O DESENHO INFANTIL EM TESES E DISSERTAÇÕES BRASILEIRAS E PORTUGUESAS ENTRE 2002 E 2013

July 23, 2017 | Autor: Paulo Nin Ferreira | Categoria: Sociology of Children and Childhood, Arts Education, Art Education, Arte Educação
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O DESENHO INFANTIL EM TESES E DISSERTAÇÕES BRASILEIRAS E PORTUGUESAS ENTRE 2002 E 2013 Paulo Nin Ferreira [email protected]

Resumo Este trabalho, parte de revisão bibliográfica inicial de pesquisa de doutorado, teve por objetivo a procura de trabalhos acadêmicos – teses e dissertações – que tratassem do desenho infantil, sobretudo os que tivessem o aporte teórico da sociologia da infância, cuja pesquisa tivesse sido realizada com crianças e que levassem em conta o contexto próximo e estendido da vida dos sujeitos e, principalmente, as interações entre eles. O levantamento perscrutou bases de dados de Brasil e Portugal entre 2002 e 2013 e selecionou trabalhos que mais se aproximavam dos referidos critérios, sobre os quais se realizou uma análise sobre a contribuição específica para a compreensão do papel das interações de pares no aprendizado de habilidades desenhistas na perspectiva teórica escolhida. Deste total escolheu-se um para uma análise crítica mais profunda com a intenção de refletir sobre as contribuições da pesquisa com crianças sobre a interação de pares. A pequena quantidade de trabalhos encontrados apenas sugere que há pouco interesse dos pesquisadores sobre as linguagens visuais na infância e no significado para a criança das suas produções. Além disso observa-se que os estudos desenvolvidos no Brasil estão mais centrados em parâmetros da psicologia do desenvolvimento, área de conhecimento que historicamente elaborou as principais referências teóricas para sua compreensão, encontrando-se, porém, um trabalho no Brasil na perspectiva da sociologia da infância. Diferente desta situação encontrou-se nos repositórios portugueses a presença de vários trabalhos sobre o desenho infantil baseados na sociologia da infância. Verificou-se também a tendência mais recente de investigações que versam sobre outras linguagens visuais na infância além do desenho, como a pintura, a escultura e a modelagem. Conclui-se que a pesquisa com crianças é ainda escassa, verificando-se um número acentuado de pesquisas sobre a criança ou que trazem a análise das produções infantis sem incluir dados das interações em contexto de produção. O levantamento aponta que historicamente o significado do desenho para a criança tem sido negligenciado em prol de uma visão centrada no adulto e indica que as pesquisas atuais caminham para um novo balizamento na compreensão do desenho infantil, qual seja, levar em conta as interações entre pares e a importância da construção social e histórica das representações. Palavras chave: desenho infantil; educação infantil; sociologia da infância

1. Introdução O presente trabalho teve por objetivo a procura de estudos e pesquisas que tratassem do desenho infantil tivessem preferencialmente o aporte teórico da sociologia da infância, caracterizados como pesquisa com crianças e que levassem em conta o contexto próximo e estendido da vida dos sujeitos e, principalmente, as interações entre eles.

Esta tarefa se impôs como parte dos estudos teóricos de revisão bibliográfica da pesquisa de doutorado em fase inicial cujo objetivo é analisar o papel da cultura de pares para o desenho infantil como linguagem no contexto da educação infantil, por meio da identificação nos desenhos infantis da construção de identidade social produzidos nas rotinas de culturas de pares. A princípio tomou-se como base o levantamento de teses e dissertações realizado por ocasião da elaboração do projeto de doutorado, uma vez que as consultas ao depositório de teses e dissertação da Capes encontrava-se inoperante no momento de elaboração deste. Este levantamento inicial é o que aparece em primeiro lugar no quadro mais abaixo e abrange um período de dez anos, de 2001 a 2011, visto que 2011 era, então, o ano mais recente com trabalhos já indexados naquele acervo. A seleção de trabalhos obedeceu aos critérios elegidos no momento da escrita do referido projeto que foram agrupados pela abordagem teórica (Interdisciplinar, psicologia, psicanálise, sociologia, história da cultura, semiótica, fenomenologia e cultura visual). Na pesquisa no sítio da Capes com frequência retornavam trabalhos que não tinham nas palavras chave, no título e nem no resumo os descritores solicitados para a busca e isso se tornou um problema difícil de resolver, pois demandou a leitura de inúmeros resumos que não ofereciam nenhum interesse e buscas por muitos descritores diferentes cujo registro acabou por se perder, não se anotando na ocasião que trabalho foi encontrado a partir de qual descritor. Por exemplo, a busca por trabalhos sobre o “desenho infantil” na área da “sociologia da infância”, mostrou-se infrutífera assim como o termo “cultura de pares”. Para contornar o problema a busca teve que ser realizada a partir de diferentes descritores, procurando-se campos de conhecimento próximos como “cultura lúdica”, “cultura da infância”, “cultura infantil”, “cultura infanto-juvenil” combinado ou não com “desenho”. Outra alternativa para o descritor “desenho infantil” foi pesquisar por “desenho” combinado com outros descritores,

como “infância”, “criança”, “educação infantil”, “educação” e

“criança pequena” o que permitiu acesso a um certo número de trabalhos relevantes. Durante o curso da disciplina Seminário de Pesquisa: pesquisa com crianças, oferecido pelo Programa de Pós-graduação em Educação da UFAL ampliou-se a procura por trabalhos que envolvessem a análise de desenhos infantis na perspectiva da sociologia da infância. O percurso que foi percorrido neste segundo levantamento, em função da interrupção do acesso ao repositório da Capes, partiu da leitura de um artigo de Manuel Jacinto Sarmento sobre desenho infantil, no qual se encontrou referência a um trabalho sobre este tema na perspectiva teórica desejada. Ao verificar que este se tratava de dissertação de mestrado orientada pelo

próprio autor do artigo na Universidade do Minho, Portugal, realizou-se um levantamento no repositório daquela universidade. Estes trabalhos compõem a segunda parte do quadro. Os descritores utilizados nesta busca foram “culturas da infância” e “desenho” que resultou em 366 documentos encontrados, a maioria sem conexão com os descritores utilizados. A primeira seleção se deu pelos títulos e uma segunda pela leitura dos resumos, procurando-se sempre o foco no discurso infantil nas linguagens visuais em contexto de pesquisa com crianças. Coincidentemente os trabalhos selecionados como relevantes foram orientados por Sarmento. A abrangência desta busca foi no intervalo de 1997 a 2013, pois não havia a possibilidade de pesquisa por um período de tempo determinado. A terceira parte do quadro é composta por um levantamento recente no acervo de importantes universidades brasileiras escolhidas como as cinco melhores pelo Ranking Universitário Folha (USP, UFRJ, UFMG, UFRGS e UNICAMP) nos últimos dez anos (20032013). Os descritores escolhidos para a pesquisa, além dos já utilizados nas buscas anteriores incluíram também o termo “arte-educação”, “arte infantil” e “educação infantil” na tentativa de pinçar trabalhos numa área de conhecimento mais ampla da arte na escola, assim como tinha sido feito na primeira parte com os trabalhos do campo da sociologia da infância. Cada um dos acervos destas universidades tem uma maneira específica de acesso ao banco de dados, alguns permitem pesquisa por assunto sem período específico, outros não permitem a pesquisa por mais de uma palavra-chave e em outros o acesso é por assunto. Dos vinte trabalhos encontrados na primeira fase que continham uma análise de desenhos infantis considerou-se relevante apenas cinco, ou seja, apenas aqueles que atendiam aos critérios definidos, ou pelo menos que deles se aproximavam. Como trabalhos na orientação teórica da sociologia da infância são ainda em pequeno número, selecionou-se também aqueles que de alguma forma levaram em conta as interações entre as crianças na produção plástica ou visual ou a pesquisa com crianças. Este critério serviu também para a segunda parte da pesquisa, o que foi válido como critério geral também para a terceira parte, entretanto acrescentando-se trabalhos nas linguagens da arte cerâmica e escultura que haviam ficado de fora da seleção do PD, mas foram arquivadas por não tratar do desenho infantil.

2. Levantamento bibliográfico – trabalhos selecionados

1ª PARTE AUTOR/TÍTULO

RESUMO

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KLUG, Alessandra. O desenho infantil em seu cotidiano: imagem, cultura lúdica e socialização. (Mestrado em Artes Visuais). Florianópolis, 2007. Universidade do Estado de Santa Catarina.

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DAY, Giseli. A produção de desenhos na proposta pedagógica para educação infantil: que lugar ocupam as crianças?. (Mestrado em Educação). Florianópolis, 2008. Universidade Federal de Santa Catarina.

Este trabalho dedica-se ao estudo do desenho infantil sob o enfoque do cotidiano da criança, como parte de um processo de comunicação que tem como pressuposto seu cenário de produção. A investigação percorre o desenhar de Enrico, de oito anos, e de Lily, de dois anos, filhos da pesquisadora, no período entre agosto de 2005 a agosto de 2006. Busca-se como objetivo central delinear e investigar as inter-relações, atreladas à experiência gráfica cotidiana da criança, entre o desenhar, a imagem e a linguagem, partindo do contexto de interação social gerador do ato gráfico. A pesquisa é configurada metodologicamente nos moldes do estudo de caso e utiliza a pesquisa ação como técnica de pesquisa. O diálogo teórico é fundamentado nas margens estabelecidas pela Semiótica Cognitiva Dialógica segundo Darras (DARRAS, 2003-A), reunindo autores como Georges-Henri Luquet, Maria Lúcia Batezat Duarte, Brent Wilson, Lev Vigotski, António Damásio e Gilles Brougère. As propostas para análise de desenhos são estabelecidas a partir do aspecto lúdico e comunicacional observado no desenhar doméstico de Enrico e Lily. Partem das interligações entre linguagem, cultura visual, e socialização, estabelecidas no cenário de produção dos desenhos. Investigam-se a hipótese do exercício de cultura lúdica vinculada a este ato, questões estruturais do grafismo alusivos ao esquema gráfico, e as possíveis relações de troca e interação entre diferentes contextos geradores do ato gráfico. Estudar o cotidiano em que o desenhar da criança se desenvolve dá conta de sua participação como forte instrumento no seu processo de socialização. Aproxima este ato de uma concepção de metalinguagem, considerando que as pistas para esse desenhar encontram-se fora do campo do desenho, nos objetos e imagens de um cotidiano marcado pela presença de inter-relações pessoais e da mídia. Trata-se de uma pesquisa qualitativa que buscou investigar a existência de uma possível importância pedagógica na proposta de desenho desenvolvida com crianças na educação infantil a partir das observações realizadas nos momentos de produção do desenho. Apesar de não possuir as crianças como foco central e sim o momento de suas produções gráficas, é perceptível a consideração por elas nesta pesquisa tendo em vista que uma de suas consequências é trazer visibilidade a estes sujeitos nos momentos em que acontecem suas produções em desenho. A pesquisa organizou-se a partir dos levantamentos bibliográficos, além das primeiras observações realizadas em um projeto piloto. Os métodos para coleta e análise dos dados basearam-se em observações sistemáticas de cunho participativo da jornada/rotina da instituição registradas em um diário de campo, além dos registros fotográficos e de áudio. O acesso ao planejamento das professoras e entrevistas também fez-se necessário. O percurso realizado para a execução da pesquisa foi pautado principalmente em alguns conceitos de Bakhtin, como o de dialogismo, exotopia e alteridade. A pesquisa qualitativa do tipo estudo de caso aconteceu em uma instituição de educação infantil particular do município de Florianópolis que procura um aprofundamento de seu trabalho pedagógico com o desenho infantil. A intenção da pesquisa foi congregar os dados e analisá-los de maneira a ir além da explicitação do fracasso, aliando-se à busca por alternativas de práticas e teorias que compreendam o desenho infantil pelas vias de suas possibilidades. A principal hipótese percebe o papel do adulto como eixo central para refletir sobre a educação, visto que ele tem a possibilidade de ampliar ou limitar os repertórios infantis através das propostas oferecidas às crianças, além de ser o principal responsável pelo planejamento e organização da rotina do desenho. Os dados obtidos levantaram questões acerca do papel do planejamento; interação entre adultos e crianças, crianças e crianças; utilização de materiais diversificados, bem como o próprio produto final do processo de desenhar, todos esses aspectos como indissociáveis. As análises foram realizadas com base em um diálogo da área da Educação com outras áreas de conhecimento, como a Arte e a Sociologia. Agregou vozes como as de M. M. Bakhtin, Maria Isabel Leite, Ana Angélica M. Albano, Maria Carmem Barbosa, Eloisa Rocha, Manuel Sarmento. Os resultados encontrados trouxeram à discussão a importância central do adulto no processo de organização do ato de desenhar e alguns questionamentos foram realizados quanto à utilização do desenho como prestação

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NACARI, Déborah Provetti Scardini. Dialogando com o desenho: interações no processo de construção imagética da criança no 5º. Ano do Ensino Fundamental. (Mestrado em Educação). Vitória, 2011. Universidade Federal do Espírito Santo.

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GÓES, Margarete Sacht. As marcas da cultura nos desenhos das crianças. (Mestrado em Educação) Vitória, 2009. Universidade Federal do Espírito Santo.

de contas´ do processo de ensino-aprendizagem aos pais, a importância vista pelas professoras na aquisição da forma no grafismo da criança, a importância de propor desenhos num coletivo que garanta a interação entre as crianças, no sentido de troca de experiências e repertórios, ampliando possibilidades. Outro fator decisivo para compreender a importância pedagógica da proposta de desenho foi a pouca participação efetiva das crianças nas entrelinhas das propostas, o que acaba definindo-as mais como executoras do que como criadoras, remetendo a uma certa compreensão restritiva de criança e de educação infantil por parte das professoras. Na abordagem histórico-cultural, o desenho apresenta-se de modo compartilhado e complexo, sob diversas relações com o outro e com os signos imersos na cultura. Isto é, algo constituído pelas interações sociais e que pode alterar a estrutura das funções psicológicas, pois como signo socializado, propicia a internalização das funções desenvolvidas socialmente. Desse modo, o desenho traz em si significados e sentidos estabelecidos historicamente, revelando as experiências compartilhadas e os modos do sujeito pensar e perceber o mundo. Essas reflexões deram formato ao problema central desta pesquisa: quais interações pode-se detectar na (re)construção imagética da criança do 5º ano do Ensino Fundamental? Sob esse prisma, este trabalho trata das interações no processo de produção do desenho das crianças em um contexto de ensino-aprendizagem, tendo por objetivos: analisar, por meio do desenho, as vivências e os conteúdos internalizados ao longo da construção do conhecimento da criança (em especial, sobre a cidade de Vitória/ES) até o 5º ano do Ensino Fundamental; comparar os desenhos das crianças que vivem realidades distintas na cidade de Vitória (ES): formas, cores, signos; propor situações de aprendizagem que favoreçam a (re)significação gráfica dos alunos. Para sua efetivação, optou-se pela construção metodológica respaldada na pesquisa de natureza qualitativa, sendo o estudo de caso comparativo o viés mais adequado aos nossos propósitos, por proporcionar partilha e confronto de ideias, possibilitando uma construção conjunta de conhecimento. Por essa linha investigativa, a pesquisadora e as crianças envolvidas, convertem-se em co-autoras do contexto estudado. Como lócus da pesquisa, foram escolhidas duas turmas de 5º ano do Ensino Fundamental: uma turma com 29 alunos, da Escola Municipal José Lemos de Miranda (Vitória/ES – Brasil), cuja seleção levou em conta o fato de essa escola estar inserida no bairro São Pedro, periferia da cidade de Vitória; uma outra turma, com 32 alunos, do Colégio Sagrado Coração de Maria (Sacrè-Couer de Marie, Vitória/ES - Brasil), escola selecionada também pela sua localização, Praia do Canto, quer seja, um bairro nobre e tradicional da capital. No percurso das investigações, percebeu-se que a criança formula significados sobre o objeto visto e imaginado, imprimindo linhas e formas que se sobrepõem aos aspectos fisiológicos da percepção visual, contando ainda com a ajuda da linguagem verbal. Isto é, o desenho revela uma realidade conceituada, enriquecida por uma percepção verbalizada, em que não é apenas a figura em si que define a visão captada da imagem, mas os significados estabelecidos pelo autor, ou observador que a torna perceptível e identificada. E, além disso, o desenho também revela a necessidade de entrelaçar emoção, sentidos e cognição por meio de interações que fomentam experiências de figuração, cujo processo concorre para a (re)construção imagética dos aprendizes. Este trabalho analisa estudos desenvolvidos no campo da linguagem visual, numa abordagem histórico-social, pela linha de pesquisa Educação e Linguagens, do Programa de Pós-Graduação da Universidade Federal do Espírito Santo. Trata de um estudo de caso de caráter etnográfico que tem por objetivo investigar as marcas da cultura nos desenhos das crianças, analisando o conceito de interações sociais no cotidiano escolar e fora dele e, ainda, a apropriação, influências e interdependências das relações interpessoais no grafismo infantil, numa turma de crianças com a faixa etária entre quatro e cinco anos, de uma unidade municipal de educação infantil do município de Vila Velha, ES. Parte do pressuposto de que as condições sociais contribuem para a constituição do processo de produção gráfica infantil. Discute e analisa que elementos sociais e culturais estão presentes no desenho infantil, observando como a criança se apropria deles, apresentando-os graficamente. A partir dos dados coletados por meio da observação participante em sala de aula, entrevistas, registros em diário de campo, gravações em áudio, fotografia, além de transcrições por escrito das falas dos alunos em ação educativa e de interação comunicativa, seleciona, para estudo, situações relevantes. Para a análise dessas situações, toma por base os pressupostos teóricos de Vygotsky, buscando dialogar com a realidade observada. Considera que o trabalho efetuado possibilita conhecer a gênese do grafismo infantil, uma das formas de expressão mais latentes e vibrantes durante a infância, por ser o grafismo composto de elementos em relação, buscando compreendê-lo sem perder de vista o caráter subjetivo e

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CORREIA, Fátima Suely Barbosa Da Silva. Representação Social do Corpo no Desenho de Escolares. (Mestrado em educação) Feira de Santana, BA, 2011. Universidade Estadual de Feira de Santana.

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GARCIA, Ricardo Miguel Simões. Narrativas gráficas em contextos pediátricos. (Mestrado em Sociologia da Infância) UMINHO, 2012. Orientador: SARMENTO, Manuel Jacinto.

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GOMES, Zélia Fernanda Fonseca. Desenho infantil: modos de interpretação do mundo e simbolização do real : um estudo em sociologia da infância. (Mestrado em Sociologia da Infância) UMINHO, 2009. Orientador: SARMENTO, Manuel Jacinto.

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MARTINS, Teresa Alexandra Fonseca Moreira

idiossincrático de quem o produziu. Assim, cabe ressaltar a importância das diferenças individuais que enriquecem a vivência coletiva e colocam abaixo a tendência de se considerar os seres humanos como iguais em sua constituição pessoal e social. As questões que se relacionam ao estudo do desenho infantil se constituem um terreno teórico-empírico, cuja diversidade de pesquisas apresenta inúmeras e polissêmicas análises nos diversos campos de conhecimento. A partir deste aspecto, faz-se importante acrescentar a esta discussão a análise desta linguagem gráfico-visual sobre a perspectiva do desenho da figura humana, temática das mais utilizadas pelas crianças para experimentar, elaborar e construir sua expressão visual e gráfica. Nesta perspectiva, apresenta-se, nesta dissertação, uma análise acerca do desenho da figura humana e as representações sociais que se desvelam a partir destes grafismos produzidos por escolares, considerando, além dos elementos que circundam o desenho, outros aspectos que pertencem ao conteúdo latente destas representações gráficas. Para tanto, este estudo se inscreveu nos contornos da linha paradigmática da pesquisa quali-quantitativa apontando para o delineamento do método de análise de conteúdo e seus resultados confirmaram a hipótese inicial de que as crianças transcrevem nos seus desenhos da figura humana, estereótipos e ideologias subjacentes. Por outro lado, esta investigação revelou que os desenhos da figura humana de escolares também apresentam aspectos idiossincráticos que evidenciam, nestas construções simbólicas, um sujeito que recebe e ao mesmo tempo faz cultura, com um olhar que lhe é peculiar e particular.

2ª PARTE Este texto resulta de investigação sociológica conduzida em espaços pediátricos, visando perceber como as crianças estruturam representações sociais relativas ao universo hospitalar, através da recolha de desenhos feitos por crianças hospitalizadas em diversos contextos geográficos. O trabalho é fundamentado numa incursão pelos campos teóricos da Sociologia da Infância, Representações Sociais e Cultura Visual. Dos dados de investigação coletados foi possível estabelecer que as narrativas gráficas veiculadas pelas crianças são enquadráveis em quatro campos, denominados de Mundos, e cuja tipificação ficou assim elencada: o Mundo Manifesto (dimensão material das representações sociais), o Mundo Descoberto (transição da materialidade para as relações e dinâmicas), o Mundo Humano (as pessoas que integram o contexto hospitalar) e o Mundo Simbólico (representações que exprimem significados existentes para além do grafismo). De modo transversal, a Subjetividade e o Imaginário surgem como suporte indissociável das narrativas veiculadas O presente estudo teve como meta conhecer a cultura geracional da infância a partir do desenho infantil. O desenho infantil está presente nas vidas das crianças enquanto produção simbólica e linguagem original, integrando o seu universo expressivo. O desenho infantil, enquanto veículo de comunicação, é facilitador de transmissão de mensagens quer em alternativa, quer em conjunto com a linguagem falada, é uma ferramenta de que as crianças dispõem para inscreverem os seus modos de entendimento do mundo, na primeira pessoa. Neste sentido considerámos questionar: qual a importância do contexto escolar na acção de produção do desenho? Em que medida o desenho infantil é meio de comunicação inter e intrageracional? Que indicadores de apropriação da cultura de pertença estão presentes nas narrativas gráficas das crianças? De que forma traduz o desenho as vivências significativas do seu autor? Como é que a criança expressa no desenho a interpretação do real? O estudo revelou as seguintes respostas: o contexto escolar condiciona a acção de produção do desenho infantil, através da sua vertente humana, o poder do adulto; o desenho infantil constitui-se como um meio de comunicação entre pares, e com adultos, enquanto linguagem simbólica que expressa o entendimento das crianças acerca do mundo; as narrativas gráficas infantis transportam elementos da cultura, global e escolar, enriquecida e transformada pelos elementos presentes na cultura real de pertença; no desenho as crianças inscrevem vivências significativas do seu quotidiano, inserem o conhecimento que possuem da sua comunidade, do seu ambiente físico próximo, das experiências e interacções vividas em vários contextos: família, escola, comunidade e natureza. O desenho das crianças é um modo de expressão, cujo estudo tem amplas implicações no contexto sociológico de formação, assim como nas seguintes questões pedagógicas: i) facilitar a compreensão dos conteúdos escolares; ii) incentivar o aumento do interesse pela cultura escolar alicerçando assim o sucesso educativo. "A voz desenhada e a vez colorida da Infância" constitui uma análise sociológica do desenho infantil. A Sociologia da

Lobo. A voz desenhada e a Vez colorida da infância. (Mestrado em Estudos da Criança área de especialização em Tecnologias da Informação e Comunicação) UMINHO, 2009. Orientador: SARMENTO, Manuel Jacinto.

Infância possibilita uma maior visibilidade à infância e, os desenhos das crianças são considerados como formas de expressão simbólica - de um grupo social do tipo geracional. A "tela" onde conjuntamente desenhamos, assenta em metodologias participativas e observação etnográfica. As "cores" deste percurso foram "pintadas" por crianças com idades compreendidas entre os três e os seis anos, no Jardim-deinfância de Pedras Rubras, na Maia. A análise sociológica do desenho infantil tende a afastar-se de análises realizadas noutras áreas científicas, embora exista um diálogo interdisciplinar. A tipologia e o processo de análise são distintos dos realizados nessas mesmas áreas: não pretendo analisar as fases de evolução do desenho infantil, mas sim, analisar os desenhos conjuntamente com as crianças/autoras, os contextos, as relações e acções sociais que decorrem a par destas produções. A perspectiva da criança, a sua cultura e as condições sociais da mesma são consideradas, e o "colorido" dos desenhos vai surgindo, dando ênfase ao acto de criação cultural e, à forma de acção social.

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GIANNOTTI, Sirlene Maria. Dar forma é formar-se: processos criativos da arte para a infância. (Mestrado em Educação). 2008. Universidade de São Paulo, Faculdade de Educação.

Esta dissertação de mestrado busca compreender a produção plástica das crianças na perspectiva do processo de sua elaboração. A pesquisa de campo se deu em oficinas de arte cerâmica, conduzidas e observadas pela pesquisadora, com um grupo de crianças entre 4 e 10 anos de idade. As oficinas foram oferecidas em uma escola da rede privada de ensino do município de São Paulo, nos anos de 2006 e 2007. Esta experiência forneceu elementos consistentes para a elaboração da reflexão pretendida neste trabalho. O tratamento do conjunto das vivências criativas desenvolvidas se inspira na pesquisa etnográfica e encontra bases conceituais na antropologia. Os dados da pesquisa de campo são registrados em forma de relatos e imagens fotográficas. A análise é feita a partir da experiência acumulada da pesquisadora como arte-educadora ceramista e de um referencial teórico, centrado principalmente nas obras analíticas da artista plástica e pensadora Fayga Ostrower, e nas as contribuições de José Antônio Marina, Anna Marie Holm, Cecília Almeida Salles, Jorge Larrosa e Gaston Bachelard. A compreensão das vivências de criação deste grupo de crianças, em arte cerâmica, permitiu que a autora vislumbrasse a presença de percursos criativos individuais. Estes percursos ofereceram elementos originais para uma compreensão mais aprofundada do papel, importante e significativo, que a vivência de processos criativos da arte pode representar no desenvolvimento da infância. Esta pesquisa leva em consideração a singularidade das individualidades e do processo de formação de cada criança, ampliando, dessa maneira, o diálogo entre arte e pedagogia.

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OLIVEIRA, Alessandra Mara Escultura & imaginação infantil: histórias sem fim. (Doutorado em Florianópolis, 2008. Universidade Santa Catarina.

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FERREIRA, Paulo Nin. O espírito das coisas: um estudo sobre a assemblage infantil. Dissertação (Mestrado em Educação) São Paulo, 2009. Universidade de São Paulo.

Considerando as crianças como produtoras de culturas infantis – com modos singulares de apropriação e criação nas diversas linguagens – esta investigação busca, a partir dos estudos advindos do campo da arte, - em particular da escultura - da filosofia, da sociologia da infância, da história, da psicologia, da antropologia social e da educação, sinalizar algumas bases teóricas e metodológicas que possibilitem olhar para as produções tridimensionais das crianças, promovendo-as enquanto esculturas plenas de valor estético, artístico e cultural, cultivando e ampliando assim, os processos de imaginação infantil. Para tal, realizou-se com as crianças -“brincantes de histórias” -, um mergulho em narrativas mitológicas universais e fantásticas da Ilha de Santa Catarina de modo a inspirar a criação escultórica das crianças; procurou-se promover e intensificar as experiências das crianças com esculturas de diversos estilos, tempos, dentro e fora dos museus da Ilha. Discute-se as relações entre os processos imaginativos infantis na criação escultórica, indicando-se a necessidade de diversificação das matérias disponibilizadas às crianças e dos tempos&espaços adequados para a fruição e a criação na linguagem da escultura. Todas estas ações e reflexões foram realizadas com um grupo de crianças de 4 a 5 anos de idade, inseridas numa instituição pública de educação infantil de Florianópolis-SC, visando, a contribuir para a valorização da infância e de sua produção cultural, no âmbito da construção de uma Pedagogia da Infância. Esta dissertação estuda a assemblage infantil, através do seu processo de criação e recriação durante a atividade de construção, procurando entender seu significado enquanto experiência lúdica e linguagem expressiva que produz conhecimento. Parte da hipótese que entender a relação entre a percepção e a expressão envolvida nessa atividade é crucial para a compreensão do processo de aprendizagem da linguagem visual pela criança. Partindo das concepções teóricas de Rhoda Kellogg sobre o desenho infantil, Jean Piaget e D.W.Winnicott sobre o brincar da criança, Walter Benjamin e Gaston Bachelard sobre narrativas e imaginação na infância e o Paradigma Indiciário de Carlo Ginzburg, essa dissertação reflete

3ª PARTE

Rotta de. um mar de Educação). Federal de

MONTEIRO, Adriana Torres Máximo. Desenho infantil na escola: a significação do mundo por crianças de quatro e cinco anos. TESE (Doutorado em Educação. Belo Horizonte, 2013. Universidade Federal de Minas Gerais.

sobre a natureza da criação artística na infância. A pesquisa foi desenvolvida com quatro grupos de crianças, entre 4 e 7 anos, em Oficinas de Construção em escolas da cidade de São Paulo, durante 2007 e 2008, ancoradas em 15 anos de experiência de trabalho, na forma de pesquisa-ação. Os resultados indicam que a assemblage é uma linguagem expressiva muito significativa para a infância, tornando possível o desenvolvimento de ricas narrativas que equilibram o conhecimento subjetivo e o objetivo de maneira harmônica e profunda, e que amplia a experiência social e cultural da criança. Também aponta que o Paradigma Indiciário de Ginzburg tem gênese na infância e que é possível identificar as suas características na atividade lúdica e expressiva de construção de assemblages. As assemblages infantis são produto de narrativas lúdicas construídas sobre indícios materiais e imateriais que refletem as conexões entre percepção, expressão, imaginação, memória e elementos inconscientes. No contexto da educação infantil, a presente pesquisa teve como objetivo buscar referenciais advindos da Psicologia Histórico-cultural e da Sociologia da Infância para a compreensão e análise do desenho infantil, para além do olhar etapista. Tais referenciais orientaram na captura, descrição e analise do que acontece com as crianças e seus desenhos, quando desenham juntos na escola. A análise microgenética permitiu delimitar um estudo de caso que destaca a voz e a participação das crianças de quatro e cinco anos na pesquisa. No contexto interativo entre as crianças, a professora e a pesquisadora o material empírico foi capturado, resultando em dados histórico-culturais, sociológicos, narrativas visuais e orais. Contrariando o olhar etapista, foram construídos outros modos de olhar as crianças e seus os desenhos, sob a ótica entrelaçada da intervenção da professora, materialidade, estética, interações sociais, mediações semióticas e das significações socioculturais. As crianças, entendidas como sujeitos, revelaram por meio do trânsito entre as linguagens, que pensam criticamente sobre o mundo em que vivem e que as cerca. E ainda, realçaram simbolicamente o lugar que não ocupam na hierarquia da escala social, sendo silenciadas pela descrença do adulto de suas ideias e capacidade de produzirem a cultura. Percebeu-se que as crianças se apropriam, articulam, manipulam valores, códigos éticos, culturais e sociais. Palavras- chave: desenho infantil; educação infantil; estudos da infância.

3. Aspectos gerais dos trabalhos selecionados Um aspecto que salta aos olhos numa observação preliminar do conjunto de trabalhos selecionados é o fato de apenas dois deles ser tese de doutoramento, a grande maioria é dissertação de mestrado. Não que não existam teses de doutoramento sobre o assunto, mas na sua maior parte não se enquadraram nos parâmetros deste levantamento seja pelo enfoque teórico-metodológico, pela data de defesa anterior ao período pesquisado ou porque simplesmente não puderam ser localizadas. Até onde se saiba, a maior parte dos trabalhos de doutoramento sobre o desenho infantil que foram publicados em livro e tiveram ampla divulgação e relevância foram realizados nos anos 1990. O espaço de tempo entre estes trabalhos e a tese mais recente (MONTEIRO, 2013) talvez indique uma mudança de referenciais teóricos e uma mudança de enfoque para olhar este objeto de estudo. Nota-se uma tendência a enfocar os estudos sobre as representações infantis do ponto de vista da sociabilidade e das culturas infantis. Para entender este quadro procurou-se registrar a formação dos orientadores dos trabalhos selecionados, os grupos de pesquisa que participam ou lideram, bem como as temáticas dos projetos de pesquisa que desenvolvem. Primeiramente, constatou-se que os trabalhos selecionados não foram gerados em linhas de pesquisa específicas sobre o tema da linguagem visual na infância, mas inseridos em campos de investigação mais ampliados, como os estudos psicológicos do desenvolvimento humano, linguagem e educação, prática de ensino de arte, semiótica e sociologia da educação. Observou-se apenas uma exceção, até onde se conseguiu apurar, de trabalho produzido numa linha de pesquisa específica sobre o desenho infantil (KLUG, 2007). Esta dissertação teve como orientadora a professora Maria Lúcia Batezat Duarte, líder do Grupo de Pesquisa Imagem, Arte e Desenho na Escola (UDESC), com viés teórico apoiado nas ciências cognitivas e neurociências e que atualmente pesquisa o desenho de crianças cegas. Vários de seus orientandos desenvolveram pesquisas com crianças cegas/surdas e também sobre as influências culturais no desenho infantil na escola. Trabalhos de mestrado e doutorado específicos em desenho infantil também não fazem parte da formação acadêmica da maioria dos orientadores dos trabalhos selecionados, com algumas exceções. Além da pesquisadora já citada que desenvolveu seu doutorado neste assunto, encontram-se a professora Rosa Iavelberg (USP), orientadora do trabalho de Trindade (2011), pesquisadora que tem seu mestrado na temática do desenho infantil e o professor César Pereira Cola (UFES), orientador do trabalho de Nacari (2011), que tem mestrado e doutorado com a temática do desenho

infantil na área da semiótica (PUC-SP). Este pesquisador, embora atualmente desenvolva pesquisa sobre este mesmo objeto, conforme registrado em seu currículo na Plataforma Lattes do CNPq, teve poucos orientandos com trabalhos centrados no desenho infantil. Não foi possível localizar os textos dos seus trabalhos nas bibliotecas digitais de teses e dissertações das universidades em que foram defendidas. Estas considerações sugerem que há poucas pesquisas interessadas nas linguagens visuais na infância e os estudos existentes no Brasil estão centrados em parâmetros da psicologia do desenvolvimento, área de conhecimento que historicamente elaborou as principais referências teóricas para sua compreensão. Infere-se, desta forma, que há espaço para novas pesquisas e que há a necessidade de se olhar para a expressão visual na infância a partir de outros pontos de vista. Foi o que se encontrou nos estudos selecionados na segunda parte deste levantamento, todos sob a orientação do professor Manuel Jacinto Sarmento na Universidade do Minho, em Portugal, na perspectiva da sociologia da infância. Entretanto, igualmente aos trabalhos encontrados no Brasil, estes também são dissertações de mestrado. Na terceira parte do levantamento encontraram-se dissertações já listadas nas seleções anteriores e outros trabalhos que abordam linguagens visuais tridimensionais na infância (GIANOTTI, 2008; OLIVEIRA, 2008 e FERREIRA, 2009) além de uma tese sobre o desenho infantil (MONTEIRO, 2013). A preocupação em estudar a expressão tridimensional parece ser uma tendência recente como uma necessidade de se expandir a temática do desenho infantil para outras formas de expressão plástica nos estudos acadêmicos. Por outro lado alguns destes trabalhos (GIANOTTI, 2009; MONTEIRO, 2013) introduzem um olhar mais detido sobre a importância da interação das crianças na aprendizagem das linguagens visuais. A abordagem interdisciplinar parece ser também um traço em comum às estas diferentes pesquisas indicando a complexidade do tema.

4. O desenho infantil nas pesquisa com crianças Em se tratando do desenho infantil, objeto de nosso interesse, a pesquisa de Alessandra Klug (2007) merece alguns comentários. A pesquisa investiga como a cultura gráfica vai sendo incorporada ao repertório de desenhos de seus dois filhos, compondo, par e passo aos desenhos das crianças, um interessantíssimo mapeamento de imagens da mídia, de livros e outros materiais culturais dos pais e das trocas na escola que serviram de referência para a construção de uma imagética pessoal. Contudo,

distanciando-se do nosso enfoque, o trabalho de Klug focaliza as relações que seus filhos estabelecem nas suas produções com as diversas fontes de imagem que têm contato e não registra o momento da produção de desenhos de forma cooperativa entre crianças. O trabalho de Day (2008), conforme o texto do resumo, embora se preocupe com o momento da produção dos desenhos pelas crianças, também não focaliza as interações entre as crianças. Seu olhar está mais para a relação entre as propostas pedagógicas e os desenhos infantis. Neste sentido, apesar de se caracterizar como pesquisa qualitativa, com parte dos dados colhidos na forma de pesquisa etnográfica, o corpus da pesquisa não registra prioritariamente a interação entre as crianças, mas as respostas destas às propostas dos adultos numa escola de educação infantil. Neste sentido o estudo tende a ser mais uma pesquisa sobre crianças, do que uma pesquisa com crianças (GRAUE; WALSH, 2003). A dissertação de Nacari (2011), apesar de conter em seu resumo a afirmativa que “o desenho traz em si significados e sentidos estabelecidos historicamente, revelando as experiências compartilhadas e os modos do sujeito pensar e perceber o mundo” anunciando subsidiariamente que o corpus da pesquisa deveria conter as “experiências compartilhadas”, o que se percebe pela leitura do trabalho é que os procedimentos metodológicos se afastam deste parâmetro. A autora realizou entrevistas com as crianças e professores e coletou desenhos através de questionário, o que possibilitou registrar as ideações das crianças sobre a sua cidade, mas não flagrar as “experiências compartilhadas” que anuncia. Assim, o estudo também não se configura como uma pesquisa com crianças na medida em que não inclui dados do contexto próximo de interações dos sujeitos. Na pesquisa de Góes (2009) as interações entre as crianças também não se constituem foco, apesar de afirmar no resumo de sua dissertação que analisará as “influências e interdependências das relações interpessoais no grafismo infantil, numa turma de crianças com a faixa etária entre quatro e cinco anos”. Realiza 26 seções de observações onde grava as falas das crianças, mas não indica se em áudio apenas ou em videogravações. Na exposição dos dados de um bom número de desenhos bastante interessantes, verifica-se que as transcrições das gravações apresentam diálogos com a pesquisadora (a maioria) ou com a professora, nos quais os adultos procuram saber a origem das ideias das figuras que cada criança representa. Apesar de a análise refletir

sobre as relações sociais, a imitação e os contextos que originaram os desenhos, há apenas um registro de conversas entre crianças durante as produções. Não foi possível analisar a obra de Correia (2011) pois esta não pode ser localizada, a BDTD da UEFS encontrava-se indisponível. Dos estudos elencados, apenas os trabalhos produzidos na UMINHO são referenciados pela sociologia da infância. Para fins deste texto, optou-se por discutir o estudo de Gomes (2009) que revelou ter uma escrita mais densa e uma análise mais detalhada dos dados. O trabalho de Monteiro (2013) merece um destaque pela importância que dá às interações das crianças para a construção de formas gráficas. A autora se preocupa com a construção compartilhada de pensamentos gráficos, mediada pela palavra organizadora dos diálogos das crianças, realizando uma análise a partir do "diálogo interdisciplinar

entre

as

teorias

originadas

nos

campos

da

psicologia

históricocultural, da sociologia da infância e alguns referenciais de estudiosos do desenho..." (MONTEIRO, 2013, p. 142). Com este trabalho Monteiro pontua que significado do desenho para a criança tem sido negligenciado em prol de uma visão centrada no adulto e indica um novo encaminhamento para a compreensão do desenho infantil, qual seja, levar em conta as interações entre pares e a importância da construção social e histórica das representações, que embora já apontado por outros autores, na sua pesquisa constrói um olhar mais próximo das interações e sua relação com as produções. Como resultado de sua pesquisa sublinha que a importâncias dos desenhos para as crianças vai muito além dos momentos de produção e que estas em geral manifestam uma percepção de que suas expressões são negligenciadas pelas adultos.

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FOLHA DE SÃO PAULO. Ranking Universitário Folha 2013. Disponível em http://ruf.folha.uol.com.br/2013/. Acesso em 03/02/2014. GOMES, Zélia Fernanda Fonseca. Desenho infantil: modos de interpretação do mundo e simbolização do real. Um estudo em sociologia da infância. (Mestrado em Sociologia da Infância) UMINHO, 2009. Disponível em http://repositorium.sdum.uminho.pt/handle/1822/11016. Acesso em ago/2013. GRAUE, M. Elisabeth; WALSH, Daniel J. Investigação etnográfica com crianças: teoria, métodos e ética. Lisboa, Pt: Fundação Calouste Gulbenkian, 2003. KELLOGG, Rhoda. Analisis de la expresión plastica del preescolar. Madrid: Cincel, 1989. KRAMER, Sonia. Autoria e autorização; questões éticas na pesquisa com crianças. Cadernos de Pesquisa, n.116, p. 41-59, julo/2002. LOWENFELD,Victor. Desarrollo de la capacidad creadora. Buenos Aires: Kapelusz, 1961. MACHADO, Anna Rachel; LOUSADA, Eliane Gouvêa; ABREU-TARDELLI, Lília Santos. Resenha. São Paulo: Parábola Editorial, 2004. SARMENTO, Manuel Jacinto. Conhecer a infância: os desenhos das crianças como produções simbólicas in: MARTINS FILHO, Altino José; PRADO, Patrícia Dias. Das pesquisas com crianças à complexidade da infância. Campinas, SP: Autores Associados, 2011, p. 27-60. SPERB, Tânia Mara. Diálogo interdisciplinar: tensões e convergências. In: MÜLLER, Fernanda; CARVALHO, Ana Maria Almeida (orgs.). Teoria e prática na pesquisa com crianças: diálogos com Willian Corsaro. São Paulo: Cortez, 2009. TRANG-THONG. Estádios e conceito de estádio de desenvolvimento da criança na psicologia contemporânea (vol. 1). Lisboa: Edições Afrontamento, 1987, p. 159-264.

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