O DIREITO SUCESSÓRIO DO CÔNJUGE SOBREVIVENTE – ANÁLISE DETIDA DE CADA REGIME MATRIMONIAL

June 7, 2017 | Autor: M. Marcondes Rodr... | Categoria: Direito Civil, Direito de família, Sucessões, Herança, Direito das Sucessões
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O DIREITO SUCESSÓRIO DO CÔNJUGE SOBREVIVENTE – ANÁLISE DETIDA DE CADA REGIME MATRIMONIAL Marcela Marcondes Rodrigues SUMÁRIO: 1 Introdução. Direito sucessório do cônjuge sobrevivente 2. Atual entendimento do Superior Tribunal de Justiça a respeito do tema 2.1 Comunhão Universal. 2.2 Separação Obrigatória e Separação Convencional 2.3 Comunhão Parcial de Bens 2.4 Regime de Participação Final nos Aquestos 3. Conclusão. Referências

1 INTRODUÇÃO - DIREITO SUCESSÓRIO DO CÔNJUGE SOBREVIVENTE A respeito do direito sucessório do cônjuge sobrevivente, o Código Civil de 1916 dispunha que somente na falta de descendentes e ascendentes, e se, ainda, no tempo da morte do outro a sociedade conjugal não estivesse dissolvida, seria deferida a sucessão em favor do cônjuge sobrevivente. Contudo, o Código Civil atual alterou substancialmente este panorama, trazendo relevante modificação na ordem de sucessão hereditária, vez que o cônjuge sobrevivente foi elevado da posição de herdeiro facultativo e passou a ser incluído como herdeiro necessário, concorrendo diretamente com os descendentes e ascendentes. Sabe-se que na forma preconizada pelo artigo 1.846 do Código Civil os herdeiros têm direito a metade dos bens da herança, aqueles que constituem a legítima, que não podem ser diminuídos, onerados, gravados pelo autor da herança, salvo em caso de deserdação. Logo, o cônjuge na qualidade de herdeiro necessário, concorrerá em igualdade de condições com os herdeiros, na forma do artigo 1829 deste diploma legal. A este respeito, disserta o doutrinador Carlos Roberto Gonçalves: O cônjuge sobrevivente permanece em terceiro lugar na ordem de vocação hereditária, mas passa a concorrer em igualdade de condições com os descendentes do falecido, salvo quando já tenha direito à meação em face do regimente de bens do casamento. Na falta de descendentes, concorre com os ascendentes. Como herdeiro necessário tem direito à legítima como

os descendentes e os ascendentes do autor da herança.

2011, p. 168).

(GONÇALVES,

Entretanto, inicialmente, faz-se necessário analisar o regime matrimonial adotado pelo autor da herança, a fim de verificar se o cônjuge supérstite faria jus a herança na qualidade de herdeiro necessário, e, caso faça, concluir se herdaria sobre a totalidade da legítima ou somente sobre os bens particulares. Este é um assunto que foi por muito tempo debatido pela doutrina e pela jurisprudência, eis que diante de determinadas espécies de regimes matrimoniais a concorrência do cônjuge na herança junto aos descendentes pode resultar em confusão patrimonial. O próprio inciso I do artigo 1829 do Código Civil determina que não haverá concorrência com os descendentes sempre que o cônjuge supérstite estiver casado com o de cujos sob o regime matrimonial da comunhão universal de bens, na separação obrigatória (artigo 1641), ou, ainda, se casado pelo regime de comunhão parcial de bens, se não tiver deixado bens particulares. Portanto, é correto afirmar que na sucessão hereditária, a concorrência do cônjuge sobrevivente com os descendentes, assim como suas características finais, dependerá, diretamente, do regime matrimonial de bens adotado. 2 ATUAL ENTENDIMENTO DO SUPERIOR TRIBUNA DE JUSTIÇA A RESPEITO DO TEMA Conforme exposto, somente é possível concluir a respeito da concorrência cônjuge na sucessão hereditária, depois de analisado regime matrimonial adotado pelo de cujus. Após analisado o regime matrimonial, conclui-se a respeito da possibilidade de concorrência, para então, analisar se a concorrência se dará sobre toda a parte disponível ou somente sobre os bens particulares (se existentes). Em regra, não há concorrência do cônjuge sobrevivente com os descendentes do de cujus se o regime matrimonial adotado era o da comunhão universal, pois, nesta espécie, a confusão matrimonial já ocorre desde a celebração nupcial, pois garante ao cônjuge sobrevivo a proteção necessária, com a meação adquirida.

De igual forma, fica afastada a concorrência do cônjuge supérstite com os descendentes, nos casos em que o regimente matrimonial do casal era o de separação obrigatória (artigo 1641 do Código Civil), pois, uma vez que este regime de casamento não permite a comunicação dos bens no momento da constituição matrimonial, afasta-se por completo o direito de concorrência com os descendentes, evitando, desta forma, qualquer pretensão de burla à imposição legal. Ainda, o inciso I do artigo 1829 do Código Civil, determina que não haverá concorrência do cônjuge sobrevivente com os descendentes se, quando adotada a comunhão parcial de bens e o autor da herança não houver deixado bens particulares. Logo, ao nos exatos termos da supracitada disposição legal, conclui-se que neste regime matrimonial, apenas haverá concorrência sucessória entre os descendentes e o cônjuge supérstite, na hipótese de o cônjuge falecido já os possuir ao casar, ou, se lhe sobrevieram bens, na constância do casamento, por doação ou sucessão, ou os sub-rogados em seu lugar, na forma preconizada pelo artigo 1659, inciso I do Código Civil. Nas hipóteses em que os cônjuges tivessem adotado como regime de casamento a participação final nos aquestos, de igual forma aplicar-se-ia o entendimento de artigo 1829, inciso I, eis que neste regime aplicam-se as mesmas regras da comunhão parcial. Entretanto, este artigo que preconiza a respeito da concorrência do cônjuge supérstite com os descendentes do falecido somente na hipótese em que houver bens particulares, foi muito debatido pela doutrina e pela jurisprudência, vez que muitos doutrinadores sustentam que a participação do cônjuge deveria se dar sobre todo o acervo, em respeito ao princípio da indivisibilidade da herança. Neste sentido, leia-se a lição de Maria Helena Diniz: Para tanto, o consorte sobrevivo, por força do art. 1829, I, só poderá ser casado sob o regime de separação convencional de bens ou de comunhão parcial, embora a participação incida sobre todo o acervo hereditário e não somente nos particulares do de cujus. (...) Meação não é herança, pois os bens comuns são divididos, visto que a porção ideal deles já lhe pertencia. Havendo patrimônio particular, o cônjuge sobrevivo receberá sua meação, se casado sob o regime de comunhão parcial, e uma parcela sob todo o acervo hereditário (DINIZ, 2010, p.

105-106).

Enquanto isso, outros doutrinadores externam sua opinião de modo diverso, observe-se o entendimento de Zeno Veloso: A concorrência do cônjuge sobrevivente com os descendentes, se o casamente regeu-se pela comunhão parcial, já é uma situação excepcional, que, portanto, tem de receber interpretação restritiva. E, diante de um quadro em que o cônjuge aparece bastante beneficiado, não há base ou motivo, num caso de dúvida, para que se opte por uma decisão que prejudica os descendentes do de cujos, que, ademais, têm de suportar – se for o caso – o direito real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família, de que o cônjuge é titular, observado o artigo 1.831

(VELOSO, p. 145).

Destarte, a fim de dirimir tamanha divergência doutrinária e jurisprudencial, recentemente, o Superior Tribunal de Justiça julgou o Recurso Especial n° 1.368.123/SP, julgamento de relatoria do Ministro Sidnei Beneti, pacificando a matéria em debate. Sendo assim, na forma do atual entendimento deste Corte Superior, colaciona-se abaixo uma tabela contendo cada regime matrimonial e a concorrência, ou não, do cônjuge sobrevivente com os descendentes, sobre a totalidade da parte disponível ou se apenas sobre os bens particulares. PARTICIPAÇÃO REGIME

COMUNHÃO

SEPARAÇÃO

SEPARAÇÃO

COMUNHÃO

FINAL

NOS

MATRIMONIAL

UNIVERSAL

OBRIGATÓRIA

CONVENCIONAL

PARCIAL

AQUESTOS

Não herda

Não herda

Não herda

Herda

Herda somente

somente se

se houver bens

houver bens

particulares

particulares

A seguir, observa-se detalhadamente o entendimento do Superior Tribunal de Justiça a respeito da concorrência do cônjuge sobrevivente em cada regime matrimonial.

2.1 COMUNHÃO UNIVERSAL Conforme já previamente exposto, na comunhão universal não há concorrência do cônjuge sobrevivente com os descendentes na sucessão, eis que o regime matrimonial adotado já garante ao cônjuge à meação sobre a totalidade dos bens, conferindo-lhe a proteção necessária. Segundo o Ministro Sidnei Beneti no julgamento do Resp de n° 1.368.12/SP, admitir tal privilégio ao cônjuge sobrevivente, poderia representar vantagem excessiva. Entende-se, assim, que a intenção do legislador ao conferir a possibilidade de concorrência com as descendentes na sucessão, foi proteger o cônjuge desprovido de meação, o que não ocorre no regime de comunhão universal. 2.2 SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA E SEPARAÇÃO CONVENCIONAL No regime matrimonial de separação obrigatória – hipóteses elencadas pelo legislador no artigo 1641 do Código Civil – não há concorrência do cônjuge supérstite com os descendentes na sucessão, vez que se trata de uma imposição da legislação para as pessoas que contraírem matrimônio com inobservância das causas suspensivas, forem maiores de 60 anos, ou dependerem de suprimento judicial para casar. Enquanto à separação convencional, decorre da vontade dos cônjuges em não terem os bens particulares, tampouco, os adquiridos na constância do casamento, comunicados. Na forma da recente decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça: “Se o objetivo deste regime é preservar a identidade patrimonial de casa cônjuge, não haveria sentido em se admitir a frustração desse escopo justamente no momento da morte. A comunicação no momento da sucessão representaria uma contradição ao próprio espirito do regime de bens em questão, tenha ele sido imposto pela vontade das partes (separação convencional) ou por força da lei (separação lega)l” – Resp n° 1.368.123/SP. Logo, a separação total dos bens dos cônjuges é permanente, não se comunicando, inclusive, os adquiridos na constância do casamento.

2.3 COMUNHÃO PARCIAL Neste regime de casamento, é onde residiu por muito tempo a discussão doutrinária

e

jurisprudencial,

em

atenção,

principalmente,

ao

princípio

a

indivisibilidade da herança. Entretanto, o Superior Tribunal de Justiça dirimiu esta questão, pacificando o entendimento no sentido que o cônjuge supérstite concorrerá com os descendentes do de cujus, somente sobre os bens particulares, se existentes. No julgamento do Resp n° 1.368.123/SP, proferido pela Segunda Seção do STJ, o Ministro Relator Sidnei Beneti, reconheceu que o entendimento por ele adotado não está isento a críticas, porém, pautado da função de uniformizador da lei federal, asseverou que deve: “(...) interpretar a norma de modo a preserva o máximo a lógica e a unidade do sistema, resistindo à tentação de seguir determinada linha interpretativa, apenas porque, no caso concreto, ela conduz mais facilmente ao resultado justo. É preciso recordar o efeito didático e multiplicador que têm os precedentes desta Corte e estar atento ao fato de que a mesma opção hermenêutica pode, transportada para outra realidade fática, revela-se completamente desastrosa.

Assim, concluiu que seria mais adequado, diante do sistema sucessório inaugurado em 2002, afirmar que o cônjuge sobrevivente concorrerá com os descendentes na sucessão do consorte falecido, apenas quanto aos bens particulares que houver deixado. De modo que, não havendo bens particulares, não há razão para assegurar qualquer quinhão ao cônjuge em detrimento aos descendentes, mas somente, a meação que faria jus, em decorrência do regime de bens adotado. Entretanto, cumpre esclarecer que no julgamento deste recurso, o próprio Ministro Relator sustentou que a questão em debate “talvez seja mesmo insuperável”, mas concluiu que o que importa é uniformizar a aplicação da lei federal indicando a interpretação mais afeita ao sistema. Portanto, no caso em comento, é possível concluir que a interpretação mais afeita ao sistema é no sentido de que, quando adotado o regimento matrimonial de separação parcial de bens, na sucessão, o cônjuge supérstite concorrerá com os descendentes, somente sobre os bens particulares, quando existentes.

Salienta-se, por fim, que se os descendentes forem comuns, na herança, a quota do cônjuge sobrevivente não pode ser inferior à quarta parte possível da herança, ou seja, dos bens particulares. 2.4 REGIME DE PARTICIPAÇÃO FINAL NOS AQUESTOS Por fim, para o regimente matrimonial de participação final nos aquestos, embora não haja legislação específica a este respeito, entende-se que são aplicáveis as mesmas regras inerentes ao regime de comunhão parcial de bens. Portanto, nesta hipótese, de igual forma o cônjuge sobrevivente, somente concorrerá com os descendentes sobre os bens particulares, se existentes. 3 CONCLUSÃO Percebe-se que a matéria em estudo apresentou por muito tempo grande controvérsia. Contudo, o Superior Tribunal de Justiça, em julgamento do Resp 1.368.123/SP, proferido pela Segunda Seção desta Corte na qualidade de uniformizador da aplicação da Lei Federal, entendeu que, na forma do regramento sucessório inaugurado em 2002 pelo Código Civil, no regime de comunhão parcial de bens o cônjuge supérstite concorrerá com os descendentes somente sobre os bens particulares, se existentes. Portanto, referido entendimento é aplicável, de igual forma, ao regime de participação final nos aquestos, eis que ambos os regimes compartilham dos mesmos regramentos. Por fim, nos regimes matrimonias de comunhão universal, separação obrigatória e separação convencional, não há o que se falar na concorrência sucessória do cônjuge com os descendentes.

REFERÊNCIAS GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil brasileiro/ Direito das Sucessões. Vol. 7. 6 ed. São Paulo: Saraiva, 2012 DELGADO, Mário Luiz. Revista IBDFAM: Famílias e Sucessões. Vol.11 (set/out). Belo Horizonte: IBDFAM, 2015.

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