O ENTORNO DA CATEDRAL METROPOLITANA DO RIO DE JANEIRO – A CONSTRUÇÃO DE UM NÃO LUGAR

Share Embed


Descrição do Produto

O ENTORNO DA CATEDRAL METROPOLITANA DO RIO DE JANEIRO – A CONSTRUÇÃO DE UM NÃO LUGAR Estela Maris de Souza Arquiteta e Urbanista – Mestrado Arquitetura e Urbanismo/UFF [email protected] Fabiana Dias Loiola Arquiteta e Urbanista – Mestrado Arquitetura e Urbanismo/UFF [email protected]

1

Resumo O presente trabalho trata da construção do entorno da Catedral Metropolitana do Rio de Janeiro como um não-lugar. As várias intervenções urbanas levaram a área a não ter uma identidade definida. A reconstrução dessa paisagem passa pela necessidade de muni-la de significado, para transformá-lo num ‘lugar’ para a cidade do Rio de Janeiro. Não ter uma identidade não significa que não tenha potencial e nem uma história cultural a ser contada. No entorno encontramos edifícios de prestígio, além da própria Catedral Metropolitana. A área é também um ponto nodal, que liga fisicamente vários ‘lugares’ do centro da cidade como Lapa, Cinelândia, Praça Tiradentes, Largo da Carioca e Rua do Lavradio, mas não exerce nenhum poder imagístico sobre aqueles que ali transitam. Palavras chave: lugar, não-lugar, paisagem urbana Introdução A globalização, esse “semideus” que está em todos os lugares ao mesmo tempo, não significa ainda um Deus Universal, pois nem todos participam efetivamente deste evento, mas todos sofrem sua influência. Uma das conseqüências da globalização é o novo enfoque sobre o que conhecemos como espaço e cultura. Outra é a mudança e/ou perda da identidade local. Olhando por esse prisma, a cidade do Rio de Janeiro, ex-capital da República, hoje cidade moderna e globalizada, traz a dicotomia da modernidade com certa nostalgia de tempos passados e a necessidade de preservação de sua identidade. Uma cidade não se faz apenas pela aglomeração de edifícios, ruas e praças, mas também e principalmente de pessoas, seus desejos e sensações. “A cidade é, como se sabe, uma realização muito antiga. Mas é sobretudo com o advento do capitalismo que se impõe a ‘questão urbana’, colocando diante do Estado a exigência de um modus vivendi normalizador do ‘viver em cidades’. Processos econômicos e sociais muito claros delineiam-se, transformando as condições da existência: 2

concentrações populacionais, migrações rurais, superpovoamento e transformação do espaço assinalam o crescimento e configuração das cidades” 1. O entorno da Catedral Metropolitana, conhecida como Esplanada de Santo Antônio, surge de um momento sócio-econômico onde o desmonte de parte do Morro de Santo Antônio faz parte de uma alusão ao progresso. A matéria, de 1956, sobre a demolição de um casarão antigo na Rua do Lavradio, mostra as conseqüências das obras do desmonte: “O casarão foi envelhecendo, decaindo, para acabar posto abaixo a fim de atender às exigências do progresso! [...] As escavadeiras parecem um monstro moderno de mandíbulas de ferro: atiram-se contra o gigante de terra, mordem-no, arrancam-lhe um pedaço, rompem, mastigam, trituram. Assim fazem agora com o Morro de Santo Antônio (aqui visto de um trecho da Rua dos Arcos) vai cedendo ao castigo impiedoso”.2 No morro de Santo Antônio havia uma das primeiras favelas do Rio de Janeiro, surgida ainda no século XIX, e presente na obra de importantes cronistas da cidade, como João do Rio e Luiz Edmundo. Nas primeiras décadas do século XX, esta favela foi um dos elementos utilizados para a construção da percepção social de favela, em uma fase inicial, como paradigma de atraso, promiscuidade e ausência de moral. Ou seja, uma visão da favela que a associa a concepções de atraso, seja como uma “mancha” em meio a uma bela paisagem urbana seja pela decadência moral e periculosidade de seus habitantes. A questão da urbanidade, da cidade e da metrópole torna-se uma tendência na década de 1950 onde as cidades são colocadas como vitrines de demonstração da capacidade e progresso técnico-científico. Isso fazia parte de uma política nacionaldesenvolvimentista que Brasília torna-se símbolo da nossa modernização urbanística,

1

2

PESAVENTO, Sandra Jatahy. Muito além do espaço: Por uma história cultural do urbano.

Correio da Manhã, 22/1/1956. É interessante notar que o Morro de Santo Antônio não era o único elemento associado à noção de atraso, que pode ser estendida às irremediações da futura explanada, principalmente no tocante a imóveis consideravelmente antigos, muitos deles utilizados para fins habitacionais pela população de baixa renda.

3

“carregada de um forte simbolismo de inovação, de nossa re-invenção a partir de nosso centro inabitado, a fim de sanar nossas desigualdades regionais e sociais”3. A Catedral Metropolitana do Rio de Janeiro tornou-se hoje um marco turístico, mas, para a cidade é apenas uma igreja em meio ao nada, ou melhor, mergulhada em meio a um mar de carros. Esta área, considerada por muitos como um vazio urbano, é caracterizada pela dicotomia Rio Antigo e Rio Contemporâneo. O Rio contemporâneo traz como representantes os Edifícios da Caixa Econômica Federal, Petrobrás e BNDES e o Rio antigo pelo que sobrou do casario na Rua do Lavradio e Rua dos Arcos. A área ficou entre a política da preservação do patrimônio e a política do ‘arrasaquarteirão’, bem marcada no projeto traçado por Reidy para a Esplanada de Santo Antônio, que não foi finalizado, mas que foi forte influência para o que hoje existe. A Catedral também faz parte desse plano, caracterizado pela sua escala e imponência como marco de uma avenida moderna. A Catedral, portanto, perde-se enquanto significado já que sua arquitetura impõese como marco, mas não está inserida no tecido urbano, apenas brota em meio ao mundo de carros estacionados ao seu redor. Diante deste quadro sentimos a necessidade de contextualizar a Catedral como marco urbano, criar linhas que unam esta ilha ao restante do tecido urbano, não apenas fazer a ligação física, mas principalmente fazer uma ligação conceitual e imagística com a cidade. Esta ligação passa por cinco eixos principais: Avenida República do Paraguai, Avenida Chile, Rua do Lavradio, Rua dos Arcos e a própria Catedral Metropolitana. Analisando esses eixos, temos que as Avenidas República do Chile e República do Paraguai foram abertas depois da demolição de parte do Morro de Santo Antonio, em 1960 e, os prédios nelas construídos refletem a prosperidade das instituições estatais do período áureo do milagre econômico brasileiro ocorrido na década de 1970.

3

Cf., JAGUARIBE, Beatriz. “Ruínas modernistas”. In: Fins de século: cidade e cultura no Ro de Janeiro. Rio de Janeiro,Rocco, 1998.

4

A Diocese do Rio de Janeiro foi criada em 1676 e teve várias sedes, passando pelas Igrejas de São Sebastião, de Santa Cruz dos Militares, de Nossa Senhora do Rosário e São Benedito e do Carmo, até que foi transferida para a atual Catedral, na Avenida Chile, em 1976 (sendo que o projeto é de 1964). A Rua do Lavradio recebeu este nome porque nela residiu o Marquês de Lavradio. Foi recuperada e atualmente nela funcionam diversos atelieres, galerias de arte e restaurantes. Já a Rua dos Arcos abriga a Fundição Progresso e o Circo Voador, importantes cenários culturais da cidade. Um exemplo de “melhoria” urbanística trazida pela obra do desmonte e divulgada pelo Correio é a manchete da seguinte reportagem: “Três mil veículos por hora em pista de alta velocidade”4. Nessa reportagem, o superintendente responsável pelas obras do desmonte anuncia para dali a dois meses a abertura da nova avenida, que viabilizará o rápido escoamento do tráfego de automóveis do centro para a zona sul. Desse modo, ainda segundo o superintendente, um percurso antes realizado entre 15 e 20 minutos, passaria a ser feito em apenas 3. A nova pista, a futura Avenida Chile, suportaria um fluxo de até 3 mil veículos por hora, conforme alardeado na reportagem. Essas mudanças afetaram direta e decisivamente a paisagem local. Uma nova proposta conceitual Segundo uma visão fenomenológica do espaço e lugar “pode-se analisar as ações, as percepções, e decodificar as simbologias que transformam os espaços em lugares, onde as experiências vividas do lugar e a afetividade pela terra desempenham um papel fundamental na construção e identidade de uma nova paisagem”.5 A partir dessa visão, o que antes era considerado como um vazio urbano, hoje pode ser caracterizado como um não-lugar. Argan (1992), por exemplo, “entende o fenômeno urbano como um acúmulo de bens culturais onde a cidade se faz através de

4

AMOROSO, Mauro. A favela faltou na foto: o desmonte do santo Antônio pelas lentes do correio da manhã. 5

FOETSCH, Alcimara Aparecida in Subsídios teórico-epistemológicos para um operacional estudo do lugar.

5

representações”. “Ora, considerando a cultura como uma rede de significados socialmente estabelecidos (Geertz, 1981), a cidade é o espaço por excelência para a construção destes significados, expressos em bens culturais. Nosso intento é, pois, resgatar a cidade como real através da ‘leitura da cidade’, ou de suas representações”. 6

“Entender a questão deste modo não é submetê-la a um mero jogo de palavras, mas sim partir do pressuposto de que as representações são parte integrante também daquilo que chamamos realidade. Isto se dá não só porque são matrizes geradoras de práticas

sociais,

como

também

porque

demonstram

um

esforço

de

revelação/ocultamento dado tanto pelas imagens reais (cenários, paisagens de rua, arquitetura) como pelas imagens metafóricas (da literatura, pintura, poesia, discurso técnico e higienista etc.) (Pechman, 1992)”. 7 Dessa forma aquilo que, à primeira vista parece dicotomia, traduz-se em dialética. A síntese entre a urbanidade da cidade como sua representação objetiva e a construção da identidade cultural (a sua construção subjetiva) é o que irá conformar a verdadeira relação da pessoa com o espaço elaborando o conceito de lugar. Consideramos lugar como algo que conhecemos, que faz parte de nossas experiências vividas, pois até então era apenas um espaço. Assim, visitando a Esplanada da Avenida Chile percebemos a Catedral Metropolitana como um objeto na paisagem, mas não temos com ela nenhuma relação mais íntima que nos remeta a um lugar. Maurice Ronai em Paisagens II trata estes espaços como o da Catedral como paisagedade turística, que se “torna circuito, regulada pelo ‘sight-seeing’ (...) assinalada na carta ou guia turístico por estrelas, por asterísticos”.8 A Catedral, portanto, é um ponto no mapa, mas não representa um lugar para os que por ali transitam.

6

PESAVENTO, Sandra Jatahy. Muito além do espaço: Por uma história cultural do urbano. Idem 6 8 RONAI, Maurice in Paisagens II – A Paisagem como campo de visão. 7

6

O lugar “é construído a partir de uma relação intersubjetiva, extremamente variável de indivíduo para indivíduo, quando vão sendo atribuídos ao suporte nomes e características simbólicas, constituindo-se enfim no mundo que une indissoluvelmente o sujeito às coisas, tornando-o um ser-no-mundo”.9 Quando falamos de cultura não estamos falando somente de cultura objetiva, mas também da cultura subjetiva que não está gravada por meios físicos. Conclui-se, portanto, que a cidade não se compõe somente de atribuições físicas, sociais e econômicas. Outro fator responsável pela sua constituição é a relação de identidade que as pessoas têm com a mesma, dessa cultura subjetiva que se desenvolve e que se apresenta num gesto, num sorriso característico, pois como Tuan10 diz, “um simples sorriso ou contato pode alertar nossa consciência sobre um momento importante”. Falta justamente ao entorno da Catedral essa ligação com o emocional das pessoas. Mas essa relação, como conceito, só surge a partir do momento em que os geógrafos humanistas passam a tratar do espaço como algo onde o homem é parte integrante e não somente como ser interventor. Essa relação de identidade se revela quando a cidade deixa de ser apenas um espaço para tornar-se um lugar. Tuan diz que “lugar é uma pausa no movimento. A pausa permite que uma localidade se torne um centro de reconhecido valor”. Entendendo essa relação de identidade do lugar e o que o caracteriza, intuímos que a Esplanada da Avenida Chile (leia-se entorno da Catedral Metropolitana) é desprovido dessa identidade. Através da idéia de que “determinados espaços, ou lugares, seriam autênticos enquanto outros seriam inautênticos, ou seja, determinados símbolos seriam verdadeiros (possuírem significado) enquanto que outros seriam falsos (desprovidos de significado)” 11, concluímos que a Catedral é um símbolo falso. Essas idéias nos levam diretamente à idéia de não-lugar, que seria segundo Relph, criador do termo, um “lugar desprovido de alguma coisa”, “desprovido de sua

9

HOLZER, Werther in Sobre Paisagens, Lugares e Não-lugares. Yi-fu Tuan, geógrafo humanista (1930). 11 Idem 2. 10

7

possibilidade de proporcionar uma relação intersubjetiva”.12 O entorno da Catedral metropolitana é desprovida justamente dessa possibilidade de se relacionar com as pessoas que ali freqüentam a área ou simplesmente transitam por ela. É um local de passagem rápida que não deixa nenhum laço que não seja o de medo e desconforto. A paisagem por si só não estabelece nenhum vínculo emocional positivo. Não se lembra do entorno da Catedral pelo seu potencial, mas pelo desconforto que o vazio ali proporciona. Segundo Milton Santos em Metamorfoses do Espaço Habitado, “cada tipo de paisagem é a reprodução de níveis diferentes de forças produtivas, materiais e imateriais (...) é uma escrita sobre a outra, é um conjunto de objetos que têm idades diferentes, é uma herança de muitos diferentes momentos”. Esse “depósito histórico” (Goulart) é nítido na área, mas não suficiente para criar laços emocionais e culturais com a paisagem. Assim, “ver a cidade e traduzi-la em discursos ou imagens implica um fenômeno de percepção, mas que envolve um complexo conjunto de ‘lógicas sociais’. Como refere Montlibert (1995), estes processos implicam julgamentos sociais, vivências, lembranças e posições estéticas em cuja base se encontra a operação prática do habitus de que fala Bourdieu. Ora, sendo o habitus uma ‘aquisição’ ou um ‘capital’ que se incorpora social e historicamente, ele opera como uma máquina transformadora que faz com que ‘reproduzamos’ as condições sociais de nossa própria produção, mas de uma maneira relativamente imprevisível (Bourdieu, 1980). As representações do mundo social assim constituídas, que classificam a realidade e atribuem valores, no caso, ao espaço, à cidade, à rua, aos bairros, aos habitantes da urbe, não é neutra, nem reflexa ou puramente objetiva, mas implica atribuições de sentidos em consonância com relações sociais e de poder (Bourdieu, 1982)”. E o entorno da Catedral Metropolitana não é diferente, além de fazer parte de um momento histórico ainda pode ser considerado um ponto nodal de vários ‘lugares’ da cidade, como a Rua do Lavradio, a Lapa, Cinelândia, Praça Tiradentes e Largo da

12

Idem 3

8

Carioca diretamente e, indiretamente, Praça da Cruz Vermelha e Campo de Santana, mas que por si só não se caracteriza como lugar, pois não tem uma identidade. “Todos os lugares possuem identidade devido a três componentes interrelacionados: traços físicos, atividade e funções observáveis e, significados ou símbolos”.

13

Analisando as áreas que são interligadas pela Esplanada da Avenida

Chile vemos que de fato são lugares, pois identificamos os componentes que o compõe, enquanto à esplanada falta os componentes de atividades e funções observáveis. Milton Santos em Metamorfoses do Espaço Habitado fala das mutações da paisagem, dizendo que “a rua, a praça, o logradouro funcionam de modo diferente segundo horas do dia, os dias da semana, as épocas do ano”. Hoje isso é patente no entorno da Catedral Metropolitana: a instalação do Tribunal Regional do Trabalho trouxe para a Rua do Lavradio toda uma vida durante o dia que não existia enquanto localização no centro empresarial. À noite com os inúmeros bares que se revitalizaram a área toma outros ares, como uma “releitura” da boemia carioca. A

Esplanada

da

Avenida Chile, no entanto, continua sendo inóspita tanto de dia quanto à noite. Durante o dia é um corredor de passagem sem infra-estrutura. À noite, este trecho não existe, mergulha num limbo. Percebemos com isso como as pessoas estão distanciadas da cidade, dos espaços que deveriam fazer parte de suas vidas não só como atores coadjuvantes, mas como estrelas principais: como a rua, a calçada, a praça, o largo etc. A cidade reduziu-se a um amontoado de elementos urbanos mal estruturados. É importante, portanto, resgatar essa relação com o espaço público, ou melhor, essa inter-relação das pessoas e seu meio ambiente físico, cultural e social. Relação essa citada por Portzamparc no conceito de Quadras abertas em que na 3ª era da cidade se reinventariam as ruas, facilitando a percepção com novas perspectivas visuais, respeitando a autonomia das edificações, mas proporcionando maior integração entre eles, permitindo, dessa forma a coexistência entre ambos.

13

Idem 4

9

Essa inter-relação passa pelo conceito de lugar. Só se recupera essa relação do homem e o meio a partir do momento que o meio se torne um lugar para os que o utilizam. Tuan caracteriza lugares íntimos como “lugares onde encontramos carinho, onde nossas necessidades fundamentais são consideradas e merecem atenção sem espalhafato. (...)”14. O homem conforme se torna adulto sai desse seu lugar íntimo, caracterizado pelos pais para abarcar outros lugares que não são necessariamente espaciais (idéias também são lugares) para conviver num espaço macro, a cidade. Que também pode se tornar um lugar, pois se caracteriza por ser um centro de significados, por excelência, pois possui símbolos bem visíveis. Portanto, estudar a cidade enquanto objeto é fundamental para se entender a morfologia urbana da mesma, sua cultura objetiva, mas as relações que aí acontecem com os indivíduos, necessitam, segundo Tuan, da permanência. Acreditamos que com a globalização podemos estar em todos os lugares que quisermos sem a necessidade do deslocamento, mas não poderemos entender jamais as (inter)relações sociais que compõe aquele espaço. Pelo menos até que a Internet nos permita sentir cheiros, sentir o aperto de mão, a intensidade do abraço, o barulho da rua etc.; portanto, um dos requisitos básicos para que um espaço se torne um lugar é a “experienciação”. No entanto, não há como negar que essa facilidade de estarmos em contato com pessoas do mundo todo através da telinha do computador não tenha trazido influências na nossa cultura social, econômica, urbana e vice-versa. Esse nosso período globalizado traz uma nova condição humana que Celina Fernandes Almeida Manso, no livro “Goiânia: uma concepção urbana, moderna e contemporânea – um certo olhar” feita por Wilton Medeiros diz - “Para mim, essa necessidade de estudar as cidades é algo semelhante à necessidade de decifração da antiga esfinge. O “decifra-me ou devoro-te” antigo tem renascido como um novo enigma para que se reconfigure a condição humana. Assim como no oitocentos o domínio sobre a natureza se configurava como condição indispensável para a constituição da cultura, atualmente, o

14

TUAN, Yi-fu. Espaço e Lugar.

10

que me parece, é que o domínio dessa “segunda natureza”, a cidade, torna-se indispensável para que se reconfigure uma nova condição humana.” Se a cidade é o ponto indispensável para a reconfiguração da condição humana devemos nos perguntar: Que cidade queremos!? Ou, que espaços queremos dentro das cidades!? Queremos espaços que antes de tudo nos remeta às nossas emoções, que nos acolha, que nos permita ir e vir sem sermos incomodados. Queremos uma cidade em que haja espaços em que a “... intimidade entre pessoas não requer o conhecimento de detalhes da vida de cada um; brilha nos momentos de verdadeira consciência e troca. Cada troca íntima acontece em um local, o qual participa da qualidade do encontro. Os lugares íntimos são tantos quantas as ocasiões em que as pessoas verdadeiramente estabelecem contato”15. Necessitamos desses locais de contato, pois vivemos sob o signo da Globalização, onde “[...] quanto mais a vida se torna mediada pelo mercado global de estilos, lugares e imagens, pelas viagens internacionais, pelas imagens da mídia e pelos sistemas de comunicação globalmente interligados, mais as identidades se tornam desvinculadas – desalojadas – de tempos, lugares, histórias e tradições específicos e parecem ‘flutuar livremente’. Somos confrontados por uma gama de diferentes identidades (cada qual nos fazendo apelos, ou melhor, fazendo apelos a diferentes partes de nós), dentre as quais parece possível fazer uma escolha (p. 75)”.16 Se perdermos a oportunidade desses encontros estaremos nos perdendo no hibridismo cultural que a globalização nos impõe. Tuan diz que “o lugar é segurança e o espaço é liberdade: estamos ligados ao primeiro e desejamos o outro”. Essa é a abordagem geográfica humanista que rechaça a idéia de mundo preciso, sem contornos e destituído de significados, esta abarca em seu âmbito os laços de afetividade que unem as pessoas ao meio ambiente e pode analisar a relação empática do ser.

15

TUAN, Yi-fu. Espaço e Lugar. HALL, Stuart. A Identidade Cultural na Pós-Modernidade. Rio de Janeiro: DP&A, 2003, p. 11. As citações da obra serão feitas somente com a indicação da página. (N. do E.) 16

11

Tal vertente encontra na fenomenologia seu suporte filosófico ao analisar a apreensão das essências através da experiência vivida, aplicada e adquirida – não considerando o mundo independente do ser humano. O enraizamento de sentimentos, a assimilação e conseqüente incorporação da cultura local contribuem para a formação da identidade dos lugares; e este sentido de identidade envolve percepção, se apresenta carregado de satisfação, reminiscência e felicidade, como um somatório das dimensões simbólicas ao encarar as experiências banais e aspirações humanas”. São essas dimensões simbólicas que precisam ser incorporadas à Catedral Metropolitana do Rio de Janeiro e seu entorno. Conclusão O presente trabalho traz à tona a discussão sobre a construção desse entorno da Catedral Metropolitana do Rio de Janeiro como um não-lugar desde sua trajetória como morro de Santo Antônio até o que hoje conhecemos como Esplanada da Avenida Chile ou Esplanada de Santo Antônio. É necessário para a cidade resgatar esse entorno enquanto acontecimento para a paisagem e conseqüentemente transformar esse espaço num lugar para as pessoas. Possibilitar que através da discussão possa se incentivar um projeto que crie um lugar de estar, cultura e lazer dentro do centro empresarial do Rio de Janeiro. Remontar imageticamente o Morro de Santo Antônio. Criar uma outra perspectiva para a área. A intenção com essa discussão é estimular a criação de um lugar que hoje não existe. Relph em A sense of Place and Authentic Place-making fala que “os espaços criados podem inclusive se tornar autênticos a partir do momento que se busque uma relação simbólica com os elementos tradicionais do espaço”.17 Relph, na mesma obra já citada também fala que “a discussão sobre espaço x lugar (e não-lugar) dependem e são variantes segundo a perspectiva do observador, a

17

RELPH, Eduard. A sense of Place and Authentic Place-making. Retirado do resumo de aula feito por Rubens Moreira R. de Carvalho e Carlos Krykhtine.

12

cultura, etc., uma vez que não podemos determinar uma variante comum a todas as sociedades – pois as ‘tradições se fabricam’ de acordo com as necessidades do lugar”. O entorno da Catedral Metropolitana tem um enorme potencial de “linkar” vários lugares do centro da cidade do Rio de Janeiro tornando-se um ponto focal de referência social, cultural e paisagística. É um espaço globalizado por si só, pois congrega vários momentos da cidade, mas necessita tomar para si essa responsabilidade perante a cidade. Deixar de ser um resíduo de história para torna-se peça essencial desse da cidade, da paisagem. Manter seu valor histórico, mas revitalizar-se assim como uma bela pintura antiga ganha uma moldura nova.

13

Referências Bibliográficas: FOETSCH, Alcimara Aparecida. Subsídios teórico-epistemológicos para um operacional estudo do lugar. Revista Espaço Acadêmico – Nº55 – Dezembro/2005 – Mensal – ISSN 1519.6186. http://www.espacoacademico.com.br/055/55geo_foetsch.htm FREITAS, Rita de Cássia Santos Freitas. Niterói – Reflexões e devaneios sobre uma cidade. RELPH, Eduard. A sense of Place and Authentic Place-making. HOLANDA, Karla. Documentário Brasileiro Contemporâneo e a Micro- Universidade de Campinas (UNICAMP) http://www.revistafenix.pro.br/PDF6/13%20-%20DOSSIE%20-%20ARTIGO%20%20KARLA%20HOLANDA.pdf?PHPSESSID=75381ff100fef3f0357b29f146efb95b HOLZER, Werther. Sobre Paisagens, Lugares e não-lugares. HOLZER, Werther. Uma discussão fenomenológica sobre os conceitos de paisagem e lugar, território e meio-ambiente. MOSER, Gabriel. Psicologia Ambiental http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413294X1998000100008&lng=in&nrm=iso&tlng=in http://www.vitruvius.com.br/resenhas/textos/resenha112.asp MANSO, Celina Fernandes Almeida. Livro resenhado por Wilton Medeiros: Goiânia: uma concepção urbana, moderna e contemporânea – um certo olhar, Goiânia, Edição do Autor, 2001 [Imagem: Planta do Setor Central, Goiânia, 1938]112.asp http://www.cpdoc.fgv.br/revista/arq/178.pdf PESAVENTO, Sandra Jatahy. Muito além do espaço: por uma história cultural do urbano. http://www.niteroi.rj.gov.br/downloads/pdf/revista.pdf 14

Niterói. Prazer de Viver aqui. http://www.neltur.com.br/port/niteroi_apresentacao.htm https://webp.caixa.gov.br/urbanizacao/conf_cidades.asp ROCHEFORT, Michel. Cidades e Globalização. Lua Nova: Revista de Cultura e Política Print ISSN 0102-6445 Lua Nova no. 69 São Paulo 2006 São Paulo no contexto da globalização* http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0102-64452006000400008&script=sci_arttext http://www.ofluminense.com.br/noticias/79069.asp?pStrLink=5,358,0,79069&IndSeguro =0 SANTOS, Milton. Metamorfoses do Espaço Habitado – Fundamentos teóricos e metodológicos da Geografia. REZENDE, Vera F. AS TRANSFERÊNCIAS INTERNACIONAIS E O URBANISMO MODERNISTA NA CIDADE DO RIO DE JANEIRO http://www.uff.br/lacta/publicacoes/astransferenciasinternacionais.htm AMOROSO, Mauro. A FAVELA FALTOU NA FOTO: O DESMONTE DO SANTO ANTÔNIO PELAS. LENTES DO CORREIO DA AMNHÃ http://www.uff.br/ichf/anpuhrio/Anais/2006/conferencias/Mauro%20Amoroso.pdf http://72.14.209.104/search?q=cache:to3x47H9_9EJ:br.geocities.com/zostratus14/riourb.htm+urbaniza%C3%A7%C3%A3o+da+%C3%A1rea+de+desmonte+do+Morro+de+ Santo+Ant%C3%B4nio+reidy&hl=pt-BR&ct=clnk&cd=13&gl=br SEGRE, Roberto. Rio de Janeiro metropolitano: saudades da Cidade Maravilhosa (1). http://www.vitruvius.com.br/arquitextos/arq046/arq046_01.asp BRANDI, Luiz Cláudio. Arquitetura + Música. http://www.arquiteturamais.blogger.com.br/2004_06_01_archive.html

15

DEL RIO, Vicente e GALLO, Haroldo. O legado do urbanismo moderno no Brasil. Paradigma realizado ou projeto inacabado? http://www.vitruvius.com.br/arquitextos/arq000/esp023.asp ALUNOS: ANA PAULA, GUSTAVO, HERBERT, JÚLIO, KATIA, LILIAN, LEANDRO, MAITÊ, MARCEL, RICARDO, PROF. CARLOS ZIBEL, ISSAO MINAMI, SÉRGIO MARTINS. DA CIDADE ORGANISMO À CIDADE ESPETÁCULO: Oxigenação, Regeneração e Espetacularização a favor da Recontextualização da área da Luz. http://www.fau.usp.br/docentes/depprojeto/i_minami/AUP5844/projetos/g6/final.htm

16

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.