O direito ao bin vivir: do antropocentrismo ao biocentrismo. Uma nova narrativa constitucional do sul pós-colonial a partir da Pachamama e a natureza como sujeito de direitos.

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O direito ao bin vivir: do antropocentrismo ao biocentrismo. Uma nova narrativa constitucional do sul pós-colonial a partir da Pachamama e a natureza como sujeito de direitos.
Saulo Tarso Rodrigues
Núria Belloso Martín
Alexandre Fernandes da Silva

"A compreensão do mundo é muito mais vasta que a compreensão ocidental. Nós precisamos descolonizar não somente nossas ciências sociais, nossas epistemologias, nossas ontologias (...) o mundo ocidental encolhe-se cada vez mais e o mundo não ocidental expande-se." Boaventura de Sousa Santos
"É Preciso compreender que a construção do constitucionalismo e da teoria dos direitos humanos é uma construção científica." Roberto Gargarella.
As narrativas constitucionais: entre conhecimentos colonialistas e emancipatórios. A urgente necessidade de descolonizar o constitucionalismo europeu para ampliar a possibilidade de um conhecimento constitucional emancipatório.

Primeiramente, para entendermos demonstrado nas narrativas jurídicas e no pensamento constitucionalista ocidental, é preciso definirmos alguns aspectos conceituais e epistemológicos, sob pena de o olharmos com olhos errados, aliás, como tem sido feito pela maioria dos estudos jurídicos e constitucionais sobre temas centrais como direitos humanos e democracia. Para isso, nosso marco teórico é aquele proposto por Boaventura de Sousa Santos e denominado de Epistemologias do Sul, que são o conjunto de procedimentos para validar o conhecimento daqueles que foram colonizados pela injustiça, opressão, dominação, causados pelo capitalismo e pelo colonialismo, e por óbvio pela imposição de uma narrativa eurocêntrica e descontextualizada de direito. Um conhecimento (constitucional) na perspectiva do sul geopolítico. E nesta perspectiva, podemos entender o sul a partir de duas faces: como uma caricatura do norte (narrativa esta hegemônica, e a maneira pela qual o capitalismo global o vê) ou como um sul pós-imperialista e de resistência. É, portanto, nesta última perspectiva, que interessa para o nosso debate, um conhecimento nascido através dos processos de resistência do colonialismo jurídico, do capitalismo e do patriarcado.
Para iniciarmos este momento de reflexão, firmado aqui pelo rompimento epistemológico, cabe nos perguntar: Por que pensarmos em uma epistemologia do sul? Por que a necessidade de um novo conhecimento constitucional do sul? Por óbvio que a resposta parece simplista, mas na realidade não o é. De qualquer modo, e de fato, tais epistemologias só exsurgem pois o que temos hoje pelo modelo colonialista são formas de epistemologias do norte – epistemologia de dominação. Se não houvessem epistemologias do norte não haveria necessidade de uma epistemologia do sul. Esta ecologia de saberes e ignorâncias só surge a partir da necessidade da resistência aos modelos de dominação impostos pelo liberalismo político-jurídico e econômico. É portanto, um esforço epistemolológico de reconhecimento de ignorâncias abissais não narradas, que foram negadas desde sempre pelo modelo de racionalidade europeia, e que por sinal, a nós foram impostos desde o modelo colonial até após os processos de independência. Há pois neste processo uma dupla face: sem as epistemologias do norte não há epistemologias do sul, e portanto, no momento em que não existirem mais as epistemologias de dominação não haverá necessidade de uma epistemologia de resistência. Portanto, necessário é o conhecimento do que são as epistemologias do norte, para que tenhamos em mente os objetivos das epistemologias do Sul, e com elas, novas narrativas emancipatórias.
Fundamentalmente este modelo científico hegemônico, denominado aqui de epistemologia do norte pelo qual toda a teoria constitucional e política da modernidade ocidental foi constituída , é um paradigma que vai a nascer no século XVII e vai ter seu grande apogeu no século XIX e que vai se prolongar pelos últimos cem anos como um paradigma que fundamenta-se na ideia de que há apenas uma forma de conhecimento rigoroso sendo tal conhecimento chamado de " ciência" que se considera como o único exclusivamente válido na altura em que havia inclusive a disputa pela hegemonia do conhecimento pelo qual participavam a filosofia e a teologia. A partir do século XVII a ciência moderna torna-se o centro do saber e ao contrário da filosofia e da teologia assentava-se em premissas novas a saber, uma forma de pensar que afasta a experiência do mundo e a substitui pela experimentação. Criam-se com isso, formas próprias de metodologias a partir do conceito de neutralidade e separação entre sujeito e objeto que obviamente vão a criar o que denominamos de conhecimento rigoroso. O objetivo do conhecimento passa a ser a busca da verdade, tida esta como a representação do real, e como tal, possui uma força muito especial de determinação do que seja o real científico. Este rigor passa a ser definido pela via da determinação e observação das regularidades que vão se afirmar na forma de leis: leis da natureza, da sociedade e, portanto, as leis que determinam todo o processo científico.
No momento histórico em que a ciência moderna surge, ela vai se tornar extraordinariamente forte, pela sua inovação na forma de ver o mundo, que a passou a tirar a centralidade nas duas grandes disciplinas que estavam a dominar o mundo europeu: a teologia e a filosofia. É evidente que este conhecimento que tem estas características, a objetividade do conhecimento foi seu grande objetivo, na medida em que houve a separação entre o sujeito e objeto e entre os métodos quantitativos e qualitativos, gerando a sua total neutralidade. Mas o que poderíamos encontrar de errado neste modelo? Em um primeiro momento, parece que nada, haja visto que tal modelo como tornou-se hegemônico sua hegemonia teve a via paradoxal de tornar-se ela própria um verdadeiro senso comum. Mas na verdade este modelo de conhecimento tem em bojo um mecanismo político que vai se tornar fundamental para a modernidade ocidental precisamente a partir do século XVII e posteriormente a partir do século XIX com a revolução industrial. Em outras palavras, a ciência não é e não foi apenas uma epistemologia mas uma verdadeira geopolítica de conhecimento tendo como características essenciais primeiramente o não interesse pelos princípios iniciais e finais da vida, visto ser uma ciência ativa, preocupada apenas com os processos de desenvolvimento social, que vão acontecer nos parâmetros do capitalismo e do colonialismo.
Estamos aqui a falar, portanto, de um modelo que vai dominar e implementar os modelos de dominação, precipuamente a partir do século XIX em que o modelo de ciência da natureza se transforma em força produtiva a partir da primeira revolução industrial sendo ela própria, a ciência moderna, uma força produtiva. No entanto, este modelo que torna-se hegemônico, no momento em que surge, nasce como uma via emancipatória. Há portanto, um elemento revolucionário na ciência moderna. tanto que a ciência se torna a força motriz da burguesia para lutar contra o antigo regime. É dizer, naquele momento histórico a ciência se torna revolucionária: liberta a burguesia da teologia e do sistema medieval , havendo uma libertação das ideias científicas imposta pela igreja e pela teologia que firmavam a dominação política e cultural. Acontece que ao chegar ao poder a burguesia de uma forma revolucionária torna-se reacionária, impedindo qualquer forma de racionalidade e desenvolvimento que não fosse capitalista, e portanto, pautado pelo colonialismo e pelo patriarcado. E aqui cabe um adendo. O que faz dela problemática em seu surgimento não tem a relação com sua forma metodológica e sim com sua hegemonia, é dizer, considerar-se ela própria como a única forma de conhecimento, desconsiderando todas as outras formas não experimentais como ignorâncias.
Esta política do conhecimento como bem demonstrou Boaventura de Sousa Santos teve outro fator importante. O que seria o saber? O que é conhecimento cientificamente válido? Partindo da ideia que conhecer é conhecer a nós próprios e experimentarmos o mundo como o nosso, e a ciência vai ter esta característica exatamente porque um conhecimento tido como ativo e transformador da sociedade ela dá aquém a domina a ideia de que o mundo é seu, e portanto o pode dominar e o transformar. E nesse ponto, como ficariam as comunidades afastadas dos centros hegemônicos do conhecimento e que, portanto, não produzem ciência? Certamente este sul geopolítico e científico vai ver que não lhe é permitido apropriar e experimentar o mundo como seu próprio mundo. Ao contrário o que a ciência vai produzir é uma visão do mundo extremamente eurocêntrica, europeizada que quando deslocadas para outras regiões do mundo (sul geopolítico) que não fazem parte dos centros hegemônicos de produção do conhecimento faz com que estas regiões do mundo não sintam-se "pertencentes" a este modelo epistemológico, e portanto, sentem como se seu mundo está sendo imposto de uma forma totalmente excludente.
Sendo o conhecimento o meio de nos apropriarmos do mundo, eis a dialética do conhecimento científico (e jurídico por óbvio): se nos apropriamos de uma forma que nos permite transformar é emancipador. Se nos apropriamos de uma forma de conhecimento que não é construído, mas nos é dado como verdadeiro, não é nosso, é alienígena, torna-se uma forma de opressão. É nesta dialética que insere-se a premissa da incompletude do conhecimento, e sua dualidade entre saberes (hegemônicos) e ignorâncias. Consequentemente, o problema epistemológico do constitucionalismo liberal está centrado na sua exaustão científica e todas as alternativas liberais são formas de epistemicídio. Se olharmos para a diversidade do mundo e a diversidade de conhecimentos (que não foram considerados como científicos pela ciência hegemônica) veremos que o movimento científico do constitucionalismo global e do internacionalismo dos direitos humanos, bem como dos pressupostos do Estado laico e do racionalismo firmado e desenhado pelas sociedades capitalistas é extremamente provinciano, portanto, é perceptível o motivo pelo qual todas as outras culturas que não a ocidental não partilham de tal conhecimento. É dizer o universalismo (direitos universais e constitucionalismo global) não se deu pela força das ideias mas, pela ideia da força, uma verdadeira forma colonialista de imposição de um ideal hegemônico. Quem não faz parte dos centros hegemônicos de produção de conhecimento, passou a ficar fora da história, e por óbvio fora do conceito eurocêntrico de desenvolvimento.Do ponto de vista epistemológico para entendermos portanto o primado da colonialidade dos primados do direito liberal é necessário entender que toda a história da hegemonia colonialista e capitalista foi e continua a ser uma história de hegemonia cientifica.
Boaventura de Sousa Santos em seus trabalhos de investigaçãopropõe uma crítica ao modelo hegemônico de conhecimento sob três óticas diferenciadas mas interligadas entre si. A primeira crítica, ou fase, começa com a obra O discurso sobre a Ciência publicada no ano de 1987 e que postula uma crítica interna da ciência moderna, feita a ela mesma, portanto, ainda não centrado em sua relação com o capitalismo e com o colonialismo, uma crítica abstrata centrada na metodologia positivista. Entre as principais críticas feitas naquele momento podemos citar a principal delas, no qual todas as demais decorrem, notadamente a pergunta de como é possível se fazer e criar um conhecimento separado da realidade social, um conhecimento experimental, ou um verdadeiro conhecimento de laboratório, sem levar em conta, as experiências cotidianas da vida, as ontologias e as práticas sociais. Foi portanto, uma verdadeira crítica interna visto questionar o facto de que se nas práticas sociais há espécies diversas de conhecimento, não que se falar como sendo este conhecimento produzido em centros de saber como sendo o único representante da realidade. Eis o paradoxo: como pode uma ciência ser considerada socialmente neutra se ela própria ela uma prática social? Esta crítica central, demonstrou a grande fragilidade deste modelo de conhecimento que tomava para si a hegemonia da definição das leis da natureza e das leis da sociedade. Além do mais, na medida em que a crítica se baseava na própria ideia paradigmática de ciência, percebe-se que não há por parte dela, um olhar externo para as culturas externas à cultura ocidental. O modelo de ciência dominante portanto, não vai buscar em outros paradigmas culturais formas de conhecimento como conhecimento científico. Este foi o grande problema que fundamentou as linhas abissais da modernidade. Logo, o modelo dominante de ciência é apenas um entre milhares. Ao longo da modernidade existiram e ainda existem outros paradigmas científicos dentro da ciência moderna mas que por ela não foram considerados como saberes e sim como ignorâncias, portanto, no lado de lá da linha abissal.
Questiona-se com isso a relação sujeito-objeto, natureza-sociedade, o rigor científico baseado na determinação, a cientificidade das leis a partir da probabilidade de conhecimento e, sobretudo, a premissa que as ciências se mantenham separada das práticas sociais. Por isso, a grande questão surge é como um modelo pode trazer um sentido único de rigor se não se preocupa com sentidos éticos, com fins últimos da vida, com os sentidos do cotidiano, da diversidade, um modelo que reduz a complexidade da vida em um sentido simplificador determinado como científico. Portanto, nem todos os problemas sociais passam a ser objeto das preocupações científicas mas apenas aqueles em que a ciência os escolhe como sendo eles próprios problemas cientificamente relevantes. E nesse sentido os estudos feministas foram demonstrando como a verdade não apenas uma questão de rigor científico e de neutralidade e separação sujeito-objeto, nem muito menos determinado por um conjunto de regras inquestionáveis, mas a verdade é sim, uma construção social. Por lógico a verdade não é uma representação e sim uma construção. Neste ponto é importante ressaltar que a ideia de representação traz consigo a premissa que uma verdade somente será verdade científica se for partilhada, e, portanto, em não o sendo, não será considerado uma verdade científica. Uma verdadeira caricatura abissal do pensamento. Por isso, longe da teoria dos paradigmas de Thomas Khun, pode-se perfeitamente reconhecer um pluralismo interno no conhecimento cientifico, conceitos diferenciados de rigor científico, de leis da natureza, conhecimentos que estão postos para e pelas práticas sociais e que não firmam-se em fins neutros.
A segunda fase crítica das ciências ocorre com a crítica anti-capitalista e, com isso, passa a ter-se uma crítica externa ao modelo científico, baseado em sua relação com o conceito de desenvolvimento do capital, ainda que neste momento, o colonialismo e sua crítica não estivessem presentes. Aqui reconhece as duas grandes formas de conhecimento, o conhecimento regulação e o conhecimento emancipação e seus desiquilíbrios a partir da união entre ciência, capitalismo e direito. Além do mais, a crítica externa ocorre por duas vias: por um lado reivindica a validade cientifica de outras formas de conhecimento, que Boaventura chamou de "conhecimento prudente para uma vida descente," necessário, portanto, se reconhecer diferentes formas de conhecimento para diferentes práticas sociais e por outro, o privilégio dado pela modernidade ocidental à ciência o privilégio exclusivo do rigor científico. O que se põe em causa nesta segunda fase não é o rigor cientifico mas sim, sua exclusividade. Logo, o conhecimento científico e seu rigor, não é e jamais foi universal, mas apenas ocidental. Tal conhecimento é tão hegemônico que quando olharmos para a diversidade do mundo veremos que ela é extremamente provinciana, visto que as outras culturas não ocidentais não partilham dela.
Na terceira fase da crítica à ciência entre a crítica ao pensamento colonialista e abissal, pois foi através dele que a ciência passa a ser um modelo de dominação política, levando a frente um verdadeiro epistemicídio. Surge portanto, por várias razões. A primeira é decorrente da premissa que o problema epistemológico será sempre um problema político e ético, e portanto, não há neutralidade, e o que estamos a presenciar no norte global (tido este como os centros que dominaram o capitalismo e o conhecimento) é um sentimento de exaustão teórica e política. A ideia de que não há formas contra-hegemônicas, alternativas ao conhecimento hegemônico, como por exemplo alternativas aos conceitos de democracia deliberativa, direito-pluralismo, institucionalidade-comunitarismo, Estado laico-ontologias e direitos humanos universais, demonstra a falta de alternativas reais baseadas em conhecimentos construídos a partir da diferença. Portanto, a busca epistemológica vem sempre de um mal-estar, é dizer, só há busca quando não há alternativas ou se estas constituem-se mais do mesmo (perceptível no discurso constitucional reproduzido pelos seus manuais). E para Boaventura o mal-estar centraliza-se na impossibilidade do radicalismo, o conformismo sufocante, que promove a apatia e com isso, recusa e reprime a rebeldia. Nesse sentido a crítica ao capitalismo e ao colonialismo, e ao discurso constitucionalista-monista e à todos os seus pressupostos regulatórios passa pela temporalidade e seu paradoxo: da urgência á apatia.
Chegamos portanto, ao século XXI com a constatação que todo o modelo posto não funciona. A ideia que sempre que a há uma crise de regulação surge uma nova possibilidade de emancipação. Essa foi a forma que a tese do progresso foi constituída, entre lutas conflitantes entre modelos de regulação e modelos de emancipação. No entanto, hoje passamos a assistir uma crise total de regulação sem no entanto existir projetos de emancipação. Entramos em um processo pós-institucional sem que haja uma força contra-hegemônica capaz de contestá-lo. Estamos a enfrentar pela primeira vez na história da modernidade ocidental uma dupla crise de regulação e de emancipação. Nem as instituições que nos regulam a fazem de forma eficaz nem nós somos capazes de propormos projetos alternativos ao modelo regulatório. Esta é a verdadeira condição do nosso tempo, estamos livres mas ao mesmo tempo aprisionados. É dizer, o problema não é estarmos presos ao uma forma única de pensamento, mas sim quando da possibilidade da libertação não conseguirmos pensar alternativas ao modelo colonial. Estamos desesperados por buscas de alternativas, tanto no paradigma político como jurídico e tais alternativas somente poderão vir do sul local visto que o direito e o modelo institucional imposto pelo modelo liberal demonstrou seu esgotamento. Especificamente no Direito, o discurso hegemônico e as práticas discursivas repetitivas sobre conceitos eurocêntricos nos demonstram a verdadeira necessidade de radicalidade. Por isso o reconhecimento da impossibilidade de radicalismo é fundamental para uma alimentação do inconformismo, perante um modelo monista, colonial e imperial de direito construído a partir de práticas que foram impostas a partir de contextos sociais não representados. É dizer, o radicalismo necessita obrigatoriamente de outras narrativas e outras fontes sobre direito. É dizer, nada é universal, pois o mundo e suas representações jurídicas são locais. E, por óbvio nos países do sul, não representados pelo eixo constitucionalista do norte, não o tem como referência. Por isso uma narrativa jurídica pós-colonial precisa obrigatoriamente partir de um conceito zero, de experiências traduzidas a partir de outras experiências culturais e jurídicas que não baseiam-se nos elementos centrais da Europa ocidental no qual estão os discursos já exaustivos de Estado laico, direitos humanos universais, capitalismo e democracia representativa. Todas as formas de conhecimento são incompletas não havendo qualquer possibilidade de sua completude, portanto, as formas de conhecimento produzidas pelo direito eurocêntrico ocultaram a realidade que é muito mais ampla do que existe nos nossos manuais e no conhecimento produzido. Portanto, precisamos urgentemente descolonizar nossas narrativas para ampliar a possibilidade do conhecimento.
Eis, portanto, para fins de conclusão desta pequena reflexão a segunda pergunta: Como podemos perceber o colonialismo nas narrativas constitucionais? Talvez essa pergunta seja mais simples de responder, não pela falta de complexidade mas pela implicidade com que as narrativas são postas. Por essa razão, historicamente, necessário se faz um recuo à década de 20 do século passado, especificamente na Alemanha, para entendermos qual o debate que se tem, geograficamente na República de Weimar. Fundamentalmente, as Constituições modernas (americana e francesa) resultam de uma luta política e de uma classe social que emerge, e que vai conquistando o poder econômico, político e social a partir do século XIV e XV, a burguesia capitalista. Naquela altura, como bem dizia Marx, era uma classe revolucionária, no qual propunha uma nova forma de sociedade, mas que não tinha em suas mãos uma estrutura institucional na medida em que o Estado era baseado no ancien regime, e portanto, tem ela que criar um Estado a sua medida, para que suas premissas política e econômicas fossem validadas. Este foi, o fundamento base de toda a luta política contra o antigo regime, vistas a criar uma nova estrutura a imagem e semelhança da burguesia e de seus fins econômicos. Este debate entre a burguesia e a aristocracia, tratou-se no momento, em um debate de alto calibre, visto ser representado pelas revoluções liberais, que estabelecem um novo porvir. E por óbvio, a burguesia saindo vitoriosa, quer ao nível republicano, quer ao nível monárquico surgem os regimes liberais denominados mais apropriadamente de Estados Constitucionais, que possui basicamente esta característica: o poder do Estado tem limites e sua legitimidade se afere pela forma como ele obedece-os. Portanto, a medida em que se consagram os modelos de Estados Constitucionais, as Constituições europeias consagram essa forma institucional e com isso, deixa de constituir qualquer tipo de problema "por detrás" da constituição, visto ser ela a representação do Estado burguês. Esse é o motivo pelo qual na Europa do século XIX até a segunda guerra mundial, as discussões constitucionais são fundamentalmente discussões jurídicas, pois a classe dominante é aquela que controla o próprio Estado e a própria constituição.
Ao longo do século XIV e início do Século XX esta hegemonia política sofre as primeiras contestações na medida em que se busca aumentar e universalizar o direito ao sufrágio. E é nesta medida em que começam a convulsionar os diversos poderes sociais que competem com a burguesia na construção deste Estado, nomeadamente as classes trabalhadoras que trazem a sua agenda política. Isso, faz com que a partir da modificação das agendas, e o debate passa a ser não mais entre burguesia e aristocracia e sim entre burguesia e classe trabalhadora em sentido amplo, vamos assistir a repolitização das próprias constituições, e portanto, a Constituição passa ser novamente um problema político central. E é nesta altura que o Estado passa por uma nova reconfiguração alterando de forma substancial sua agenda política e portanto, constitucional. De um estado negativo, passamos a assistir a instituição de um Estado positivo e intervencionista. Passamos politicamente do Estado liberal ao Estado social de direito. Eis o problema que se levanta a esta altura: se por um lado a constituição é quem define, por outro lado, quem a defende? Se a constituição não é atacada por óbvio não merece ser defendida, mas em sendo, quem será responsável pela sua defesa? Quem garante a regularidade constitucional? Quem seria este poder neutro para a sua defesa?
Por influência de Hans Kelsen, vão a encontrar o grande defensor da Constituição: o Tribunal Constitucional, que conforme Kelsen serão eles que em última instância poderão a defende-la, passando a ser um legislador negativo, famosa fórmula defendida pelo autor austríaco.
Este debate, longe de um período histórico passado, torna-se atual na medida em que primeiro há países que não têm um tribunal constitucional, ou mesmo aqueles que o possuem estão a discutir suas funções e limites. De outro lado, com a derrota do regime nazista a teoria Kelseneana saiu vitoriosa e, obtidas as diferenças, a Europa e os países da América-Latina passaram a constitui-lo como forma institucional de controle legislativo e político.
Esta narrativa, é como podemos ver, uma história bastante europeia, visto ter sido neste continente que surge toda a narrativa exposta, mas que, de outro lado, mostra a necessidade de a partir do quadro teórico das epistemologias do sul obter um crítica com outras narrativas apagadas pelo constitucionalismo como se sua história fosse apenas uma parte da Europa, e portanto, o restante sequer haveria existido. E para tanto, para as epistemologias do sul é de fundamental importância a definição das linhas abissais. A partir deste quadro teóricopodemos ver uma linha abissal, qual seja, o constitucionalismo liberal na Europa não surge como uma proposta emancipatória mas sim regulatória, na medida em que visava regular a vida das metrópoles e não das colônias, onde a quase toda a população mundial vivia. Portanto, há nesta narrativa ao contrário do que pregava a burguesia, um Estado que ao invés de propor um projeto revolucionário suplantava um verdadeiro projeto colonial e reacionário. Isso fica claro, que em toda a teoria constitucional moderna e principalmente, na teoria moderna dos direitos humanos, nenhum teórico preocupou-se com o constitucionalismo para as colônias. Ao contrário, como veremos mais adiante, os marcos teóricos foram impostos única e exclusivamente para, dentro de uma estrutura justificada por limites, impor sem limites o marco do colonialismo nas periferias. Portanto, e esse foi o grande pensamento abissal do constitucionalismo moderno, a legitimidade do poder era baseada em uma via dupla e paradoxal: limites para a burguesia e ausência de limites para as colônias.
É dentro desta narrativa que de fato vemos para que surgiu o constitucionalismo moderno, sua teorização e, com ele, as próprias constituições. E esse viés abissal e colonial vai sair do localismo chamado Europa e se espalhar pelo mundo através do processo hegemônico da globalização e do discurso dos direitos humanos.
Podemos dentro desta narrativa pós-abissal, e, portanto, dentro de uma narrativa que se constrói nos processos constitucionais do sul geopolítico, identificar 3 grandes experiências constitucionais pós-coloniais no mundo, ou três grandes contextos constitucionais não narrados, que podemos colocar como característica especial, apesar de suas variações, advir sempre de um debate europeu e eurocêntrico. É dizer, no momento em que a burguesia estava hegemonicamente no poder político as questões constitucionais eram resumidas às questões jurídicas, mas, a partir das transformações sociais, das novas agendas, e das contestações advindas dos movimentos sociais, os problemas constitucionais passa(ra)m a ser problemas jurídicos. E, com isso, nestes contextos o constitucionalismo vai refletir uma maior ou menor conflitualidade. Se não há grandes conflitos, e portanto, novas agendas políticas, o debate constitucional fica reduzido como foi no século XIX e início do Século XX aos princípios e sua discrepância com a realidade, é dizer, a Constituição não é posta em causa, apenas se constata que a maioria de seus princípios não são aplicados (line books versus line actions).
Com o fim da segunda guerra, a Europa passa a ser reconstruída do ponto de vista político através da ampliação do sufrágio universaltrazendo com isso, uma profunda reclamação que vinha desde antes da classe trabalhadora quanto aos pressupostos do Estado Liberal. Este é um momento em que depois dos processos de independência da América Latina no princípio do século XIX, passamos a encontrar grande parte do mundo sobre o colonialismo político, econômico e filosófico do mundo europeu. No entanto, a América Latina já continha suas constituições desde o princípio do século XIX, sendo a primeira a Constituição do Haiti, que a partir de um processo de ruptura e utilizando os mecanismos do próprio liberalismo construiu uma constituição a partir de seus próprios interesses. Já no restante da América – Latina, temos as elites, descendentes dos colonizadores que vão conquistar ou receber a independência, mas com um transplante das constituições europeias (um verdadeiro colonialismo institucionalizado). E neste, contexto, a dinâmica que havia no constitucionalismo europeu e o debate sobre o Estado liberal para o Estado social nunca se verificou na América – Latina senão a partir dos anos 90 do século passado. Portanto, esse pacto entre Estado e trabalho nunca existiu em nosso continente de forma democrática, basta ver o caso do Brasil que os direitos sociais não estão relacionados com fatores democráticos, mas sim da era Getúlio Vargas.
No entanto, em outros países e em outros continentes, como o caso da África e Ásia começam os processos de independência. E aqui, se deve ter atenção as narrativas do sul que vão a surgir sobre o constitucionalismo, mas não foram traduzidos pelo constitucionalismo europeu. Exemplo é a própria constituição da Índia que além de herdar o constitucionalismo europeu contribuí com aspectos culturais de sua cultura religiosa que trouxe as contradições internas do princípio da igualdade na medida em que pela cultura hinduísta a problemática das castas não seriam resolvidos com a fórmula europeia. Além disso, o fator interessante é justamente o surgimento da constituição que se dá após o fato mais traumático daquele país que é a sua separação de origem pós-colonial do Paquistão, no qual separou-se famílias inteiras pela questão religiosa e nada constou na constituição sobre isso, uma verdadeira sociologia das ausências de caráter obviamente geopolítico. Esse silêncio, nos demonstra claramente como fatores políticos importantes são negados pelo modelo colonial do constitucionalismo europeu.
Já no contexto africano por exemplo, os estudos pós-coloniais demonstraram que houve muita inovação constitucional e econômica dado que quase todos os países que saem do colonialismo português, e, portanto, europeu, vão adotar constituições socialistas saindo de um modelo capitalista de desenvolvimento. Muitas constituições tinham por referência tanto o constitucionalismo europeu como o constitucionalismo soviético. Angola e Moçambique por exemplo, a partir de uma narrativa do sul não imperial vão a constituir outra forma política e outra forma de democracia no qual em um partido único congregavam o sentimento da nação, que no caso da África representava-se pelos movimentos nacionais de libertação. É claro que todos nós sabemos que não havia partidos únicos e que houve muita violência como o caso da guerra civil da angola que se prolongou até 2002, Moçambique sua guerra se prolongou até o início dos anos 90. De todo o modo, podemos visualizar a construção de elementos constitucionais totalmente novo e fora do padrão liberal. A Constituição da Tanzânia por exemplo, que em seu texto constitucional vamos assistir elementos da cultura ocidental e elementos da cultura africana, mais especificamente do humanismo africano. É importante notar, que o sumak kawsay, disposta nas constituições latino-americanas não é algo novo, pelo contrário, o continente africano já havia construções complexas entre a cultura do racionalismo liberal e a cultura mística africana, da mesma maneira que o fez recentemente a América-Latina. Portanto, neste contexto, temos as constituições do pós-independência que contribuíram para, tanto na américa-latina, como África e Ásia para desmistificar que o constitucionalismo seria possível apenas a partir de uma narrativa eurocêntrica.
No segundo contexto, podemos auferir as constituições no período de transição democrática, como as constituições da Itália, Alemanha, Portugal, Estes processos foram importantes pois vão ocorrer outros processos de transições democráticas que não possuíram o mesmo perfil revolucionário, como o próprio caso da África do Sul que ao invés de ser uma constituição pós-colonial constitui-se em uma constituição de transição para a democracia.. As constituições do Brasil e da Espanha por exemplo foram constituições fruto de um pacto político, perceptível no caso brasileiro na constituição de 1988. Especificamente no Brasil, é perceptível as "ausências" que foram obrigatórias em decorrência deste "pacto" , como por exemplo, o facto de não se poder por em causa os crimes cometidos durante a ditadura, tal como no chile. Portanto, as transições democráticas demonstram elas próprias suas própria contradições, e obviamente, deve-se olhar para as constituições decorridas de tais processos e perceber se elas a partir de uma narrativa do sul, devem ser defendidas ou alteradas. E por obvio este processo de alteração pode ser ou para aprofundar os aspectos democráticos ou para os atenuar. De facto a nível mundial, a tendência reformista tem sido sempre para o retrocesso, para desqualificar as lutas políticas que foram o motor de processos mesmo que pequenos de emancipação democráticas.
Na terceira experiência da narrativa não europeia, estão inseridos os contextos pós-coloniais. E aqui evidentemente deve-se lembrar que a constituição, seja qual for o seu contexto, e me refiro tanto às narrativas eurocêntricas como a partir do sul não imperial, é e foi um instrumento hegemônico, desenvolvido por uma classe em um primeiro momento revolucionária que após a tomada do poder passa a ser reacionária, e portanto, utilizada pela burguesia para consolidação dos Estados capitalistas, produzindo as ausências necessárias para a consolidação do sistema liberal, no qual também foi usada para seus próprios fins pelos Estados do Leste Europeu, tendo no seu viés cultural o eurocentrismo como motor de seus processos políticos, no qual fora deste contexto se repete de alguma maneira. No entanto, é preciso um grande esforço para que não haja a repetição, que se dá fundamentalmente através de resistências sociais, e esforços locais que se transformam eles próprios em lutas universais. É dizer, quando levamos as constituições para fora da Europa, nós vamos para outras culturas, para outras formas de construção comunitária, para outras formas de governo, de que fazem de fato parte da vida cotidiana das pessoas. Por exemplo o direito das sociedades indígenas que têm suas constituições a pesar de não reconhecidas formalmente pelo Estado, mas que lá estão a reger toda uma sociedade. A Constituição do Canadá por exemplo, até 1982, é uma massiva ausência, pois os direitos dos indígenas, que eram entre 8 e 12 milhões no século XVII são agora cerca de 500 mil.
Voltando à África do sul, tem-se a tentativa de interculturalizar um documento eurocêntrico, tentativa esta que se deu através do conceito de Umbundu, conceito que representa a ideia de que "eu sou porque tu és", logo a ideia do indivíduo não existe, senão o indivíduo "com" , e, portanto, o indivíduo com o outro, como comunidade. Este conceito, não somente traz estranheza a partir da cultura ocidental mas torna-se difícil de constitucionalizar-se onde a centralidade é o indivíduo, marcado pelo princípio máximo da dignidade da "pessoa" (individual) humana, que baseou-se em toda a filosofia moderna de matriz racionalista. Um verdadeiro processo de construção de um derecho profano e marginal. Neste sentido estes modelos de constitucionalismo pós-colonial vão colocar em cheque as linhas abissais tentando resolver ao trazer para o texto constitucional os dois lados da linha, portanto, dos saberes e das ignorâncias. Por óbvio que as próprias constituições pós-coloniais não deixam de ser eurocêntricas pois a estrutura do Estado mantem-se em um processo de continuidade entre o colonialismo e o pós-colonialismo. Por isso, fica a pergunta final: se as narrativas constitucionais são amplas, diversas e filosoficamente incompatíveis, por que insistimos em repetir constantemente e somente as narrativas europeias? Se a américa-latina, por exemplo, possui uma própria narrativa constitucional, e mais recentemente um constitucionalismo experimental, por que as ignoramos?


O direito ao bin vivir: Novas narrativas constitucionais do sul pós-colonial a partir da Pachamama. Do antropocentrismo ao biocentrismo.
O resgate de saberes e simbologias tradicionais dos povos indígenas nas Constituições equatoriana e boliviana, notadamente por meio do reconhecimento de um direito ao bem viver, é de grande relevância para construir uma outra forma de relacionamento do ser humano com a natureza, diferente daquela projetada pela modernidade, baseada na super-exploração do ambiente.
Assim, a própria ideia de bem viver abarca uma dimensão ecológica, ao trazer como meta outra forma de desenvolvimento, a partir de uma relação mais equitativa com a natureza. Por meio da ideia de bem viver, visualiza-se a indivisibilidade entre os diversos componentes da vida; nessa lógica de harmonia, o ser humano não considera seus direitos de maneira isolada, mas na inter-relação com o outro, que engloba não apenas o elemento humano, mas a vida em geral.
Não poderíamos deixar de voltar nossos olhos para a questão do conceito de direito fundamental, atribuído ao constitucionalismo moderno, e, agora rediscutido pelo constitucionalismo latino-americano, a partir de seus aspectos culturais firmado nos povos indígenas e em conceitos como bem viver (o sumak kawsay) e pachamama e no paradigma de direitos socioambientais, (DANTAS, 2012, p. 13) na medida em que, para o Boaventura, todas estas correntes de entendimento são facetas do mesmo pensamento que dominou a modernidade: o pensamento colonialista. E esta nova miragem é essencial para uma visão consectária com o novo constitucionalismo latino-americano.

Esta perspectiva socioambiental, como bem se referiu Dantas (2012, p. 14) se dá da observação não dissociada entre ser humano e meio ambiente, ou seja, de uma visão diferenciada que os povos e comunidades tradicionais têm do meio ambiente em que vivem. Natureza e cultura uma unidade dialética" que significa dizer que não existem independentemente, visto que a cultura necessita da natureza para se desenvolver. "Com base nisto, é possível a realidade social pelo prisma das forças socializantes da natureza, pelo modo como cada sociedade se apropria dos recursos naturais e transforma o ambiente que vive. A cultura é continuação da natureza, pois a realidade não vem da mente humana e sim dos relacionamentos entre social e natural. Afirma que a relação homem/natureza está além dos fenômenos naturais implacáveis. Essas formas tradicionais de vida não dissociam sua existência da natureza, convivem e compartilham com ela a construção e a reconstrução contínua de seus modos de ser, fazer e viver. Por isso, é necessário compreender o termo "tradicional com o sentido de continuidade, através de uma releitura antropológica, entendendo a tradição não sob o véu da linearidade histórica, ou sob a ótica do passado, ou ainda como uma reminiscência das chamadas "comunidades primitivas" e "comunidades domésticas", ou ainda, como amostras de um suposto estágio de "evolução da sociedade.
Werner (2015) afirma que no terceiro ciclo do constitucionalismo latino-americano, além da interpretação de um sentido mais alargado para a proteção ambiental que decorre das disposições relacionadas ao bem viver, os ordenamentos andinos destinaram, ainda, previsões específicas associadas aos direitos da Natureza ou Pachamama na Constituição do Equador e dos direitos da Mãe Terra na legislação infraconstitucional da Bolívia. Dessa forma, além do direito a um ambiente sadio e equilibrado, capaz de garantir à população uma vida que vá ao encontro do bem viver, por meio do qual se declara como de interesse público "a preservação do ambiente, a conservação dos ecossistemas, a biodiversidade e a integridade do patrimônio genético do país, a prevenção do dano ambiental e a recuperação dos espaços naturais degradados", o Equador fez constar em seu texto constitucional um capítulo específico, também sob o título "Direitos", voltado aos direitos da natureza. Ali é definida a Natureza, ou Pachamama – em referência à sabedoria ancestral indígena –, como o local "onde se reproduz e realiza a vida". A Constituição equatoriana elenca direitos que são atribuídos à natureza, não enquanto condição para o desenvolvimento digno da pessoa humana, mas enquanto detentora de valor intrínseco. Atribui-se à natureza o direito a que seja respeitada sua existência, à manutenção e regeneração de seus ciclos vitais, sua estrutura, funções e processos evolutivos, e o direito à restauração – independente da indenização devida a particulares ou a coletividades que sofram efeitos decorrentes de danos ambientais. Há, por fim, a previsão de que a produção, prestação e aproveitamento dos serviços ambientais serão regulados pelo Estado, não sendo suscetíveis de apropriação.
Na Constituição da Bolívia, há uma previsão para o direito ao meio ambiente, inserido no capítulo que versa sobre os direitos sociais e econômicos, estabelecendo-se ali que as pessoas têm direito "a um meio ambiente saudável, protegido e equilibrado", sendo que o exercício desse direito deve "permitir aos indivíduos e coletividades das presentes e futuras gerações, além de outros seres vivos, desenvolverem-se de maneira normal e permanente". (Werner, 2015)
Além disso, no título em que são dispostos os deveres dos bolivianos e bolivianas, as disposições relacionadas ao meio ambiente impõem como deveres: "resguardar, defender e proteger o patrimônio natural, econômico e cultural da Bolívia"; "proteger e defender os recursos naturais e contribuir para seu uso sustentável, para preservar os direitos das futuras gerações"; "proteger e defender um meio ambiente adequado para o desenvolvimento dos seres vivos". Destina-se, ainda, um título inteiro para tratar do meio ambiente, recursos naturais, terra e território, abordando, principalmente, a regulação do Estado sobre os bens ambientais, de forma a assegurar sua "soberania sobre os recursos naturais", estabelecendo que o patrimônio natural é de interesse público e de caráter estratégico para o desenvolvimento sustentável no país. Embora no texto constitucional da Bolívia não haja referência específica à atribuição de direitos à natureza, tal como ocorreu no Equador, e ainda que a perspectiva boliviana possa ser considerada vinculada à visão antropocêntrica, dada a previsão de apropriação e industrialização dos recursos naturais, a natureza é abordada, também, sob a perspectiva e terminologia dos povos indígenas em textos infraconstitucionais. Assim, por meio da Lei nº 71 de 2010 ("Ley de derechos de la Madre Tierra") e da Lei nº 300 de 2012 ("Ley marco de la Madre Tierra y desarollo integral para vivir bien"), protege-se a "Madre Tierra", a Mãe Terra, o que sugere ser um reforço à concepção de interdependência entre ser humano e natureza, e de indivisibilidade entre elementos ecológicos e culturais. Nesse sentido, a Mãe Terra é definida como "o sistema vivo dinâmico conformado pela comunidade indivisível de todos os sistemas de vida e os seres vivos, inter-relacionados, interdependentes e complementares, que compartilham um destino comum" .A Lei nº 71/2010 reconhece os direitos da Mãe Terra, bem como as obrigações e deveres do Estado e da sociedade para que os referidos direitos sejam concretizados. São estabelecidos ali princípios e definições; há o detalhamento de quais seriam os direitos da Mãe Terra – direito à integridade e à diversidade da vida, à preservação das funcionalidades dos ciclos d'água, à manutenção da qualidade do ar, ao equilíbrio, à restauração e a viver livre de contaminação. E, por fim, são relacionadas as obrigações do Estado – no sentido de desenvolver políticas públicas que evitem a extinção de seres vivos, a alteração dos ciclos e processos que garantam a existência da vida – e da sociedade – tais como defender e respeitar os direitos da Mãe Terra, promover a harmonia dos sistemas de vida, adotar hábitos de consumo e aproveitamento dos recursos naturais de forma compatível com os direitos em questão. (Werner, 2015, p. 95)

A Lei nº 300 é muito mais extensa e detalhada, tratando não apenas dos direitos da Mãe Terra, mas de sua integração com o regime de bem viver. Ali é exposto, então, o que se entende por desenvolvimento integral para alcançar o bem viver e quais são as bases e estratégias de sua implementação; o rol de princípios, definições, direitos, obrigações e deveres é alargado em relação à lei anterior. A partir das novas Constituições que marcam este terceiro ciclo de um novo constitucionalismo na América Latina, tem-se referido a um verdadeiro giro biocêntrico nas novas ordens constitucionais. Para compreender em que consiste essa mudança de paradigma e quais as suas implicações para a proteção da natureza, serão feitas algumas considerações acerca do antropocentrismo e do biocentrismo, no âmbito da ética ambiental. De maneira geral, é possível dizer que os dilemas éticos ambientais consubstanciam-se na dicotomia antropocentrismo versus biocentrismo. Na cultura ocidental, parece estar enraizada a ideia de que a sociedade humana e a natureza são antagônicas e incompatíveis entre si. Nota-se, ao longo da história, a concepção de que a sociedade dita civilizada está à parte da natureza caótica que a circunda, e que por isso o ser humano deve dominar os elementos naturais. Em uma continuidade a esse rompimento entre ser humano e natureza, ainda atualmente prevalece na cultura ocidental dominante uma ótica puramente antropocêntrica, a partir da qual a natureza é considerada como um meio para garantir ao ser humano qualidade de vida e bem estar. Na visão antropocêntrica, a natureza é um conjunto de objetos conhecidos e valorados em função das pessoas e é apenas objeto de direitos, já que estes residem apenas no ser humano. Gudynas considera que esta postura tem uma visão dualista; isto porque de um lado o ser humano se separa e se considera distinto da natureza, e de outro, é tomado como medida, origem e destino de todos os valores280. Assim, para o autor, a natureza é fragmentada, sendo que alguns elementos são ignorados, enquanto outros se viabilizam, na medida em que são úteis ou afetam as pessoas. Por sua vez, o biocentrismo, identificado por Leite sob a denominação de ecologia profunda, não distingue a natureza do próprio ser humano. Não se trata de afastar a busca do bem estar também para o ser humano, em detrimento da natureza, mas de reconhecer o valor intrínseco de todos os seres vivos, estando o ser humano interagindo com os demais elementos, inserido na teia da vida, na concepção de Capra282. Esta visão considera, portanto, a natureza como portadora de valor em si mesmo, ou seja, valor independente de sua utilidade ou benefício, real ou potencial, que possa transmitir ao ser humano. (Werner, 2015, p. 98)

Nota-se, então, que, enquanto no antropocentrismo fala-se em proteção do meio ambiente como requisito essencial para a garantia da dignidade da pessoa humana, a ética biocêntrica284 clama por uma proteção da natureza em si mesma, pela manutenção das bases. naturais da vida, com vistas a garantir a durabilidade da vida em todas as suas formas e assegurar a dignidade da vida, que não se restringe à dimensão humana. Para Ferry, a ecologia profunda baseia-se no holismo, tese filosófica segundo a qual o todo é superior moralmente aos indivíduos, o que significa que, de maneira contrária ao individualismo que caracteriza a modernidade ocidental, é necessário reconhecer que a ecosfera é uma realidade da qual os seres humanos são apenas uma parte; pertencem a ela e dela são totalmente dependentes. Essa é, para a ecologia profunda, a fonte do valor intrínseco da natureza. (Werner, 2015, 100)

Através dos estudos sobre a convivência diferenciada sociedades tradicionais com a natureza ratifica a existência de sistemas de manejo dos recursos naturais marcados pelo respeito aos ciclos naturais, à sua exploração dentro da capacidade de recuperação das espécies de animais e plantas utilizadas. Estes sistemas tradicionais de manejo não são somente formas de exploração econômica dos recursos naturais, mas revelam a existência de um complexo de conhecimentos adquiridos pela tradição herdada dos mais velhos, de mitos e simbologias que levam à manutenção e ao uso sustentado dos ecossistemas naturais. Essas discussões contribuíram para consolidar que modelo econômico vigente é insustentável, porque pautado na lógica individualista, no acúmulo de capital, na propriedade privada e na venda da força de trabalho, não consegue se reproduzir sem gerar danos ambientais e aumentar as desigualdades sociais. (DANTAS, 2012, P. 16)
É nesse contexto que se insere o Novo Constitucionalismo Latino- Americano, que, na tentativa de inserção da visão holística entre meio ambiente e ser humano, especialmente quando traz o princípio do sumak kawsay ou buen vivir como direcionador do próprio Estado, para assim, propor novos mecanismos de adequação entre sustentabilidade e desenvolvimento econômico, redefine não somente as funções do direito, como também as concepções hegemônicas de direitos fundamentais, rompendo com a velha dicotomia entre direitos humanos e fundamentais, redefinindo inclusive a base do constitucionalismo moderno: a dignidade humana. Sendo esta baseada em uma visão liberal, não há que se falar em dignidade do Homem, pois este não é o centro, e sim em dignidade da vida.

O bem viver,de acordo com Werner (2015, p. 105) constitui parte essencial das culturas milenares das sociedades indígenas deste continente, como um conceito que ultrapassa a linguagem e se constitui em uma referência filosófica. Consiste, então, em um verdadeiro projeto de vida, pautado no respeito à diversidade, na convivência, na harmonia com os outros seres humanos, com animais não humanos, com a flora e outros componentes dos espaços naturais, enfim, em uma aceitação e valorização da vida em todas as suas formas, e na luta pela garantia de sua durabilidade. O sentido de direito a um projeto de vida que se pretende aqui atribuir é aquele reconhecido pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, vinculado à liberdade, ou seja, ao direito de cada pessoa escolher seu próprio destino, de modo que o dano causado a esse projeto existencial afeta o próprio sentido espiritual da vida, conforme considerado pela Corte no caso Loayaza Tamayo versus Peru.Isto se torna claro especialmente nos casos de violação dos direitos de comunidades indígenas, que possuem uma forte ligação com as terras que tradicionalmente ocupam. Afinal, esses são os espaços onde são desenvolvidos seus hábitos, seus ritos, suas crenças. O direito de permanecer em suas propriedades ancestrais possibilita que mantenham viva a sua identidade através da memória. Outro ponto a ser destacado com relação ao que está envolvido no direito a um projeto de vida é a sua relação com o próprio direito à vida. Apreende-se dos julgados da Corte Interamericana que o direito à vida não pode continuar sendo entendido como uma mera proibição da privação arbitrária da vida física. Afirma-se a necessidade de alargar essa noção, de modo a perceber que devem ser evitadas circun Nos casos de violação a um projeto de vida de povos e comunidades tradicionais, notadamente indígenas, este projeto é coletivo, e, portanto, não se esgota no tempo; antes, projeta-se para o futuro, em uma continuidade infinita. Em tais casos, a perda de sentido é muito grave, pois se estende a toda a comunidade. É importante que o projeto de vida coletivo, traçado por um determinado povo, não seja obstado e até mesmo que o Estado garanta a sua realização. Intervenções externas que obstem a concretização desse projeto de vida comunitário produzem danos espirituais que são irreversíveis e que não podem ser reparados. O projeto de vida coletivo dos povos indígenas envolve inter-relações entre todos os aspectos da vida, e o território é o local onde se desenvolvem tais relações. A consideração dos direitos dos povos indígenas, especialmente no que se refere à livre determinação dos destinos traçados para sua coletividade, passam pelo redimensionamento da ideia de propriedade, a fim de abranger um conceito de territorialidade. stâncias que de outras formas podem conduzir à morte, especialmente no caso de pessoas consideradas mais vulneráveis, como os povos indígenas. Assim, para Martínez de Bringas, enquanto o direito ocidental compreende o conceito de propriedade a partir das "possibilidades de outorga do direito civil", o conceito de território nos sistemas normativos indígenas é construído em uma relação intrínseca com o conceito de povo, a partir das "possibilidades de outorga de direitos políticos públicos", notadamente a autonomia. A propriedade coletiva indígena, portanto, não supõe copropriedade, mas, de maneira simultânea, uma consideração individual, comunitária e supracomunitária, compreendendo direitos das antigas e das futuras gerações. Martínez de Bringas ressalta que, de modo diverso da concepção ocidental de propriedade, a territorialidade indígena nunca é absoluta ou exclusiva, por envolver um conjunto de mediações que atuam como restrições ou limitações. Então, sob uma perspectiva intercultural, a propriedade indígena abrange uma base material de territorialidade, um espaço sociocultural e um espaço político e geográfico. Deve-se enfatizar que a Corte Interamericana de Direitos Humanos reconhece haver uma lógica intercultural na compreensão do território indígena, por existir uma tradição comunitária sobre uma forma comunal da propriedade coletiva da terra, cuja propriedade não está centrada em um indivíduo, mas na comunidade. Assim, a Corte ressalta a importância para a própria existência dos povos indígenas que eles vivam livremente em seus territórios, visto que a estreita relação com a terra é base fundamental de sua cultura, sua vida espiritual, sua integridade e sua sobrevivência econômica. Não se trata, portanto, de uma questão de posse ou produção, mas, como afirma a Corte, de "um elemento material e espiritual do qual gozam plenamente, inclusive para preservar seu legado cultural e transmiti-lo às gerações futuras" . A percepção de que o conceito de propriedade não é somente aquele relacionado à propriedade privada do direito moderno ocidental é de grande relevância para compreender as relações dos povos indígenas com seus territórios. A partir daí, é possível compreender a ideia de propriedade intercultural, como aquela que permite a coexistência e inter-relação entre as diversas culturas de um país, a fim de gerir democraticamente seu conjunto de territórios e recursos naturais. Nesse sentido, Tapia Mealla considera que um modelo de propriedade no qual determinados territórios correspondem a determinados povos, ou a só um povo e cultura, reconhece direitos inclusive prévios à colonização, mas não estabelece critérios mais amplos de configuração do comum. Para o autor, uma maior democratização implica em uma "decisão coletiva e generalizada de todas as culturas e povos", a fim de conceber que a "propriedade de todos os territórios e espaços é de todos os povos e culturas" .É possível compreender que a configuração da propriedade é parte essencial do projeto de vida coletivo dos povos indígenas, visto que suas implicações se projetam para além da existência física, abrangendo, também, aspectos culturais e espirituais. Sumak kawsay, suma qamaña, teko porã, tratam de um projeto de existência pautado em outras relações com a natureza e com os outros, que não aquela relação estabelecida por uma cultura ocidentalizada, homogeneizada e colonizada. Traduzem, enfim, a retomada de um caminho e um novo horizonte de construção de uma vida plena, em harmonia com a natureza e tudo o que a compõe, a fim de concretizar um projeto de existência coletivo e duradouro. (Werner, 2015, p. 110)

É dizer, em outras palavras, o conceito de direito fundamental, bem como o universo determinante do liberalismo, fundamentados politicamente no constitucionalismo e filosoficamente na ideia de direitos naturais, que, atualmente, definem-se como universais, seriam apenas um movimento eurocêntrico, denominado pelo autor de globalização hegemônica. Portanto, não há que se falar em direitos fundamentais, muito menos em constitucionalismo, como forma de "emancipação". A resposta seria, em primeiro lugar, uma ruptura com tal visão, e esta ruptura viria do sul, um movimento externo ao direito, propondo não um neoconstitucionalismo, seja qual for sua matriz, mas um constitucionalismo do sul, denominado de constitucionalismo democrático latino-americano. Da mesma forma, não se utilizaria um conceito de direito fundamental, mas sim de dignidades, que não significa dignidade humana, mas dignidades da vida, a partir de uma visão do Estado Heterogêneo.



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Dantas, Fernando Antonio de Carvalho Dantas. Multiculturalismo, cidadania e direito dos povos indígenas. Revista Amazônia de Estudos sócios ambientais. 2012. Sanchez
Geertz. Clifford O saber local: novos ensaios em antropologia interpretativa. Tradução de Vera Mello Joscelyne. Petrópolis, Vozes, 1997, 366 pp.
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Santos, Boaventura de Sousa. A crítica da razão indolente. Contra o desperdício da experiência. Ed. Cortez, 2002.
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Werner, Eveline. Constitucionalismo latino-americano e direito ao meio ambiente: diálogos em busca de uma proteção jurídica de integridade. Dissertação de mestrado apresentada ao programa de pós-graduação em direito ambiental da faculdade de direito da UFMT. 2015











Constitucionalista e sociólogo.Possui graduação em Direito pela Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (2000), mestrado em Direito do Estado pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (2002), Doutorado em Sociologia do Estado e do Direito na disciplina de Direitos Humanos pela Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (2008), tendo como orientador o Prof. Dr. Boaventura de Sousa Santos e Pós-Doutorado em Direito Constitucional e Teoria do Estado pela Uppsala University - Suécia (2008), no qual desenvolveu sob supervisão do Professor Doutor Iain Cameron a tese de Pós-Doutoramento intitulada "Os Estados Colapsados e a Democracia Latino-Americana: o caso do Brasil", publicada pela EdUFMT. A tese de doutoramento defendida junto à Universidade de Coimbra intitulada "A globalização Contra-Hegemônica e a Problemática Contemporânea dos Direitos Humanos" foi aprovada com nota máxima e menção de "Distinção e Louvor". Atualmente é Professor-Pesquisador da Universidade Federal do Mato Grosso (FDUFMT). Professor Permanente do Programa de Mestrado em Direito Agroambiental da Faculdade de Direito da UFMT-Cuiabá, na disciplina de "DIREITO DAS SOCIEDADES INDÍGENAS, NOVO CONSTITUCIONALISMO LATINO-AMERICANO E EMANCIPAÇÃO SOCIAL". Pesquisador membro do GPMSE (Grupo de Pesquisa Movimentos Sociais e Educação) da Universidade Federal do Mato Grosso, Pesquisador colaborador do programa de Mestrado e Doutorado em Educação do IE da UFMT, membro do Grupo de Pesquisa "A Efetividade Dos Direitos Humanos" da Universidade Federal de Rio Grande (RS), pesquisador no grupo de pesquisa TEDEPES - Teoria do Direito, Educação Popular e Economia Solidária, do(a) Universidade do Estado de Mato Grosso, pesquisador no grupo de pesquisa DIREITOS DOS CONHECIMENTOS, do(a) Universidade Federal do Amazonas, líder do grupo de pesquisa registrado no diretório dos grupos de pesquisa "Constitucionalismo democrático latinoamericano, novas intersubjetividades e emancipação social". Diretor de Pesquisa do Núcleo de Pesquisa "MINGA - NOVO CONSTITUCIONALISMO LATINO-AMERICANO, NOVAS INTERSUBJETIVIDADES E EMANCIPAÇÃO SOCIAL". Professor Visitante nas Universidades Livre de Bruxelas (2009-2010), Universidade de Lausanne (2009), Universidade de Paris I - Panthéon-Sorbonne (2009) e Universidade de Rennes (2010). Membro do Conselho Editorial da EDITORA JURUÁ, Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito Público. Área de atuação: Teoria do Estado, Teoria do Direito, Teoria Constitucional, Democracia radical e pos-colonialismo: as perspectivas para a reconstrucao da cidadania multicultural e intercultural"
Nuria Belloso Martín es Catedrática Acreditada de Filosofía del Derecho en la Universidad de Burgos (España). Es Directora del Departamento de Derecho Público. Es Coordinadora del Máster en Derecho de la Empresa y de los Negocios. Es Directora del Curso de Especialista en Mediación Familiar. Directora de Relaciones Internacionales y Cooperación del Núcleo de Pesquisa "Minga. Constitucionalismo democrático latinoamericano, novas intersubjetividades e emancipação social" (UFMT- Brasil).
Graduado em Direito pela UFMT. Mestrando como aluno especial na disciplina "Direito das sociedades indígenas, novo constitucionalismo latino-americano e pós-colonialismo."
O sul geopolítico é representado pelo conjunto de países, movimentos sociais, organizações sociais, sociedades e populações marginalizadas, e, também por óbvio pertencente ao norte geográfico.
Como não é o objeto deste trabalho, para aqueles que quiserem um aprofundamento sobre a relação entre colonialismo e capitalismo ver Santos, Boaventura de Sousa. A gramática do tempo. Editora Cortez, 2010.
É importante referir que a partir das epistemologias do sul, a temporalidade é central para o debate. Portanto, uma luta anti-colonial que não é anti-capitalista e anti-patriarcal não faz sentido, da mesma forma que uma luta anti-capitalista que não é anti-colonial e anti-patriarcal também não o faz.
Para uma análise mais concreta ver: Santos, Boaventura de Sousa. A crítica da razão indolente. Contra o desperdício da experiência. Ed. Cortez, 2002.
O colonialismo por óbvio não foi uma invenção da modernidade, mas o colonialismo moderno tem como sua característica a sua inter-relação com o capitalismo, de modo que ambos se alimentam e não se separam.
Op. Cit. 35
Esse é o tema central da questão dos direitos humanos e sua teorização hegemônica como universal quando confrontado com países do sul geopolítico.
Santos, Boaventura de Sousa. Epistemologies of the South. Justice against Epistemicide. Boulder/Londres: Paradigm Publishers, 2014.
Op. Cit.
Queremos deixar bem claro que a idéia de direitos humanos, democracia e constitucionalismo é, portanto, um modelo científico construído a partir do eurocentrismo ocidental.
Importante para entender esta crítica é ver o conceito proposto por Boaventura de Globalização contra-hegemônica.
No campo do constitucionalismo a linha abissal é muito bem determinada pela validade das narrativas constitucionais, centrando-se sempre em narrativas europeizadas, como se o mundo fosse uma de suas colônias.
Essa crítica nos parece central para a (re)construção da teoria hegemônica dos direitos humanos.
Para uma análise ver: Santos, Boaventura de Sousa. A crítica da razão indolente. Contra o desperdício da experiência. Op, cit.
Este conceito é central para entendermos a impossibilidade da formação científica e de seu compartilhamento pela comunidade acadêmica de um conceito não ocidental e islâmico de direitos humanos.
Aqui centra-se a tese central desta reflexão. O sul global, nada mais é do que uma caricatura do modelo capitalista e do modelo monista de Direito, portanto, uma espécie de "repetidor de conceitos inautênticos". É por essa razão, que o radicalismo, e aqui me refiro no direito, parte de um rompimento com modelos postos, exemplos estes que nos foram dados pelo constitucionalismo latino-americano centrado nas constituições da Bolívia e do Equador que colocaram nosso modelo de constitucionalismo liberal em uma verdadeira contradição entre discursos globais e locais.
As práticas coloniais representadas pelo Direito, especificamente no Direito Constitucional e Internacional, no qual expandiram uma forma de conhecimento desvinculado da realidade intercultural do mundo pode ser expressada na idéia de Estado laico, direitos humanos universais, sociedade civil, igualdade formal, e dignidade humana. É dizer: "No podemos hacer diálogos interculturales si no conocemos la Historia de los otros o los consideramos pueblos sin Historia. El pensamiento y la sabiduría se produce en todo el mundo.." Santos, Boaventura. As espistemologias del sur. Ob cit. As narrativas constitucionais foram e continuam sendo narrativas feitas a partir da ideia de que o mundo foi, é e sempre será ocidental.
Sobre isso ver: Santos, Booaventura de Sousa Santos. o pluralismo jurídico em Moçambique. Cortez, 2006. Geertz. Clifford O saber local: novos ensaios em antropologia interpretativa. Tradução de Vera Mello Joscelyne. Petrópolis, Vozes, 1997, 366 pp.
As próprias constituições indígenas do Equador e da Bolivia trazem um novo conceito de democracia, centralidade no comunitarismo e um novo conceito de direito baseado nas tradições culturais e religiosas, rompendo-se com o massivo e exaustivo debate eurocêntrico, por exemplo, sobre a laicidade do Estado e a ideia do racionalismo como fundamento dos direitos fundamentais. Todo esse debate é facilmente descontruído quando olhamos para o Direito Constitucional e suas produções científicas e não encontramos absolutamente nada sobre o constitucionalismo africano ou indiano. E a pergunta é simples? Quem produz conhecimento, para qual finalidade e por que? Se há um constitucionalismo africano, diferente do constitucionalismo europeu, por que tais narrativas não estão descritas nos manuais? O mundo é resumido na cultura ocidental e portanto, o Direito também o é? Se visto da África, o conceito de universalismo europeu é uma forma de tribalismo. A própria Escola de Frankfurt baseou-se no universalismo europeu, o que torna-se ela mesma paradoxal, pois se é universal não pode ser apenas europeia e se é europeia não pode ser universal. Neste ponto, a falácia do universalismo é posta a partir de sua própria noção: universal é tudo aquilo que é válido independente do contexto. E se tudo o que existe possui um contexto, é preciso um contexto muito rigoroso do ponto de vista científico para recusar todos os demais contextos locais. É dizer, somente a partir de um mega-conceito posso afirmar que é válido a partir da negativa dos demais contextos. E esse mega-conceito foi justamente o capitalismo o monismo e o internacionalismo. É por isso que um processo de descolonização das narrativas jurídicas fundamenta-se em um paradoxo: negar o universalismo para produzi-lo novamente a partir de contextos locais. É por isso que a partir da filosofia andina, das cosmovisões indígenas e do hinduísmo o conceito de direitos fundamentais baseados no racionalismo da filosofia europeia nada mais é do que um conhecimento não compartilhado, imposto, e, portanto, uma verdadeira forma de colonização científica e política. Há um ocidente não ocidentalista, muito bem demonstrado na ontologia do pós-vida das culturas indígenas no qual refutam qualquer racionalismo filosófico. É neste ponto que há uma desconstrução da ideia ocidental de direitos humanos, pois o direito é para os "humanos vivos" pelo qual em culturas indígenas os espíritos não estão mortos mas estão vivos. E aqui o próprio colonialismo e suas narrativas se contradizem: o Brasil por exemplo, é comum lermos nos manuais de direito constitucional que o direito a vida é o meta-princípio, vinculado à dignidade da pessoa humana, portanto, absoluto e inderrogável. Como explicar o aborto no Código Penal brasileiro e mais recentemente o aborto contra crianças anencéfalas? Haveria nestes casos alguma diferença entre o infanticídio cometido em sociedades indígenas condenadas por nós membros das sociedades civil(izadas)?
Para uma análise mais precisa sobre tais documentos remetemos a: Rodrigues, Saulo Tarso, Bonavides, Paulo; Martín, Núria Belloso, Silva, Alexandre Fernandes. Teoria da Decisão Judicial e Teoria da Justiça. Novos paradigmas jusfilosóficos e constitucionais. Curitiba, Ed. Juruá, 2015
Que no momento representava tanto o sistema feudalista como os sistemas absolutistas.
Esta distinção não é tão precisa quanto se parece. Para tanto ver: Lafer, Celso. O significado de República. Estudos Históricos, Rio de Janeiro. V.2, n.4 1989, 214-234.
A pesar de ser denominado de Estado Constitucional ou Democrático liberal, não necessariamente o era naquele período, pois por exemplo, a questão do sufrágio, direito básico de uma democracia não tinha o elemento de universalidade.
Em relação ao período anterior tal regime foi totamente revolucionário, um conceito nunca antes visto e com fundamentos políticos totalmente libertários. Neste ponto, sendo a imagem e semelhança da Burguesia, o Estado além de ser mínimo deveria ser absolutamente negativo, para não "interferir" nos interesses capitalistas que estavam a dominar institucionalmente através das constituições liberais. Para isso, a propriedade passa a ser um direito absoluto, firmando-se na liberdade e igualdade formal, e na moderna separação entre Estado e Sociedade Civil, fundamentando institucionalmente os modelos coloniais de exclusão social. Essa máxima estava no tríade de Locke: razão, trabalho e propriedade.
É neste momento em que os direitos sociais e econômicos passam a ter sua constitucionalização como forma de direitos fundamentais.
É nesse momento em que as questões sociais se agonizam e nascem as ciências sociais na Europa.
Como se pode imaginar esta foi uma inovação extremamente complicada para a teoria liberal e sua clássica teoria da separação dos poderes. Como pode um poder não eleito determinar o que é ou não constitucional e, portanto, inferir-se na estrutura democrática do poder eleito? E é aqui que surge o debate entre Kelsen e Karl Schmidt que escreve em 1929 um livro chamado "A defesa da Constituição" e que vai mostrar que efetivamente não faz sentido nenhum um Tribunal Constitucional. No entanto, através de uma crítica extremamente efetiva, profunda e política sobre a estrutura do Estado Liberal, busca a superação através do que chamou de Estado Integral que teve a sua representação no Nazismo e em Hitler e sua fundamentação nas críticas de Karl Schimidt pois, para este quem vai defender efetivamente a Constituição não é o Tribunal Constitucional mas sim o chefe de Estado. Foi com esta justificativa que Hitler sem golpe de Estado chegou ao poder.
Sobre este debate aprofundamos noutro lugar. Rodrigues, Saulo Tarso, Bonavides, Paulo; Martín, Núria Belloso, Silva, Alexandre Fernandes. Teoria da Decisão Judicial e Teoria da Justiça. Novos paradigmas jusfilosóficos e constitucionais. Curitiba, Ed. Juruá, 2015

Sobre o pensamento abissal ver: Santos: Descolonizar el saber reiventar el poder. Uruguai, Trilce Editora, 2010.
Por óbvio que este modelo de Estado colonial e posteriormente pós-colonial não foi o mesmo nas diversas partes de sua ingerência. É dizer que o Estado colonial da Europa central não foi o mesmo que o Estado colonial nas suas colônias e assim por diante.
Cabe referir que dentro deste debate estava a ideia da proibição de indeterminação de meta-conceitos constitucionais. É dizer, a Constituição deveria ser clara para não permitir diversas interpretações sobre a mesma temática (podemos citar termos como justiça e equidade). E foi, sob estas condições que Kelsen justificou a possibilidade dos tribunais constitucionais funcionar como legislador negativo. E aqui, pode-se contestar através do que Boaventura denomina de Sociologia da ambiguidade pois a produção de determinações jurídicas e constitucionais claras é muito fácil quando os grupos sociais que produzem a Constituição estão em acordo. Pelo contrário, quando a grupos sociais muito distintos, com pluralidades ideológicas e culturais, o conflito é muito intenso, logo, a única maneira de produzir constituições é produzindo premissas ambíguas. Sobre isso, voltaremos no último ítem deste trabalho quando analisaremos as constituições da Bolívia e Equador. No entanto, cabe referir que desta forma, é a única forma de se produzir normas constitucionais justas, pois se transfere os conflitos políticos, é dizer, produz-se a constituição e politiza-se o judiciário.
É claro que isso não se deu de forma uniforme. Na Suiça por exemplo, as mulheres só tiveram o direito ao voto em 1961.
Pode-se dizer que o Haiti utilizou-se dos mecanismos do iluminismo para obter sua independência, o que refletiu em uma constituição dúbia. No entanto, percebe-se na constituição haitiana uma forte influência pós-colonialista.
Vos pergunto: em algum manual de direito constitucional brasileiro tal narrativa está posta? Se a resposta for negativa, vos pergunto: por que não se foi uma narrativa existente? É dizer, apenas as narrativas europeias são dignas de fidelidade científica?
A Constituição de Stalim de 1936 vai influenciar diretamente a constituição da China que foi e é um país em que sobre ele não há praticamente nenhuma discussão constitucional.
Tais guerras não eram apenas guerras internas mas também guerras potencializadas pelas grandes potências que tinham interesses nos territórios.
É importante ressaltar que o humanismo africano é negado pela filosofia ocidental de índole racionalista. Para isso ver: Santos: Descolonizar el saber reiventar el poder. Uruguai, Trilce Editora, 2010.
sumak kawsay. Na linguagem quéchua, o bem viver, el buen vivir, traduz-se na expressão sumak kawsay, que revela a concepção andina da vida pelo próprio sentido da expressão: sumak significa "o ideal, o belo, o bom, a realização"; kawsay significa "a vida, em referência a uma vida digna, em harmonia e equilíbrio com o universo e o ser humano". Desse modo, o sumak kawsay representa a plenitude da vida (KOWII, s/d, p. 06). Para que o sumak kawsay possa ser alcançado, o povo quéchua compreende a necessidade de que seja observado um conjunto de princípios. Dentre eles, estão o equilíbrio (pakta kausay), a harmonia (alli kausay), a criatividade (wiñak kausay), a serenidade (samak kawsay), e o saber ser (runakay)
A Constituição portuguesa de 1976 foi uma das mais democráticas desse processo fundamentada exclusivamente em uma assembleia constituinte originária para proceder-se a reforma. Neste sentido, deve-se atentar para o facto que uma verdadeira reforma constitucional jamais será feita pelo parlamento ou pelo judiciário e sim pelos movimentos sociais, que lutam por verdadeiras mudanças políticas substanciais.
No caso do Brasil podemos apenas citar como exemplo o caso da redução da maioridade penal.
Este conceito constitucional africano juntamente com o Sumak Kawsae põe em contradição toda a trajetória do constitucionalismo europeu e suas principais premissas.
Título do livro de Robezembert Aritza Santamaria.
Isso foi muito bem feito tanto no Equador como na Bolívia. No Brasil, infelizmente, mantemos uma linha abissal e ausências necessárias ao projeto de desenvolvimento capitalista, centrado nas grandes empresas no agronegócio.
Direito ao bem viver - sumak kawsay. na linguagem quéchua, o bem viver, el buen vivir, traduz-se na expressão sumak kawsay, que revela a concepção andina da vida pelo próprio sentido da expressão: sumak significa "o ideal, o belo, o bom, a realização"; kawsay significa "a vida, em referência a uma vida digna, em harmonia e equilíbrio com o universo e o ser humano". desse modo, o sumak kawsay representa a plenitude da vida (kowii, s/d, p. 06). para que o sumak kawsay possa ser alcançado, o povo quéchua compreende a necessidade de que seja observado um conjunto de princípios. dentre eles, estão o equilíbrio (pakta kausay), a harmonia (alli kausay), a criatividade (wiñak kausay), a serenidade (samak kawsay), e o saber ser (runakay)
O grande problema do direito constitucional moderno, para o autor, foi a falta de atenção às diferenças, que criou generalizações espúrias, no qual fundamentou o pensamento colonialista da modernidade. As ciências sociais, incluindo o direito, eurocêntricas, tomando acriticamente o colonialismo inglês e francês, criaram uma unidade de análise que acabou por impor às unidades menores uma forma de Estado ou direito decorrente de pressões homogeneizantes. Essa matriz firmou a base do direito constitucional moderno: a ideia de que em cada Estado só há um direito, ignorando que em cada sociedade circulam várias formas de direitos não reconhecidas, experiências marginalizadas pelo discurso hegemônico (veja, por exemplo o não reconhecimento dos direitos culturais dos povos indígenas), são facetas deste fenômeno. Nesse sentido, diz Boaventura, o movimento constitucionalista falhou, pois as sociedades contemporâneas são judicialmente plurais. Circulam nelas várias formas de direitos não reconhecidos pelo Estado, pelo direito, e por seu discurso hegemônico. Vive-se, portanto, em um mundo de hibridações jurídicas, muito bem demonstradas pelas novas Constituições do Equador e da Bolívia, no qual fundaram, apenas juridicamente, o movimento do constitucionalismo latino-americano. Esta hibridação jurídica não existe apenas no marco das relações jurídicas entre diversos marcos legais, mas também das vivências e experiências dos grupos sociais. O direito estatal é formado basicamente, para Boaventura, pela violência, pelo etnocentrismo e pela burocracia, que formam os elementos estruturais dominantes. Foi nesse sentido que Teubner, 1992, e, no Brasil, Antonio Carlos Wolkmer, pugnaram por uma teoria que partisse de fora, a partir das experiências renegadas e da premissa que o direito dito pelo Estado será sempre violento e hegemônico, tanto em sua praticidade como em sua retórica. Por isso, a ideia do pluralismo em um contexto pós-colonial como o descrito por SALLY MERRY (1988), prevê o rompimento com a ideia monista, e aqui incluindo qualquer que seja a concepção de neoconstitucionalismo. O Direito somente será democrático se souber conviver com concepções não estatais de direito, como muito bem preconizou Fernando Dantas(2012) ao se referir sobre o conceito de justiça indígena. Esta hibridação jurídica – mistura de diferentes elementos de ordens jurídicas, religiosa, direito costumeiro, direito oficial – permite analisar as variáveis sobre o direito, rompendo com a máxima da modernidade que o que é do Estado é oficial. Portanto, o conceito de direito e de justiça são dominados e controlados pelo Estado, em uma visão puramente colonizadora e eurocêntrica, um verdadeiro epistemicídio. Nesse sentido, ver: SANTOS, Boaventura de Sousa. O direito dos oprimidos. São Paulo: Editora Cortez, 2014; SANTOS, Boaventura de Sousa. Para uma revolução democrática da justiça. São Paulo: Editora Cortez, 2007; SANTOS, Boaventura de Sousa; MENEZES, Paula (Orgs.). Epistemologias do Sul: Justiça contra o Epistemicídio. São Paulo: Cortez, 2010.

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