O Encanto das Trovas Tomo VI - Estado do Rio de Janeiro vol 4

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O Encanto das Trovas . . . Tomo VI – Estado do Rio de Janeiro – vol. 4......... Página | 1

SUMÁRIO Adelir Coelho Machado................................................................................ 3 Archimino Lapagesse .................................................................................. 8 Haroldo Rodrigues de Castro ......................................................................13 João Ney Rodrigues Damasceno .................................................................17 José Corrêa Villela .....................................................................................22 Judith Montanhas da Cruz Cocarelli ..........................................................26 Luna Fernandes .........................................................................................30 Maria Apparecida Picanço Goulart .............................................................34 Milton Nunes Loureiro ...............................................................................37

O Encanto das Trovas . . . Tomo VI – Estado do Rio de Janeiro – vol. 4......... Página | 2

Adelir Coelho Machado São Gonçalo/RJ (1928 – 2003) Niterói/RJ

1 Acumulando jornadas, hoje sigo as fantasias que vestem de madrugadas as minhas noites vazias!…

2 A droga é falsa ilusão no torneio dos fracassos... Tira a vergonha, a razão, e arrasta a vida aos pedaços. 3 A empregada de hoje em dia quando vai para o fogão, cozinha em banho-maria as cantadas do patrão!!! 4 Apagada a mocidade, no carvão encontro meios de, entre as cinzas da saudade, acender meus devaneios! 5 A saudade hoje tem pressa… Sobe ao céu, a Deus, a Marte… De joelhos faz promessa, meu amor, para buscar-te.

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6 Busco a harmonia dos mares que a tempestade aniquila com lucidez de luares na consciência tranquila!... 7 Em teus braços me abandono... O teu amor é guarida e folha verde de outono no verão da minha vida. 8 Enquanto vibra o universo, o mar-poeta se enleia pelo acalanto de um verso que o sol escreve na areia. 9 Esqueço… não desespero porque sei quanto doeu o pranto amargo e sincero que sua culpa verteu.

10 Findam noites estreladas, no renascer da harmonia: o sol com Deus de mãos dadas abrem as portas do dia. 11 Foi no trem que a moça disse com seus “ares” de tolinha: – Se tentar uma tolice, eu não chego ao fim da linha!!! 12 Meu laçarote de fita que o tempo fez em retalhos prende uma infância infinita nos meus cabelos grisalhos. 13 Meu namorado querido! Nosso amor tão lindo e puro será por Deus aquecido nos caminhos do futuro!…

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14 Milagre da terra ardente no estorricado sertão: – brota do trigo a semente para a mesa ter mais pão. 15 Não revido esta invernia da minha alma anoitecida. Tenho uma estrela vadia me aquecendo o céu da vida. 16 … Não ventava, nem chovia. Tudo silêncio, asseguro… Somente a rede gemia naquele quartinho escuro!!! 17 Nosso grisalho carinho é bênção que Deus nos deu: – és presença em meu caminho, eu sou presença no teu!

18 Ouço a minha alma cantando a mais doce melodia: Sei que Deus está ninando minha infante fantasia!… 19 Para que contar invernos? Do tempo vivo à mercê. Quero que sejam eternos meus momentos com você. 20 Pelos caminhos do céu, vai, balão iluminado! mas volta como um troféu à terra, sempre apagado. 21 Preciso de uma pedra só: – mas que seja bem bonita e se avolume do pó de uma esperança infinita!…

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22 Procurando coisa alguma, meu sonho sempre se alteia… Faz com pilastras de espuma, os meus castelos de areia!… 23 Procuro a paz dos caminhos com verdes encruzilhadas onde encontre frágeis ninhos protegidos nas ramadas!… 24 Que o tempo – guri travesso fugindo a cada segundo, não esqueça do endereço do amor que lidera o mundo. 25 Rezar é belo, criança, não há mistérios na prece... Deus dá o pão da esperança enquanto o trigo não cresce!

26 Se a noite chega cansada de caminhar sempre ao léu, Deus dá vinhos de alvorada na taça rubra do céu. 27 Seja palácio ou favela a educação sempre traz a esperança que revela um mundo pleno de paz. 28 Ser Gente é ter semelhança com Deus em sua virtude: Inocência de criança amor em cada atitude. 29 Tanta falta de capricho! Outra vez está de porre? – Fui ao bar matar o bicho… Mas o danado não morre!!!

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30 Teu beijo – doce quentão é vício que não supero. Me embriaga de emoção… Quanto mais bebo, mais quero!… 31 Tudo é mentira, patroa! É fofoca desta gente… O patrão diz que sou boa porque faço prato quente!!!

32 Vejo auroras encantadas no peito do trovador: Quatro versos de mãos dadas numa ciranda de amor!…

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Archimino Lapagesse Florianópolis/SC 1897 Rio de Janeiro/RJ 1966

1 A Lua faz com seus linhos, nos teares do firmamento, o lençol dos pobrezinhos que estão dormindo ao relento!

2 A mentira se revela o mais feio dos pecados mas também, às vezes ela dá consolo aos desgraçados! 3 A mocidade pretensa de certos velhos faz rir: a velhice é uma doença que ninguém pode encobrir. 4 A mulher feia, afinal, encanta, às vezes, também, com essa graça espiritual que muitas belas não têm! 5 As rendeiras - diz a lenda que morreram sem casar, hoje no Céu fazem renda tecendo a luz do luar!

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6 As rosas dos meus caminhos murcharam na vida inquieta; por isso é toda de espinhos minha coroa de poeta! 7 A vida vai, de tal sorte, nos matando devagar, que, enfim, quando chega a morte, não há mais o que matar! 8 Cantando aprendi um dia que, no mundo sofredor, qualquer mostra de alegria é o disfarce de uma dor! 9 Em meio às mágoas em que ando tive hoje um dia feliz: ouvi um cego cantando trovas de amor que te fiz!

10 Ergueu o vento os refolhos de tua saia rendada, e jogou pó em meus olhos para que eu não visse nada! 11 Eu maldiria a velhice se, à sombra que ela projeta, uma porta não se abrisse para os meus sonhos de poeta! 12 Fazer versos é mania que qualquer um pode ter; mas os versos com poesia nem todos podem fazer! 13 Há uma graça agoureira que assusta néscios e sábios: – a graça de uma caveira rindo com dentes sem lábios!

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14 Já que tens alma de artista, vive teus sonhos em paz; mas que não percas de vista o feio mundo em que estás! 15 Lembra a trova, quando brota bem simples do coração, a água fresquinha da grota que a gente bebe na mão! 16 Morrendo um ceguinho doente, aos olhos que nunca viram, a luz se fez de repente, e as portas do céu se abriram! 17 Mostras nos olhos, em calma, todo o teu drama interior: num lindo corpo sem alma um coração sem amor!

18 Na lua existe um moinho que leva a noite a girar, moendo o trigo branquinho com que Deus faz o luar!... 19 Não choro a dor que me pesa na ausência de teus agrados: – sei que Deus nunca despreza os que vivem desprezados! 20 Não te culpo, se propalas tua inconstância no amor; pois as mais lindas opalas são as que mudam de cor! 21 Neste mundo desigual, que tantas duvidas tem, há tanto bem que faz mal, há tanto mal que faz bem!

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22 No carnaval desta vida, ou por graça ou por maldade, a Mentira anda vestida com a nudez da Verdade! 23 O prazer no mundo passa quando menos se pressente; é que o vento da desgraça quando sopra é de repente! 24 O riso que os outros têm nunca se deve invejar; que o riso às vezes também é um modo de se chorar! 25 Para uma trova perfeita, de sentimento profundo, ando fazendo a colheita das dores todas do mundo!

26 Pessegueiro do caminho que envelheces dando flor: lembras um poeta velhinho que ainda faz versos de amor! 27 Quando costuras, parece o teu dedo, no dedal, soldadinho que tivesse capacete de metal! 28 Quando o vento abre a janela, todo em flor, o jasmineiro atira os ramos por ela e beija o teu travesseiro! 29 Quem diz que guarda segredo e vai confiá-lo a alguém, há de, mais tarde ou mais cedo, contar aos outros também!

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30 Renego a lição dos sábios que nada sabem do amor... Com um beijo só de teus lábios tirei carta de doutor! 31 Saudade - ponte encantada entre o passado e o presente, por onde a vida passada volta a passar, novamente... 32 Teu beijo é de tal dulçor que se me beijas, menina, recorro logo ao doutor para tornar insulina!

33 Troféus de amor!... Hoje, ao vê-los, só me fazem confusão: laços de fita, cabelos que já não sei de quem são! 34 Veneração, misticismo, pecado, seja o que for: guardas no teu catecismo, as minhas trovas de amor! 35 Viram-se na praia um dia ... Foi uma história risonha ... Depois houve pretoria, lua de mel e... cegonha! …

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Haroldo Rodrigues de Castro Pilares/RJ (1936 – 2003) Magé/RJ

1 A saudade não me abala nem tristeza me corrói. O desprezo é que avassala, e meu coração destrói.

2 Ausência, palavra amarga, saudade não sei de quem; tristeza que não se apaga, nesse amor que vai-e-vem. 3 Com a língua portuguesa vou trovando com ardor. Nossa Pátria, que beleza, Deus nos deu com muito amor! 4 Dentro de meu pensamento uma ilusão pé fincou: - Amar-te por um momento, sonhar que ninguém te amou. 5 Eu tenho em mim a saudade de um coração bem sofrido que não sabe o que é vaidade e nunca foi compreendido.

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6 Foi com Deus no pensamento que vi nosso amor nascer. Senti, naquele momento, o motivo de viver. 7 Mágoas? Tenho-as em constante, ao longo de minha vida, desde aquele triste instante que foste embora… querida! 8 Nem sempre a briga é conflito, quando o bom senso a conduz; certas pedras, em atrito, soltam centelhas de luz! 9 O beijo que tu me deste, teve jeito de oração, pois com ele tu vieste dar-me a força do perdão!

10 O desprezo que me dás, negando amor e carinho, é maldade, não se faz, com quem vive tão sozinho! 11 Ódio, traição, covardia, é triste ter que dizer: É a parte do dia a dia dos covardes no poder… 12 Oh! saudade matadeira, traz de volta, por favor, a minha paz verdadeira, dada por Nosso Senhor! 13 Olhando o mar eu versejo, fazendo mais esta trova: Nas águas verdes te vejo e o mar feliz, se renova.

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14 Os passos que foram dados, no furor de minha vida, foram todos reciclados de uma vivência perdida. 15 Quando apertado em teus braços, sinto enorme calafrio, pois eu tenho teus abraços mas num abraço vazio... 16 Quando partires, querida, não leves meu coração. Leva apenas a ferida, deixa só minha ilusão! 17 Quando temos esperança o sol é mais radiante, e até no olhar da criança a paz se mostra constante.

18 Quem no futuro não crer, na vida, na paz, no amor, não tem esperança em ter a paz de Nosso Senhor! 19 Quem perde seu tempo em vão com coisa pequena e fútil, já bem sabe, de antemão, que nada fará de útil. 20 Só quando existe esperança, na vida de um sofredor, é que ele vê na criança, o quanto é belo o amor! 21 Sou poeta trovador, na trova sou bem capaz: Faço trovas com amor que muito me satisfaz.

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22 Tenho meu passo cansado, de caminhar pela vida, neste mundo já abalado e de vida mal vivida. 23 Tens a doçura do mel, a claridade da Lua. És uma estrela do céu vivendo na minha rua.

24 Valeu, Mestre, eu vos proclamo, no reino dos sabedores, um amigo que muito amo, – professor dos professores!

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João Ney Rodrigues Damasceno Curitiba/PR (1924–2005) Rio de Janeiro/RJ

1 Amigo e capacho é isso que só difere na rima: - ambos só prestam serviço quando a gente está por cima.

2 Ao afirmar que a cegonha trouxera os três de presente, ouviu do mais sem-vergonha: - Papai então é impotente? 3 Ao pescar a doce amada, o homem nunca tem noção de que a sogra avinagrada vem, de quebra, no arrastão! 4 As paredes que se ocultam nos antigos casarões, são mausoléus que sepultam segredos de gerações! 5 As pompas do casamento são um ato de sadismo: - Não se festeja o momento em que alguém salta no abismo!

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6 Bonitão, forte e viril, valia por três, sozinho! E a mulher dele fugiu... com um anão, seu vizinho. 7 Casamento é como um doce só por fora açucarado: é como se o doce fosse de jiló cristalizado. 8 Causa da própria orfandade, tão feio nasceu o Augusto, que a mãe, na maternidade, ao vê-lo, morreu de susto... 9 Ciúme é como pimenta, tem que se saber dosar: - sendo pouco, condimenta, muito, pode até matar!

10 Depois que o sapo beijou o corpo dela todinho, a sapa então protestou: - Na boca, não! Dá sapinho! 11 De uma longa enfermidade que lhe minou os pulmões, Jacob morreu, na verdade, em suaves prestações. 12 Diz a cegonha à colega: - Minha amiga, ultimamente, eu quase não faço entrega, mas dou susto em muita gente! 13 Ele a amou loucamente e por ela era querido, até quando, infelizmente, dela se tornou marido.

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14 Ele era mesmo um talento, tão "completo" pianista, que pra levar o instrumento tornou-se halterofilista. 15 Em um forró nordestino, quando o locutor berrou: "Telefone, Severino!", o salão se esvaziou!... 16 Em véspera de eleição até preso de xadrez, pra conseguir votação, vira padrão de honradez. 17 É tão errado o José, diz tanta coisa sem lógica, que o apelido dele é: "previsão meteorológica"!

18 Há momentos em que penso que eu não devo dispensar toda a atenção que eu dispenso a quem não sabe pensar. 19 - Meu Deus! Que brilho ofuscante! Como é lindo este anel seu! Conte pra mim: é diamante? - Não. Meu marido é quem deu. 20 Minha mulher fica tonta com festa em hora marcada; quando ela diz: "Estou pronta!" a festa está terminada. 21 Muita gente sofre e chora porque trocou, sem receio, toda a certeza do "agora", por um "depois" que não veio...

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22 O ascensorista escondido dentro do armário, tremendo, pra despistar o marido, abre a porta e diz: - Descendo! 23 O careca é um revoltado unicamente porque só tem cabelo espalhado nos pontos que ninguém vê. 24 O casamento é um contrato que quem o assina, em verdade, sem saber assina um ato de extinção da liberdade. 25 O ciúme é uma suspeita que, quando fundamentada, quem não tem cabeça feita, fica com ela enfeitada!...

26 Olhando a ilha perdida na imensidão do oceano, eu tenho a exata medida do nada que é o ser humano... 27 Para cumprir as promessas que fez para ser eleito, precisa - agora confessa ser cem anos o prefeito! 28 Para sair deste tédio eu faço aqui um apelo: - Descubram-me um bom remédio para dor de cotovelo! 29 Passarinhos me sujaram a roupa, sem que eu notasse; mas vocês já imaginaram se vaca também voasse?

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30 Quando eu respondi que sim no dia que nos casamos, todos olharam pra mim como a dizer: "Lamentamos"... 31 Se quer que todos bem cedo saibam de um fato qualquer, conte-o então como um segredo a qualquer uma mulher. 32 Só bebo "rabo de galo", sou mestre em 'rabo-de-arraia", curto "rabada" e me ralo por qualquer "rabo-de-saia"!

33 Só compartilha contigo quando quer que votes nele; - o político é o amigo das horas difíceis... dele. 34 Velho rico é o verdadeiro caso paradoxal: tem o burro do dinheiro mas não tem 'o capital"...

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José Corrêa Villela Rio de Janeiro/RJ (1899 – ????)

1 As duas rosas terçando espinhos de ciúme – eu vi! -, rubras, se despetalando pelo amor de um colibri.

2 Às vezes canto em meus versos o amargor dos meus gemidos, para que em rimas, dispersos, sejam por todos ouvidos. 3 À vovozinha amorosa, mostrando a curta sainha diz a netinha, vaidosa: – Olha, vovó, tô na minha… 4 Bem maldosa é a diferença entre o marido e a mulher – se ele faz mal o que pensa, ela faz o que bem quer… 5 Com filigranas de aurora e rosas da minha estima, quero ofertar-lhes, agora, num verso a mais linda rima!

O Encanto das Trovas . . . Tomo VI – Estado do Rio de Janeiro – vol. 4......... Página | 22

6 De uma clareira me valho – abro a janela – e olho o sol sorvendo estrelas de orvalho nos fios de um aranhol! 7 Dos amigos quero apenas, com minha estima e humildade, qual num ramo de açucenas, cultivar-lhes a amizade. 8 É deveras contundente, quando a Moral e a Razão se repelem, frente a frente, dentro de um só coração! 9 Embora o frio, embrulhado nos trapos do desabrigo, dormi bem agasalhado – a noite dormiu comigo…

10 E o bom frade, pachorrento: – Se o matrimônio é consórcio, eu te arrumo um casamento, mas sem direito a divórcio!… 11 E ouvirás, pelos espinhos que andas na terra espalhando, na solidão dos caminhos, mil bocas te amaldiçoando! 12 Essa lágrima, essa prece, que na saudade flutua, é a luz do sol que adormece nos frios olhos da lua. 13 Essa miséria que passa, mascarando os desenganos, é o carnaval da desgraça, o dos farrapos humanos!

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14 Foi a Vida a professora que encontrei, logo ao nascer. E ai de mim se assim não fora, não saberia viver. 15 Foi uma cartada incerta, essa que você jogou. Beijos … numa carta aberta, certo, o carteiro encartou! 16 Há muita gente (e eu sei bem) que faz do pobre existir, saber dar tudo o que tem e nada saber pedir. 17 Nesta passagem, sofrendo, a gente conclui, sem graça, que em nossos passos, correndo, é a própria vida que passa.

18 No banho… Casta e indecisa, por dentro a porta fechava… Mas a barra da camisa, presa por fora, acenava… 19 Nossos olhos, por vaidade, nem de leve se tocaram. Mas, tocados de saudade, nossos corações se olharam… 20 Num cantinho da colina, nos momentos de saudade, o barraco mais se inclina para beijar a cidade. 21 Num carnaval – a quimera de asas, perfumes e cores, desabrocha a Primavera, despetalada em mil flores!…

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22 O Carnaval é os engodos da própria vida… Em seus braços, mascarados, somos todos nós os mais tristes palhaços! 23 O lírio branco – a pureza, que ao doce orvalho balança, é a mesma flor que viceja no coração da criança. 24 Partida! Choro entre os dois… – “Voltarei sem empecilhos”… E voltou, anos depois… carregadinha de filhos!…

25 Quando o machado, inclemente, o velho tronco cortava, escutei que amargamente toda a floresta chorava! 26 Segue o trêmulo velhinho, o Inverno, a rósea quimera – sobre a neve do caminho encontrar a Primavera. 27 Sob os beijos dardejantes do sol, assim nos prendendo, somos velhinhos amantes – dois invernos se aquecendo.

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Judith Montanhas da Cruz Cocarelli Rio de Janeiro/RJ

1 A gíria já é um fato que nós temos que aceitar: o bonito é um barato e curtir, apreciar…

2 Ainda tenho esperança se torne realidade ver nosso mundo-criança atingir maioridade. 3 A programação assumo da vida que desejei, hoje arrumo e desarrumo este rumo que tomei. 4 Com “meu” caracol brincava, num mundo de fantasia; quantas vezes invejava a concha em que se escondia! 5 Como o poeta julguei poder estrelas contar mas, sem querer, misturei com elas o teu olhar…

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6 Corremos, com esperança, atrás da felicidade. No final da nossa andança, restam cansaço e saudade… 7 Cultivo uma aspiração neste caro mundo meu: – Que ao parar meu coração eu fiquei a ouvir o teu… 8 Deixe embora, em minha andança de ver, ouvir, caminhar, se me restar a esperança continuarei a sonhar! 9 Dispensando-lhe carinho damos-lhe alguma esperança: – lembremo-nos que o velhinho já foi, um dia, criança…

10 Disseram-me que “a esperança é a última a morrer”. Às vezes, em nossa andança, ela nem chega a nascer! 11 Ela não é tua filha mas dá-lhe alguma atenção; a criança maltrapilha é filha de teu irmão! 12 Gostaria que a esperança retornasse à minha vida para ser, como em criança, na boneca prometida… 13 Muita gente, nesta vida, desejaria voltar ao seu ponto de partida e novo rumo tomar…

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14 Nós não temos, na cidade, luar como o do sertão, mas dá-nos felicidade a pequenina fração… 15 O luar, meu aliado, o quarto dele invadiu levando-lhe meu recado… Mas dormia, nem sentiu! 16 O sol se esvai, no horizonte, oferecendo ao olhar uma inesgotável fonte para o nosso versejar. 17 Passei minha vida inteira num rumo só, trabalhar. Parece que foi asneira, porque eu gosto é de rimar!

18 Peço a Deus, com esperança, num fervoroso rogado, note-se em toda criança um sorriso ensolarado! 19 Pedimos com devoção, tudo que nos dá prazer e esquecemos, na oração, de, no entanto, agradecer! 20 Pelo sol vivo ansiando! Quando chove ou anoitece quisera estar habitando o país em que aparece. 21 Pleno dia, plena estrada, quero o sol apreciar mas à noite, extasiada, que não me falte o luar!

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22 Por quem não tem agasalho por quem num leito padece… Acredito que mais valho se os incluo em minha prece. 23 Preces feitas, decoradas, repetidas todo tempo não valem as inventadas na hora do sofrimento. 24 Procurando no Universo algo como o teu olhar para rimar o meu verso, eu encontrei o luar!

25 Quero estrelas, o luar, o sol, as flores, o vento, as águas verdes do mar que são meu deslumbramento! 26 Se percebes que essa estrada causou-te decepção, faz uma pausa e, calada, ruma em outra direção. 27 Vou te ensinar, com carinho, lição que já sei de cor: Quase em silêncio, baixinho, é que se ama melhor.

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Luna Fernandes Rio de Janeiro/RJ

1 A glória, após a partida, não nos traz paz nem conforto: quero ser mortal... com vida! E não imortal... e morto!

2 As outras brincam de roda… E a olhar a brincadeira a menina se acomoda sobre as rodas da cadeira… 3 Ciúmes - já disse alguém vivem no fundo da gente. Ninguém diz que tem, mas tem; ninguém quer sentir, mas sente. 4 É a nossa vida, em resumo, uma estrada em que se passa, da qual só se traça o rumo... O limite, é Deus quem traça. 5 Embora eu lute e me agite nesse afã, pelo pão-nosso... eu sei que existe um limite entre o que eu quero e o que eu posso...

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6 Em meu brinquedo, entretido, a brincar de esconde-esconde, eu fui ficando escondido não sei de quem, nem sei onde. 7 Eu e a vida estamos quites pois, se de modo severo, a vida me impõe limites, eu, quase sempre os supero... 8 Fogosa, a "gata", no leito, já fez tudo o que sabia... E o velho, "do mesmo jeito", comenta: "Que teimosia!'... 9 Há de ter sonhos pequenos todo aquele que acredite que, nos limites terrenos, a vida tem seu limite.

10 Jurei não te procurar... jurei, mas quebrei a jura... quem ama pode jurar não procurar, mas... procura. 11 Meu coração, tem cuidado. No amor, não te precipites pois, o amor é ilimitado mas tu tens os teus limites... 12 Na calma insossa da praça o ancião mede a distância que vai dos dias que passa aos dias da sua infância. 13 Não me queixo se, de dores, minha vida hoje é repleta, pois sofrer plantando flores é destino de poeta...

O Encanto das Trovas . . . Tomo VI – Estado do Rio de Janeiro – vol. 4......... Página | 31

14 Não somos dois, - asseguro somos metades... E assim, ao procurar-te, eu procuro outra metade de mim... 15 Nessa procura incessante, sem ter achado o que eu quis, achei, na vida, o bastante para achar que sou feliz!... 16 Nos domínios de Afrodite ninguém fica ileso a nada... Pois, neles não há limite que algum amor não invada... 17 O carrilhão, com sonoras e compassadas batidas, marca o limite das horas... Marca o limite das vidas...

18 Para não ter frustrações de insucessos e fracassos, eu limito as ambições ao limite dos meus passos... 19 Por mais que estude e medite sobre os mistérios do Além, verá que existe um limite que ninguém passa... Ninguém! 20 Por mais que julguem bisonhos teus sonhos, nunca os evites e nem limites teus sonhos... que os sonhos não têm limites. 21 Quando os meus sonhos, escassos, se despedaçam, tristonho, eu vou juntando os pedaços e deles faço outro sonho…

O Encanto das Trovas . . . Tomo VI – Estado do Rio de Janeiro – vol. 4......... Página | 32

22 Se partires, algum dia, não me acenes e nem chores... Que cada aceno faria minhas tristezas maiores… 23 Talvez porque eu cante tanto o mesmo amor, há quem diga que essas cantigas que eu canto são sempre a mesma cantiga... 24 Tem calma, velhice, aguarda! Não venhas me ver ainda!... Que não receies ser tarda, porque nem tarda és bem vinda...

25 Um beijo de despedida... Depois o aceno... E depois, nós dois, o resto da vida, com saudades de nós dois… 26 Vejo enfim, com desencanto, que tive sonhos de rei... Fui à procura de tanto!... E foi tão pouco que achei!

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Maria Apparecida Picanço Goulart Niterói/RJ

1 Abrigando uma criança, dando escola, educação, haverá ainda esperança do Brasil como Nação.

2 A criança em nossos dias não é como antigamente. Não há mais paz, alegrias, há violência somente. 3 Agentes de segurança que maltratam internados investem só em matança e não em recuperados. 4 Anchieta foi professor, escreveu poema na areia: – ao gentio, o Redentor, deu a fé para que creia. 5 A volta sempre esperada, do amor que um dia partiu, se chega de madrugada, parece que o sol surgiu.

O Encanto das Trovas . . . Tomo VI – Estado do Rio de Janeiro – vol. 4......... Página | 34

6 Buscando sempre um amor vive-se muito feliz, porque já morreu, que horror! Aquele que amor não quis. 7 Dizem que nada mereço, se minha busca é ventura, mas esta vida ofereço por outra nula em censura. 8 É noite, ventos passeiam, agitam plantas aquáticas, as águas tremem, anseiam, em mensagens telepáticas. 9 Há neste mundo profano, sem Deus, sem fé, sem verdade, “ tanta guerra, tanto engano,” em nome da liberdade.

10 Investir em falso amor, nunca auxilia ninguém. Só traz tristeza, só dor, e não a graça de um bem. 11 Lutar na vida por quem nos dá júbilo, prazer, é batalhar por um bem que prá nós não vai morrer. 12 Nada existe que um sorriso não consiga amenizar, por isso é sempre preciso belo sorriso mostrar. 13 Não dar ao aposentado os reajustes salariais, é anular do segurado suas contribuições mensais.

O Encanto das Trovas . . . Tomo VI – Estado do Rio de Janeiro – vol. 4......... Página | 35

14 O mar, sempre murmurando, traz ao marujo a lembrança de alguém que ficou chorando, aguardando-o com esperança. 15 Passa um pássaro cantando, bem juntinho de onde estou, vai no espaço proclamando que o Ano Novo chegou. 16 Pelo mar, sempre constante, partindo de Portugal, indo a terra tão distante, ao Brasil chegou Cabral. 17 Pobre do trabalhador, passa a vida trabalhando, no fim só lhe resta a dor do seu salário minguando!…

18 Primavera, só beleza, esperança, muito amor: a vida só traz tristeza, pra quem não sente uma flor. 19 Quem busca tudo na vida tem sempre desilusão, por mais que seja querida vive sempre em frustração. 20 Quem diz que sofre saudade, na verdade está blefando. Pois não se sofre, em verdade, bons momentos recordando. 21 Quem só busca nesta vida felicidade, alegria, esquece que o bem sem lida torna a vida mais vazia.

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Milton Nunes Loureiro Campos/RJ (1923 – 2011) Niterói/RJ

1 A bebida que me invade, parecendo não ter fim, é a tristeza de uma grade que se fecha dentro em mim...

2 A ciência me conduz a pensar desta maneira: do excesso, às vezes, de luz, pode nascer a cegueira... 3 Amanhã... Depois... Depois... Foi assim a vida inteira... E entre os sonhos de nós dois, a intransponível fronteira... 4 A penumbra que me invade e que nunca chega ao fim, é a janela da saudade fechada dentro de mim... 5 Apesar dos solavancos em minha vida sem cor, adornei, com lírios brancos, nossos segundos de amor...

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6 A tristeza que me invade e que nunca chega ao fim, é a esquina de uma saudade que eu dobro dentro de mim... 7 A vida às vezes revela certos contrastes assim: eu – enredado por ela; e ela – a tramar contra mim! 8 Chegaste, os braços abertos após as tuas andanças E trouxeste aos meus desertos mil motivos de esperanças... 9 De tanto sofrer na vida, eu peço a Deus, sem revolta: - Abra as porteiras da ida, feche as porteiras da volta!...

10 Embora colhendo espinhos em meu viver malogrado, semeio pelos caminhos bem-me-quer por todo lado... 11 Encerrando a caminhada que anuncia o fim da vida, corajoso na escalada, tenho medo da descida... 12 Entardece e a caminhada leva ao outono da vida… Se a subida é quase nada, é dolorosa a descida!… 13 Esperança, não me peças que acredite em tuas juras... Já me cansei de promessas e me perdi nas procuras...

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14 Essa angústia que me invade, parecendo não ter fim, é a triste rua-saudade, que chora dentro de mim... 15 Esta carta que ora mando a você, com muita ânsia. é a saudade soluçando sobre os trilhos da distância. 16 Esta pergunta te faço, meu coração sonhador: - se possuis tão pouco espaço, como guardas tanto amor?... 17 Eu não entendo, Senhor, a diferença das ruas: - Umas, repletas de amor,.. outras, de amor, sempre nuas.

18 Fronteira é a mais desumana das humanas criações: - desiguala e desirmana homens de iguais corações! 19 Imagens difusas... Sonho irrealizado, sofrido, que eu componho e recomponho na dor de te haver perdido... 20 Liberta este amor profundo dos grilhões dos teus desertos, que o maior Homem do mundo morreu de braços abertos. 21 Não quero o poder que esmaga o sonho com seu furor.. Eu quero o poder que afaga nossos momentos de amor ...

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22 Neste mundo passageiro, a vida, que vai fluindo, é um intervalo ligeiro, dois silêncios dividindo... 23 No amor é bom ter cuidados para evitar dissabor... Nem sempre em beijos trocados trocam-se beijos de amor. 24 O amanhã, que importa agora? Que nos importa o depois?... Vamos viver, vida afora, o imenso amor de nós dois!... 25 O poeta em sua lida, ainda que o mundo o afronte, nos devaneios da vida vai muito além do horizonte...

26 O poeta em sua lida, ainda que o mundo o afronte, tem sempre o aceno da vida, que o leva além do horizonte... 27 O poeta em sua lida, ainda que o mundo o afronte, tem sempre um sopro de vida que o leva além do horizonte... 28 O tormento que me invade, parecendo não ter fim, é o sininho da saudade, que plange dentro de mim! 29 Primaveris e frementes os meus lábios, em volteios, trocam passos diferentes sob o manto dos teus seios...

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30 Profano, sem horizonte, caminho, sedento e triste, à procura de uma fonte que eu nem mesmo sei se existe... 31 Sem direito de sonhar, vagando no mundo, a esmo, nem sequer pude marcar encontro comigo mesmo! 32 Sem jamais fazer menção ao destino que a conduz, a raiz, na escuridão, mantém os ramos na luz!...

33 Se o meu tempo está marcado e da saudade eu disponho, invento alguém ao meu lado, cerro meus olhos e sonho... 34 Somente tristes lembranças vão comigo pela estrada... Eu, que plantei esperanças, colho derrotas... mais nada... 35 Todas as pedras, querida, que a vida atira em nós dois, dão mais vida à nossa vida e mais crença no "depois"...

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NOTA As trovas foram obtidas em livros, boletins de trovas, jornais, trovas enviadas pelos trovadores e em alguns sites, como www.falandodetrova.com, www.poesiasemtrovas.blogspot.com.br , www.singrandohorizontes.blogspot.com.br Biblioteca J. G. de Araújo Jorge, as Mensagens Poéticas enviadas pelo falecido trovador potiguar Ademar Macedo, etc. Montagem da Capa da Revista sobre imagem obtida na internet, não foi encontrada a autoria. Números anteriores podem ser encontrados em https://independent.academia.edu/JoseFeldman Esta revista não pode ser comercializada em hipótese alguma, sem autorização de seus autores ou representantes legais. Pode ser copiado, desde que se coloque o autor das trovas, caso contrário pode ser caracterizado como crime e ser enquadrado nas sanções legais. Respeite os direitos do autor. O Encanto das Trovas . . . Tomo VI – Estado do Rio de Janeiro – vol. 4......... Página | 42

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