O DIREITO ORIGINÁRIO À TERRA E A AUTODETERMINAÇÃO DOS POVOS INDÍGENAS NO BRASIL

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL  FACULDADE DE DIREITO            MAYARA RODRIGUES DE ALMEIDA                O DIREITO ORIGINÁRIO À TERRA E A AUTODETERMINAÇÃO DO POVOS  INDÍGENAS NO BRASIL                            Porto Alegre  2015 

 

 

 

MAYARA RODRIGUES DE ALMEIDA                      O DIREITO ORIGINÁRIO À TERRA E A AUTODETERMINAÇÃO DOS POVOS  INDÍGENAS NO BRASIL      Trabalho  de  Conclusão  de  Curso  apresentado  como  requisito parcial para a obtenção  do grau  de  Bacharel  em  Direito  pela  Faculdade  de  Direito  da  Pontifícia  Universidade  Católica  do  Rio Grande do Sul.       Orientador: Prof. Dr. Gustavo Oliveira de Lima Pereira.                    Porto Alegre  2015 

 

 

 

MAYARA RODRIGUES DE ALMEIDA                O DIREITO ORIGINÁRIO À TERRA E A AUTODETERMINAÇÃO DOS POVOS  INDÍGENAS NO BRASIL        Trabalho  de  Conclusão  de  Curso  apresentado  como  requisito parcial para a obtenção  do grau  de  Bacharel  em  Direito  pela  Faculdade  de  Direito  da  Pontifícia  Universidade  Católica  do  Rio Grande do Sul.               Porto Alegre, 26 de novembro de 2015.        BANCA EXAMINADORA      _________________________________________  Prof. Dr. Gustavo Oliveira de Lima Pereira ­ PUCRS      _________________________________________  Profª. Drª. Rosa Maria Zaia Borges ­ PUCRS      _________________________________________  Prof. Dr. José Carlos da Silva Moreira ­ PUCRS   

 

                                          A linguagem como traição: gritam carrascos para eles.   No Equador, os carrascos chamam de carrascos as suas vítimas:     ­ Índios carrascos! ­ gritam.    De cada três equatorianos, um é índio. Os outros dois cobram dele,  todos os dias, a derrota histórica.    ­ Somos os vencidos. Ganharam a guerra. Nós perdemos por  acreditar neles. Por isso ­ me diz Miguel, nascido no fundo da selva  amazônica.    São tratados como os negros na África do Sul: os índios não  podem entrar nos hotéis ou nos restaurantes.  ­ Na escola metiam a lenha em mim quando eu falava a nossa  língua ­ me conta Lucho, nascido ao sul da serra.    ­ Meu pai me proibia de falar quechua. É pelo seu bem,   me dizia ­ recorda Rosa, a mulher de Lucho  .  Rosa e Lucho vivem em Quito. Estão acostumados a ouvir:    ­ Índio de merda.    Os índios são bobos, vagabundos, bêbados. Mas o sistema que os  despreza, despreza o que ignora, porque ignora o que teme. Por  trás da máscara do desprezo, aparece o pânico: estas vozes  antigas, teimosamente vivas, o que dizem? 

 

 O que dizem quando falam? O que dizem quando calam?    (Eduardo Galeano – O Livro dos Abraços, p. 132)   

 

RESUMO    Desde  1500,  com   a  chegada  dos  colonizadores  ao  Brasil,  os  povos  indígenas  passaram  a  sofrer  diversas e graves violações  em território nacional. Desta forma, o  presente  trabalho  tem  por  objetivo  analisar,   a  partir  de  uma  perspectiva  crítica,  os  interesses  desenvolvimentistas  que  permeiam  as ações  realizadas  contra os povos  indígenas,  as  quais  ocorrem  desde  o  sustento  da  “coroa  portuguesa”  até  os  dias  atuais.  Em  um  segundo  momento,  o  trabalho  avaliará  a  evolução  da  legislação  nacional  e   internacional,  as  quais,  teoricamente,  objetivaram resguardar  os  direitos  dos  povos  indígenas/tribais.  Por  fim,  a  pesquisa  abordará  um  título  específico  de  observação  às  violações  realizadas,  sobretudo  contra  a  população  indígena  que  está  sendo  impactada  pela  construção  da  Usina   Hidrelétrica  de  Belo  Monte.  Ademais, levando­se  em conta os critérios deste trabalho, importante ressaltar que o  método  de  abordagem  é  o dialético,  no intuito de  observar o  panorama histórico  da  construção  da identidade do índio do Brasil e a consequente busca da efetividade  de  seus  direitos  no  decorrer  deste  percurso.  Diante  da  realidade  apontada,  portanto,  objetiva­se  demonstrar  o  tratamento  concedido  pelo  ordenamento  jurídico  pátrio  a  tais questões, bem como expor os avanços e retrocessos apresentados, como forma  de se questionar  e  propor a abertura para uma nova cultura no ordenamento jurídico  brasileiro.    Palavras­chave:  Povos  indígenas.  Direito  originário.  Antropologia   jurídica.  Indigenismo. Direito, cultura e identidade.   

 

 

LISTA DE SIGLAS    DASI 

– 

Departamento de Atenção à Saúde Indígena 

DGESI 

– 

Departamento de Gestão da Saúde Indígena 

DSESI 

– 

Departamento de Saneamento e Edificações de Saúde 

EdSI 

– 

Estatuto das Sociedades Indígenas 

EIA 

– 

Estudo de Impacto Ambiental 

ELETROBRÁS – 

Centrais Elétricas Brasileiras S.A. 

FUNAI 

– 

Fundação Nacional do Índio 

IBAMA 

– 

Instituto  Brasileiro  do   Meio  Ambiente  e  dos  Recursos  Naturais  Renováveis 

INCRA 

– 

Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária 

MERCOSUL 

– 

Mercado Comum do Sul 

MPF 

– 

Ministério Público Federal 

ONU 

– 

Organização das Nações Unidas 

PAC 

– 

Programa de Aceleração do Crescimento 

PBA 

– 

Plano Básico Ambiental 

PBA–CI 

– 

Plano Básico Ambiental do Componente Indígena 

PEC 

– 

Proposta de Emenda à Constituição 

RIMA 

– 

Relatório de Impacto Ambiental 

SasiSUS 

– 

Subsistema de Atenção à Saúde Indígena 

SESAI 

– 

Secretaria Especial de Saúde Indígena 

SPU 

– 

Secretaria do Patrimônio da União 

SUS 

– 

Sistema Único de Saúde 

 

 

 

LISTA DE ILUSTRAÇÕES    Figura 1 ­ Distribuição total, rural e urbana da população indígena no Brasil.​ ...........73  Figura 2 ­ Localização e extensão das terras indígenas............................................7​ 4  Figura  3  ­  Tabela   com  o  reconhecimento  das  terras  indígenas  nos  governos  dos  presidentes  José   Sarney,  Fernando  Collor,  Itamar  Franco,  Fernando  Henrique  Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff.​ ................................................75  Figura 4 ­ Situação das terras indígenas no Brasil.​ ..................................................76   Figura  5  ­  Situação  das  terras  indígenas  na  Amazônia  Legal.  Estas  terras  representam 22,25% da extensão da Amazônia Legal.​ .............................................77  Figura 6 ­ Demarcações na Amazônia Legal.​ ............................................................78  Figura 7 ­ Terras Indígenas por Estado na Amazônia Legal (em 22/10/ 2014).........7​ 9  Figura 8 ­ Projeto de Construção da Usina Belo Monte.​ ............................................80  Figura 9 ­ Remoção forçada das famílias e perda do modo de vida ribeirinho.​ .........81   Figura 10 ­ Plano emergencial indígena e desestruturação das aldeias.​ ..................82      

 

 

SUMÁRIO    1. INTRODUÇÃO​ .............................................................................................................9   2. A CONDIÇÃO DE ÍNDIO E O DIREITO NO BRASIL: PANORAMA HISTÓRICO​ ...13  2.1  O  DIREITO  ORIGINÁRIO  DOS  ÍNDIOS  ÀS  TERRAS  TRADICIONALMENTE  OCUPADAS...............................................................................................................21  2.2 O DIREITO À AUTODETERMINAÇÃO DOS POVOS INDÍGENAS....................30  3. DIREITOS INDÍGENAS NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988​ ..........................38   3.1 DIREITOS INDÍGENAS NA LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL..............42   3.2 A HERANÇA E O PRESSÁGIO ENCONTRADOS EM BELO MONTE...............48   4 CONCLUSÃO​ ............................................................................................................58  5 REFERÊNCIAS​ ..........................................................................................................61  ANEXO – ILUSTRAÇÕES​ .........................................................................................77                                                           

 

    INTRODUÇÃO    No Brasil, segundo dados do IBGE (2010), os  povos indígenas são compostos  por  305  etnias,  falam  274  línguas  e  totalizam  aproximadamente  897  mil  indivíduos.  1

Conforme  estimativa  da  FUNAI ​ ,   eles  estão  presentes  em   todas  as  Unidades  Federativas  do  Brasil,  sendo  que  cada  etnia  possui  uma  cultura  própria.  Esta  diversidade  cultural,  sem  dúvida,  é  uma  das  maiores  riquezas  do  país,  bem  como  consiste  em  um  grande  desafio quando  surge  a necessidade de  implementação  de  políticas  públicas  diferenciadas  e  específicas.  Sendo  assim,  com o sistema jurídico  não seria diferente.    Neste sentido, o presente  trabalho busca  problematizar a condição dos índios  em  território  nacional   assim  como  expor  a  evolução  da  legislação  que  respalda  os  direitos  indígenas,  a  fim  de  demonstrar  o  quanto  ­  e  se  ­  as  normas  criadas  são  capazes  de  corresponder  aos  problemas  que  cercam  os  povos  indígenas  na  atualidade,  assim  como  o  sistema  jurídico  vigente.  Ademais,  a  relevância  desta   pesquisa,  para   além  de  pessoal,  centra­se  no  fato  de  desejar  a  aproximação  da  academia  com  a   problemática  jurídico­social  envolvida   na  temática  dos  direitos  indígenas.    Nesta  perspectiva,  ao  analisarmos  o  século  XXI,   principalmente  a  partir  da  década  de  1990,  é  possível  se  verificar  o  início  de  uma  complexa  relação,  com  inúmeros  problemas   sociais,  políticos  e  econômicos,  criados  a  partir  da  versão  recente  do  capitalismo,  denominado  neoliberalismo,  sustentado  por  uma  ideologia  2

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contrária  à  distribuição  de  riquezas  e  à  inclusão  social.   Assim,  conforme  Santos ​ ,  também  os  povos  indígenas  começaram  a  se  mobilizar,  em  busca  de  encontrar 

  FUNDAÇÃO  NACIONAL  DO  ÍNDIO  ­  FUNAI.  ​ Saúde.  ​ Brasília,  2015.  Disponível  em:   . Acesso em: 10 out. 2015​ .  2   SANTOS,  Boaventura   de  Sousa.  Poderá  o  Direito  ser  emancipatório?  ​ Revista   Científica   de  Ciências  Sociais,  São  Paulo,  n.  65,  p.  3­76,   maio  2003.  Disponível  em:  . Acesso em: 12 set. 2015.  3   Ibidem, p. 12.  1

 

alternativas  ao  “direito  hegemonicamente  vigente”  e  que  fosse  capaz  de  corresponder  para  além  das  necessidades  jurídicas  do  mercado.  À  vista  disso,  sugere o autor supra referido, o que ele denominou de “des­pensar o direito”.    Neste sentido, de acordo com Lyra Filho4 ​ :    A  lei  sempre  emana  do  Estado  e  permanece  em  última  análise,   ligada  à  classe  dominante,  pois  o  Estado,  como  sistema  de  órgãos  que  regem  a  sociedade  politicamente  organizada  fica  sob  o  controle  daqueles  que  comandam  o   processo  econômico.  [...]  Embora  as  leis   apresentem  contradições  que  não  nos  permitem  rejeitá­las   sem  exame,  como   pura   expressão  dos  interesses  daquela  classe,  também  não   se  pode  afirmar que  toda  legislação  seja  direito  autêntico, legítimo  e  indiscutível [...].  A  legislação  sempre  abrange  em  maior  ou  menor grau Direito  e Antidireito:  isto  é,  Direito  propriamente   dito,  reto   e  correto,  e  negação  do  direito,  entortado  pelos  interesses classísticos  e caprichos continuistas do poder estabelecido. 

  É  nesta  lógica  que  a  academia  deve  buscar  desenvolver  uma  aproximação  que  possibilite  a  visualização  da  problemática  indígena  no  Brasil,  de  forma  que  o  sistema  jurídico  abranja,  também,  as  necessidades   coletivas  que  emergem  da  5

sociedade.  Lyra   Filho   afirma  que  o  Direito  e  a  Justiça  caminham  enlaçados,  enquanto  lei  e  Direito  se  divorciam  com  frequência.  O  autor  ainda  aponta  que  o  Direito é:     [...]  processo,  dentro  do  processo  histórico:  não  é  uma coisa  feita,  perfeita e  acabada;  é  aquele  vir­a­ser  que  se enriquece nos movimentos de  libertação  das  classes  e   grupos  ascendentes  e  que  definha   nas   explorações  e  opressões que o contradizem, mas de cujas próprias contradições brotarão as   novas conquistas. 

  Para  melhor  desenvolver  o  tema,  o  presente  trabalho  foi  elaborado  em  dois  capítulos.  No  primeiro,  será  realizado um panorama  histórico da condição dos índios  e  da  construção  de  seus  direitos  no  Brasil,  com  o   objetivo  de  elencar  as  bases  teóricas  utilizadas,  para,  posteriormente,  avaliarmos  como  foi  gerado  o  direito  originário  à  terra  e   à  autodeterminação,  assim  como as perspectivas e  retrocessos  que  abarcam  as  temáticas  desenvolvidas.  Cumpre  observar  que  para  o  desenvolvimento  do  trabalho,  além  da  teorização  baseada  na  ciência  jurídica,  4 5

  LYRA FILHO, Roberto. ​ O que é Direito?​  17. ed., 9. reimp. São Paulo: Brasiliense, 2003. p.8.    LYRA FILHO, Roberto. O ​ que é Direito?​  11. ed. São Paulo: Brasiliense, 1982. p.56.  

 

buscou­se  um  fortalecimento  teórico  a  partir  da  perspectiva  sociológica  e  antropológica sobre o assunto.     Na  sequência,  será  analisada  a  conjuntura  política  em  que  emergiu   a  Constituição  Federal  de  1988  e  os  avanços  trazidos  em  seu  texto  no  tocante  ao  reconhecimento dos direitos  indígenas.  A partir deste delineamento será  analisada a  legislação  infraconstitucional,  a  qual,  com  base  na  Constituição,  desenvolveu  e  difundiu  o  acesso  aos  direitos,  aos  recursos  e   às  políticas  públicas  que,  a  partir  deste  reconhecimento ­ e na medida do possível ­ propiciaram o exercício de direitos  e  cidadania.  Por  fim,  será exposta a problemática  trazida  pela  construção da  Usina  Hidrelétrica de Belo Monte, assim como será demonstrada a violação aos direitos da  população impactada,  especialmente os povos indígenas estabelecidos na região do  Rio  Xingu.  Neste  sentido,  a  situação  jurídica  será  criticamente  exposta,  sobretudo,  para que as heranças violadoras deixadas desde 1500 não sejam perpetuadas.    Outrossim,  como  já  exposto,  o  trabalho  não  tem  a  pretensão  de  esgotar  as  possibilidades   jurídicas  relacionadas  aos  povos  indígenas,  mas  sim  atrair  os  operadores  do  direito  para  a  investigação  das  possibilidades  e  estudos  abarcados  pelo tema.   

 

 

2 A CONDIÇÃO DE ÍNDIO E O DIREITO NO BRASIL: PANORAMA HISTÓRICO    Ao  ​ examinarmos  a   história  da  colonização  brasileira,  para  além  da  visão  6

“simbólica”   que  permeia  o que  nos  é  contado  sobre  o  “descobrimento  do  Brasil”  e,  com  a  intenção  de  aproximar­nos  do  que  de  fato  aconteceu,  se  faz  imprescindível  falarmos  do  panorama  histórico  da  condição  de  índio  e  a luta pelo  reconhecimento  de  seus  direitos  em  território  nacional.  Neste  sentido,  é  de  suma  importância  observarmos  o  verdadeiro  extermínio  que  culminou  as  populações  indígenas  habitantes do país quando  à  época da chegada dos colonizadores, o que  ocasionou  na mortandade  de  milhares  de  indígenas.  Cabe  frisar que esta tragédia não ocorreu  de  forma  isolada,  visto  que  tal  fato  ocorreu  em   toda  a América  indígena.  Galeano,  neste  sentido,  informa  que  no  México  pré­colombiano  o  contingente  populacional  encontrava­se  em torno  de 30 e 37,5 milhões de habitantes,  a América  Central, por  seu  turno  possuía  em  torno  de  10  a  13  milhões  de  habitantes.   Estima­se  que,  somente na América, a população indígena apresentava­se entre 70 e 90 milhões de  pessoas,  sendo  que,  após  a  chegada dos colonizadores, passou  a  totalizar  apenas  7

3,5 milhões.     8

Conforme  dados  do  Instituto  Socioambiental ​ ,   encontravam­se  em  território  brasileiro,  cerca  de  1.000  povos,  somados  entre 2 e 4 milhões de  pessoas  à  época  da  chegada  dos  colonizadores,  sendo que, no Brasil de  hoje,  existem  cerca  de  ​ 243  povos  distribuídos   entre  diversas  aldeias,  os  quais  são  falantes  de  mais  de  ​ 200  9

línguas  diferentes.  Ao  analisar  apenas  os  tupi­guarani,  Clastres   verificou   ​ a  existência  de  um  milhão  e  quinhentos  mil  índios guaranis, durante a colonização, ao 

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  Neste  sentido,  entende­se   a  visão  “simbólica”  como  a  perpetuação  do  que  nos  foi  contado  pelos  colonizadores. Bourdieu explica  que: “o  poder simbólico é, com efeito, esse poder invisível o qual só  pode  ser  exercido  com  a  cumplicidade  daqueles   que  não querem  saber  que  lhe  estão  sujeitos  ou  mesmo  que  o   exercem.”  (BOURDIEU;  Pierre.  ​ O   poder   simbólico​ .  2.  ed.  Rio de  Janeiro:  DIFEL,  1989).  7   ​ GALEANO,  Eduardo.  ​ As  veias  abertas da  América  Latina​ .  Trad.  de Galeano  de  Freitas. Rio  de  Janeiro: Paz & Terra, 1994. p. 50.  8   Conforme  informação  no  site  do   PIB.  (POVOS  INDÍGENAS  NO  BRASIL.   ​ Povos   indígenas.  Disponível  em:  .  Acesso em: 12 set. 2015).   9   CLASTRES, Pierre. ​ A sociedade contra o Estado​ . São Paulo: Cosac Naify, 2003. p.109. 

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passo  que,  atualmente ,  estes  encontram­se   na  faixa  de  cinquenta  e  sete  mil  indígenas,  divididos  entre  os  estados   do  Mato  Grosso  do  Sul,  Paraná, Rio Grande  11

do  Sul,  Rio  de  Janeiro  e  Espírito  Santo.  As  causas  do  decréscimo   da  população  indígena  vão  desde a disseminação  de  doenças trazidas pelos colonizadores até os  confrontos  diretos  nas  chamadas  guerras  de  conquista  e  de  apresamento,  cujo  objetivo  era  garantir  a  exploração  da  mão­de­obra  indígena  através  do  trabalho  escravo,  tal  fato  perdurou  durante  o  período  colonial  e  imperial,  sendo  abolido  12

somente no ano de 1831, pela lei de 27.10.1831 ​ .    É  possível  observar,  portanto,  que  na  lógica   do  sistema  hegemônico,  “a  ‘cultura’  obtém  uma  força  ‘política’  quando  uma  formação  cultural  entra  em  contradição com  lógicas políticas ou econômicas que tentam refuncionalizá­la para a  13

exploração  ou  dominação” ​ .  Cria­se,  desta  forma, um contraponto externo ao  que a  14

lógica  capitalista  impõe ​ .  Logo,  durante  o  período  da  colonização,  a  prioridade  dos  “recém  chegados”   pautou­se  na  tentativa  de  assimilar,  apresar,  catequizar  ou 

  Conforme  informação  no site  da  PIB. (POVOS INDÍGENAS NO BRASIL.  ​ Quadro geral dos povos.  Disponível em: . Acesso em: 10 out. 2015).  11   A  degradação  cultural  dos  índios  desde  a   chegada  dos  colonizadores,  e  a  “ausência  de   perspectivas”,  contribui  para  a  crescente taxa  de suicídios  que acomete diversas  tribos  brasileiras.  (MORGADO,   Anastácio  F.  Epidemia  de  suicídio  entre   Guaraní­Kaiwá:  indagando  suas  causas  e  avançando  a hipótese do recuo impossível. ​ Cadernos de Saúde Pública, ​ Rio de Janeiro, v. 7, n. 4,  p. 585­598,  out./dez.  1991.  Disponível em: . Acesso   em:  15  ago.  2015).  Em  sentido  informativo  segue  matéria  veiculada  no  Jornal  Estadão:  “Vários  autores  relatam  que  o  suicídio  coletivo  não  é  algo  incomum  entre  os  povos  tribais,  ainda  que,  obviamente, seja causa  de preocupação para  com  a dignidade  humana destes, cabendo ao Estado  efetuar  a  sua  proteção.  [...]  à  época   da  chegada  dos  colonizadores  a  Cuba,  “estava  aquela  terra  próspera  e  rica  e muito  povoada  por  índios,  os  quais, pouco depois, deram para enforcar­se, quase  todos…  se   enforcavam  de  tal  maneira   e  com  tanta  pressa  que  houve  dia  de  amanhecer  com  cinquenta  casas  com índios  enforcados com  suas mulheres  e filhos em  um  mesmo povoado. Era a  maior   lástima  do  mundo  para  qualquer   vivente  ver  aqueles  seres  pendurados  nas  árvores”.  (MANSO,  Bruno  Paes.   Porque  os  índios  lideram   o  ranking  dos  suicídios  no  Brasil?  O  mapa  da  violência.  Estadão,  ​ Rio  ​ de  Janeiro,  07  jul.  2014.   Disponível  em:  . Acesso em: 15 ago. 2015).  12   Vide  texto  em  Malheiro; A  escravidão  no Brasil, p. 236  s.;  ARNAUD,  Aspectos  da  Legislação sobre  os índios  do Brasil, p. 17; BRASIL, Leis,  Decretos, etc, Assuntos indígenas, Coletânea  de Leis, atos  e  memoriais  referentes  ao  indígena  brasileiro,  p.  70 e seguintes.  (​ KAYSER, Hartmut­Emanuel.  ​ Os  direitos  dos povos indígenas  do  Brasil​ :  desenvolvimento histórico  e  estágio  atual. Porto Alegre:  Sergio Antonio Fabris, 2010. p. 144).  13   Lowe  e  Lloyd,  1997a  ​ apud  SANTOS;  Boaventura  de  Sousa.  ​ Reconhecer   para  libertar​ :   os  caminhos do cosmopolitismo multicultural. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. p. 34­35.  14   ​ É nesse  sentido  que Boaventura  de Sousa Santos fundamenta a sociologia das ausências na teoria  crítica  pós­moderna,  pois  o  capitalismo  seria  um  entrave   à  emancipação  humana. Desta forma,  o  autor propõe a ascensão do multiculturalismo emancipatório. (Ibidem).  10

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“domesticar”  os  índios,  pois  estes  eram vistos  como  selvagens   primitivos.   Kayser   observa que:    O  trabalho  escravo   foi  permitido durante o  período  da colonização  do Brasil,  de  acordo  com  o  Direito   português.  O  Direito Civil  português  daquela  época  continha  normas  expressas  sobre  a  escravidão. As  leis gerais  aplicáveis  em  Portugal  desde  1521  eram  as  chamadas  Ordenações  Manuelinas  de  1521.  Estas   foram  substituídas  pelas  Ordenações  Filipinas  de  1603,  que,  em  essência, vigoraram no Brasil até 1868. 

  No  entanto,  os  interesses  que permeavam  as  investidas  da Coroa, para além  de  fiscais  e  estratégicos,  eram  políticos.  Pois  viam  nos  índios  os  aliados  que  necessitavam  nas  lutas  contra  franceses,  holandeses  e  espanhóis,  seus  competidores internos.    [...]  o  Estado  tinha  grande  interesse  estratégico  na  submissão  política   dos   povos indígenas: sua vassalagem  importava ao  Estado como condição prévia  de  uma  mão­de­obra  domesticada  e  politicamente  eficaz  na  constituição de  uma  sociedade   colonial  que  garantisse  a   Portugal  a  posse  dos  territórios  16 conquistados [...].  

  17

À  vista  disso,  Chauí   afirma   que,  a  partir  do  ponto  de  vista  histórico,  as  grandes  navegações  foram  impulsionadas  pelo  desejo de  expansão do capitalismo  mercantil.  Diante  deste  contexto,  a  autora  afirma  que  nasce  com  a  colonização  18

brasileira,  o  chamado  “mito  fundador” ​ ,  baseado  em  três  premissas:  a  visão  do  paraíso;  a  história  teológica  que  buscava  “domesticar”  os  nativos  que  habitavam o  Brasil  à  época,  e,  por  último,  “a  influência  jurídico­teocêntrica  da  figura  do  governante  como  rei  pela  graça  de  Deus”.  Ainda,  de  acordo  com  a  autora  supracitada:  Cartas  e   diários  de  bordo   impressionam  porque  descrevem  o  mundo  descoberto  como  novo e  outro, mas o  sentido desses termos é diverso  do que  esperaríamos.  De  fato,  ele  não  é  novo  porque  jamais   visto  nem   é  outro  porque  inteiramente  diverso  da  Europa.  Ele  é  novo  porque   é  o  retorno  à  perfeição  da  origem,  à   primavera  do  mundo,  ou   à  “novação  do  mundo”,  oposto  à  velhice outonal ou à decadência  do velho mundo. E é outro porque é    K ​AYSER,  Hartmut­Emanuel.  ​ Os  direitos  dos  povos  indígenas  do  Brasil​ :  desenvolvimento  histórico e estágio atual. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2010. p. 100.  16   CUNHA,  Manuela  Carneiro   da.  ​ Índios  no  Brasil​ :  história,  direitos  e  cidadania.  1.ed.  São  Paulo:  Claro Enigma, 2012. p.104.  17   CHAUÍ, Marilena. ​ Brasil: ​ mito fundador e sociedade autoritária. São Paulo: Perseu Abramo, 2000.   18   Esclarece  a  autora  que  “visão   do  paraíso”  é  clássica  expressão  utilizada  por  Sérgio  Buarque  de  Holanda.  15

  originário,  anterior  à  queda   do  homem.  Donde  a   descrição  da   gente  nova  como  inocente e  simples, pronta para ser evangelizada.  [...]  considerando­se  o  estado  selvagem  (ou  de  brutos  que  não  exercem   a  razão),  os índios não  podem ser tidos  como  sujeitos  de  direito  e, como tais,  são escravos naturais. 19

 

  A partir de 1552, o rei Dom João III confiou à Companhia de Jesus o empenho  em  converter os índios  ao  cristianismo, com respaldo no Regime de Tomé de Sousa  (ordens  do  rei para o primeiro Governador  Geral  Tomé  de Sousa), de 15.12.1548, a  qual  permaneceu  em  vigor  até  1577  e  continha  as  diretrizes  da  administração  do  Brasil.  Importante  observar  que  um  dos  seus  mais  importantes  objetivos  era  justamente  a  conversão  dos  índios  à  fé  cristã,  uma   clara  tentativa  de  promover  a  integração  dos   índios  ao  que  chamamos  de  cultura  eurocêntrica.  Objetivando,  portanto,  a  homogeneização  de  uma  cultura  e,  consequentemente,  tentando  20

desconstruir  a  identidade  étnica  do  índio  brasileiro.  Nesta  perspectiva,   Laraia   destaca:    O  fato  de  que  o  homem   vê  o  mundo  através  de  sua  cultura  tem  como  consequência  a  propensão  em  considerar  o seu modo  de vida como  o mais  correto  e  o  mais  natural.  Tal  tendência,  denominada  etnocentrismo,   é  responsável  em  seus casos  extremos  pela ocorrência de numerosos conflitos  sociais.   [...]  cada sistema cultural está  sempre em mudança. Entender esta dinâmica é   importante  para  atenuar  o choque entre as gerações e evitar comportamentos  preconceituosos.  Da  mesma   forma  que  é fundamental  para  a  humanidade  a  compreensão das diferenças entre  povos  de  culturas diferentes, é necessário  saber  entender as  diferenças  que ocorrem dentro do mesmo sistema. Este é o  único  procedimento  que   prepara  o   homem  para enfrentar serenamente este  constante e admirável mundo novo do porvir. 

  Os  períodos  em  que  o  Brasil  seguiu  como  colônia   de  Portugal  e,  posteriormente,  durante  o  Império,  foram  pautados,  sobretudo,  pela  questão  da  21

disputa  de  terras,  a  qual  será  estudada  em  capítulo  próprio.  Nesta  senda,  Cunha   esclarece que:   

  CHAUÍ,  Marilena.   ​ Brasil: ​ mito  fundador e  sociedade  autoritária. São Paulo: Perseu Abramo,  2000.  p.63.  20   LARAIA,  Roque  de  Barros.   ​ Cultura  um  conceito  antropológico.   ​ Rio  de  Janeiro:  Editora  Jorge  Zahar, 2006. p.72­73, 101.  21   CUNHA,  Manuela  Carneiro   da  (Org.).  ​ História  dos índios  no  Brasil​ .  São  Paulo:  Companhia  das   Letras/FAPESB, 1992. p.56.  19

  O  século  XIX  é  um  século  heterogêneo,  o  único  que  conheceu  três  regimes  políticos:  embora  dois  terços  do  período  se passem  no Império, ele  começa  ainda  na  Colônia  e   termina  na  República  Velha.  Inicia­se  em   pleno  tráfico  negreiro e termina com o início das grandes vagas de imigrantes livre.   [...]  A  política  indigenista  do  período   leva  a  marca de  todas  essas disparidades.  Mas,  para  caracterizar  o  século como um todo, pode­se dizer que  a questão  indígena deixou  de ser essencialmente  uma  questão  de mão de obra para se   tornar uma questão de terras. 

  À  vista  disso,  o  Direito   gerado  dentro  da  cultura   de  uma  nação  baseada  em  concepções  burguesas  clássicas  acabou   por  compreender  não  haver  intermédios  22

entre  o cidadão e este Estado ​ . A cultura  do individualismo, desta forma, fortalecia o  país através de  seus cidadãos livres, com direitos e garantias individuais, solidificada  especialmente  na  sociedade  do  século  XXI.  Deste  modo,  absorveu­se   a  ideia  de  23

coletividade,  grupos  humanos  ou  tribos.  Bauman   explica  que  os  nômades  (os  próprios  índios   e/ou  os  ciganos,  estes  últimos  muito  discriminados  no  continente  europeu),  por  sua  indiferença  com  a  cultura  do  progresso  e  da  civilização,  pouco  preocupados   com  as  fronteiras  territoriais  traçadas  pelos  legisladores,  inseridos  no  que  denominou­se  “cronopolítica”,  passaram  a  ser  vistos  como  primitivos  e  subdesenvolvidos, abaixo da escala evolutiva criada para manter o “padrão universal  de  desenvolvimento”.  Logo,  são  semelhantes,  pois,  ao  seu  modo,   negam  o  “civilizar­se”,  o  submeter­se  ao  padrão  cultural  hegemônico,  o  qual,  na maioria  das  vezes,  tenta  absorver  estas  identidades  vistas  como  diferentes.  Neste  sentido,  24

Lévi­Strauss ​ , analisando a diversidade das culturas explica:    Nada  impede, com efeito, que culturas  diferentes  coexistam e que prevaleçam  entre elas  relações relativamente tranquilas, que a  experiência histórica prova  poderem  ter  fundamentos  diferentes.  Logo,  cada  cultura  se  afirma  como  a  única  verdadeira   e  digna   de  ser  vivida;  ignora  as  outras,   chega  mesmo   a  negá­las como culturas.  [...]  Enquanto  se  consideram   simplesmente  diversas,  as   culturas  podem  voluntariamente  ignorar­se, ou  considerar­se como parceiros para um diálogo  desejado. 

    SOUZA FILHO, Carlos  Frederico  Marés  de.  ​ O Renascer dos  Povos Indígenas para o Direito​ . 1.   ed. 4. tir. Curitiba: Juruá, 2005. p. 62.  23   BAUMAN, Zygmunt. ​ Modernidade Líquida​ . Rio de Janeiro: Zahar, 2001. p. 21­22.   24   ​ LÉVI­STRAUSS,  Claude.  ​ O olhar  distanciado​ . Lisboa: Edições  70,  1983. p.  23­24. Disponível em:  . Acesso em: 31 ago. 2015.  22

 

Evidentemente,  os  povos  tribais  se  reconhecem  como  pessoas  enquanto  parte  de  um  coletivo:  a  tribo,  o  grupo. A própria  antropologia  social  já concluiu que  os  grupos  étnicos   são  caracterizados  por  suas  distinções  percebidas  entre  eles  25

próprios  e  outros  grupos  com  os  quais  interagem ​ .  Nesta  perspectiva,  ​ Seeger,  26

Matta  e Castro   ponderam, com muito cuidado,  que  para  vermos os índios com “os  seus  próprios  olhos”,  é  necessário  reconhecê­los  enquanto  grupos  com  uma  estrutura  social  (os  sul­americanos,  sobretudo,  os brasileiros),  em que  seus  corpos  são  dotados  de  simbolismo,  precedendo   outras  perspectivas  de  articulação,  tais  como  o  espaço social e  o  tempo social. Evitando­se, conforme os autores “os cortes  etnocêntricos  em  domínio  ou  instâncias  sociais,  como  ‘parentesco’,  ‘economia’  ou  27

‘religião’”.  Os  mesmos  autores   concluem  que  “a  corporalidade  e  a  pessoa  como  informador  da  ​ praxis  local  concreta  é  única  via  não­etnocêntrica  de  inteligibilidade  desta  ​ praxis​ ”.  Ou  seja,  faz­se  necessária  a  observação  de  como  estes  corpos  se  reconhecem  e  convivem  entre  si,  e  principalmente  de  qual  maneira  os  sujeitos  externos  à  essas  relações  podem  reconhecer   a  existência  de  uma  autonomia  imbuída  na  estrutura  social  dos  ameríndios  (os  índios  americanos),  a  qual  encontra­se  arraigada, portanto, nas concepções cosmológicas destes sujeitos. Este  28

entendimento  fundamenta­se  nos  sentidos  multinaturalistas   das  comunidades  indígenas,  diferentemente,  ou  como  complemento  ao  que 

propõe  o 

29

multiculturalismo.    

  CUNHA,  Manuela  Carneiro   da  (Org.).  ​ História  dos índios  no  Brasil​ .  São  Paulo:  Companhia  das   Letras/FAPESB, 1992. p.103.   26   SEEGER,  Anthony;  MATTA,  Roberto  da;  CASTRO,  Eduardo  Viveiros  de.  A  construção  da  pessoa  nas sociedades indígenas  brasileiras. ​ Boletim do  Museu  Nacional​ ,  Rio de  Janeiro, n.  32, p. 2­19,  1979.   27   SEEGER,  Anthony;  MATTA,  Roberto  da;  CASTRO,  Eduardo  Viveiros  de.  A  construção  da  pessoa  nas sociedades indígenas  brasileiras. ​ Boletim do  Museu  Nacional​ ,  Rio de  Janeiro, n.  32, p. 2­19,  1979.   28   O  multinaturalismo  acredita  que  há  uma  cultura  composta  por  diversas  naturezas  e  que  a  corporalidade  faz  junção  entre  a  natureza  e  a  cultura.  A  chamada  “política  cósmica”.  (CASTRO,  Eduardo  Viveiros  de.  ​ A  Inconstância   da  Alma  Selvagem  e  outros  Ensaios de  Antropologia​ .  São Paulo: Cosac & Naify, 2002. p. 347­348).  29   Boaventura  de Sousa Santos  propõe a reivenção  do multiculturalismo,  de forma que este ocorra de  maneira  emancipatória,  ​ “baseado  no  reconhecimento  da  diferença  e   do  direito  à  diferença  e  da  coexistência  ou construção  de  uma  vida  em  comum além  de  diferenças de vários tipos”. ​ (SANTOS,  Boaventura  de Sousa.  ​ Reconhecer para libertar​ : os caminhos do cosmopolitismo multicultural. Rio   de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. v. 3).  25

  30

Atualmente,  para reconhecer “quem é ou  não índio”  ​ , a FUNAI se baseia nos  critérios  estabelecidos pela  Convenção 169 da OIT sobre Povos Indígenas e Tribais,  31

promulgada   integralmente  no  Brasil  pelo   Decreto  nº  5.051/2004 ​ , e no  Estatuto  do  32

Índio  (Lei  6.001/73).  CUNHA   frisa  a  importância  de  ponderar,  dentro  destes  critérios  de  definição  da  identidade  étnica  de  um  grupo  indígena,  que  estes  são  baseados  em  traços  culturais que  podem  sofrer  alterações  com  o  tempo,  haja  vista  que a cultura é  dinâmica e  permanentemente  reelaborada,  sem  que isto afete a sua  identidade.  Ainda,  completa  a  autora,  “a  identidade  étnica  de um  grupo  indígena  é,  portanto,  exclusivamente  função  da  auto­identificação  e  da  identificação  pela  sociedade envolvente”.    Como a herança  da  moral  perversa  “do etnocentrismo  colonial” que  tendeu  a  “transformar  a  consciência indígena  numa  ‘consciência  infeliz’”,  Cardoso de Oliveira 33

  mostrou  que  tal  definição  acabou  sendo  ultrapassada  a  partir  dos  movimentos 

sociais de 1960, devido ao auto­reconhecimento identitário por  parte dos índios, esta  como  fonte  de   dignidade  e  auto­afirmação.  O  autor  explica  que  “o reconhecimento  da  identidade  do  indígena  como  ser  coletivo  passou  então  a  ser  mais  do  que  um  direito  político;  passou  a  ser  um  imperativo  moral”.  O  “nós  tribal”,  assim  como  a  30

  O  Estatuto  do  Índio  define,  em   seu   artigo  3º,  o  indígena  como:  “[...]   todo  indivíduo  de  origem  e  ascendência pré­colombiana  que  se  identifica  e  é identificado  como  pertencente  a  um  grupo  étnico  cujas características culturais  o distinguem da sociedade nacional.” (BRASIL. ​ Lei nº 6.001, de 19 de  dezembro  de   1973.  ​ Dispõe  sobre  o  Estatuto  do  Índio.  Disponível  em:  . Acesso em: 12 set. 2015).  31   ​ A Convenção  169  da  OIT  sobre Povos Indígenas e Tribais, promulgada  integralmente no Brasil pelo  Decreto   nº  5.051/2004,  em  seu  artigo  1º  afirma  que:  “1.  A  presente   convenção  aplica­se:  a)  aos   povos  tribais  em  países  independentes,  cujas  condições   sociais,  culturais  e   econômicas  os   distingam  de  outros  setores da  coletividade nacional,  e  que estejam  regidos, total  ou parcialmente,  por  seus  próprios  costumes  ou  tradições  ou   por  legislação  especial;  b)  aos  povos  em  países  independentes,  considerados  indígenas pelo  fato de  descenderem  de  populações  que habitavam o  país  ou  uma  região  geográfica  pertencente ao  país na  época da conquista ou da colonização ou do  estabelecimento das atuais  fronteiras  estatais  e  que, seja qual  for  sua  situação jurídica, conservam  todas  as   suas  próprias  instituições  sociais,  econômicas,   culturais  e  políticas,   ou  parte  delas.  2.  A  consciência  de  sua  identidade  indígena  ou tribal deverá ser considerada  como  critério  fundamental  para  determinar  os  grupos  aos   que  se  aplicam as  disposições  da presente  Convenção.”  (BRASIL.    ​ Decreto  nº  5.051,  de  19  de  abril  de  2004.  ​ Promulga  a   Convenção  nº​ 169  da  Organização  Internacional  do  Trabalho  ­   OIT  sobre  Povos  Indígenas  e  Tribais.  Disponível  em:  .  Acesso  em:  12  set.  2015).  32   CUNHA,  Manuela  Carneiro   da.  ​ Índios  no  Brasil​ :  história,  direitos  e  cidadania.  São  Paulo:  Claro  Enigma, 2012. p. 108­109.  33   OLIVEIRA,  Roberto Cardoso de.  ​ O  índio e o mundo dos brancos​ . 4. ed. Campinas: Ed. Unicamp,  1996. p.12. 

 

produção  cultural  advinda  da  “tribo”,  nasce  antes  de  ser  pressuposto  para  que  esta  se reconheça como tal.  Sendo, destarte,  um  produto fabricado  por este meio. Neste  34

​ sentido, assevera Barth : 

  [...]  os  elementos  da  cultura  presente  de  um  grupo   étnico  não  surgem  do  conjunto  particular  que  constitui  a  cultura  do  grupo  em  um  período  anterior,  embora  o  grupo  tenha  uma existência organizacional contínua,  com fronteiras  (critérios  de  pertença)  que,   apesar  das  modificações,  nunca  deixaram   de  delimitar uma unidade contínua. 

  Ao  longo  da   história  ­  e  permanecendo  até  hoje  ­  houve  a  reprodução  e  o  oferecimento  do  chamado  “processo  civilizatório”,  o  qual  ainda  é  projetado  no  interesse  de  integrar  o  que  é  visto  como  diferente,  herança  da  colonização.  Neste  ponto,  a  construção dos  Estados  nacionais latino­americanos  sofreu forte influência  do ponto de vista dominante  dos  colonizadores,  o  qual  buscava  um  Estado  único e,  35

36

por  consequência,  um direito  único ​ . Segundo Souza  Filho ​ ,  “a independência dos  países  latino­americanos  se  confunde  com  revoluções  burguesas”,  sobretudo  de  37

Portugal e Espanha. Para Araújo et al ​ :    Trata­se  de uma interpretação etnocêntrica do Direito, que não admite que  um  conjunto de  regras diferenciadas que organizam uma sociedade distinta possa   ser  acatado  como Direito, convivendo lado a lado com o Direito estatal. Dessa   forma,  é  que  opta  por  se   referir   a  usos,  costumes  e  tradições,  os  quais  se   exige  respeitar  desde  que  não  sejam  incompatíveis  com  o  sistema  jurídico  estatal.  Na   verdade,  os  sistemas  jurídicos   indígenas  são  vistos  como  mera   fonte secundária  do Direito, concepção carregada  de preconceito que reclama  providências no  sentido  da absorção  de preceitos  contemporâneos bem mais  arrojados sobre o tema. 

  Desta  forma,  ao  examinarmos  o  sistema  jurídico  contemporâneo,  é  notável  que  as  leis  complementares  e  a  regimentação  jurídica  e  administrativa,  ainda  não  fizeram  superar  os  vícios   tutelares,  autoritários  e  assistencialistas  do  Estado    B ​ARTH, Fredrik. Os  grupos  étnicos e  suas fronteiras. In: POUTIGNAT, Philippe;  STREIFF­FENART,  Jocelyne (orgs). ​ Teorias da etnicidade​ . São Paulo: Editora da Unesp, 1969. p. 227.  35   O  autor  continua:   “[...]  na  boa  proposta  de  acabar  com  privilégios  e  gerar  sociedades   de  iguais,   mesmo que  para  isso  tivesse que  reprimir de  forma  violenta ou  sutil as diferenças culturais, étnicas,  raciais,  de gênero, estado ou  condição”  (SOUZA FILHO,  Carlos  Frederico  Marés. ​ O  renascer dos  povos indígenas para o direito​ . Curitiba: Juruá, 1998. p. 63).  36   SOUZA  FILHO,  Carlos  Frederico  Marés.  ​ O  renascer  dos   povos  indígenas  para  o  direito​ .  Curitiba: Juruá, 1998, p. 62.  37   ARAÚJO,  Ana  Valéria  et  al.   ​ Povos   Indígenas  e  a   Lei  dos  "Brancos"​ :  o  direito  à  diferença.  Brasília: MEC/SECAD ​  LACED/Museu Nacional, 2006. p.64­65.  34

  38

brasileiro,  ​ como  concluiu  Souza ​ .  Cumpre  observar,  ainda,  que  há  muito  tempo  o  Estado  tem  pautado  a  sua  relação  com  os  povos  indígenas  através  de  um  falso  diálogo,  o  qual  mais  tem  tolhido  os  direitos  dos  povos  originários  do  que  os  reconhecido  de fato. Permanece a busca  por uma libertação da “dominação colonial”  39

herdada ­ ou reconfigurada? ­ a qual,  conforme Santos ​ , poderá nos fazer evitar que  “a  reconstrução  de   discursos  e  práticas  emancipatórios   caia  na  armadilha  de  40

reproduzir,  de  forma  ampliada, concepções  e preocupações  eurocêntricas”.  Sader   aponta,  entre  outros,  a  força  popular  do  movimento  social  indígena  na  América  Latina,  enquanto  instrumento  de  luta,  como  alternativa  às  políticas  neoliberais  que  41

os  afeta  diretamente,  buscando­se  um  sentido  emancipatório   à  “luta  política  dos  movimentos  sociais,  eis  que  o  mesmo  assume  um  papel   relevante  no  acesso  ao  42

direito e à justiça” ​ .    2.1  O  DIREITO  ORIGINÁRIO  DOS  ÍNDIOS  ÀS  TERRAS  TRADICIONALMENTE  OCUPADAS     Uma  das  maiores  dificuldades  encontradas  no  cenário  brasileiro  atual  refere­se  ao  direito  dos  índios  às  terras  tradicionalmente  ocupadas  e  os  conflitos  fundiários  advindos  deste  reconhecimento,  através  da  demarcação  de  terras.  É  de  suma  relevância  registrar  que  da  garantia  do  direito  à  terra  dependem  os  demais  direitos  inerentes  aos  povos  indígenas,  tal  como  a  sua  própria  sobrevivência  e 

38

  SOUZA,  José Otávio  Catafesto. Mobilização indígena, direitos originários e cidadania  tutelada no sul  do  Brasil  depois  de 1988.  In: FONSECA,  Claudia; TERTO JUNIOR, Veriano;  ALVES, Caleb Farias  (orgs.).  ​ Antropologia, Diversidade  e Direitos Humanos​ : diálogos interdisciplinares.  Porto Alegre:  UFRGS, 2004. p. 185­197.  39   SANTOS;  Boaventura   de  Sousa​ .   Reconhecer  para  libertar​ :  os   caminhos  do  cosmopolitismo  multicultural. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. v. 3.  40   SADER,  Emir.  Movimentos  Sociais e luta antineoliberal. OSAL​ ,  Observatorio  Social  de América  Latina​ ,  Buenos  Aires,  v.  5,  n.  15,  p.  57­64,  sep./dic.  2004.  Disponível  em:  .  Acesso  em:  15  ago.  2015.   41   ​ SANTOS,  Boaventura  de  Sousa.  ​ Do  pós­moderno  ao pós­colonial  e para além de um e outro​ .  Coimbra:  Centro  de  Estudos  em  Ciências  Sociais,  ​ 2004,  p.  39​ .  Disponível  em:  .​  Acesso em: 30 ago. 2015.  42   CARLET,  Flávia.  ​ Advocacia  popular:  ​ práticas  jurídicas  e  sociais  no  acesso ao  direito  e à  justiça  aos  movimentos  sociais de  luta  pela terra.  2010. 130f.  Dissertação  (Mestrado em Direito, Estado  e  Constituição) –  Coordenação  de Pós­Graduação em Direito, Universidade de  Brasília,  DF,  2010. p.   112.  Disponível  em:  .  Acesso em: 01 set. 2015. 

 

reprodução  cultural,  e a consequente  estruturação  social própria e a preservação de  43

seus princípios cosmológicos. Conforme adverte Souza Filho ​ :    [...]  a  existência  física  de um território,  com um ecossistema  determinado  e o  domínio, controle  ou  saber  que tenha o  povo sobre ele, é determinante para a   própria  existência  do povo.  É  no território  e  em seus  fenômenos naturais que  se  assentam  as  crenças,  a  religiosidade,  a  alimentação,  a  farmacopéia  e  a  arte de cada povo.  

  A  dificuldade  em  precisar  com  exatidão  a  divisão  territorial  dos  povos  indígenas  estabelecidos  no  Brasil  na  época  da  colonização  ocorria,  sobretudo,  porque  cada   tribo  possuía  o  seu  próprio  conceito  de  território.  A  base  do  poder  exercida  em  determinado  espaço  geográfico  sustentava­se nas  crenças  e  mitos  de  cada  tribo.  Desta  forma,  a  utilização  do espaço  ou  a  forma  como  se  protegiam  das  investidas  de  terceiros  diferia­se  muito  e, portanto, dependia ­ e ainda depende ­ do  44

critério de cada tribo ​ .    Há  muito  tempo  debate­se  juridicamente  os  conflitos  referentes  às  terras  45

indígenas. Neste contexto, esclarece Cunha ​ :    Os  reis   portugueses  reconheceram,  em  várias   leis,  os  direitos  dos  índios  sobre  suas terras: o  alvará  de 1º de  abril de  1680, mais tarde incorporado na  lei  pombalina  de  1755,  isentava  os  índios de  ‘foro  ou  tributo  algum  sobre  as  terras  (tantos  os  índios  silvestres   quanto  os  aldeados),  ainda   que  dadas as  sesmarias  a  pessoas  particulares,  porque  na  concessão  destas  se  reserva  sempre  o   prejuízo  de  terceiro,  e  quero  que  se  entenda  ser  reservado  o  prejuízo e direitos dos índios primários e naturais senhores delas. 

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Araújo  e outros  apontam que o Alvará foi pouco respeitado, eis que as terras  indígenas  continuaram  a  sofrer  com  o  esbulho praticado pelos colonos da época, os  quais  muitas  vezes  contavam com o apoio das autoridades locais. Destarte, deve­se  reconhecer  que  tal  documento  foi  um  marco  na  lei  colonial  voltada  aos índios,  pois 

  SOUZA FILHO, Carlos  Frederico  Marés  de.  ​ O renascer  dos Povos Indígenas  para  o  Direito​ .  8.  ed. Juruá: Curitiba, 2012. p.120.  44   SOUZA FILHO, Carlos  Frederico  Marés  de.  ​ O Renascer dos  Povos Indígenas para o Direito​ . 1.   ed. 4. tir. Curitiba: Juruá, 2005. p.43   45   CUNHA,  Manuela  Carneiro   da.  ​ Índios  no  Brasil​ :  história,  direitos  e  cidadania.  1.ed.  São  Paulo:  Claro Enigma, 2012. p.111.  46   ARAÚJO,  Ana  Valéria  et  al.   ​ Povos   Indígenas  e  a   Lei  dos  "Brancos"​ :  o  direito  à  diferença.  Brasília, DF: MEC/SECAD ​  LACED/Museu Nacional, 2006. p.24.  43

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os  declarou  “primários  e  naturais  (senhores  das  terras)” ​ .  Neste  sentido,  Cunha   assevera que:    [...]  D.João  VI,  em  Carta  Régia  de  2/12/1808,  havia  declarado  devolutas as  terras  conquistadas  aos  índios  a  quem  havia  declarado  guerra  justa;  essa   declaração  implica  o  reconhecimento dos direitos anteriores  dos  índios sobre  suas  terras,  direitos  agora  ab­rogados  para  certos  grupos  apenas; e implica  também  a  permanência  de  tais  direitos  para  índios  contra  os   quais   não  se  49 declarou guerra justa.  

  A  transformação  das  sesmarias  em  propriedade  plena  ocorreu  somente  em  1850,  quando  promulgou­se  a  Lei  601, de  18.09.1850,  mais conhecida como Lei de  50

Terras,  a  qual  foi  regulamentada  pelo  Decreto  1.318,  de  30/01/1854 ​ .  Conforme  51

Souza  Filho ​ ,  esta  Lei  incorporava  as  terras  devolutas  ao  patrimônio  privado,  reconhecendo­se o direito  de quem havia adquirido as terras através das sesmarias.  52

Cunha   aponta  ficar  demonstrado  que  “o  título  dos  índios  sobre  suas  terras  é  um  título  originário,  que  decorre  do  simples  fato  de  serem  índios”,  sem  qualquer  necessidade de legitimação.    Durante  este  período,  a  política  de  assimilação  e  concentração  social  dos   53

índios ao resto da população foi estimulada. Conforme adverte Cunha ​ , nesta época  47

  Ainda  segundo  o  autor os índios  eram  assentados  “em rotas fluviais,  como a  que ligava São Paulo  ao  Mato  Grosso,  ou  o   Paraná  ao  Mato  Grosso,  ou  ainda  como  as  do   Tocantins  e  do  Araguaia  ligando  o  Centro­Oeste  ao Pará  e  ao Maranhão. [...]  Podiam­se  estabelecer  aldeamentos em rotas  de  tropeiros, como  a que  ligava  São  Pedro  do  Rio Grande do Sul e Santa Catarina”, e frisa que “em  todos esses casos,  os  aldeamentos  serviam  de  infraestrutura, fonte  de  abastecimento  e reserva de  mão  de obra.” (CUNHA, Manuela Carneiro  da. ​ Índios no Brasil​ : história, direitos e  cidadania. 1.ed.  São Paulo: Claro Enigma, 2012. p.76).   48   CUNHA,  Manuela  Carneiro   da.  ​ Índios  no  Brasil​ :  história,  direitos  e  cidadania.  1.ed.  São  Paulo:  Claro Enigma, 2012. p.71.  49   Ainda,  conforme  a  autora: “[...]  a  primazia  e inalienabilidade  do direito  dos  índios sobre  as  terras  a   que ocupam deve  se estender  aos  aldeamentos para onde haviam sido  levados, mesmo  que longe  de  suas terras  originais.  Tanto  é verdade isso que,  em  1819, a Coroa  volta atrás na  concessão  de  uma  sesmaria  dentro  de  terras   da  aldeia  de  Valença,  de  índios  Coroados,  e  reafirma  princípios  fundamentais: as  terras das  aldeias são inalienáveis e não  podem  ser  consideradas devolutas; são  nulas as concessões de sesmarias em tais”.  50   BRASIL.  ​ Decreto  nº  1.318,   de  30  de  janeiro  de  1854.  ​ Manda  executar  a  Lei  nº  601,   de  18  de  Setembro  de  1850.  Disponível  em:  . Acesso em: 12 set. 2015.  51   SOUZA FILHO, Carlos  Frederico  Marés  de.  ​ O Renascer dos  Povos Indígenas para o Direito​ . 1.   ed. 4. tir. Curitiba: Juruá, 2005. p.125.  52   CUNHA,  Manuela  Carneiro   da.  ​ Índios  no  Brasil​ :  história,  direitos  e  cidadania.  1.ed.  São  Paulo:  Claro Enigma, 2012. p.72.  53   CUNHA,  Manuela  Carneiro   da.  ​ Índios  no  Brasil​ :  história,  direitos  e  cidadania.  1.ed.  São  Paulo:  Claro Enigma, 2012. p.75. 

 

as  aldeias  deram  lugar  às  vilas  com  nomes  portugueses,  os  casamentos  mistos  foram  favorecidos,  e  a  moradia  estabelecida  entre  índios  e  portugueses  foi  estimulada. Tal  prática,  ainda conforme  a  autora supra citada, ficou conhecida como  “política de entrusamento” e, na teoria, durou pouco menos de um século.    54

Percebe­se,  portanto,  mais  do  que  assimilar  a  cultura  do  ser  diferente ​ ,  se  buscava,  também,  a  submissão  dos  índios  às  leis  e  ao  trabalho,  reunindo­os   e  sedentarizando­os  com  o  objetivo  de  retirá­los  dos  grupos  das  aldeias  e  os  55

colocando  em  aldeamentos ​ ,  tais  como  as  missões  jesuíticas.  Tal  prática  se  justificava,  ainda  durante  o  século  XIX,  em  que  índios  foram  assentados  56

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principalmente  em  rotas  fluviais  e  de  tropeiros ​ .  Neste  sentido,  Farage  e  Cunha   esclarecem:    [...]  o  missionamento  desde  o  século  XVI  esteve  estreitamente vinculado ao  projeto  colonial  do  Estado  português   através  do  assim  chamado  Padroado  Real,  acordo  estabelecido  entre a Coroa  portuguesa  e a Igreja  Católica, pelo   qual   as  ordens  religiosas  estariam  subordinadas  ao  Estado  em  troca  do  financiamento de  seu  trabalho  nas  colônias portuguesas. A tarefa catequética   tinha  assim  por  objetivo  básico  adequar  a  população  indígena  às  58 necessidades político­econômicas da empresa colonizadora portuguesa.  

 

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  Conforme  Monteiro “o  direito à diferença  refere­se  à  aceitação e à tolerância daquilo que é estranho  aos padrões pré­definidos, o qual foi excluído do sistema pela sociedade moderna”.  55   “Nunca  é  demais  lembrar  a  distinção  básica  entre  “aldeia”  (povoado  indígena  pré­existente  à  colonização)  e  “aldeamento”  (agrupamento  indígena  montado  pelos  missionários   com  finalidades  específicas).  Os   aldeamentos  foram  implantados  desde  o  século   XVI   a  partir  do trabalho pioneiro  dos  jesuítas.  O  regimento  de 1686 concedeu  a  administração  espiritual  e  política dos aldeamentos  às ordens  religiosas.”  (BEOZZO, José  Oscar.  ​ Leis  e  regimentos das missões​ : política indigenista  no Brasil. São Paulo: Loyola, 1983).  56   A  autora   ainda  informa  que  os  índios  eram  assentados  “em  rotas  fluviais,  como  a  que  ligava  São  Paulo  ao Mato  Grosso,  ou  o Paraná ao Mato Grosso,  ou ainda como as do Tocantins e do Araguaia  ligando  o  Centro­Oeste  ao Pará  e  ao Maranhão. [...]  Podiam­se  estabelecer  aldeamentos em rotas  de  tropeiros, como  a que  ligava  São  Pedro  do  Rio Grande do Sul e Santa Catarina”, e frisa que “em  todos esses casos,  os  aldeamentos  serviam  de  infraestrutura, fonte  de  abastecimento  e reserva de  mão  de obra”. (CUNHA, Manuela Carneiro  da. ​ Índios no Brasil​ : história, direitos e  cidadania. 1.ed.  São Paulo: Claro Enigma, 2012. p.76)  57   FARAGE,  Nádia;  CUNHA,  Manuela  Carneiro  da.  Caráter  da  Tutela  dos  Índios:  Origens  e  Metamorfoses.  In:  CUNHA,  Manuela  Carneiro  da  (org.).  ​ Os  Direitos   do  Índio​ :  Ensaios  e  Documentos. São Paulo: Editora Brasiliense, 1987. p.103.  58   Ainda,  esclareceu  a  autora  que   “a  tendência  do  Estado  foi  a  de  reforçar   o  papel  das   ordens  religiosas  na  administração  da  mão­de­obra  indígena  livre  e,  após  muitas  oscilações,  tal  papel  foi  consolidado  pelo  Regimento  das  Missões  em   1686,  que  regulou  o  aldeamento  de  índios  sob  o  governo temporal  dos  missionários. Este sistema só terminou em  meados do século XVIII.” (CUNHA,  Manuela  Carneiro  da.  ​ Índios  no  Brasil​ :  história,  direitos  e  cidadania.  1.ed.  São  Paulo:  Claro  Enigma, 2012. p.92­93). 

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De  acordo  com Cunha ​ , a cada aldeamento de índios, era concedida à aldeia  uma  sesmaria  de  terras.  No  entanto,  “essas  terras  podiam  ser  arrendadas  e  aforadas,  e  com  esses  rendimentos  se  supunha  que  deviam  sustentar­se”.  Nesta  perspectiva,  os  índios,  insatisfeitos,  começaram  a  cobrar  das  autoridades  locais  o  60

reconhecimento  dos  direitos  que  tinham  sobre  essas  terras,  o  direito  às  raízes ​ .  61

Cunha ​  aduz que:    Em  1815,  os índios  da aldeia  dos  Aramaris  de Inhambupe de  Cima, na Bahia,  encaminham  uma  longa   representação  protestando  contra  a  espoliação das  terras  de  sua aldeia, que ocupavam,  afirmam  eles, havia mais  de cem  anos.  Em  1821  e 1822,  o  principal dos índios  Gamela de  Viana logra da Justiça  do  Maranhão  a demarcação  judicial  das  terras  da aldeia  (arquivo  do Tribunal de  Justiça  do  Maranhão,  pacote  005/tj/1986  apuc  Andrade  1990).  Um  índio  Xukuru, o capitão­mor da vila de Cimbres em  Pernambuco, denuncia em 1825  os  abusos  cometidos  aparentemente  pelo  diretor  da  aldeia  e  obtém  uma   decisão  favorável   do  imperador   (23/3/1825).  E  em  1828  (20/11/1828)  é  o  capitão­mor  da  vila   de  Atalaia,  em  Alagoas,  quem   protesta   contra  as  violências e a invasão das aldeias. 

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Tendo  em  vista  a  forma  devoluta   como  foram  caracterizadas  as  terras  ocupadas  pelos indígenas  durante  os  períodos  colonial e imperial,  coube à primeira  63

Constituição  da  República  de  1891, em  seu artigo 64  a transferência  aos estados  das  terras  devolutas  situadas  em  seus  territórios,  a  partir  da  extinção  dos 

  CUNHA,  Manuela  Carneiro   da.  ​ Índios  no  Brasil​ :  história,  direitos  e  cidadania.  1.ed.  São  Paulo:  Claro Enigma, 2012. p.77­78.  60   Santos se refere ao direito às raízes ao analisar a reemergência da etnicidade  como fundamento das  culturas  locais em contraponto  à cultura comercial, globalizada. Modernidade, identidade e a cultura  de  fronteira,  em  Pela  mão  de   alice:  o  social  e  o  político  dna  pós­modernidade.   (SANTOS,  Boaventura  de  Sousa.  ​ A Crítica  da Razão  Indolente​ :  Contra  o  Desperdício da  Experiência. 7.ed.  São Paulo: Cortez, 2000. p.144­145).  61   CUNHA,  Manuela  Carneiro   da.  ​ Índios  no  Brasil​ :  história,  direitos  e  cidadania.  1.ed.  São  Paulo:  Claro Enigma, 2012. p.92­93.  62   Dec.  1.318/1854,  “Art.  72.  Serão  reservadas  terras  devolutas  para  colonização   e  aldeamento  de  indígenas  nos  distritos  onde  existem  hordas   selvagens”  e  em  seu  art.  75,   assim   estabelecia  “As  terras  reservadas  para  colonisação  de indígenas, e por elles distribuidas, são destinadas ao seu usu  fructo;  e  não  poderão  ser  alienadas,  enquanto  o   Governo  Imperial,  por  acto   especial,  não   lhes  conceder  o pleno  gozo dellas,  por  assim  o  permitir  o seu estado de  civilização”.  (BRASIL. ​ Decreto  nº  1.318,  de  30  de  janeiro  de  1854.  ​ Manda  executar  a  Lei nº 601,  de  18 de  Setembro de  1850.  Disponível em:  . Acesso em: 12  set. 2015).  63   CF/1891,  “​ Art  64. Pertencem aos Estados as minas e terras devolutas situadas nos seus respectivos  territórios, cabendo à União somente a porção do  território que  for indispensável  para a defesa das  fronteiras,  fortificações,  construções  militares  e  estradas  de  ferro   federais.”  (BRASIL.  Constituição  (1891).  ​ Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil, de 24 de fevereiro de 1891.  Disponível  em:  .  Acesso  em:   10 set. 2015.  59

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aldeamentos ​ .  Araújo   explica  que  datam  dessa  época  os  títulos  conferidos  de  maneira  indevida  sobre  as  terras  dos  índios  Guarani­Kaiowá,  no  Mato  Grosso  do  Sul, bem como as invasões iniciais da Terra Indígena  Raposa Serra do Sol, quando  Roraima  ainda  fazia  parte  do  estado  do   Amazonas.  Posto  isto,  a  mesma  autora  afirma  que  a  Carta  de  1891  não  fez referência ao direitos  territoriais  dos  indígenas  sobre  as  terras  que   ocupavam,  e  que  a  União  tratava  sobre  o assunto  diretamente  com os governos estaduais e municipais.    Cumpre  ressaltar  que  as  terras  dos  aldeamentos  não  extintos  e  as  terras  imemoriais  indígenas não  eram consideradas  devolutas,  o que à época causou uma  66

grande desordem. João Mendes Jr. ​  aponta que:    Aos  Estados  ficaram as terras devolutas;  ora, as  terras  do  indigenato, sendo  terras  congenitamente  possuidas,  não   são   devolutas,  isto  é,  são  originariamente   reservadas,   na  forma  do  Alvará   de  1  de abril  de 1680 e por  deducção  da  própria  Lei  de  1850  e  do  art.   24,   §1.º,  do  Decr.   de  1854;   as  terras  reservadas   para   o  colonato  de  indígenas  passaram  a  ser  sujeitas  às  mesmas  regras que as  concedidas  para  o  colonato  de  immigrantes,  salvo as  cautelas  de  orphanato  em  que  se  acham  os  índios;  as  leis  estadoaes  não  tiveram,  pois, necessidade de  reproduzir as  regras  dos  arts. 72 a 75 do Decr.  n 1.318, de 30 de janeiro de 1854. 

  À  título  de  curiosidade  e  representando  um  marco  para  a  época,  em  1922,  67

conforme  Cunha ​ ,  entrou  em  vigor  no  Rio  Grande  do  Sul,  o  Decreto  Estadual  n.º  68

3.004,  de  10.8.1922. Tal  documento, em  seu art. 21 ​ ,  reconheceu títulos  indígenas  conforme  estes  seriam  consagrados  posteriormente  pela  Constituição  de  1934.  Neste  sentido,  apesar  da  reconhecida  posse  dos  índios  sobre  as  terras  que    CUNHA,  Manuela  Carneiro   da.  ​ Os  direitos   do  índio​ :  ensaios  e  documentos. São Paulo: Editora  Brasiliense, 1987. p. 68.  65   ARAÚJO,  Ana  Valéria  et  al.   ​ Povos   Indígenas  e  a   Lei  dos  "Brancos"​ :  o  direito  à  diferença.  Brasília, DF: MEC/SECAD ​  LACED/Museu Nacional, 2006. p.7.  66   MENDES  JUNIOR,  João.  Os  indígenas  do  Brazil,  seus  direitos  individuaes  e políticos. São  Paulo:  1912,  p.  62 ​ apud  ​ CUNHA,  Manuela  Carneiro da. ​ Os direitos do índio​ : ensaios  e documentos. São  Paulo: editora brasiliense, 1987. p.74­75.  67   CUNHA,  Manuela  Carneiro   da.  ​ Índios  no  Brasil​ :  história,  direitos  e  cidadania.  São  Paulo:  Companhia das Letras, 1987. p.77­78.  68   ​ ­Dec.  3.004/1922: “Art.  21 “​ O  Estado as  considera tais (terras  indígenas) independente de  qualquer  título  de  domínio,   como  consequência   da  propriedade  de  ocupação  por  eles (índios).”  (OLKOSKI,  Wilson.  Aspectos  da   história  agrária  dos  Kaingang  do  médio  alto  Uruguai  –  RS.  ​ Revista  de  Ciências  Humanas,   ​ Rio  de  Janeiro,  v.  4,  n.   4,  2003.  Disponível   em:  .  Acesso  em:  10  out.  2015. p.6).  64

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ocupavam,  expresso  nas  Constituições  de  1934 ​ ,  1937 ​ ,  1946 ​ ,  1967   e  1969 ​ ,  foi  apenas  com o  advento  da  Constituição  de  1988 que  restou proclamado  o  direito  originário  dos  povos  indígenas  sobre  as terras  que  possuíam.  Nesta perspectiva,  a  Constituição  de 1988  reconhece  que basta  a ocupação  da terra tradicional para que  sobre  ela  os  povos  tenham  direitos originários,  aplicando­se o ato  administrativo de  reconhecimento  da  área  ocupada  por  uma  comunidade  indígena  através  do  procedimento de demarcação.    Entretanto,  uma  das  ameaças  atuais  mais  explícitas  aos  direitos  territoriais  dos  povos  indígenas  refere­se  à  expansão  das  fronteiras  agrícolas  (agronegócio),  bem  como  as  ações  desenvolvimentistas  de  concentração  de  terras  e  exploração  74

dos  recursos  naturais ​ ,   tendo  em  vista  que  os  mesmos  comprometem  os  povos  originários  estabelecidos  em  território  brasileiro,  eis  que  apresentam­se  interesses  75

opostos em debate. Nesta perspectiva, Souza Filho ​  analisa que:    Além da  conjuntura política,  as disputas judiciais por terra  no Brasil continuam  fortemente  influenciadas  pelos  direitos  individuas estruturados  no  século XIX,  com   opção  preferencial  pela  propriedade  individual  da   terra.  O  caráter  individualista  e absoluto da  propriedade da  terra tem  sido o  traço distintivo do   direito ocidental e a matriz do direito civil latino­americano.  [...]  Com  o  advento  dos  direitos  coletivos,  ficou  mais  claro  que  a  terra  deve  cumprir  esse papel  social,  ou socioambiental,  de proteger  o  meio  ambiente e  as culturas  a  ela associadas.  Mas  a  exclusividade no domínio de um  território  é  o  marco   da  cultura  jurídica  latino­americana,  seja   do  ponto   de  vista  do  direito  público,  seja  do   ponto  de   vista  do  direito  privado,  aquele  disputando  69

  Constituição  de 1934:  “Art.  129.  Será respeitada  a posse de terras de silvícolas que nelas se achem  permanentemente localizados, sendo­lhes, no entanto, vedado aliená­las.”  70   Constituição  de 1937:  “Art.  154.  Será respeitado  aos  silvicolas  a posse das terras em que se achem  localizados em caráter permanentemente, sendo­lhes, porém, vedada a alienação das mesmas.”  71   Constituição   de  1946:   “Art.  216.  Será  respeitado  aos  silvícolas  a  posse  das  terras  onde  se  achem  permanentemente localizados, com a condição de não a transferirem.”  72   Constituição   de  1967:   “Art.  186.  É  assegurada  aos  silvícolas  a  posse  permanente  das  terras  que  habitam  e  reconhecido  o  seu  direito a  usufruto  exclusivo  dos  recursos naturais e todas as utilidades  nelas existentes.”  73   Constituição  de 1969:  “Art.  198.  As  terras habitadas  pelos silvícolas são inalienáveis nos termos  em  que  a lei federal determinar,  a eles  cabendo  a sua  posse  permanente e ficando reconhecido o seu  direito ao usufruto exclusivo das riquezas naturais e todas as utilidades nelas existentes.”  74   Souza Filho  explica  que: “mesmo em regiões  não  atingidas  pela fronteira  agrícola,  são  enormes os   interesses  econômicos  que  disputam  território  com  os  povos  indígenas:  maneira,  minérios,  combustíveis  fósseis,  vias  de   comunicação  férrea,  fluvial,   rodoviária  ou  até  mesmo  aérea,  com  a  instalação   de  aeroportos  na  selva”. (SOUZA  FILHO, Carlos  Frederico  Marés  de.  ​ O Renascer dos  Povos Indígenas para o Direito​ . 1. ed. 4. tir. Curitiba: Juruá, 2005. p.149).  75   SOUZA FILHO, Carlos  Frederico  Marés  de.  ​ O Renascer dos  Povos Indígenas para o Direito​ . 1.   ed. 4. tir. Curitiba: Juruá, 2005. p. 62. 

  soberanias   absolutas  e  detalhadamente  demarcadas,  inclusive  em  regiões  desconhecidas,  este  transformando  toda  terra  em  lotes  privados.  Por  isso,  apesar  das  mudanças  legais  introduzidas  pelas  constituições,  ainda  é muito  difícil  que  os  juízes  interpretem  as  leis  contra  interesses  da  propriedade  privada. 

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Conforme  Souza Filho ​ , o sistema jurídico vigente no Brasil reconhece a terra  indígena  como   “propriedade  da  União Federal, mas destinada  à  posse permanente  dos  índios,  a  quem  cabe  o  usufruto  exclusivo  das  riquezas  do  solo,  dos rios  e  dos  lagos  nelas  existentes”,  segundo seus  usos, costumes  e  tradições.  Em 1973,  com o  advento  do Estatuto  do  Índio (Lei 6.001), o seu artigo 65 já determinava que o Poder  Executivo  realizasse  a  demarcação  das  terras  indígenas  no  prazo  de  cinco  anos, o  que  não  ocorreu.  Posteriormente,  em  1988,  o  artigo  67  do  Ato  das  Disposições  Constitucionais   Transitórias  também  determinou  que  “a  União  concluirá  a  demarcação  das terras indígenas no prazo de cinco anos a partir da promulgação da  Constituição”, vencendo­se novamente este prazo.    Cumpre  observar  que  o  estudo  para  a  realização  da  demarcação  realizado  77

atualmente,  ocorre  de  acordo  com  o  que   dispõe  o  Decreto  n.º  1.775/96 ​ .  Primeiramente,  a  FUNAI  nomeia  um  antropólogo  para  elaborar  um  estudo  antropológico  de  identificação  da  terra   indígena  em  questão,   com  o  apoio  de  um  grupo  técnico  do  Órgão  indigenista,  para  posteriormente  ser  ​ apresentado  um  “relatório  circunstanciado  à  FUNAI,  do  qual  deverão   constar  elementos  e  dados  específicos  listados  na  Portaria  nº  14,  de  09/01/96”,  contendo  as  informações  da  terra indígena  a  ser  demarcada. Na  sequência, o relatório deverá ser aprovado pelo  presidente  da   FUNAI   no  prazo  de  quinze  dias,  publicando  o  seu  resumo no  Diário  Oficial  da  União  e  no Diário Oficial  da unidade federada correspondente, bem como  na  sede  da  prefeitura  local.  Em  seguida,  até  90  dias  após  as  publicações,  todo  interessado,  incluindo  estados  e municípios, poderá apresentar contestação, munida  de  provas  que   comprovem  direito  à  indenização  ou  vícios  existentes  no   relatório 

  SOUZA FILHO, Carlos  Frederico  Marés  de.  ​ O Renascer dos  Povos Indígenas para o Direito​ . 1.   ed. 4. tir. Curitiba: Juruá, 2005. p.121.  77   BRASIL. ​ Decreto  nº  1.775,  de 8  de janeiro de  1996. ​ Dispõe  sobre o procedimento administrativo  de  demarcação  das  terras  indígenas   e  dá  outras  providências.  Disponível  em:  . Acesso em: 05 set. 2015.  76

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apresentado ​ .  Respectivamente,  e  após  o  transcurso dos  90  dias,  a  FUNAI  terá  60  dias  para  elaborar  pareceres  fundamentando  as  razões  dos  interessados  e  encaminhando  o procedimento ao Ministro da Justiça, o qual terá o prazo de 30 dias  para:    (a)  expedir   portaria,  declarando   os  limites  da   área   e  determinando  a   sua   demarcação  física;  ou (b) prescrever  diligências a  serem  cumpridas  em  mais  90  dias;  ou  ainda,  (c)  desaprovar  a  identificação,  publicando  decisão  79 fundamentada no parágrafo 1º. do artigo 231 da Constituição.  

  Nesta sequência,  após a declaração  dos limites  da  área,  a FUNAI promove a   demarcação  física, enquanto o  INCRA  (Instituto Nacional de Colonização e Reforma  Agrária),  prioritariamente,  procederá  ao  reassentamento  de  ocupantes  que  eventualmente  não  sejam  índios.  A  homologação  da  demarcação  compete  ao  Presidente  da  República,  o  qual  procederá  mediante  decreto.  Por  fim,  a  terra  demarcada  e  homologada  será  registrada  em   até 30 dias após a  homologação,  no  cartório  de  imóveis  da  comarca  correspondente  e  na  Secretaria  de  Patrimônio  da  80

União (SPU).     81

Eliane Brum ​  quando se refere à concentração de terras, explica que:    Segundo  o  Censo de 2010 do IBGE, há 517  mil índios aldeados  em menos de  107   milhões  de   hectares  de  terras  indígenas,  o  equivalente  a  12,5%  do  território  brasileiro.  E  onde  estão  essas  terras? Mais  de 98% delas estão na  Amazônia  Legal  –  e  menos  de   2%  fora  de  lá.  Já  os  46  mil  maiores  proprietários  de  terras,   segundo  o  Censo  Agropecuário   do  IBGE,  exploram  uma área maior do que essa: mais de 144 milhões de hectares.  Sobre a realidade  da concentração fundiária no  país,  que  continua a crescer,  o  Cadastro  de  Imóveis  Rurais  do  Incra  (Instituto  Nacional   de  Colonização  e  Reforma  Agrária)  mostra  que   as  130  mil   grandes   propriedades  rurais  particulares  concentram  quase   50%   de  toda  a   área   privada  cadastrada   no    POVOS  INDÍGENAS  NO  BRASIL.  ​ Como  é  feita  a  demarcação  hoje?  ​ Disponível  em:  .  Acesso em: 05 set. 2015.  79   POVOS  INDÍGENAS  NO  BRASIL.  ​ Como  é  feita  a  demarcação  hoje?  ​ Disponível  em:  .  Acesso em: 05 set. 2015.  80   POVOS  INDÍGENAS  NO  BRASIL.  ​ Como  é  feita  a  demarcação  hoje?  ​ Disponível  em:  .  Acesso em: 05 set. 2015.  81   BRUM, Eliane. Os  índios e  os golpes na Constituição. El País,  Madrid, 13 abr. 2015. Disponível em:  .  Acesso  em:  05  set.  2015.   78

  Incra.   Já  os quase  quatro  milhões  de  minifúndios  equivalem,  somados,  a um  quinto  disso:  10%  da área total  registrada. ​ Em entrevista ao jornal O Globo, o  pesquisador  Ariovaldo  Umbelino  de  Oliveira,  coordenador  do  Atlas  da Terra,   afirmou que quase 176 milhões de hectares são improdutivos no Brasil.   [...]  Num  país  com   essa  quantidade  de  terras  destinada  à  agropecuária   e  com  essa  concentração   de  terras  na  mão  de  poucos, afirmar  que  o  problema  do  desenvolvimento  são  os  povos indígenas  só  não é mais  ridículo do que Kátia  Abreu,  a   latifundiária  que  diz  não  existir  mais  latifúndio  no  Brasil  e  hoje  ministra   da  Agricultura,  afirmar  que  “o  problema   é  que   os  índios  saíram  da  floresta e passaram a descer na área de produção. 

  Portanto,  é  possível  se  observar  o  desenrolar  de  diversos  conflitos  entre  comunidades  indígenas  e  fazendeiros,  o  que  por  vezes  ocasiona  a  morte  de  integrantes  do  movimento  indígena,  como  visto  recentemente  no  Mato  Grosso  do  82

Sul ​ ,  consequência  da  disputa  por  terras  entre  fazendeiros  e  índios   da  etnia  Guarani­Kaiowá.  Nesta  sequência,  ressurge  com  força  o  debate  referente  à  Proposta  de Emenda  à  Constituição  215  (PEC  215), a qual acrescenta  ao  artigo  49  da  Constituição  Federal  o  inciso  XVIII,  a  fim  de  tornar  competência  exclusiva  do  Congresso  Nacional  “aprovar  a  demarcação  das  terras  tradicionalmente  ocupadas  pelos  índios  e ratificar  as  demarcações  já homologadas”. Modifica, também, o artigo  231 da  Constituição Federal,  em  seu  §4º,  o  qual  disporá  que “​ as terras de que trata  este  artigo,  após  a  respectiva  demarcação  aprovada  ou  ratificada  pelo  Congresso  Nacional,  são   inalienáveis  e  indisponíveis,  e  os  direitos  sobre  elas imprescritíveis”.  Igualmente,  altera  o  §8º  do  referido  artigo,  estabelecendo  que  “os  critérios  e  procedimentos  de  demarcação  das  Áreas  Indígenas  deverão  ser  regulamentados  83

por lei.” ​ .    Ressalta­se,  por  fim,  que   demarcar  as  terras  indígenas  é  uma  forma  de  contribuir  para  a  preservação  do  meio  ambiente  e  da  biodiversidade  presente  em 

  P ​ara  mais detalhes  acessar:  BEDINELLI,  Talita. Foi uma  guerra,  um  massacre. ​ El País, ​ Madrid, 05  set.  2015.  Disponível  em:  . ​ Acesso em: 07 set. 2015.  83   BRASIL.  Congresso  Nacional.  Comissão  de  Constituição  e  Justiça  e  de  Cidadania.  ​ Proposta  de   Emenda  à  Constituição  nº  215,  de  2000. ​ Acrescenta o  inciso  XVIII  ao art. 49; modifica  o  § 4º e  acrescenta   o  §  8º  ambos  no   art.  231  da  Constituição Federal. Autor:  Deputado Almir  Sá  e  outros;  Relator:   Deputado  Osmar  Serraglio.   Disponível  em:  . Acesso em: 10 out. 2015.  82

 

território brasileiro,  e  colabora  “[...]para a construção  de uma sociedade que valoriza  84

a identidade étnica e cultural dos seus povos” ​ .    2.2 O DIREITO À AUTODETERMINAÇÃO DOS POVOS INDÍGENAS    Historicamente,  é  possível  observar  que  a  autodeterminação  teve  o  seu  apogeu  após a Segunda Guerra Mundial, mais especificamente entre os períodos de  1945  e  1980,  “no  bojo  do  processo  de  descolonização  que  culminou  com  a  derrocada  de  regimes  coloniais  e  o  surgimento  de  novos  Estados  a  partir  dos  85

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antigos povos  subjugados  na  África,  na  Ásia  e  na Oceania” ​ . Albuquerque  explica  que:    A  autodeterminação  consiste  em  um   direito  enquanto  conjunto  de  regras,  normas,  padrões  e  leis  reconhecidas  socialmente  que  garantem  a  determinados  povos,  segmentos  ou  grupos  sociais   o  poder  de   decidir  seu  próprio  modo  de  ser,  viver   e  organizar­se  política,  econômica,  social   e  culturalmente,  sem  serem  subjugados  ou  dominados  por  outros  grupos,  segmentos, classes sociais ou povos estranhos à sua formação específica.  

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Souza  Filho   refere que a política integracionista contemporânea encontra­se  assentada  no  constitucionalismo  dos  estados  modernos,  livres  e  soberanos,  garantidores  de  direitos  individuais  e  da  consequente  população  estabelecida  em  solo  pátrio. Logo, as minorias  étnicas encontradas  neste  mesmo território passaram   a  ser  oprimidas,  ter  direitos  suprimidos  ou,  junto  a  isto,  sofreram  investidas  que  causaram  graves  violações,  como  é  o  caso  brasileiro  da  construção  da  Usina  Hidrelétrica  de  Belo  Monte  que,  além  de  causar  impactos  catastróficos  às  comunidades  indígenas dependentes  do Rio Xingu, também acabou por prejudicar a  vida de inúmeras famílias de ribeirinhos que retiravam dali o sustento familiar.     BANDEIRA,  Marcela.  ​ A   demarcação  de  terras  indígenas  no  Pará  é  fundamental  para  a   proteção  da  Amazônia​ .  Manaus,  06  nov.  2014.  Disponível   em:  .  Acesso em: 14 set. 2015.  85   ​ ANJOS  FILHO,  Robério  Nunes  dos.  O  direito  à  autodeterminação  dos  povos  indígenas:  entre  a  secessão  e  o  autogoverno.  In:  ANJOS  FILHO,  Robério  Nunes  dos  (Org.).   ​ Direitos  Humanos  e  Direitos Fundamentais​ : diálogos contemporâneos. Salvador: JusPodivm, 2013.​  p. 589.  86   ALBUQUERQUE,  Antonio  Armando  Ulian  do  Lago.  ​ Multiculturalismo  e   direito  à  autodeterminação dos povos indígenas​ . Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2008. p. 148.  87   SOUZA FILHO, Carlos  Frederico  Marés  de.  ​ O Renascer dos  Povos Indígenas para o Direito​ . 1.   ed. 4. tir. Curitiba: Juruá, 2005. p. 77.  84

 

  Importante  frisar  que, apesar de exposta na Convenção 169 da OIT, da qual o  Brasil  é  signatário,  ​ a  população  indígena  reivindicava  a  consulta  que  deveria  ser  realizada  junto  às  comunidades  ali  estabelecidas,  tendo  em  vista  que estes  seriam  os  impactados  diretos  pelas  obras.  Respeitaria­se,  portanto,  o  direito  à  autodeterminação destes​ , estabelecida  pela Convenção supra referida, no entanto, a  88

consulta não ocorreu ​ .    Compactua­se  com  as  violações  sofridas  pelos  povos  indígenas,  quando  contribuímos  com  o  silenciamento  destes,  visando  apenas  a  perpetuação  das  nossas  vozes  e  dos  nossos  privilégios,  enquanto  reféns  da  cultura  dominante  homogênea,  a  qual,  por  não  compreender  a  diferença  do  outro,  a  inferioriza.  A  identidade  nacional,  portanto,  não  deixou  espaço  de  reconhecimento  às  culturas  diferentes, às identidades  étnicas  que não fossem a predominante. Silenciosamente  convivemos  com  estas  identidades,  sabemos  que elas  existem  mas não  as  vemos,  as  utilizamos  como  alegorias,  como  parte  da  história   que  talvez  nos  lembre,  como  fruto de nossa ignorância, o quanto “evoluímos”.    89

Anaya ​  esclarece que:    [...]  embora  vários  Estados  tenham  resistido   ao  uso  expresso  do  termo  autodeterminação  em  associação a povos indígenas, é possível ver, além das  sensibilidades retóricas,  um  consenso de  opinião  amplamente compartilhado.  Tal  consenso  se  encontra  na  visão de  que os povos  indígenas têm  direito a  continuar  a existir como  grupos  distintos e, portanto, a ter controle sobre seus  próprios destinos  em  condição  de igualdade. Este princípio possui implicação  em  qualquer decisão  que  possa afetar  os interesses de  um  grupo indígena, e   traz consigo os contornos gerais de normas a ele relacionadas. 

  Diferentemente  do  que  estabelece  a  autodeterminação  desenvolvida  pelo  direito  internacional,  assentada  no  direito  de  um  povo  se  constituir  em  Estado,  e    ÍNDIOS  afetados  por  hidrelétricas:  três  processos  judiciais, nenhuma  consulta.  ​ Movimento  Xingu   Vivo  para  Sempre,  04  ​ jun.  2013.  Disponível   em:  . Acesso em: 05 set. 2015.  89   ANAYA,  S.  James.  Os  direitos  humanos  dos  povos   indígenas.   In:  ARAÚJO,  Ana  Valéria  (Org).  Povos  Indígenas  e  a  Lei  do   “Brancos”:  o  direito  à   diferença.  Brasília,   DF:   Ministério  da  Educação, 2006. p.191.  88

 

internamente  vertida  em  soberania,  a  autodeterminação  dos  povos  indígenas  refere­se  a  autoestima  destas  comunidades.  Observando­se  que  eles  possuem  regras  de  convivência social singulares,  as  quais, consequentemente, diferem muito  90

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das normas estatais vigentes ​ . Quanto à autodeterminação, explica Souza Filho ​ :    Quando  dito  a  partir  das organizações internacionais  estatais, significa o povo  do  Estado,   considerado,  apesar  das diferenças,  como  um  só.  Quando dito a  partir  do  próprio   povo,  antropologicamente   falando,  diz  respeito  à  vontade  coletiva de um grupo socialmente organizado. 

  Cumpre frisar  que  os  direitos coletivos dos povos  indígenas ficam  limitados a  um  território,  objetivando­se  que  o  sistema  os  localize, excluindo­se, portanto, deste  92

reconhecimento,  os  povos  que  extrapolam  um  espaço  territorial  determinado ​ .  93

Nesta  perspectiva,  ​ Catafesto  Souza ​ ,  refere  a  condição  dos  Mbyá­Guarani,  os  quais,  conforme  o  autor,  foram  “relegados  à  condição  de  apátridas”  por circularem   por  todos  os  países  do  Mercosul  e,  no  Brasil,  serem  relegados  à  condição  de  “estrangeiros”,  ocorrendo  poucos avanços  no  reconhecimento  desta etnia quanto ao  direito à mobilidade.    94

Anjos  Filho  observa que uma importante referência foi trazida pela Carta das  Nações  Unidas,   a  qual  expressamente  estipulou  o  respeito  ao  princípio  da  95

autodeterminação,  em  seu artigo 1º ​ , bem como  a Declaração Sobre a  Concessão    SOUZA  FILHO,  Carlos  Frederico  Marés  de.  ​ O  renascer  dos  povos  indígenas  para   o  direito​ .  1.ed., 4. tir. Curitiba: Juruá, 2005. p. 78  91   SOUZA  FILHO,  Carlos  Frederico  Marés  de.  ​ O  renascer  dos  povos  indígenas  para   o  direito​ .  1.ed., 4. tir. Curitiba: Juruá, 2005. p. 80.  92   SOUZA  FILHO,  Carlos  Frederico  Marés  de.  Multiculturalismo  e  direitos  coletivos.  In:  SANTOS,  Boaventura  de  Souza  (Org.).  ​ Reconhecer  para  libertar​ :  os  caminhos  do  cosmopolitismo  multicultural. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. p. 93.  93   SOUZA,  José Otávio  Catafesto  de.  ​ Os Mbyá­Guarani e os Impasses  das Políticas Indigenistas  no  sul   do  Brasil​ .  Buenos   Aires,  out.  2009.  Disponível  em:  . Acesso em: 10 set. 2015.  94   ​ ANJOS  FILHO,  Robério  Nunes  dos.  O  direito  à  autodeterminação  dos  povos  indígenas:  entre  a  secessão  e  o  autogoverno.  In:  ANJOS  FILHO,  Robério  Nunes  dos  (Org.).   ​ Direitos  Humanos  e  Direitos Fundamentais​ : diálogos contemporâneos. Salvador: JusPodivm, 2013. p.589­590.  95   Carta  das  Nações  Unidas,  “Artigo  1  –  Os  propósitos  das  Nações  Unidas  são:  [...]  2.  Desenvolver  relações  amistosas entre  as nações,  baseadas no respeito ao princípio de igualdade de  direitos e de  autodeterminação  dos  povos,  e   tomar  outras  medidas  apropriadas  ao  fortalecimento  da  paz  universal;”  (ORGANIZAÇÃO  DAS  NAÇÕES  UNIDAS  ­  ONU.  ​ Carta  das  Nações  Unidas.   ​ São  Francisco,  26  jun.  1945.  Disponível   em:  .  Acesso   em: 10 out. 2015).   90

 

de  Independência  aos  Países  e  Povos  Coloniais  da  Assembléia  Geral  da  ONU,  de  96

1960 ​ .  O  Direito  à  autodeterminação  também   foi  respeitado  pelos  Pactos  97

Internacionais  de  Direitos  Humanos  de  1966 ​ .  Neste  mesmo  sentido,  o  autor  supracitado estabelece que conforme a autodeterminação:    [...]  um  povo  não  está   submetido   à  vontade  de   outro  povo,  assumindo  as   rédeas  do  seu  próprio  destino.  A  liberdade,  neste  contexto  de  autodeterminação, não  se  refere  diretamente aos indivíduos considerados  em   si  mesmos,  mas  sim  à  coletividade  política  formada  pelo  conjunto  de  todos  eles [...]. 

  O  direito  à  autodeterminação  também  foi encontrado na Declaração  Sobre  o  Direito  ao  Desenvolvimento, adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em  98

1986,  através   da  Resolução  41/133 ​ ,  a  qual  previa  que  o  direito  humano  ao  desenvolvimento  deveria  respeitar  a  autodeterminação  dos  povos,  bem  como  a  99

soberania  sobre  todas  as  riquezas  e  recursos  naturais ​ ,  e,  ainda,  tomar  medidas  96

  1.  A   sujeição  dos  povos  a  uma  subjugação,  dominação  e  exploração  constitui   uma  negação  dos  direitos  humanos  fundamentais,  é  contrária à  Carta das Nações Unidas  e compromete a  causa da  paz  e  da  cooperação   mundial;  2.   Todos  os  povos  tem  o  direito  de livre determinação;  em  virtude  desse  direito,  determinam  livremente  sua  condição  política   e  perseguem  livremente  seu  desenvolvimento   econômico,  social  e   cultural.  (ORGANIZAÇÃO  DAS  NAÇÕES  UNIDAS  –  ONU.  Declaração  sobre  a concessão de  independência aos  Países e  Povos  Coloniais. ​ Resolução  n.  1514,  de  14  de  dezembro   1960.  Disponível  em:  . Acesso em: 12 set. 2015).  97   Assim  estabelecem  o  ​ Pacto   Internacional  de  Direitos   Civis  e  Políticos  e  o   Pacto  Internacional  de  Direitos  Econômicos,  Sociais  e  Culturais,  os  quais, expressamente reconhecerem em seu primeiro  artigo   que  “todos  os  povos  têm  direito  a  autodeterminação.  Em  virtude  desse  direito, determinam  livremente  seu  estatuto  político  e   asseguram  livremente  seu desenvolvimento  econômico, social  e  cultural.”  (BRASIL.  ​ Decreto  nº  591,  de  06  de   julho  de  1992.  ​ Atos  Internacionais.  Pacto  Internacional  sobre  Direitos  Econômicos,  Sociais  e   Culturais.  Promulgação.  Disponível  em:  .  Acesso  em:  15   set.  2015;  BRASIL.  ​ Decreto  nº  592,  de 06 de  julho  de 1992. ​ Atos  Internacionais. Pacto Internacional  sobre  Direitos  Civis  e  Políticos.  Promulgação.  Disponível  em:  .​  Acesso em: 15 set. 2015).  98   ORGANIZAÇÃO  DAS  NAÇÕES  UNIDAS  –  ONU.   ​ Declaração  sobre  o  Direito  ao  Desenvolviemento.  ​ Genebra,  04  dez.  1986.  Disponível  em:   . Acesso em: 18 set. 2015.  99   Artigo  1º,   §  2º  “Para   a  consecução  de seus  objetivos, todos os  povos  podem dispor  livremente  se  suas  riquezas  e de  seus recursos  naturais, sem prejuízo das obrigações decorrentes da cooperação  econômica  internacional,  baseada  no   princípio  do  proveito  mútuo,  e  do  Direito  Internacional.  Em  caso  algum,  poderá um povo ser privado de seus meios  de subsistência.” (BRASIL. ​ Decreto nº 591,  de   06  de  julho  de  1992.  ​ Atos  Internacionais.  Pacto  Internacional  sobre  Direitos  Econômicos,  Sociais  e  Culturais.  Promulgação.  Disponível  em:  .  Acesso  em:  15   set.  2015;  BRASIL.  ​ Decreto  nº  592,  de 06 de  julho  de 1992. ​ Atos  Internacionais. Pacto Internacional  sobre  Direitos  Civis  e  Políticos.  Promulgação.  Disponível  em:  .​  Acesso em: 15 set. 2015). 

 

firmes  quanto  às  recusas  de  reconhecimento  do  direito  fundamental  dos  povos  à  100 ​

autodeterminação



  A  Declaração  das  Nações  Unidas  sobre  o  Direito  dos  Povos  Indígenas,  adotada  pela  Assembléia  Geral  em  13  de  setembro  de  2007,  em  seu  artigo  2º,   reconheceu  que  “os  povos  indígenas  [...]  têm  o  direito  de não  serem  submetidos a  nenhuma forma de  discriminação  no  exercício  de seus direitos, que  esteja  fundada,  em  particular,  em  sua   origem  ou  identidade  indígena.”.  Em  seu  artigo  3º  a  referida  Declaração  expõe  que:  “Os  povos  indígenas  têm  direito  à  autodeterminação”.  Em  virtude  desse  direito,  determinam  livremente  sua  condição  política  e  buscam  livremente  o  seu   desenvolvimento  econômico,  social  e  cultural.  Já  o  artigo  4º  estipula  que  os  indígenas  “no  exercício  do  seu  direito  à  autodeterminação,  têm  direito  à  autonomia  ou  ao autogoverno nas questões  relacionadas  a  seus assuntos  internos  e  locais,  assim  como  a  disporem  dos  meios  para  financiar  suas  funções  autônomas.”    A  Convenção  169  da  Organização  Internacional  do  Trabalho  (OIT)  sobre  Povos  Indígenas  e  Tribais,  promulgada  pelo Brasil através  do  Decreto  nº 5.051,  de  101 ​

19  de  abril  de  2004

,  deixa  claro  o  dever   de  o  país  preservar  a  integridade  dos 

povos  indígenas,  bem  como  o  respeito  a   sua  identidade  social  e  cultural e  o  pleno  gozo  dos  direitos  humanos  e  liberdades  fundamentais.  Neste  sentido,  o  Decreto  estabelece,  inclusive  e  fundamentalmente,  o  direito  que  estes  povos  possuem  de  100

  Artigo  5º,   “1.  Nenhuma  das  disposições  do  presente  Pacto  poderá  ser  interpretada  no sentido  de  reconhecer a um Estado, grupo ou indivíduo qualquer direito de dedicar­se a  quaisquer atividades ou  de  praticar  quaisquer  atos  que  tenham  por  objetivo  destruir  os  direitos  ou  liberdades  reconhecidos  no  presente  Pacto  ou  impor­lhe  limitações  mais  amplas  do   que  aquelas nele  previstas. 2. Não se  admitirá  qualquer  restrição  ou  suspensão  dos  direitos  humanos  fundamentais  reconhecidos  ou  vigentes  em  qualquer  país em virtude de  leis, convenções, regulamentos ou  costumes, sob pretexto  de  que  o  presente Pacto  não os reconheça ou os  reconheça em menor grau.” (​ BRASIL. ​ Decreto nº  591,  de  06  de julho de  1992. ​ Atos Internacionais.  Pacto  Internacional sobre  Direitos  Econômicos,  Sociais  e  Culturais.  Promulgação.  Disponível  em:  .  Acesso  em:  15   set.  2015;  BRASIL.  ​ Decreto  nº  592,  de 06 de  julho  de 1992. ​ Atos  Internacionais. Pacto Internacional  sobre  Direitos  Civis  e  Políticos.  Promulgação.  Disponível  em:  .​  Acesso em: 15 set. 2015​ ).  101  ​   BRASIL. ​ Decreto  nº  5.051,  de 19 de abril de 2004.  ​ Promulga a Convenção no​ 169  da Organização  Internacional  do  Trabalho  ­   OIT  sobre  Povos  Indígenas  e  Tribais.  Disponível  em:  .  Acesso  em:  08  set.  2015.  

 

consulta  quanto  às  “medidas  legislativas  ou  administrativas  suscetíveis  de  afetá­los  diretamente”

102

  art.  6º,  a,  “[...]  deverão  ter   o  direito  de  escolher  suas  próprias 

prioridades  no  que diz  respeito  ao processo de desenvolvimento, na medida em que  ele  afete  as  suas  vidas  [...]”

103

  assim  como,  poderão  participar  da  avaliação  de 

planos  e  programas de  desenvolvimento  a  nível  regional  e nacional  que  possam  vir  a afetá­los diretamente (art. 7º,1).

104

 

  Primordial  é a análise  das Diretrizes Sobre os Assuntos dos Povos Indígenas,  105 ​

realizado  pelo  Grupo das  Nações Unidas  para o Desenvolvimento

, o qual além de 

reconhecer  o  princípio  da   autodeterminação,  reconhece  também  o  livre,  prévio  e  informado  consentimento  dos  “​ pueblos  tribales​ ”.  Seguindo  esta  mesma  lógica,  a  Organização  dos   Estados  Americanos  está  confeccionando  a  sua  respectiva  Declaração de Direitos dos Povos Indígenas

106 ​



  Nesta  perspectiva,  cumpre  aos  Estados  aplicar,  de  fato,  o  que  dispõe  os  principais documentos que  corroboram  com  o  direito  à autodeterminação dos povos  indígenas, de modo que  estes exerçam  seus direitos constitucionais com autonomia  107

acerca  dos  assuntos  que  possam  vir  a  afetá­los  diretamente.  Anjos  Filho

 

esclarece:   

 ​ ANJOS  FILHO,  Robério  Nunes  dos.  O  direito  à  autodeterminação  dos  povos  indígenas:  entre  a  secessão  e  o  autogoverno.  In:  ANJOS  FILHO,  Robério  Nunes  dos  (Org.).   ​ Direitos  Humanos  e  Direitos Fundamentais​ : diálogos contemporâneos. Salvador: JusPodivm, 2013​ .  103  ​   BRASIL. ​ Decreto  nº  5.051,  de 19 de abril de 2004.  ​ Promulga a Convenção no​ 169  da Organização  Internacional  do  Trabalho  ­   OIT  sobre  Povos  Indígenas  e  Tribais.  Disponível  em:  .  Acesso  em:  08  set.  2015.   104  ​   BRASIL. ​ Decreto  nº  5.051,  de 19 de abril de 2004.  ​ Promulga a Convenção no​ 169  da Organização  Internacional  do  Trabalho  ­   OIT  sobre  Povos  Indígenas  e  Tribais.  Disponível  em:  .  Acesso  em:  08  set.  2015.   105   ORGANIZAÇÃO  DAS NAÇÕES UNIDAS –  ONU.  ​ Directrices  sobre los Asuntos de los Pueblos  Indígenas​ .  Aprovado  em   01  de  fevereiro  de  2008.  Disponível em:  . Acesso em: 15 set. 2015.  106   COMISSÃO  INTERAMERICANA  DE  DIREITOS  HUMANOS.  ​ Projeto  de  Declaração  Americana  sobre  os  Direitos  dos  Povos  Indígenas.  ​ 26   fev.  1997.  Disponível  em:  . Acesso em : 15 set. 2015.  107  ​ ANJOS  FILHO,  Robério  Nunes  dos.  O  direito  à  autodeterminação  dos  povos  indígenas:  entre  a  secessão  e  o  autogoverno.  In:  ANJOS  FILHO,  Robério  Nunes  dos  (Org.).   ​ Direitos  Humanos  e  Direitos Fundamentais​ : diálogos contemporâneos. Salvador: JusPodivm, 2013​ . p.619.  102

  [...]  parece  não  haver  dúvida  de  que  no  presente   momento  o  sistema  internacional  de  direitos  humanos,  construído  a  partir  dos  esforços  da  Organização das Nações Unidas, não  admite  como regra geral  a possibilidade  de  secessão  dos  povos  com  base no  direito à autodeterminação,  priorizando  a  integridade   dos   Estados  nos  quais   estão  inseridos,  o  que  pode  ser  excepcionado apenas em raras situações.  

  A  crítica  realizada  aos  órgãos  oficiais,  nacionais  ou  internacionais,  e  os  instrumentos  de  proteção  dos  direitos  humanos,  no  entanto,  é  que   estes  acabam  sendo  enfraquecidos  ou  colocados  em  segundo  plano  quando  imbuídos  por  interesses  dominados  pela  política  hegemônica  globalizada. Direitos  subsumidos, e  não apenas dos povos indígenas,  estabelecidos em um modelo neoliberal de direitos  humanos  e  democracia,  como  os  hoje  existentes,  necessitam,  no  mínimo,  ser  revistos, 

como 

forma 

de 

evitarmos 



reprodução 

de 

verdadeiros 

etnocídios/genocídios.  É  neste  sentido  que  nasce  a  teoria  crítica  dos  direitos  humanos,  em  que  a  lógica  mercadológica  imbricada  na  sociedade  moderna,  108

encontra nas lutas sociais uma reconfiguração destes direitos. Para Herrera Flores :   

[...]  el  sistema  de  valores  hegemónico  en nuestros  días  es mayoritariamente  neoliberal, y,  por consiguiente, pone por encima a las libertades funcionales al  mercado  y  por debajo a  las políticas públicas de  igualdad social,  económica y  cultural.  

  Aparício

109

  explica   que  através  da  perspectiva  crítica  e  emancipatória  no 

quadro de direitos humanos, projetamos essas diversas lutas sociais (principalmente  de  índios,  mulheres  e  negros)  em  um  espaço  democrático  participativo  e  plural,  o  que resultaria,  portanto,  no empoderamento  destes “novos sujeitos”  frente ao direito  internacional.  Trata­se  de,  no  plano  internacional,  transpormos  o  universalismo  cultural,  ainda  que  este  apresente  valores e preocupações  universais, para que, de  fato, se estabelece um diálogo intercultural.      HERRERA   FLORES,  Joaquín.  ​ La  Reinvención  de  los  Derechos  Humanos.  Andalucía:  Astrasueños,  [2005].  p.  36.   Disponível  em:  . Acesso em: 08 jul. 2015.   109   APARÍCIO, Adriana  Biller.  A reinvenção  dos  direitos  territoriais  indígenas:  na trilha da Teoria Crítica  dos  Direitos  Humanos  como  “Motor”  do Pluralismo  Jurídico. In:  BECKER,  Simone; BRITO,  Antonio  Guimaraes;  OLIVEIRA, Jorge Eremites  de. ​ Estudos de Antropologia Jurídica na América Latina  Indígena.​  1.ed. Curitiba: CRV, 2012. p.242.  108

 

Por  fim,  cumpre  esclarecer  que  a  secessão,  principal  motivo  de  recusa  ao  reconhecimento  da  autodeterminação  por  parte  dos  Estados,  apenas se justificaria  em  caso  de explícita  violação  aos  valores democráticos de igualdade  e de respeito,  110 ​

ou  em  caso  de  recente  colonialismo  ou  ocupação  estrangeira

.  Prioriza­se, 

portanto,  a  integridade  dos  Estados  em  que  estes  povos  se  encontram,  reconhecendo­se o direito  à  autoadministração dessas  populações e a consequente  manutenção  da  sua  identidade   cultural  e  territorial.  Neste  sentido,  importante  ressaltar  que  o  Programa  das  Nações  Unidas  para  o  Desenvolvimento,  fortalece  a  ideia  de  que  a  concessão  de  autonomia  aos  povos  indígenas  torna­se  um  fator  positivo, inclusive  evitando a  ruptura  destas populações com o Estado em que estão  111 ​

inseridas



  3 DIREITOS INDÍGENAS NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988    A  partir  de  1980   verifica­se  que  os  direitos  dos  índios  passaram  a  ser  introduzidos  por  várias  constituições latino­americanas,  logo,  foram promulgadas  as  constituições  do  Panamá  e  do  Equador,   ambas  de  1983,  sendo  que  o  Equador  promulgou  uma  das  mais  avançadas  Constituições  no  tocante  aos  direitos  das  112 ​

comunidades  tradicionais,  em  2008

.  Na  sequência,  a  Guatemala,  em  1985;  a  113 ​

Nicarágua,  em  1987  e  o  Brasil,  em  1988

.  A  partir  de  1990  novas  constituições 

entraram  em  vigor  ou  foram  revisadas,  tais  como  a  Constituição   da  Colômbia,  em  1991;  do Paraguai,  em 1992; do Peru, em 1993; Argentina e Bolívia, ambas de 1994  e  Venezuela,  em  1999

114 ​

.  Cumpre  ressaltar  a  importância  das  Constituições  do 

115 ​

Equador  e  da  Bolívia

, a última  promulgada em  2007,  tendo  em  vista que elas são 

 ​ ANJOS  FILHO,  Robério  Nunes  dos.  O  direito  à  autodeterminação  dos  povos  indígenas:  entre  a  secessão  e  o  autogoverno.  In:  ANJOS  FILHO,  Robério  Nunes  dos  (Org.).   ​ Direitos  Humanos  e  Direitos Fundamentais​ : diálogos contemporâneos. Salvador: JusPodivm, 2013. p. 596.  111   Ibidem.  112   ECUADOR.  ​ Constitución  de  la  República  del  Ecuador.  ​ Disponível  em:  . Acesso em: 06 out. 2015.  113   KAYSER,  Hartmut­Emanuel.  ​ Os  direitos  dos  povos  indígenas  do  Brasil​ :  desenvolvimento  histórico e estágio atual. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2010. p.218.  114   Ibidem, p.218.  115   BOLÍVIA.  ​ Constitución  Politica  del  Estado,  24  de  noviembre  de  2007.  ​ Disponível  em:  . Acesso em: 06 out. 2015.  110

 

referências  no  respeito  aos  direitos  dos  povos  originários  na  atualidade,  principalmente  no  tocante  à  consulta  prévia,  em  consonância  com  o  que  dispõe  a  116 ​

Convenção 169 da OIT



  À  vista  disso,  a  promulgação  da  atual  Constituição  Federal,  ocorrida  em  05/10/1988,  representou  um  verdadeiro  marco  no  que  diz  respeito  ao  relacionamento  do  Estado  com  os  povos  indígenas  encontrados  no  Brasil,  bem  como  efetivou  o  reconhecimento  de  pontos  fundamentais  no  tocante  aos  direitos  pertencentes aos índios. Lacerda

117 ​

 refere brilhantemente que: 

  Na  Constituição  Federal  de  1988  os  povos  indígenas,  bem  como  outras  formas  de  identidade  coletiva  de  base  étnico­cultural,  obtiveram   amparo  e  visibilidade.  Ali,  pela  primeira  vez  mencionava­se  a  existência  de  comunidades  quilombolas,  momento   em   que  se  lhes  reconhecia  a  propriedade  definitiva  de  suas  terras (terras  de quilombos),  determinando­se  ao  Estado a  obrigação  de “emitir­lhes os títulos respectivos” (art.  68 – Ato das  Disposições  Constitucionais  Transitórias).  Ao  mesmo  tempo,  determinava­se  também,   em  caráter  obrigatório,  a  abertura  do  ensino   de  História  do   Brasil  para  as contribuições  das  “diferentes culturas  e  etnias” na “formação do povo  brasileiro” (art. 242, § 1.º ­ Ato das Disposições Constitucionais Gerais). 

  Desta  forma,  a  partir  desta  evolução  constitucionalista  desencadeada   na  América  Latina,  constata­se  que  o  texto  constitucional  brasileiro  superou  a  118

concepção  assimilacionista

  presente  na  legislação  anterior,  reconhecendo  aos 

índios,  em  seu  capítulo  VIII,  conforme  depreende­se  do  artigo  231  (e  seus  respectivos  parágrafos)  e  do  artigo  232,  fundamentalmente,  o  reconhecimento  das  terras  tradicionais  que  ocupam  permanentemente,  o  direito  a  serem  diferentes,  119 ​

preservando  suas  crenças,  tradições,  costumes,  línguas  e  organização  social



  LACERDA,  Rosane  Ferreira.  ​ “Volveré,  y  Seré  Millones”​ :  Contribuições  Descoloniais   dos   Movimentos  Indígenas  Latino   Americanos  para  a  Superação  do  Mito  do  Estado­Nação.  2014.  2v,  491f.  Tese  (Doutorado)  ­   ​ Universidade  de  Brasília  –  UnB.  Faculdade  de  Direito.  Área  de   Concentração:   Direito,  Estado  e  Constituição,   Brasília,   2014.  p.  392.  Disponível  em:   . Acesso em: 02 out. 2015.  117   LACERDA,  Rosane  Ferreira.  ​ “Volveré,  y  Seré  Millones”​ :  Contribuições  Descoloniais   dos   Movimentos  Indígenas  Latino   Americanos  para  a  Superação  do  Mito  do  Estado­Nação.  2014.  2v,  491f.  Tese  (Doutorado)  ­   ​ Universidade  de  Brasília  –  UnB.  Faculdade  de  Direito.  Área  de   Concentração:   Direito,  Estado  e  Constituição,   Brasília,   2014.  p.  371.  Disponível  em:   . Acesso em: 02 out. 2015.  118   SOUZA FILHO, Carlos  Frederico  Marés  de.  ​ O Renascer dos  Povos Indígenas para o Direito​ . 1.   ed. 4. tir. Curitiba: Juruá, 2005. p.107.  119   A  Constituição  Federal,  em  seu artigo  231, dispõe: “São  reconhecidos  aos  índios  sua  organização  social,  costumes,  línguas,  crenças  e  tradições,  e  os  direitos   originários   sobre  as  terras  que  116

  120

entre  outros.  Batista

  refere  que tais mudanças  influenciaram o reconhecimento de 

um  estado  multicultural,  em  que  foram  estabelecidas  medidas  de  “proteção  às   culturas  indígenas  como  realidades  dotadas  de  peculiaridades  específicas  em  relação  à  sociedade  como  um  todo”.  Souza

121

  acrescenta,  também,  que  com  o 

advento  da  Constituição  de  1988,  os   nativos  passaram  “a  ser  respeitados  como  agentes  de  seu  próprio  destino,  estando  baseada  juridicamente  sua  vontade  de  manutenção enquanto comunidade diferenciada no seio da sociedade nacional”.    Nesta  perspectiva,  ainda  foi  consagrado  o  entendimento  no  qual  as  terras  122

ocupadas  pelos  índios  são  bens da União

  e  não  sujeitam­se à categoria de  bens 

públicos, posto que são inalienáveis. As  terras, portanto, são também indisponíveis e  os  direitos  sobre   elas  são  imprescritíveis

123 ​

.  O  controle  exercido  pela  União,  neste 

sentido,  tem  o  intuito  voltado  para  a  preservação  da  área  em  que  assentada  a  comunidade  indígena,  competindo  aos  índios,  além  da  posse  permanente,  o  124 ​

usufruto  exclusivo  das  riquezas  do  solo,  dos  rios  e  dos  lagos  nela  existentes



objetivando,  portanto,  a  conservação  das “atividades  produtivas,  as  imprescindíveis  à  preservação  dos  recursos  ambientais  necessários  a  seu  bem­estar  e  as  tradicionalmente  ocupam,  competindo  à União demarcá­las, proteger e fazer respeitar todos os seus  bens.”  (BRASIL.  Constituição (1988).  ​ Constituição da  República Federativa do Brasil de  1988.  Disponível  em:  . Acesso  em:  05   out. 2015).  120   BATISTA,  Juliana  de  Paula.  A  natureza   jurídica  dos  direitos  indígenas na  Constituição Federal de  1988.  ​ Revista Eletrônica  da Faculdade de  Direito de  Franca,  ​ Franca, SP, v. 4,  n. 1, p. 111­133,  2011.   Disponível  em: .  Acesso  em: 10 out. 2015.  121  ​ SOUZA,  José  Otávio  Catafesto  de.  ​ A  construção  de  políticas   públicas  diferenciadas   às  Comunidades  Indígenas  do  Rio  Grande  do  Sul:   o  caso  dos  Kaingang.  In:  SCHWINGEL,   Lúcio   Roberto  (org.). ​ Povos Indígenas  e  Políticas Públicas da Assistência Social no Rio Grande do  Sul:  subsídios  para  a  construção  de  políticas  públicas  diferenciadas  às  Comunidades  Kingang  e  Guarani. Porto Alegre: Secretaria do Trabalho e Cidadania, [2012]. p. 25.   122   CF/88,  “A​ rt.   20.  São  bens  da  União:  [...];  XI  ­  as  terras  tradicionalmente  ocupadas  pelos  índios.”  (​ BRASIL.  Constituição  (1988).  ​ Constituição  da  República  Federativa   do  Brasil  de  1988.  Disponível  em:  . Acesso  em:  05   out. 2015).  123   CF/88,  “Art.  231  ​ São  reconhecidos aos índios  sua  organização  social, costumes, línguas, crenças e   tradições,  e  os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União  demarcá­las,  proteger  e fazer respeitar todos os seus bens. [...] §4º ​ As terras de que trata este artigo  são  inalienáveis  e  indisponíveis,  e  os  direitos  sobre  elas,  imprescritíveis.”  ​ (BRASIL.  Constituição  (1988).  ​ Constituição  da  República  Federativa  do  Brasil  de  1988.  ​ Disponível  em:  . Acesso em: 05 out. 2015).  124   CF/88,  Art.  231,   “§2º  As  terras  tradicionalmente  ocupadas  pelos  índios  destinam­se  a  sua  posse  permanente,  cabendo­lhes  o  usufruto  exclusivo  das  riquezas  do  solo,  dos  rios  e  dos  lagos  nelas  existentes​ .” (Ibidem). 

 

necessárias  a  sua  reprodução  física  e  cultural,  segundo  seus  usos,  costumes  e  125 ​

tradições”



  Silva cultural

126

 observa que a identidade étnica perdura no conceito desta reprodução 

127 ​

, mas adverte que a mesma não é estática, pois: 

  Os  índios,  como  qualquer  comunidade  étnica,  não  param  no  tempo.  A  evolução  pode ser  mais  rápida  ou  mais  lenta,  mas sempre  haverá mudanças  e,  assim,  a  cultura  indígena,  como  qualquer   outra,  é  constantemente   reproduzida,  não igual  a si mesma. [...] Eventuais transformações decorrentes  do  viver  e  do   conviver  das  comunidades  não  descaracterizam  a   identidade   cultural.   Tampouco  a  descaracteriza  a  adoção   de  instrumentos  novos  ou de  128 novos utensílios, porque são mudanças dentro da mesma identidade étnica.  

  Da  mesma  forma,  é  importante  frisar  a  competência  da  União   em  legislar  129 ​

sobre  as  populações  indígenas

,  cumprindo  ao  Congresso  Nacional  autorizar  a 

exploração  e  o  aproveitamento  dos  recursos   hídricos,  bem  como  a  pesquisa  e  a  130 ​

lavra  de  riquezas  em  terras  indígenas

,  ressalvando­se  que  a  casa  legislativa 

procederá,  neste ponto,  independentemente de  sanção  do Presidente  da  República 131

.    Quanto  ao  julgamento  e  processamento  das  ações  referentes  aos  direitos  132 ​

indígenas,  a  competência  é  da  Justiça  Federal

,  sendo  partes  legítimas  para 

ingressar em  juízo,  os  índios,  as  comunidades  e organizações que atuam na defesa 

  CF/88, Art. 231, §4º (op. cit.).    SILVA,  José Afonso  da.  ​ Curso de  Direito Constitucional  Positivo​ . 21. ed. São Paulo: Malheiros,  2002.   127   CF/88. Art. 231, §2º (op. cit.).  128   SILVA,  José Afonso  da.  ​ Curso de  Direito Constitucional  Positivo​ . 21. ed. São Paulo: Malheiros,  2002.   129   CF/88,  “​ "​ Art.  22.  Compete   privativamente  à  União  legislar  sobre:  [...];XIV  ­  populações  indígenas;”  (​ BRASIL.  Constituição  (1988).  ​ Constituição  da  República  Federativa   do  Brasil  de  1988.  Disponível em:  . Acesso em: 05   out. 2015).  130   CF/88,  “​ Art.   49.  É  da  competência  exclusiva do  Congresso  Nacional:  [...]XVI  ­ autorizar, em  terras  indígenas,  a  exploração  e  o  aproveitamento de  recursos  hídricos e a  pesquisa  e  lavra de  riquezas  minerais;” (Ibidem​ ).   131   CF/88,  “Art.   48  ​ Cabe  ao   Congresso  Nacional,  com  a  sanção  do  Presidente  da  República,  não   exigida  esta  para  o  especificado  nos  arts.   49,   51  e  52,  dispor  sobre  todas  as  matérias  de  competência da União, especialmente sobre:” (​ Ibidem).  132   CF/88,  “​ Art.  129. São funções  institucionais do  Ministério  Público:  [...]; V ­ defender judicialmente os  direitos e interesses das populações indígenas;” (Ibidem​ ).  125 126

 

dos  seus  interesses

133 ​

134

,  com  a  possível  intervenção   do  Ministério Público  Federal

 

em todos os atos do processo.    135 ​

A  atual  constituição,  conforme  explica  ​ Souza

,  influenciou  inclusive  nas 

transformações  de  diretrizes  e  políticas  públicas  direcionadas  às  múltiplas  comunidades  étnicas existentes no Brasil,  tanto administrativa  quanto judicialmente,  no  tocante  às  questões  relativas  à  saúde,  educação,  assistência  social,  regularização  fundiária,  entre  outras.  Referiu,  ainda,  que tais  transformações foram  ocasionadas pela  emergência de  movimentos nacionalistas  e  étnicos contrários aos  novos modelos de dominação colonial (neocolonialismo).    136 ​

É possível se concluir que, formalmente

, a Constituição de 1988 possibilitou 

uma  evolução  essencial  no que  diz respeito ao explícito  resguardo  dos  direitos dos  povos  indígenas,  ainda  que,  atualmente,  seja  possível  visualizarmos  a  busca  da  efetividade destes direitos frente às violações cometidas a tais comunidades.    3.1 DIREITOS INDÍGENAS NA LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL    A legislação infraconstitucional que respalda os direitos dos povos indígenas é  resultado,  sem  dúvida,  das  lutas  políticas  e  sociais,  as  quais,  antes  mesmo  da  Constituição  de  1988,  já  ansiavam  pelo  reconhecimento  de  direitos  que  pudessem  expressar  e  suprir  as  suas mínimas condições de existência. Neste sentido, primeiro  e,  como  um  verdadeiro  marco,  demonstra­se  a  importância  do  Decreto­Lei  25,  de  30.11.1937,  o  qual  foi  criado  com  base  na Constituição de 1937, e além  de  dispor,    CF/88,  “Art.   232  ​ Os  índios,  suas comunidades e  organizações  são  partes  legítimas para ingressar  em  juízo  em  defesa  de seus  direitos e interesses,  intervindo o Ministério Público em todos os atos  do  processo.” (​ BRASIL. Constituição (1988), op. cit.).  134   CF, Art. 129, “V. ​ defender judicialmente os direitos e interesses das populações indígenas;” (Ibidem).  135   SOUZA,  José Otávio  Catafesto. Mobilização indígena, direitos originários e cidadania  tutelada no sul  do  Brasil  depois  de 1988.  In: FONSECA,  Claudia; TERTO JUNIOR, Veriano;  ALVES, Caleb Farias  (orgs.).  ​ Antropologia, Diversidade  e Direitos Humanos​ : diálogos interdisciplinares.  Porto Alegre:  UFRGS, 2004. p.187.  136   Kayser  acrescenta  que não  há uma  garantia  jurídica  permamente  dos  direitos indígenas  à  posse  e  ao  usufruto,  posto que,  existe  a  possibilidade  de autorização  do uso  e da  exploração dos recursos  localizados  em terras  indígenas pelo  Congresso Nacional. (KAYSER, Hartmut­Emanuel​ . Os direitos  dos  povos  indígenas  do  Brasil:  ​ desenvolvimento  histórico  e  estágio  atual. Porto Alegre:  Sergio  Antonio Fabris, 2010. p. 278).  133

 

previu  obrigações  sobre  a  proteção  e  conservação  do  Patrimônio  Histórico  e  Artístico Nacional, compreendidos, entre este, o patrimônio arqueológico, etnográfico  e  paisagístico,  distribuído  nas  categorias  de  arte  arqueológica,  etnográfica,  ameríndia e popular.    Posteriormente,  com  o  advento  da  Constituição  Federal  de  1988,  o  sistema  jurídico  brasileiro  viu  desencadear  um  notável  aumento  nos  diplomas  legais  relacionados aos índios. Neste  sentido,  merecem  destaques,  conforme Santos Filho 137

,  o  Decreto  22, de  04.02.1991,  o qual  foi  o primeiro a dispor  sobre  o  processo  de 

demarcação  das  terras  indígenas.  Surgiram  também  os  Decretos  23,  24  e  25,  editados  em  04.02.1991,  os  quais,  respectivamente,  referem­se  à  prestação  de  assistência  à  saúde  das  populações  indígenas;  a  proteção  do  meio  ambiente  em  terras  indígenas  e  os  programas  e  projetos  de  auto­sustentação  dos  povos  indígenas.     138

Souza  Filho

  esclarece que  o  Decreto  22,  de  1991,  referente  à  demarcação 

das terras indígenas, observou  o  disposto na Constituição Federal  de 1988, e sob a  sua  vigência,  como  fato  notório,  foram  “demarcadas  as  mais  importantes  e  maior  número  de  terras  indígenas  ,  em  unidades  e  em  extensão  territorial”,  outrossim,  pretendendo  cumprir  o  disposto  no  art.  67  do  Ato  das  Disposições  Constitucionais  Transitórias,  indicou­se  a  publicação  de  plano  referente  à  demarcação  das  terras  indígenas  a  cargo  do  Ministério  da  Justiça.  Posteriormente  foi  editado  o  Decreto  1.775,  de  08.01.1996,  que   revogou  o  Decreto  22,  de  1991,  deliberando  integralmente  sobre  o  processo  demarcatório  das  terras  indígenas.  A  crítica  realizada  ao  procedimento  permanece  no   sentido  de  que  não  há  uma  consulta  prévia  realizada   à  comunidade  estabelecida  no  território  a  ser  demarcado,   desta  forma,  inexiste  a  efetiva  participação  da  comunidade  indígena  na  tomada  de  decisão.      SANTOS  FILHO;  Roberto   Lemos  dos.  ​ Apontamentos  sobre  o  Direito  Indigenista​ .  Curitiba:   Juruá, 2005.  138   SOUZA FILHO, Carlos  Frederico  Marés  de.  ​ O Renascer dos  Povos Indígenas para o Direito​ . 1.   ed. 4. tir. Curitiba: Juruá, 2005.  137

 

Quanto  à  educação  a  ser  desenvolvida  em  território  indígena,  restou   consolidado, através  da  Lei  de  Diretrizes e Bases  da  Educação Nacional, Lei 9.394,  de  20.12.1996,  conforme  os  seus  artigos  78  e  79,  como  sendo  dever  do  Estado  oferecer  aos  índios  uma  educação  escolar  bilíngue,  na  língua  portuguesa  e  na  língua  indígena.  Entre  os  seus  objetivos   está  “a  recuperação  de  suas  memórias  históricas,  a  reafirmação  de  suas  identidades  étnicas  e  a  valorização  de  suas  línguas e  ciências”

139 ​

.  ​ O  Conselho  Nacional  da  Educação, por seu turno, através da 

Resolução  nº  3,  de  10.11.1999,  definiu  que  é  responsabilidade  da  União  fixar  as  diretrizes  da  política  de  educação  indígena,  e  aos  estados  a  tarefa  de  ofertá­la,  conforme  estabelece  o  artigo  9º,  inciso  I,  da  referida  resolução.  Ainda,  cumpre  destacar  a  implantação  da  Lei  12.711

140 ​

,  de 29.08.2012,  conhecida  como  a  “Lei  de 

cotas”,  uma  política  de  ação  afirmativa,  destinada,  entre  outros,  aos  estudantes  de  origem  indígena,  a  qual  concede  acesso  às  instituições  federais  de  ensino  técnico  ou de nível  médio,  como também  às  instituições federais de ensino superior,  tanto a  nível  de  graduação  (tendo a  Universidade de Brasília  como  pioneira,  neste sentido)  quanto  a  nível  de  pós­graduação, a  título  de  exemplo, encontramos  a  Universidade  141 ​

Estadual  do  Rio  de Janeiro Federal de Goiás

, a qual  aprovou em 2014 tal medida, e a Universidade 

142 ​

, a qual aprovou a mesma medida no ano de 2015. 

 

 ​ Lei  de  Diretrizes  e  Bases  da   Educação  Nacional,   de  1996,   e  da  Resolução  3/99  do  Conselho  Nacional   de  Educação,  a  educação  indígena  está   contemplada  no  Plano  Nacional  de  Educação,  aprovado  em  2001, e  no  projeto  de lei de revisão do  Estatuto do Índio, em  tramitação no Congresso   Nacional.  (BRASIL.  ​ Lei nº 9.394, de 20 de dezembro  de 1996. ​ Estabelece as  diretrizes e  bases da  educação  nacional.  Disponível  em:  .  Acesso  em: 12  set.  2015; GRUPIONI,  Luís  Donisete  Benzi.  ​ Política Indígenas:  ​ introdução. Disponível  em:  .  Acesso  em:  12  set.  2015;    BRASIL.  Ministério  da  Educação.  ​ Resolução  CEB  nº  3,  de  10  de  novembro  de  1999.  ​ Fixa  Diretrizes  Nacionais  para  o  funcionamento  das  escolas  indígenas e  dá   outras  providências​ .  Disponível  em:  . Acesso em: 12 set. 2015​ ).  140   BRASIL.  ​ Lei  nº  12.711,   de  29  de   agosto  de  2012.  ​ Dispõe   sobre  o  ingresso  nas  universidades  federais  e  nas  instituições  federais  de  ensino  técnico  de  nível  médio  e   dá  outras  providências.  Disponível  em:  .  Acesso  em: 10 out. 2015.  141   LEI   estabelece  sistema  de  cotas nos cursos de  pós­graduação  no RJ.  ​ G1 Rio, ​ Rio  de  Janeiro,  11  nov  2014.  Disponível  em:  . Acesso em: 10 out. 2015.  142   GOIÁS. Universidade Federal.  ​ Resolução CONSUNI  nº  07/2015.  ​ Dispõe  sobre a política  de ações  afirmativas para pretos,  pardos e  indígenas na Pós­Graduação stricto sensu na UFG. Disponível em:  . Acesso em: 10 out. 2015.  139

 

O  direito  à  saúde   é  garantido  pela  Constituição  Federal  como  um  direito  de  todos  e  dever  do  ​ Estado

143 ​

,  já  o  Estatuto  do  índio,  em  seu  artigo  54

144 ​

,  regula  o 

direito  dos  índios  à  assistência  à  saúde.  Neste  sentido,  compete  à  Secretaria  Especial  de  Saúde Indígena (Sesai),  criada em outubro  de 2010, a coordenação  da  Política  Nacional  de  Atenção  à  Saúde  dos  Povos Indígenas

145 ​

,  bem  como a gestão 

do  Subsistema  de  Atenção  à  Saúde  Indígena  (SasiSUS),  no  âmbito  do  Sistema  Único  de  Saúde  (SUS)

146 ​

.  Compete  à  Secretaria  o  desenvolvimento  de  ações  de 

atenção  integral  à  saúde  indígena,  bem  como  a educação  em  saúde, entre  outros,  contando  com  o  apoio  administrativo  do  Departamento  de  Gestão  da  Saúde  Indígena  (DGESI),  o  Departamento  de  Atenção  à  Saúde  Indígena  (DASI)  e  o  Departamento  de  Saneamento e Edificações de  Saúde (DSESI). Ainda, como forma  de  melhor  atender  as  demandas  das  populações  indígenas,  foram  criados  trinta  e  quatro  DSEIs  (Distritos  Sanitários  Especiais  Indígenas),  sendo  de responsabilidade  destas  unidades  gestoras descentralizadas do subsistema, “a execução de ações de  atenção  à  saúde  nas  aldeias  e  de  saneamento  ambiental  e  edificações  de  saúde  indígena”

147 ​

.  Cumpre  observar  que  tais  distritos  foram  divididos  por  critérios 

territoriais, podendo  abranger  mais de um município  e  em  alguns casos mais de um  148

estado.  À  FUNAI

  compete  apenas  o  monitoramento  das  ações  de  atenção 

desenvolvidas  às  comunidades  indígenas.  Por  fim,  também  vale  ser  ressaltada  a 

  CF/88,  “​ Art.   6º   São  direitos   sociais  a   educação,   a  saúde,  a  alimentação,  o trabalho,  a moradia,  o   transporte,  o  lazer,  a  segurança,  a  previdência  social,  a   proteção  à  maternidade   e  à  infância,  a  assistência  aos  desamparados,  na  forma   desta  Constituição.”  (​ BRASIL.  Constituição   (1988).  Constituição  da  República  Federativa  do  Brasil  de   1988.  ​ Disponível   em:  . Acesso em: 05 out. 2015).  144   “​ Art.   54.  Os  índios  têm   direito  aos  meios  de  proteção  à  saúde  facultados   à  comunhão   nacional.   Parágrafo  único.  Na  infância,  na  maternidade,  na  doença  e  na  velhice,  deve  ser  assegurada  ao  silvícola,  especial   assistência  dos  poderes  públicos,  em  estabelecimentos  a   esse  fim  destinados.”  (BRASIL.  ​ Lei  nº  6.001,  de 19 de  dezembro  de 1973. ​ Dispõe sobre o  Estatuto do Índio. Disponível  em: . Acesso em: 12 set. 2015).  145   BRASIL.  Ministério  da  Saúde.  Fundação  Nacional   da  Saúde.  ​ Política  Nacional  de  Atenção  à  Saúde  dos  Povos  Indígenas.  ​ Brasília,   2002.  Disponível  em:  . Acesso em: 12 set. 2015.  146   SECRETARIA  ESPECIAL  DE  SAÚDE   INDÍGENA  –   SESAI.  Disponível  em:  . Acesso em: 12 out. 2015.  147   SECRETARIA  ESPECIAL  DE  SAÚDE   INDÍGENA  –   SESAI.  Disponível  em:  . Acesso em: 12 out. 2015.  148   FUNDAÇÃO  NACIONA  DO  ÍNDIO  –  FUNAI.  ​ Qual  é  o  papel  da  FUNAI  relativo  a  atenção  à  saúde   dos  povos  indígenas​ .  Brasília,  DF,  2015.  Disponível  em:  . Acesso em: 10 out. 2015.  143

 

importância  que  o  Programa  Mais  Médicos

149

  vem  obtendo  nas  áreas  atendidas 

pelos DSEIS:    [...]  Antes  do  Mais  Médicos,  os  34  Distritos  Sanitários  Especiais  Indígenas  (DSEI)  contavam  com  247   médicos  que  ficavam  justamente  em  locais  onde  não  era  necessário  dormir  na  aldeia.  Com  o programa, o  número  aumentou  para  582  médicos,  dos  quais  292  são  médicos  cubanos,   oito   brasileiros  formados  no Exterior, 26  intercambistas e  nove pelo Programa de Valorização  do  Profissional  da  Atenção  Básica  (Provab).Desde  2011,  a  Secretaria  Especial  de   Saúde  Indígena  (Sesai)  vem   superando  adversidades  para  atender  a  cerca  de  666  mil indígenas que vivem em 305 povos residentes em  5.700   aldeias,  sendo  que  a  Região  Norte  concentra  a  maior  parte  dessa  população (cerca de  46%).  A Sesai é composta de 34 DSEI, 354 Polos Bases,  68  Casas  de Saúde  Indígena (CASAI),  751 postos  de saúde  distribuídos  nas   cinco Regiões Geográficas. 

  150 ​

Quanto  ao  Código  Civil  de  2002,  Lei  nº  10.406

,   de  10.01.2002,  conforme 

151 ​

Araújo

,  deu  um  tratamento  mais  positivo  aos  índios,  na  medida  em  que 

estabeleceu  ser   matéria  de  lei  específica  a  questão  da  capacidade  para  a  prática  152 ​

dos  atos  da  vida  civil.  Conforme  Kayser

,  a  antiga  redação  do artigo 6 do Código 

Civil,  datado  de  01/01/1916,  “continha  uma  regulamentação  sobre  a  capacidade  jurídica  relativa  dos  índios  e  o  mandado  de  regulamentar  sua  tutela  através de  leis  especiais”. No mesmo sentido, esclarece o autor:    A  regulamentação  tem   efeito  paternalista,  e  parece  incorporar  preconceitos  jurídicos.   [...]   A  circunstância   de  que  o  legislador   do  Direito   Civil  de   1916   conduziu   os  “silvícolas”  ao  ordenamento  de  incapacidade   jurídica  relativa  foi  sua  153 “inadaptação à civilização do país”.  

 

149

  MAIS  médicos  contribui  para  melhorar  atendimento  aos  povos  indígenas.  Brasílai,  27  jun.  2015.  Disponível  em:  . Acesso em: 05 set. 2015.  150   BRASIL.  Código  Civil   (2002).  ​ Lei  nº  10.406,   de  10  de  janeiro  de  2002.  ​ Institui  o  Código  Civil.  Disponível  em:  .  Acesso  em:  04  set.  2015.   151   ARAÚJO,  Ana  Valéria  et  al.   ​ Povos   Indígenas  e  a   Lei  dos  "Brancos"​ :  o  direito  à  diferença.  Brasília: MEC/SECAD ​  LACED/Museu Nacional, 2006. p.58.   152   KAYSER,  Hartmut­Emanuel.  ​ Os  direitos  dos  povos  indígenas  do  Brasil​ :  desenvolvimento  histórico e estágio atual. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2010. p.278.  153   KAYSER,  Hartmut­Emanuel.  ​ Os  direitos  dos  povos  indígenas  do  Brasil​ :  desenvolvimento  histórico e estágio atual. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2010. p.278. 

 

Assim,  ainda  durante  a  República,  através  do  Decreto  nº  5.484

154 ​

,  de 

27.06.1928,  pela  primeira  vez  foi  empreendida  a  tentativa  de  regulamentação  das  155 ​

relações  jurídicas  dos índios.  Conforme  Souza Filho

, apesar das críticas à norma, 

há relevância no que  ela oferece  a partir  do  ponto  em  que é realizada uma abertura  na  legislação  brasileira,  sendo  introduzida  no  sistema  jurídico  brasileiro  “a  concepção  de  que as relações  dos  índios com  a sociedade organizada sob o manto  do  Estado  brasileiro  é  de  natureza  pública  e  não  privada”.  Todavia,  as  regulamentações  do  Decreto  foram  substituídas  pela  Lei  nº  6.001,  de  1973,   conhecido  como  Estatuto  do  Índio,  eis  que,  em  1967,  devido  a  forte  pressão  da  opinião pública  nacional e internacional quanto  a  violação  aos direitos humanos dos  156

índios,  o  Serviço  de  Proteção  ao  Índio (SPI)

  foi  extinto  e, com a promulgação  da 

157 ​

Lei  nº  5.371

,  de  05.12.1967,  criada  a  Fundação  Nacional  do  Índio  (FUNAI),  a 

quem incumbiu elaborar o projeto de lei indígena, denominado Estatuto do Índio.    Ao Estatuto  do  Índio

158 ​

,  elaborado  em 1973, em plena  ditadura militar, ficou a 

tarefa  de  dispor,  entre  outros,  sobre  a  assistência  e  tutela  dos  índios  e  suas  comunidades.  Criado  pela  Lei  nº  6.0001,  de  19.12.1973, o Estatuto  busca, de  certa  forma,  a  preservação  da  cultura  indígena,  no  entanto,  consoante  o  seu  artigo  1º,  pretendeu a  integração  “progressiva  e  harmônica  dos  índios  ou  silvícolas  na  comunhão  nacional”

159 ​

,  por  isso,  é  causa  de   muitas  críticas.  Atualmente  há  um 

debate  sobre  a  evidente  contradição  encontrada  no  Estatuto  do  Índio,  em 

  BRASIL.  ​ Decreto  nº  5.484,   de  27  de  julho  de  1928.  ​ Regula  a  situação  dos  indios  nascidos  no  territorio  nacional.  Disponível  em:  . Acesso em: 26 jul. 2015.  155   SOUZA FILHO, Carlos  Frederico  Marés  de.  ​ O Renascer dos  Povos Indígenas para o Direito​ . 1.   ed. 4. tir. Curitiba: Juruá, 2005. p. 100­101.  156   BRASIL.  Congresso  Nacional.  ​ Projeto  de  Lei  nº  2.057,  de  1991.  Dispõe  sobre   o  Estatuto   das  Sociedades  Indígenas.  Autor:  Deputado  Aloizio  Mercadante  e  outros.  Disponível  em:  .  Acesso   em:  12 set. 2015.  157   BRASIL. ​ Lei  nº  5.371,  de 05  de  dezembro de 1967. ​ Autoriza a instituição da ?Fundação Nacional  do  Índio?  e  dá   outras  providências.  Disponível  em:  . Acesso em: 26 jul. 2015.  158   BRASIL. ​ Lei  nº  6.001,  de 19  de  dezembro de 1973. ​ Dispõe  sobre o  Estatuto do Índio. Disponível  em: . Acesso em: 12 set. 2015.  159   “Art.1º   ­  Esta  lei  regula  a  situação  jurídica   dos   índios  ou  silvícolas  e das  comunidades indígenas,  com   o  propósito  de  preservar  a  sua  cultura  e  integrá­los,  progressiva   e  harmonicamente,  à  comunhão nacional”. (Ibidem).   154

 

contraponto   ao  posicionamento  da  Constituição  Federal  de  1988.  Inclusive,  tramita  no Congresso  Nacional  a  proposta

160

 de  um novo estatuto do índio, conhecido como 

o Estatuto das Sociedades Indígenas ­ EdSI.    Sendo  assim,  visíveis  são os avanços  trazidos  também  em  consonância com  a  Constituição  Federal  de  1988,  os  quais  fortaleceram  os  direitos  indígenas  que  ainda  não estavam  consolidados no  ordenamento jurídico brasileiro. Muito embora o  Estado  necessite  de  melhorias  em  vários  aspectos   práticos  do  âmbito  jurídico  e  administrativo,  de  modo  a  satisfazer  todos  os  envolvidos,  o  mero  fato  de  existirem  documentos  legais  corroborando  com  as  reivindicações  dos  povos  indígenas  já  é  algo  a  ser  considerado  como  um  convite  ao  debate  e  às  positivas  mudanças  que,  cedo ou tarde, chegarão.    3.2 A HERANÇA E O PRESSÁGIO ENCONTRADOS EM BELO MONTE    “A história é um profeta com o olhar voltado para trás:  pelo que foi, e contra o que foi, anuncia o que será.”  (Eduardo Galeano)  

  O  giro  histórico das  violações  cometidas  contra os  povos  indígenas,  de 1500  aos  dias  atuais,  encontra  em  Belo  Monte  umas  das  piores heranças deixadas pelo  período  ditatorial brasileiro.  A hidrelétrica  de Belo Monte foi planejada no período de  1975

161 ​

162 ​

,  pela  Eletrobrás  (Centrais  Elétricas  ​ Brasileiras)

,  e  abalou  de  forma muito 

intensa a  vida da população  de  Altamira,  uma das  cidades  mais afetadas pela obra,  bem  como  a  vida   das  comunidades  indígenas  e  dos  ribeirinhos  que  dependem do  Rio  Xingu  para  (sobre)viver,  impactando  de  maneira  catastrófica  a  vida  destas  pessoas.      BRASIL.  Congresso  Nacional.  ​ Projeto  de  Lei  nº  2.057,  de  1991.  Dispõe  sobre   o  Estatuto   das  Sociedades  Indígenas.  Autor:  Deputado  Aloizio  Mercadante  e  outros.  Disponível  em:  .  Acesso   em:  12 set. 2015.  161   RODRIGUES,  Luciana.  Belo   Monte:  Risco  ou  progresso?  ​ Revista Latitude,  ​ Maceió, v. 5, n.  2,  p.  111­139,  2011. Disponível  em: . Acesso  em: 10 out. 2015.  162   ELETROBRÁS:  Energia  para  novos   tempos.  Disponível  em:  . Acesso em: 12 set. 2015.  160

 

A  Usina  Hidrelétrica  de  Belo  monte faz  parte do  Programa de  Aceleração  do  Crescimento  (PAC),  do  Governo  Federal,  sendo  construída  em  uma  região  muito  rica em  biodiversidade, constituída  como  o berço de espécies endêmicas de fauna e  flora,  além  de  território  tradicionalmente  ocupado   pelos  povos  indígenas  ​ juruna  e  163 ​

arara

. Desta forma,  criou­se um  enorme  conflito  socioambiental,  o  qual, conforme 

164

Rosa

  gerou  “[...]controvérsias  e  reclamações  por  parte  dos  movimentos  sociais, 

ambientalistas e populações da região afetada[...]”.    165 ​

Conforme  Rodrigues

,  o  projeto  original  sobre  a  construção  da  hidrelétrica 

sofreu  inúmeras  alterações  com  o  passar  dos  anos,  sendo  retomado  apenas  em  2001,  quando  em  razão de  um verão pouco  chuvoso,  ocorreu uma grande crise  de  eletricidade e o projeto foi  reapresentado como a promessa de “salvação do país”. A  partir de então, explica a autora:    [...]  houve  o ajuizamento da primeira Ação Civil Pública pelo Ministério Público  Federal  de  Belém, visando exigir a  obrigatoriedade  de consultar os indígenas  habitantes  das  áreas  que  fossem  afetadas,   bem  como  a  obtenção  de  autorização  do  Congresso  Nacional, o que é determinado  pelo artigo  231 da  Constituição Federal.    A  decisão  judicial  decorrente  dessa  Ação  Civil  Pública  foi  no  sentido  de  embargar  o  EIA  (Estudo  de  Impacto  Ambiental)  e  o  processo  de  licenciamento.  Tal  decisão,   tomada em primeira instância  em  Belém, no  ano  de  2001,  foi  mantida  até  a  última  instância,  em  Brasília.  Mais  uma  vez  o  projeto Belo Monte foi derrotado, em fins  de 2002.  Assim,  o Governo Federal  anuncia   a  pretensão   de  modificar os  procedimentos para o  empreendimento   hidrelétrico   no  rio  Xingu.  A  terceira  tentativa   de  construção   da  usina  hidrelétrica  começou nos primeiros meses do governo Lula, quando o senador  José  Sarney,  aliado do  governo  em  exercício,  convencia a cúpula  federal da  importância  e  oportunidade  do  projeto   Belo   Monte.  Em  janeiro  de  2006,  o  MPF  ajuíza  a  segunda  ação,  tentando demonstrar  a inconstitucionalidade  da  falta  de oitiva das comunidades indígenas afetadas.  A ELETROBRÁS solicitou   ao  IBAMA  a  abertura   de  processo  de  licenciamento  ambiental  prévio.  Começou,  então,  a ser feito o Estudo de Impacto Ambiental (EIA). A sentença  do  processo,  em  primeira  instância,  derrubou  o  entendimento  do  MPF  e  dispensou  a  oitiva dos indígenas atingidos, tendo os estudos sido iniciados. O    Informações   extraídas  de:  INSTITUTO  SOCIOAMBIENTAL.  ​ Dossiê   Belo  Monte.  ​ p.  8.  Disponível  em:  .  Acesso em: 10 out. 2015.   164   ROSA,  Michel  Fernandes  da.  Discutindo saúde  ambiental a partir  de  uma  Ecologia  de Saberes. In:  SANTOS,  Boaventura  de  Sousa;  CUNHA,  Teresa.  ​ Colóquio  Internacional do Sul:  ​ aprendizagens  globais  Sul­Sul,  Sul­Norte  e  Norte­Sul.  Coimbra:  Centro  de  Estudos  Sociais,  2015. Disponível  em:  .  Acesso  em: 14 out. 2015.  165   RODRIGUES,  Luciana.  Belo   Monte:  Risco  ou  progresso?  ​ Revista Latitude,  ​ Maceió, v. 5, n.  2,  p.  111­139,  2011. Disponível  em: . Acesso  em: 10 out. 2015.  163

  governo federal,  então,  se  apressa  para  licenciar  a obra, mas  começa a fazer  o  EIA  (Estudo  de  Impacto  Ambiental).  A  primeira  versão  do   EIA/RIMA   é  entregue  ao  IBAMA  em  2009,  mesmo  ano  em  que  a  Eletrobrás  solicitou  a   Licença  Prévia  (LP).  O  MPF  ajuizou   uma  nova  ação  em  razão  de  entender   que  os  Estudos  de  Impacto  Ambientais  estavam   incompletos,   sob  o  argumento  de   que  não  seria  possível  que  em  dez  dias  tivessem sido  feita  a  vistoria  técnica  no local  da  obra, as reuniões com as  comunidades afetadas e  a  conclusão do  termo  de referência de  uma  obra  de tal magnitude.  O  pedido  do  órgão  ministerial  foi  judicialmente  aceito,  suspendendo  novamente   o  processo  de  licenciamento  até  que  os  Estudos  fossem  efetivamente  completados.   [...]   Em  fevereiro  de  2010 o Ibama concede a Licença Prévia (LP) da hidrelétrica e  a  ANEEL  aprova   estudos  de   viabilidade  da  UHE  Belo  Monte.  Na  mesma  época,  houve  a  aprovação  pelo TCU da  previsão  de custos  para  construção  da  UHE Belo Monte, bem como a aprovação do  Edital do  Leilão nº. 06/2009,  destinado  à   contratação   de  energia  elétrica  proveniente  da  Usina.   Após  diversas  suspensões  das  obras  pela  justiça,  recursos  foram  julgados  e  as  obras novamente liberadas, estando a hidrelétrica em plena execução. [...].  

  A  construção  da  Usina  teve  início  no  ano  de  2011,  quando  a  vencedora  da  166 ​

licitação,  o  Consórcio  Norte  Energia  S/A

, obteve a outorga de concessão, ficando 

definido  em  um  Projeto Básico Ambiental (PBA) o detalhamento dos planos, projetos  e programas  destinados a prevenir, mitigar e compensar  os impactos da obra. ​ Hoje,   com  a  obra  praticamente concretizada, em  um  custo  estimado  em R$  30 bilhões

167 ​



é possível analisar­se a herança deixada quanto a  degradação ambiental da região,  a  piora  da  qualidade  de  vida  da  população  local  e  a  perda  dos  recursos  naturais  168 ​

necessários para a sobrevivência das populações tradicionais ali estabelecidas

.  

 

 ​ A composição acionária do Consórcio Norte  Energia divide­se da seguinte forma: o Grupo Eletrobras  divide­se  em  Eletrobras, com  15,00%;  Chesf, com  15,00%  e Eletronorte, com 19,98%. A Sociedade  de  Propósito  Específico  compreende a Belo Monte Participações  S.A.  (Neoenergia),  com 10,00% e  Amazônia  (Cemig/Light),  com  9,77%.  As Autoprodutoras  dividem­se  em  Aliança  Norte Energia S/A  (Vale/Cemig),  com  9,00%  e  Sinobras,  com1,00%.  As  Entidades  de  Previdência  Complementar são  compreendidas  em  Petros,  com  10,00%  e  na  Funcef,  com  10,00%.  0,25%  são  pertencentes  às  outras  sociedades,  compreendida,  nesta, a  empresa J.Malucelli  Energia. (NORTE ENERGIA. Usina  Hidrelétrica Belo Monte.  ​ Composição  acionária da  Norte  Energia. ​ Belo Monte, 2015.  Disponível  em: .​  Acesso em: 10 out. 2015).  167   DOSSIÊ:  Belo  Monte:  Não  há  condições  para  licença  de  operação.  São  Paulo:  Instituto  Socioambiental,  2015.  p.  40.  Disponível  em:   Acesso em: 12 set. 2015.   168   Informações   extraídas  de:  DOSSIÊ: Belo Monte:  Não  há condições  para  licença de  operação.  São  Paulo:  Instituto  Socioambiental,  2015.  p.  9.  Disponível  em:   Acesso em: 12 set. 2015  166

  169 ​

Rosa

, explica que a Usina está sendo construída na região oeste do Estado 

do  Pará,  no  município  de  Vitória  do  Xingu,  no  entanto,  a  obra  afeta  diretamente  o  número  de  onze  municípios,  quais  sejam:  Altamira,  Anapu,  Brasil  Novo,  Gurupá,  Medicilândia,  Pacajá, Placas,  Porto  de  Moz,  Senador  José  Porfírio,  Uruará  e  Vitória  170

do  Xingu.  Neste  sentido,  é  preocupante  a  violência  institucional  e   simbólica

 

causada  aos  grupos  antagonistas  do  projeto,  em  busca  de  um  nítido  progresso  a  qualquer  custo.  ​ Hernández  e  Magalhãs especialistas”

171

  ao  analisarem  o  estudo   do  “painel  de 

172 ​

,  afirmam  q​ ue várias comunidades indígenas  que vivem às margens 

do rio seriam afetadas:    [...]  as Terras  Indígenas  – Juruna  do Paquiçamba  e  Arara  da Volta  Grande –  são  “diretamente  afetadas”  pela  obra.  E,  ademais,  grupos  Juruna,  Arara,  Xipaya,  Kuruaya e  Kayapó, que,  imemorial  e/ou tradicionalmente, habitam as  margens deste trecho do rio. 

  Thais  Santi,  Procuradora  da República  que atua diretamente  no caso de Belo  173 ​

Monte,  explica  em  entrevista  concedida  à  Eliane  Brum,  em  dezembro  de  2014



que  “[...]  ​ Belo  Monte  vai  se  tornando  um  fato  consumado.  E  a  morte  cultural  dos 

169

  ROSA,  Michel  Fernandes  da.  Discutindo saúde  ambiental a partir  de  uma  Ecologia  de Saberes. In:  SANTOS,  Boaventura  de  Sousa;  CUNHA,  Teresa.  ​ Colóquio  Internacional do Sul:  ​ aprendizagens  globais  Sul­Sul,  Sul­Norte  e  Norte­Sul.  Coimbra:  Centro  de  Estudos  Sociais,  2015. Disponível  em:  .  Acesso  em: 14 out. 2015   170   HERNÁNDEZ,  Francisco del  Moral;  MAGALHÃES, Sonia  Barbosa.  Ciência, cientistas e  democracia  desfigurada:   o  caso  Belo  Monte.  ​ Novos  Cadernos  NAEA,  ​ v.  14,  n.  1,   p.  79­96,  jun.  2011.  Disponível  em  . Acesso em : 10 out. 2015.  171   HERNÁNDEZ,  Francisco del  Moral;  MAGALHÃES, Sonia  Barbosa.  Ciência, cientistas e  democracia  desfigurada:   o  caso  Belo  Monte.  ​ Novos  Cadernos  NAEA,  ​ v.  14,  n.  1,   p.  79­96,  jun.  2011.  Disponível  em  . Acesso em : 10 out. 2015.  172   SANTOS,  Sônia  Maria  Barbosa  Magalhães;  HERNANDEZ,  Francisco  del  Moral.  ​ Painel  de   Especialistas​ :  Análise  Crítica  do  Estudo  de Impacto Ambiental do  Aproveitamento  Hidrelétrico de  Belo  Monte.  Belém,  29  out.  2009.  Disponível   em:  . Acesso em: 10 out. 2015.  173   BRUM,  Eliane.  Belo Monte:  a anatomia  de  um etnocídio. El  País, Madrid,  01  dic. 2014.  Disponível  em:  .  Acesso  em:  05  set. 2015.  

 

indígenas  é  naturalizada  por  parte  dos  brasileiros  como  foi  o  genocídio  judeu  por  174 ​

parte da sociedade alemã.”​ . Neste sentido, Rodrigues

 refere:  

  O  MPF  acredita que se a obra não causar um genocídio propriamente dito, vai  causar  no  mínimo  um  genocídio   cultural,  porque   a  cultura  vai  mudar  completamente  a  vida das pessoas, já  que tem  relação  com o sagrado,  com  as festas religiosas, festa da piracema etc. [...]. 

  Importante  referir,  ainda,  o  fato  de  que  no  ano  de  2011  a  questão  de  Belo  Monte  foi  levada   ao  Conselho  de  Direitos  Humanos  da  ONU,  através  da  Medida  Cautelar  de  nº382/2010  (MC­382/10)

175 ​

,  ante  as  claras  violações  de  direitos 

humanos realizadas em  benefício da construção  da usina. Assim, a entidade cobrou  explicações das  autoridades  brasileiras,  além  de solicitar a imediata paralisação das  obras,  bem  como  para  que  fosse  realizada  uma  consulta  prévia,  livre,  informada  e  culturalmente  adequada  às  comunidades  afetadas

176 ​

.  O  Brasil  não  apenas  não 

compareceu  à  audiência  designada  para  prestar  esclarecimentos

177 ​

,  como  também 

autorizou o início  da obra no mesmo  ano. Não obstante a problematização em torno  de  Belo  Monte,  vários  especialistas  posicionaram­se  desqualificando

178

 o  EIA/RIMA 

apresentado  pelo  governo,  com  apontamentos  de  graves  falhas  no  tocante  ao  impacto ambiental e social do projeto, além da inviabilidade técnica.   

  RODRIGUES,  Luciana.  Belo   Monte:  Risco  ou  progresso?  ​ Revista Latitude,  ​ Maceió, v. 5, n.  2,  p.  111­139,  2011. Disponível  em: . Acesso  em: 10 out. 2015.  175   COMISSÃO  INTERAMERICANA  DE  DIREITOS  HUMANOS.  ​ MC   382/10  ­  Comunidades  Indígenas  da  Bacia  do  Rio  Xingu,  Pará,  Brasil​ .  Disponível  em:  . Acesso em: 14 set. 2015.  176   QUESTÃO   de  Belo  Monte  é  levada  ao  Conselho  de   Direitos  Humanos  da  ONU.  ​ Justiça  Global  Brasil,  03  ​ jun.  2011.  Disponível  em:  . Acesso em: 12 set. 2015.  177   BELO  Monte:  após  boicotar  audiência,  Brasil é cobrado na  CIDH/OEA. ​ Justiça Global  Brasil, ​ 28  out.  2011.  Disponível  em:   .  Acesso em: 12 set. 2015.  178   O  documento  “Painel  de  Especialistas:  Análise  Crítica  do  Estudo  de  Impacto  Ambiental  do  Aproveitamento  Hidrelétrico  de  Belo  monte”  está  disponível  em:   SANTOS,   Sônia  Maria  Barbosa  Magalhães;  HERNANDEZ, Francisco  del  Moral.  ​ Painel de Especialistas​ : Análise Crítica do Estudo   de  Impacto  Ambiental   do  Aproveitamento  Hidrelétrico  de  Belo  Monte.  Belém,  29  out.   2009.  Disponível  em:  .  Acesso em: 10 out. 2015.  174

 

Cumpre  observar  que  medidas  de  mitigação  e   compensação  foram  apresentadas  na  forma  de  31  condicionantes,  as  quais  foram  planejadas  pela  Fundação  Nacional  do  Índio  (FUNAI),  em  que  basicamente  estipulava­se  a  responsabilidade  do  poder  público  e  do  empreendedor,  em  um  Plano  Básico  Ambiental  do  Componente Indígena (PBA­CI),  com  o  prazo  de  35  anos de duração,  contudo,  até  abril  de  2015,  não  ocorrera  o  cumprimento  nem  da  metade  das  condicionantes

179 ​

.  Conforme  importante  informação  disponibilizada  pelo  dossiê 

realizado pelo Instituto Socioambiental:     Segundo  a  Norte  Energia,  R$  212  milhões   já  foram  gastos  com  os   povos  indígenas.  Porém,  em  lugar  de  serem  investidos,  de  forma   estruturada,  na  mitigação e compensação dos impactos, esses recursos foram principalmente  utilizados  no  fornecimento  de  bens  materiais  (até   março  de  2015,  foram  comprados  578  motores para barco,  322 barcos e  voadeiras,  2,1  milhões de  litros  de  gasolina,  etc.),  consolidando  um   inaceitável  padrão  clientelista  de   relacionamento  entre   empresa  e  povos  indígenas.  Os  recursos  foram  distribuídos  por  dois anos (de outubro de 2011  a setembro de 2013), na forma  de  uma espécie  de “mesada” no valor  de R$ 30 mil mensais por aldeia. Dessa  maneira,   o empreendedor  e  o Estado  puderam  controlar  temporariamente  os  processos  de  organização   e  resistência  indígena,  deixando  como  legado  a  desestruturação  social  e  o  enfraquecimento  dos  sistemas  de  produção  de  alimentos nas  aldeias, colocando em risco a saúde, a segurança alimentar e a  autonomia desses povos.  [...]  Para  que  o  empreendedor  reconhecesse  a  obrigatoriedade  em   realizar  algumas ações de mitigação,  foram necessárias determinações judiciais. Foi o   que ocorreu,  por  exemplo, com o Plano de Fiscalização e Vigilância Territorial  e  com  a  realocação  dos   Juruna  que  vivem  em  um  travessão  da  rodovia   180 Transamazônica (BR­230), conhecidos como Juruna do Km 17.   

  Mesmo  assim, as ações ainda não foram executadas. O MPF  precisou intervir  para  exigir  a  assinatura  do  termo  de  compromisso  de  implementação  do  PBA­CI,  que  garantiria  o  cumprimento  das  medidas  de  mitigação  de  longo  prazo.  O  instrumento  deveria  ter  sido  assinado  35  dias  após  a  emissão  da  licença  de  instalação  da  obra,  concedida  em  janeiro   de  2011,  mas  isso  só  ocorreu  três  anos 

179

  DOSSIÊ:  Belo  Monte:  Não  há  condições  para  licença  de  operação.  São  Paulo:  Instituto  Socioambiental,  2015.  p.  14.  Disponível  em:   Acesso em: 12 set. 2015.   180   DOSSIÊ:  Belo  Monte:  Não  há  condições  para  licença  de  operação.  São  Paulo:  Instituto  Socioambiental,  2015.  p.  40.  Disponível  em:   Acesso em: 12 set. 2015.  

 

depois,  em  março  de  2014,  depois  de  mais  de  300  indígenas  terem  ocupado  os  escritórios da Norte Energia, em Altamira, durante dois dias.

181

 

  Ademais,  em  parecer  técnico  realizado  pela  FUNAI,  em  março  de  2015,  constatou­se que  entre 2008  e  2013,  o desmatamento ocorrido no interior das terras  indígenas  no  entorno  da  construção   de  Belo  Monte  foi  de   193,4  quilômetros  182 ​

quadrados,  o  que  representa  uma  eclosão  de  16,31%  de  desmatamento



Outrossim,  apesar  de  não alagar  nenhuma  região  de  território indígena, Belo Monte  praticamente  seca  o  Rio  Xingu  entre  as  terras  indígenas  Arara  da  Volta  Grande  e  Paquiçamba,  ocasionando o desvio da vazão hídrica em até 80% para o reservatório  183 ​

de geração de energia



  Assim  sendo,  encontramos  em  Belo  Monte  um  Direito  que,  para  além  das  bases  legais   ou,  insuficientemente  chegando  nesta  “legalidade”,  encontra­se  refém  184

das  escolhas  políticas  e  governamentais

  de  um  país  que  pretere  direitos 

fundamentais  em  favor  de  poder  e  lucro.   Isto  fica  claro  ao  se  analisar  o  Plano  185

Emergencial  apresentado  pela  Norte  Energia  S/A

181

  e,  conforme  expõe  a 

  Poder Judiciário, Justiça Federal de Primeira  Instância, Seção Judiciária do Pará.  Decisão. Ação civil  pública  nº  655­  78.2013.4.01.3903.  Belém,  31  mar.  2014;  Poder  Judiciário,  Justiça  Federal  de  Primeiro  Grau,  Seção  Judiciária  do  Estado  do  Pará,  Subseção  Judiciária  de  Altamira.  Decisão   liminar. Ação civil pública nº 1655­ 16.2013.4.01.3903. Altamira, 6 set. 2013.  182   DOSSIÊ:  Belo  Monte:  Não  há  condições  para  licença  de  operação.  São  Paulo:  Instituto  Socioambiental,  2015.  p.  38.  Disponível  em:   Acesso em: 12 set. 2015.   183   DOSSIÊ:  Belo  Monte:  Não  há  condições  para  licença  de  operação.  São  Paulo:  Instituto  Socioambiental,  2015.  p.  40.  Disponível  em:   Acesso em: 12 set. 2015.   184   BRUM,  Eliane.  Belo Monte:  a anatomia  de  um etnocídio. El  País, Madrid,  01  dic. 2014.  Disponível  em:  .  Acesso  em:  05  set. 2015.  185   PLANO  emergencial.  ​ Boletim  Informativo,  ​ Belo  Monte,  n.  2,  nov.  2011.  Disponível  em:   . Acesso em: 10 out. 2015. 

 

Procuradora  da República  Thais  Santi

186 ​

,  sobre  a  dependência criada ardilosamente 

aos povos indígenas, em clara tentativa de assimilacionismo:    [...] Eliane Brum – O que a senhora viu? 

  Santi ­ O  Plano  Emergencial  tinha como  objetivo  criar programas específicos  para  cada  etnia,  para  que  os  indígenas  estivessem  fortalecidos  na  relação  com   Belo   Monte.  A  ideia  é  que  os  índios  se   empoderassem, para não  ficar  vulneráveis  diante  do  empreendimento.  [...]  Eu  vi  os índios  fazendo fila  num  balcão  da Norte  Energia, um  balcão  imaginário, quando  no plano  estava dito  que eles  deveriam permanecer nas aldeias. Comecei a perceber o que estava  acontecendo  quando  fiz  essa  visita  à  terra  indígena  de  Cachoeira  Seca  e  conheci  os   Arara,  um  grupo  de  recente  contato.  E  foi  um  choque.  Eu  vi  a   quantidade  de  lixo  que  tinha  naquela  aldeia, eu  vi as  casas  destruídas, com  os telhados furados, chovendo  dentro. E  eles  dormiam ali. As  índias, na beira  do  rio,   as  crianças,  as  meninas,  totalmente  vulneráveis  diante  do  pescador   que  passava.  Quando  Belo  Monte  começou,  esse  povo  de   recente  contato   ficou  sem  chefe  do  posto.  Então,  os  índios  não  só  se  depararam com  Belo  Monte,  como   eles  estavam   sem  a  Funai dentro da  aldeia.  De  um  dia  para  o  outro  ficaram  sozinhos.  Os  Arara   estavam  revoltados,  porque  eles  tinham  pedido  60  bolas   de  futebol,  e  só  tinham  recebido   uma.  Eles  tinham  pedido  colchão boxe para  colocar naquelas casas que estavam com telhado furado  e  eles  não   conseguiram.   Esse  grupo  de  recente   contato  estava  comendo  bolachas  e  tomando  refrigerantes,  estava  com  problemas  de  diabetes  e  hipertensão.  ​ [...]  ​ Era como se  fosse  um  pós­guerra, um holocausto.  Os índios  não  se  mexiam.   Ficavam  parados,  esperando,  querendo  bolacha,  pedindo  comida,   pedindo  para  construir  as  casas.  Não  existia  mais  medicina  tradicional. Eles  ficavam pedindo. E  eles  não  conversavam mais entre si, não  se  reuniam.  O  único  momento  em  que  eles  se  reuniam  era  à  noite  para  assistir à novela numa TV de plasma. Então foi brutal.   [...]  

  Eliane  Brum  ­   Era  esse  o  Plano  Emergencial,   o  que  deveria  fortalecer  os  indígenas para que pudessem resistir ao impacto de Belo Monte? 

  Santi  –  Tudo  o  que  eles  tinham  recebido  do   Plano  Emergencial.  O  Plano  Emergencial  gerou  uma dependência  absoluta do empreendedor. Absoluta. E  o  empreendedor  se   posicionou  nesse  processo  como  provedor  universal  de  bens  infinitos, o  que só  seria tolhido se a Funai dissesse não. A Norte Energia  criou  essa dependência, e isso  foi proposital. E  se  somou  à  incapacidade  da  Funai  de estar presente,  porque  o órgão deveria ter sido fortalecido para esse  186

 ​ “[...]  A  decisão foi  tomada após pedido do Ministério Público para que fosse analisada a  participação  de  empresas  investigadas na  Operação  Lava  Jato, que apura desvios de recursos na  Petrobras, em   outra estatal do  país,  a Eletrobras, do setor elétrico.  A obra de Belo Monte está estimada atualmente  em  cerca  de  R$  33  bilhões.  A maior  parte  dos recursos para a  construção viriam  do BNDES  – ao  menos  R$  22  bilhões.  O  Ministro   José  Múcio  Monteiro,  responsável  pelo   processo  no  TCU,  considerou   que  o  fato  de as  empresas  que  formam  o  consórcio  que constrói  a  hidrelétrica  estarem  sendo  investigadas  na  Lava  Jato  é  motivo  para  o  início  de  uma  auditoria  do  tribunal  sobre  esse  contrato.  Outro  problema apontado  foi o alto custo  da construção  da usina, que estaria inviabilizando  um  retorno  financeiro  para  as  estatais  que  estão  investindo  nesse  projeto.”   (AMORA,  Dimmi. Por  envolvimento  de  construtoras  na  Lava­jato  TCU  investiga  Belo  Monte.  ​ Folha UOL, ​ Brasília, 24 jun.  2015.   Disponível  em:  . Acesso em: 10 out. 2015). 

  processo  e,   em  vez  disso,  se   enfraqueceu  cada  vez  mais.  Os  índios  desacreditavam da Funai e criavam uma dependência do empreendedor.  

  Eliane  Brum  ­  A  senhora  acha  que  essa  condução do  processo, por  parte da   Norte Energia, com a omissão do governo, foi proposital? 

 

 

Santi  –  Um  dos  antropólogos  da  6ª  Câmara  tem  uma  conclusão  muito  interessante.  No  contexto  de Belo Monte,  o Plano Emergencial foi estratégico  para  silenciar  os  únicos  que  tinham  voz e  visibilidade:  os  indígenas.  Porque  houve  um  processo  de silenciamento da sociedade civil. Tenho muito respeito  pelos  movimentos  sociais de  Altamira. Eles são uma  marca  que faz  Altamira  única  e  Belo  Monte  um  caso paradigmático.  Mas hoje  os  movimentos sociais  não  podem  nem  se  aproximar  do  canteiro  de  Belo  Monte.  Há  uma  ordem  judicial  para  não  chegar  perto.  Naquele  momento,  os  indígenas  surgiram  como  talvez  a  única  voz  que ainda tinha condição  de  ser  ouvida e  que tinha  alguma  possibilidade  de  interferência,  já   que  qualquer  não   índio  receberia  ordem  de  prisão.  E  o  Plano  Emergencial  foi  uma  maneira  de  silenciar essa  voz. [...]​ . 

O  posicionamento   da  Advocacia  Geral  da  União  é  no  sentido  de  que  Belo  187 ​

Monte  se  trata  de  uma  obra  governamental, como explica Santi

.  Entretanto, Belo 

Monte  se  apresentou  como  uma  empresa  com  formação  de  S.A.  (Sociedade  Anônima),  como  empresa  privada,  o  que,  consequentemente,  complica  na hora de  se cobrar  as  políticas públicas cabíveis  à  população  impactada,  devido  ao  fato de a  empresa transferir tal responsabilidade para o Estado.     188

Ademais,  Santi

  frisa  que  a  ação  referente  à  Belo  Monte  é  uma  obra  “​ sub 

judice​ ”,  composta  de  22  duas  ações.  Competindo  ao  Supremo  Tribunal  Federal  realizar  este  julgamento;  entretanto,  a  ação   encontra­se  em  “suspensão  de  segurança”, mecanismo jurídico herdado da ditadura militar, o qual:    [...]  impede o ​ julgamento  antecipado de  uma ação, que poderia ser pedido por  conta da  urgência, da  relevância  e da  qualidade  das  provas  apresentadas. É   concedido  pela  presidência  de  um  tribunal,  que  não  analisa  o  mérito  da  questão, apenas se limita a mencionar razões como “segurança nacional”. 

 

  SANTI,  Thais  [entrevistada].  Belo  Monte:  a  anatomia  de  um  etnocício.  ​ Instituto   Humanitas  Unisinos,  ​ São  Leopoldo,  02  dez.  2014.  Disponível  em:  . Acesso em: 10 set. 2015.  188   SANTI,  Thais  [entrevistada].  Belo  Monte:  a  anatomia  de  um  etnocício.  ​ Instituto   Humanitas  Unisinos,  ​ São  Leopoldo,  02  dez.  2014.  Disponível  em:  . Acesso em: 10 set. 2015.  187

 

Desta  forma,  por  todo  o  exposto,  a  sociedade  precisa  incansável  e  189

urgentemente  transformar a  sua  ausência

  em  presença, para que  velhas práticas 

e  discursos  não  sejam  naturalizados,  e  para  que  não  haja  a  compactuação  com  práticas  etnocidas  por parte  de um Estado estrategicamente silencioso. As heranças  permanecem, de 1500 até agora, o presságio requer mudança. Mudança e coragem.  Esta  deve ser a herança deixada para as futuras gerações, para que estas consigam  olhar para trás e ver o que a história nos conta, sem a repetição de velhos erros ou a  propagação de antigos preconceitos.    Atualmente  a  obra  de  Belo  Monte  encontra­se  quase  concluída,  faltando  apenas  a  licença operacional

190 ​

, analisada pelo IBAMA. Ademais, em junho de 2015, 

o  Tribunal  de   Contas  da  União  informou  que  iniciará  uma  investigação   sobre  191 ​

recursos públicos utilizados na construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte



 ​ É  neste  sentido  que,  brilhantemente,  PIZZIO  e  VERONESE  analisam  a sociologia das ausências,  teoria  formulada  por  Boaventura  de  Sousa Santos:  “A  produção  social  dessas ausências  resulta na  subtração  do   mundo,  na  contração  do  presente  e no  desperdício  da experiência. A sociologia  das  ausências   coloca  a  necessidade  de  pôr   em  questão  cada  uma  dessas   lógicas.  Nesse   questionamento,  propõe   substituir ​ monoculturas​  por ​ ecologias​ ,  o  que  possibilitaria  a  disputa  epistemológica entre  diferentes  saberes,  a  vivência de temporalidades diversas da frenética  máxima  de  que  tempo  é   dinheiro,  a   não  identificação   da  diferença  com  a  desigualdade,  a  recuperação do  que  no  local  não   é  efeito   da  globalização  hegemônica,  a  valorização  de  sistemas   alternativos  de  produção  e consumo, eco­socialismo, eco­feminismo etc. Dessa forma,  torna­se possível,  através da  sociologia das ausências, captar  e  compreender o  processo através do qual  têm sido produzidos os  silêncios  sociais   nos   mais  diversos  contextos  empíricos  e,  a  partir  daí,  trazer  a  tona   saberes  e  perspectivas  diferenciadas  que  possam   representar  toda  a   riqueza  social  contemporânea.  Nesse  processo,  os  sujeitos  fazem­se ​ autores​  da  sua  própria  vida  e  da  vida   coletiva.”.  (PIZZIO,  Alex;  VERONESE,  Marília  Veríssimo.  Possibilidades  conceituais  da  sociologia  das  ausências  em  contextos  de  desqualificação social.  ​ Cadernos de  Psicologia  Social  do Trabalho, ​ São Paulo, v.  11,  n.  1,  p.   51­67,  2008.  Disponível  em:  . ​ Acesso em: 10 out. 2015).  190   FALEIROS,  Gustavo.  Quase  concluída,  Belo   Monte  mudará  o  pulso  das  águas  do  Singu.  ​ UOL  Notícias,   ​ Manaus,  01  out.   2015.  Disponível  em:  .  Acesso em: 10 set.  2015.   191  ​ “[...]  A  decisão foi  tomada após pedido do Ministério Público para que fosse analisada a  participação  de  empresas  investigadas na  Operação  Lava  Jato, que apura desvios de recursos na  Petrobras, em   outra estatal do  país,  a Eletrobras, do setor elétrico.  A obra de Belo Monte está estimada atualmente  em  cerca  de  R$  33  bilhões.  A maior  parte  dos recursos para a  construção viriam  do BNDES  – ao  menos  R$  22  bilhões.  O  Ministro   José  Múcio  Monteiro,  responsável  pelo   processo  no  TCU,  considerou   que  o  fato  de as  empresas  que  formam  o  consórcio  que constrói  a  hidrelétrica  estarem  sendo  investigadas  na  Lava  Jato  é  motivo  para  o  início  de  uma  auditoria  do  tribunal  sobre  esse  contrato.  Outro  problema apontado  foi o alto custo  da construção  da usina, que estaria inviabilizando  um  retorno  financeiro  para  as  estatais  que  estão  investindo  nesse  projeto.”   (AMORA,  Dimmi. Por  envolvimento  de  construtoras  na  Lava­jato  TCU  investiga  Belo  Monte.  ​ Folha UOL, ​ Brasília, 24 jun.  2015.   Disponível  em:  .  Acesso em: 10 out. 2015). 

 

4 CONCLUSÃO    O  objetivo deste trabalho foi problematizar e demonstrar o direito histórico dos   índios  à  terra  e  à  sua  autodeterminação,  assim  respeitado  o  dever  de  consulta.  Pautou­se,  inicialmente,  fazer um  retrospecto  como  o  realizado no primeiro capítulo,  com  o  delineamento  da  história  da  colonização  brasileira  e  dos  documentos legais  surgidos  em  cada  período.  Neste  sentido,  é  importante  destacar  que  do  respeito  à  condição  dos  índios  e às  suas  particularidades  culturais,  tendo  em  vista  a  diversidade de etnias  existentes  no  Brasil, os  demais  direitos inerentes,  tais como à  terra  e  à  autodeterminação,  conseguirão,  no  mínimo,  entrar  no  debate  político­econômico­histórico­social  brasileiro.  Logo,  os  interesses  políticos  e  estratégicos  que  embasaram  a  vinda  da  Coroa,  bem  como  a  disputa  pela  mão  de  obra  escrava  dos índios,  não difere muito do cenário encontrado hoje. Os interesses  são os mesmos, muda a forma de violentar o outro.     Desta forma,  é  possível notar  que o direito  desenvolvido à época  da Colônia,  o  qual  permaneceu  até  a  República  Velha,  tratava  essencialmente  da  questão  referente  às  terras,  sem   deixar  de  ser  desenvolvida   uma  política  de  assimilação  e  concentração  social  dos  índios  ao  resto  da  população.  Conforme  observado,  a  reprodução  cultural dos  índios,  sua  estruturação  social  e  a própria sobrevivência da  identidade étnica de  um determinado  grupo, é consequência  da garantia do direito  à  terra.  Se  trata  de  reconhecer  que  este  grupo  existe,  ali,  com  seus  valores,  seus  mitos  e  crenças, em sua possível  dignidade. Isto posto, ressalta­se que apenas com  o  advento  das  Constituições  de  1934,   1937,  1946,  1967  e  1969,  foi  reconhecido  o  direito  dos  índios  à  posse  das  terras  que  ocupavam,  e,  apenas  com  o  advento  da  Constituição  de  1988  restou  proclamado   o  direito  originário  dos  povos  indígenas  sobre  as  terras  que   possuíam.  O  qual  ocorre  através  do  ato  administrativo  de  reconhecimento da área ocupada, com o procedimento de demarcação.    À  vista  disso,  a  problemática  centra­se  na  expansão das fronteiras  agrícolas  (agronegócio),  bem  como  observando­se as ações desenvolvimentistas que buscam  explorar  os  recursos  naturais  em  áreas  de  ocupação  tradicional,  trazendo  como 

 

consequência o embate  entre  as  comunidades indígenas  e os demais interessados.  É  neste  contexto  que  o  direito  deve  funcionar  como  força emancipatória, tendo em  vista  a  emergência  de  uma  nova  cultura  jurídica,  bem  como  uma  ruptura  paradigmática, capaz de formar operadores do direito no mínimo mais humanistas.    Nesta sequência,  com  o  advento de inúmeras constituições latino­americanas  entre  a  década  de  1980  e  1990,  compostas  pelo  reconhecimento  de  direitos  às  populações indígenas, coube  à  Constituição  Brasileira de 1988  tornar­se um marco.  Através  da  Constituição  Federal  houve  o  reconhecimento  de  pontos   fundamentais  do  direito  indigenista,  tais  como  o  reconhecimento  das  terras  tradicionais  que  ocupam permanentemente,  o  direito a serem  diferentes, preservando suas  crenças,  tradições, costumes, línguas e organização social, além da superação, teoricamente,  da  concepção  assimilacionista  encontrada  em   textos  legais  do  passado.  Deste  modo,  foram  criadas  leis  infraconstitucionais  que  proporcionaram  o  acesso  dos  índios  à  direitos  fundamentais  e  de  plena  cidadania,  tais  como  os  relacionados  à  saúde e à educação da população indígena.    No  tocante  à  autodeterminação,  foi  possível  se  concluir  que  esta  advém  da  necessidade dos Estados  aplicarem,  de  fato, o que dispõe os principais documentos  referentes  ao  direito  à  autodeterminação  dos  povos  indígenas,  de  modo que  estes  exerçam  seus  direitos  constitucionais  com  autonomia  acerca  dos  assuntos  que  possam  vir  a  afetá­los  diretamente.  Neste  contexto,  é  importante  frisar  que  prioriza­se  a  integridade  dos  Estados  em  que  estes  povos  se  encontram,  reconhecendo­se o direito  à  autoadministração dessas  populações e a consequente  manutenção  da  sua  identidade   cultural  e  territorial,  como  forma  de  se  evitar   o  argumento referente a secessão.    Isto  posto,  buscou­se  analisar  a  evolução  da  legislação  brasileira,  utilizando­se  também  as  bases  teóricas  sociológicas  e  antropológicas,  a  fim  de  demonstrar   ­  e  evitar  ­  que  os  direitos  até  aqui  conquistados  não  caiam  na  armadilha  de  reproduzir  velhas  concepções  eurocêntricas.  É  neste  sentido  que  o  direito,  enquanto  um  instrumento  de  emancipação  social,  pode  fortalecer  os 

 

movimentos  que  lutam  pelos  direitos indígenas, como alternativa contra  as  políticas  que,  especialmente  no  Brasil,  com  a  legitimidade  concedida  (principalmente)  pelo  Congresso  Nacional,  imbuído  por  diversos  interesses,  tem  cometido  graves  violações contra os povos indígenas estabelecidos em território nacional.      

 

 

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SANTOS, Sônia Maria Barbosa Magalhães; HERNANDEZ, Francisco del Moral.  Painel de Especialistas​ : Análise Crítica do Estudo de Impacto Ambiental do  Aproveitamento Hidrelétrico de Belo Monte. Belém, 29 out. 2009. Disponível em:  . Acesso em: 10 out. 2015.  SANTOS; Boaventura de Sousa​ . Reconhecer para libertar​ : os caminhos do  cosmopolitismo multicultural. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. v. 3.  SECRETARIA ESPECIAL DE SAÚDE INDÍGENA – SESAI. Disponível em:  . Acesso em:  12 out. 2015.  SEEGER, Anthony; MATTA, Roberto da; CASTRO, Eduardo Viveiros de. A  construção da pessoa nas sociedades indígenas brasileiras. ​ Boletim do Museu  Nacional​ , Rio de Janeiro, n. 32, p. 2­19, 1979.  SILVA, José Afonso da. ​ Curso de Direito Constitucional Positivo​ . 21. ed. São  Paulo: Malheiros, 2002.  SOUSA JUNIOR, José Geraldo de. ​ O acesso ao direito e à justiça, os direitos  humanos e o pluralismo jurídico​ . Coimbra, may 2003. Disponível em:  . Acesso  em: 05 set. 2015.  SOUSA JUNIOR, José Geraldo. Por uma Concepção Alargada de Acesso à Justiça.  Revista Jurídica, ​ Brasília, v. 10, n. 90, ed. esp. P. 1­14, abr./maio 2008. Disponível  em: . Acesso em: 12 set. 2015.  SOUZA FILHO, Carlos Frederico Marés de. Multiculturalismo e direitos coletivos. In:  SANTOS, Boaventura de Souza (Org.). ​ Reconhecer para libertar​ : os caminhos do  cosmopolitismo multicultural. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.  SOUZA FILHO, Carlos Frederico Marés de. ​ O Renascer dos Povos Indígenas  para o Direito​ . 1. ed. 4. tir. Curitiba: Juruá, 2005.  SOUZA FILHO, Carlos Frederico Marés. ​ O renascer dos povos indígenas para o  direito​ . Curitiba: Juruá, 1998.  SOUZA, José Otávio Catafesto de. ​ A construção de políticas públicas diferenciadas  às Comunidades Indígenas do Rio Grande do Sul: o caso dos Kaingang. In:  SCHWINGEL, Lúcio Roberto (org.). ​ Povos Indígenas e Políticas Públicas da  Assistência Social no Rio Grande do Sul:​  subsídios para a construção de políticas  públicas diferenciadas às Comunidades Kingang e Guarani. Porto Alegre: Secretaria  do Trabalho e Cidadania, [2012].   SOUZA, José Otávio Catafesto de. ​ Os Mbyá­Guarani e os Impasses das Políticas  Indigenistas no sul do Brasil​ . Buenos Aires, out. 2009. Disponível em: 

 

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      ANEXO ­ ILUSTRAÇÕES    Figura 1 ­ Distribuição total, rural e urbana da população indígena no Brasil 

  Fonte:  IBGE,   2015.  Disponível  em:  .   Acesso  em:  12  set. 2012. 

 

 

 

  Figura 2 ­ Localização e extensão das terras indígenas 

  Fonte:  POVOS  Indígenas  no  Brasil.  ​ Localização  e  Extensão  das  TIs​ .  2015.  Disponível  em:  . Acesso em: 10 set. 2015. 

   

 

 

   Figura  3  ­  Tabela  com  o  reconhecimento  das  terras  indígenas  nos  governos  dos  presidentes  José  Sarney,  Fernando  Collor,  Itamar  Franco,  Fernando  Henrique  Cardoso,  Luis  Inácio  Lula  da  Silva  e  Dilma  Rousseff 

  Fonte:  POVOS  Indígenas  no  Brasil.  ​ Demarcações  nos  últimos   seis  governos.  11  ago.  2015.  Disponível  em:  .  Acesso em: 12 set. 2015. 

            Figura 4 ­ Situação das terras indígenas no Brasil 

 

  Fonte:  POVOS  Indígenas  no  Brasil. ​ Situação  jurídica das TIs no  Brasil  hoje.  ​ 2015. Disponível  em:  .   Acesso  em:  10  set.  2015.  

   

 

 

  Figura  5  ­  Situação  das  terras  indígenas  na  Amazônia  Legal.  Estas  terras  representam 22,25% da extensão da Amazônia Legal 

  Fonte:  POVOS  Indígenas  no  Brasil. ​ Situação  jurídica das TIs no  Brasil  hoje.  ​ 2015. Disponível  em:  .   Acesso  em:  10  set.  2015.  

               

 

Figura 6 ­ demarcações na Amazônia Legal 

  Fonte:  POVOS  Indígenas  no  Brasil.  ​ Demarcações  nos  últimos   seis  governos.  11  ago.  2015.  Disponível  em:  .  Acesso em: 12 set. 2015 

           

 

Figura 7 ­ Terras Indígenas por Estado na Amazônia Legal (em 22/10/ 2014). 

  Fonte:  POVOS  Indígenas  no  Brasil.  ​ Localização  e  Extensão  das  TIs​ .  2015.  Disponível  em:  . Acesso em: 10 set. 2015 

     

 

 

Figura 8 – Projeto de Construção da Usina Belo Monte 

  Fonte:  DOSSIÊ:   Belo   Monte:  Não  há  condições  para  licença  de  operação.  São  Paulo:  Instituto  Socioambiental,  2015.  Disponível  em:   Acesso em: 12 set. 2015​ . 

     

 

 

Figura 9 – Remoção forçada das famílias e perda do modo de vida ribeirinho 

  Fonte:  DOSSIÊ:   Belo   Monte:  Não  há  condições  para  licença  de  operação.  São  Paulo:  Instituto  Socioambiental,  2015.  Disponível  em:   Acesso em: 12 set. 2015. 

   

 

 

 ​ Figura 10 – Plano emergencial indígena e desestruturação das aldeias 

  Fonte:  DOSSIÊ:   Belo   Monte:  Não  há  condições  para  licença  de  operação.  São  Paulo:  Instituto  Socioambiental,  2015.  Disponível  em:   Acesso em: 12 set. 2015​ . 

   

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