O Encanto das Trovas - Tomo I: Ceará

June 13, 2017 | Autor: Jose Feldman | Categoria: Poesia, Trovador, Trovadorismo, Trovas
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O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 1

SUMÁRIO Francisco José Pessoa de Andrade Reis ....................................................... 3 Fernando Câncio de Araújo ....................................................................... 10 Haroldo Lyra ............................................................................................. 14 Giselda de Medeiros Albuquerque .............................................................. 19 Aloísio Alves da Costa................................................................................ 23 Nemésio Prata Crisóstomo ......................................................................... 31 Aloísio Bezerra .......................................................................................... 40 Santiago Vasques Filho ............................................................................. 45 Adaucto Soares Gondim ............................................................................ 53

O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 2

1 A cobiça sendo um vício e a renúncia salutar, nosso menor sacrifício é saber renunciar.

2 Aconteça o que aconteça eu nunca vou desistir… por trás da nuvem espessa, tem sempre um sol a sorrir! 3 À minha mulher confesso: - Na atual encarnação, para apressar teu progresso sou a tua expiação! 4 Aquele pé de carvalho plantado em minha lembrança, cintila gotas de orvalho quando me vejo criança. 5 À tardinha, todo dia, assisto o chegar do trem, esperando por Maria só que Maria não vem. O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 3

6 A poça d’água na rua de repente se prateia… espelho tosco da lua em noite de lua cheia. 7 As estrelas não fenecem perante à luz que encandeia, mas docemente adormecem se a noite é de lua cheia. 8 De forma vil, ilusória, o falaz aos ventos, berra, cantando sua vitória sem ter terminado a guerra! 9 Eis o grande desafio para quem se diz cristão: - ter que dizer, renuncio, em favor de um outro irmão!

10 É quando a noite se enluta envolta em intenso véu, que a estrelinha diminuta empresta luz para o céu. 11 Esplendor tens, de tal monta, quando passeias na praça, que a lua se esconde, tonta, atrás da nuvem que passa. 12 Esta vidinha da gente tal a serra é mesmo assim… ora subida ou vertente num sobe e desce sem fim. 13 “Faça-se a luz”! e ao fazê-la com muito amor e carinho, Deus colocou uma estrela a clarear meu caminho. O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 4

14 Feliz da vida se logra o Zeca exibe o caneco, que ele trocou pela sogra na feira de cacareco. 15 Homem com muitos trejeitos, mulher com muita feiúra para mim são dois defeitos que nem com reza tem cura! 16 Já que não posso mantê-las ao alcance do meu braço, eu canto minhas estrelas em cada verso que faço. 17 Mãe é palavra seleta por si só uma obra prima, pois mesmo o maior poeta procura e não acha rima!

18 Mesmo que lhe desagrade, dentre os sabores prefira o amargo de uma verdade ao doce de uma mentira. 19 Meus sonhos por si navegam levando-me ao transcendente, por mil estradas enxergam bem mais do que enxerga a gente. 20 Minha mãe, quanta lembrança, quem me dera tal jaez… eu voltar a ser criança começar tudo outra vez. 21 Minhas lágrimas vertidas por entre dobras de rugas, são saudades incontidas do meu passado... são fugas! O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 5

22 Na avenida do fracasso onde a humanidade avança, em cada esquina que passo eu planto um pé de esperança. 23 Não há placa de chegada na minha estrada da vida… faço de cada parada novo ponto de partida. 24 Na solidão com frequência escutamos uma voz… deve ser nossa consciência querendo falar por nós! 25 Nas veredas tortuosas dessa vida em desalinhos, nas retas eu colho as rosas nas curvas tiro os espinhos.

26 Noel Rosa, quem diria, sem cigarro e sem chapéu, chegou só, sem parceria, pra fazer samba no céu. 27 Noitinha volto da roça e Rosa com seu pudor, apaga a luz da palhoça pra gente fazer amor. 28 Nos quatro dias de Momo ante tanta bebedeira, eu estarei, não sei como, quando chegar quarta-feira! 29 Nossas faces, pergaminho, rastro do tempo que, algoz, não apagou o carinho que ainda existe entre nós! O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 6

30 Nossa vida não tem prazo e tal o dia, é assim: um surgimento, um ocaso, que por acaso é sem fim! 31 Nos trigais do sentimento que contra o vento eu transponho, cozi o pão sem fermento no forno quente de um sonho. 32 O amor seria fecundo como tal se espalharia, se toda mãe que há no mundo tivesse um nome…Maria! 33 O intenso amor que nos une e nos completa, querida, faz a nossa vida imune às incertezas da vida.

34 O inverno se me avizinha e, no espelho, a contragosto, vejo que o tempo caminha deixando o rastro em meu rosto. 35 O meu amor quis safar-se de mim, então me escondi; de rosa era seu disfarce… fui, sorrateiro, e a colhi! 36 O nosso amor passageiro tal orvalho evaporou… nasceu e morreu ligeiro, que nem saudade deixou. 37 O pó que emana do giz e o salário sem valor, tornam bem mais infeliz a vida do professor! O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 7

38 O sentimento de culpa se esconde na consciência de quem fere e se desculpa a suplicar inocência. 39 Os gritos de liberdade abafados por censuras, viram ecos de piedade nos porões das ditaduras. 40 O sol, gigante centelha, torna-se mais colossal, quando nascendo se espelha nas águas do pantanal. 41 Por mais que em ti não pensasse uma lágrima escorria, irrigando a minha face, onde eu plantei nostalgia.

42 Por sofrer tantos açoites nos meus momentos tristonhos, pus redoma em minhas noites para prender-te em meus sonhos 43 Quando o sol arquiva o dia e o expediente se encerra, ecoa a Ave-Maria nos escritórios da serra! 44 Quantos banquetes regados a vinho, trufa e salmão… quantos irmãos relegados sem água, sem luz, sem pão! 45 Quem diz ter brilho e alardeia desdenhando o semelhante, esquece que a lua cheia tem seus dias de minguante! O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 8

46 Quem faz da vida um disfarce e finge viver a esmo, de tudo pode safar-se mas não engana a si mesmo! 47 Quem não quer vencer a estrada como faz o peregrino, dobra sempre a esquina errada na contramão do destino. 48 Saudade é o tempo guardado dentro do peito da gente... Nó que se dá, no passado, e se desfaz no presente. 49 Sem usar pincel ou tinta apenas com seu clarão, a lua cheia repinta as veredas do sertão.

50 Soluça vazia, a rede, o armador emudeceu, marcas de pé, na parede, choram tanto quanto eu!… 51 Subo às nuvens… fantasia… e para o amor espalhar, solto minha poesia com rimas soltas ao ar. 52 Todo indivíduo que é tolo mas que de sábio se arvora, é tal um pão sem miolo… só tem a casca por fora! 53 Vai estudante, buscar conhecimento fecundo pois, és a pedra angular na construção do teu mundo! O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 9

1 Adeus... e foste saindo, dizendo que voltarias... E a saudade entrou sorrindo, da mentira que dizias... 2 A ilusão da meninice com meus netos se refez: – agora, em plena velhice, eu sou criança outra vez!… 3 A mão triste, vacilante, de porta em porta estendida, é o troféu mais humilhante que o pobre ganha na vida. 4 A mulher do seu Ventura tem o beijo tão sugante, que engoliu a dentadura do dito... 'naquele instante"… O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 10

5 Ao ver-te assim neste encanto, mãos postas em oração, fiquei invejando o santo que olhavas com devoção. 6 A vida de faz-de-conta que levo desde menino, é brinquedo de desmonta nas peças do meu destino... 7 Bimbalham sinos tristonhos entre as horas esquecidas, como a lembrar velhos sonhos perdidos em nossas vidas… 8 Enquanto o sino da igreja martela o bronze perfeito, minha saudade solfeja na catedral do meu peito…

9 Entre velhos e crianças há dois sinos na medida. Quando um bimbalha: – Esperanças. O outro bate o “pôr-da-vida”. 10 Era um poeta de mão cheia, hippie, cabelos revoltos... Só poetava na cadeia, detestava versos soltos! 11 Meus olhos cheios de mágoa buscam as pedras do chão, são dois riachos sem água perdidos na imensidão… 12 Nas tardes calmas sentidas Bem-te-vi - que afinidade: – tu a cantar - tristes vidas eu, vida triste - saudade! O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 11

13 Na velha igreja em ruína, desprezada em abandono, a cruz cansada se inclina, boceja o sino de sono. 14 Nesta saudade abrangente que maltrata qual açoite, vejo teu vulto silente passando dentro da noite! 15 No palco azul desta vida toda paixão é uma fraude, pois no ato da despedida somente a saudade aplaude... 16 O morro grita o seu nome num frenesi sem igual e vai sambando com fome a deusa do carnaval!

17 O nosso sonho termina num adeus triste, exaltado, deixando no chão da esquina o teu retrato rasgado! 18 O que me importa a saudade se os netos brincam lá fora, a renovar a ansiedade dos velhos sonhos de outrora?!... 19 Pescador dos verdes mares, quando embarca em procissão, nos lábios leva cantares e no peito uma oração… 20 Saudade, marcas doridas de um momento que passou; bandeirinhas coloridas que o tempo nunca rasgou. O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 12

21 Se de lágrimas brotasse a água carente do agreste, talvez nunca mais faltasse inverno no meu Nordeste. 22 Sertanejo, envelheceste, tal cardo nascido ao léu: – quantas secas tu venceste com os olhos postos no céu. 23 Tarde sem chuvas, de estio. Cigarras, que afinidade, passamos horas a fio cantando a mesma saudade...

O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 13

1 A gaiola me resguarda da fatal atiradeira: – do chumbo da espingarda, da pedra da baladeira.

2 A juventude sadia brincando cria um evento, com lindo sorriso envia buquê de flores ao vento. 3 A rede armada na praia, lazer que embala o casal, que no Ceará se espraia ao longo do litoral. 4 A sombra da juventude na parede projetada, contrasta com lassitude da velhice na calçada. 5 Bailar na vida é rotina de quem sabe ser feliz, e nunca fecha a cortina do baile que não tem bis. O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 14

6 Cai a chuva sobre a terra em queda fenomenal; quanta alegria que encerra até banhando o casal. 7 Cenas de tempos passados, que à saudade satisfazem, evocam sonhos dourados e muito a tantos aprazem. 8 Confirma-se o sofrimento do pobre homem, coitado!... pois desde o seu casamento que ele vive acorrentado. 9 Comprova a fama que traz, o casal protagonista desse filme ora em cartaz, intitulado turista.

10 Considero a efervescência dessa densa multidão, estressante consequência da tal globalização. 11 Com sua vela enfunada não lhe intimidam navios e singra, afoita jangada, os verdes mares bravios. 12 Cores de outono bizarro que a paisagem modifica; E a estrada tosca de barro juncada de folhas fica. 13 Era um garoto travesso, Um mestre na peraltice: - virava tudo ao avesso, era o rei da macaquice. O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 15

14 Essa fumaça abismal configura um retrocesso atroz e paradoxal, nas esteiras do progresso. 15 Fora a lida humanitária, do trabalho grande amiga, herdara dessa operária o denodo da formiga. 16 Gosto de me divertir nas belas praias do Iguape, mas acho melhor curtir a serra de Maranguape. 17 Já tenho setenta e três nessa tal melhor idade, versando com lucidez e muita felicidade.

18 No cais, sem vela, ancorado, o barco sofre a lacuna, de um capitão reformado que abandonou velha escuna. 19 No mar da vida sonhei com a rota certa e fiel. Sereno, as vagas singrei num barquinho de papel. 20 Nos acordes, uma festa, namoro no coração; são enlevos da seresta nas cordas de um violão. 21 O arrojo dos alpinistas arrepia tal qual túmulos, mormente quando as conquistas escalam os níveos cúmulos. O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 16

22 Oh! vento que vela enfunas. Oh! buggy aberto ao terral, cinzelando as alvas dunas ornam praias de Natal. 23 Olhando a fotografia me confunde um leve açoite: – no relógio é meio-dia ou será que é meia-noite? 24 O luar no mar refrata feixe de raios azuis, realça a onda e retrata a praia que nos seduz. 25 Ontem pujante esperança numas linhas refratárias; no caderno, hoje, a lembrança das minhas trovas primárias.

26 Os sentimentos do mar as ondas cantam na areia, afagando o firme olhar da solitária sereia. 27 Para o carinho colher, por Maranguape eu passava, subia a serra a rever a noiva que ali morava. 28 Permita entrar meu amor pela porta da afeição, para expulsar o torpor que anula a sua razão. 29 Pode até conter amor, mas a emoção será pouca: – beijos por computador!... prefiro os de boca à boca. O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 17

30 Pra viagem convidado, chegou depois da partida. Convém tomar mais cuidado: – se não, perde o trem da vida. 31 Quanto mais vai apertando tanto mais fica gostoso, com esse aperto estreitando, doce abraço carinhoso!... 32 Quisera que sempre houvesse nas mãos que dominam o mundo, a força que o amor exerce num viver livre e fecundo. 33 Rio de curvas simétricas emoldurando a paisagem, cinzela as veias poéticas da natureza selvagem

34 Tens a missão importante num mar sereno ou escuro, indicando ao navegante aquele porto seguro. 35 Terra de gente importante que em Maranguape nasceu: - do Chico, comediante; d’um Capistrano de Abreu. 36 Um carinho especial dispensei à margarida; essa flor que hoje é vital no jardim da minha vida. 37 Vai disposto e sorridente, o senil casal surfar. Quanta alegria evidente por se divertir no mar. O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 18

1 Aprendi, na tua ausência, uma lição ponderada: – que a espera, com paciência, torna mais breve a chegada.

2 As trovas são diamantes que certo ourives, um dia, com suas mãos operantes, cravou no anel da poesia. 3 Cem anos da abolição e o negro sofre a desgraça de acorrentar-se à prisão do preconceito da raça! 4 Chove a cântaros... e o frio cai sobre tudo, por fim... E, enchendo este meu vazio, chovem saudades em mim... 5 É carnaval… e em meu peito qual um sagaz folião, brinca o meu sonho desfeito nas alas da solidão… O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 19

6 É o mais belo panorama e de Deus o melhor verso o sol ressurgindo em chama, banhando de ouro o universo. 7 Essas rugas que há no rosto, mostrando a idade inclemente, são rumos onde o desgosto caminha, pisando a gente. 8 Esse gemido tristonho das ondas, sempre a chorar, é a voz queixosa de um sonho preso nas conchas do mar! 9 Felicidade... momentos de emoções transcendentais, que se vão na asa dos ventos e não voltam nunca mais!

10 Lançada a sorte! Em verdade, eu parti... Mares medonhos!... E, no Porto da Saudade, fui ancorar com meus sonhos… 11 Leu tanto amor… e, no entanto, sozinha, a cigana, à morte, convive com o desencanto de não ler a própria sorte!… 12 Não deixes preto o teu céu... Vê que as grandes tempestades espalham sombras ao léu, mas vêm, depois, claridades. 13 Nesta existência sofrida, triste certeza me invade: – o sonho ardendo na vida, e a vida a arder na saudade. O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 20

14 O teu adeus, mesmo em sonho, me aniquila de tal sorte que, estando viva, suponho estar nos braços da morte! 15 Por te amar tão loucamente, fui-me tornando um palhaço, fazendo rir tanta gente às custas do meu fracasso. 16 Por um momento de sonho, que dure uma eternidade, darei tudo e não me oponho a viver só da saudade. 17 Ri, palhaço, que o teu riso vai à dor dar acolhida, transformando em paraíso teu picadeiro da vida.

18 Se a noite vem, com azedume, vestindo de preto o céu, que sejas tu, vagalume, e espalhes luz a granel. 19 Sê como o mar, grandioso, cujo esplendor estonteia, mas, humilde e generoso, vem bordar rendas na areia! 20 Se vires um tom de escuro na trilha dos rumos teus, não temas, e vai seguro, que é a sombra da mão de Deus. 21 Sublime, aquele momento em que o poeta, risonho, põe asas no pensamento e voa, buscando o sonho. O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 21

22 Tenta esconder o teu pranto, às frustrações, ao desgosto, pois não há maior encanto que mostrar a paz no rosto. 23 Teu olhar, por sorte, às águas, sombra nenhuma deixou, no entanto deixou-me mágoas nesta sombra que hoje eu sou! 24 Teus olhos, ardentes círios, meus dias tornam risonhos, e tuas mãos, brancos lírios, vão modelando meus sonhos.

25 Vasculhando meu passado, encontrei nele, tristonho, teu retrato empoeirado na gaveta do meu sonho. 26 Vencendo todo o cansaço, decerto gargalharei, pois hoje sou um palhaço dos sonhos que não sonhei.

O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 22

1 Agora que tu partiste e a saudade está chegando, desculpe o meu verso triste, minha musa está chorando!...

2 Amarela é a cor mais bela e é fácil de soletrar: - é bastante unir com "Ela", as letras do verbo "Amar"!... 3 Ante o medo que angustia, talvez a grande mensagem, fosse a que Deus nos diria ... - Coragem, filho, coragem ... 4 Ao se pesar, a Constança, que é gorda e não pesa pouco, comenta, sobre a balança: - Esse ponteiro está louco!... 5 Aos sonhos nunca se apegue, que eles se vão de repente... e sonho que se persegue é o que mais foge da gente!... O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 23

6 As musas, não posso vê-las... vivem num mundo distante... mas posso além das estrelas ouvi-las a todo instante 7 Bonança e paz sobre a terra é tudo que peço a Deus, para que as armas de guerra virem peças de museus. 8 Buscando instantes felizes pelos caminhos tristonhos, foram tantos meus deslizes que tropecei nos meus sonhos!... 9 Castigado desde cedo, tanto apanhei do destino, que nunca tendo um brinquedo, nem lembro que fui menino.

10 Chegada bem mais feliz, bem mais alegre, suponho, é a de quem faz o que eu fiz: - cheguei trazendo o meu sonho!... 11 Creio em Deus, unicamente não ando rezando à-toa... - tenho uma alma que sente e um coração que perdoa! 12 Dando na alma embevecida, laços de amor e amizade, fui, na jangada da vida um pescador de saudade!... 13 Dentro da noite inclemente De frio intenso e garoa, o agrado de um beijo quente garante que a noite é boa!... O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 24

14 Dói a saudade em meu peito e eu canto, não silencio... Quanto mais pedras no leito mais alto o canto do rio! 15 Dos ideais o maior é viver, lutar, e, após, deixar um mundo melhor aos que vêm depois de nós. 16 Dos jogos o mais nocivo, até hoje, em meu caminho, tem sido o rebolativo da mulher do meu vizinho! 17 Enquanto o Zé Liberato sai em busca da gatinha, pela janela entra um gato que janta a sua sardinha!

18 Era uma vez uma dona que andava a pé, sem ninguém; e tanto pediu carona, que ganhou carro também! ... 19 Esta saudade infinita do amor que a gente viveu, é a mensagem mais bonita que o meu passado viveu!... 20 Feito de essência divina e fluidos de eternidade, um grande amor não termina, mas se transforma em saudade! 21 Feliz é quem, pela vida, envelhecendo sem fugas, alegre e de fronte erguida, zomba do espelho e das rugas. O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 25

22 Já diz o velho ditado, que lenha verde e viúva, com paciência e cuidado pegam fogo até na chuva!... 23 Mensagem que se recebe e nos enche de quimeras, é aquela em que se percebe que as palavras são sinceras 24 Meu sonho em mágoa desfeito, tão grande fez meu desgosto, que não cabendo em meu peito se fez pranto no meu rosto!... 25 Minha irmã conta as topadas, que já deu pelos caminhos, pelas pedras arrancadas... - E eu conto, pelos sobrinhos!...

26 - Na carta que ela me fez, nas reticências sem fim, a incerteza de um "talvez" dá-me esperanças de um "sim"... 27 Na farmácia, ao ver o busto da balconista, hesitante, em vez de xarope, o Augusto pediu mesmo foi calmante!... 28 Na linha desta saudade, que é tua e também é minha, nós somos nós de verdade nas duas pontas da linha! 29 Na luta contra a cobiça, mantendo na alma a esperança, meu desejo de justiça é maior que o de vingança! O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 26

30 Não busques falso tesouro se bens duráveis garimpas... Nem sempre as mãos que têm ouro e pedras raras, são limpas... 31 Não condeno o revoltado que defende seu direito... – revolta de injustiçado, merece todo respeito! 32 Não preciso, mãe, no templo, rezar tanto de joelhos... - Minha luz é o teu exemplo, minha prece os teus conselhos!... 33 Na tua ausência, ao meu lado em cima da nossa mesa, o candelabro apagado mantém a saudade acesa.

34 Na tumba da falecida, o esposo ciumento, à porta, murmura: - Volta, querida. E ela responde: - Nem morta! 35 Nem ouro, nem pedra rara, nada que vem do garimpo, vale um fio de água clara no leito de um rio limpo... 36 No momento doce e breve que a inspiração nos invade, dos versos que a gente escreve, a musa escreve metade!... 37 Num armário sem conforto, do qual não guardo saudade, guardado, me fiz de morto, pra não morrer de verdade... O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 27

38 O meu cansaço é tamanho, que, na mesma caminhada, eu quase não acompanho minha sombra na calçada! 39 Partiste, chorando tanto, no teu rumo oposto ao meu, que, solidário ao teu pranto, o céu fechou-se... e choveu... 40 Partiste, cigana errante, e de uma noite em teu leito, restou-me um sonho distante e esta saudade em meu peito!... 41 Peço a Deus que o tempo corra, e corra a nosso favor, para que este amor não morra antes que eu morra de amor!…

42 - Pelas ruas da lembrança, nas cirandas das calçadas, saudade, sonho e esperança, brincam juntos de mãos dadas! 43 Pelos motivo da guerra e pela falta de pão, não culpo quem fez a terra, mas quem fez a divisão. 44 Quando a lei se faz omissa e a impunidade se solta, do silêncio da justiça surgem gritos de revolta... 45 Quando a noiva viu a cama que a esperava pra dormir, mandou sustar o proclama e desistiu do faquir!... O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 28

46 Quando a vida se complica nas horas de solidão, amigo é aquele que fica depois que os outros se vão. 47 Quando a voz de um pai ressoa e a de um filho abaixa o tom, conselho é semente boa, plantada em terreno bom! 48 Quando instantes de carinho, trazem saudades depois, lembrança é viver sozinho de um sonho vivido a dois. 49 Quando não vens, na ansiedade desses momentos perversos, vem a musa da saudade pôr mais saudade em meus versos.

50 - Quando o amor se faz lembrança e a solidão nos invade, ou se vive de esperança ou se morre de saudade... 51 Quem não aprende em menino, tem que aprender na velhice, que ter pai pobre é destino, mas sogro pobre é burrice!… 52 Sambando quase pelada, no 'No bloco do vai sem medo", Paulete foi mais cantada que o refrão do samba enredo.. 53 Sempre que a vida me nega segurança nos meus passos, minha esperança me pega e me carrega nos braços! O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 29

54 Sendo orador de alta escala, é tão profundo e erudito, que a gente, quando ele fala, só entende o... "tenho dito". 55 Se o telefone falasse o que nele a gente fala, duvido que alguém deixasse o telefone na sala!... 56 Somente um bem acontece quando a gente cai doente: doente é que se conhece quem é amigo da gente. 57 Sou de onde o vento trabalha, lá onde a brisa fagueira embala de leve a palha, beijando a carnaubeira! ...

58 Teimei no amor... e errei tanto na teimosia de amar, que eu mesmo não sei mais quanto errei tentando acertar!... 59 Teu olhar... a voz macia... tuas promessas de amor... - são notas de fantasia na pauta da minha dor. 60 Vencendo o tempo e a distância, mensagens da mocidade, sempre nos trazem da infância, saudade ... muita saudade... 61 Volátil, discreta e doce, no instante certo, presente, a musa é como se fosse o anjo-da-guarda da gente… O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 30

1 A droga foi seu arpéu, sem destino, destroçado, vagueia na rua, ao léu, até quando for "levado"!

2 Antes do quebrar da barra, ao canto do caboré, sussurrando, ela me agarra, dizendo: hora do café! 3 Ao relento, relegado, negado pelo destino; hoje vive escravizado, coitado; que desatino! 4 Ao ver a imagem singela do barco, tranquilo, ao mar, lembrei-me: não há procela que Deus não possa acalmar! 5 Chorando, segue o andarilho solitário, a sua dor; de deixar pra trás um filho, fruto de um fugaz amor! O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 31

6 Com talento e sutileza no salão, "a media luz", o casal mostra a leveza do belo tango andaluz! 7 Coração, enquanto bate, é vida, amor e paixão; mas depois que ele se abate, é vela, choro e caixão! 8 Correndo, desesperado, de mala e chapéu na mão, o passageiro, coitado, perdeu o trem... e a razão! 9 Deixe a Natureza em paz, rapaz, tenha mais juízo; pois isso que você faz demonstra falta de siso!

10 Descendo esta escadaria Onde ela vai me levar? Se eu soubesse eu desceria; Como não sei, vou ficar! 11 Despertando, reparei a "louça" já preparada em nossa cama, e tomei o "Café" da madrugada! 12 De toda trova legenda que já fiz na minha vida esta veio de encomenda, pois não dei nem a partida! 13 De tudo que eu aprendi pra chegar a ser “doutor”, se, bem, eu o compreendi: devo muito ao Professor! O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 32

14 Deus me livre, por um dia me faltar um Livro a mão; de tristeza eu morreria, em pungente solidão! 15 Deus, o Poeta dos Poetas, é TROVADOR; e em poesias manda-nos netos e netas para encher-nos de alegrias! 16 Dizem, com propriedade, que a saudade é inexplicável; explica-se: na verdade, o senti-la é indecifrável! 17 Dois minutos, Cinderela; está chegando o momento! Não vá cair na esparrela de esquecer o encantamento!

18 É noite, e a brisa do sono sopra, mansa e sorrateira; em seus braços me abandono, enroscado, a noite inteira! 19 Entre lágrimas e risos, respostas às emoções, liberamos sentimentos represos nos corações! 20 Férias! Ah, sim, bem eu sei, que és bem merecedora; mas, cá, não esquecerei de ti, grande trovadora! 21 Homem, mau, vil e perverso; toda vez que tu desmatas, mesmo em nome do progresso, é a ti mesmo que tu matas! O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 33

22 Já não suportamos mais ver os nossos pequeninos, nas mãos destes marginais: – traficantes-assassinos! 23 Lancei minha rede ao mar e pesquei bela sereia que comigo foi deitar noutra rede, em plena areia! 24 Maranguape a tua glória são teus filhos de valor; foi Capistrano, na História, e Chico Anísio, no Humor! 25 Na mata o machado bate forte pra tirar "madeira"; e assim o "homem" abate, uma a uma, a mata inteira!

26 Na mão o toco de giz, na outra, o apagador; na assistência o aprendiz, no tablado o Professor! 27 Não "curta" a sua velhice dando voz ao seu lamento; deixe dessa "caduquice" seu "velhote" rabugento! 28 Não queiras por teu amigo quem não pode ser provado no dar água, pão e abrigo, para alguém necessitado! 29 Na solidão do meu eu, fugindo da realidade, meu pensamento varreu da mente toda verdade! O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 34

30 No céu, as nuvens, e as flores, no campo; um quadro sem par. É Deus tingindo de cores a Primavera a chegar! 31 Nos bailes não dava trela, e a todos dizia não; mas no fim foi a donzela quem "dançou": ficou na mão! 32 Nos braços do seu amor, loucamente apaixonada, ela sente o seu calor mesmo sob a chuvarada! 33 O ato de ler praticado com prazer, pelo leitor; no final, seu resultado, assemelha-se ao do amor!

34 O bailarino, indeciso, na chuva, dá mil volteios; e o lampião diz, bem preciso: homem, deixe de rodeios! 35 O envelhecer é sublime presente a nós concedido por Deus; o que bem exprime: Dele, ninguém é esquecido! 36 Olhando com bem clareza pras marcas do seu herdeiro, já não tem tanta certeza de ser o pai verdadeiro! 37 Olho azul, branco e lourinho o filho do "Zé Negão" lembrava mais o vizinho; coitado, tinha razão! O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 35

38 Os dois silentes, colados, corações a palpitar; olhares apaixonados... já pensou no que vai dar? 39 Para cuidar da saúde com desvelo e competência busco Médico amiúde, amigo, de preferência! 40 Passei horas meditando, pensando no que dizer; terminei nada compondo, sem nada para escrever! 41 Perdido na multidão das ruas, sem ter alguém que ao menos lhe estenda a mão; não passa de um "Zé Ninguém"!

42 Pintor, por que teimas ver o teu sol onde ele não pode mais aparecer, vítima da poluição? 43 Por aqui passava um rio caudaloso e pleno em vida; hoje mal se vê um fio d'água suja e poluída! 44 Quando chove no sertão o sertanejo se apega ao santo de devoção, esperando pela sega! 45 Quem ama a literatura, e a ela se entrega, tem prazer não só na leitura, mas, no produzir, também! O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 36

46 Quem busca noiva, é preciso que tome muito cuidado; procure uma de bom siso, pra não terminar "ornado"! 47 Quem corta, na natureza, árvores sem precisão, destrói-a e deixa-a indefesa; é um ser sem coração! 48 Selva: bela e exuberante; cria, de rara beleza, de Deus que, naquele instante, nominou-a... Natureza! 49 Sem um "pingo" de pudor o mar fita a lua, arfante, clamando: vem meu amor, quero te ter por amante!

50 Ser Poeta neste mundo é cultivar nele o Amor; sentimento mais fecundo na vida do TROVADOR! 51 Se tu estás velho, também, mais perto de Deus tu estás; tem tu, pois, por grande bem ser velho, e bem viverás! 52 Se você anda amargado, tristonho, ou com grande dor, procure ser "medicado" por um Doutor TROVADOR! 53 Se você sofre de tédio só tem um jeito: tomar TROVADOR, santo remédio; e seu tédio vai passar! O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 37

54 - Solta-me! Clama o navio ao cais que o faz prisioneiro; - deixa-me sair vadio pelo mar... que é meu parceiro! 55 Tem coisas que não se explica na vida de um TROVADOR; uma: é quanto ele mais fica só, mais cultiva o Amor! 56 Tem Poeta nesta terra que seus versos dão prazer de lê-los, pois ele encerra numa Trova o seu dizer! 57 Tem quem só quer receber para si o que é melhor, porém ao aparecer chance pra dar: – dá o pior!

58 Toda noite o seresteiro aguardava a madrugada para declarar, faceiro, seu amor à sua amada! 59 Todo livro deve que ter "título" bem eficaz... pois não é que o meu vai ser: – Leia-me... (se for capaz). 60 Triste sina a da criança deste meu Brasil gigante; vive “presa” na esperança de escapar do traficante! 61 Uma folha de caderno, um lápis, e a inspiração, bastam ao trovador terno pra lhe abrir o coração! O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 38

62 Vendo a imensidão do mar pensei cá, com meus botões: – se esta turbina falhar tem "janta" pros tubarões! 63 Vindo de tão longe, não se deu conta que chegara ao seu velho e antigo chão, que há muito tempo deixara! 64 Voa, canário indeciso, o que esperas; afinal seres liberto é preciso, mesmo pensando irreal! _______________

Três Trovas sem Pé nem Cabeça 65 Sem barulho, corta o céu por entre as nuvens, um trem, levando pro beleléu a lua, e o sol também! 66 Era noite e a lua cheia, viu chegar a madrugada, trazendo o sol, em candeia, deixando-lhe "encandeada"! 67 Não deixe a coisa ficar do jeito que já não dê pra você, um jeito dar, no sujeito que é você!

O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 39

1 Acorda, logo, Alencar, não faças tanto ruído! Esqueceste de tomar, pra dormir, teu comprimido!... 2 Ante insucessos de partos, da mãe preta há gestos nobres em ceder seus seios fartos a órfãos que não são pobres!

3 - Ao andar, sinto cansaço. Que me aconselha, doutor? - Nenhum remédio lhe passo, só tome um táxi, senhor! 4 Ao fone da Previdência responde o "boy', que é modesto: - Não mais trabalha, Excelência, aqui, ninguém por Honesto!... 5 A tragédia em profusão, vai matando em tom profundo: - É Deus chamando a atenção dos pecadores do mundo! 6 Cada vez que és malcriada, fica branco o meu cocó! - Mãe, como foste danada: – repara as cãs da vovó!... O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 40

7 Carro-de-bois, és toada cadenciada e sem fim; enquanto gemes na estrada, mais geme a saudade em mim! 8 Cem anos de lucidez fez vovô, e sem canseira, pois o velho, todo mês, corre atrás da cozinheira!... 9 Com uma frase, somente, eu tento a fé descrever: – a fé, resumidamente, é acreditar sem se ver! 10 Contra a constante injustiça, que a maldade, às claras, solta, lanço aos donos da cobiça o meu clamor de revolta.

11 Depois de preso à corrente dos seus braços, que ironia! Ela me deu, finalmente, um alvará de alforria! 12 Depois de tanto fracasso que nesta vida sofri, me transformei em palhaço, um palhaço que não ri! 13 De que vale ter diamantes, jóia aos montões, ser incréu, se, em libertinos instantes, chegar a perder o Céu? 14 Diante da mãe barriguda, o garoto olha assustado: - É barriga d'água, Arruda. - E o nenê morre afogado?... O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 41

15 Diz-nos, Deus, basta de guerra, quando, alegrando aos mortais, descerá, por sobre a terra, a pomba branca da paz? 16 Em cada dia primeiro, pese o seu filho, senhor. Logo retruca o açougueiro: - Com ou sem ossos, doutor? 17 Essas constantes matanças, o roubo e a imoralidade navegam nas águas mansas e negras da impunidade! 18 Eu vejo um mundo safado, sem fé, sem paz, em meu pranto, só rejeitando, aloucado, o que é de Deus, o que é santo!

19 Feito o mundo, Deus projeta de logo um duplo desejo: – deu a saudade ao Poeta e a tristeza ao sertanejo! 20 Felicidade - eu diria, através da sutileza, é uma fração de alegria entre inteiros de tristeza! 21 Inda veremos nas liças, outros horrores insanos, por causa das injustiças e dos delitos humanos! 22 Meu amor é tão perfeito, que sempre ao ver-te, menina, escuto, dentro do peito, um carrilhão em surdina!... O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 42

23 Meu troféu é mais que prata, mais que o mais fino brilhante; ele, deveras, retrata minha trova - o meu diamante! 24 - Meu viver é turbulento, queixando-se, diz Seu Paiva: - Neste ano não tive aumento, é "roxo" o meu, mas... de raiva! 25 Minhas rugas, meus cansaços e esses cabelos tão brancos vão responder por meus passos, entre trancos e barrancos! 26 Nada cobiço, querida, sou venturoso, porque, se tenho sorte na vida, a minha sorte é você!...

27 Neste vale de pecado, o pendor para o perdão só pode ser conquistado sob o poder da oração! 28 Nossos momentos, quem vê, os vê felizes, querida: – eu descobri com você o doce encanto da vida! 29 O mundo gira, lascivo, com todos os vícios seus, violento, injusto, opressivo, porque distante de Deus! 30 - O que é bígamo, papai? Me venha então explicar. - Um imprudente que vai por duas vezes errar. O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 43

31 O saber, o mais profundo, a fama e a riqueza até, não os troco neste mundo pelo dom da minha fé! 32 Para que reine a harmonia neste mundo de profanos, urge que vença a alforria e os tais direitos humanos. 33 Por ser um cara safado, conquistador de má fama, veio a morrer o tarado de um espirro sob a cama! 34 - Que burrada! Que burrada! - Já sei! Não vá repetindo! - Não sou eu, meu camarada, é o eco que está saindo!...

35 - Tal qual meu pai, ao crescer, bom dinheiro vou ganhar! - Tal qual mamãe, podes crer, vou, tão somente, gastar! 36 Tua beleza era tanta, tua oração tão ardente, que em vez de fitar a santa, eu te fitava somente! 37 Uma casinha singela e um chameguinho, o melhor, de um casal a viver nela... - Para que sorte maior? 38 Um leito fofo e adornado de cetim, brocado e flor, de carícias abrasado, foi palco do nosso amor!… O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 44

1 A chuva traz à lembrança uma janela quebrada, a casa humilde e a criança olhando, triste, a enxurrada. 2 Agora, sem mais nem quando, sofrendo porque fugiste, eu sonho que estás voltando, para eu deixar de ser triste…

3 A jangada, quando alcança dos mares a imensidade, leva no bojo a esperança, deixa na praia a saudade. 4 - Algo impede o casamento? Se alguém sabe, agora fale!... - Eu sei, seu padre... - Um momento! Você é o noivo, e assim não vale! 5 Ao migrante maltrapilho, que cruza o adusto sertão, só resta, ao morrer-lhe o filho, o consolo da oração… 6 Ao te encontrar, sem querer, tarde linda, sol morrente, mais triste que te perder foi te rever novamente. O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 45

7 Apregoa o Zé Seráfico, que a mulher está na dela: - como um filme fotográfico, só no escuro se revela… 8 Buscando esperanças vãs no descompasso dos prazos, gastei, sem ver, mil manhãs e não sei quantos ocasos. 9 Cai a chuva fina e mansa, e, na janela, que graça: - O nariz de uma criança achatado na vidraça!… 10 Casa assombrada... sombria... Portas rangendo... Arrepio... E o Zé tremia, tremia, dizendo que era de frio!…

11 Coragem!... Sua mulher tem poucos dias... Lamento... - Doutor, se o destino quer, mais uns dias eu aguento... 12 Da loja um ladrão levou cristais valiosos ao léu, e o lojista assim rezou: - Pai nosso cristais no céu... 13 Das mágoas, dos sacrifícios, das dores, dos sofrimentos, fiz enormes edifícios onde alugo apartamentos. 14 De longe, não desconfias que, esperando tua volta, tua ausência de mil dias traz mil noites de revolta. O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 46

15 De repente este conflito, quando a ausência me revolta, por tudo que não foi dito para trazer-te de volta! 16 Desconfio que a velhice chega sempre bem depressa quando se faz a tolice de pensar que ela começa... 17 Descrente, maldigo até meus atos de contrição, por não ter, a minha fé, o tamanho da oração!… 18 De volta à casa paterna, revejo os vitrais antigos, por onde a saudade eterna repassa rostos comigo…

19 Diz, de cabeça enfaixada - Não brigue, nem se aborreça. Sua mulher, se é charada, a minha é quebra-cabeça !... 20 Diz que vai me abandonar, cai em pranto mas, depois, perdoa e põe-se a rezar, pedindo aos céus por nós dois… 21 Eis-me no inverno da vida velando ocasos tristonhos, mantendo a mão estendida, tentando alcançar meus sonhos… 22 Ela se foi manhã cedo, furtiva, sem que eu a visse, guardando o rumo em segredo para que eu não a seguisse. O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 47

23 Em passos e contrapassos, ao som de acordes tristonhos sempre foges dos meus braços no bailado dos meus sonhos... 24 Endoidou e, em seus chiliques, diz que é um relógio em destaque, por isso vai, com seus tiques, repetindo - tique-taque… 25 E o marido da Mercedes, pintor sagaz, com seus trecos, de dia pinta paredes, de noite... "pinta os canecos". 26 Eu baterei na janela... Confia em mim! - prometeu... Mas foi a saudade dela quem na vidraça bateu…

27 Grita a mulher do ladrão: - Por onde andaste, cretino ?... Não vejo qualquer menção de assaltos, no matutino! 28 Há muita gente enganosa qual goiaba sazonada: - Por fora, a casca sedosa; por dentro, podre ou bichada! 29 Maria!... grito, encantado, quando me encontro sozinho. Mas, quando estou ao seu lado, só sei dizê-lo baixinho... 30 Não fosse a dor no traseiro, numa corrida recorde, diria, ainda, o carteiro, que "cão que ladra não morde!...’ O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 48

31 Não quis ver tua partida nem teus acenos de adeus, quando, agora, a tua vida tem rumos que não são meus. 32 Não vivas com tanto orgulho em razão do teu talento, o tambor, que faz barulho, tem, por dentro, apenas vento! 33 Na tua mão estendida para este aperto de adeus, vejo que a linha da vida tem rumos que não são meus. 34 Nestas horas de sol-posto, na saudade mais atroz, nas fotos, beijo-te o rosto; nas cartas, ouço-te a voz.

35 No forró do Zé Pancada, que acabou no maior pau, o Chicão desceu a escada sem pisar nenhum degrau! 36 No peito a amargura cresce, quando o caboclo, tristonho, pede o inverno para a messe e o inverno é apenas um sonho! 37 Numa farmácia, a freguesa - Tem sal de frutas aí ? Tem ? Então, por gentileza, me dá um de abacaxi... 38 Nunca vi almas! - diz rindo. E um cara na sua frente, foi sumindo... foi sumindo... transparente... transparente... O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 49

39 Os teus vestidos, Vitória, e os lindos sapatos altos, representam promissória pela qual dou muitos saltos! 40 O velhinho monologa contra o remédio, no leito: - De que me adianta esta droga, se o resto não tem mais jeito?!… 41 O velho galo, à noitinha, ouviu a franga assanhada dizendo para a galinha : - Ele ainda "canta"... e mais nada! 42 Pago as vidraças quebradas, que quebrei quando menino, com as violentas pedradas que hoje levo do destino!

43 Pelo espaço onde flutua, nas noites claras de estio, a lua ri de outra lua que faz caretas no rio. 44 Pintora boa, de fato, tem talento a Elizabete, pois pintando o auto-retrato, pintou-o "pintando o sete". 45 Por ser muito procurada pra fazer qualquer trabalho, foi, na loja, apelidada de "garota quebra-galho"… 46 Promessa, cheia de graça, de regressar, ela fez... ... Mas quem bateu na vidraça foi a saudade, outra vez… O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 50

47 Quando teus olhos eu fito, rezo neles a oração de um monge em transe, contrito, num ato de adoração! 48 Realismo mesmo mostrou o pintor sacro Gregório, que óleo de rícino usou pra pintar... o purgatório! 49 Sem rival na adulação, Belarmino Guararapes chega a usar mata-borrão no que o chefe escreve a lápis!… 50 Se não tens mais esperanças, tantos são os teus fracassos, muda o curso das andanças... toma o rumo dos meus braços!

51 Se o patrão conta piada, puxa-saco faz assim: solta logo a gargalhada, sem esperar pelo fim. 52 Se o tormento, como dizes, é a remissão dos pecados, por te amar - é bom que frises eu tenho os meus perdoados. 53 Socialite na butique: Qual é a moda, seu Andrada?... Agora, madame, o chique é pagar conta atrasada... 54 Sofrendo tuas demoras, com meus sonhos moribundos, maldigo a fuga das horas na precisão dos segundos!… O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 51

55 Tendo aos braços o serão de nove meses atrás, Marília exclamou: Patrão, fazer serão... nunca mais! 56 Teus olhos nos meus pousados, em silente confissão, são dois monges deslumbrados, rezando a mesma oração! 57 Tua ausência, tão sentida, seria menor castigo se eu soubesse repartida minha saudade contigo. 58 Tu partes... mas, por piedade, ao me deixares sozinho, tira o espinho da saudade do rumo do meu caminho!

59 Vendo o galã na TV beijar a sua parceira, grita o garoto: - Mãiêêê, igual papai e a copeira!… 60 Verdade que se proclama pelo efeito contraposto: - quem joga pedra na lama, recebe lama no rosto. 61 Vê, Rosário, o que me aprontas! Eu te conheço do berço. Tens um rosário de contas do qual não pagaste um terço!...

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1 Adoro a treva ao açoite do vento que não tem dono: Deus fez o escuro da noite para a carícia do sono.

2 A dor que minha alma corta de maneira aguda e infinda, é ter-te à conta de morta sabendo que és viva ainda. 3 Amor perfeito suponho se houvesse seria assim: ela dentro do meu sonho, seu sonho dentro de mim. 4 Amor que passou – rosário de saudade e de ilusão, folhinha de calendário que a gente atira no chão. 5 A trova é gemido brando, breve cantiga inocente, que dizemos suspirando, pensando na amada ausente. O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 53

6 Dá de graça o que recebes de graça se diz, em suma, e o que te peço e me negas não te custou coisa alguma. 7 Da distância em que me vejo quero ir pelos espaços voando para o teu beijo, fugindo para os teus braços 8 Da trova fiz o meu pão minha cantiga inocente, a voz do meu coração e o sentir da minha gente. 9 De meus idílios, o fado me traz em triste labor: – quanto mais sou desprezado mais aumenta o meu amor,

10 De quem favores te pede nunca procures fugir; - só sabe a dor de quem pede quem precisa e vai pedir. 11 Destaco a minha folhinha quando o sol nascendo vem: – o calendário da vida mais um dia a menos tem... 12 Deus pensou em nós. Primeiro para esculpir nosso amor, deu-me uma alma de troveiro deu-te a ternura de uma flor. 13 Eu quando tiver certeza que meu bem já não me quer, irei matar a tristeza nos braços de outra mulher. O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 54

14 Fui à missa e rezei muito, depois de haver comungado, deixei a igreja e encontrei-te: – nem Deus evita o pecado. 15 Inda recordo, querida, foi numa noite de lua, te beijei e a minha vida se misturou com a tua. 16 Inverno, a terra se veste de flores em profusão, somente a minha alma agreste vive em eterno verão. 17 Meu coração, se a esperança dentro dele se renova, se alegra qual a criança que veste uma roupa nova.

18 Meu coração triste e frio, sofrendo sempre em segredo, faz lembrar ninho vazio na solidão do arvoredo. 19 Mulheres que estão me olhando pensando no mesmo assunto, são como freiras rezando na intenção de um só defunto. 20 Na minha cova - meu leito eterno - por caridade ninguém plante amor perfeito, dou preferência à saudade. 21 Não sei de maior pecado: – não sou santo e, como tal, vi meu retrato guardado dentro do teu manual. O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 55

22 Nem sempre a face do espelho mostra exato as dimensões, há quem dê o bom conselho com segundas intenções. 23 Nosso amor, que se renova, aumenta em tal proporção que não cabe numa trova nem dentro do coração 24 No teu jardim, entre flores, feliz estou ao teu lado meu calendário de dores hoje marcou feriado. 25 Nunca me chames de ingrato porque com outra casei: – podia eu, metal barato, dar liga a ouro de lei?

26 Parece uma coisa louca: – para aumentar meu desejo eu vejo que tua boca Deus fez em forma de beijo. 27 Penso em ti de olhos fechados e o pensamento aprofundo: – ah! se estivesse ao teu lado para glória do meu mundo! 28 Prometo dar-te um milhão de beijos, se me disseres quem tem o meu coração que perdi entre as mulheres. 29 Quando os raios prateados do luar beijam a noite, pede a saudade pernoite nos corações namorados. O Encanto das Trovas . . . Tomo 1 - Ceará......... Página | 56

30 Quem tiver a alma doente não fuja deste caminho: – recorde a mulher ausente faça trova e tome vinho. 31 Rico de amor como eu não há quem possa igualar, e o muito que Deus me deu é pouco para te dar. 32 Saudade – alívio das dores e dentro da alma se estampa qual um canteiro de flores plantado sobre uma campa. 33 Sobre minha enfermidade disse o doutor, com razão; é o germe de uma saudade

destruindo o coração. 34 Teu olhar sereno e terno sobre os meus olhos pousou, qual chuva de fim de inverno num campo que já secou! 35 Vendo-te assim tão formosa, de porte esbelto e sereno para intrigar uma rosa chamei-te cravo moreno. 36 — Vi teus braços… que ventura! — teu colo… as pernas… que gosto! Agora, tira a pintura, Que eu quero ver o teu rosto.

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NOTA As trovas foram obtidas em livros, boletins de trovas, jornais, trovas enviadas pelos trovadores e em alguns sites, como www.falandodetrova.com, www.poesiasemtrovas.blogspot.com.br, www.singrandohorizontes.blogspot.com.br Biblioteca J. G. de Araújo Jorge, as Mensagens Poéticas enviadas pelo falecido trovador potiguar Ademar Macedo, etc. Montagem da Capa da Revista sobre imagem obtida na internet, não foi encontrada a autoria. Esta revista não pode ser comercializada em hipótese alguma, sem autorização de seus autores ou representantes legais. Pode ser copiado, desde que se coloque o autor das trovas, caso contrário pode ser caracterizado como crime e ser enquadrado nas sanções legais. Respeite os direitos do autor.

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