O Espectador da Filosofia e O Moralista Estético (M. Sérgio Cortella e o Séquito...)

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O Espectador da Filosofia e O Moralista Estético (M. Sérgio Cortella e o Séquito...)

Emanuel Magalhães Fróes

Se todos entendem quase tudo que, p.ex o Mário Sérgio Cortella diz, sem precisar efetuar nenhum "movimento infinito" no espírito, então o que ele lhes diz de novo? Pois parece que assim ele só exprime melhor o que todos de antemão já sabem e , principalmente, já julgavam ser sensato, dando a isto apenas uma expressão mais viva. O nome da técnica da expressão é retórica, instrumento da filosofia. A ela alia-se outro fator importante, que é seu material semântico, e no caso da filosofia, dado pela erudição, quando não por sínteses do pensamento mesmo. Ambas, retórica e erudição, são dominadas por nosso prof. Cortella. Ora, mas a filosofia não deve ser julgada por seu instrumento, nem o filósofo pelo belo uso dele. A questão principal caį sempre sobre os pensamentos filosóficos, que exigem conceitos filosóficos, os quais abordam justamente o que ainda nem para o filósofo está claro, relacionando realidade e auto-conhecimento sob respeito à complexidade inexorável destas coisas - que é maior, tanto mais a religião é suspendida do assunto. E, se não é o principal o que se busca, o que é a filosofia?

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A quem nunca leu uma obra filosófica, o melhor conselho é lê-la, antes de seu ouvido prender-se ao discurso populista, e não simplesmente filosófico, pois evita que teu pensamento o interrompa, ao pensares também. Mesmo a mais difícil vale a pena pegar e folhear: será exigido de ti os movimentos originais e principais do que está por vir, mesmo tratando coisas mais fáceis. A leitura filosófica é acompanhada, ao início, naturalmente de um enfado, pois sua dificuldade é tão intrínseca ao que está para ser entendido quanto a incapacidade de incompreensão disto é intrínseca ao leitor e pensador iniciante. Porém, muitas vezes depois de vencer o enfado por dedicação, o sujeito tem prazer no conhecer e entender - o prazer de ampliar o mundo ao ampliar o mundo interior - e leva consigo a dificuldade até de explicar coisas que tornarem-se óbvias, ou fortemente plausíveis. Pois a realidade que for bem explicada é um objeto que converte-se facilmente de complexo para simples, já que o conceito, finalidade da criatividade filosófica, a unifica às vezes de modo dificílimo de romper, depois de apanhado sob a paciência que ele exige. Outras coisas, porém, recusam-se ao clareamento mesmo das almas mais esclarecidas. Tornar p.ex. a categoria do enfado um critério para a qualidade da manifestação pública da filosofia é, ao ser tomado e exagerado por si mesmo, um claro exemplo de esteticismo intelectual, onde o gosto e sensibilidade intelectual daquele a quem se ensina é predominante em relação a daquele a quem é confiado ensinar. Ora, se de quem me ensina exijo que seja sobretudo fonte de meu prazer intelectual, e sobretudo medido sob a medida deste, suprimindo qualquer movimento contrário ao esforço, então é claro que isto contradiz dois pressupostos da relação pedagógica: confiança no mestre ( ou, indiretamente, na fonte), como algo que excede meu mundo, e a consciência de que o que me falta saber deve ser resultado de meu próprio trabalho, sendo parte deste a compreensão de coisas ainda incompreendidas, e ainda o julgamento destas. Exatamente no momento do julgamento do "espectador" é que nota-se a fraqueza de tais manifestações públicas, principalmente as que não carregam um discurso escrito por traz, pois neste caso é preciso, primeiro, ter conhecimento para julgar o conhecimento e, segundo, o discurso julgado deve ser de tal forma que possa ser ao menos formalmente verificável ou objetável. Mas todos sabem que discursos vãos demais

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são tão confirmáveis quanto objetáveis! Na trivialidade é que fazem o maior sucesso. Na Europa há casos parecidos deste "moralismo estético", e de diversos tipos de qualidade. ( Mas, havendo um buraco moral enorme no Brasil, é claro que os nossos sao formas quase que desesperadas desta prática) Eles parecem, no entanto, não dialogar entre si, e por isso aparecem com soluções - como se muitas delas fossem da filosofia, e não de certo bom senso - e frequentemente em discursos curtos demais, ou amplos e diluidos demais. O que seriam, senão soluções, o esperado de uma " filosofia-para"? Pois o ambiente acadêmico, nem o público, estão livres das diferentes formas do self-marketing. Veja-se David Precht, Peter Sloterdijk, Slavoj Zizek, e Chomsky nos Estados Unidos... Dado que no mundo predomina ignorância e injustiça, basta revestir o pensamento "sejamos mais intelectuais, e mais justos" de um retórica mais cabida à circunstância para provocar um apelo e efeito público considerável. Então chame-se-os antes moralistas, bem-feitores, pedagogos públicos; pois, mesmo sendo o filósofo, em sua integralidade, também pedagogo e homem público, não é por aí que ele se institui legitimamente como tal, mas sim pela validade de suas especulações para si e, ao menos, para outro semelhante. O momento do contato com o discípulo é crucial, determina também a qualidade de sua doutrina, mas é ainda posterior. Então, mais posterior ainda, a magnitude pública de uma doutrina, ou, no pior dos casos, de um "modo de falar", o qual o povo, por não dominar sua expressão, nem às do que se exprimem, confunde com presença de conteúdo. Trata-se de um evento estético, sobretudo; e deve ter, no mínimo, uma autoconsciência de seu momento estético, por outro lado, indispensável, assim como a retórica o é. ( Tanto na música, como na lógica, o momento retórico se dá como complemento intrínseco do sentido destas artes) Em alguns casos a validade de suas especulações tem consequência pública sem ser pública; em outros casos o sentido de certas especulações é afetar o público, exigindo para si uma retórica apropriada. Mas em todos os casos é a verdade, através de exercício prático e teórico contínuo e de longo prazo, o que faz o filósofo cada vez mais filósofo, e não sua compreensão. Pois a compreensão popular poucas vezes é devida ao

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exame, e na maioria das vezes reside na aceitabilidade, isto é, num consenso dado de antemão. Isto pode ser um bem intelectual de algum tipo, mas não por sê-lo deve confundir aos que, na maioria dos casos, tem vergonha mesmo dos livros de filosofia e similares, de que aí está a verdadeira filosofia, isto é, no momento fácil e público, na maioria das vezes dubitavelmente concentrado e apoiado sobre as pernas de uma só pessoa. Isto não significa, porém, que tais pessoas tomem parte em contrariar fundamentalmente inclinações importantes do sentimento filosófico, que se dirige obviamente tanto a si quanto aos homens, mas sobretudo, que os nomes e funções milenares de certas coisas não seja negligenciado por contingências mesquinhas próprias do caos contemporâneo. Não é possível explicar muita coisa propriamente filosófica a quem se contenta com um grupo de cinco frases colado num cartão na porta do quarto e que só ao citar a filosofia sente-se enrubecido. Pois é-lhe exigido abertura, e na abertura ele esforça-se por compreender e compreende os custos materiais e espirituais de um empreendimento verdadeiro que supere o limite do entretenimento. Por outro lado, uma atividade pedagógica, com endossamento filosófico, poderia colaborar para esta abertura, isto é, simplesmente não a evitando... Mas toda essa coisa de uma " pedagogia filosófica" é ainda uma palhaçada mesmo, enquanto não há um grupo mais ou menos conjunto de filósofos, mas apenas de pesquisadores com interesses arbitrários comuns - para não citar excessões: é uma palhaçada pois destrui-se a philosophia perennis, a unica coisa que embasaria o adjunto "filosófico" que serve como coringa e erva-daninha toda vez que a coisa aperta. Sem a resolução própria do corpo de problemas que impede a filosofia como bem mais ou menos unificado, estarão oferecendo indiferentemente e indiretamente Comte, Thomás, Nietzsche, Russel e Kierkegaard sob o nome santo "filosofia", despistando o canteiro de obras onde se deve dar as discussões e colaborações. É preciso, usando o nome da filosofia, discursos que provoquem anseio de saber ao mostrar o desconhecido como potência do saber mesmo;

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não discursos que deixem a pessoa onde ela já está, como certos filmes recentes que , tão realistas e próximos a experiências medíocres da vida, já deixam de mostrar a realidade em questão. Que não se use gratuitamente, pelos fins mais imediatos, os nomes mais últimos e mais caros possíveis.

Salzburg, 16.02.2016

http://pseudoacademicus.blogspot.co.at

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