colocação, a partir do seu cotidiano, permitindo que professor e aluno utilizem suas vivências e experiências; (e) que enfoque o espaço como uma totalidade, sendo que o espaço geográfico deve ser tratado em toda sua complexidade. Cabe salientar que talvez um bom livro didático onde todos os aspectos mencionados estejam de acordo com as exigências, não existe, portanto, é fundamental ao professor buscar outros recursos para suprir tais deficiências. Oliveira (2005) traz considerações relevantes no debate acerca do uso de livros didáticos, para o autor o professor não tem tido uma visão critica com relação ao livro didático, na verdade o professor passou a se tornar vítima dessa ferramenta didática, acreditando que todo o conteúdo do livro didático esta correto, e não necessita ser analisado criticamente, na verdade para ele o professor não teve/tem a oportunidade de ser um produtor de conhecimento, se tornando um mero reprodutor dos conteúdos dos livros didáticos, as editoras chegam até publicar o “livro do professor”, para lhe facilitar o trabalho. Sendo assim o professor não deve usar o livro didático como o instrumento responsável por direcionar seu trabalho, na verdade o livro didático deve ser um instrumento que será usado a serviço do professor, de seus objetivos e propostas, o professor deve ter responsabilidade, e com senso ao usá-lo, fazer do livro didático uma forma critica, confrontando-o com outros materiais, (jornais, livros, artigos científicos, etc.), é interessante quando o autor fala que o professor não deve se submeter à ditadura do livro didático, este material para o bom professor, é um apoio. O professor tem que saber usar o livro para auxiliar o aluno no diálogo com a realidade, assim, orientar o aluno para a formação de um futuro sujeito crítico, criativo e capaz de fazer coisas novas (VESENTINI, 1989).

A GEOGRAFIA AGRÁRIA: UM DEBATE ACERCA DE SUA IMPORTÂNCIA NA EDUCAÇÃO GEOGRÁFICA Segundo PCNs (BRASIL, 1998) de geografia do ensino fundamental II, a questão agrária é muito importante, no documento varias vezes é possível observar passagens que mostram que o professor necessita abordar a questão agrária, segundo o documento, é preciso tratar a reforma agrária como solução para o problema dos sem-terra, e nas questões da renovação urbana, moradia, transporte, 19

saneamento, ou seja, salientar a importância da reforma agrária como solução para os grandes problemas sociais do campo e da cidade no Brasil. Fazer o aluno entender, a consolidação das oligarquias agrárias como representantes do poder, no Brasil colonial, mostrar ao aluno que o processo de democratização pelo qual o Brasil passou nos anos 1980 não garantiu ainda a realização de uma verdadeira reforma agrária. Ainda segundo o documento é preciso mostrar o latifúndio e o trabalho tradicional como sobrevivências do passado nos tempos atuais, também a pequena propriedade de subsistência, as relações de parceria no campo e sua coexistência com a monocultura empresarial, enfim é visto que a questão agrária pode e deve ser trabalhada no ensino fundamental e como o ensino médio, é continuação do processo de aprendizagem iniciado no Ensino Fundamental presume-se que os conteúdos continuem sendo trabalhados de forma mais aprofundada, bem como os livros didáticos são pautados nos PCNs, neles também. No que se refere a Geografia Agrária, os PCN’s organizam essa temática abordando sua relação com indústria, com o urbano, com a questão ambiental, apresenta as características resultantes da ação capitalista no Brasil entretanto não apresenta vinculação entre os temas (SANTOS; CONCEIÇÃO, 2009, p.4)

Camacho (2010) diz que é preciso, desconstruir os discursos da mídia para a construção de uma consciência libertadora por meio da educação, e ainda: Entretanto, uma metodologia progressista, construtivista, emancipatória que permita ao aluno construir o seu conhecimento com autonomia, tendo, do outro lado, uma abordagem de conteúdo tradicional, ideologicamente neoliberal, não consegue explicar a realidade de maneira plena para instrumentalizar o aluno a agir na sua realidade socioespacial de forma emancipatória. Não permite que o oprimido compreenda quem são os opressores e suas estratégias de opressão para a construção de uma ruptura estrutural, de maneira coletiva, por intermédio da educação (CAMACHO, 2010, p. 110).

E ainda: Concebemos que hoje no Brasil não podemos discutir a questão agrária sem refletirmos a respeito dos movimentos sociais do campo. Por isso, entendemos ser fundamental para construirmos uma educação transformadora que os professores conheçam a essência dos movimentos sociais do campo que, na verdade, é a antítese do que apresenta o discurso ideológico neoliberal dos meios de comunicação de massa (CAMACHO, 2010, p.111).

Para Camacho (2008), a questão agrária é muito presente, em alunos oriundos das áreas rurais, bem como daqueles que mesmo distante da área rural, é importante entender que tanto filhos de agricultores familiares como filhos de trabalhadores das cidades, têm algo em comum: a marginalização provocada pelo capitalismo, mesmo com a relevância do entendimento da questão agrária, no Brasil, 20

prevalece é o discurso fatalista da elite agrária, que busca através desta ideologia manter-se no poder, tentando, por meio da mídia desconstruir imagem dos movimentos sociais do campo. Nabarro e Tsukamoto (2010), dizem que a questão agrária é por si só um tema polemico e complexo, ele esta envolto de interesse das mais diferentes classes sociais, portanto nele está envolvido forte viés ideológico pela mídia, a questão agrária é marcada pela luta de classes, é possível nele perceber uma das maiores contradições do modo capitalista de produção. Os mesmos autores ainda nos mostram que um ponto de partida para despertar nos alunos a curiosidade para entender a questão agrária pode ser levantando através de um estudo da história da terra no país (ocupação e posse), e também através do estudo sobre a importância da agricultura, essa curiosidade que os autores dizem que devem ser levantada nos alunos prioriza, sobretudo os alunos que residem na área urbana, já que estes nunca vivenciaram os desdobramentos sociais da questão agrária. Para eles: O fato de a maioria da população viver no espaço urbano dificulta, mas não impossibilita, a compreensão dos problemas do campo. É necessária a realização, por parte do professor de geografia, de uma superação do desconhecimento do rural para que seja desenvolvida a criticidade dos alunos ao serem analisados os problemas do campo (NABARRO; TSUKAMOTO, 2010, p. 47).

Nessa discussão acerca do despertar a curiosidade a cerca da questão agrária principalmente nos alunos de área urbana, Silva (1951) diz que é necessário orientar a educação para que ela transforme a mentalidade das novas gerações, afim de que desapareça o preconceito a cerca do “rural”. Segundo ela: É preciso que o problema agrário, considerado como base da economia do país, encontre apoio entre os brasileiros, em geral, tanto habitantes do campo como da cidade, e que as novas gerações, pela atitude de simpatia à terra, pelo sentido real do valor da agricultura na vida humana e nacional, sejam levadas a justa apreciação desses valores, em qualquer setor profissional em que atuem, e à colaboração efetiva na solução dos problemas a eles relativos. (SILVA, 1951, p. 19).

Ainda para Nabarro e Tsukamoto (2010) a geografia brasileira passou por muitas mudanças, uma das mais importantes foi após o Encontro Nacional de Geógrafos de 1978, quando a geografia critica ganhou espaço nas discussões da ciência geográfica, ainda dentre os acontecimentos que impactaram a ciência e consequentemente seu ensino na década de 1970 é interessante lembrar que a lei 5.692 de 1970 extinguiu as disciplinas de geografia e história da grade curricular, e colocou em seu lugar os “estudos sociais”, Nesse sentido a volta da geografia já na 21

década de 1990 pode ser presenciada também nos livros didáticos passaram a abordar a questão agrária após 1992, quando ocorre a reformulação do currículo e a geografia e história voltaram a fazer parte do currículo base, a questão agrária aparece nos livros didáticos desde o fim da década de 1980, entretanto é dando mais ênfase após 1999 com os Parâmetros Curriculares Nacionais. Ainda segundo eles a ciência geográfica é um instrumento imprescindível para o conhecimento do mundo e para a formação crítico reflexiva dos alunos, nesse contexto, a questão agrária auxilia na análise e entendimento dos discursos presentes na sociedade, que reflete em sua maioria discurso das classes dominantes.

ANÁLISE DOS LIVROS DIDÁTICOS Com base nas considerações até este ponto, onde foi discutida a importância do ensino de geografia na formação de um sujeito crítico, da relevância do ensino da geografia agrária bem como o papel do livro didático no processo ensino aprendizagem se faz necessário nesse item efetuar a análise de livros didáticos aprovados pelo Programa Nacional do Livro Didático, e aqui denominados de livros “A”, “B” e “C”. Na presente análise realizamos um diagnóstico, não cabe aqui dizer se o livro é bom ou ruim até porque ele não foi analisado em sua totalidade, apenas pontuar se a questão agrária foi ou não negligenciada em algum momento. Como a questão agrária é muito ampla o foco foi na estrutura fundiária, e assuntos diretamente ligados a ela como reforma agrária e o Movimento Sem Terra. As questões referentes ao que o presente artigo se propôs a discutir aparecem no livro “A” no subitem “O Estatuto Da Terra e a reforma agrária” nesta parte o livro fala do Estatuto Da Terra, depois define e explica o que é uma propriedade familiar e módulo rural, só depois faz discussões à guisa da reforma agrária. O livro traz o artigo 184 da constituição de 1988, ressaltando o fato de que apesar da constituição ter fornecido instrumentos legais para a realização da reforma agrária, ela não ocorreu, também apresenta para os alunos a lei do Rito Sumario de desapropriação. O livro apresenta gráficos e tabelas interessantes para melhor compreensão dos alunos, como uma que mostra o número de famílias assentadas por região entre 1995 e 2008, e outra que mostra a estrutura fundiária do país em 2006. Há uma lacuna nesta parte do livro, se ele mostrasse os problemas que a concentração fundiária traz como o fato de muitas pessoas terem 22

vocação e vontade de trabalhar na terra e não ter acesso a ela pelo fato de ter poucos com posse de áreas enormes, e improdutivas, seria importante mostrar que no Brasil terra ainda e sinônimo de poder, e que boa parte dela só serve para especulação, enquanto pessoas que poderiam produzir tanto para a subsistência quanto para o mercado não tem acesso, seria importante o livro induzir o aluno perceber que mesmo não tendo tradição ligada a terra essa é uma questão que interfere sim na sua vida, é preciso fazer o aluno entender que essa estrutura concentrada não é justa, e que essa realidade deve mudar. O livro “A” deixa muito a desejar no que tange a discussões ligadas aos movimentos sociais de luta pela terra, em especial o MST, o livro não faz noção sequer a um subitem para discutir questões ligadas a essa temática que é tão relevante no estudo do campo brasileiro. O livro poderia mostrar ao aluno que a luta do Movimento Sem Terra é antes de tudo justa, é preciso mostrar que o movimento busca o acesso a terra, para fazê-la cumprir sua função social que é produzir alimento, também seria preciso o livro mostrar que se as reivindicações do movimento fossem atendidas, isso seria uma forma de tirar das mãos de poucos a terra, diminuindo a concentração histórica de terras do país que se encontra em mãos de uma minoria, o livro poderia trazer exemplos de assentamentos rurais que deram certo e que estão cumprindo seu propósito, contribuindo para a segurança alimentar de toda a sociedade brasileira. No livro “B” na discussão da estrutura fundiária, concentração de terras e reforma agrária, apresenta algumas discussões, e usa o Brasil como referência, os autores levantam a questão de que o país tem uma das piores distribuições de terras, traz algumas explicações para isso como quando fala da grilagem, apresenta tabelas com dados que mostra a atual situação do país, discute a Lei de Terras de 1850, no entanto a discussão acerca da reforma agrária não foi satisfatória. Com relação aos movimentos sociais no campo o item “A luta pela terra no Brasil”, o texto apresenta um pouco das ligas camponesas, e fala sobre a luta do MST de forma sucinta, a discussão poderia ter sido mais rica, nesse sentido, o livro poderia contribuir para contextualizar o tratamento que a mídia disponibiliza ao movimento, mostrando ao aluno como a mídia trabalha para desconstruir e banalizar os integrantes, o livro também poderia mostrar a história do movimento suas conquistas, e como foi tratado de forma brutal, por latifundiários, enquanto na

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verdade

o

movimento

estava

simplesmente

reivindicando

seus

direitos

historicamente alienados. O livro “B” dedica até um item ao tema, que nele recebe o nome “Questão agrícola e agrária no Brasil”, o texto tenta mostrar a diferença entre agronegócio e a agricultura familiar, porém isto acontece de forma equivocada, o livro trata o agricultor familiar como alguém miserável, dando a impressão que este modelo seria sinônimo de atraso. O livro deveria mostrar para o aluno a importância que a agricultura familiar tem, já que ela é responsável por alimentar a sociedade brasileira, enquanto, os latifundiários simplesmente estão preocupados em produzir commodities para exportar, seria interessante o livro indagar o aluno a pensar, o que seria da cidade, sem os alimentos produzidos pelo agricultor, o livro tinha que apresentar que o trabalho do agricultor em varias instâncias da sociedade não é valorizado. O livro “C” destaca a problemática da terra e da distribuição, concentração, e etc. quando explica a diferença entre questão agrária e agrícola, quando o livro foca na discussão acerca da questão agrária brasileira, relaciona a temática com problemas relacionados a “terra” e “sua posse”. Também apresenta todo um histórico da posse da terra no país, e segundo ele “A concentração de terras e a violência no campo foram não só constates, mas crescentes.” (p. 120). Explica o termo questão agrária, traça uma linha do tempo que permite o aluno compreender a problemática, tenta trazer a discussão para algumas realidades dos alunos quando cita áreas que foram incluídas no processo produtivo brasileiro no passado como ocorreu com o norte do Paraná, - mas sendo o livro nacional isso não quer dizer que contempla todas as realidades - só depois entra de fato na discussão da reforma agrária, o texto fala sobre o problema de concentração de terras, cita modernização conservadora e suas implicações para a agricultura; são suficientes estas discussões, mas tudo depende também de um bom professor. Já na pagina 128, o livro traz um subcapitulo intitulado Reforma agrária X Posse da terra onde traz a estrutura fundiária brasileira altamente concentrada como um dos maiores problemas agrários do Brasil. O livro também apresenta a Lei de Terras de 1859 e suas implicações na estrutura fundiária do país, uma passagem interessante do livro pode ser contemplada, segundo ele “Nem mesmo a independência (1822), a promulgação da Lei Áurea (1888) ou a Proclamação da República (1889) foram capazes de alterar a distribuição da propriedade fundiária” 24

(p.129).

Essa passagem mostra que esse modelo é antigo, e sempre esteve

presente na nossa sociedade, e já passou da hora de mudar, mudança essa que só seria alcançada por meio de uma reforma agrária. Seria melhor que o livro mostrasse que a reforma agrária só não aconteceu no Brasil porque o estado sempre trabalhou em prol dos interesses da burguesia, e grande parte dos homens que fazem e executam a lei são ao mesmo tempo donos de terras e, portanto aceitar a reforma agrária seria ser diretamente atingidos com perda de boa parte de suas terras improdutivas. O livro “C” também traz a discussão acerca dos movimentos sociais no campo, como a criação das Ligas Camponesas (1950) e o MST. Com relação ao MST, são dedicadas cinco páginas para discutir movimentos sociais em especial o MST, o livro apresenta um texto rico que mostra a diferença de assentamento e acampamento, discute o histórico do MST, mostra como e porque o movimento se formou, sua importância no cenário atual, o livro ainda traz mapas que mostram localização dos assentamentos no território brasileiro.

CONSIDERAÇÕES FINAIS Diante das considerações tecidas no texto, buscou-se entender como é abordado nos livros didático um tema referente à geografia agrária, a estrutura fundiária, como pode ser visto no referencial, o uso do livro didático cresceu nas ultimas décadas, ele hoje é um instrumento necessário, sendo muitas vezes o único recurso que o professor tem. Pautado nisso, e depois de analisar três livros do ensino médio de coleções diferente foi possível concluir que não existe livro didático perfeito, o assunto que era abordado de forma rica em um livro deixa a desejar no outro e vice-versa, os livros trazem o assuntos de forma muito generalizada numa escala muito ampla, não valoriza a escala local, deixando parecer que os problemas do campo são muito distantes dos alunos, e não tem influencia direta no seu cotidiano, os livros não exigem uma visão critica por parte dos alunos, isso tudo é mais uma prova da responsabilidade do professor, onde mais importante que ter o livro é preciso que o professor tenha prudência desde a sua escolha até o uso, o profissional deve ter capacidade de utilizar o livro de forma crítica, mais que isso, o livro deve ser usado a serviço do professor e não direcionar seu trabalho, o professor deve utilizar os conteúdos dos livros, direcionando em mostrando a importância daquilo para a vida

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do aluno, para conseguir por meio de suas aulas e com o auxílio do livro didático, tornar o aluno um cidadão crítico. REFERÊNCIAS BARROS, G. C.; TEIXEIRA, J. P.; SANTOS, N. C. Uma análise da Geografia agrária no livro didático Geografia. In: I simpósio Baiano de Geografia agrária e XI semana de Geografia da UESB, 2013, Vitória da Conquista. Anais... Vitória da Conquista. 2013 BAUMAN, Z. A ética é possível num mundo de consumidores?. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed, 2011. BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais. Terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental (Geografia). Brasília MEC/SEF 1998 CAVALCANTI, L. S. Geografia e Práticas de Ensino. Goiânia: Alternativa, 2002. CAVALCANTI, L. S. Geografia escolar e a construção de conceitos no ensino. In: ______. Geografia, escola e construção de conhecimentos. 18º ed. Capinas: Papirus, 2011. p. 87-136. CAMACHO, R. S. O ensino da geografia agrária e a formação de professores: entrevista com professores das séries iniciais do ensino fundamental. Revista Eletrônica da Associação dos Geógrafos Brasileiros. Três Lagoas/MS, n. 11, p. 99 – 125, Maio 2010. CAMACHO, R. S. O ensino de geografia e a questão agrária: refletindo a partir da prática em sala de aula. Revista Eletrônica da Associação dos Geógrafos Brasileiros. Três Lagoas/MS, n.8, p. 26 – 51, Nov. 2008. CASTROGIOVANNI, A. C.; GOULART, L. B. A questão do livro didático em geografia: elementos para uma análise. Associação Brasileira de Geógrafos, Seção Porto Alegre, Porto Alegre, v. 16, n. 1, p. 17 – 20, Out 1988. DAMIANI, A. L. A Geografia e a construção da cidadania. In: CARLOS, Ana Fani Alessandri (Org.). A geografia na sala de aula. São Paulo: Contexto, 2006. p. 5061. KAERCHER, N. A. Quando a geografia crítica é um pastel de vento e nós, seus professores, midas. In: colóquio internacional de geocrítica, 9., 2007, Porto Alegre. Anais... Porto alegre: UFRGS, 2007.

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